Empreendedorismo e(m) Design de Moda: uma visão estratégica para o Ensino Superior

July 21, 2017 | Autor: Graziela Sousa | Categoria: Entrepreneurship, Education, Fashion design, Higher Education, Millenials, Entrepreneurism
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Empreendedorismo e(m) Design de Moda: uma visão estratégica para o Ensino Superior Graziela Sousa 1 1) Faculdade de Arquitectura da Universidade de Lisboa, Portugal [email protected]

Resumo O artigo descreve as intenções e os resultados previstos do projecto de investigação de doutoramento em decurso intitulado Empreendedorismo e(m) Design de Moda: uma visão estratégica para o Ensino Superior. Para responder à questão de investigação “Como fomentar o perfil e as competências de empreendedorismo dos (futuros) designers de moda no contexto do ensino superior português?” percorre-se um percurso teórico no sentido de (1) conhecer as problemáticas do meio do design de moda, profissional e educacional e as tendências de inovação neste campo; (2) reconhecer a missão da Universidade na formação de indivíduos (identificando os interesses e as motivações da geração de estudantes actual) e na promoção do empreendedorismo; (3) compreender que conceito de empreendedorismo é adequado para a investigação e (4) identificar paradigmas emergentes – indispensáveis para conformar modos de actuação e garantir a actualidade e o sucesso da investigação. Está a ser formulado um modelo pedagógico para o ensino superior em Design de Moda (DM) – focado especificamente nos mestrados. A nível metodológico, para além da revisão da literatura, estão a ser levadas a cabo entrevistas a intervenientes de relevo, tanto do campo do DM, como do ensino e fomento do empreendedorismo, estão a recolher-se dados sobre alumni de DM e sobre currículos de cursos, e finalmente, está a ser formulado um estudo exploratório que irá testar o modelo em construção, cujos resultados e operacionalização serão públicos e partilhados globalmente e cuja validação por especialistas e consequentes feedbacks/reformulações permitirão a afinação e finalização do modelo. Através deste, espera-se contribuir para um incremento do espírito empreendedor entre os estudantes e jovens designers de moda, de acordo com os paradigmas da actualidade e orientado para a inovação – no sentido da sustentabilidade e da incorporação de avanços tecnológicos relevantes.

Palavras chave: design de moda, ensino competências empreendedoras, inovação.

1.

superior,

empreendedorismo,

Introdução

A suspeita inicial de que é necessário um incremento no fomento do espírito empreendedor no contexto do ensino superior de Design de Moda, é facilmente confirmada por diversos autores e por profissionais da indústria (Gehlar, 2008; Burke, 2008; Jaeger, 2009; Meadows, 2014[2012]). Tanto a nível do ensino como a nível da prática da profissão e do carácter específico da indústria da moda, existem inúmeras problemáticas que contribuem para a dificuldade sentida por estudantes e profissionais deste campo, especialmente na configuração das suas carreiras (trabalhando para outrem e/ou lançando negócios próprios).

Estreitando o estudo no sentido da influência do ensino superior na formação de profissionais/cidadãos, procedeu-se à exploração de temáticas como a Missão da Universidade (Ortega y Gasset, 1930), a Universidade Empreendedora (Etzkowitz et. al, 2000; Etzkowitz, 2004; Redford & Fayolle, 2014) e o Ensino e Fomento do Empreendedorismo (Redford, 2008; 2013). No caso do ensino superior de Design de Moda, – dada a redução das licenciaturas para três anos (com o processo de Bolonha) e a consequente dificuldade de leccionação dos conteúdos e desenvolvimento de competências num reduzido número de horas de contacto, – tomou-se a decisão de fazer um foco nos mestrados em Design de Moda. Neste contexto, pretende-se levar a cabo experiências que auxiliarão na construção do modelo, as quais serão adaptadas aos seus beneficiários directos (a geração Millennial1) através do recurso a ferramentas Web, digitais e redes sociais.

2.

Contextualização

A moda é um tema relevante em Portugal, com particular reconhecimento no domínio da fabricação e manufactura e com algumas marcas de relevo com um incremento no volume de exportações nos últimos anos (Mellery-Pratt, 2015). No entanto, o design de moda português não é ainda reconhecido mundialmente, observando-se uma lacuna entre o prestígio internacional do tecido industrial nacional, o número limitado de marcas de sucesso e mais limitado ainda o número de criadores independentes cujos negócios têm reconhecimento e vendas a nível internacional. No domínio global, há também um carácter muito específico desta indústria criativa, cujas exigências vão para além da criação e comercialização de vestuário, estando inserida num meio que prima pelo glamour, marketing, publicidade, mediatismo – e onde reinam as grandes marcas de fast-fashion2. Estes factores dificultam a tarefa de ensinar design de moda, sendo os estudantes muitas vezes atraídos para esta profissão (ou formação) por motivos de fascínio e atracção pelo meio e não necessariamente por paixão/vontade de desempenhar uma actividade como designer de moda. Tal como vários players da indústria relatam, ter sucesso em design de moda requer muita dedicação ao que é a gestão estratégica, montagem e promoção de um negócio, algo para que, habitualmente, os estudantes/jovens designers não são preparados (Jaeger, 2009). Da escassa literatura sobre empreendedorismo em Design de Moda (Gehlar, 2008; Burke, 2008; 1 2

Denominação celebrizada por Neil Howe e William Strauss (2000) na obra Millennials Rising: The Next Great Generation.

A expressão fast fashion refere-se às marcas de baixo custo que procuram ir ao encontro dos desejos de consumo dos consumidores mais jovens (Joy et al., 2012).

Jaeger, 2009; Kurz, 2010; Meadows, 2014[2012]) foi possível confirmar que (1) o trabalho de um designer de moda empreendedor não se confina à conceptualização de peças de vestuário ou de acessórios, porque muito do seu tempo tem de ser dedicado ao negócio propriamente dito, e (2) que a criatividade em design de moda orientada para a inovação de negócio e para o desenvolvimento de produtos tem de ser informada dos diversos aspectos ligados ao business process para erradicar abordagens intuitivas e ingénuas. Elisa Kurz (2010) identifica alguns dos problemas enfrentados por designers de moda empreendedores na sua tese de mestrado3 e fornece pistas para a resolução/diminuição dos mesmos. A autora conclui que: (1) É necessário desenvolver mais investigação a nível da gestão empresarial no campo particular da moda; (2) O empreendedorismo deve ser visto como parte integrante da educação universitária em Design de Moda; (3) Os designers de moda empreendedores necessitam de uma maior preparação e suporte antes e durante a criação dos seus negócios, assim como na fase de crescimento/desenvolvimento destes. A investigadora induz também que a possibilidade de desenvolvimento e crescimento de novos negócios no campo da moda pode igualmente contribuir beneficamente para o desenvolvimento do tecido industrial têxtil e de produção de vestuário (Kurz, 2010: 2, 51) – algo que se pretende ver espelhado no futuro, como resultado da presente investigação e da implementação do modelo. O mercado de moda é continuamente inundado pelo mais variado tipo de produtos de consumo, oriundos dos impérios da chamada fast-fashion que lideram a maioria dos mercados internacionais porque têm a capacidade de produzir em massa vestuário e/ou acessórios a baixo custo. Estes gigantes da indústria normalmente não se preocupam com questões éticas – nomeadamente com os direitos de autor, com condições de trabalho humanizadas, nem com a sustentabilidade. Na falta de legislação e de fiscalização para combater com eficácia estes gigantes económicos, os consumidores são os únicos que detêm o poder de os penalizar. Porém, o desejo de consumo sobrepõe-se ao sentimento de responsabilidade ética e social (Joy et al., 2012). A tragédia ocorrida no Bangladesh a 24 de Abril de 20134 é apenas um exemplo gritante dos problemas resultantes da fast-fashion cuja solução se adivinha difícil e morosa (Shannon, 2013). Também o impacto ambiental da indústria de moda é alvo de uma pertinente preocupação: a produção, a colheita e o tingimento das fibras têxteis utilizadas não só consomem recursos naturais de difícil renovação ou não renováveis (como por exemplo, o petróleo) como são

3

Analysis on fashion design entrepreneurship: Challenges and supporting models (2010), tese de mestrado elaborada por Elisa Kurz na University of Borås, Swedish School of Textiles.   4 O incêndio que deflagrou no complexo fabril Rana Plaza, onde era confeccionado vestuário para diversas marcas ocidentais como a Primark, Benetton, provocou a morte a 1134 operários, tendo muitos mais ficado feridos ().

igualmente responsáveis pela poluição aquática e atmosférica, não esquecendo o facto de que o consumo exacerbado de vestuário se reflecte também no aumento de desperdício (Challa, 2010). O marketing, o branding e o product placement das marcas de moda são cada vez mais agressivos, tanto a nível físico (e.g., em lojas e montras) como a nível da Web e do editorial – que inundam as vidas dos consumidores, influenciando os seus desejos, as suas escolhas e a sua percepção da realidade (Clifford, 2008; Hultin e Villberg, 2013). A velocidade e a rotatividade de tendências de moda, proporcionada por ciclos de divulgação e apresentação de colecções cada vez mais rápidos, não permitem que os designers façam uma verdadeira reflexão sobre o produto do seu trabalho e/ou sobre a sua actividade porque os torna ‘vítimas’ de uma engrenagem da qual têm obrigatoriamente que participar sob pena de serem esquecidos. De acordo com Susy Menkes (2013), também a imprensa de moda acaba por ficar excessivamente ocupada com os mais variados eventos e notícias, o que não permite nem um conhecimento aprofundado/consciente do contexto real de moda nem a procura e descoberta de novos talentos e projectos inovadores/originais. A conectividade constante e crescente, através de gadgets, de interfaces tecnológicas, redes sociais e e-shopping, tem vindo a transformar os consumidores em prosumers5 que, tendo um poder cada vez maior relativamente aos produtos que consomem (mesmo que sejam influenciados pelo exterior – publicidade, marketing e branding), influenciam as escolhas de outros consumidores e se fazem ouvir junto das marcas – tanto para as glorificar como para as criticar (Jaeger, 2009; Gunelius, 2010; Ollins, 2013). Os avanços tecnológicos abrem também campos promissores para a criação e produção no domínio da moda: o desenvolvimento de produtos no campo da chamada Wearable Technology, i.e., acessórios e peças de vestuário que permitem a interacção constante dos utilizadores através de aplicações de software que podem monitorizar a actividade física ou auxiliar na produtividade (Pitzer et al., 2013). Os avanços no domínio da produção de fio, têxteis e fabricação de vestuário, com a evolução e desenvolvimento das chamadas fibras têxteis inteligentes, permitem diversas novas opções estéticas e funcionais e têm aberto diversas alternativas no campo do vestuário desportivo, no domínio da saúde e também no do vestuário de protecção (Fibernamics, 2013; Berglin, 2013). Como pistas precursoras do futuro da actividade, é possível extrair que: (1) a influência da Web, das redes sociais e dos gadgets, provocam e continuarão a provocar um forte impacte no campo 5

prosumer – aglomeração resultante da combinação das palavras professional e consumer: o termo resulta da observação do facto de que os consumidores se têm vindo a tornar especialistas e ‘advogados’ das marcas, transformando-se na voz dos produtos e influenciando significativamente no sucesso ou falhanço das empresas, marcas e produtos, especialmente graças ao seu envolvimento nas redes sociais (Gunelius, 2010).

da moda, tanto ao nível de conhecimentos e partilha, como ao nível de desenvolvimento de novos produtos; (2) a sustentabilidade, tanto ambiental como económica e social, deve ser o caminho a seguir; (3) os consumidores passarão a ter cada vez mais poder e influência sobre os produtos e serviços que consomem, circunstância esta que poderá ou não ser acompanhada por um aumento da informação (fidedigna) sobre esses produtos e serviços – o que terá que ser ponderado, tendo em conta a agressividade do marketing da indústria de vestuário e os preços altamente competitivos do mercado da fast-fashion. Fatma Ünay e Cemal Zehir (2012) estabelecem uma relação entre Inovação, Criatividade e Empreendedorismo na área de design de moda e evidenciam a importância de uma visão global do que é o negócio de moda, desde a identificação de oportunidades e a aplicação de inovações, ao processo de desenvolvimento de um produto e ao negócio que permite fazer chegar esse produto ao grande público. Os autores sublinham a importância deste processo integrado, em que a criatividade é uma peça fundamental para a compreensão da envolvente social e material e para que sejam efectuadas mudanças significativas (e melhorias/avanços) no contexto (Ünay e Zehir, 2012: 316). Os autores concluem que, pelo facto dos dois processos - conceptualização e negócio, – serem usualmente encarados como pertencendo a campos separados, se tem inibido a criação de ligações entre inovação e comercialização em design de moda (Ünay e Zehir, 2012: 315), originando lacunas no domínio investigativo e também no da prática real/profissional. A iniciativa Baltic Fashion (Acksteiner e Lorenzen, 2013) situou as inovações a explorar no campo do design de moda em três áreas fundamentais, i.e.,

tecnologia, tradição e

sustentabilidade. Desenvolvida em parceria por diversos países do Mar Báltico (Estónia, Suécia, Finlândia, Letónia, Alemanha e Polónia) entre 2011 e 2013, visou a criação de marcas de moda, a realização de workshops, projectos de investigação e exposições. Com estas acções, a iniciativa procurou auscultar diferentes questões dentro das áreas temáticas supramencionadas com a finalidade de desenvolver o design de moda naquela região através de um questionamento precursor de Inovação (Acksteiner e Lorenzen, 2013: 4). A iniciativa Baltic Fashion foi conseguida graças a múltiplas parcerias entre universidades, centros de investigação, organizações governamentais locais, ministérios e incubadoras de negócios, daquela região (Acksteiner e Lorenzen, 2013: 55). Apesar de se ter circunscrito apenas a dois anos de actividades, cumpriu a intenção de implantar uma cultura supra-regional para o desenvolvimento da indústria de moda na Região Báltica, que ainda hoje se repercute em diversas acções de cooperação entre as entidades e os países envolvidos, através da centralização e divulgação de oportunidades e de novos eventos/projectos/acções reunidos na plataforma . Esta iniciativa serve não só para demonstrar como o fomento à Inovação em Design de Moda pode ser feito, mas também para consciencializar sobre

a importância que as entidades governamentais europeias, regionais e nacionais têm na prossecução desse desígnio. Apesar das muitas dificuldades patentes na área do Design de Moda e da grande competitividade da indústria e da profissão, existem várias áreas com espaço para a exploração de melhorias e desenvolvimentos inovadores. Estas poderão ser, no futuro, não apenas formas de tornar este campo mais rico e diversificado, mas também de o aproximar cada vez mais de práticas sustentáveis no desenvolvimento de novos produtos e serviços bem como nas estratégias de comunicação. Também o recurso às inovações científicas e tecnológicas mais pertinentes poderá facilitar o acesso a oportunidades de negócio e de partilha de conhecimento a nível interdisciplinar e à escala global. Por situar, no sentido filosófico, a missão da Universidade e pela pertinência da sua perspectiva (apesar de datar do início do século passado), é fundamental mencionar-se o contributo de Ortega y Gasset (1930). O filósofo situa a missão da Universidade como algo diferente da missão de um ensino meramente profissional ou profissionalizante, descrevendo-a como um berço de novas ideias e de elevação cultural. Para que tal seja possível, o filósofo recomenda uma permanente actualização relativamente aos conteúdos e ao contexto de inserção da Universidade, apontando esta actualização como a única forma para se conseguir uma formação de cidadãos activos e capazes de intervir sobre o seu meio e o mundo. Também o contributo de Câmara (2009a, 2009b) é determinante para a investigação porque apresenta uma visão da Universidade que reverte para o desenho do modelo em desenvolvimento: i.e., para a capacitação de indivíduos pensadores e criativos, para o fomento do espírito empreendedor no contexto da universidade, para a aplicação dessas competências na criação de novas empresas de raiz universitária e, por fim, para a abertura da Universidade à comunidade como promotora de novas ideias, de novos negócios e de criação de valor. Algumas ideias de Ortega y Gasset estão presentes no pensamento de Câmara (2009a), mesmo sem o citar. Câmara acredita que a Universidade deve ser um centro para a evolução dos indivíduos no sentido de produção e promoção de conhecimento novo e de enriquecimento pessoal orientado para o futuro e para a melhoria das condições presentes. No âmbito da ligação Universidade-Empreendedorismo, foram de particular importância os contributos de Henry Etzkowitz et al. (2000), Dana Redford (2008) e Dana Redford e Alain Fayolle (2014). Dos seus estudos, extraíram-se os seguintes dados pela sua pertinência para a construção do modelo: 1) As universidades devem mudar as suas políticas, regras e estratégias organizacionais possibilitando aos investigadores e docentes a participação em actividades empreendedoras, no

sentido do cumprimento da missão da Universidade – ensino, investigação e serviço/integração na comunidade. 2) A visão estratégica das universidades, as políticas públicas e a integração do suporte para a criação e apoio a start-ups universitárias são vitais para a independência das instituições de ensino superior e para configurar percursos profissionais bem sucedidos. 3) As universidades não podem isolar-se da comunidade; pelo contrário, têm de ser capazes de compreender as especificidades e as necessidades do contexto envolvente. 4) A cultura do empreendedorismo na formação dos estudantes é essencial para alimentar a criação de start-ups de raiz universitária. O modelo de Ortega y Gasset (1930) deixava já antever o que se chama hoje em dia a terceira vertente da missão da universidade – a sua integração na comunidade – mas é na obra de Etzkowitz (2000) e de Câmara (2009a) que se encontra uma caracterização mais detalhada do que se poderá chamar de Universidade Empreendedora. Também é através de Etzkowitz (2000) e de Câmara (2009a), que se identifica o modelo de interacção entre universidade-indústriagoverno, servindo o propósito de servir a comunidade, avançar no conhecimento e contribuir para o desenvolvimento económico. Embora não se encontre uma resposta específica para o design de moda relativamente à implementação/formulação de um modelo de empreendedorismo universitário, pode aferir-se que será possível contribuir para este através de mudanças profundas de mentalidade, cultura e até regras organizacionais nas universidades, através da extensão do acesso a informação, formação e ao enriquecimento dos conteúdos leccionados no sentido de uma maior ligação à actualidade/contexto de inserção, à criação de estruturas de fomento, suporte e apoio à criação de start-ups universitárias e à implementação de estratégias que permitam uma articulação universidade-indústria-governo que apresente benefícios/melhorias para os três intervenientes. É fundamental para este estudo o conhecimento do maior público-alvo das universidades: os estudantes. Para tal, tomou-se como ponto de partida a geração mais significativa presente nas 6

universidade actualmente: a chamada Geração Y ou Millennial – nascidos entre 1982 e 2002 (Elam et. al., 2007: 21). Esta geração é descrita como conformista (que aceita regras e necessita delas) e, embora orientada para objectivos e ambiciosa, pode ser demasiado dominada pelo sistema estabelecido – algo que pode dificultar o desenvolvimento/surgimento de um espírito e de características inovadoras e/ou empreendedoras (Shane, 2014). Assim, também a formação de educadores deverá ser feita no sentido de dar poder a esta geração: torná-los pensadores,

críticos e activistas na sua comunidade – indivíduos capazes de mudar o seu contexto positivamente. Tornando-se, obviamente, fundamental formar professores neste sentido, pois só assim poderão contribuir para fomentar o espírito crítico e a ambição de configurar futuros mais promissores (Donnison, 2007: 9). O ensino superior actual e futuro necessita de diversos tipos de transformação, tanto ao nível da reformulação da sua missão e política como na sua ligação à comunidade, mais precisamente através de estratégias que permitam e incentivem o empreendedorismo nesse contexto: seja através de formação, da criação de estruturas de acesso, suporte e acompanhamento de projectos empreendedores, na transferência de conhecimento e no desenvolvimento do modelo de interacção universidade-indústria-governo. Para que tal se verifique, será necessário ter em conta o contexto específico de inserção da universidade (factores sócio-económicos, geográficos, etc.) e também a adaptar as estratégias aos estudantes que as frequentam (suas expectativas, características e desafios). Foi necessário situar o conceito de empreendedorismo que mais se adequa aos propósitos da investigação e do modelo a ser projectado - alguns autores dão destaque à criatividade e capacidade de inovar quando definem o conceito de empreendedorismo enquanto que outros se restringem à acepção associada ao negócio e à criação de empresas. Embora ainda não se tenha determinado a acepção mais adequada ao âmbito da presente investigação, destacam-se alguns autores que podem conduzir à sua futura definição: tanto Peter Drucker (1993) como Robert Baron e Scott Shane (2008[2005]) dão destaque à capacidade de exploração de mudanças e oportunidades, que surtem efeitos na economia; também Donald Kuratko (2014[2009]) coloca uma tónica na mudança, descrevendo o empreendedorismo como um processo dinâmico que integra visão e criatividade como elementos decisivos para o sucesso na implementação de novas ideias. Considera-se que os propósitos, objectivos e missão da presente investigação estão mais próximos dos domínios da criatividade, inovação e criação de valor num determinado campo – sendo importante influenciar a capacidade de empreender, avançando no conhecimento, trazendo propostas de valor que sejam capazes de alterar os paradigmas do campo do design de moda: enriquecendo este campo através de novas abordagens de consumo, comportamentais, éticas, ambientais, entre muitas outras. De acordo com o que Câmara (2009b) salienta em Voando com os pés na terra, particularmente a sua visão para o futuro, a importância do saber colectivo e a ligação da humanidade em redes, baseando-se no modelo anarquista de Peter Kropotkin (1842-1921), juntamente com a visão apresentada por Don Tapscott e Anthony Williams (2006) em Wikinomics, é possível compreender a tendência para a informação partilhada (peer-to-peer) e de toda uma economia

baseada neste ‘novo poder’ que todos possuem com a ligação em redes e a partilha de saberes. Considera-se que este é um dos maiores paradigmas da sociedade actual e que tem um enorme potencial de crescimento e espaço para aproveitamento em todos os campos de conhecimento. Manifestações como tecnologias disponíveis em open-source, inovações que podem ser melhoradas pelo público (o exemplo mais imediato é a Wikipedia, conhecida amplamente por todo o público); como a multiplicidade de projectos financiados em regime de crowd-funding (no site Kickstarter, por exemplo) – são mais algumas confirmações de que o poder da audiência/público/consumidores está a tornar-se cada vez mais forte e um factor crescentemente mais significativo para o sucesso de projectos e a partilha de inovações.

3.

Metodologias

Para além da revisão da literatura que tem vindo a ser elaborada, proveniente de diversos domínios do conhecimento, como Filosofia e Psicologia da Educação, Design, Moda, Gestão, Economia, Inovação, Empreendedorismo, entre muitas outras, estão a ser levadas a cabo entrevistas exploratórias com diversos intervenientes nacionais e internacionais nos âmbitos do design de moda e do ensino e fomento do empreendedorismo, e está a ser efectuado um levantamento de dados relativos aos cursos e aos alumni de cursos de Design de Moda (percurso profissional, académico e empreendedor). Está também a ser preparado um estudo exploratório com estudantes de Design de Moda, recorrendo à teoria de aprendizagem experiencial (Kolb, 1984). Pretende-se operacionalizar este estudo e as suas iniciativas através da Web e socialnetworking, estimulando a participação e a publicação do seu percurso e resultados em tempo real e recolhendo feedback tanto do público como dos participantes – adaptando-o à geração/interesses dos seus destinatários e aos paradigmas emergentes – treinando e estimulando a aprendizagem através da prática, da incorporação de feedback ao longo do processo e adicionando os devidos ajustes. Prevê-se levar a cabo workshops com estudantes dos mestrados em Design de Moda nacionais – que façam uma ponte entre o meio académico e o meio profissional, consciencializem sobre os problemas do meio e a importância de uma mudança de atitude no campo do Design de Moda, que fomentem competências empreendedoras e ajudem a incentivar os estudantes para uma atitude responsável, inovadora e empreendedora (para que possam vir a ser agentes de mudança/evolução do seu campo). Estas iniciativas assemelhar-se-ão a programas de aceleração/geração de ideias, com diversas sessões informativas e diferentes oradores vindos dos mais variados campos de actividade (como freelancers, criadores, designers e gestores de

marcas, agentes de venda, marketeers, industriais do sector, relações públicas e social media experts, entre outros), intercaladas com trabalho em equipas e sessões de mentoria com especialistas e de apresentação de ideias/protótipos. Os workshops a realizar terão foco nas áreas de potencial inovação no campo da moda, divididas em duas grandes tendências: a) Ambientais: cada vez mais o consumidor e os intervenientes no campo da moda estão sensibilizados para o impacte ambiental da produção de vestuário, desde o cultivo de fibras, à fiação e tecelagem, passando pelos processos de tingimento e acabamento, até à produção de vestuário e ao desperdício gerado tanto pela indústria de moda como pelos consumidores. Têm sido alvo de grande destaque inovações que permitem o fabrico de tecidos a partir de materiais orgânicos (como vinho, leite e café) e que possibilitam tingimentos e acabamentos sem o uso de água e sem recorrer a químicos nocivos para o meio ambiente e para os consumidores7 (Breyer, 2012). b) Tecnológicas: o recurso à programação e a aplicações na Web permitem a optimização de processos de fabrico e a experimentação/produção de pequenas quantidades – tais como, modelagem computacional, estampagem digital, 3D printing, 3D knitting, 3D weaving, corte a laser, entre outros – e ainda a aproximação entre o consumidor e os produtos que consome – proporcionada por apps e gadgets que assentam na produção por processos de body-scanning, personalização e interacção em directo. A documentação destas iniciativas, os resultados obtidos, o feedback dos participantes e de especialistas, conduzirão aos devidos ajustes e reformulações e, posteriormente, à formulação do modelo pedagógico.

4.

Reultados (previstos)

Embora tenha como beneficiários directos os estudantes e jovens profissionais de design de moda, é possível intuir que o tecido industrial nacional e, consequentemente, a economia portuguesa poderão beneficiar de medidas que fomentem o empreendedorismo no ensino superior de Design de Moda em Portugal. Em termos institucionais, a formulação de um modelo pedagógico com enfoque no empreendedorismo em Design de Moda para o ensino superior português poderá contribuir para aumentar a notoriedade (local e internacional) dos cursos de Design de Moda – a prossecução da implementação deste modelo e a ligação que se pretende criar entre a comunidade, a Universidade e a indústria/meio profissional do design de moda –

poderão inclusivamente contribuir para um reconhecimento da formação superior nacional neste campo, colocando-a em paralelo com a excelente reputação da indústria nacional. Pretende-se também que o modelo/estratégias a implementar estendam a sua intervenção dentro e fora dos currículo dos mestrados em Design de Moda portugueses – que as iniciativas sejam transversais e possam progressivamente ‘contaminar’ as comunidades académicas para além dos mestrados/mestrandos. Intui-se que, também a nível da aprendizagem da profissão, estimular a ligação/contacto com a comunidade e o tecido industrial ainda no nível universitário possa contribuir para futuros profissionais mais promissores – i.e., que se passem a formar designers com uma maior capacidade de compreender o seu contexto e um maior estímulo para inovar/actuar sobre este e efectuar avanços no seu campo disciplinar. Ao incentivar uma acção consciente, responsável e com um pendor inovador no meio – que permita fazê-lo melhorar/evoluir – contribuir-se-á positivamente para o crescimento da área do design de moda em Portugal e para a economia nacional e global. Ao motivar professores, estudantes e comunidade académica em geral – para os benefícios do desenvolvimento de competências empreendedoras em qualquer nível de ensino, tornar-se-á possível um movimento de renovação e de mudança de paradigmas neste campo – algo necessário dadas as actuais dificuldades e problemas que se fazem sentir – tanto a nível de consumo como a nível da sustentabilidade. Espera-se com a presente investigação contribuir para que sejam criadas mais iniciativas, oportunidades e uma progressiva melhoria de condições para o fomento do empreendedorismo e da inovação no campo do design de moda.

5.

Conclusão

Combinando as diversas contribuições que permitem uma visão alargada sobre os diferentes temas relevantes para a investigação, podemos concluir que a formulação de um modelo empreendedor para a formação superior em Design de Moda é um desafio que terá de atender a diversos factores: _O contexto da moda nacional – pela compreensão do que pode ser feito para ou melhorar o meio ou aproveitar o seu potencial e criar oportunidades a partir daí; _O contexto académico (nacional e internacional) – se o modelo pedagógico pretende ser para o caso português, então é necessário compreender a fundo qual o potencial e quais as lacunas das universidades portuguesas e como se pode contribuir para melhorar ou para potenciar/tomar

partido dos seus pontos positivos; _O contexto nacional de suporte ao empreendedorismo – as políticas, as oportunidades e os desafios, – que informam o modelo, adequando-o às oportunidades presentes e futuras. É importante manter presente o facto de que não se pretende com esta investigação nem colocar a Universidade ao serviço de empresas (contexto exterior), nem preparar os estudantes para serem apenas ‘empregados’ destas; a Universidade tem de ser o local onde se formam pensadores, pessoas que sejam capazes de intervir activamente nos mercados, de modo competente, ético e socialmente. Os dados recolhidos sobre o meio do Design de Moda em Portugal, o reconhecimento das características e interesses dos estudantes, as tendências globais sobretudo ao nível da Web e da inteligência colaborativa em rede justificam a pertinência de um modelo empreendedor para o ensino superior em Design de Moda operacionalizado, partilhado e divulgado na Web e nas redes sociais. Este meio facilitará a difusão, a actualização de conteúdos, a comunicação, a partilha de experiências e de resultados e possibilitará a recolha de feedback a uma escala global.

6.

Referências

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