«Esplendor na Relva. Ruy Belo e a lição da poesia», in Um Nome Para Isto. Leituras da Poesia de Ruy Belo, Coimbra, Angelus Novus, 2003, pp. 104-118.

July 31, 2017 | Autor: Pedro Serra | Categoria: Literatura Portuguesa, Poesia portuguesa contemporânea
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«ESPLENDOR NA RELVA» Ruy belo e a lição da poesia PEDRO SERRA

A poesia de Ruy Belo é o lugar de uma impossível tanatologia. A sua poética, neste sentido, é consciente de não poder objectivar a «morte» como tema. No seu primeiro livro de poemas, Aquele Grande Rio Eufrates, lemos: «A morte é a grande palavra desse homem / não há outra que o diga a ele mesmo» 1 . O devir da escrita beliana faz-se deflectindo a transcendência aqui implicada, a de uma existência com uma enteléquia, ainda que niilista. No seu último livro de poemas volta a recorrer uma vez mais a mesma proposição, no último verso do poema «A fonte da Arte», escrito em Madrid a 24 de abril de 1977, e publicado no livro Despeço-me da Terra da Alegria: «O receio da morte é a fonte da arte»2. A «morte» é algo tão prosaico como um «receio», agora sem o pathos de um destino último. O tropo da «fonte», por outro lado, regressa exausto, já que, como vou argumentar ao longo desta secção, a poesia e poética de Ruy Belo se situam na posteridade de uma Poesia cuja demasiada consciência significa a su dissolução como «fonte». É talvez esta uma possível medida da poesia de Ruy Belo, que situa de modo Moderno – ecoando a conhecida lição hegeliana – a Arte como algo póstumo. Ao transportar o seu próprio cadáver, esta poesia é muito consciente da historicidade da forma poética. Digamos que, de tantas vezes levado à fonte, o cântaro se partiu. Proponho, pois, pensar a poesia de Ruy Belo em função da sua adscrição ao «romantismo», um vínculo que em tempos foy estabelecido por Joaquim Manuel Magalhães3. Dizer que a escrita de Ruy Belo tem 1

AGRE: 25. DTA: 620. 3 Cf. Magalhães, 1989: 147 e ss. Cf. Carlos, 2000: 259-260, que releva este lugar de Magalhães, num ensaio que, do meu ponto de vista, acaba por glosar o tópico. A 2

uma genealogia romântica é dizer que ela é poesia. A noção de «romantismo» desenvolvida por Joaquim Manuel Magalhães é muito afim do legado romântico – por exemplo wordsworthiano – lido como poética da natureza. Muito especificamente, esse seu «romantismo» assenta na ideia da poesia como fusão da consciência e do mundo. Na decantação nocional sobre que sustenta a sua poetologia – somando os operadores «romantismo» e «classicismo», num amplo gesto (eliotiano) de sincretismo de diferentes tempos estéticas – a tradição forte a que junta Ruy Belo é a de um «romantismo clássico» segundo o qual, num mundo de inalienáveis desequilíbrios, o único cânone de decorum é precisamente a poesia: Aqui reside o princípio pelo qual não há em Ruy Belo, nem nos poetas de cuja linha a sua poesia cresce, rompimento do decorum, do equilíbrio entre sentimento e mundo e palavra. Há, muito ao contrário, a busca de um equilíbrio novo, onde nem o mundo se sobrepusesse ao sentimento nem este ao mundo. Trata-se de uma tradição romântica onde a dinâmica entre o eu e as coisas buscava um pacto novo através de uma ruptura inicial: o equilíbrio clássico torna-se uma sobreposição a caminho da sabotagem excessiva do sentimento. Era necessário instaurar um diálogo renovado entre a alma e o quotidiano, entre o espírito e a materialidade da terra.4

sobredeterminação que nele tem o «símbolo» da árvore é disso sintomático. Digamos que, para Carlos, a obra de Belo não é um todo conceptual (ou conceptualizável – cf. ibid.: 267), retirando do «simbolismo» da árvore a organicidade. Por outras palavras, e seguindo os termos do ensaio, o pendor «romântico» acabaria por impor-se. O que assim se pressupõe é um quadro comunicativo em que uma imagem produz consenso entre a obra de um poeta, a sua produção crítica, a leitura de um «texto fundador» (cf. ibid.: 260) e as leituras subsequentes. O vínculo romântico foi também destacado por Fernando Guimarães: «É aqui que se faz sentir aquele envolvimento cultural a que atrás nos referimos, e que, na linha da grande tradição do Romantismo, exprimiria o próprio desígnio de comunicação a partir de um sujeito que, em tal acto de comunicação, se eleva da sua própria individualidade, o que faz com que, deste modo, se revele mais como uma forma de intersubjectividade do que de intertextualidade. Nos livros de Ruy Belo é bem visível esse convívio com várias vozes que poderão ser as de um Fernando Pessoa, as de um Dylan Thomas ou, sobretudo nos seus primeiros livros, as da Bíblia» (Guimarães, 1989: 96). Fernando Pinto do Amaral, por seu turno, fala de «fôlego neo-romântico de Ruy Belo» (cf. Amaral, 1991: 47). 4 Magalhães, 1989: 148.

A felicidade do «equilíbrio entre sentimento e mundo e palavra» é o organon de Magalhães. Pelos termos que enuncia, estar no mundo é ser poeta, ou melhor, só a este é possível transcender uma «existência» separada. Do meu ponto de vista, há que reconduzir a leitura «romântica» de Ruy Belo. Pensar o «romantismo» beliano, neste sentido, é um bom exemplo de como continua vigente a sua importância como «problema», segundo Paul De Man em «Wordsworth and Hölderlin», ensaio inicialmente publicado em alemão na revista Schweizer Monatshefte (1966), e em versão inglesa de Timothy Bahti em The Rethoric of Romanticism 5 . Diz-nos aí o seguinte: «o problema do romantismo continua a dominar outros problemas da historiografia e crítica literárias. O rasto dos pontos principais à volta dos quais orbitam os argumentos metodológicos e ideológicos contemporâneos pode quase sempre ser seguido até à herança romântica». 6 Pensar o «romantismo» beliano pressupõe, pois, não perder de vista como a sua poesia, enquanto reverberação do problema romântico, domina também ela «outros problemas de historiografia e crítica literária». Quer isto dizer que pensar o «romantismo» da poesia de Ruy Belo é pensar, igualmente, o lugar que ocupa numa história da poesia portuguesa contemporânea, indiscernível da questão do lugar da crítica literária nessa mesma história. Este argumento é suficiente, segundo creio, para fundamentar uma necessária revisão do «consenso» que existe em torno da importância da poética beliana durante as décadas de 80 e 90 da poesia portuguesa. Esse consenso não é a figura de algo resolvido, é o indício da procura de um tropo – por exemplo «Ruy Belo» – em que se reveja quem consensua. Este é talvez programa para umas obras de Santa Engrácia. Trato aqui de fazer apenas a prospecção da produtividade de um tal obrar: precisamente lendo Ruy Belo-cum-Joaquim Manuel Magalhães. Volto, então, ao autor de Um Pouco da Morte para exemplificar o que pretendo significar. Centro-me, muito concretamente, na leitura 5 6

De Man, 1984. Ibid.: 48.

do poema «Esplendor na Relva» que faz o autor dos importantes posfácios daquela que foi a primeira edição das obras completas de Ruy Belo7. Eis, em primeiro lugar, o poema em causa, publicado em Homem de Palavra[s], poemário de 1970, que se seguiu a Aquele Grande Rio Eufrates (1961), O Problema da Habitação (1962) e Boca Bilingue (1966). Trata-se de um soneto: Eu sei que deanie loomis não existe mas entre as mais essa mulher caminha e a sua evolução segue uma linha que à imaginação pura resiste A vida passa e em passar consiste e embora eu não tenha a que tinha ao começar há pouco esta minha evocação de deanie quem desiste na flor que dentro em breve há-de murchar? (e aquele que no auge a não olhar que saiba que passou e que jamais lhe será dado ver o que ela era) Mas em deanie prossegue a primavera e vejo que caminha entre as mais8

A referência cinematográfica ao conhecido filme de Elia Kazan cruza-se, em simultâneo, com o intertexto de Wordsworth. Eis, então, a leitura de Joaquim Manuel Magalhães, que parte justamente do carácter citacional do soneto beliano: Wordsworth é directamente invocado no título do poema 'Esplendor na Relva', ainda que esse título refira um filme de Elia Kazan, citando a ode wordsworthiana. A persistência, pela memória, do esplendor passado da vida, a resistência, pela criação, ao fluxo mortal da existência afirmam o esplendor da escrita em face da derrota do corpo e do impulso visionário natural. 'Em 7 8

Obra Poética, vols. 1 e 2, Lisboa, Presença, 1981; vol. 3 Lisboa, Presença, 1984. HP: 243.

deanie', isto é, na criatura da imaginação, no artefacto da arte, 'prossegue a primavera', isto é, combate-se a mortalidade do instante.9

Neste passo temos manifesta, fundamentalmente, a reverberação da poetologia afirmativa – i.e., que faz a superação do tempo alterizante, da História -, antes sumariada, e que é a que Joaquim Manuel Magalhães considera encarnar-se em Ruy Belo. Ou, bem vistas as coisas, em qualquer poeta que o seja: para Magalhães o ser poeta pressupõe uma sublimação antropológica, a poesia verdadeiramente não é história mas sim ontologia. Impõe-se explicar um pouco melhor o que pretendo significar com esta última descrição do labor crítico de Magalhães. Para tanto, faço um pequeno desvio, rementendo para um outro seu comentário, desta feita sobre um poema em prosa de Ruy Belo – pertencente ao conjunto «Imagens Vindas dos Dias» do livro Homem de Palavra[s] (1970). Intitula-se «A Pressão dos Mortos»: Fechas a mala do carro cheia de bagagem. E de súbito apercebes-te de que não é novo o gesto. Muitas vezes o viste já repetir. A muitas horas do dia, mas nunca como num fim de tarde. Qualquer que fosse a paisagem, a mesma paisagem: a terra calcinada, o canto das cigarras, o ar espesso do vapor a provocar a rarefacção das coisas vistas e a dar-lhes um ar de miragem. Fechase o tampo do caixão sobre a cara conhecida para todo o sempre. Nem se levanta o problema da eternidade. Esta terra é que tu amaste com todas as contrariedades e os problemas quotidianos. Amaste homens que por vezes talvez te tenham dado a cara e eram deliciosamente imperfeitos como tu. E tiveste de te despedir deles. Já não eram daqui. Já tinham problemas de mortos. Já se falava deles no imperfeito e não no presente. Mudou um simples tempo de verbo e tudo mudou. Um último olhar a essa caixa de mau gosto. Gostarias de atirar um torrão, como em criança, para esconjurar os maus sonhos. Mas falta-te a inocência. Decisivamente, tens de fechar com força a mala do carro. E pedes que te ponham os pneus à pressão 22. A pressão dos mortos.10

Abrevio a minha leitura do poema dizendo que a pressão do título alude também a este recurso do poema: a impressão do morto, a 9

Magalhães, 1989: 152. HP: 261.

10

inscrição do morto, a impossibilidade de escrever o morto. Aquilo que recorre pelo dito poema fá-lo por, digamos, uma afecção estética. Vejamos como Magalhães é afectado pelo poema: «Onde a irradiação da morte nos atinge, nesse livro, HP, com uma tristeza, um fulgor e uma violência mais centrais é no poema em prosa 'A pressão dos Mortos'. Mas esse tom dolorido não marca as outras aproximações da morte que povoam este livro»11. No juízo de Magalhães a «morte atinge» – tem uma «irradiação» – comportando-se o nomeado «Morte» como num enunciado do tipo «A morte existe»: aparentemente efeito do irradiado, é a comoção dita por «nos atinge» que ontologiza o irradiante. A pressão da Morte é figura daquele que é por ela pressionado, cujo acto é padecer a ilusão de um efeito. Tudo o mais, neste excerto de Magalhães, são reforços figurais dessa mesma figura: «livro», «tristeza», «fulgor», «violência» ou «poema em prosa». Ou, talvez melhor, o recalcamento dos mediadores de modo a dar algo como uma autonomia ao mediado. Eis a enunciação desta ideologia poética ou, se se quiser, poetologia: A poesia é sempre uma apropriação material, seja ou não de materialidades, mas também sempre através de instrumentos trans-materiais. A sua compreensão não pode, pois, confinar-se à análise dos meros planos de materialidade. Sem a inquietação do confronto com a enigmática qualidade da mediação não material, com poucos detritos de sentido ficaremos a não ser arestas linguísticas, bolores gramaticais, adivinhas contextuais. Elas fazem sentido, mas não fazem o sentido. O sentido do poema passa pela poesia, tinham nisso razão os românticos, na esteira de Platão.12

A poesia segundo Joaquim Manuel Magalhães, cuja teoria aqui uma vez mais se resume, é dita como «trans-materialidade material». Esta esteira platónica da lição de uma Poesia anterior ao Poema – um programa que também já foi enunciado assim: «A tarefa consiste em ver o enigma»13– produz um poeta – por exemplo Ruy Belo-cum-Joaquim Manuel 11

Magalhães, 1984: 234. Ibid.: 218. 13 Heidegger, 1991: 65. 12

Magalhães – como epifenómeno dela. Havendo «detritos» o Sentido está salvo: capitaliza neles o tensor dialéctico que permite instaurar um como que processo que os anula. A afinação de Belo por uma tal linhagem é sobejamente conhecida. De resto, uma das estratégias do lance crítico de Magalhães é precisamente convocar casos para, num segundo momento, fazer deles descaso. A aporética é, diríamos, também platónica, ou mimética, pois o que se visa é uma como que anagnórise do Poeta, aquele que não sofre de ou com as imitações. É aqui que a linhagem dos poetas não significa História, mas antes Ontologia. Um qualquer poeta epigoniza a inalienável agência que gera produtos não produzidos. Veja-se o seguinte exemplo: [O] diálogo com Jorge de Sena manifesta-se, mais concretamente ainda [antes convocara «Inês de Castro»], na concepção de poemas sobre objectos culturais (obras darte, cidades, artistas) que, na obra de Sena, se haviam tornado mais insistentes a partir de Metamorfoses e, em Ruy Belo, se acenturão também a partir de Boca Bilingue. Mas é fundamental referir como, à parte de uma ocasional preocupação temática homóloga, nenhuma espécie de similitude estilística ou processual epigoniza esse diálogo entre personalidades tão distintas. O mesmo se passando em relação à obra do poeta posterior, J. M. Fernandes Jorge.14

A diferencialidade irredutível do que aqui se chama estilo – coincidências são símiles, i.e., aparências insubstanciais – é equacionada por uma outra figura: a da «personalidade», onde de resto ainda podemos ler a lição de um Eliot15. Vai-se-nos dizendo qualquer coisa como que o estilo é o homem. O cerne é tautológico: «temas» afins desditos por «estilística» discreta, poetologia emancipando a forma do conteúdo, mas apenas para afirmar a veiculação dos conteúdos todos: a poesia 14

Magalhães, op. cit., II: 337. Lembremos o seguinte passo de «Tradition and Individual Talent», imediatamente depois de o poeta-crítico fazer a síntese da noção de poesia como uma fuga à expressão das emoções e da personalidade: «Mas, claro, apenas aqueles que têm personalidade e emoções sabem o que significa escapar destas coisas» (Eliot, 1969: 58). 15

transporta o homem e, por isso que é poeta, transporta um homem sublimado. Mas regressemos ao comentário de Magalhães sobre «Esplendor na Relva», o poema supra citado. Nele se exibem explicitamente uma série de operações de leitura significativas. Fundamentalmente extrai consequências da imagem de Deanie Loomis como «criatura da imaginação» e, como tal, símbolo da própria «arte», de uma arte precisamente simbólica. A poetologia de Magalhães distingue, ainda, duas temporalidades: uma que é «fluxo mortal», «derrota do corpo» ou «mortalidade do instante»; e uma outra que é a dos produtos da imaginação – a Arte – como «persistência» do vivido, como «resistência» à mortalidade e, ainda, como prossecução da «Primavera». Esta segunda temporalidade é decalcada da «Natureza», que produz idênticos e identidades de ontologia sem crise. O «passado» persiste no exercício euforizante da «memória», o acto de criação, conquanto decalcado do natural, é idêntico a si próprio. Assim, o «esplendor da escrita» é a expressão unívoca do «esplendor do passado», comutável com o «esplendor da relva», e traduzível pelo esplendor do «mundo». A escrita, neste sentido, é apenas um dos termos da unidade orgânica escrita/mundo. A imagem de Deanie Loomis, seguindo os implicados no argumento de Magalhães, tem «objecto correlativo»: seja o citado wordsworthiano, seja o citado filme, seja o «mundo» que simbolizam. São o essencial ontologizado, que em relação ao dito é um a priori inalienável. Nesta poetologia não há senão natureza, ou naturalizações, que um poema não pode senão representar naturalmente: a tradição poética – ou a história da poesia -, o poema ou o poeta, este último modulado por um «impulso visionário natural» como líamos mais acima. Mas voltemos a «Esplendor na Relva». A primeira quadra do soneto diz-nos da negação disso que é nomeado «deanie loomis», tanto do ponto de vista intelectivo: «Eu sei que deanie loomis não existe»; e ainda no que toca à faculdade imaginativa: «a sua evolução segue uma linha / que à imaginação pura resiste» (sublinhado meu). A primeira

quadra propõe-nos um objecto não mediado que seria precisamente «deanie loomis». Todavia, o que temos também é a sustentação de uma tensão imagética, jogada na outridade de Deanie Loomis em relação às faculdades intelectiva («não existe») e imaginativa («pura resiste») já aludidas, e o imperativo «referencial», representado pelos segundo e terceiro versos: «mas entre as mais essa mulher caminha / e a sua evolução segue uma linha». A adversativa introduz esse modo de inexistir – não mediado pela razão ou pela imaginação – e note-se como o deíctico «essa» e os verbos de movimento «caminha» e «segue», assim como o vocábulo «mulher», instauram uma como que redundância que força a (paradoxal) sugestão de uma mediação sensível do que quer que seja denominado por «deanie loomis». O efeito é, ainda, intensificado por um segmento importante do segundo verso: «entre as mais». Sugerese, pois, uma equivalência ontológica entre «as mais [mulheres]» e «mulher», uma como que contiguidade de loci: o das «existentes» e o de «deanie loomis [que] não existe». O argumento de Joaquim Manuel Magalhães, «Deanie Loomis como símbolo da Arte», vale-se desta contiguidade ontológica, ou aferida em termos ontológicos. O «equilíbrio entre sentimento e mundo e palavra», o seu organon poético como vimos, necessita que «mundo» e «linguagem» sejam existentes independentes mas que se comportem da mesma maneira. O «esplendor da escrita» é o «esplendor na relva» do mesmo modo que «Deanie Loomis» é, ontologicamente, também como «as mais mulheres». Daí que para Joaquim Manuel Magalhães este poema seja algo como o regresso dos deuses (ou deusa) ao convívio dos homens (ou mulheres). Ora bem, vejamos um pouco melhor em que consiste a tensão a que aludi. Digamos que poderíamos reduzi-la aos seguintes dois enunciados. Por um lado, o poema afirma que «Deanie Loomis não existe» e, por outro, que «Deanie Loomis existe». Repare-se que necessitamos apenas o primeiro verso para subtrair uma contradição: nele um predicado de não existência predica um nome – «Deanie Loomis» – que é (afirmativamente) nomeado. Que nos afirma a negação? O segundo enunciado, neste sentido, propõe duas

redundâncias: o predicado predica a existência do que já de si é nome. Digamos que o saldo de tudo isto é podermos dizer «Deanie Loomis» é «Deanie Loomis», sendo que para existir lhe baste com ser nome. «Deanie Loomis» não é vazio do mesmo modo que o não é o facto de sobre ela se dizer «caminhar». O segundo verso pode desdobrar-se, também, em dois enunciados: «Deanie Loomis caminha» e «As mais caminham». Deanie Loomis não poderá não caminhar sem haver nisso contradição; mas «As mais» sim, pois sendo «as mais» sempre poderá haver as que caminham e as que não. Ora, do meu ponto de vista, o que daqui se extrai é que «As mais caminham» significam não ser vazio o «caminhar», o «caminhar» de Deanie Loomis. Voltarei a este segundo verso, verdadeiramente importante pois com ele se conclui o poema, ainda que introduzindo uma reveladora variante. Todavia, antes ainda, gostaria de chamar a atenção para o facto de a leitura de Joaquim Manuel Magalhães prescindir de grande parte do poema. A segunda quadra não é sequer implicada na sua exegese. O mesmo acontece com o primeiro terceto e o primeiro verso do segundo terceto. Na verdade, o que de mais interessante, do meu ponto de vista, acontece no poema é passado completamente por alto. Trata-se de um «soneto», como não deixei de dar conta. Forma «clássica», como sabemos, precisamente pelo decorum, pela «harmonia» nela investida pelos seus cultores históricos. A equação, tematicamente estabelecida por Magalhães, entre «Deanie Loomis» e «artefacto de arte», poderia ser a deste mesmo soneto como forma natural que, enquanto tal, pode ser lido como lugar da reciprocidade decorosa dos termos dessa equação. Para Magalhães, «Deanie Loomis» existe como objecto natural, isto é, como artefacto da arte ou poema. Assim, «Deanie Loomis», «artefacto da arte» ou «poema» são literalmente tais objectos. Mais do que uma forma «decorosa» ou a prática de um decorum formal, o que neste soneto temos – e noutros de Ruy Belo, de resto – é a figura do «indecoroso». Comparecerá nele, como implicitamente lemos em Magalhães, o equilíbrio entre «sentimento», «mundo» e «palavra»? Tal comparência, convenhamos, seria qualquer coisa como a sua

consideração de «objecto» que não fosse coisa feita. Valho-me, aqui, de uma proposição beliana para contraditar esta felicidade: «a perfeição [tamanha perfeição] é coisa de mortos»16. Na verdade, é ainda o próprio Ruy Belo que dediz tal equilíbrio. A prática do soneto, para o autor de Boca Bilingue, pode ser indexada ao carácter recursivo das formas da cultura literária. Por outras palavras, o soneto é em Ruy Belo uma das suas «incorrigíveis alusões culturais»17. Recorro, neste sentido, a um passo do posfácio à segunda edição de Aquele Grande Rio Eufrates: «Se, por exemplo, só no seu terceiro livro o soneto surgiu, foi porque não conseguiu resistir por mais tempo à irresistível tentação dessa forma quem, durante nada menos que uns longos quinze anos, a praticou com o carácter oculto e obstinado de um vício»18. Este tropo do vício se alguma coisa nos devolve é o ciclo vicioso do retorno das formas da tradição cultural, que despojam o dictum poético de uma agência expressiva unitária. O imperativo da alusão cultural em Ruy Belo é concomitante com a sua ampliação do depósito de formas canonizadas do ethos modernista, em cuja posteridade o poeta se situa. Penso que essa posteridade pode ser dita pelo convívio apaziguado com a recursividade «cultural» do poético, franca redução da língua modernista enquanto geração de monumentos únicos agenciados por estilos e indivíduos únicos. Como conciliar a teoria (alto-modernista) de um sujeito soberano e que soberanamente comanda o processo de criação para produzir originais com a teoria das «incorrigíveis alusões culturais»? Conviver apaziguadamente com a recursividade «cultural» do poético é chegar à funcionalidade social do poema: e para esta – isto é, para que o social seja representado no poema – basta que o poema seja um poema – e não outra coisa –, basta que um soneto seja apenas um soneto. Por conseguinte, a ideia da imposição de uma forma como o soneto só aparentemente assiste à sua des-historização (ou seja: pelo 16

AGRE: 21. Ibid.: 15. 18 Ibid.: 19-20. 17

facto de se impor, não é nem mais nem menos necessário). Se lermos este assim nomeado soneto de Ruy Belo, vemos que o que faz é precisamente negar a sua naturalidade e, por sinédoque, a naturalização da tradição das formas. Isto porque derroga diferentes essenciais dessa tradição lírica. Um deles é, muito significativamente, o dogma de uma unidade «psicológica» que organizasse ou unificasse o poema. O sujeito lírico introduz a consciência de si próprio como outro, a outridade como essa consciência, concretamente na segunda quadra: «embora eu não tenha a [vida] que tinha / ao começar há pouco esta minha / evocação de deanie». Note-se, em primeiro lugar, como Ruy Belo centra o desenvolvimento do poema no próprio acto da escrita. O eu lírico encontra-se, neste sentido, enredado na impossibilidade de fazer coincidir o momento da escrita do poema com a sua temporalidade enquanto sujeito. O sujeito diz-se não idêntico a si próprio precisamente como escrevente, que parte de um acontecimento «singular» que é o «começar» uma evocação, ou «começar» a escrever um soneto. Ora é precisamente neste momento singular que a imposição do «soneto» como retorno da tradição naturalizada se historiza: este soneto não repete o soneto como lugar comum da tradição – a tradição como lugar comum repete o soneto como diferença, vota-o à diferença precisamente porque o subjectiva. Esta sobredeterminação do subjectivo sobre o objectivo mais não significa que o «soneto» da tradição não comparece neste soneto. Nega, precisamente, essa forma como permanência ou fundamento (poético). Na verdade, e se voltarmos às reflexões de Ruy Belo sobre a sua prática oculta do soneto, o que aí podemos ler é a exautoração dessa forma como essencial poético. A irresistibilidade da «tentação» do soneto devolve-nos não tanto a imposição de um fundamento poético como um poético cujas formas exaustas podem ser revistas como formas históricas. Como o filme de Elia Kazan ou o poema de Wordsworth, o soneto, em «Esplendor na Relva», é uma citação que lhe derroga a organicidade. De resto, esta derrogação, na obra poética de Ruy Belo, toma dois caminhos produtivos: i) a comutação da própria forma

«poema» em favor da forma «livro», como propõe Osvaldo Manuel Silvestre 19 ; ii) a comutação de uma cânone poético dominado pelo poema curto em favor do poema longo. Poetar, segundo Ruy Belo, é coisa de seres tardios: «viemos tarde e a poesia é velha»20. Tudo isto, evidentemente, tem consequências para a leitura da imagem de «Deanie Loomis». Argumentava anteriormente que, seguindo a interpretação de Joaquim Manuel Magalhães, «Deanie Loomis» seria um símbolo, a Arte como natureza ou identidade consigo mesmo. Esta leitura passa pelo seguinte juízo enunciado pelo crítico: «Em Deanie, isto é, na criatura da imaginação, no artefacto da arte». Note-se como utiliza a preposição «em» sugerindo tanto «Deanie» como «artefacto da arte» como lugares (ontologicamente) estáveis. Mais ainda, poderíamos reescrever o que nos propõe inferindo a seguinte série de enunciados: «Deanie Loomis é a Arte», «Deanie Loomis é Deanie Loomis» ou «A Arte é a Arte». A redundância da série provém do facto de a mesmidade que significam os nomes «Deanie Loomis» e «Arte» ser concebida, por Magalhães, como uma mesmidade de objectos (extralinguísticos e extra-mentais): Deanie Loomis e Arte. A factualidade subjacente é o que provoca o carácter supérfluo do que diz, superfluidade que aqui entendo comutável com o facto de ser a crítica, para o autor de Um Pouco da Morte, «rima pobre». Seja qual for o objecto «natural» pressuposto pela imagem de Deanie Loomis tal como Magalhães a concebe – penso sobretudo numa tradição poética como natureza, ou cuja existência é predicada de objectos – o que como já disse este modo de a ler pressupõe é a prioridade do objecto natural sobre a imagem. Estou a seguir aqui o importante ensaio de Paul De Man intitulado «Intentional Structure of the Romantic Image», igualmente incluído em The Rhetoric of Romanticism21 . Partindo de um muito conhecido lugar da poesia de 19

Cf. Silvestre, 1997: 10-11. Do poema «No Túmulo de Sardanapalo», O Problema da Habitação – Alguns Aspectos: 113. 21 De Man, 1984: 1-17. 20

Hölderlin – «Worte, wie Blumen, entstehn», de «Brot und Wein» -, De Man mostra como o modo como a natureza «origina» não coincide com o modo como o faz a palavra. Lemos, precisamente, sobre as imagens que dizem essa coincidência: Este tipo de imagens fundamenta-se na primazia ontológica intrínseca do objecto, e o seu crescimento e desenvolvimento encontram-se determinados por esta propensão. Vimos que este movimento é essencialmente paradoxal e está condenado de antemão ao fracasso. Podem existir flores que ‘são’ e palavras poéticas que ‘originam’, mas não palavras poéticas que ‘originem’ como se ‘fossem’.22

Para Magalhães uma Deanie Loomis como «criatura da imaginação» pressupõe, nos seus atributos de «persistência», «resistência» e «prossegu[imento] da Primavera», o ter sido gerada como objecto natural. Pressupõe uma Arte, uma palavra, que origine como a Natureza. Esta Poesia que originasse como a Natureza, todavia, esquece o seguinte: Está na essência da linguagem o ser capaz de originar, mas nunca o ser capaz de alcançar uma absoluta identidade consigo própria como a que existe no objecto natural. A linguagem poética não pode senão originar de novo uma e outra vez; é sempre constitutiva, capaz de apresentar independentemente da presença mas, pelo mesmo motivo, incapaz de fundamentar o que apresenta a não ser como um desejo da consciência.23

«Deanie Loomis», para Magalhães, seria esse idêntico a si próprio: o «artefacto da Arte» como essência, ou o «esplendor da escrita» indistinguível do «esplendor da relva». Joaquim Manuel Magalhães regressando ao real e ao coração – e a implicação de Ruy Belo nesse regresso – é, assim, e efectivamente, realista: existentes que independem, prioridade ontológica da realidade extra-mental e extralinguística, sendo que real e linguagem são estruturalmente «uns». 22 23

Ibid.: 7. Ibid.: 6.

A Natureza é convocada no poema em «Mas em deanie prossegue a primavera» e, ainda antes deste penúltimo verso do segundo terceto, no primeiro verso do primeiro terceto, que continua uma frase iniciada na segunda quadra: «quem desiste // na flor que dentro em breve há-de murchar?» O antecedente imediato é a «evocação de deanie», e esta contiguidade acrescentada à referência ulterior à «primavera» contribui para a assimilação de «deanie» à própria «flor». Esta assimilação é ainda reforçada nos versos entre parênteses: «(e aquele que no auge a não olhar / que saiba que passou e que jamais / lhe será dado ver o que ela era)». Este «ela» que acabo de sublinhar tanto pode remeter para «Deanie Loomis» como para a «flor». A indeterminação deíctica destes versos, por outro lado, afecta também o «aquele que no auge», em que de resto «no auge» tanto pode ser atributo do «aquele» como de «Deanie Loomis» como da «flor». Este «auge», por outro lado, refere também indeterminadamente. Tanto pode aludir ao «momento» de iminência do fim da «flor» como à condição mutável do sujeito que lemos na segunda quadra. E, já agora, o «aquele» tanto pode remeter para o sujeito como, com alguma latitude, para um leitor, por exemplo Joaquim Manuel Magalhães ou eu próprio. Ou, ainda, o próprio Ruy Belo como leitor do seu poema. Efectivamente, o poeta teceu umas muitas breves mas fundamentais considerações, que vão mediar a partir daqui a leitura do soneto. São elas as seguintes: É de notar que, em Esplendor na Relva, se recolhe o momento preciso em que Natalie Wood, actriz maravilhosa, que no filme encarna a delicada e fresca figura de Deanie Loomis, muito bem dirigida por Elia Kazan, procura em vão comentar numa aula um excerto de um poema de Wordsworth sobre a fugacidade da vida e a necessidade, como condição de felicidade, de colher a flor no próprio instante em que floresce.24

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HP: 188.

Em primeiro lugar, refira-se que esta reflexão nos reconduz a leitura para um outro cenário da poesia: a sala de aula, a lição de poesia, o comentário da poesia; sem anular, obviamente, a cena da escrita antes aludida, dada por um sujeito poemático auto-consciente do acto evocativo e da temporalidade que rompe a unidade da evocação. O importante deste novo cenário de leitura que o comentário do próprio Ruy Belo nos propõe é não tanto o conteúdo eudemonista do carpe diem wordsworthiano, mas sim uma actriz a representar uma personagem acometida pela vacuidade de comentar numa aula o excerto de um poema. Dir-se-ia que uma dialéctica negativa insuflaria este cenário. A «felicidade» ensinada pelo poema é contraditada pela inconsequência da sua mediação pelo comentário na aula. De algum modo, o soneto de Ruy Belo coloca-nos perante a repetição dessa cena de uma Deanie Loomis a tentar, em vão, comentar um poema de Wordsworth. Joaquim Manuel Magalhães parece superar essa vacuidade. Será, digamos, um aluno avantajado, um aluno situado «no auge», como no diz o próprio poema. Magalhães olhou e viu: o poema como a afirmação do «esplendor da escrita», da Arte como negação da negatividade temporal alterizante. O splendore, o brilho intenso, o fulgor intenso impõe-se a um ver que fosse sensível. Fora da História – porque a negaria – esse ver não tem lugar, nem tempo, nem enunciação, nem intertexto. A Arte já não é um tropo do póstumo, mas uma comparência, uma presença no poema. Magalhães não apenas parece ver «Deanie Loomis» como aparenta ver como «Deanie Loomis», «delicada e fresca figura». Todavia, o meu argumento é o de que Magalhães diz ver aquilo que o próprio poema nos representa como não sendo visível. Poema sobre o ver, é, neste sentido, um poema sobre os limites do dar a ver a poesia. É o próprio Ruy Belo quem no-lo diz: Deanie Loomis procura em vão comentar numa aula um excerto de um poema de Wordsworth. Voltemos uma vez mais ao soneto. O «auge» que há que «olhar» – e muito possivelmente lugar de onde há que «olhar» – é o irrepresentável momento em que florescer e murchar são comutáveis, o «instante» que,

e sigo o próprio Magalhães, tem como atributo a «mortalidade». No soneto temos esse «instante» dado por a «flor que dentro em breve há-de murchar»; na leitura de Ruy Belo antes referida, por seu turno, temos implicado esse «instante» no passo «colher a flor no próprio instante em que floresce». Note-se como a ontologia da «flor» aqui suposta é desinvestida de qualquer rasgo de estabilidade. Postular a «mortalidade» da «flor» – ou da Natureza – é entendê-la também como história, é desnaturalizá-la. Se, como objecto natural, essa «flor» se dilui como forma estável, então não pode ser representada, nem sustentar qualquer prioridade ontológica sobre a «palavra». É como uma palavra, isto é, é originada a partir do nada, e à qual está vedada a permanência. Tudo isto tem muito pouco a ver com a Natureza – que se estruturasse como «equilíbrio entre sentimento e mundo e palavra» –, ou com uma poética de algo como o «impulso visionário natural», e muito com uma poetologia muito consciente das suas «incorrigíveis alusões culturais». A precessão não é a da Natureza mas sim a da Arte. No prefácio de Transporte no Tempo (1973) diz-nos Ruy Belo: «Dou palavras um pouco como as árvores dão frutos, embora de uma forma pouco natural e até anti-natural porquanto, sendo como o é a poesia uma forma de cultura, representa uma alteração, um desvio e até uma violência exercidos sobre a natureza»25. A exaustão do «mundo» e da própria «arte» estão em «Esplendor na Relva» no primeiro verso da primeira quadra: «A vida passa e em passar consiste», verso cuja redundância, regime aforístico e literalidade nos devolve a mortalidade como metáfora da «vida», e isso a que chamamos «vida» como figura do processo estagnado de metaforização. Não admira, pois, uma «chave de ouro» cujo pathos é deflectido pelo facto de ser a repetição do segundo verso da primeira quadra, ainda que com uma significativa variante: «e vejo que caminha entre as mais». Vimos antes como a irrupção de um sujeito poemático que não projecta sobre o poema uma qualquer unidade psicológica se faz, precisamente 25

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pela sua auto-assunção como sujeito escrevente. Não é o único caso de ruptura da representação lírica na poesia de Ruy Belo. Esse sujeito sempre outro – i.e., mortal – é uma dimensão da temporalidade do «poema», processo alterizante que não acaba por coincidir consigo mesmo. Como entender, então, esta «chave de ouro»? Precisamente, ela não é o lugar de consumação do imperativo autotélico que fizesse valer esse lugar final como lugar de fechamento do poema. O que a «chave de ouro» faz é repetir como diferença um impossível início, implodido num impossível fim26. O verso «e vejo que caminha entre as mais» diz-nos de uma «imagem» – Deanie Loomis – que, estando aquém ou além da representação, ainda assim tem uma tradução estética. É visível, ainda que não seja referível nem tenha origem no mundo da «vida». O visto que diz ver é que a imagem – Deanie Loomis – existe sem objecto correlativo. É mediação pura. Vê, no fundo, que a imagem é imagem, transporte da não existência do objecto. A imagética é pós-romântica na medida em que, enquanto imagem, Loomis não estimula um incompletude que produza representação 27 . A primavera de Deanie Loomis é a (im)possível representação da mortalidade, sendo esta a condição de toda a representação. Dizer da morte existir ou não existir é conceber essa existência não por ontologia mas por propriedade do dizêlo. E o mesmo vale para «Deanie Loomis», para um «artefacto de arte» ou «Um simples cão que era e já não é»28: a Morte existe enquanto exista Gramática.

26 Como linguagem a que é impossível auto-fundamentar-se, apenas resta a repetição da necessidade de fundamentar-se: «a linguagem representa e a linguagem significa (uma vez que formula) mas a linguagem não pode representar o significado; apenas o pode reiterar (ou reflectir) na sua reconfirmada falsidade» (De Man, 1984: 118-119). 27 Deanie Loomis é imagem da morte, neste sentido, por excesso de semelhança. 28 Ibid.: 340.

BIBLIOGRAFIA BELO, Ruy, (1981) Obra Poética, org. J. M. Magalhães, vols. I e II, 1ª ed., Lisboa, Editorial Presença. (2001) Obra Poética, Lisboa, Assírio & Alvim. DE MAN, Paul, (1984) The Rhetoric of Romanticism, New York, Columbia University Press. MAGALHÃES, Joaquim Manuel, (1989) «Ruy Belo», in Um Pouco da Morte, Lisboa, Presença, pp. 145174. Reproduz os dois posfácios publicados pelo autor em Belo, 1981. SILVESTRE, Osvaldo Manuel, (1997) «Introdução» in Ruy Belo, Boca Bilingue, Lisboa, Editorial Presença, pp. 7-20.

In Um Nome Para Isto. Leituras da Poesia de Ruy Belo, Coimbra, Angelus Novus, 2003, pp. 104-118. Parcialmente publicado, em inglês, com o título “Splendour in the Grass. Ruy Belo and the Poetry Lesson”, Portuguese Literary & Cultural Studies, vol. 7, University of Massachussets Dartmouth, 2008, pp. 17-27.

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