Estudo de Caso IP Pampa Gaúcho da Campanha Meridional, IP Região do Cerrado Mineiro e IP Vale do Sinos

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CAPÍTULO 10

Estudo de Caso: IP Pampa Gaúcho da Campanha Meridional, IP Região do Cerrado Mineiro e IP Vale do Sinos Delphine Vitrolles Claire Marie Thuillier Cerdan Kelly Lissandra Bruch

Estudo de Caso IP Pampa Gaúcho da Campanha Meridional, IP Região do Cerrado Mineiro e IP Vale do Sinos

Neste capítulo, você irá conhecer melhor as Indicações de Procedência Pampa Gaúcho da Campanha Meridional, Região do Cerrado Mineiro e do Vale do Sinos. Neste contexto, o objetivo deste capítulo é mostrar como foi o processo de reconhecimento destas IP, desde a organização dos produtores até o regulamento de uso e o controle, bem como o registro e a situação atual. E também identificar o impacto socioeconômico e ambiental do reconhecimento dessas indicações para os produtores e para a comunidade local. Assim, esperamos que você possa fazer excelente uso deste material de forma que ele contribua para o aprimoramento de seus conhecimentos e formação. Sejam bem-vindos e bom estudo!

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10.1 IP Pampa Gaúcho da Campanha Meridional 10.1.1 Identificação da região e do produto Na Argentina e no sul do Brasil, “a famosa carne do pampa veio de fora, um dia, há cinco séculos, as vacas chegaram, elas se aclimataram, raças crioulas foram formadas, os produtores desenvolveram seu saber-fazer, a qualidade das forragens contribuiu… um produto típico então nasceu…”(Muchnik, 2002). Para melhor responder aos mercados, os criadores brasileiros introduziram no sul do Brasil, raças britânicas, no final do século XIX, que se adaptaram aos campos naturais do pampa (Felippi, 2001). Formado por vastas planícies, o Pampa corresponde, no Brasil, à metade sul do Estado do Rio Grande do Sul e abrange cerca de 157.000 km2. Os campos do Pampa, reconhecidos pela riqueza da sua biodiversidade, abrigam um grande número de espécies muitas vezes endêmicas, com aproximadamente 450 gramíneas, 150 leguminosas, 70 espécies de cactos, 385 pássaros e 90 mamíferos (Nabinger, 2007). Observa-se também, uma rara associação de espécies de inverno e de verão, mas com predominância dessas últimas, dependendo do manejo. De acordo com Nabinger (2007) “é essa dieta altamente diversificada que confere características particulares ao produto animal”. Sobre a base de tal riqueza biológica, essa região é reconhecida como região destinada à engorda do gado bovino a base de pastagem, na qual se associa a qualidade da carne à originalidade do sistema de produção. Além disso, não se pode compreender o Pampa sem a cultura gaúcha, que se construiu em torno de um modo de vida e em um ambiente voltados para a criação de bovinos e de cavalos. Os Gaúchos formam um grupo social e cultural específico no Brasil (Avila, 2005). A pecuária condiciona cada aspecto da vida cotidiana dos Gaúchos: suas vestes (bombachas, calças largas abotoadas no tornozelo), seus jogos, sua comida baseada numa maneira específica de preparar a carne (churrasco) e de conservá-la (charque, carne seca ao sol e conservada com sal).

CAPÍTULO 10

A ideia de implementar uma indicação geográfica para a carne do Rio Grande do Sul surgiu, em 2003, em Brasília, durante um colóquio internacional sobre a valorização de produtos com diferencial de qualidade e identidade: indicações geográficas e certificações para competitividade nos negócios1. Depois desse evento, algumas instituições do Rio Grande do Sul organizaram uma reunião para apresentar aos empresários e produtores rurais o conceito de IG e avaliar quais seriam as regiões e os produtos e/ou serviços potenciais do Estado que se enquadrariam como in-

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dicação geográfica. Foram sugeridos os Doces de Pelotas, a região Serrana para a indústria moveleira e também, a região do Pampa para a pecuária de corte. Cabe salientar que o primeiro movimento de valorização da carne do sul do Brasil, surgiu em 2000, apoiado pelo “Programa Juntos para Competir”, uma parceria do Sebrae/RS, a Farsul, e o Senar/RS. Esse programa buscava organizar e aprimorar as cadeias produtivas do setor agropecuário no Rio Grande do Sul, trabalhando com a bovinocultura de corte, suinocultura, ovinocultura, caprinocultura, fruticultura, floricultura, vitivinicultura, apicultura e com a cana-de-açúcar e seus derivados. Conheça mais as instituições envolvidas no Programa Juntos para Competir. http://www.sebrae.com.br/ http://www.farsul.org.br/ http://www.senar.org.br/ Acesso realizado em 16 abr. 2014.

Nesse programa, os pecuaristas gaúchos, em parceria com os frigoríficos e o SICADERGS (Sindicado da Indústria de Carnes e Derivados do Rio Grande do Sul), procuraram diferenciar os seus produtos nos mercados nacionais e internacionais, dos produtores de carne de zebu (CentroOeste e região pré-Amazônica). Eles criaram a marca South Brazilian Beef com objetivo de divulgar a carne de animais criados nos campos gaúchos, bem como buscar novos importadores e impulsionar a exportação. Um diagnóstico dos sistemas de produção também foi realizado e apontou a importância da pecuária de corte no sul do Estado: em 2005, a região da Campanha representava 20% do gado bovino abatido. Entretanto, destacou-se também a falta de competitividade da cadeia produtiva nos mercados nacionais e internacionais. Nesse sentido, a IG foi pensada como uma estratégia de marketing para a cadeia produtiva da carne no Sul. Com a marca South Brazilian Beef, a IG poderia diferenciar o produto no mercado, valorizando qualidade e origem.

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10.1.2 Formação da associação Apropampa Uma vez identificados a região e o produto potencial, os parceiros do projeto seguirem para a organização dos produtores e dos atores da cadeia produtiva. Em março de 2005, foi feita a ATA de constituição da Apropampa. Esta associação é constituída por seis órgãos sociais: Assembléia Geral, Conselho de Administração, Conselho Fiscal, Diretoria Executiva, Conselho Técnico e de Pesquisa, e Conselho Regulador de Indicação Geográfica. Pode associar-se à entidade qualquer pessoa física ou jurídica que tenha uma atividade de produção, industrialização, comercialização, e correlatas com a pecuária de corte. No início, 15 produtores constituíram a Apropampa. Além desses, associou-se um único frigorífico, o Mercosul, que tinha uma unidade em Bagé, bem como membros das associações de Raça Angus e Hereford e técnicos da Embrapa. Em 2008, 55 produtores estavam associados. Saiba mais sobre o frigorífico Mercosul. http://www.frigorificomercosul.com.br/ Acesso realizado em 16 abr. 2014.

10.1.3 Comprovação da notoriedade ou levantamento histórico-cultural

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A comprovação da notoriedade do produto foi realizada por uma historiadora da UFRGS, que buscou elementos comprobatórios da importância histórica e econômica da pecuária e da produção de carne na região, da sua notoriedade e das qualidades ligadas à cultura gaúcha (modo de viver e alimentação). A pesquisadora considerou um amplo período da história, começando com a introdução do gado pelos Jesuítas, em 1632, até a chegada dos primeiros touros Angus e Hereford, inscritos no livro genealógico das raças no início do século XX, usando várias fontes (relatos de viajantes, estudos de sociólogos, geógrafos e historiadores), dados estatísticos, literatura (romances, contos, memórias e poesias).

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Esse amplo trabalho confirmou a importância econômica e social do gado e da produção de carne no Estado, destacando diferentes ciclos econômicos: ciclo do couro, ciclo do charque e ciclo da carne ou dos frigoríficos. Conforme as fontes escritas ou orais recolhidas, a região Sul do Estado do Rio Grande do Sul tornou-se, ao longo do tempo, historicamente, uma região de terminação do gado2. Os resultados desse trabalho foram resumidos num relatório intitulado “Elementos Comprobatórios do reconhecimento do Pampa Gaúcho da Campanha Meridional como indicação de procedência do produto carne e seus derivados”3. Ele foi anexado ao pedido de reconhecimento apresentado no INPI.

10.1.4 Delimitação física da área de produção A delimitação da área geográfica de IG contou com pesquisadores da UFRGS, Embrapa, Membros e técnicos da Farsul e Sebrae e foi realizada em várias etapas. Num primeiro momento, partiu-se do levantamento histórico-cultural para identificar as regiões de maior importância histórica e/ou de forte notoriedade. Esse primeiro trabalho permitiu escolher a região da Campanha, identificada historicamente como uma região de terminação de gado, no Estado de Rio Grande do Sul: “tendo em vista o reconhecimento pelo mercado, da tradição e qualidade da produção de carne bovina da região da Campanha do RS, mais precisamente, da Campanha Meridional”.4 Num segundo momento, três critérios agronômicos foram considerados como determinantes para a delimitação da área: os tipos de solos, a qualidade dos campos (campos limpos) e a composição florística favorável à terminação de gado. O objetivo era de identificar municípios com características homogêneas na região da Campanha. Identificou-se 11 tipos de solos com distintas composições florísticas favoráveis para o desempenho animal. Quando não conseguiam encontrar a descrição florística na literatura, a equipe verificava no campo (foram percorridos 3.000 km). Isso foi primordial porque certas regiões avaliadas positivamente não corresponderam aos critérios e ficaram fora da zona. Hoje, 13 municípios inteiros ou parcialmente (Figura 9.1) constituem a área delimitada da IP, entre eles estão: Herval, Pinheiro Machado, Pedras Altas, Candiota, Hulha Negra, Bagé, Ácegua, Dom Pedrito, Santana do

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Livramento, Lavras do Sul e São Gabriel. Esses municípios situam- se na região sudoeste do Estado do Rio Grande do Sul, na fronteira com o Uruguai, entre os paralelos 30° e 32°30’ Sul e os meridianos 56°30’ e 54°30’ Oeste de Greenwich, ocupando uma área aproximada de 12.000 km2 (Figura 10.1). Assim, a área geográfica Pampa Gaúcho da Campanha Meridional não foi delimitada apenas pelos limites administrativos dos municípios envolvidos, mas, principalmente, pelo conjunto de características que envolvem o clima, o solo e a vegetação.

Figura 10.1 - Limites da área delimitada de produção da IP do Pampa Gaúcho da Campanha Meridional - Fonte: http://www.carnedopampagaucho.com.br - Acesso realizado em 16 abr. 2014.

10.1.5 Elaboração do Regulamento de Uso O regulamento de uso da IP caracteriza o produto e garante a sua qualidade. Ele também implementa métodos de verificação e controle. Chamado de regulamento técnico pelos próprios usuários, ele estabelece as regras que todos os produtores, localizados na área delimitada, deverão seguir para que tenham direito ao uso da IP.

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Neste caso, o regulamento de uso define a delimitação da área de produção, as raças autorizadas, a alimentação autorizada, a rastreabilidade, a carência de permanência dos animais na região e as características dos animais.

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A questão da raça ou o uso único e exclusivo das raças Angus e Hereford ou cruzas entre elas Nas discussões, as raças de gado foram consideradas relevantes. De fato, surgiu a ideia de que seria mais interessante trabalhar com gado britânico. O levantamento histórico comprovou a anterioridade da introdução do gado Angus e do gado Hereford, no início do século XX, na Campanha Meridional5. Entretanto, no decorrer dessas últimas décadas, ocorreu introdução e experimentação de outras raças de bovinos. Por isso, constata-se que hoje, as raças europeias puras não representam 10% do rebanho bovino riograndense. Dentro desses 9.8%, as raças Angus e Hereford são majoritárias, com cerca de 70% das raças puras (Tabela 10.1).

Composição do rebanho de gado de corte do Rio Grande do Sul. Composição do rebanho (%)

Raças (%) Raças puras

9,8

Angus

Hereford

Devon

Charolês

Nelore

49,1

18,2

9,1

9,1

7,3

Cruzamentos entre raças européias 10,2

44,8

Angus x Hereford

Angus x Charolês

Charolês x Hereford

Angus x Hereford x Charolês e outros

Cruzamento entre raças européias e zebu Mais de 30 cruzamentos identificados

35,2 Gado comum sem raça determinada Tabela 10.1 - Fonte: Adaptado de UFRGS (2003)

A questão da pureza das raças foi objeto de muitas discussões durante a elaboração do Regulamento de Uso. Finalmente, foi apontada que “a tradição do criatório regional sempre deu preferência às raças Hereford e Angus, que constituem uma marca associada à paisagem regional e que estão intrinsecamente associadas à qualidade do produto” 6. Enfim, o regulamento de uso da APROPAMPA indica que o gado da Indicação de Procedência “Pampa Gaúcho da Campanha Meridional” deve proceder, única e exclusivamente, das raças Angus e Hereford ou cruzas entre elas.

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Para saber mais sobre os programas de certificação das raças Angus e Hereford, que não se confundem com a IP Pampa Gaúcho da Campanha Meridional, consulte os sites das associações das raças Angus e Hereford. http://www.angus.org.br http://www.hereford.com.br/?bW9kdWxvPTEwJm1lbnU9MjQmYXJxdW l2bz1jb250ZXVkby5waHA Acesso realizado em 16 abr. 2014.

• A permanência dos animais por, no mínimo, um ano, na região delimitada e alimentação autorizada A região tornou-se, historicamente, uma área de terminação do gado “pela qualidade botânica de seus campos”7. O regulamento de uso especifica e permite a entrada de animais de fora da região, mas exige uma permanência dos animais por, no mínimo, 12 meses na área delimitada. Esse ponto relaciona-se tanto com a questão da própria história da região como a alimentação dos animais e a especificidade da carne. Ela também destaca a importância da interação raça-dieta animal como determinador da diferenciação dessa carne. A dieta deveria naturalmente “ser diferenciada por atributos regionais naturais e a pastagem natural da região apresenta características para tal” 8. Por isso, a alimentação dos animais para a IG deveria ser exclusivamente proveniente da pastagem nativa. O regulamento de uso aceita, porém, respeito à alimentação, que as pastagens nativas tenham sido submetidas a “melhoramento” por correção da fertilidade do solo (pastagens nativas melhoradas) e sobre-semeadura de espécies forrageiras de inverno (pastagens cultivadas de inverno), nativas ou exóticas. No último ano, antes do abate do animal, foi proibido o uso de pastagens cultivadas de verão e suplementação alimentar com grãos.

Para conhecer melhor a indicação de procedência Carne do Pampa Gaúcho da Campanha Meridional, consulte o regulamento técnico de qualidade da IP que se encontra disponível na Biblioteca Virtual do Curso. CAPÍTULO 10

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• Rastreabilidade A rastreabilidade é um elemento muito importante do regulamento de uso. Além de cada animal ter o seu brinco de rastreabilidade, cada corte de carne leva o número de identificação na etiqueta da embalagem. O consumidor consegue identificar a propriedade que terminou o animal inserindo o número IP (Figura 10.2) que consta na etiqueta no site www. carnedopampagaucho.com.br.

Figura 10.2- Etiqueta da embalagem da indicação de procedência Pampa Gaúcho da Campanha Meridional - Fonte: http://www.carnedopampagaucho.com.br – Acesso realizado em 16 abr. 2014.

• Características dos animais no abate O regulamento de uso define a idade dos animais para abate (até 42 meses), o acabamento de gordura (mínimo 3 mm de gordura), a conformação da carcaça (convexas) e o peso mínimo (dependendo da idade). Para conhecer melhor as características dos animais da IG, consulte o regulamento técnico de qualidade que se encontra disponível na Biblioteca Virtual do Curso.

10.1.6 Controle Cada produtor é responsável pelo seu próprio controle (autocontrole) ao nível do manejo alimentar, da pureza das raças, da permanência na área de produção, do transporte, da sanidade e do bem-estar dos animais. O secretário executivo da associação é responsável pela avaliação desse controle: fala-se, então, de controle interno. No Frigorífico, o veterinário contratado faz o acompanhamento das atividades de abate dos animais com IG, desde o recebimento junto ao frigorífico (bem-estar, sanidade, desossa,

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maturação) até a etiquetagem e inclusão dos registros SISBOV (Serviço Brasileiro de Rastreabilidade da Cadeia Produtiva de Bovinos e Bubalinos) para rastreabilidade no site da associação. Essas atividades também se referem ao controle interno dentro da associação. No abate dos animais com IG, cincos pontos críticos são avaliados pelo secretário e veterinário da associação. Nas propriedades dos associados, ele avalia primeiro a conformidade dos animais e os diferentes documentos obrigatórios para obtenção da IG. Os pecuaristas devem preencher o registro de solicitação de utilização da IG e o boletim de embarque dos animais (Figura 10.3). Chegando ao frigorífico, o veterinário deve inspecionar os animais na linha de abate e avaliar critérios tais como sexo, idade, acabamento de gordura, conformação e peso e marcá-los, carimbando a carcaça para reconhecer os animais levando a IG. Essas atividades não interferem nos controles específicos para obtenção do SIF. Quatro penalidades são definidas no Regulamento e podem ser aplicadas aos produtores: advertência por escrito, multa, suspensão temporária da IP e suspensão definitiva da IP Pampa Gaúcho da Campanha Meridional.

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Figura 10.3 - Sistema de controle e pontos a ser controlados no frigorífico - Fonte: Relatório Sinergi(2007)

Para apresentar a IP Pampa Gaúcho da Campanha Meridional, nós utilizamos os resultados de pesquisas do projeto europeu SINER-GI (Strengthening INternational Research on Geographical Indications). O objetivo dessa pesquisa (2004-2008) era, através do estudo de 14 casos no mundo, avaliar as diferentes estratégias de qualificação dos produtos de origem. Vários trabalhos e relatórios estão disponíveis no site http:// www.origin-food.org. Acesso realizado em 16 abr. 2014.

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• A formação do Conselho Regulador O regulamento técnico da IP considera e define a atuação do Conselho Regulador, referindo-se ao artigo 35 do Estatuto da associação Apropampa. O mesmo Conselho foi constituído em fevereiro de 2006, depois da solicitação de registro da IG ao INPI. O Conselho Regulador deve ser constituído, segundo o artigo 36, por: • Seis membros eleitos pela Assembléia Geral Ordinária, sendo quatro sócios produtores, um sócio transformador (industrial) e um sócio comercial e/ou contribuinte, os quais escolherão, dentre os mesmos, o diretor e o vice-diretor do Conselho Regulador; • Dois membros representantes de instituições técnico-cientificas, com conhecimento da cadeia da pecuária de corte, eleitos (indicados) pela Assembléia Geral; • Um membro da Associação de Raça Angus; • Um membro da Associação de Raça Hereford; • Um membro representante de instituição de desenvolvimento ou divulgação ligada ao setor, eleito (indicado) pela Assembléia Geral. Os membros do Conselho terão um mandato de 2 anos, podendo ser reeleitos para mais um mandato. A cada dois mandatos a renovação do Conselho dar-se-á, obrigatoriamente, em no mínimo 2/3 dos membros. Consulte o Estatuto da Apropampa que se encontra disponível na Biblioteca Virtual do Curso.

10.1.7 Procedimento de Registro No dia 8 de agosto de 2005, foi encaminhado o projeto ao INPI. Após 16 meses de exame realizou-se a entrega oficial do certificado de registro da IP, pelo INPI, e o lançamento oficial do projeto, em dezembro de 2006. CAPÍTULO 10

A terceira IG brasileira teve uma avaliação boa da parte do INPI. Inclusive o dossiê (elaboração, apresentação), submetido a exame formal, foi considerado como bom pelos próprios membros do INPI: não foram formuladas exigências para sua regularização e não teve devolução para complementação de documentos.

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Depois do exame formal do pedido de registro, o registro foi publicado para apresentação de manifestação de terceiros no prazo de 60 (sessenta) dias. Os produtores de carne bovina receberem, assim, a legitimidade do uso dos termos “Pampa Gaúcho da Campanha Meridional”. Apesar de encontrar planícies de pampa gaúcho na Argentina, no Uruguai e no Brasil, a Campanha Gaúcha foi definida pelo IBGE: “atualmente, a Campanha Gaúcha corresponde à mesorregião sudoeste rio-grandense (1989), composta pelas microrregiões da Campanha Ocidental, da Campanha Central e da Campanha Meridional”9. Nesse sentido, apesar da homonímia, a IP brasileira não indica falsa procedência e não induz o público ao erro quanto ao verdadeiro lugar de origem da carne. Nesse prazo, nenhum requerente contestou o pedido de registro do Pampa Gaúcho da Campanha Meridional. O INPI proferiu decisão reconhecendo oficialmente a IP em dezembro de 2006 (Tabela 10.2). No entanto, ocorreu uma contestação, proveniente do Ministério da Agricultura da Argentina, sobre a denominação geográfica da IG. Apesar de o prazo ter decorrido, os pecuaristas gaúchos da Apropampa, junto com o INPI, justificaram a escolha e a legitimidade do uso de “Pampa Gaúcho da Campanha Meridional” referindo-se ao artigo 22 (proteção das indicações geográficas) do acordo TRIPS da OMC.

Consulte as normas relativas à existência, alcance e exercício dos direitos das indicações geográficas definidas pelo ADPIC. http://www.wto.org/french/docs_f/legal_f/27-trips_04b_f.htm Acesso realizado em 16 abr. 2014.

Consulte o primeiro volume do Atlas das Representações Literárias de Regiões Brasileiras sobre o Brasil Meridional. ftp://geoftp.ibge.gov.br/atlas_representacoes_literarias/vol_1_brasil_ meridional.pdf Acesso realizado em 09 abr. 2013.

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A Instrução Normativa INPI n. 25 de 21 de agosto de 2013 estabelece os procedimentos para o Registro de Indicações Geográficas. Consulte esta norma no site do INPI: http://www.inpi.gov.br/images/docs/instrucao_normativa_25_indicacoes_geograficas[2].pdf Acesso realizado em 16 abr. 2014.

Registro pelo INPI da IG Pampa Gaúcho da Campanha Meridional N° de registro

IG200501

Data de depósito

08/08/2005

Data de registro

12/12/2006

Requerente

Associação dos produtores de carne do Pampa Gaúcho da Campanha Meridional

País

Brasil

Denominação da área geográfica

Pampa Gaúcho da Campanha Meridional

Área geográfica

12.935 km2

Produtos

Carne bovina e seus derivados

Base legal

Lei n. 9.279 de 14/05/1996

Espécie

Indicação de Procedência

Apresentação

Mista

Sinal Gráfico

Tabela 10.2 - Fonte: Cerdan, Vitrolles (2009) com base em Apropampa (2007) e INPI (2009)

10.1.8 Desafios que permanecem após o reconhecimento da IG • Baixa disponibilidade de animais CAPÍTULO 10

Logo após o reconhecimento oficial da IP pelo INPI, iniciou o primeiro abate. O abate semanal foi fixado em 50 cabeças. Na primeira semana, foram produzidos 1.988,65 kg de carne. Na semana seguinte, ocorreu uma diminuição de 43%, caindo ao nível mais baixo na quarta semana: a produção caiu de 89% em um mês10.

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Os produtores não conseguiam suprir a demanda devido à baixa disponibilidade de animais que se enquadravam no programa. Conheça os parceiros comerciais da Apropampa nos sites abaixo: http://www.ccmoacir.com.br/ http://www.peruzzo.com.br/ Acesso realizado em 09 abr. 2013.

A baixa disponibilidade pode ser justificada por várias situações. Relacionase, o rigor, com a dificuldade de aplicação das normas do regulamento de uso, ao pouco envolvimento dos pecuaristas na região e à não remuneração da diferenciação. Primeiro, os produtores da região nunca tiveram o hábito de engordar o gado só a pasto. Os associados estão numa fase de aprendizagem de um novo sistema de produção, com outro manejo. A microrregião da Campanha Meridional é sujeita a um inverno úmido e frio. A proibição da complementação da ração associa-se a uma perda de peso de animais naquela temporada e então, a uma perda de renda (tempo de terminação maior). Por serem livres o ano todo, os animais vão ter também características diferentes do gado confinado (peso, gordura, conformação). Além disso, a maioria dos produtores criava gado cruzado. Para conseguir um animal puro, precisa-se de três gerações de animais. Enfim, existem outros programas de valorização da carne menos restritivos, a exemplo dos programas de promoção das raças Angus e Hereford, considerados mais fáceis e atrativos para o produtor. Diante dessa dificuldade de abastecimento de produtos, os produtores optaram para um circuito de distribuição de menor porte (casa especializada, rede de supermercado local). Para saber mais sobre o Programa Carne Angus Certificado, consulte o manual do produtor acessando o endereço abaixo. h t t p : / / w w w. c a r n e a n g u s . o r g . b r / d o w n l o a d / d o w n l o a d / ? I D _ DOWNLOAD=1. Acesso realizado em 16 abr. 2014.

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Os custos e as normas de produção deveriam ser compensados por um preço maior. Porém, o prêmio recebido pelos produtores continua ser o mesmo, seja dentro do programa Angus, da marca própria do frigorífico ou da IG. Isso quer dizer que, apesar de um regulamento de uso muito rigoroso (raça, alimentação), os produtores da IG não têm uma maior valorização econômica de seus produtos. O conjunto desses elementos pode justificar a baixa participação dos produtores da região. Eram quinze (15) associados na criação da Apropampa e apenas cinquenta e cinco (55), em 2008. Por isso, com apoio do Sebrae, os produtores criaram uma estratégia de desenvolvimento. O objetivo geral foi buscar a valorização e a diferenciação do produto carne, considerando os aspectos de preservação ambiental, do resgate da cultura e da tradição local, através do desenvolvimento da associação Apropampa. Para isso, fizeram planejamento com um cronograma que vai até 2010, com três objetivos principais: • Ampliar o número de produtores associados da Apropampa, sendo 55 em 2008, 100 em 2009 e 200 em 2010. • Ampliar a escala semanal de abate dos animais pertencentes ao programa, sendo 50 em 2008, 75 em 2009 e 100 em 2010. • Agregar valor à Carne do Pampa Gaúcho, através de uma remuneração acima do preço de mercado, de 5% em 2008, 10% em 2009 e 15% em 2010, para os produtores rurais associados da Apropampa. Consulte o projeto Indicação de Procedência da Carne do Pampa Gaúcho da Campanha Meridional do Sebrae no Sistema de Informação de Gestão Estratégica Orientada para Resultados (SIGEOR) http://www.sigeor.sebrae.com.br/ Acesse - Visitante - Rio Grande do Sul - Indicação Geográfica da Carne do Pampa Gaúcho da Campanha Meridional Acesso realizado em 16 abr. 2014.

• Nova apresentação do selo e criação de uma marca própria CAPÍTULO 10

O departamento de marketing do frigorífico Mercosul realizou junto com a Apropampa uma modificação na apresentação das etiquetas (Figura 9.4)

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Figura 10.4 - Etiquetagem da IG: associação de vários sinais distintivos. Fonte: Apropampa (2007).

A cor mudou e foi acrescentada à IP (logo e denominação), os sistema de rastreabilidade, a marca Mercobeef, e a marca Força do Rio Grande. A marca Mercobeef é própria do frigorífico, “ela identifica a procedência MERCOSUL e está sempre presente em nossos rótulos em destaque como marca guarda-chuva”11. A marca Força do Rio Grande é específica da IP. Pode-se, então, destacar dois pontos: parece, nesse caso, que houve um amalgama entre IP e marca própria (a diferença entre esse dois sinais distintivos foi apresentado no Capítulo 2). A representação da denominação geográfica mostra também a importância dada aos termos “Pampa Gaúcho” apresentados em caracteres maiores do que “Campanha Meridional”. Qual seria o interesse de criar uma marca só para a IP? Você pensa que poderá existir uma confusão entre marca e IP? O que diferenciou a criação da IP Paraty, da IP Vale dos Vinhedos e da IP Pampa Gaúcho da Campanha Meridional? Não deixe de participar do Fórum de Conteúdo. Lembre-se que sua participação é muito importante!

• Apoio institucional e territorial Esta IP recebeu através da associação Apropampa um grande apoio técnico e financeiro por parte de várias instituições. Esses apoios foram em

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grande parte destinados para a realização dos estudos e elaboração do dossiê para pedido de registro ao INPI. Desde o reconhecimento da IP, as orientações técnicas junto com os produtores, os custos de manutenção da IP (custos de controle, etiquetagem) estão ocorrendo e apoiados porém em menor proporção. Cabe salientar que o processo de reconhecimento do Pampa Gaúcho da Campanha Meridional ocorreu com fortes apoios institucionais. A implementação da IG permitiu uma melhor coordenação entre os agentes. Ocorreram reuniões visando melhorar o conhecimento dos seus vizinhos. Até surgiu uma nova organização territorial original12. Com o projeto da IP, associaram-se agentes privados e públicos com uma boa articulação entre os dois setores. A conscientização da importância da qualidade, da especificidade do produto e do território é o resultado de uma aprendizagem coletiva. Os produtores melhoraram suas práticas de produção e perceberam como podem contribuir para a conservação do meio ambiente. Assim, a Apropampa tornou-se uma referência ambiental regional e fechou parceria com uma ONG internacional, a BirdLife. Veja qual é a atuação da BirdLife no mundo e no Brasil http://www.birdlife.org/ Para conseguir mais informação sobre os desafios da IG, consulte o endereço seguinte. http://w w w.origin-food.org/2005/upload/R oma%20SIN%20 BrazilianBeef31Jan.pdf Acesso realizado em 09 abr. 2013.

CAPÍTULO 10

Com as pesquisas realizadas e a atuação da Apropampa, foi reativada a identidade gaúcha, dando um valor de patrimônio à pecuária de corte. Os produtores resgataram sua história e melhoraram sua autoestima. Apesar de não agregar valor ao produto (diretamente no produto final), não se pode negar outros impactos socioeconômicos. A IG melhorou a atratividade da região e o orgulho dos produtores, é um vetor de desenvolvimento rural, ajudou a criar empregos, a fortalecer o agroturismo e a reforçar a cultura gaúcha.

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10.1.9 Desafios vislumbrados para após o reconhecimento da IP A construção da IP Pampa Gaúcho da Campanha Meridional tornou a região mais conhecida e teve impactos sociais, econômicos e ambientais. De fato, pode-se avaliar os efeitos na conservação do meio ambiente, na coordenação da cadeia produtiva, na criação de valor econômico, e também sociocultural. Nas Tabelas a seguir (10.3 e 10.4), apresentamos os impactos e/ou desafios cadeia produtiva e do território.

Objetivos e efeitos da implementação da IG Pampa Gaúcho da Campanha Meridional na cadeia produtiva da carne. Aumentar o volume de produção (em andamento) Melhorar a genética do gado pampiano (em andamento) Melhorar o manejo dos campos nativos (em andamento) Produção

Incrementar a produtividade: número de animal por hectare (em andamento) Incrementar a produtividade: número de animal por hectare (em andamento) Implementar um padrão tecnológico Aperfeiçoar a estrutura de controle

Certificação

Rastrear a produção Diferenciar o produto Reconhecer a qualidade do produto Reconhecer a origem geográfica do produto Articular os interesses privados e coletivos Desenvolver um projeto coletivo Desenvolver parceiras institucionais

Coordenação

Desenvolver parceiras comerciais Aumentar o número de produtores (da criação até a terminação) Criar empregos Distribuir o valor agregado na cadeia

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Melhorar a comercialização dos produtos Segmentar o mercado nacional Conquistar a fidelidade do consumidor Comercialização

Facilitar o acesso aos mercados através da propriedade coletiva Construir um plano de marketing para ampliação do mercado Antecipar o mercado europeu Conseguir maior competitividade no mercado internacional

Aumentar o valor agregado (remuneração) do produto Tabela 10.3 - Fonte: Vitrolles (2009) com base em Vitrolles (2006, 2007) e Cerdanetal (2007)

Objetivos e efeitos da implementação da IG Pampa Gaúcho da Campanha Meridional no desenvolvimento territorial da região. Preservar os campos nativos Manejar melhor os campos nativos Quebrar a ideia de que as pastagens são de má qualidade Meio ambiente

Manter a biodiversidade Melhorar a qualidade e a produtividade dos campos nativos Criar parceria com ONG internacional BirdLife Desenvolver parcerias institucionais Desenvolver parcerias comerciais Envolver maior número de produtores na área delimitada inclusive criadores e pecuaristas familiares

Coordenação

Aumentar o número de associados Criar empregos Animar o debate sobre a sustentabilidade CAPÍTULO 10

Promover o desenvolvimento territorial

355

Valorizar as propriedades Valorizar a autoestima dos pecuaristas Valor agregado

Valorizar a cultura gaúcha Reivindicar o patrimônio gaúcho

Promover o turismo rural Tabela 10.4 - Fonte: Vitrolles (2009) com base em Vitrolles (2006, 2007) e Cerdanetal (2007)

10.2 IP Região do Cerrado Mineiro 10.2.1 História do café mineiro: deslocamento dos cafezais e organização da cadeia A história do café, no Brasil, é muito rica e está ligada à colonização do país. No início, a produção cafeeira teve muito sucesso: o que importava era a quantidade e não a qualidade do café produzido. Num primeiro momento, os cafezais foram implantados com o mínimo de conhecimento da cultura e uma despreocupação em relação à qualidade, em regiões que mais tarde se tornaram inadequadas para seu cultivo13. Por isso, quando ocorreu, na década 70, a maior geada que a cafeicultura conheceu, as plantações do Norte do Paraná e do Oeste de São Paulo foram atingidas e sofreram prejuízos incalculáveis. Essa geada foi o primeiro fator que conduziu à introdução e ao crescimento da importância econômica da cafeicultura no Estado de Minas Gerais. A produção paranaense decaiu a partir da década de 70, devido a essa grande geada e também ao incentivo do governo, aumentando os preços da soja. Pouco a pouco o Paraná foi substituindo grandes áreas de café por soja. Apesar da imagem de baixa fertilidade, o Cerrado Mineiro oferecia baixos preços para a aquisição de terras (financiamento da compra de terras para novos colonos), topografia plana (possibilidade de mecanização) e programas de incentivo oferecidos pelo governo, como políticas de crédito agrícola14. A colonização do Cerrado Mineiro foi para muitos cafeicultores a última etapa de uma longa migração: “o perfil dos produtores dessa região foi se moldando com características próprias e de diversas outras regiões mais tradicionais na produção de café”15.

356

10.2.2 Organização de produtores Com o reconhecimento do Cerrado como região cafeeira pelo Instituto Brasileiro do Café (IBC, hoje extinto), a cadeia produtiva passou a receber mais investimentos em pesquisa, desenvolvimento de tecnologias e organização dos cafeicultores. Em 1986, criou-se a primeira associação de produtores de café da região do Cerrado. No início da década de 90, diversas cooperativas e associações de cafeicultores proliferaram, sendo essa proliferação interligada à extinção do IBC: com a perda do referencial cafeeiro, os produtores sofreram com a queda de preços e com a crise econômica do setor da cafeicultura. Surgiu, então, a necessidade de pensarem em alternativas para o excesso de oferta e desregulamentação do mercado cafeeiro16: • Organizar-se melhor (associativismo e cooperativismo); • Aumentar o volume de produção; • Melhorar a qualidade do café do Cerrado (com preços de produção controlados). Para representar os interesses dos cafeicultores da região do Cerrado Mineiro nos níveis político, comercial, social e técnico, conjugaram-se os esforços dos produtores e demais elos da cadeia da cafeicultura, criando o CACCER. Em 11 de novembro de 2009 foi solicitado ao INPI a alteração do titular da IG para Federação dos Cafeicultores do Cerrado responsável pela organização da cadeia produtiva de café na região do cerrado mineiro (Tabela 10.5). Para ter uma visão mais ampla da importância e da organização do Sistema Café do Cerrado, e obter informações sobre as associações, as cooperativas e as fundações, consulte o seguinte endereço eletrônico: Consultar o site:http://www.cafedocerrado.org/ Acesso realizado em 16 abr. 2014.

CAPÍTULO 10

357

Estratégias desenvolvidas pela Federação dos Cafeicultores do Cerrado na Região do Cerrado Mineiro. - Novas variedades de arábica: Mundo Novo é substituído em parte por Icatú e Catuaí Inovação nas biotecnologias

- Práticas culturais adaptadas à qualidade dos solos (acidez) e à qualidade do café: uso intensivo de insumos, irrigação, colheita mecanizada

- Marca coletiva: Café do Cerrado - Programa de certificação: Certicafé Certificação da produção

- Indicação de procedência: Região do Cerrado Mineiro (embora não seja uma forma de certificação)

- Certificação da produção

Estratégia de marketing

- Central de negócios, criação de canal único para venda de café compra de insumos, industrialização e cafeterias - Participação em feiras internacionais - Participação em concursos de qualidade

Construção de uma nova governabilidade da cadeia produtiva

- Coordenação da cadeia: gestão de estratégia unificada

Tabela 10.5 - Fonte: Adaptado de Broggio e Droulers (2007)

358

A Federação dos Cafeicultores do Cerrado representa cerca de 4.000 produtores reunidos em seis (6) associações e oito (8) cooperativas, apoiadas pela Fundação de Desenvolvimento do café do Cerrado (FUNDACCER) - (Figura 10.5).

Figura 10.5 - Organização do CACCER - Fonte: http://www.cafedocerrado. org/?p=ca1 – Acesso realizado em 14 junho 2010.

10.2.3 Delimitação da área geográfica “Região do Cerrado Mineiro” Primeiramente, em 1995, O Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA) demarca oficialmente quatro zonas produtoras de café no Estado: Região Sul de Minas, Região dos Cerrados de Minas, Região das Montanhas de Minas e Região do Jequitinhonha de Minas (Tabela 10.6 e Figura 10.6).

CAPÍTULO 10

359

Características das quatro regiões cafeeiras de Minas Gerais, demarcadas pelo IMA. Região Demarcada

Características

Região Sul de Minas

Compreende as áreas geográficas delimitadas pelos paralelos 21º13’ a 22º10’ de latitude e 44º20’ a 47º20’ de longitude, abrangendo a Região do Sul de Minas, parte das Regiões do Alto São Francisco, Metalúrgica e Campo das Vertentes. Caracteriza-se por áreas elevadas, altitude de 700 a 1.080m, com temperaturas amenas, sujeitas a geadas, com moderada deficiência hídrica e possibilidade de produção de bebida fina, sendo que, quando próximas de represas, apresenta elevada umidade relativa, com produção de café de bebida dura a rio.

Região dos Cerrados de Minas

Compreende as áreas geográficas delimitadas pelos paralelos 16º37’ a 20º13’ de latitude e 45º20’ a 49º48’ de longitude, abrangendo as Regiões do Triângulo Mineiro, Alto Paranaíba e parte do Alto São Francisco e do Noroeste. Caracteriza-se por áreas de altiplano, altitude de 820 a 1.100m, com clima ameno, sujeito a geadas de baixa intensidade e com possibilidade de produção de bebida fina, de corpo mais acentuado.

Região das Montanhas de Minas

Compreende as áreas geográficas delimitadas pelos paralelos 40º50’ a 43º36’ de latitude e 18º35’ a 21º26’ de longitude, abrangendo as regiões da Zona da Mata, Rio Doce e parte das regiões Metalúrgicas, Campos das Vertentes e Jequitinhonha. Caracterizase por áreas montanhosas, altitude de 400 a 700m, úmidas, sujeitas a neblina e possibilidade de produção de café de bebida dura a rio.

Região do Jequitinhonha de Minas

Compreende as áreas geográficas delimitadas pelos paralelos 17º05’ a 18º09’ de latitude e 40º50’ a 42º40’ de longitude, abrangendo parte das regiões do Jequitinhonha e Rio Doce. Caracteriza-se por áreas de espigão elevado, altitude de 1.099m, isenta de geada, com reduzido índice de insolação, alta umidade e possibilidade de produção de café de bebida dura a rio.

Tabela 10.6 - Fonte: Portaria nº 165/1995. http://ima.mg.gov.br – Acesso realizado em 16 abr. 2014.

360

Essa demarcação visa estabelecer as diferenças entre cada região para emitir Certificados de Origem Específicos. O IMA construiu esse trabalho de demarcação apoiado em cinco critérios17: a. A importância socioeconômica da cultura do Café para o Estado de Minas Gerais; b. As dificuldades para a caracterização do Café produzido nas diferentes regiões ecológicas do Estado; c. O crescimento das exportações da produção mineira de café e a necessidade de identificação das regiões produtoras; d. O conteúdo do trabalho denominado “Aptidão Climática para a qualidade da bebida das principais regiões cafeeiras de arábica no Brasil” de autoria do extinto Instituto Brasileiro do Café; e. Os resultados das pesquisas intituladas “Qualidade do Café nas diferentes regiões do Estado” e “Zoneamento Agroclimático para a cultura do café”, realizadas pela Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais – EPAMIG.

CAPÍTULO 10

Figura 10.6 – As regiões de Minas Gerais – Fonte: Extraído de Broggio e Droullers (2007)

361

Consulte a Portaria nº 165/95 no site do IMA ht t p : / / w w w. i m a . m g. g ov. b r / i n d ex . p h p ? o p t i o n = co m _ docman&task=doc_download&gid=69 Acesso realizado em 09 abr. 2013.

• Demarcação da Região do Cerrado Mineiro Em Dezembro de 2002, a Portaria nº 561/2002 revoga a denominação Região dos Cerrados de Minas: “Fica alterada a denominação da região para produção de café no Estado de Minas Gerais, de “Região dos Cerrados de Minas” para “Região do Cerrado Mineiro”18. Consulte a Portaria nº 561/2002 no site do IMA ht t p : / / w w w. i m a . m g. g ov. b r / i n d ex . p h p ? o p t i o n = co m _ docman&task=doc_details&gid=227 Acesso realizado em 09 abr. 2013.

Essa alteração da demarcação originou-se da solicitação de registro da IP Região do Cerrado Mineiro, feita pelo CACCER ao INPI (Tabela 10.7).

Denominação da área delimitada, especificada nos pedidos de registro da IP ao INPI. N° de registro

IG980002

IG990001

Data de depósito

20/05/98

28/01/99

Data de registro

11/05/00 Rejeitada

14/04/05 Concedido

Requerente

Conselho das Associações dos Cafeicultores do Cerrado

Conselho das Associações dos Cafeicultores do Cerrado

Denominação da área geográfica

Cerrado

Região do Cerrado Mineiro

Espécie

DO

IP

Produto

Café

Café

Tabela 10.7 - Fonte: Adaptado de http://www.inpi.gov.br/menu-esquerdo/ indicacao/andamento-processual - Acesso realizado em 16 abr. 2014.

362

A denominação “Cerrado” não foi aceita pelo INPI. Tratava-se de uma denominação genérica, que se aplicaria a todo o cerrado brasileiro.

Figura 10.7 - Delimitação da IG Região do Cerrado Mineiro - Fonte: http://www. cafedocerrado.org – Acesso realizado em 16 abr. 2014.

Para conseguir o registro da IG era preciso comprovar que o nome geográfico ficou conhecido como centro de extração, produção ou fabricação do produto. A área já era delimitada e coube ao IMA trocar a denominação de “Região dos Cerrados de Minas” para “Região do Cerrado Mineiro” (Figura 10.7). • Características da Região do Cerrado Mineiro A Região do Cerrado Mineiro abrange 55 municípios localizados no Alto Paranaíba, Triângulo Mineiro e Noroeste de Minas. A área total da zona é de 112.289,56 km2. O Cerrado Mineiro ocupa um altiplano, com altitude variando de 820 a 1.100m. O clima é tropical de altitude. A amplitude térmica ao longo do ano é baixa, com temperaturas médias entre 18 e 21°C19. CAPÍTULO 10

As estações climáticas são definidas. O verão é quente e úmido com clima favorável à florada dos cafezais. O inverno é ameno, seco, livre de chuvas e sujeito a geadas de baixa intensidade. O padrão edafoclimático uniforme da região possibilita, então, a produção de cafés de alta qualidade com características de corpo mais acentuado, sabor e aromas específicos20.

363

A Região do Cerrado Mineiro é a segunda indicação de procedência reconhecida no Brasil pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial. Requerida pelo Conselho das Associações dos Cafeicultores do Cerrado, a IP beneficia seis associações e oito cooperativas, reunindo cerca de 4.000 produtores, em 55 municípios, cobrindo, aproximadamente, 112.289,56 km2. Consulte no link abaixo a lista dos 55 municípios da área delimitada da Região do Cerrado Mineiro e a área de cada um. http://www.cafedocerrado.com.br/intranet/docs/55municipios. CERRADO.pdf Acesso realizado em 09 abr. 2013.

10.2.4 Características do produto, regras de produção e de controle • Caracterização do café com Indicação de Procedência As condições edafoclimáticas e a insolação da Região do Cerrado Mineiro favorecem a produção de um café arábica diferenciado com os seguintes atributos de qualidade21: a. Aromas intensos que variam de caramelo a nozes; b. Delicada acidez cítrica com leve toque de laranja; c. Sabor adocicado com uma finalização achocolatada de longa duração; d. Finalização longa. • Construção da qualidade do café do Cerrado Na IG Região do Cerrado Mineiro, a qualidade do café deve contar com boas práticas agronômicas, responsabilidade social e ambiental, origem garantida, qualidade comprovada, segurança alimentar e rastreabilidade. Uma das primeiras ações do CACCER foi o registro e a divulgação da marca (serviço e produto) Café do Cerrado (Figura 10.8). O primeiro objetivo era diferenciar o produto, “garantir diferencial de preço ao produtor, evitando que o café fino do cerrado servisse apenas para valorizar

364

as ligas dos exportadores”22. A finalidade dessa estratégia era evoluir do estatuto de café “a grão” para um café “especial”. Como passo seguinte à demarcação das quatro regiões produtores de café no Estado mineiro, o Decreto nº 38.559/1996 instituiu o regulamento para emissão do Certicafé, um Certificado de Origem para garantir a procedência do café mineiro. As missões de acompanhamento, emissão e controle eram atribuídos à EPAMIG (Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais). à EMATER/MG e ao IMA.

Figura 10. 8 - Logomarca do Café do Cerrado - Fonte: 23http://www.cafedocerrado. org24. Acesso realizado em 16 abr. 2014.

Apesar de ser um Certificado de Origem, essa certificação de procedência do café não é uma indicação geográfica, conforme define a lei  9279/1996 Para cumprir as exigências dos mercados internacionais, os programas de certificação do café do Cerrado integram garantias de qualidade, origem, transparência do modelo de produção e rastreabilidade do produto. O processo possui virtudes educativas e de inclusão, à medida que os critérios controlados são considerados em diversas etapas, de modo a dar tempo ao produtor para aprender e desenvolver os instrumentos necessários de forma progressiva. Isso permite que pequenas e médias empresas possam participar dos diferentes programas de certificação25.

CAPÍTULO 10

A primeira indicação geográfica para o café brasileiro, que estava em tramitação desde 1999, foi oficialmente concedida ao CACCER (Tabela 10.8) depois de 5 anos de trabalho árduo. O reconhecimento demorou porque houve muita dificuldade pelo fato deles serem os primeiros a iniciar esse processo na região26. Foi necessário “contratar uma equipe de especialistas para definir o processo de produção no Cerrado e as características do Café do Cerrado; definir as formas de produção, variedades, manejo, con-

365

dições climáticas, altitude, tecnologia agronômica; definir os parâmetros de qualidade de bebida do Café do Cerrado (aroma, acidez, corpo e finalização) e também a metodologia de avaliação (Metodologia Americana SCAA)”27.

Registro pelo INPI da IP Região do Cerrado Mineiro. N° de registro

IG990001

Data de depósito

28/01/1999

Data de registro

14/06/2005

Requerente

CACCER - Conselho das Associações de Cafeicultores do Cerrado

País

Brasil

Denominação da área geográfica

Região do Cerrado Mineiro.

Área geográfica

112.289,56 km2

Produtos

Café

Base legal

Lei nº 9.279/1996

Espécie

Indicação de Procedência

Apresentação

Nominativa

Tabela 10.8 - Fonte: Elaborado com base em: http://www.inpi.gov.br e http://www. cafedocerrado.org - Acesso realizado em 16 abr. 2014

Para poder fazer o uso da marca Café do Cerrado, é necessário submeterse a avaliação de três exigências: • Cumprir os requisitos da Indicação de Procedência (altitude acima de 800 metros do nível do mar, município dentro da região delimitada, café arábica); • Certificar a propriedade Café do Cerrado (quatro níveis, de 1 a 4 estrelas); • Certificar o produto (a bebida deve atingir no mínimo 75 pontos na metodologia da SCAA). Parece-nos importante destacar, aqui, a coexistência de dois sinais de valorização para o mesmo produto, a marca e a IP. Apesar de ter registrado a

366

Região do Café Cerrado Mineiro como indicação geográfica, a estratégia de marketing atual da organização está baseada só na divulgação e promoção da marca Café do Cerrado. Essa coexistência de “marca / IP” pode ser entendida de diferentes formas. Pode ser vista como uma confusão de signos – os produtores e consumidores consideram os dois sinais distintivos parecidos, ou como uma estratégia de ação que reconhece que numa região ou país onde as IG são ainda pouco conhecidas, é melhor comunicar com a ferramenta mais difundida (o caso das marcas). • Controle e certificação Para maior garantia da procedência do genuíno Café do Cerrado, foi implantado o primeiro sistema de rastreabilidade por código de barras de logística em café, em 2001. Esse sistema permite controlar a procedência (município, propriedade e parcela) do café e avaliar o padrão da marca Café do Cerrado. A produção do Café do Cerrado tem também o certificado NBR ISO 9001. Essa norma fornece as exigências organizacionais requisitadas para a existência de um sistema de gestão da qualidade. O café não só é avaliado pelo próprio cliente, mas também por uma entidade terceira, uma certificadora. O programa de certificação do Café do Cerrado foi um processo de construção da qualidade de longo tempo (Figura 10.9) que associa o reconhecimento da origem de um produto e o incremento da qualidade cada vez maior.

CAPÍTULO 10

Figura 10.9 - Evolução no tempo da certificação requerida para o Café do Cerrado – Fonte: Aguinaldo (2008)

367

Consultar o código de conduta da propriedade produtora no endereço eletrônico abaixo: http://www.cafedocerrado.com.br/intranet/docs/Norma_CACCER_RA_ v14.pdf Consultar o fluxograma de certificação Café do Cerrado http://www.cafedocerrado.com.br/intranet/docs/fluxograma_certproduto_caccer.pdf Consultar o protocolo para análise sensorial de café com a metodologia SCAA http://www.cafedocerrado.com.br/intranet/docs/Protocolo_SCAA_ OK.pdf Para consultar todos os documentos disponíveis no site do CACCER relativos à certificação de produto, de propriedade e de armazém acesse: http://www.cafedocerrado.org Acesso realizado em 09 abr. 2013.

10.2.5 Impactos A Tabela 10.9 expõe quais são os impactos da implementação de procedimentos de valorização da origem e da qualidade na região, em níveis econômicos, sociais e ambientais.

368

Impactos sociais, econômicos e ambientais na cadeia produtiva do café. Organização da cadeia produtiva: criação de associações e cooperativas; criação da CACCER Ações coletivas Coordenação

Assessoramento técnico Assessoramento comercial Formação e capacitação dos atores da cadeia produtiva Integração: redução do número de intermediários e Integração progressiva ao processo de melhoria de qualidade Leis trabalhistas (contratos de trabalho, folgas semanais, etc.)

Adequação às normas nacionais e internacionais

Saúde (utilização de equipamentos e proteção individual, prevenção de acidentes, etc.) Leis sanitárias (uso de agrotóxicos, presença de resíduos, etc.) Padronização própria: caracterização do café do Cerrado, seleção, variedades

Inovação

Certificação da qualidade e da origem Inovação técnica no sistema de condução (irrigação, colheita mecanizada, uso intensivo de insumos) Produção responsável e sustentável (RainForest Alliance) Concorrência entre as grandes empresas

Comercialização ou conquista de mercados

Segmentação do mercado (café especial) Divulgação: Marketing e Participação em feiras e concursos (premio Illy) Remuneração da qualidade ao produtor Remuneração ao produtor, devido à notoriedade

Valor agregado

Criação de empregos (4,6 milhões de empregos diretos) CAPÍTULO 10

Importante componente econômico e social de Minas Gerais (18,8% do PIB do Estado, ou seja, aproximadamente US$ 800 milhões) Tabela 10.9 - Fonte: Vitrolles (2009) com base em Vitrolles e al. (2006), Souza (2007), Mafra (2008) e Aguinaldo (2008)

369

10.3 IP Vale do Sinos Vamos apresentar a Indicação de Procedência Vale do Sinos para couro acabado. O pedido de registro da Indicação de Procedência foi depositado em 14 de setembro de 2007, sob n° IG200702, junto ao INPI, pela Associação das Indústrias de Curtume do Rio Grande do Sul - AICSUL. A concessão do registro se deu em 19 de maio de 2009 (Figura 9.10), por meio da publicação da RPI nº 2002, p. 167.

Figura 10.10 - Certificado de concessão de registro para a indicação de procedência vale do sinos para couro acabado e seu respectivo logo - Fonte: http://www.agrosoft.org.br/agropag/210650.htm e http://www.courovaledosinos.org.br/ru_regulamento_de_uso_da_ip.pdf. Acesso realizado em 09 abr. 2013.

História do Vale do Sinos O Vale do Rio dos Sinos tem este nome devido ao próprio rio, que o forma e corta, e que em seu percurso encontra um extenso e fértil vale que cobre muitos municípios hoje, mas que são a formação original do município de São Leopoldo, no Rio Grande do Sul. A população inicial era, exclusivamente, de imigrantes alemães, os quais vieram de Holstein, Hamburgo, Mecklemburgo, Hannover, Hunsrück, Palatinado, Pomerânia, Vestfália e de Württemberg. Em 1824, chegam os primeiros colonos alemães ao Rio Grande do Sul, sendo assentados na atual cidade de São Leopoldo (Figura 10.11) Os alemães chegavam em pequeno número, todos os anos, porém eram em número suficiente para se organizar e se expandir pela região.28

370

A atual população de todo este vale, ainda hoje, guarda essa característica, sendo predominantemente de descendentes dos antigos imigrantes alemães. Embora pareça deslocada essa história da imigração alemã com a IP do Vale do Sinos, sua ligação é fundamental para que hoje essa região seja conhecida como um complexo coureiro calçadista, posto que foram esses mesmos imigrantes alemães que, trazendo suas habilidades de artesãos, começaram a utilizar o couro que havia em abundância, na província do Rio Grande do Sul, pois trata-se de uma região predominantemente pecuárista. Sua localização destacada neste vale e a habilidade com o couro, unidos à situação local, permitiram que esses fizessem nascer a história coureiro calçadista do Vale do Rio dos Sinos.

Figura 10.11 - Pintura retratando a chegada dos primeiros imigrantes alemães ao Rio Grande do Sul, em 1824 - Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Vale_do_Rio_ dos_Sinos Acesso realizado em 10 jul. 2010.

Segundo o artigo 1º do Regulamento de Uso da IP Vale do Sinos,29 o setor coureiro surge nesta região em função da combinação de fatores que não se repetiram em outro lugar ou época no Brasil: “o encontro de mão-de-obra especializada livre - dos imigrantes alemães, chegados ao Rio Grande do Sul a partir de 1824 - com a demanda de mercado”. CAPÍTULO 10

371

Figura 10.12 - Fotografia dos antigos curtumes do Vale do Sinos - Fonte: http:// www.courovaledosinos.com.br/

E seu crescimento também se dá dentro dessas especificidades, propiciadas pelas guerras do século XIX, notadamente, a revolução farroupilha e a guerra do Paraguai, que exigiram uma crescente demanda de artefatos de couro, que o Vale do Sinos absorveu. No século XX, é o início da exportação de calçados que dá novo impulso à região, estabelecendo uma nova dinâmica – da segmentação – para alcançar o aperfeiçoamento necessário à demanda existente. Desta forma, organizou-se o cluster coureiro calçadista do Vale do Sinos. 30 Desde sua formação, na antiga colônia de São Leopoldo, ao auge de sua expansão, tanto no discurso científico quando no uso popular, a região é conhecida como “Vale do Sinos”. Com o crescimento do cluster, a ocupação suplantou a região geográfica do próprio vale, englobando outros municípios que se encontram no Vale do rio Caí e do rio Paranhana. Todavia, foi entendido pelo INPI que a justificação histórica e a unicidade de cultura e tradições da região, aliados a não dependência propriamente dita do terroir (posto que a proteção se dá ao couro acabado, cuja proveniência não é regulada), permitem compreender essa região expandida como sendo a Indicação de Procedência do “Vale do Sinos” para couro acabado.31

10.3.2 Identificação do produto O produto objeto da IP Vale do Sinos trata de couro acabado dentro da zona delimitada, independente da origem da matéria-prima ou localização de seu processamento inicial, o qual poderá ser transformado em di-

372

versos produtos, tais como calçados, artefatos de couro, roupas e estofados (Figura 10.13 e 10.14).

Figura 10.13 - Diversas amostras de peças de couro acabadas para serem utilizadas em acessórios, vestuário, calçados e mobiliário - Fonte: Bruch (2009) com base em imagens e fotografias localizadas no www.google.com.br

Os couros que recebem a IP são acabados por curtumes localizados dentro da região delimitada e atendem a uma série de especificações técnicas. Os curtumes são auditados e devem cumprir uma série de requisitos relacionados com os seus processos de produção, incluindo controles e avaliações da matéria-prima recebida pela empresa, dos insumos químicos, do processo produtivo e dos requisitos de responsabilidade socioambiental, relacionados com a mão-de-obra, a segurança no trabalho e o meio ambiente, além de atender especificações estabelecidas para cada tipo de acabamento.32

CAPÍTULO 10

373

Figura 10.14 - Exemplo de produtos acabados - Fonte: IP Vale do Sinos (2009).

Segundo o artigo 3º, do Regulamento de Uso, os produtos autorizados poderão apresentar um determinado número de características de superfície e de tipo de acabamento (Tabela 10.10). As definições encontram-se no Anexo A do referido regulamento.33 Superfície

Acabamento

a) Couro flor integral: couro com a camada flor intacta, mantida com suas características originais.

a) Acabamento anilina: acabamento realizado sem a utilização de ligantes e pigmentos.

b) Couro flor lixada: couro que tem as características da camada flor alteradas através da utilização de lixas. c) Couro nubuck: couro que possui como principal característica o toque aveludado e efeito escrevente na flor obtido através do lixamento ao qual é submetido. d) Couros afelpados: couros sem flor, originado de raspas ou de couros utilizados pelo lado do carnal.

b) Acabamento semi-anilina: acabamento leve, à base de ligantes, pigmentos, corantes e auxiliares que igualiza e mantém o aspecto natural da superfície do couro. c) Acabamento pigmentado: acabamento de cobertura, à base de ligantes, pigmentos e auxiliares, que altera o aspecto natural da superfície do couro. d) Acabamento catiônico: acabamento realizado com produtos de caráter catiônico. e) Acabamento com transfers: acabamento obtido pela transferência de filmes laminados. f) Acabamento com transfers metalizados: acabamento de aparência metálica obtido pela transferência de filme laminado.

Tabela 10.10 - Fonte: Bruch(2009) com base no Regulamento de Uso da IP Vale do Sinos (2009).

374

Com relação à matéria-prima, determina o artigo 4º, do Regulamento de Uso que pode proceder de qualquer raça animal, podendo ser recebida em estágio de wet-blue ou semi-acabado (crust), independentemente da sua origem ou localização de seu processamento inicial. O importante é que o acabamento final se dê na região do Vale do Sinos, e dentro das normas estabelecidas no regulamento de uso. 34 Para que um produto manufaturado possa utilizar-se da IP Vale do Sinos, há certos percentuais mínimos de composição com o couro acabado, proveniente desta região, que precisam ser respeitados, conforme o artigo 10, do Regulamento de Uso: para o cabedal do calçado: 70%; para a parte externa de artefatos de couro: 80%; para a parte externa de vestuários em couro: 80%; para a superfície frontal de estofados: 90%.35

10.3.3 Organização dos produtores Os produtores estão organizados na forma de associação sem fins lucrativos, a Associação das Indústrias de Curtume do Rio Grande do Sul – AICSUL.36 Dentro dessa associação, que abrange uma gama maior de produtores, no momento, participam do processo sete curtumes. Embora haja possibilidade da participação de transformadores e comerciantes, isso ainda não se verifica. O SEBRAE-RS, o Centro Tecnológico do Couro – SENAI e o Centro Tecnológico do Calçado – SENAI, auxiliaram no reconhecimento dessa IP e continuam apoiando as ações relacionadas. 37 O que facilitou o trabalho de reconhecimento foi a existência de uma grande organização associativa do setor coureiro-calçadista, no Vale do Sinos, com diversas associações representando os diversos segmentos da área. Também é relevante a existência prévia da AICSUL, que adaptou o seu Estatuto para englobar o objetivo de preservar e proteger a IP do couro acabado do Vale do Sinos.38 Também se verifica que, ao contrário de outros casos, na IP Vale do Sinos a iniciativa partiu do próprio setor, o que certamente facilitou sua mobilização e organização, bem como a fixação dos parâmetros da IP, que são bastante compatíveis com essa modalidade de indicação geográfica: mais flexíveis e simples de serem observados. CAPÍTULO 10

375

10.3.4 Delimitação da área geográfica Segundo o artigo 2º, do Regulamento de Uso, a área delimitada “encontra-se dentro da zona que compreende o original município de São Leopoldo, berço da colonização alemã no Rio Grande do Sul, dos municípios dele desmembrados e do resultante processo de enxamagem identificado pela expansão das indústrias produtoras de couros” 39 (Figura 10.15).

Figura 10.15 - Delimitação geográfica do Vale do Sinos - Fonte: IP Vale do Sinos (2009).

Esta zona compreende os municípios da região delimitada pelos Conselhos Regionais de Desenvolvimento – COREDEs do Vale do Sinos, Paranhana/ Encosta da Serra e Vale do Caí 40 (Figura 10.16).

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Figura 10.16 - Municípios integrantes da região delimitada pela IP Vale do Sinos Fonte: IP Vale do Sinos (2009).

Com relação a forma de delimitação geográfica, vale ressaltar que, ao contrário do que vinha se verificando em diversas Indicações de Procedência, neste caso, o documento comprobatório de Delimitação da Área Geográfica foi emitido pela Secretaria do Desenvolvimento e dos Assuntos Internacionais – SEDAI, do Governo do Estado do Rio Grande do Sul. 41 O documento foi baseado na tradição histórica da formação da região e na sua ocupação pelos imigrantes alemães e, o INPI, em seu parecer, entendeu como suficiente.42 Uma das afirmações que corroboram o parecer é que esta IP está ligada com uma atividade industrial, sendo, portanto, sem necessidade dos estudos relacionados com os fatores edafoclimáticos.

10.3.5 Regulamento de uso e Órgão de Controle O Regulamento de uso e a forma de controle da IP Vale do Sinos são estabelecidos pelo Regimento Interno da AICSUL. Este informa quem poderá participar da IP e quais serão os órgãos que irão compor a sua estrutura de fiscalização e controle. 43 CAPÍTULO 10

Primeiramente, estabelece que podem participar da IP produtores de couro acabado, transformadores, comercializadores e contribuintes (entidades que auxiliam na ordenação da cadeia produtiva). Todavia, somente os produtores e transformadores poderão usar a IG de forma originária e somente quando em conformidade com o Regulamento de Uso. 44

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A IP é constituída, assim, por uma Assembleia de Participantes, um Grupo Gestor, uma Diretoria Executiva e um Conselho Técnico-Regulador. Compete ao Conselho Técnico-Regulador o controle técnico sobre a produção, a fiscalização e emissão de certificados para os produtos que atendam as normas do Regulamento de Uso. 45 O Conselho Técnico-Regulador também deverá manter registros e fichas que permitam a rastreabilidade do produto, os quais compreendem os registros das auditorias, as fichas de inscrição dos produtos, os laudos de avaliação, as amostras e as declarações de produção. O regulamento impõe, com relação ao produto, requisitos que devem ser cumpridos pela matéria-prima e pelos insumos a serem utilizados no processamento do couro, bem como acompanhamento das etapas de processamento e comercialização, para que todo caminho percorrido pelo couro possa ser auditado. 46 Ressalta-se que a matéria-prima deve ser identificada por lote de recebimento. E: “cada lote deverá ser identificado através da nota fiscal de recebimento, sendo registrado, também, a data, a procedência, o cliente ou proprietário do couro, o número de couros e a metragem correspondente.” 47 O descumprimento das normas de produção e rotulagem, bem como dos princípios da IP poderão acarretar sanções tais como  : advertência por escrito, multa, suspensão temporária e definitiva. 48 O artigo 5º, do Regulamento de Uso, descreve os requisitos que devem apresentar os insumos químicos a serem utilizados na curtição e acabamento do couro, bem como, em referência ao Anexo C, a não utilização de produtos químicos restritos. 49 Os artigos 6º e 7º, do Regulamento de Uso, estabelecem os requisitos técnicos que devem ser observados tanto no processo de produção quando no produto final, bem como a quais testes os produtos serão submetidos e os resultados mínimos e máximos que podem ser atingidos. 50 Ressalta-se que, com relação às análises, os métodos utilizados, em regra, são do padrão ISO ou da NBR (Normas Brasileiras de Referência), sendo que ao final, independente do tipo de acabamento, os couros deverão apresentar os seguintes resultados: Resistência à tração: mínimo 150 N; Alongamento mínimo 35%; Distensão da flor: mínimo 7 mm. Outros resultados específicos também são estipulados, dependendo do tipo de acabamento e de superfície. 51

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Também são estabelecidos requisitos de responsabilidade socioambiental que deverão ser cumpridos pelos produtores. Esses são divididos em mão-de-obra, segurança do trabalho e meio ambiente. 52 Em relação à mão de obra, todos os funcionários do participante devem estar regularizados de acordo com a legislação trabalhista vigente no país. Não é permitida a utilização de mão de obra infantil em qualquer fase do processo produtivo, mesmo que de forma terceirizada. Em relação à segurança no trabalho, o produtor deve cumprir e fazer cumprir todos os requisitos de segurança no trabalho, exigidos pela legislação vigente. Em relação ao meio ambiente, o produtor envolvido no processo produtivo do acabamento do couro deve ter e manter atualizada sua licença ambiental. O descarte de qualquer produto, resíduos ou embalagem(ns) deverá ser controlado e não provocar risco de contaminação ao meio ambiente. Certamente, esses requisitos também capacita-os para o acesso a mercados internacionais que, além das exigências habituais, têm ressaltado a responsabilidade sócio ambiental como requisito para compra de produtos. E a IP torna-se uma espécie de credencial que os referencia. Em relação à rotulagem, todos os produtos que forem aprovados pelo Conselho Técnico-Regulador poderão utilizar o seguinte selo53 (Figura 10.17):

Figura 10.17 - Sinal distintivo da IP Vale do Sinos a ser colocado sobre os produtos com o respectivo número de controle - Fonte: Regulamento de Uso art. 11, IP Vale do Sinos (2009). CAPÍTULO 10

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Os instrumentos e a operacionalização dos controles de produção são definidos através de Norma Interna do Conselho Técnico-Regulador. 54Até o momento, o Conselho Técnico-Regulador criou duas normas: Norma Interna – NI/01 - processo de inscrição, avaliação e controle da Indicação de Procedência do couro acabado do “Vale do Sinos”.55 Norma Interna – NI/02 - processo de auditoria.56

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Resumo O Pampa Gaúcho da Campanha Meridional é a terceira indicação de procedência a ser reconhecida no Brasil. Teve seu registro deferido em 12/12/2006. Em 2007, a Associação dos Produtores do Pampa Gaúcho da Campanha Meridional (APROPAMPA) contava com 55 associados localizados em uma área de 12.935 km2, cobrindo, por parte, 13 municípios. A Região do Cerrado Mineiro é a segunda indicação de procedência reconhecida no Brasil pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial, em 14/06/2005. Requerida pelo Conselho das Associações dos Cafeicultores do Cerrado (FEDERAÇÃO DOS CAFEICULTORES DO CERRADO), a IP beneficia seis associações e oito cooperativas, reunindo cerca de 4.000 produtores, em 55 municípios, cobrindo aproximadamente 112.289,56 km2. A IP do Vale do Sinos teve seu registro da indicação de procedência depositado em setembro de 2007, e a sua concessão de registro em maio de 2009. Hoje , dentre os associados da AICSUL, sete já utilizam a IP. A área delimitada abriga 43 municípios que encontram-se no Vale do Sinos, Paranhana/Encosta da Serra e Vale do Caí. Cada IP teve a sua trajetória própria. Cada associação de produtores teve que justificar o seu requerimento e comprovar a notoriedade da origem geográfica e a legitimidade da IP. A idéia da IP Pampa Gaúcho da Campanha Meridional se inscreve numa visão, em longo prazo, de segmentação do mercado e de valorização de um produto reconhecido pela sua qualidade. O objetivo da Federação dos Cafeicultores do Cerrado é valorizar a qualidade de um café especial, coordenar uma cadeia produtiva voltada para a produção de commodities. A indicação geográfica em vez de ser valorizada como uma ferramenta nova e diferencial, fez parte de uma estratégia complexa de marketing voltada para promoção de uma marca. No caso do Vale do Sinos, trata-se de uma iniciativa local, que, pela abrangência e importância regional possibilitará que a região tradicionalmente coureiro calçadista seja reconhecida e protegida como tal.

CAPÍTULO 10

Esperamos que você possa fazer excelente uso desse material de forma que ele contribua para o aprimoramento de seus conhecimentos e formação.

381

Notas 1.

Esse encontro foi , organizado pela SEBRAE e pelo CIRAD (Centro Internacional de Pesquisa Agronômica pelo Desenvolvimento), Embaixada da França e Sebrae, com apoio dos Ministérios da Agricultura brasileiro e francês, era desenvolver as IG.

2.

ÁVILA, 2005.

3.

ÁVILA, 2005.

4.

NABINGER, 2006.

5.

ÁVILA, 2005.

6.

NABINGER, 2006.

7.

APROPAMPA, 2005.

8.

NABINGER, 2006.

9.

IBGE, 2006.

10. APROPAMPA, 2007. 11. MERCOSUL. Disponível em: . Acesso realizado em 16 abr. 2014. 12. CERDAN e VITROLLES, 2008. 13. CERDAN e VITROLLES, 2008. 14. MAFRA, 2008; ORTEGA, 2008. 15. MAFRA, 2008. p. 131. 16. BROGGIO e DROULERS, 2007. 17. IMA. Disponível em: . Acesso realizado em 16 abr. 2014. 18. IMA. Disponível em: . Acesso realizado em 16 abr. 2014. 19. VITROLLES, CERDAN e MAFRA, 2006; SAES e JAYO, 1997, MAFRA, 2008.

382

20. VITROLLES, CERDAN e MAFRA, 2006; SAES e JAYO, 1997, MAFRA, 2008. 21. FEDERAÇÃO DOS CAFEICULTORES DO CERRADO. Disponivel em: . Acesso realizado em 16 abr. 2014. 22. CACCER em MAFRA, 2008. 23. Registro concedido pelo INPI sob nº 817419314, em 19/09/1995, para a classe de serviços de ‘representação de classe profissional e assistência a profissão’ (41:50), e sob nº 818227060, em 20/07/1999, para a classe de produtos ‘café’ (30:10). 24. Registro concedido pelo INPI sob nº 817419314, em 19/09/1995, para a classe de serviços de ‘representação de classe profissional e assistência a profissão’ (41:50), e sob nº 818227060, em 20/07/1999, para a classe de produtos ‘café’ (30:10). 25. VITROLLES, CERDAN e MAFRA, 2008. 26. AGUINALDO, 2007. 27. AGUINALDO, 2007. 28. http://pt.wikipedia.org/wiki/Coloniza%C3%A7%C3%A3o_ alem%C3%A3_no_Rio_Grande_do_Sul. 29. IP Vale do Sinos. Regulamento de Uso, Artigo 1. 30. IP Vale do Sinos, 2009. 31. IP Vale do Sinos, 2009. 32. IP Vale do Sinos, 2009. 33. IP Vale do Sinos. Regulamento de Uso, Artigo 3. 34. IP Vale do Sinos. Regulamento de Uso, Artigo 4. 35. IP Vale do Sinos. Regulamento de Uso, Artigo 10. 36. AICSUL, 2009. CAPÍTULO 10

37. IP Vale do Sinos, 2009. 38. RPI. nº 1998 de 22/05/2009, p. 133-142.

383

39. IP Vale do Sinos. Regulamento de Uso, Artigo 2. 40. IP Vale do Sinos. Regulamento de Uso, Artigo 2. 41. RPI. nº 1998 de 22/05/2009, p. 133-142. 42. RPI. nº 1998 de 22/05/2009, p. 133-142. 43. RPI. nº 1998 de 22/05/2009, p. 133-142. 44. RPI. nº 1998 de 22/05/2009, p. 133-142. 45. RPI. nº 1998 de 22/05/2009, p. 133-142. 46. RPI. nº 1998 de 22/05/2009, p. 133-142. 47. IP Vale do Sinos. Regulamento de Uso, Artigo 4. 48. RPI. nº 1998 de 22/05/2009, p. 133-142. 49. IP Vale do Sinos. Regulamento de Uso, Artigo 5. 50. IP Vale do Sinos. Regulamento de Uso, Artigos 6 e 7. 51. IP Vale do Sinos. Regulamento de Uso, Artigos 6 e 7. 52. IP Vale do Sinos. Regulamento de Uso, Artigo 8. 53. IP Vale do Sinos. Regulamento de Uso, Artigo 11. 54. IP Vale do Sinos. Regulamento de Uso, Artigo 14. 55. IP Vale do Sinos. N1. 56. IP Vale do Sinos. N2.

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