Faces de Bergman: retórica visual aplicada à criação de cartazes cinematográficos conceituais

July 24, 2017 | Autor: Hana Luzia | Categoria: Ingmar Bergman Films, Retórica, Processos Criativos, Cartazes, Retórica Visual
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Universidade Federal de Pernambuco Centro de Artes e Comunicação Departamento de Design Bacharelado em Design Hana Luzia de Abreu Leite Recife, 2013

FACES DE BERGMAN retórica visual aplicada à criação de cartazes cinematográficos conceituais

Universidade Federal de Pernambuco Centro de Artes e Comunicação Departamento de Design Bacharelado em Design Hana Luzia de Abreu Leite Recife, 2013

FACES DE BERGMAN retórica visual aplicada à criação de cartazes cinematográficos conceituais

Memorial descritivo apresentado ao Departamento de Design da Universidade Federal de Pernambuco como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Design

Orientador: Prof.º Hans Waechter Co-orientadora: Prof.ª Gisela Leão

AGRADECIMENTOS Agradeço a Hans Waechter e Gisela Leão, meus mestres, pelo apoio e paciência. Aos meus pais, João Denys e Rose Mary, e aos meus avós Sinhazina, Leopoldina, Jomard e Raimundo, pelo amor total. Aos meus amigos, por acreditarem em mim, principalmente Mateus Barros e Marcela Lins, por servirem de modelos fotográficos para os cartazes, Lana Pinho, por fotografar, e Júlia Mendes, pela assistência em momentos cruciais E, sobretudo, agradeço a Alyson Lima, Clara Tobias, Clara Torres, Madyana Torres e Silvia Gomez, pelo amor muitas vezes distante geograficamente, porém incondicional.

RESUMO O processo criativo de cartazes é pouco abordado na história do Design. Há limitada bibliografia sobre o tema e os cartazes cinematográficos possuem uma tradição comercial, em que o objetivo maior é seduzir o espectador com imagens dos atores principais, com raras exceções. Atualmente, uma abordagem mais artística e conceitual, com a predominância do significado do filme, é pouco utilizada. A fim de se obter resultados mais criativos e menos intuitivos, este projeto baseia-se em técnicas e figuras de linguagem que são utilizadas para influenciar emoções e significações aos receptores através da aplicação da Retórica Visual à criação de cinco cartazes cinematográficos conceituais de filmes de Ingmar Bergman (Fanny e Alexander, 1982; Gritos e Sussurros, 1972; Morangos Silvestres, 1957; Persona, 1966; e O Sétimo Selo, 1957).

PALAVRAS-CHAVE Design gráfico, retórica visual, cartaz conceitual, Ingmar Bergman, cinema.

ABSTRACT The creative process of posters is rarely approached in the history of Design. There is limited bibliography on the theme and movie posters have a commercial tradition, in which the main goal is to seduce the viewer with images of the main actors, with some exceptions. Currently, a more artistic and conceptual view, with predominance of the meaning of the film, is hardly used. In order to obtain more creative and less intuitive results, this project is based on techniques and figures of language that are used to influence emotions and meanings to the receivers through the application of Visual Rhetoric to the creation of five conceptual movie posters from Ingmar Bergman´s films (Fanny and Alexander, 1982; Cries and Whispers, 1972, Wild Strawberries, 1957; Persona, 1966, and The Seventh Seal, 1957).

KEYWORDS Graphic design, visual rhetoric, conceptual poster, Ingmar Bergman, cinema.

SUMÁRIO Lista de ilustrações | 07 1 Introdução | 11 2 Fundamentação Teórica | 13 2.1 Cartaz | 13 2.2 Retórica visual | 20 2.3 Linguagem cinematográfica | 26 2.4 Ingmar Bergman | 33 3 Metodologia | 35 3.1 Processo | 35 3.2 Definições | 37 3.3 Retórica | 41 4 Desenvolvimento | 42 4.1 Pesquisa | 42 4.2 Geração de Ideias | 48 4.3 Geração de Alternativas | 57 4.4 Resultado | 68 4.5 Implementação | 71 5 Considerações finais | 76 Referências | 77

LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 2.1 — Anúncio americano em tipos móveis de madeira, de 1875. (Fonte: http://papress.com/ thinkingwithtype/teachers/type_lecture/history_FullMoon.htm | Acesso em: 10 dez. 2011) | 13 Figura 2.2 — Papier a Cigarettes Job (Jules Chéret, 1889). (Fonte: http://www.yaneff.com/html/ plates/pl1.html | Acesso em: 10 dez. 2011) | 13 Figura 2.3 — Moulin Rouge: La Goulue (Toulouse-Lautrec, 1891). (Fonte: http://www.ibiblio.org/wm/ paint/auth/toulouse-lautrec/ | Acesso em: 10 dez. 2011) | 14 Figura 2.4 — Cartaz com ilustração realista | Casablanca (Michael Curtiz, 1942). (Fonte: http:// tvtropes.org/pmwiki/pmwiki.php/Main/Casablanca | Acesso em: 10 dez. 2011) | 15 Figura 2.5 — Anatomia de um crime (Otto Preminger, 1959). (Fonte: http://www.smartmagna. com/index.php?option=com_k2&view=item&id=48:the-film-postersof-saul-bass-at-kemistrygallery&Itemid=2&lang=en | Acesso em: 10 dez. 2011) | 16 Figura 2.6 — Nie! (Tadeusz Trepkowski, 1953). (Fonte: http://www.moma.org/ | Acesso em: 10 dez. 2011) | 16 Figura 2.7 — Dylan (Milton Glaser, 1967). (Fonte: http://www.miltonglaser.com/ | Acesso em: 10 dez. 2011) | 17 Figura 2.8 — New York School, the first generation (Lou Danziger, 1966). (Fonte: http://www.aiga. org/medalist-louisdanziger/ | Acesso em: 10 dez. 2011) | 17 Figura 2.9 — Fotografia utilizada no cartaz do Festival de Jazz de Frankfurt (Günther Kieser, 1978). (Fonte: http://www.frankfurthigh.com/history/subpages/Frankfurt_Concerts_46to95.htm | Acesso em: 10 dez. 2011) | 17 Figura 2.10 — Cartel Cubano (Raul Martinez, 1970). (Fonte: http://www.artexpertswebsite.com/ pages/artists/martinez-raul.php | Acesso em: 10 dez. 2011) | 18

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Figura 2.11 — Sagmeister Aiga Detroit (Stefan Sagmeister, 1999). (Fonte: http://www.sagmeister. com/ | Acesso em: 10 dez. 2011) | 18

Figura 2.25 — Contra-plongèe | Seven (David Fincher, 1995). (Fonte: Capturada do filme) | 27

Figura 2.12 — Peace (Luba Lukowa, 2001). (Fonte: http://altpick.com/lubalukova | Acesso em: 10

Figura 2.26 — Câmera oblíqua | Cidadão Kane (Orson Welles, 1941). (Fonte: Capturada do filme) | 27

dez. 2011) | 19 Figura 2.27 — Câmera excêntrica | Aos treze (Catherine Hardwicke, 2003). (Fonte: Capturada Figura 2.13 — Solo vocals (Niklaus Troxler, 2004). (Fonte: http://www.troxlerart.ch/ | Acesso em: 10

do filme) | 27

dez. 2011) | 19 Figura 2.28 — Campo e contra-campo | 2046 (Wong Kar-Wai, 2004). (Fonte: Capturada do filme) | 27 Figura 2.14 — As etapas do discurso retórico (JOLY, 1996). (Fonte: JOLY, 1996) | 20 Figura 2.29 — Corte. (Fonte: COSTA, 2009) | 29 Figura 2.15 — As etapas do discurso retórico | design (WAECHTER, 2008). (Fonte: WAECHTER, 2008) | 23

Figura 2.30 — Fade in e fade out. (Fonte: COSTA, 2009) | 29

Figura 2.16 — Classificação geral das figuras retóricas de Durand (1973). (Fonte: DURAND, 1973,

Figura 2.31 — Dissolve. (Fonte: COSTA, 2009) | 29

p. 27) | 24 Figura 2.32 — Cortina. (Fonte: COSTA, 2009) | 29 Figura 2.17 — Plano geral | A sombra de uma dúvida (Alfred Hitchcock, 1943). (Fonte: Capturada do filme) | 26

Figura 2.33 — Ingmar Bergman. (Fonte: http://colunistas.ig.com.br/cinemaetudoisso/2012/05/09/ imperdivel-mostra-do-diretor-ingmar-bergman-tera-a-maior-retrospectiva-de-sua-carreira-no-

Figura 2.18 — Plano conjunto | Interlúdio (Alfred Hitchcock, 1946). (Fonte: Capturada do filme) | 26

ccbb/ Acesso em: 28 dez. 2012) | 33

Figura 2.19 — Plano americano | Por um punhado de dólares (Sergio Leone, 1964). (Fonte: Capturada

Figura 2.34 — Cartaz original do filme Crise (1946), primeiro filme de Ingmar Bergman. (Fonte:

do filme) | 26

http://www.ingmarbergman.se/ | Acesso em: 06 out. 2011) | 34

Figura 2.20 — Plano médio | Sindicato de ladrões (Elia Kazan, 1954). (Fonte: Capturada do filme) | 26

Figura 2.35 — Cena do filme O sétimo selo (Ingmar Bergman, 1957). (Fonte: http://www. ingmarbergman.se/ Acesso em: 06 out. 2011) | 34

Figura 2.21 — Primeiro plano | A rede social (David Fincher, 2010). (Fonte: Capturada do filme) | 26 Figura 2.36 — Esquema das sete etapas de design por Gavin Ambrose e Paul Harris (2011). (Fonte: Figura 2.22 — Primeiríssimo plano | O iluminado (Stanley Kubrick, 1980). (Fonte: Capturada

AMBROSE;HARRIS, 2011, p. 12) | 35

do filme) | 26 Figura 2.37 — Esquema das etapas do projeto pela autora. (Fonte: a autora) | 36 Figura 2.23 — Plano detalhe | 127 horas (Danny Boyle, 2010). (Fonte: Capturada do filme) | 27 Figura 2.38 — Seleção das cenas pela autora. (Fonte: a autora) | 38 Figura 2.24 — Plongèe | Psicose (Alfred Hitchcok, 1960). (Fonte: Capturada do filme) | 27

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Figura 2.39 — Ficha de análise de similares pela autora. (Fonte: a autora) | 39

Figura 2.53 — Campo e contra-campo | Da vida das marionetes (Ingmar Bergman, 1980). (Fonte: Capturada do filme) | 48

Figura 2.40 — Ficha de análise das cenas pela autora. (Fonte: a autora) | 40 Figura 2.54 — Campo e contra-campo | O sétimo selo (Ingmar Bergman, 1957). (Fonte: Capturada Figura 2.41 — Diretrizes para geração de alternativas na metodologia de Design a partir da

do filme) | 48

aplicação de figuras da Retórica Visual de Waechter (2008) adaptadas pela autora (Fonte: WAECHTER, 2008) | 41

Figura 2.55 — Campo e contra-campo | O silêncio (Ingmar Bergman, 1963). (Fonte: Capturada do filme) | 48

Figura 2.42 — Plano detalhe | O rosto (Ingmar Bergman, 1958). (Fonte: Capturada do filme) | 42 Figura 2.56 — Símbolos | A paixão de Ana (Ingmar Bergman, 1969). (Fonte: Capturada do filme) | 48 Figura 2.43 — Primeiríssimo plano | O silêncio (Ingmar Bergman, 1963). (Fonte: Capturada do filme) | 42

Figura 2.57 — Símbolos | Sorrisos de uma noite de amor (Ingmar Bergman, 1955). (Fonte: Capturada do filme) | 48

Figura 2.44 — Plano detalhe | Gritos e sussuros (Ingmar Bergman, 1973). (Fonte: Capturada do filme) | 42

Figura 2.58 — Símbolos | Luz de inverno (Ingmar Bergman, 1963). (Fonte: Capturada do filme) | 48

Figura 2.45 — Primeiríssimo plano | Fanny e Alexander (Ingmar Bergman, 1982). (Fonte:

Figura 2.59 — Símbolos | Morangos silvestres (Ingmar Bergman, 1957). (Fonte: Capturada

Capturada do filme) | 42

do filme) | 48

Figura 2.46 — Plano detalhe | Persona (Ingmar Bergman, 1966). (Fonte: Capturada do filme) | 42

Figura 2.60 — Análse de similares | Crise (Ingmar Bergman, 1946). (Fonte: http://www. ingmarbergman.se | Acesso em: 06 out. 2011) | 44

Figura 2.47 — Iluminação | Gritos e sussuros (Ingmar Bergman, 1972). (Fonte: Capturada do filme) | 42 Figura 2.61 — Análse de similares | A hora do lobo (Ingmar Bergman, 1968). (Fonte: http://www. Figura 2.48 — Iluminação | Quando as mulheres esperam (Ingmar Bergman, 1952). (Fonte:

filmaffinity.com/en/film451511.html | Acesso em: 10 dez. 2011) | 45

Capturada do filme) | 48 Figura 2.62 — Análse de similares | Juventude (Ingmar Bergman, 1951). (Fonte: http:// Figura 2.49 — Iluminação | Persona (Ingmar Bergman, 1966). (Fonte: Capturada do filme) | 48

a2.moovidadb.com/movies/19291 | Acesso em: 10 dez. 2011) | 45

Figura 2.50 — A hora do lobo (Ingmar Bergman, 1968). (Fonte: Capturada do filme) | 48

Figura 2.63 — Análse de similares | A paixão de Ana (Ingmar Bergman, 1969). (Fonte: http:// vargashoy.blogspot.com.br/2011/07/pasion-de-ingmar-bergman-passion-1969.html | Acesso em: 10

Figura 2.51 — O sétimo selo (Ingmar Bergman, 1957). (Fonte: Capturada do filme) | 48

dez. 2011) | 46

Figura 2.52 — Campo e contra-campo | Sede de paixões (Ingmar Bergman, 1949). (Fonte:

Figura 2.64 — Análse de similares | Através de um espelho (Ingmar Bergman, 1961). (Fonte: http://

Capturada do filme) | 48

www.royalbooks.com/pictures/130180.jpg | Acesso em: 10 dez. 2011) | 46

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Figura 2.65 — Resultado da análise de similares. (Fonte: a autora) | 47

Figura 2.81 — Geração de alternativas | Morangos silvestres | Alternativa 2. (Fonte: a autora) | 63

Figura 2.66 — Fotografias para composição dos cartazes (Lana Pinho, 2012) | 48

Figura 2.82 — Geração de alternativas | Persona | Alternativa 1. (Fonte: Capturada do filme) | 64

Figura 2.67 — Ficha de análise | Fanny e Alexander (Ingmar Bergman, 1982). (Fonte: a autora) | 52 Figura 2.68 — Ficha de análise | Gritos e sussuros (Ingmar Bergman, 1972). (Fonte: a autora) | 53 Figura 2.69 — Ficha de análise | Morangos silvestres (Ingmar Bergman, 1957). (Fonte: a autora) | 54 Figura 2.70 — Ficha de análise | Persona (Ingmar Bergman, 1966. (Fonte: a autora) | 55

Figura 2.83 — Geração de alternativas | Referências em Person. (Fonte: Capturada do filme) | 64 Figura 2.84 — Geração de alternativas | Persona | Alternativa 2. (Fonte: a autora) | 65 Figura 2.85 — Geração de alternativas | O sétimo selo | Alternativa 1. (Fonte: a autora) | 66 Figura 2.86 — Geração de alternativas | Referências em O sétimo selo. (Fonte: Capturada do filme) | 66

Figura 2.71 — Ficha de análise | O sétimo selo (Ingmar Bergman, 1957). (Fonte: a autora) | 56 Figura 2.87 — Geração de alternativas | O sétimo selo | Alternativa 2. (Fonte: a autora) | 67 Figura 2.72 — Diretrizes para geração de alternativas na metodologia de Design a partir da aplicação de figuras da Retórica Visual pela autora. (Fonte: a autora) | 57 Figura 2.73 — Geração de alternativas | Fanny e Alexander | Alternativa 1. (Fonte: a autora) | 58 Figura 2.74 — Geração de alternativas | Referências em Fanny e Alexander. (Fonte: Capturada

Figura 2.88 — O sétimo selo | Cartaz final. (Fonte: a autora) | 71 Figura 2.89 — Gritos e sussurros | Cartaz final. (Fonte: a autora) | 72 Figura 2.90 — Morangos silvestres | Cartaz final. (Fonte: a autora) | 73

do filme) | 58 Figura 2.91 — Persona | Cartaz final. (Fonte: a autora) | 74 Figura 2.75 — Geração de alternativas | Fanny e Alexander | Alternativa 2. (Fonte: a autora) | 59 Figura 2.92 — O sétimo selo | Cartaz final. (Fonte: a autora) | 75 Figura 2.76 — Geração de alternativas | Gritos e sussurros | Alternativa 1. (Fonte: a autora) | 60 Figura 2.77 — Geração de alternativas | Referências em Gritos e sussurros. (Fonte: Capturada do filme) | 60 Figura 2.78 — Geração de alternativas | Gritos e sussurros | Alternativa 2. (Fonte: a autora) | 61 Figura 2.79 — Geração de alternativas | Morangos silvestres | Alternativa 1. (Fonte: a autora) | 62 Figura 2.80 — Geração de alternativas | Referências em Morangos silvestres. (Fonte: Capturada do filme) | 62

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1 INTRODUÇÃO Pode-se dizer que o processo de criação de cartazes é pouco abordado na história do design. Há limitada bibliografia sobre o tema, focando-se no cartaz publicitário comercial e na história dos cartazes. Os cartazes cinematográficos também possuem uma tradição comercial, em que o objetivo maior é seduzir o espectador com imagens dos atores principais, com algumas exceções. Atualmente, uma abordagem mais artística e conceitual, com a predominância do significado do filme, é pouco utilizada. Assim, em geral, os cartazes conceituais são pouco analisados, devido ao seu caráter autoral e experimental, e por não participarem do círculo comercial. A partir dessa realidade, este projeto tem como objetivo principal utilizar o campo da Retórica, mais especificamente da Retórica Visual, como método de criação de cartazes conceituais, processo que geralmente é feito intuitivamente. Na Retórica Visual, técnicas e figuras de linguagem são utilizadas para influenciar emoções e significações aos receptores da mensagem através do discurso visual. O corpus deste trabalho, para o qual os cartazes serão produzidos, são os filmes de Ingmar Bergman, um dos cineastas mais importantes da história do cinema, cuja linguagem cinematográfica, de notável referência estética e simbólica, possibilita uma maior riqueza de significados. Especificamente, o projeto tem como objetivo produzir cartazes conceituais para cinco de seus filmes (Fanny e Alexander, 1982; Gritos e Sussurros, 1972; Morangos Silvestres, 1957; Persona, 1966; e O Sétimo Selo, 1957), um para cada, e cada cartaz baseia-se em uma cena do filme correspondente. É necessário reforçar que a Retórica é pouco explorada no campo do design, com raras excessões em abordagens analíticas. Seu estudo ainda é muito atrelado à linguística e sua perspectiva criativa ainda é recente. Assim, a metodologia pode e deve ser modificada quando for necessária. Outro desafio é o corpus do trabalho, que não apenas utiliza o Cinema como temática, e sim como pesquisa e geração de ideias, possibilitando a obtenção dos signficados necessários à criação dos cartazes. Por se tratar de outro campo, o Cinema está aqui focado no que influencia o Design. Logo, ao propor o diálogo entre dois meios de comunicação (o Cinema e o Design Gráfico) através de uma ciência de linguagem (Retórica) torna-se fundamental

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contextualizar estes campos através das particularidades do projeto. Portanto, o projeto é composto por três etapas principais. A primeira etapa compõe toda a fundamentação teórica, que apoiará o processo analítico e projetual. Ela está dividida em quatro segmentos: Cartaz (2.1), seu breve histórico e funções e as particularidades do cartaz conceitual de propaganda; Retórica visual (2.2), breve histórico da Retórica, sua relação com a imagem e o design, e as figuras retóricas visuais; Linguagem cinematográfica (2.3), e os diversos elementos que compõem um filme; e Ingmar Bergman (2.4), sua breve biografia e algumas características. A segunda etapa corresponde à metodologia, sendo composta por três segmentos: Processo (3.1), no qual é esquematizado pelo método de design thinking toda a estrutura projetual; Definições (3.2), primeira etapa do projeto, referente ao briefing e modelos de análise utilizados na pesquisa e geração de ideias; e Retórica (3.3), no que se refere a apresentação do método criativo de Retórica Visual utilizado na geração de alternativas. Na terceira etapa procede-se o desenvolvimento dos cartazes, que é composto por Pesquisa (4.1) e suas análises, tanto das características cinematográficas de Ingmar Bergman, quanto dos similares; Geração de ideias (4.2), no quais são organizadas as informações obtidas na pesquisa, gerando ideias tanto por meios visuais (fotografias referenciais), quanto por análise das cenas dos filmes; Geração de alternativas (4.3) por meio de operações retóricas; Resultado (4.4) final, avaliação e seleção dos cartazes; e por fim Implementação (4.5) por meio das especificações gráficas dos cartazes. O último capítulo refere-se às considerações finais do projeto, no qual são avaliados os resultados e a relevância do processo.

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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 2.1 CARTAZ É difícil a tarefa de definir a origem exata do surgimento do cartaz. O cartaz como meio de divulgação de uma informação, principal e primeira função do cartaz descrita por Moles (1974), pode remontar à Antiguidade, com o aparecimento da escrita. Porém, o cartaz semelhante ao que se conhece hoje, como peça publicitária, surge no século XIX, promovendo principalmente espetáculos e casas de entretenimento, e, posteriormente, todo tipo de serviço ou produto, campanhas e até movimentos políticos. Nomes como Jules Chéret e Toulouse-Lautrec, artistas franceses pioneiros no uso da litografia (gravação em pedra) em cartazes, são exemplos do século XIX, com trabalhos que ficaram famosos por serem considerados obras de arte. A litografia criou o contexto ideal para o surgimento do cartaz moderno, uma vez que viabilizou a reprodução de peças gráficas em escala industrial e com baixo custo. Hollis (2001) explica que, antes da litografia, os cartazes continham imagens simples ou apenas texto, em preto e branco, com uma variedade de tipos móveis já existentes. Assim, o cartaz nasceu da necessidade da difusão da mensagem que se desejou

Figura 2.1 — Anúncio americano em tipos

ilustrar a partir do momento em que a técnica de impressão de imagens avançou e

móveis de madeira, de 1875.

que se tentou passar para o receptor o maior número de elementos em menos tempo. Portanto, o papel da imagem tem maior importância, a partir de que é mais assimilável do que o texto para os mais diversos públicos. Desse modo, o cartaz é um exemplo de uma mensagem da coletividade ao indivíduo e Moles (1974) separa essa mensagem em duas partes necessárias e indissoluvelmente ligadas: a) mensagem semântica ou denotativa, objetiva e traduzível pelo receptor por uma combinação de signos conhecidos. b) mensagem estética ou conotativa, subjetiva e pessoal, mas compreendida Figura 2.2 — Papier a Cigarettes Job (Jules

por um grande número de pessoas.

Chéret, 1889).

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Porém, esta mensagem não é fixa: O cartaz como mensagem da sociedade para o indivíduo não é estática; pela sua repetição em múltiplas cópias postas em diferentes lugares, o cartaz se decalca, pouco a pouco no cérebro dos membros da sociedade para aí se constituir num elemento da cultura. (MOLES, 1974, p. 27)

Como mecanismo social, o cartaz é um meio de comunicação em massa, criado para auxiliar um sistema institucional qualquer. Pode-se definir dois sistemas essenciais de motivação: o circuito comercial, direcionado à venda, à sedução do público, ao despertar de desejos — cartaz publicitário; e o circuito não-comercial, direcionado à estética e à divulgação da mensagem sem necessariamente retorno financeiro — cartaz de propaganda. O segundo pode ser exemplificado como os cartazes produzidos para causas políticas ou sociais, campanhas institucionais, abordagens artísticas/ conceituais, entre outros, e serão o foco deste projeto mais adiante. 2.1.2 Funções do cartaz Moles (1974: 53-57) define seis funções do cartaz: Informação É a primeira função do cartaz, que divulga uma informação. O papel semântico é o essencial. Propaganda ou publicidade Função de convencimento, persuasão e sedução. Apesar de anteriormente serem definidos distintos, a propaganda e a publicidade, independente de seus fins, querem para si a atenção do espectador. Educação Passa certas informações e valores da cultura vigente através de uma abordagem educativa. Ambiência Figura 2.3 — Moulin Rouge: La Goulue (Toulouse-Lautrec, 1891).

É a função do cartaz no ambiente urbano. Projeta-se visando o ambiente e suas condições.

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Estética É o tipo de cartaz que sugere mais do que diz. O papel estético é essencial, atraindo uma série de conotações que, muitas vezes, se sobrepõem às denotações. Criação Função considerada alienante, por criar desejos e fazer desses desejos necessidades. 2.1.3 Cartaz cinematográfico O cartaz foi quase o único material de divulgação da indústria cinematográfica no início da história do cinema. Hoje ele faz parte de uma enorme produção de promoção de um filme, junto com outras peças e objetos. Os cartazes de cinema têm quatro das seis funções enunciadas por Moles (1974): informação, publicidade, estética e criadora. Eles devem informar os nomes do filme, dos atores, do diretor, da produtora etc; seduzir os potenciais espectadores; despertar desejos e sensações que vão além das simples informações. (LIMA, 2008, p. 29)

Assim, pelo caráter de cultura de massa, o cartaz de cinema, na maioria das vezes, foi projetado com uma maior preocupação para a venda do filme frente ao público e o estilo dos cartazes durante toda a história do cinema acabou por ser mais realista, sobretudo o realismo fotográfico, que hoje chega a ser extremamente manipulado pela computação gráfica. Segundo Nakason: Desde a primeira exibição, ocorrida no Grand-Café, em Paris, na França, no ano de 1895, pelas mãos inventivas dos irmãos Auguste e Louis Lumiere, o cartaz cinematográfico Figura 2.4 — Cartaz com ilustração realista | Casablanca (Michael

apresenta, na sua evolução, diversas formas e formatos, chegando até ao que se

Curtiz, 1942).

apresenta, atualmente, nas salas de cinema. Fruto da computação gráfica, observa-se pouco do desenho feito a mão, como ocorria nos primórdios dessa produção. […] Um novo campo de trabalho abria-se para os artistas que estavam dispostos a desenvolver suas ideias, pois, vislumbraram no cinema a oportunidade de expressão, desenvolvendo, assim, novas técnicas voltadas para esse tipo de linguagem, que se diferencia da representação teatral, mas que, ao mesmo tempo, trabalha, também, com atores, cenários, uma história a ser contada, uma ideia, como ocorre com um diretor de teatro. (NAKASON, 2010, p. 2)

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Somente a partir dos anos 1950 o estilo dos cartazes sofreu uma ruptura, com o surgimento de uma nova linguagem gráfica, que abrange uma identidade própria desde os créditos de abertura ao logotipo do cartaz, assim como uma maior redução dos elementos gráficos a fim de concentrar-se no conceito do filme. O pioneiro desse período é Saul Bass, designer estadunidense, que se consagrou com os cartazes de O homem do braço de ouro (Otto Preminger, 1955), Anatomia de um crime (Otto Preminger, 1959) e Êxodus (Otto Preminger, 1960). Porém, esse tipo de cartaz conceitual e comercial é quase inexistente atualmente. O espaço do cartaz conceitual acabou por fazer fronteira com o cartaz de propaganda, não-comercial, como se pontua adiante. 2.1.4 Cartaz conceitual de propaganda A criação do designer, para existir como tal, é inerentemente conceitual, porque o designer utiliza a arte e a comunicação como instrumentos de abstração de uma ideia, de um conceito, para um determinado fim. A partir disso, Beccari (2011) analisa que um fato concreto e um pensamento abstrato fundem-se através de conceitos. Figura 2.5 — Anatomia de um crime

Porém, Meggs e Purvis usam a denominação imagem conceitual para classificar as

(Otto Preminger, 1959).

imagens desenvolvidas pelo design gráfico após a Segunda Guerra Mundial, que não Figura 2.6 — Nie! (Tadeusz Trepkowski, 1953).

transmitiam a informação de forma narrativa como anteriormente: O ilustrador que simplesmente interpretava o texto de um escritor deu lugar a um profissional preocupado com o projeto total do espaço, que trata palavra e imagem de forma integrada e, sobretudo, cria suas próprias afirmações. (MEGGS; PURVIS, 2009, p. 547)

Muitos designers passaram a criar imagens mais pessoais, e explorar novos estilos inspirados nos movimentos artísticos do século XX. Criou-se assim um paradigma até hoje muito indefinido nos estudos do design, que é a dificuldade em identificar as fronteiras entre as artes plásticas e o design. Como discorrido anteriormente, o cartaz de propaganda é o cartaz produzido para causas políticas ou sociais, campanhas institucionais, abordagens artísticas/conceituais, entre outros, sem motivações comerciais. Existe desde o surgimento do cartaz, mas sua abordagem conceitual obteve maior força após a Segunda Guerra Mundial.

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O cartaz conceitual de propaganda possui três das funções enunciadas por Moles (1974) e será o foco do desenvolvimento deste projeto: informação, propaganda e estética. Assim, ele deve divulgar as principais informações e conceitos através de imagens não-narrativas simbólicas, para atrair o público-alvo e criar impacto estético, não necessariamente de beleza, mas também de estranhamento ou humor, geralmente por meio de retórica visual, que será estudada mais adiante. A criação de cartazes conceituais de propaganda foi um enfoque importante do design na Polônia, Estados Unidos, Alemanha e Cuba. Após a Segunda Guerra Mundial, a Polônia foi praticamente destruída e se estabeleceu uma sociedade comunista, cujos clientes eram instituições e indústrias controladas pelo Estado. O primeiro artista de cartaz polonês pós-guerra foi Tadeusz Trepkowski. Seus cartazes tinham como característica a redução de imagens e palavras para que o conteúdo se sobressaísse de forma mais simples. Seu cartaz mais conhecido, de 1953, possui formas sintéticas para simbolizar uma cidade devastada, sobrepostas à silhueta de uma bomba caindo. Figura 2.7 — Dylan (Milton Glaser,

Figura 2.8 — New York School, the first

1967).

generation (Lou Danziger, 1966).

No Estados Unidos a abordagem mais conceitual começou com o grupo de artistas gráficos do Push Pin Studio (Milton Glaser, Reynolds Ruffins e Seymour Chwast), criado durante os anos 1950 em Nova York. O estilo inovador para a época, no qual usava a história da arte e do design gráfico, das pinturas do renascimento às histórias em quadrinhos, como repertório formal fizeram do Push Pin um estilo inconfundível e de influência mundial. Um dos cartazes mais conhecidos é o de Bob Dylan, de 1967, por Milton Glaser. Nele há a silhueta preta do rosto de Dylan e os cabelos coloridos, inspirados no art nouveau, com a palavra ‘Dylan’ quase imperceptível sobre a cor preta. O cartaz foi encartado no disco, transcendendo objeto e função ao se tornar peça simbólica da época. Porém, o Push Pin não possuia o monopólio do cartaz conceitual nos Estados Unidos: Designers como Paul Rand, Lou Danziger, Herbert Leupin e Raymond Savignac incorporaram a técnica de criar uma imagem central para comunicar ideias visuais por meio da união de dois símbolos gerando uma “imagem fundida”. Era um meio de

Figura 2.9 — Fotografia utilizada no

combinar forma e conteúdo e assim criar imagens pregnantes para capas de livros,

cartaz do Festival de Jazz de Frankfurt

cartazes e anúncios. (MEGGS; PURVIS, 2009, p. 547).

(Günther Kieser, 1978).

17

Assim, muitos designers combinavam, por meio de retórica, os aspectos semânticos e estéticos, descritos anteriormente. Isso é visível no cartaz New York School, the first generation (1966), de Lou Danziger, em que tubos de tinta se convertem em arranha-céus. Na Europa, a partir dos anos 1960 até os anos 1990, surge uma abordagem poética do design gráfico baseada na colagem e manipulação de imagens. Os cartazes do mestre alemão desse movimento, Günther Kieser, foram muito famosos por suas imagens fantásticas convicentemente reais. No cartaz de divulgação do Festival de Jazz de Frankfurt de 1978, por exemplo, Kieser faz o tronco de uma árvore assumir a forma de um trompete. Já ao final da Segunda Guerra Mundial, com a divisão dos blocos comunista e capitalista, as nações emergentes da América Latina, Ásia e África foram chamadas de Terceiro Mundo. Nesses países, com o acesso limitado aos meios de comunicação, o cartaz teve papel fundamental na disseminação de ideias e conceitos políticos e sociais. Alguns eram produzidos pelo povo, outros por artistas consumados, mas todos tinham uma característica básica: motivar a população para a luta ideológica. Figura 2.10 — Cartel Cubano (Raul

Figura 2.11 — Sagmeister Aiga Detroit (Stefan

Cuba se tornou um centro importante para o design de cartazes conceituais depois

Martinez, 1970).

Sagmeister, 1999).

que a força revolucionária liderada por Fidel Castro tomou o poder, logo que anteriormente as artes criativas tinham sido praticamente ignoradas pelo regime de Fugêncio Batista. As artes gráficas serviam para promover eventos culturais e seus cartazes utilizavam imagens simbólicas elementares, para serem entendidas facilmente pelo povo e países de diferentes línguas. Como os cubanos eram carentes de tradições artísticas, os designers gráficos cubanos influenciaram-se pelo estilo de outros países, como a arte pop, a psicodelia e o Push Pin Studios. O designer gráfico cubano de maior destaque é Raul Martinez, cujo estilo se assemelhava a dos HQs norte-americanos, de cores intensas. Atualmente, os cartazes conceituais de propaganda estão muito ligados às experimentações dos materiais e suportes, devido à banalização da internet e dos softwares gráficos digitais. O designer austríaco Stefan Sagmeister, que atualmente mora e trabalha em Nova York, usa dos mais diversos materiais e inesperados experimentalismos em seus trabalhos. Sua maior repercussão foi por meio do cartaz feito para a Aiga Detroit (Associação Profissional de Design de Detroit), em que ele 18

usa seu próprio corpo como suporte e todas as informações do cartaz são escritas por cortes em sua pele. Outra designer conceitual importante da atualidade é Luba Lukowa. Artista búlgara que trabalha em Nova York e tem como uma constante o uso de imagens e cores contrastantes, em temas de questões sociais e políticas, como a guerra e a conservação ambiental. Em seu cartaz Peace (2001), várias armas são usadas para compor uma pomba. Já o designer suíço Niklaus Troxler é mais conhecido por seus cartazes conceituais para festivais de música, especificamente de jazz, nos quais as informações muitas vezes são ofuscadas por ilustrações de duplo sentido. Sua ênfase é assumidamente estética, como se pode notar no cartaz Solo vocals (2004), em que o assunto é representado por um simples batom. Figura 2.12 — Peace (Luba Lukowa,

Assim, é possível entender que as mensagens semânticas e estéticas que compõem

2001).

as imagens conceituais dos cartazes de propaganda desenvolveram-se a partir da fusão da cultura popular e da arte moderna. “Ao usurparem das artes gráficas sua função documental, a fotografia e o vídeo reposicionaram a ilustração gráfica rumo a um papel mais expressivo e simbólico.” (MEGGS; PURVIS, 2009, p. 576). Desse modo, a complexidade das ideias políticas, sociais e culturais, e as emoções que os designers Figura 2.13 — Solo vocals (Niklaus Troxler, 2004).

precisam comunicar, podem ser mais eficazes pela imagem icônica e simbólica do que pela imagem narrativa.

19

2.2 RETÓRICA VISUAL 2.2.1 Retórica A Retórica é uma disciplina que surgiu no ensino dos sofistas na Grécia antiga, no século V a. C., com o objetivo de preparar oradores para discursos e debates em público, envolvendo a oratória e eloquência. A Retórica era ligada a três campos: o político, o jurídico e o religioso, referindo-se tanto à estrutura quanto à formulação estilística, dicção, gestualidade em reuniões públicas, festas, entre outros. A fala, e posteriormente a escrita, tinha como alvo a persuasão da audiência. Assim, o êxito consistia na eficácia dos argumentos e recursos estilísticos, que nem sempre eram verdadeiros (BONSIEPE, 1997). O tema tem sido estudado sob os mais variados aspectos desde a Antiguidade, e de acordo com a época suas implicações sofreram diferentes abordagens, críticas e elogios. Segundo Almeida e Nojima (2010), Aristóteles, um dos primeiros a teorizar a Retórica, discerniu os meios de persuasão, creditando que é pelo discurso que se persuade, apresentando o que é verdade, ou pelo menos que pareça ser verdade. Sócrates a via como a “arte de fingir” (GRUSZYNSKI, 2007), senso comum até nos dias de hoje no estereótipo do discurso falacioso, artificial, enganoso. Já Nietzsche afirmou que: [...] não há linguagem sem retórica. A Retórica é um aperfeiçoamento dos artifícios já presentes na linguagem, que em si é a resultante de “artes puramente retóricas” (NIETZSCHE [1844-1900], 1995, p. 44 apud ALMEIDA; NOJIMA, 2010, p. 16).

No que se refere à eloquência, cinco passos para formulação do discurso retórico são encontrados: invenção, disposição, elocução, memória e ação (figura 2.14). Invenção é a descoberta de argumentos que pode ser via convencimento ou comoção; Disposição é o arranjo de ideias; Elocução é a descoberta da expressão apropriada para cada ideia, que inclui o estudo das figuras retóricas; Memória é a memorização invenção

disposição

elocução

memória

ação

do discurso; e Ação, é a apresentação do discurso para uma audiência, envolvendo

inventio

dispositio

elocutio

memoria

actio

gestos, dicção, entre outros (JOLY, 1996).

Figura 2.14 — As etapas do discurso retórico (JOLY, 1996).

20

A parte da Retórica que mais evoluiu foi a elocução. Ela é dividida em paradigma (seleção de palavras) e sintagma (arranjo das palavras em frases). As figuras de linguagem correspondem ao arranjo sintático, na substituição de uma palavra por outra produzindo um novo sentido, uma nova conotação.

2.2.2 Retórica Visual Partindo da premissa nietzcheana de que não há linguagem sem retórica e considerando que a visualidade também é uma linguagem, assim como a linguística, é possível considerar que a imagem também tenha sua própria retórica. Essa abordagem inicia-se no começo do século XX, nos estudos de literatura e da arte, em que se deixa de lado a concepção de que a Retórica se restringe a adornos de um discurso vazio de conteúdo. É necessário considerar também os estudos da teoria da imagem e semiótica para uma maior compreensão dos estudos de significação da imagem. Apesar de existirem diversas teorias da imagem, a teoria da semiótica aborda a imagem sob o ângulo da significação. As origens da semiótica remontam à Antiguidade grega, mas seu estudo como “ciência do signos”, batizada inicialmente de semiologia ou semiótica, é uma ideia do início do século XX e seus maiores precursores são o linguista suíço Ferdinand de Saussure e o cientista americano Charles Peirce. Joly (1996) diferencia os termos “semiótica” e “semiologia”: [...] o primeiro, de origem americana, é o termo canônico que designa a semiótica como filosofia das linguagens. O uso do segundo, de origem europeia, é mais bem compreendido como o estudo das linguagens particulares (imagem, gestos, teatro, etc.). Os dois nomes foram fabricados a partir do termo grego semeion, que quer dizer “signo”. (JOLY, 1996, p. 30)

Saussure considerava que a língua não era o único sistema de signos que exprimia ideias, mas imaginou a semiologia como uma ciência geral dos signos em que a linguística se estabeleceria como o padrão geral de qualquer tipo de linguagem. Essa “supremacia do modelo linguístico”, encontrada também na Retórica, não foi utilizada por Peirce, que não priorizou a linguística como padrão geral e sim a utilizou como participante de uma teoria geral dos signos (semiotics). Para ele, o signo é algo que está no lugar de alguma coisa para alguém, em alguma relação ou alguma 21

qualidade. “Vê-se, portanto, que tudo pode ser signo, a partir do momento em que dele deduzo uma significação que depende de minha cultura, assim como do contexto de surgimento do signo” (JOLY, 1996, p. 33). Para Peirce não existe signo puro, porém para distinguir os signos uns dos outros, propôs uma classificação complexa e bastante conhecida: •

Ícone: o que é representado visualmente (significante) mantém uma relação de analogia com o que se quer representar (referente). Ex.: fotografia, síntese de uma imagem, etc.



Índice: o que é representado visualmente (significante) se refere ao objeto denotado (referente) em virtude de ser realmente afetado por esse objeto. Ex.: fumaça e fogo, pegadas e pés, etc.



Símbolo: o que é representado visualmente (significante) mantém uma relação de convenção com o que se quer representar (referente). Ex.: bandeiras para país, pomba para paz, etc.

Considerando que a imagem é, antes de tudo, algo que se assemelha ou evoca algo, ou seja, possui uma analogia inerente a sua constituição, então ela é percebida como signo. Assim, é possível confirmar que a imagem é naturalmente retórica ao evocar e representar algo ou alguma ideia. Durand (1973 apud WAECHTER, 2008) e Ricarte (1998 apud WAECHTER, 2008) afirmaram que Roland Barthes foi o primeiro a analisar a imagem publicitária com auxílio de conceitos retóricos, em 1964 no nº 4 de Comunications, levando-o a lançar as bases de uma retórica da imagem. Neste estudo foi possível encontrar todas as figuras clássicas de retórica, ficando claro que ideias criativas podem surgir da transposição das figuras retóricas na imagem. Porém, no Design, mais especificamente no Design Gráfico, em que a visualidade é o principal canal da informação e da significação, há pouca teoria que o leve a delimitar sua própria natureza e independência dentro de seu caráter multidisciplinar. Segundo Bonsiepe (1997), a Retórica é um dos campos menos pesquisados do design, embora seja inerente à prática do mesmo.

22

Waechter (2008), a partir da observação e da aplicação de esquemas metodológicos

PROCESSO DA RETÓRICA | PROCESSO DE DESIGN

propostos por vários estudiosos da metodologia de design, percebeu que esses estudos não contemplam o uso de ferramentas e diretrizes que orientam a fase criativa de forma efetiva. Apesar de existir técnicas criativas como o brainstorming,

invenção

disposição

elocução

memória

ação

nota-se que a maioria dos designers utiliza principalmente as informações coletadas

inventio

dispositio

elocutio

memoria

actio

do briefing para dar início à geração de alternativas. Bonsiepe (1997) inclusive ressalta

(1)

(2)

(3)

(4)

(5)

que as figuras retóricas em geral são aplicadas para análise de artefatos gráficos e não como instrumento para o processo criativo.

(1) Procura de argumentos | no design corresponde ao briefing e pesquisa. (2) Organização do discurso | no design corresponde à organização dos dados e planejamento do projeto. (3) Elaboração da mensagem | no design corresponde à execução do projeto, através da criatividade na escolha dos partidos conceituais e visuais, assim como adequação do mesmo ao usuário e ao meio em que será vinculado. (4) Memorização do discurso | no design corresponde às diretrizes para registro e produção de artefatos criados. (5) Apresentação do discurso | no design corresponde à apresentação do projeto de design, comunicando os resultados obtidos. Figura 2.15 — As etapas do discurso retórico | design (WAECHTER, 2008).

Ricarte (1998 apud WAECHTER, 2008) com base na análise de Barthes (1964), aproxima as etapas do discurso retórico com a publicidade, e Waechter (2008) o adapta para o processo de criação em design (figura 2.15). Waechter (2008) conclui, então, que no processo criativo de design as etapas do discurso são semelhantes. A linguagem visual possui formas, planos, volumes, famílias tipográficas, entre outros elementos que são arranjados pelo designer para obedecer ou evocar uma conceituação determinada. Assim, a Retórica e suas figuras de linguagem cabem perfeitamente à geração de alternativas da metodologia de design. Durand (1973) propôs uma matriz em que são classificadas as maiorias das figuras retóricas utilizadas em artefatos de design e publicidade, e suas relações com os elementos variantes (os elementos da linguagem visual). Ela é indispensável para a melhor compreensão das operações retóricas e suas funções, facilitando assim o processo de design na aplicação das mesmas. (figura 2.16).

2.2.3 Figuras Retóricas Visuais As figuras retóricas propostas por Durand (1973), aqui chamadas de figuras retóricas visuais por sua aplicação em design e publicidade, são divididas em quatro operações fundamentais: 1.

Figuras de Adjunção: adiciona-se um ou mais elementos à composição. Repetição: adição de elementos iguais. Rima: adição de elementos similares em forma e diferentes em conteúdo Comparação: adição de elementos diferentes em forma e similares em conteúdo Acumulação: adição de elementos diferentes. 23

Emparelhamento: adição de elementos opostos em forma.

classificação geral das figuras retóricas

Antítese: adição de elementos opostos em conteúdo. Antanáclase: adição de elementos similares em forma, mas diferentes em

Relação entre Elementos Variantes

conteúdo (duplo sentido).

Operação Retórica Adjunção

Supressão

Substituição

Troca

Paradoxo: adição de elementos opostos em forma, mas similares em conteúdo (paradoxo).

Identidade

Repetição

Elipse

Hipérbole

Inversão

Similaridade

Rima

Circunlóquio

Alusão

Hendíadis

de forma

Comparação

Metáfora

Homologia

de conteúdo

2. Figuras de Supressão: suprime-se um ou mais elementos da composição. Elipse: supressão de elementos. Circunlóquio: supressão de elementos relacionados a outros elementos da mensagem por relação de similaridade.

Diferença

Acumulação

Suspensão

Metonímia

Assíndeto

Suspensão: supressão de elementos para retardar e diferenciar a mensagem.

Oposição

Emparelhamento

Dubitação

Perífrase

Anacoluto

Dubitação: supressão de elementos opostos em forma.

de forma

Antítese

Reticência

Eufemismo

Quiasmo

Reticências: supressão de elementos opostos em conteúdo. Tautologia: supressão de elementos para destacar a superioridade de um único

de conteúdo Falsas

Antanáclase

Tautologia

Trocadilho

Antimetábole

Homologias

Paradoxo

Preterição

Antífrase

Antilogia

duplo sentido paradoxo Figura 2.16 — Classificação geral das figuras retóricas de Durand (1973).

elemento (duplo sentido). Preterição: supressão de elementos em detrimento dos mesmos (paradoxo). 3. Figuras de Substituição: substitui-se um ou mais elementos na composição. Hipérbole: substituição de elementos pelo exagero. Alusão: substituição de elementos similares em forma. Metáfora: substituição de elementos similares em conteúdo. Metonímia: substituição de elementos pela diferença de uma parte pelo todo. Perífrase: substituição de elementos opostos em forma. Eufemismo: substituição de elementos opostos em conteúdo. Trocadilho: substituição de elementos similares em forma e opostos em conteúdo (duplo sentido). Antífrase: substituição de elementos similares em conteúdo, e opostos em forma (paradoxo). 4. Figuras de Troca: trocam-se dois ou mais elementos entre si na composição. Inversão: troca de elementos iguais, modificando, invertendo ou deformando. Hendíadis: troca de elementos similares em forma, e diferentes em conteúdo. Homologia: troca de elementos similares em conteúdo, e diferentes em forma. Assíndeto: troca de elementos diferentes. 24

Anacoluto: troca de elementos opostos em forma. Quiasmo: troca de elementos opostos em conteúdo. Antimetábole: troca de elementos similares em forma, mas diferentes em conteúdo (duplo sentido). Antilogia: troca de elementos opostos em forma, mas similares em conteúdo (paradoxo). A partir dos estudos aqui proferidos admite-se que a figura é uma operação que desloca a linguagem de um nível a outro, expondo algo de uma maneira ‘figurada’, quando poderia ser dito de uma maneira direta, assim como a imagem o faz, mesmo quando o significante se aproxima do real. Portanto, as operações retóricas são instrumentos importantes no processo criativo, e serão utilizadas como método criativo nas etapas de geração de alternativas dos cartazes adiante.

25

2.3 LINGUAGEM CINEMATOGRÁFICA 2.3.1 Plano “Um dos principais elementos da linguagem cinematográfica é o plano. O filme é constituído de planos, como uma casa de tijolos.” (COLODA; VIAN, 1972, p. 39). Cada arte possui linguagem própria. Assim como a literatura usa palavras e frases, o cinema fala pela imagem luminosa em movimento, constituída de planos. Bernardet (1985) define o plano como um trecho de filme rodado ininterruptamente, ou que parece ter sido rodado sem interrupção. Uma imagem entre dois cortes. Figura 2.17 — Plano geral | A sombra de uma

Figura 2.18 — Plano conjunto | Interlúdio

dúvida (Alfred Hitchcock, 1943).

(Alfred Hitchcock, 1946).

Existem diversos planos. Bernardet (1985) define como principais: Plano geral (PG) Plano descritivo que serve para ambientar o espectador, abrangendo assim uma ampla realidade espacial. Exemplos: cenários naturais, paisagens, multidão, cidade, entre outros (figura 2.17). Plano conjunto (PC) Plano que mostra um grupo de personagens ou objetos e sua interação com o ambiente. Também pode se tratar de um único personagem, com o corpo inteiro tomando toda a tela (figura 2.18).

Figura 2.19 — Plano americano | Por um

Figura 2.20 — Plano médio | Sindicato de

punhado de dólares (Sergio Leone, 1964).

ladrões (Elia Kazan, 1954).

Plano americano (PA) Corta os personagens na altura do joelho (figura 2.19). Plano médio (PM) Os personagens são visualizados na altura da cintura, ou o tamanho do objeto é moderado (figura 2.20). Primeiro plano (PP) [close] Também conhecido como close, corta a personagem na altura do busto ou mostra um objeto numa escala relativamente grande (figura 2.21).

Figura 2.21 — Primeiro plano | A rede social

Figura 2.22 — Primeiríssimo plano | O

(David Fincher, 2010).

iluminado (Stanley Kubrick, 1980).

26

Primeiríssimo plano (PPP) [close-up] Primeiríssimo plano ou close-up, corta a personagem na altura do pescoço, enfatizando o rosto (figura 2.22). Plano detalhe [extreme close-up] Plano detalhe mostra parte de um corpo de um personagem ou apenas um detalhe de um objeto. (figura 2.23) Figura 2.23 — Plano detalhe | 127 horas (Danny

Figura 2.24 — Plongèe | Psicose (Alfred

Boyle, 2010).

Hitchcok, 1960).

2.3.2 Angulação Coloda e Vian (1972, p. 47) explicam que no “início do cinema não havia preocupação em dar aspectos diferentes à imagem. Colocavam a câmera à frente dos personagens, casas, etc., de maneira que pudessem vê-las inteiras. Só mais tarde houve preocupação em dar novas posições à câmera”. Assim, dependendo da angulação da câmera, é possível somar expressões e significados à cena. Existem diversos ângulos. Coloda e Vian (1972) definem como principais:

Figura 2.25 — Contra-plongèe | Seven (David

Figura 2.26 — Câmera oblíqua | Cidadão Kane

Fincher, 1995).

(Orson Welles, 1941).

Ângulo normal É o ângulo situado na mesma altura do personagem ou objeto. É o olhar de quem olha em linha horizontal, na mesma linha do objeto filmado. Plongèe (câmera alta) A câmera situa-se mais alta do que o olhar. Como a cena é vista de cima para baixo, pode-se exprimir um sentimento de inferioridade ao objeto filmado, como também destacar um personagem ou situação (figura 2.24).

Figura 2.27 — Câmera excêntrica | Aos treze

Figura 2.28 — Campo e contra-campo | 2046

(Catherine Hardwicke, 2003).

(Wong Kar-Wai, 2004).

Contra-plongèe (câmera baixa) A câmera situa-se abaixo do olhar. O personagem assim é filmado de baixo para cima, criando-se uma atmosfera de superioridade ao que está sendo representado (figura 2.25). Câmera oblíqua (inclinada) A filmagem se dá obliquamente, ou seja, com a câmera inclinada, criando desequilíbrio do cenário, personagens e objetos (figura 2.26).

27

Câmera excêntrica (tonta, circular) Filma-se fazendo movimentos circulares com a câmera, criando efeito de vertigem e tontura (figura 2.27). Campo e contra-campo Esses tipos de angulações são utilizados quando se tomam cenas de diálogos. O personagem que fala, normalmente, é visto de frente (campo) e o que escuta, de costas (contra-campo). Outras vezes é filmado só o personagem que escuta, a fim de vermos as suas reações (figura 2.28). 2.3.3 Movimentos de câmera Os movimentos de câmera são ações executadas com uma câmera cinematográfica ou de vídeo através de trilhos, gruas e outros mecanismos para modificar uma cena ou acompanhar uma ação. Travelling Movimento no qual a câmera se movimenta de forma linear, deslocando o eixo sobre o qual está apoiada, aproximando-se ou afastando-se dos elementos de uma cena. O movimento pode se dar para os lados, para a frente e para trás ou para cima e para baixo. O efeito proporcionado por um travelling para frente e para trás assemelhasse ao efeito de zoom, obtido com as lentes da câmera, porém no zoom não há alteração entre as posições relativas das figuras presentes em uma cena. Quem criou esse movimento foi o diretor David Wart Griffith, em 1915, colocando a câmera num carrinho. Panorâmica (Pan horizontal) Este movimento descreve uma cena horizontalmente, podendo ser da esquerda para direita, ou da direta para esquerda. Equivale à cabeça que gira sobre o pescoço para ver tudo o que pode. A câmera gira sobre seu eixo captando a cena. Tilt (Pan vertical) É o movimento panorâmico que descreve um objeto, um prédio, uma pessoa no sentido vertical. Ele pode ser usado de cima para baixo, ou de baixo para cima. Grua Esse tipo de movimento consiste de um sobrevôo da câmera acima dos cenários e atores por meio de um suporte, como um guindaste. 28

Câmera na mão É o tipo de movimento em que a câmera é controlada manualmente, sem uso de tripé, ou outro artifício para estabilizá-la. O efeito mais livre e subjetivo desse tipo de movimento aproxima mais a plateia do filme, através de um personagem ou da própria presença invisível. Câmera parada É um plano fixo em que a câmera fica parada durante toda a cena ou parte dela. Figura 2.29 — Corte.

Zoom (in ou out) Não é um movimento de câmera propriamente dito, mas sim de suas lentes. Porém, seu resultado é semelhante a um movimento de câmera. O zoom in aproxima a imagem e o zoom out distancia a imagem. 2.3.4 Técnicas de transição de planos e cenas “Nos dias de hoje existem diversos tipos de efeitos de transição que são utilizados em filmes, no entanto neste caso são destacados apenas as quatro formas básicas de transição entre planos/cenas que [...] deram origem a todos esses efeitos que são utilizados hoje em dia [...]”. (COSTA, 2009, p. 4).

As quatro formas de transição são: Figura 2.30 — Fade in e fade out.

Corte [cut] É a técnica de edição mais simples, que provoca uma mudança instantânea de um plano para outro. Fade É uma transição gradual, mais acentuada que o corte, e consiste em fade in e fade out. O fade in é a transição em que uma tela escura ilumina-se enquanto um plano aparece. O fade out é o desaparecimento de um plano enquanto a tela escurece (os fade-outs também podem se iluminar para o branco ou para uma cor). Dissolve Dissolve é a transição gradual entre dois planos, durante o qual a primeira imagem Figura 2.31 — Dissolve.

Figura 2.32 — Wipe.

desaparece enquanto a outra aparece. 29

Wipe O wipe, ou cortina, é um efeito de transição que envolve tal como no dissolve da substituição gradual de um plano para outro. Porém, não existe a mistura das imagens como no dissolve. Uma imagem entra enquanto outra sai, através de uma linha ou forma variada. 2.2.5 Unidades do filme Coloda e Vian (1972) dividem o filme em: partes, sequências, cenas, planos e fotogramas. Parte As partes do filme pertencem ao enredo e às suas mudanças temáticas, semelhantes às partes das peças teatrais. Sequência A sequência de um filme é uma extensão completa de uma ação. Pode ser uma cena excepcionalmente longa ou um conjunto de cenas sucessivas, tendo entre si nexo pelo conteúdo cênico, dramático, psicológico, com unidade de sentido e tempo real. Não há necessidade que haja unidade de lugar, pode ser em diversos locais. Cena É um conjunto de tomadas que se realizam com unidade de tempo e lugar. Pode haver um ou mais planos. Plano O plano é a menor unidade dramática do filme. É uma tomada sem mexer a câmera e as lentes. Fotograma (frame) Fotograma, ou frame é cada uma das pequenas fotografias que são impressas na película. Normalmente cada película é filmada e projetada numa velocidade de 24 fotogramas por segundo, variando a quantidade quando for câmera lenta ou rápida. 2.3.6 Elementos cinematográficos Coloda e Vian (1972) definem como elementos cinematográficos os elementos que entram na filmagem: o estúdio, o cenário, a iluminação, o som, a música e os diálogos.

30

Estúdio O estúdio é a área onde está tudo o que é necessário para a construção da filmagem. Quando a filmagem não é feita em estúdio, ao ar livre, depende-se da iluminação natural do ambiente, assim como de uma maior estrutura de transporte de equipamentos e equipe, o que exige maior tempo de produção. Cenário O cenário é o local onde se desenrolam as ações, as cenas. A escolha correta do local de filmagem e seus elementos cabe grande parte da narrativa do filme. As sensações experimentadas pelo espectador são causadas não só pelas ações dramáticas dos atores, mas também pelo ambiente em que se realizam. Assim, o cenário além de ser o local onde se desenrolam os acontecimentos, serve para caracterizar os personagens. Os cenários podem ser naturais, quando se utiliza aquilo que já está construído pela natureza ou pelo homem, ou artificiais, quando construídos para as filmagens. Iluminação A luz é o princípio vital do cinema, indispensável para obter uma boa fotografia. Luzes e sombras complementam-se, contrastam-se e acentuam-se abrandando o efeito total. A iluminação pode ser dirigida, controlada e multiplicada de acordo com a cena, para transformar um cenário, uma cena, um rosto, ou pondo em evidência um detalhe. Som No cinema o som serve como complemento à imagem, dramática ou psicologicamente. Ele deve depender da imagem. Ruídos, apitos, barulhos, entre outros, se configuram como sonoplastia, muitas vezes sugestionando alguma imagem invisível, como o apito do trem sem o mesmo em cena. Essa função subjetiva muitas vezes substitui o personagem ou objeto. Música Nos primeiros anos do cinema mudo, a música era usada como acompanhamento, orquestradas por músicos ao vivo. Assim, nem sempre a música correspondia à ação do filme (cenas lentas e música ligeira). Com o surgimento do cinema sonoro, ela foi integrada ao filme. Assim como o som, ela complementa a linguagem das imagens, passando maior dramaticidade, poeticidade e autenticidade, ou sugerindo ideias que complementem a trama. 31

Diálogo O diálogo é a conversa dos personagens. Suas palavras servem para complementar e esclarecer a imagem. Símbolos do cinema Coloda e Vian (1972, p. 121) definem o símbolo como “[...] um objeto ou alguma outra coisa que tem um significado moral, psíquico, além do próprio.” Flores, velas, quadros, pássaros, entre outros, podem ter uma significação simbólica, caracterizando os personagens ou situações no decorrer da trama de um filme. Exemplo: uma moça que gosta de cinema, no ambiente onde vive, terá cartazes de filmes preferidos, fotografias de atores, entre outros. A imagem fala. É preciso entendê-la. Ir além das palavras e diálogos. Saber ler o movimento das imagens. Saber captar os símbolos e seu significado. Não sabendo ler as imagens e não entendendo os símbolos, é difícil captar a linguagem cinematográfica. Não devemos pensar que em cinema seja tudo símbolo, é preciso ver o contexto do filme. (COLODA; VIAN, 1972, p. 121).

Portanto, Bernardet (1985) observa que é necessária a compreensão de que os elementos da linguagem cinematográfica não têm em si significação exata e fixa: a significação depende essencialmente da relação que se estabelece com outros elementos. A câmera baixa pode heroizar uma figura se a filmar contra um fundo azul, mas o sentido pode ser invertido se o fundo for um imenso prédio cinzento, expressando assim opressão devido ao pequeno tamanho do homem em relação ao prédio. Cada diretor tem sua maneira particular de representar ideias, conceitos, acontecimentos ou atitudes. É preciso interpretar as imagens, símbolos e outros elementos e linguagens cinematográficas como ângulo de câmera, iluminação, cenário, movimentos de câmera, entre outros, para um melhor entendimento desses significados. Daí a necessidade de se estudar o diretor do filme.

32

2.4 INGMAR BERGMAN Ernest Ingmar Bergman nasceu em 14 de julho de 1918, em Uppsala, Suécia. Filho de um pastor luterano, recebeu uma educação muito rígida, mas isso não o impediu de se tornar uma das maiores referências cinematográficas. Bergman alterou radicalmente o significado e a natureza do filme, transformando-o numa arte capaz de provocar o espectador para inúmeros questionamentos existenciais humanos, como fé, morte, medo, entre outros, atenuados por uma linguagem poética. A riqueza de detalhes dos filmes de Bergman tinha como objetivo comover as pessoas, mostrando o que realmente acontece além da superfície: Bergman trouxe para o cinema um novo sentido de intimidade emocional, unindo conceitos Freudianos da Psicoterapia com uma sensibilidade encontrada em metáforas visuais, flashbacks, planos detalhe (extreme closeups) e iluminação diferenciada por uso inteligente de sombras e contrastes. (ANKENY, [entre 1996 e 2001], tradução nossa).

Figura 2.33 — Ingmar Bergman.

Nas duas primeiras décadas do cinema o público ignorava a figura do diretor. A atenção estava direcionada aos atores e gênero da produção. Bergman foi um dos primeiros diretores a usar a câmera como meio de expressão pessoal, caracterizando o ‘cinema de autor’, termo muito utilizado para “distinguir cineastas cuja obra tem uma força de afirmação pessoal em termos de estilo e tema” (BERGAN, 2010, p. 112). Uma característica marcante do seu trabalho foi manter uma equipe fixa durante toda a produção dos seus mais importantes filmes, incluindo nomes legitimados, que ficaram registrados na história da sétima arte como o fotógrafo Sven Nykvist e os atores Gunnar Björnstrand, Liv Ullmann, Erland Josephson, Ingrid Thulin, Bibi Andersson e Max von Sydow. Bergman estudou na Universidade de Estocolmo, onde se interessou por teatro e, mais tarde, por cinema — inicialmente como revisor de roteiros. Seu primeiro trabalho foi a peça de teatro Morte de Kasper, em 1941. Em 1943 começou a trabalhar no departamento de roteiros do Svensk Filmindustri, com sua peça Tormento sendo adaptada para o cinema no ano seguinte pelo cineasta Alf Sjöberg. Sua estreia como diretor de cinema foi realizada com o filme Crise (1946), e a partir daí, Bergman dirigiu, Figura 2.34 — Cartaz original do filme Crise

em média, um filme por ano.

(1946), primeiro filme de Ingmar Bergman.

33

Seu reconhecimento como um dos maiores cineastas de todos os tempos deve-se a sua considerada obra-prima O sétimo selo (1956), no qual ganhou o Prêmio do Júri do Festival de Cannes. Este filme contém uma das cenas mais memoráveis do cinema, em que o ator Max Von Sydow se opõe à Morte em um jogo de xadrez. Ao fugir das explorações românticas e idealistas dos trabalhos anteriores, Bergman procurou analisar as relações do homem com Deus e a Morte, tema este que acabou estando presente por toda sua obra. A década de 60 foi outra fase de ouro para o cineasta. Os filmes dessa época foram os mais experimentais de sua carreira. A configuração medieval de O sétimo selo reapareceu em 1960, com A fonte da donzela, um controverso ensaio sobre estupro, que ganhou um Oscar de Melhor Filme Estrangeiro. Já em 1966 Persona trouxe uma intensa meditação sobre a identidade, o que mais tarde revelou-se como um exame da natureza do próprio cinema. Em 1971, Bergman foi convidado a trabalhar nos Estados Unidos, dirigindo A hora do amor, considerado como um resultado com pouco vulto e que o fez retornar para Suécia para realizar obras inesquecíveis como Gritos e sussurros (1972), Cenas de um casamento (1973) e Sonata de outono (1978). Em 1982, Bergman anunciou sua aposentadoria do cinema, lançando como despedida o filme Fanny e Alexander, um retrato autobiográfico de sua infância, ganhador do Oscar e Globo de Ouro na categoria Melhor Filme Estrangeiro. Porém, ele continuou a fazer filmes para a TV até 2003, em que dirige Saraband, seu último filme. No documentário Bergman and the Faro Island Bergman justifica um dos temas mais recorrentes de seus filmes, a infância, comparando-a com sua profissão: “Eu ainda tenho conexões muito diretas com minha infância. Eu imagino que é por isso que eu ainda gosto de jogar, quero dizer, minha profissão é um tipo de jogo”. (Marie Nyreröd, 2004, tradução nossa). Ingmar Bergman faleceu em 30 de julho de 2007, deixando um legado de mais de 70 filmes (entre direção, produção e roteiro) em 60 anos de carreira. Figura 2.35 — Cena do filme O sétimo selo (Ingmar Bergman, 1957).

34

3 METODOLOGIA 3.1 PROCESSO Na pesquisa de Waechter (2008) aponta-se a utilização do briefing como o principal instrumento dos designers no processo metodológico de design. Ele é indispensável porque responde a maioria das questões necessárias para o planejamento do projeto. Harris e Ambrose (2011) sistematizam esse planejamento num processo semelhante às etapas do processo retórico pontuado anteriormente, as etapas do pensamento do design, ou design thinking (figura 2.36).

definir

pesquisar

gerar ideias

briefing

histórico

soluções

testar protótipos resolução

selecionar

implementar

aprender

justificativa

entrega

feedback

Figura 2.36 — Esquema das sete etapas de design por Gavin Ambrose e Paul Harris (2011).

35

Considerando que o presente trabalho não possui um briefing externo definido, e sim direcionado por um método de pesquisa de origem empírica, a primeira etapa ‘Definir’ fará parte da metodologia no que concerne à definição geral dos objetivos e critérios do projeto, assim como à análise das cenas. A última etapa ‘Aprender’, apesar de suprimida, ocorre ao longo de todo o processo de design. Assim, adaptando o modelo para os objetivos do projeto, o processo é composto por cinco etapas principais (figura 2.37). Os nomes das etapas foram adaptados a fim de padronização. ‘Testar protótipos’ é a etapa de execução e testes das ideias, o mesmo que ‘Geração de Alternativas’ e ‘Selecionar’ é a seleção dos resultados e justificativas, portanto a considerei como ‘Resultado’.

Definição

Pesquisa

Geração

Geração de

Resultado

Implementação

de Ideias

Alternativas

Fotografias

Operações

Avaliação

Apresentação

Definições

Análise das

gerais

características

retóricas

qualitativa

cinematográficas

(10 alternativas)

e seleção

de Ingmar

dos cartazes

Bergman

Seleção da

Análise

Análise

amostragem

de similares

das cenas

Definições de análise Figura 2.37 — Esquema das etapas do projeto pela autora.

36

3.2 DEFINIÇÕES 3.2.1 Definições Gerais O projeto produz uma série de cartazes retóricos conceituais para cinco filmes de Ingmar Bergman (Fanny e Alexander, 1982; Gritos e Sussurros, 1972; Morangos Silvestres, 1957; Persona, 1966; e O Sétimo Selo, 1957), com o objetivo de experimentar o uso consciente de operações retóricas na metodologia de criação em design. Não há um público alvo totalmente definido, já que o cinema abrange uma grande quantidade de pessoas, provenientes de lugares e culturas diferentes, mas devido ao partido cinematográfico em questão, é possível definir um público geral e um público específico. O geral abrange o público de cinema, e o específico os chamados “cinéfilos” e admiradores do diretor em questão, que possuem um conhecimento prévio do estilo do mesmo. O formato dos cartazes deve ser de 1000 x 700 mm e como cartaz conceitual de propaganda deve possuir três das funções enunciadas por Moles (1974): informação, propaganda e estética. Ou seja, a motivação comercial é suprimida para uma diferenciação de resultado. A estética deverá corresponder aos resultados das análises (características de Bergman, similares e cenas dos filmes). Os cartazes também devem possuir um mínimo de características em comum, que os façam percebidos como uma série. 3.2.2 Seleção da amostragem Ingmar Bergman é um dos mais importantes cineastas na história do cinema mundial, não somente qualitativamente quanto quantitativamente: sua produção criativa soma mais de 300 trabalhos para cinema, TV, teatro, rádio e publicações. Devido à quantidade da amostra, foi definido que o critério para a seleção dos filmes para este projeto seria a abrangência, ou seja, reconhecimentos e prêmios. Assim, foram pesquisados os prêmios de sua filmografia, constatando-se que Fanny e Alexander, 1982; Gritos e Sussurros, 1972; Morangos Silvestres, 1957; Persona, 1966; e O Sétimo Selo, 1957, se encaixavam nos critérios estabelecidos. Para uma melhor compreensão dos filmes foram definidas cenas icônicas para serem analisadas e gerarem significados (figura 2.38). 37

3.2.3 Definições de análise No projeto há três análises principais que embasam o processo criativo: análise das características cinematográficas de Ingmar Bergman, análise de similares e análise das cenas. Devido ao caráter projetual do presente projeto, as análises devem ser breves, porém pontuais. A análise das características cinematográficas de Bergman é fundamentada nos elementos da linguagem cinematográfica e nos estudos de Deleuze (1985), Aumont (2003) e Elsaesser (2009). A análise de similares (figura 2.39) é composta por cinco cartazes originais de filmes de Bergman, com exceção dos filmes selecionados no projeto, selecionados por seu partido conceitual. Os aspectos a serem analisados são os aspectos sintáticos (forma, cor, textura, tipografia, layout, figuras retóricas, entre outros) e os aspectos semânticos (possíveis significados, símbolos, figuras retóricas, entre outros). A análise das cenas tem como objetivo identificar as características e significados cinematográficos para auxiliar a criação dos cartazes. Assim como na análise de similares, os aspectos sintáticos e semânticos também devem ser analisados.

Fanny e Alexander (1982)

Gritos e Sussurros (1972)

Morangos Silvestres (1957)

Persona (1966)

O Sétimo Selo (1957)

Fanny e Alexander brincam com

Anna, Karin e Maria escutam o choro

O professor Isak Borg tem um sonho

Alma e Elisabeth travam uma

O cavaleiro Antonius Block e a Morte

lanterna mágica e veem a alma do

da alma de Agnes e entram uma a uma

muito estranho. Numa caminhada

batalha mental de identidade.

se conhecem e travam uma batalha

pai pela primeira vez.

no quarto em que ela faleceu. As irmãs

matinal ele se perde numa parte

não suportam a situação e a criada

desconhecida da cidade, com ruas

Anna é a única que acalenta Agnes.

desertas e casas em ruínas...

de xadrez.

Figura 2.38 — Seleção das cenas pela autora.

38

Título

Cliente

Designer

Imagem do cartaz Aspectos SINTÁTICOS

Aspectos SEMÂNTICOS

Figura 2.39 — Ficha de análise de similares pela autora.

39

FILME Título | Ano | Direção | Autoria | CENA Descrição | Duração |

Quadros principais das cenas

Atores |

CINEMATOGRAFIA Plano

Angulação

Movimento de câmera Transição de planos

Aspectos SINTÁTICOS Plano geral

Plano conjunto

Plano americano

Primeiro plano

Primeiríssimo plano

Plano detalhe

Normal

Plongèe

Contra-plongèe

Câmera oblíqua

Câmera excêntrica

Campo e contra-campo

Travelling

Panorâmica

Tilt

Grua

Câmera na mão

Câmera parada

Zoom

Fade

Dissolve

Corte

Plano médio

Wipe

Aspectos SEMÂNTICOS

Ambientação Cenário Iluminação Som Música Diálogo Figura 2.40 — Ficha de análise das cenas pela autora.

40

3.3 RETÓRICA O processo de criação retórica tem como base o método proposto por Waechter (2008) através dos experimentos realizados no grupo de estudo do Bacharelado em Design da UFPE, “Retórica Visual e Design”, durante quatro semestres acadêmicos. A proposta consiste em diretrizes que limitam e preveem as variáveis que poderão ser manipuladas, e as que intervêm no processo criativo. As operações retóricas são determinadas pelas funções e relações entre elementos variantes da matriz de Durand (1973). São consideradas também as informações do briefing e o resultado da análise de similares. Como neste projeto o briefing corresponde às definições gerais, e não somente a análise de similares é utilizada como pesquisa, mas também a análise de características de Bergman, as diretrizes estabelecidas para a geração de alternativas e as variáveis possíveis de manipulação foram adaptadas (figura 2.41).

Diretrizes para geração de alternativas na metodologia de Design a partir da aplicação de figuras da Retórica Visual Artefato

Figuras Retóricas

Variáveis

Intervenientes

Cartaz conceitual de

Operações retóricas

Elementos

Características formais e conceituais predominantes

propaganda

predominantes na

predominantes na

na pesquisa e geração de ideias

análise de similares

análise de similares Função informacional (informação) Linguagem Pictórica (desenhos, fotografia)

Função estética (sugestão)

Linguagem Verbal

Função de propaganda (persuasão)

(tipografia, lettering, caligrafia) Linguagem Plástica (cor, textura) Figura 2.41 — Diretrizes para geração de alternativas na metodologia de Design a partir da aplicação de figuras da Retórica Visual de Waechter (2008) adaptadas pela autora.

41

4 DESENVOLVIMENTO 4.1 PESQUISA 4.1.2 Análise das características cinematográficas de Ingmar Bergman Primeiríssimo plano e plano detalhe O espectador pode ver, pensar e sentir os personagens em diferentes estados emotivos — como vemos assuntos reduzidos à pura carne, ossos, boca, nariz, cabelos e olhos. “Bergman é, sem dúvida, o autor que mais insistiu sobre o elo fundamental que Figura 2.42 — Plano detalhe | O rosto (Ingmar

Figura 2.43 — Primeiríssimo plano | O silêncio

Bergman, 1958).

(Ingmar Bergman, 1963).

une o cinema, o rosto e o primeiro plano [...]”. (DELEUZE, 1985, p. 128). Iluminação Em parceria com o diretor de fotografia Sven Nykvist, Bergman explorou uma iluminação baseada no claro-escuro e alto contraste que podem simbolizar dicotomias presentes em sua obra: luz e sombra, vida e morte, razão e loucura, realidade e sonho. Campo e contra-campo Na maioria de seus filmes Bergman possibilitou o conhecimento das emoções e gestos de seus personagens, pelo espectador, através do uso de angulações de campo e contracampo em planos conjunto. Os personagens aparecem, em muitas situações, sobrepostos.

Figura 2.44 — Plano detalhe | Gritos e

Figura 2.45 — Primeiríssimo plano | Fanny e

sussuros (Ingmar Bergman, 1972).

Alexander (Ingmar Bergman, 1982).

Símbolos Bergman utiliza diversos símbolos que podem ser encontrados repetidamente em seus filmes. Esses símbolos são representados por objetos e elementos que possuem um significado próprio. Relógios, portas, janelas, jogos como o xadrez, espelhos, esculturas, brinquedos, telefones, fotografias, partes do corpo, entre outros, compõem um prisma de significados, assim como abrangem as lembranças e o universo do diretor.

Figura 2.46 — Plano detalhe | Persona (Ingmar

Figura 2.47 — Iluminação | Gritos e sussuros

Bergman, 1966).

(Ingmar Bergman, 1972).

42

Figura 2.48 — Iluminação | Quando as

Figura 2.49 — Iluminação | Persona (Ingmar

Figura 2.50 — Iluminação | A hora do lobo

Figura 2.51 — Iluminação | O sétimo selo

mulheres esperam (Ingmar Bergman, 1952).

Bergman, 1966).

(Ingmar Bergman, 1968).

(Ingmar Bergman, 1957).

Figura 2.52 — Campo e contra-campo | Sede

Figura 2.53 — Campo e contra-campo | Da vida

Figura 2.54 — Campo e contra-campo |

Figura 2.55 — Campo e contra-campo |

de paixões (Ingmar Bergman, 1949).

das marionetes (Ingmar Bergman, 1980).

O sétimo selo (Ingmar Bergman, 1957).

O silêncio (Ingmar Bergman, 1963).

Figura 2.56 — Símbolos | A paixão de Ana

Figura 2.57 — Símbolos | Sorrisos de uma noite

Figura 2.58 — Símbolos | Luz de inverno

Figura 2.59 — Símbolos | Morangos silvestres

(Ingmar Bergman, 1969).

de amor (Ingmar Bergman, 1955).

(Ingmar Bergman, 1963).

(Ingmar Bergman, 1957).

43

Título Kris (Crise).

4.1.3 Análise de similares A análise de similares compõe-se de cinco cartazes originais de filmes de Bergman dos quais foram analisados os aspectos sintáticos (aspectos formais) e os aspectos semânticos (aspectos conceituais). Os cartazes foram definidos partindo da definição

Cliente Svensk Filmindustri. Designer Desconhecido.

de cartaz conceitual de propaganda, em que o conceito se sobrepõe às informações textuais e às imagens dos atores. O resultado da análise de similares (figura 2.65) abrangeu quatro categorias principais: linguagem verbal, linguagem plástica, linguagem pictórica e operações retóricas. Os elementos predominantes de cada categoria foram identificados e serviram de referência para geração de alternativas. Há uma predominância da legibilidade, tanto por uso de cores contrastantes entre si, quanto por tipografias lineares (sem serifa) em caixa-alta. Nos títulos predominam os letterings, em alguns casos com referências caligráficas. A pessoalidade está presente em todos os cartazes, devido aos temas ligados a intimidade e sentimentos profundos, o que pode justificar a total ausência das operações retóricas de troca e a maior

Aspectos SINTÁTICOS

presença das operações de adjunção.

O cartaz é composto por três agrupamentos principais acumulados: o título, as imagens e as informações. O título em cor branca e caixa-alta é um lettering com características caligráficas (alusão dos rastros do movimento do pincel). A imagem central é um recorte fotográfico de uma face masculina (elipse) em sépia, emparelhada por uma imagem em preto e branco de uma figura feminina sobre fundo avermelhado. Informações sobre o filme e indústria estão localizadas nas quatro extremidades do cartaz, em tipografias lineares e ícones diferentes. O fundo preto é composto por uma moldura branca.

Aspectos SEMÂNTICOS O título do filme, manual e inclinado, sugere ‘crise pessoal’. A face do homem em elipse e hiperbolizado direciona o olhar à mulher, que é enfatizada pelo fundo vermelho. O maior paradoxo talvez seja a comparação entre as ‘crises’ das duas figuras: o homem toma maior parte do cartaz, mas numa cor discreta e a mulher possui menor escala, porém destaque em cor. Figura 2.60 — Análse de similares | Crise (Ingmar Bergman, 1946).

44

Título

Título

Vargtimmen (A hora do lobo).

Sommarlek (Juventude).

Cliente

Cliente

Svensk Filmindustri.

Svensk Filmindustri.

Designer

Designer

Desconhecido.

Desconhecido.

Aspectos SINTÁTICOS

Aspectos SINTÁTICOS

O cartaz é composto por dois agrupamentos principais acumulados: informações e imagem. As

O cartaz é composto por dois agrupamentos principais acumulados: informações e imagem. As

informações textuais localizam-se na parte inferior do cartaz, centralizadas, e rimam três tipos

informações textuais localizam-se na extremidade direita inferior e rimam dois tipos de grafias

de grafias diferentes em mesma cor (rosa avermelhada): o nome do diretor, acima, em caligrafia

diferentes, mas de mesma cor (preta): informações do elenco e diretor, acima e abaixo, em

diferenciada; abaixo o elenco principal em tipografia Cooper Black serifada; e entre eles o

tipografia linear (sem serifa) em caixa-alta, e entre eles o título do filme em destaque, em outra

título do filme, em caligrafia em caixa-alta. Nas informações também se encontra o logotipo

tipografia linear (sem serifa), também em caixa-alta. Nas informações também se encontra o

da produtora, na extremidade direita inferior. A imagem do cartaz é uma fotografia em preto e

logotipo da produtora, à esquerda da imagem. A imagem do cartaz é uma pintura da metade de

branco que se apresenta como uma elipse de uma face quase toda suprimida por sombras.

um corpo (elipse) sustentado por uma das pernas em ponta de pé, que preenche verticalmente o cartaz (hipérbole) em cores pasteis (azul claro, branco e creme), sobre uma mancha oliva. Os

Aspectos SEMÂNTICOS

traços da pintura são bem definidos.

O elemento de maior destaque é a imagem, que devido à escala e à iluminação, num efeito

Aspectos SEMÂNTICOS

hiperbólico assustador, enfatiza a boca aberta ao centro (metonímia). O título, em caligrafia simples, mas de bastante personalidade, em cor forte e contrastante, remonta ‘individualidade’

O elemento de maior destaque é a imagem, devido à escala, às cores, à complexidade da

(metáfora). Há um conceito geral de pavor no cartaz.

postura corporal. Apesar do destaque em apenas uma parte do corpo, é identificável a figura feminina e a posição de dança do Ballet clássico pelas sapatilhas de pontas (metonímia). O

Figura 2.61 — Análse de similares | A hora do lobo (Ingmar Bergman, 1968).

conceito do Ballet abrange tanto a temática de ‘juventude’ do filme (metáfora) quanto ao paradoxo entre ‘juventude’ e ‘complexidade’ (antífrase). Figura 2.62 — Análse de similares | Juventude (Ingmar Bergman, 1951).

45

Título

Título

En passion (A paixão de Ana).

Såsom i en spegel (Através de um espelho).

Cliente Cliente Svensk Filmindustri. Svensk Filmindustri. Designer Designer Desconhecido. Desconhecido.

Aspectos SINTÁTICOS

Aspectos SINTÁTICOS

O cartaz é composto por dois agrupamentos principais acumulados: informações e imagens.

O cartaz é composto por três agrupamentos principais acumulados: título, informações e imagem.

As informações textuais (título, diretor, elenco e fotógrafo) localizam-se centralizadas na parte

O título localiza-se à esquerda superior, em cor branca e caixa-alta. Sua grafia é um lettering

inferior do cartaz e rimam cor (preta) e tipografia serifada (Times New Roman). O título possui

serifado sombreado, contrastando com o fundo azul acinzentado. As informações do elenco

maior destaque. Há também o logotipo da produtora. As imagens ocupam a parte superior

e diretor distribuem-se entre as extremidades do cartaz em tipografia linear (sem serifa) em cor

do cartaz, e são formadas por quatro grupos diferentes (comparação) de faces similares

preta (rima). Há também o logotipo da produtora no canto direito inferior em cor branca.

recortadas (elipse) e sobrepostas em tons avermelhados (rima e repetição). Apenas uma

A imagem é um desenho de uma cabeça de uma mulher (elipse) em preto e branco. Há uma

delas possui faces diferentes sobrepostas (emparelhamento).

mancha azulada vertical que se sobrepõe (emparelhamento), por transparência, ao desenho. O título (branco com sombras pretas) rima com o desenho mulher (branca com traços em cor preta).

Aspectos SEMÂNTICOS Aspectos SEMÂNTICOS As faces, masculinas e femininas, compõem quatro grupos de duas faces cada e representam as personagens dos atores listados nas informações (metonímia). Apenas as faces femininas

O título e as informações distribuídas ao redor da imagem provocam um circunlóquio. O título

acima à esquerda que possuem diferenças entre si, provocando contradição (antanáclase)

‘Através de um espelho’ associa a mancha azulada sobreposta ao desenho com a ideia de

e ênfase à sua figura. O título do filme sugere ‘paixão’, e restam dúvidas à qual face o

‘espelho’ (metonímia) através da transparência, na qual possui alusão ao reflexo. Há também

sentimento está relacionado (dubitação). A repetição das faces também proporciona um

um paradoxo: teoricamente não há como representar graficamente imagem ‘real’ e espelho

circunlóquio na mensagem.

sem criar uma repetição da imagem, então os dois elementos foram somados.

Figura 2.63 — Análse de similares | A paixão de Ana (Ingmar Bergman, 1969).

Figura 2.64 — Análse de similares | Através de um espelho (Ingmar Bergman, 1961).

46

LINGUAGEM VERBAL

OPERAÇÕES RETÓRICAS

Título Lettering

Adjunção Caligrafia

Tipografia linear

Tipografia serifada

Caligrafia

Tipografia serifada

Acumulação

Rima

Emparelhamento Comparação

Paradoxo

Repetição

Antanáclase

Circunlóquio

Dubitação

Metáfora

Hipérbole

Informações Tipografia linear

Supressão linguagem plástica

Elipse

Cor Preto

Branco

Vermelho

Oliva

Azul Substituição Metonímia

Alusão

Textura Lisa

Linear

Orgânica Antífrase Legenda:

linguagem PICTÓRICA 1 Fotografia

Desenho

2

3

4

5

Pintura Figura 2.65 — Resultado da análise de similares.

47

4.2 GERAÇÃO DE IDEIAS 4.2.1 Fotografias A partir dos resultados obtidos nas análises de características cinematográficas e similares, fotografias foram produzidas para serem editadas e compor os cartazes, auxiliando, assim, na geração de alternativas. Os símbolos mais fotografados foram relógios, xadrez, esculturas, brinquedos, telefones, partes do corpo, entre outros. Os recursos mais utilizados foram o primeiríssimo plano e plano detalhe, e os ângulos frontal, plongèe, contra-plongèe e campo e contra-campo.

Figura 2.66 — Fotografias para composição dos cartazes (Lana Pinho, 2012).

48

49

50

4.2.2 Análise das cenas A análise das cenas teve como propósito identificar as características cinematográficas das cenas representativas de cada filme, tanto da perspectiva sintática (forma) quanto da perspectiva semântica (significado), para gerar ideias sobre cada filme e assim possibilitar uma maior geração de alternativas por meio da Retórica Visual. Os resultados a seguir confirmam muitas das características de Ingmar Bergman encontrados na Pesquisa, como a recorrente utilização de temas e símbolos sobre tempo, morte, nascimento, relações humanas e identidade, aliados a uma cinematografia que enfatiza essas significações.

51

FILME Título | Fanny e Alexander. Ano | 1982. Direção | Ingmar Bergman. Autoria | Ingmar Bergman. CENA Descrição | Fanny e Alexander brincam com lanterna mágica e veem a alma do pai pela primeira vez. Duração | 01”36’. Atores | Pernilla Allwin, Bertil Guve e Allan Edwall.

CINEMATOGRAFIA Plano

Angulação

Movimento de câmera Transição de planos Ambientação Cenário

Aspectos SINTÁTICOS Plano geral

Plano conjunto

Plano americano

Primeiro plano

Primeiríssimo plano

Plano detalhe

Normal

Plongèe

Contra-plongèe

Câmera excêntrica

Campo e contra-campo

Travelling

Panorâmica

Tilt

Câmera na mão

Câmera parada

Zoom

Fade

Dissolve

Corte

Plano médio

A cena é ambientada numa casa, que pode ser percebida no plano conjunto. Há inúmeros lustres de cristais e mobília, numa paleta de cores clara. Os figurinos das crianças são escuros e semelhantes ao uniforme de marinheiro. A alma do

Câmera oblíqua

pai utiliza traje claro. A angulação da cena é normal e os movimentos de câmera acompanham as crianças em zoom (in e out) e travelling (de Alexander para Fanny em primeiríssimo plano).

Grua

Aspectos SEMÂNTICOS Wipe

Interna. Casa da avó de Fanny e Alexander: lustres, cristais, bibelôs, mobília antiga. Cores predominantes: branco, creme, preto.

Iluminação

Artificial.

Som

Vento.

Música

Música à corda da lanterna mágica e música tocada no cravo, pela alma do pai.

Diálogo

Fanny: Ouviu algo? Alexander, acorde! Tem algo lá fora.

Fanny e Alexander são transportados de uma ilusão visual (lanterna mágica) para outra (visão da alma do pai). Ambas as partes são acompanhadas por música, mas uma é gravada e artificial (à corda) e outra é tocada ‘ao vivo’ pela alma do pai (cravo). As duas partes são bem diferenciadas pela transição dos planos por corte.

Figura 2.67 — Ficha de análise | Fanny e Alexander (Ingmar Bergman, 1982).

52

FILME Título | Gritos e sussurros. Ano | 1972. Direção | Ingmar Bergman. Autoria | Ingmar Bergman. CENA Descrição | Anna, Karin e Maria escutam o choro da alma de Agnes e entram uma a uma no quarto em que ela faleceu. As irmãs não suportam a situação e Anna, a criada, é a única que acalenta Agnes. Duração | 10”07’. Atores | Harriet Andersson, Kari Sylwan, Ingrid Thulin, Liv Ullmann. CINEMATOGRAFIA Plano

Angulação

Movimento de câmera Transição de planos Ambientação Cenário

Aspectos SINTÁTICOS Plano geral

Plano conjunto

Plano americano

Primeiro plano

Primeiríssimo plano

Plano detalhe

Normal

Plongèe

Contra-plongèe

Câmera excêntrica

Campo e contra-campo

Travelling

Panorâmica

Tilt

Câmera na mão

Câmera parada

Zoom

Fade

Dissolve

Corte

Plano médio

A cena inicia-se pela face de Anna aparecendo gradativamente numa tela vermelha (fade in) e desaparecendo em seguida (fade out). Anna escuta um choro semelhante a um choro de um bebê e procura sua origem caminhando

Câmera oblíqua

pela casa (travelling) muito nervosa (câmera excêntrica). Todos os tipos de planos são encontrados, com destaque o plano detalhe e primeiríssimo plano nos diálogos. A cena possui iluminação sombria.

Grua

Aspectos SEMÂNTICOS Wipe

Interna. Casa da família. Tanto a mobília quanto o figurino possuem como cores predominantes preto, marrom, branco e vermelho.

O fade inicial vermelho, com a personagem Anna, introduz e simboliza seu ponto de vista na cena. Anna é a única que tolera a presença do espírito de Agnes, na qual é acalentada no fim da cena. A câmera tem papel principal ao refletir as emoções dos personagens ao percorrer as trajetórias dos mesmos e por angulações inusitadas. A escuridão e os sons de respiração alimentam o suspense da cena. É possível

Iluminação

Artificial.

comparar o choro de Agnes a um choro de um bebê (nascimento), que enfrenta o

Som

Gritos, choros, sussurros, sinos, respiração.

início de sua ‘vida’ em outro plano existencial (morte).

Música

Música de violoncelo.

Diálogo

[...] Agnes: Está com medo de mim agora? Anna: Não, nem um pouco. Agnes: Estou morta, você sabe. [...] Figura 2.68 — Ficha de análise | Gritos e sussurros (Ingmar Bergman, 1972).

53

FILME Título | Morangos silvestres. Ano | 1957. Direção | Ingmar Bergman. Autoria | Ingmar Bergman. CENA Descrição | O professor Isak Borg tem um sonho muito estranho. Numa caminhada matinal ele se perde numa parte desconhecida da cidade, com ruas desertas e casas em ruínas… Duração | 04”42’. Atores | Victor Sjöström. CINEMATOGRAFIA Plano

Angulação

Movimento de câmera

Aspectos SINTÁTICOS Plano geral

Plano conjunto

Plano americano

Primeiro plano

Primeiríssimo plano

Plano detalhe

Normal

Plongèe

Contra-plongèe

Câmera excêntrica

Campo e contra-campo

Travelling

Panorâmica

Tilt

Câmera na mão

Câmera parada

Zoom

Fade

Dissolve

Plano médio

A cena inicia-se por um fade in e é narrada pelo personagem Isak Borg, que descreve brevemente que teve um sonho, que se inicia. Todos os tipos de planos são utilizados e em alguns momentos as angulações passam do normal para

Câmera oblíqua

plongèe e contra-plongèe. A ambientação é tanto externa (sonho) quanto interna (Isak dormindo).

Grua

Aspectos SEMÂNTICOS A cena possui uma gama de significados diferentes, por se tratar de um sonho. É

Transição de planos Ambientação Cenário Iluminação Som Música

Corte

Wipe

Interna e externa. Quarto em que personagem dorme (cama) | Cidade deserta do sonho com edifícios antigos. Cena em preto e branco.

composta por muitos cortes, devido à quantidade de ações. A iluminação possui alto contraste e o movimento de câmera mais utilizado é o travelling, que acompanha os movimentos do personagem pelas ruas. O zoom é utilizado nos momentos de medo e tensão, dando ênfase às expressões de Isak. Ao final do sonho o zoom in nas faces de Isak (si próprio e morto) desfoca a imagem. Os sons e a música têm importante

Artificial e natural.

papel, pois também produzem significados na narrativa. As batidas do relógio, os

Badalos de sinos, batida de relógio, passos de cavalo, batida do coche no poste, ruído

passos dos cavalos à distância e os ruídos do coche, semelhante ao choro de bebê,

do coche preso sendo forçado pelos cavalos.

são exemplos. Há um conceito principal de duplo sentido: a morte pelo nascimento

Música introdutória por harpa e música de suspense no ápice da cena.

e o nascimento pela morte, ou morte é vida e vida é morte.

Isak Borg: Na noite do primeiro dia de junho...Tive um sonho estranho. Sonhei que Diálogo

durante minha caminhada matinal...Eu me perdi numa parte desconhecida da cidade... com ruas desertas e casas em ruínas.

Figura 2.69 — Ficha de análise | Morangos silvestres (Ingmar Bergman, 1957).

54

FILME Título | Persona. Ano | 1966. Direção | Ingmar Bergman. Autoria | Ingmar Bergman. CENA Descrição | Alma e Elisabeth travam uma batalha mental de identidade. Duração | 12”01’. Atores | Bibi Andersson, Liv Ullmann.

CINEMATOGRAFIA Plano

Angulação

Movimento de câmera Transição de planos

Aspectos SINTÁTICOS Plano geral

Plano conjunto

Plano americano

Primeiro plano

Primeiríssimo plano

Plano detalhe

Normal

Plongèe

Contra-plongèe

Câmera excêntrica

Campo e contra-campo

Travelling

Panorâmica

Tilt

Câmera na mão

Câmera parada

Zoom

Fade

Dissolve

Corte

Plano médio

A cena, em preto e branco, possui três partes principais. As transições dessas partes são caracterizadas pelo dissolve e música (piano e metais). Na primeira parte o ponto de vista é da enfermeira Alma, que ocupa o lugar da câmera e

Câmera oblíqua

Elisabeth ocupa o primeiro plano e suas reações corporais ao texto de Alma são atenuadas. Na segunda parte o ponto de vista é de Elisabeth Vogler, em que toda sequência anterior é repetida, mas em situação inversa. Na terceira parte Alma

Grua

Wipe

utiliza seu uniforme de enfermeira e interage fisicamente com Elisabeth. Aspectos SEMÂNTICOS A cena é composta por um ‘diálogo’ que na verdade é um monólogo, já que Elisabeth

Ambientação

Interna e externa.

Cenário

Cena em preto e branco. Figurino em preto, cortinas claras e parede de madeira.

Iluminação

Artificial.

Som

Som de projetor de slides quando Elisabeth pisca os olhos.

Música

Música por piano e metais nas transições de planos (dissolve).

recíprocas entre as personagens. Na terceira parte Alma quer reforçar sua

[...] Alma: Jamais serei como você. Eu mudo o tempo todo. Pode fazer o que quiser.

identidade substituindo sua roupa pelo uniforme de enfermeira, porém a ‘batalha’

Não vai me afetar [...]

finaliza-se com uma troca metafórica (sangue x agressão).

Diálogo

não fala em nenhum momento. A mesma sequência é repetida em diferentes pontos de vista (primeiramente Alma e secundariamente Elisabeth), visualizando-se assim suas respectivas reações e emoções. No final da segunda parte as faces das personagens fundem-se (wipe). Essa fusão aliada ao texto da cena, em que Alma rejeita sua semelhança à Elisabeth, sugere uma confusão e dominação de identidade

Figura 2.70 — Ficha de análise | Persona (Ingmar Bergman, 1966).

55

FILME Título | O sétimo selo. Ano | 1957. Direção | Ingmar Bergman. Autoria | Ingmar Bergman. CENA Descrição | O cavaleiro Antonius Block e a Morte se conhecem e travam uma batalha de xadrez. Duração | 03”46’. Atores | Max von Sydow, Bengt Ekerot.

CINEMATOGRAFIA Plano

Angulação

Movimento de câmera Transição de planos Ambientação Cenário

Aspectos SINTÁTICOS Plano geral

Plano conjunto

Plano americano

Primeiro plano

Primeiríssimo plano

Plano detalhe

Normal

Plongèe

Contra-plongèe

Câmera excêntrica

Campo e contra-campo

Travelling

Panorâmica

Tilt

Câmera na mão

Câmera parada

Zoom

Fade

Dissolve

Corte

Plano médio

A cena, em preto e branco, inicia-se com uma narração sobre o sétimo selo (plano geral) e ambienta-se numa praia com muitas rochas e pedras. Antonius Block descansa sobre as rochas ao lado de um tabuleiro de xadrez.

Câmera oblíqua

Paralelamente dois cavalos bebem água do mar e outro homem dorme sobre as pedras. A Morte aparece para buscar Antonius, mas ele a desafia no jogo de xadrez, autorizando levá-lo caso perdesse a partida. Os planos da cena são

Grua

muito abertos (geral, conjunto e médio), com exceção do primeiro plano na aproximação da Morte e seu diálogo com Antonius (campo e contra-campo).

Wipe

Aspectos SEMÂNTICOS

Externa. Cena em preto e branco. Praia com muitas rochas. Figurino metalizado (cavaleiro) e capa preta (morte).

A narração de abertura da cena cria relações com as imagens no plano geral. A ópera que é soada e o pássaro negro sobrevoando o ambiente também apoiam o suspense. Pelos figurinos (Antonius utiliza traje de cota de malha metálica

Iluminação

Artificial e natural.

e espada; a Morte capa preta) é possível reconhecer o contexto histórico-

Som

Som das ondas do mar.

cultural da Idade Média, apesar de ser uma obra de ficção. O recurso do xadrez

Música

Ópera na abertura da cena.

Diálogo

Antonius Block: Quem é você? Morte: Sou a morte. Antonius Block: Veio me buscar?

como símbolo de luta pela vida, que de fato é desafiada com a Morte, e as correspondências das cores das peças com os personagens (pretas — Morte; brancas — Antonius) também são muito significantes.

Morte: Ando com você há muito tempo [...] Figura 2.71 — Ficha de análise | O sétimo selo (Ingmar Bergman, 1957).

56

4.3 GERAÇÃO DE ALTERNATIVAS A partir dos resultados da pesquisa (análise de similares e análise das características cinematográficas de Bergman) e das ideias geradas pela análise das cenas, as diretrizes para geração de alternativas a partir da aplicação de figuras da retórica visual (WAECHTER, 2008) foram delimitadas a favor das particularidades do projeto (figura 2.72). Essas diretrizes objetivam a percepção de uma série, através de uma unidade estética entre os cartazes. Pelo menos uma figura de cada operação retórica predominante deve ser utilizada (adjunção, supressão, substituição) e as variáveis são delimitadas, porém não é necessário que todas sejam utilizadas (os cartazes não têm que ser compostos por todas as cores selecionadas, por exemplo).

Diretrizes para geração de alternativas na metodologia de Design a partir da aplicação de figuras da Retórica Visual faces de bergman Artefato

Figuras Retóricas

Variáveis

Intervenientes

Cartaz conceitual de

Operações retóricas

Elementos

Características formais e conceituais predominantes

propaganda

predominantes na

predominantes na

na pesquisa e geração de ideias

análise de similares

análise de similares Função informacional

Adjunção

Linguagem Pictórica

Supressão

(desenho, fotografia)

Substituição

(título, diretor) Função estética

Linguagem Verbal

(referências à cena, referências à Bergman)

(lettering, caligrafia) Função de propaganda Linguagem Plástica

(divulgação do filme)

(preto, branco, vermelho, oliva e azul; textura lisa) Figura 2.72 — Diretrizes para geração de alternativas na metodologia de Design a partir da aplicação de figuras da Retórica Visual pela autora.

57

4.3.1 Fanny e Alexander Alternativa 1 Figuras de substituição como alusão, metonímia e metáfora foram utilizadas para gerar alguns significados da cena. A fotografia central faz alusão à parte da cena em que as crianças veem a alma do pai, ao formato circunsférico das lâminas da lanterna mágica e às linhas brancas que contornam a fotografia ao figurino das crianças (figura 2.73). As linhas brancas também são uma metonímia do figurino. A metáfora é utilizada na informação do título e diretor, em letterings caligráficos que remetem personalidade, além de chamar atenção do espectador. Figuras de adjunção, como rima e acumulação, e figura de supressão, elipse, também foram utilizadas. A rima para criar relações de cor do fundo com a fotografia (preto) e do título com as linhas circulares (branco). A elipse corresponde ao fragmento circular da fotografia e a acumulação é inerente a todos os cartazes da geração de alternativas, já que inevitavelmente elementos diferentes são acumulados na composição (título, diretor, imagem, desenho, entre outros). A cor predominante é a preta, por alusão ao figurino das crianças e à lanterna mágica.

Figura 2.73 — Geração de alternativas | Fanny e Alexander | Alternativa 1.

Figura 2.74 — Geração de alternativas | Referências em Fanny e Alexander.

58

Alternativa 2 Figuras de substituição como alusão e metáfora foram utilizadas. Nessa alternativa as imagens fazem referência à lanterna mágica por alusão (forma circunsférica e numeração — figura 2.73) e à posição dos personagens na cena quando veem a alma do pai. A metáfora é utilizada na informação do título e diretor, por letterings caligráficos que remetem personalidade. Figuras de adjunção, como rima, comparação e acumulação, e figura de supressão, elipse, também foram utilizadas. A rima corresponde às relações de cor (preto e branco) e a comparação corresponde às relações entre as duas elipses e a numeração indicando a quantidade. A elipse corresponde ao fragmento circular da fotografia, assim como a imagem sangrada na margem esquerda, semelhante ao movimento da lanterna mágica da cena. A acumulação é inerente a todos os cartazes da geração de alternativas, já que inevitavelmente elementos diferentes são acumulados na composição (título, diretor, imagem, desenho, entre outros). A cor predominante é a preta, por alusão ao figurino das crianças e à lanterna mágica.

Figura 2.75 — Geração de alternativas | Fanny e Alexander | Alternativa 2.

59

4.3.2 Gritos e sussurros Alternativa 1 Figuras de substituição como alusão, metonímia e metáfora foram utilizadas. A cor vemelha foi definida devido à sua predominância na cena e no filme analisado anteriormente (figura 2.77). Ela também remete a dor, a pulsão, o sangue (metáfora). As bocas foram utilizadas porque “gritos e sussurros” são sons, ou seja, não existe representação visual além do figurativo. As bocas e suas expressões são meios de representá-los (metonímia). As informações textuais (título e diretor) foram representados por letterings com características caligráficas, nos quais as letras são desarmônicas e passam sensação de descontrole (metáfora). Figuras de adjunção, como comparação, acumulação, emparelhamento e paradoxo, e figuras de supressão como elipse e suspensão, também foram utilizadas. A comparação corresponde às relações entre as bocas (mesma boca em formas diferentes). O paradoxo consistiu no sentido de que palavras não são visualizadas quando falamos, recurso utilizado no emparelhamento do título do cartaz com a boca aberta. A elipse consistiu nos recortes das bocas e a suspensão no conceito de separação do movimento da boca do silêncio (boca fechada) ao grito (boca extremamente aberta).

Figura 2.76 — Geração de alternativas | Gritos e sussurros | Alternativa 1.

Figura 2.77 — Geração de alternativas | Referências em Gritos e sussurros.

60

Alternativa 2 Ao contrário da primeira alternativa, objetivou-se um menor uso das figuras, a fim destacar a figura principal, a hipérbole (figura de substituição). Seu uso consistiu no exagero da imagem e das informações, tanto na escala dos elementos quanto na expressão facial. Outra figura de substituição utilizada é a metáfora, através do lettering com caracteríticas caligráficas, no qual as letras são desarmônicas e passam sensação de descontrole, e da cor vemelha devido à sua predominância na cena e no filme, remetendo dor, pulsão, sangue (figura 2.77). Assim como na primeira alternativa, o paradoxo (figura de adjunção) foi utilizado, no sentido de que palavras não são visualizadas quando falamos, recurso utilizado no emparelhamento (figura de adjunção) do título do cartaz com a boca aberta. Nesse caso, porém, as palavras do título foram separadas, num recurso de suspensão (figura de supressão), como se cada agrupamento fosse separado por uma vírgula,ou uma pausa na fala. A acumulação (figura de adjunção) é inerente a todos os cartazes da geração de alternativas, já que inevitavelmente elementos diferentes são acumulados na composição (título, diretor, imagem, desenho, entre outros).

Figura 2.78 — Geração de alternativas | Gritos e sussurros | Alternativa 2.

61

4.3.2 Morangos silvestres Alternativa 1 A cena em que o cartaz foi baseado inicia-se com o personagem principal dormindo e narrando seu próprio sonho. Pelo teor surrealista e onírico da cena, as figuras de substituição foram as mais utilizadas para compor o cartaz: hipérbole, alusão, metáfora e trocadilho. As cores preta e branca foram definidas como predominantes (figura 2.80) e utilizadas como uma alusão à imagem filmada. O relógio na escala em que foi configurado caracteriza-se como uma hipérbole, e trocadilho pela substituição de uma cabeça por ele, já que é um paradoxo uma pessoa com cabeça de relógio, mas o formato redondo remete a um rosto. As metáforas consistem nas informações textuais (título e diretor), representados por letterings com características caligráficas, nos quais são encontradas pessoalidade, característica do inconsciente, e na associação de relógio parado (sem ponteiros) com o sono e/ou morte. Figuras de adjunção foram usadas na acumulação de elementos diferentes e na harmonia dos tons de cinza e preto (rima). A figura de supressão utilizada foi a preterição, em que os ponteiros do relógio foram suprimidos tanto para referência ao relógio também sem ponteiros da cena do filme, quanto para destaque do mesmo pelo paradoxo.

Figura 2.79 — Geração de alternativas | Morangos silvestres | Alternativa 1.

Figura 2.80 — Geração de alternativas | Referências em Morangos silvestres.

62

Alternativa 2 Nesta alternativa foi utilizado um número menor de figuras retóricas. As figuras de substituição foram alusão, metáfora e a metonímia. As cores preta e branca foram definidas como predominantes (figura 2.80) e utilizadas como uma alusão à imagem filmada. As metáforas consistem nas informações textuais (título e diretor), representados por letterings com características caligráficas, nos quais são encontradas pessoalidade, característica do inconsciente, e na associação de relógio parado (sem ponteiros) com o sono e/ou morte. A imagem de fundo assemelha-se a um corpo sob um lençol, que foi utilizada como metonímia para sono e/ou morte. Figuras de adjunção foram usadas na acumulação de elementos diferentes e na harmonia dos tons de cinza e preto (rima), assim como no emparelhamento do relógio sobre o lençol. A figura de supressão utilizada foi a preterição, em que os ponteiros do relógio foram suprimidos tanto para referência ao relógio também sem ponteiros da cena do filme, quanto para destaque do mesmo pelo paradoxo.

Figura 2.81 — Geração de alternativas | Morangos silvestres | Alternativa 2.

63

4.3.3 Persona Alternativa 1 A cena em que o cartaz foi baseado trata-se de uma “batalha” mental entre duas mulheres, e em alguns momentos elas somam e trocam suas identidades (figura 2.81). Pelo teor metafórico da cena, as figuras de substituição foram as mais utilizadas para compor o cartaz: hipérbole, alusão, metáfora e trocadilho. A hipérbole foi utilizada na grande escala dos rostos, referenciando o momento da cena em que os rostos das personagens são fundidos pela técnica de transição wipe. As cores preta e branca foram definidas como predominantes e utilizadas como uma alusão à imagem filmada. A cor azul do fundo foi utilizada por remeter introspecção, assim como os letterings de características caligráficas (o título possui uma caligrafia arredondada feminina) (metáfora). Cada parte da face corresponde a uma mulher diferente por metonímia e a união dos rostos teve como objetivo o trocadilho. As figuras de adjunção foram utilizadas devido à acumulação de elementos e à comparação inevitável entre as partes dos rostos. A figura de supressão utilizada foi a elipse, que divide a face em duas partes.

Figura 2.82 — Geração de alternativas | Persona | Alternativa 1. Figura 2.83 — Geração de alternativas | Referências em Persona.

64

Alternativa 2 Nesta alternativa as figuras retóricas utilizadas foram semelhantes, porém com diferenças à níveis formais. Pelo teor metafórico da cena, as figuras de substituição foram as mais utilizadas para compor o cartaz: hipérbole, alusão, metáfora e trocadilho. A hipérbole foi utilizada na grande escala dos rostos, referenciando campo e contra-campo recorrente na cena e no filme (figura 2.81). As cores preta e branca foram definidas como predominantes e utilizadas como uma alusão à imagem filmada. 0 verde oliva de fundo foi utilizado por remeter sensações de angústia e doença (metáfora) e os letterings foram utilizados por suas características caligráficas pessoais e femininas. Cada parte da face corresponde a uma mulher diferente por metonímia. As figuras de adjunção foram utilizadas devido à acumulação de elementos e à comparação inevitável entre as partes dos rostos. O emparelhamento dos rostos teve como objetivo criar a sensação de profundidade entre eles. A figura de supressão utilizada foi a elipse, que delineia os rostos.

Figura 2.84 — Geração de alternativas | Persona | Alternativa 2.

65

4.3.4 O sétimo selo Alternativa 1 A cena em que o cartaz foi baseado trata-se de uma disputa de xadrez entre um cavaleiro medieval e a Morte. Para compor este cartaz apenas alguns elementos foram utilizados, promovendo um maior destaque à figura da Morte. As figuras de substituição foram as mais utilizadas: alusão, metáfora e metonímia. A alusão foi utilizada para referenciar as cores (preto e branco) e a figura da Morte da cena (figura 2.83). A Morte em si já é uma metáfora, que também é encontrada no filme. Sua presença no cartaz suprime os outros elementos da cena referenciada (o cavaleiro, o xadrez, os cavalos, entre outros), por superioridade (tautologia - figura de supressão), que pode ser notada pela expressão facial. As figuras de adjunção correspondem ao emparelhamento e acumulação de elementos, do lettering branco sobre a Morte (escura), e da Morte sobre o fundo (claro). Essa dualidade é encontrada tanto no xadrez (alusão), quanto no tema do filme (morte x vida, luz x escuridão).

Figura 2.85 — Geração de alternativas | O sétimo selo | Alternativa 1.

Figura 2.86 — Geração de alternativas | Referências em O sétimo selo.

66

Alternativa 2 Diferentemente da primeira alternativa, este cartaz teve como conceito replicar a figura da Morte em cores diferentes e opostas em suas posições, fazendo assim referência às peças de xadrez encontradas na cena. As figuras de adjunção foram mais utilizadas: rima, acumulação, emparelhamento e antanáclase. A rima consistiu na diferença de cor das semelhantes figuras, emparelhadas por inversão. A antanáclase foi utilizada para dar duplo sentido à Morte, como peças de xadrez de cores diferentes. As figuras de substituição foram alusão e metonímia. A alusão foi utilizada para referenciar as cores da cena (preto e branco) e as peças de xadrez. As figuras da Morte em preto e branco foram utilizadas como símbolo de todas as peças restantes do xadrez (metonímia), recortadas em forma semelhante aos peões (elipse - figura de supressão).

Figura 2.87 — Geração de alternativas | O sétimo selo | Alternativa 2.

67

4.4 RESULTADO O resultado da geração de alternativas abrangeu as diretrizes para aplicação de figuras retóricas visuais (figuras retóricas, variáveis e intervenientes). O critério de seleção dos resultados, além da criatividade, foi a essência da cena para qual o cartaz foi referenciado e que foi previamente analisada na Geração de Ideias. As alternativas para o cartaz de Fanny e Alexander tiveram figuras retóricas e estética semelhantes, mas os recursos semânticos foram diferenciados. A alternativa 1 remeteu com sucesso a estética navy (marinha) dos figurinos das crianças e as reações expressivas dos mesmos quando deparados com a alma do pai. Porém a alternativa 2 promoveu movimento pela referência formal à lanterna mágica, em que uma das elipses sangra pela margem esquerda enquanto outra se aproxima, numa continuidade de imagens; e referência conceitual às reações expressivas das crianças quando deparados com a alma do pai. Outra questão importante é que de acordo com a análise da cena, Fanny e Alexander são transportados simbolicamente de uma ilusão visual (lanterna mágica) para outra (visão da alma do pai). Assim, a alternativa 2 agrega melhor essas principais partes da cena. As alternativas para o cartaz de Gritos e sussurros tiveram resultados díspares. Para a alternativa 1 foram utilizadas muitas figuras retóricas, resultando em uma proposta diferenciada e divertida. Porém, o recorte das bocas (elipse) provocou uma dubiedade, em que o contexto principal do filme, atrelado ao sofrimento e às emoções intensas, pode ser confundido com temáticas de humor e sexo (boca vermelha e suas outras convenções simbólicas). A alternativa 2, por outro lado, foi composta por um número menor de figuras retóricas e não possui resultado visual inovador, porém possui um impacto visual significante e seu conceito corresponde totalmente à essência do filme. A hipérbole por si só necessita de um maior espaço, assim como a dor do filme que é retratada por gritos e sussuros. Logo, a alternativa 2 foi escolhida.

68

As alternativas para o cartaz de Morangos silvestres tiveram estéticas semelhantes, mas os recursos semânticos foram diferenciados. A alternativa 1 abordou o sonho da cena referenciada, utilizando mais operações de substituição, recurso semelhante ao processo onírico (cruzamento e substituição de significados inconscientes). Assim, a principal figura é representada por uma figura inusitada, surreal e paradoxal. A alternativa 2, ao contrário da alternativa 1, não possui uma figura e sim um relógio como destaque, sobreposto à lençóis que remetem o sonho, o sono e a morte. Porém, não é tão intrigante quanto à escolhida alternativa 1, além não seguir o padrão inevitável encontrado na maioria das alternativas, em que faces são apresentadas. A alternativa 1 não possui uma face literal, real, mas o relógio a substitui. As alternativas para o cartaz de Persona tiveram resultados muito semelhantes, com diferenças sutis e significativas. A alternativa 1 representa a soma de personalidades pela soma de faces (metáfora e metonímia), que é representada claramente pela supressão (elipse) do rosto, dividindo-o em duas partes. A cor azul foi utilizada pela instrospeção e subjetividade que o tom utilizado abrange. A alternativa 2 é semelhante à alternativa 1, porém os lados das faces estão opostos, sugerindo diferença e não semelhança, principal conceito da cena referenciada. A cor verde, utilizada com objetivo de passar sensações incômodas, possui um conceito forte, mas esteticamente não é atrativo. Assim, a alternativa 1 foi escolhida.

69

As alternativas para o cartaz do Sétimo selo tiveram resultados diferenciados. A alternativa 1 foi composta unicamente pela figura da Morte, em posição de superioridade e poder que a personagem carrega simbolicamente (tautologia). A imagem é impactante visualmente, tanto pela postura da Morte, quanto pelo emparelhamento de cores opostas. Porém, a dicotomia existente na cena para qual o cartaz se refere, em que a Morte e o cavaleiro são oponentes e representantes, não é apresentada. Ela é encontrada na alternativa 2, em que a figura da Morte é representada em preto e em branco, em posições opostas como um tabuleiro de xadrez, assemelhando-se a peões. Assim, foi escolhida a alternativa 2, por representar o principal conceito da cena e do filme referenciado.

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4.5 IMPLEMENTAÇÃO

Fanny e Alexander Diretor | Ingmar Bergman Ano | 2013 Design | Hana Luzia Especificações gráficas Formato | 1000 x 700 mm Papel | Apresentação 145 g/m² Cor | 1/0 Figura 2.88 — O sétimo selo | Cartaz final.

71

Gritos e sussurros Diretor | Ingmar Bergman Ano | 2013 Design | Hana Luzia Especificações gráficas Formato | 1000 x 700 mm Papel | Apresentação 145 g/m² Cor | 4/0 Figura 2.89 — Gritos e sussurros | Cartaz final.

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Morangos silvestres Diretor | Ingmar Bergman Ano | 2013 Design | Hana Luzia Especificações gráficas Formato | 1000 x 700 mm Papel | Apresentação 145 g/m² Cor | 1/0 Figura 2.90 — Morangos silvestres | Cartaz final.

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Persona Diretor | Ingmar Bergman Ano | 2013 Design | Hana Luzia Especificações gráficas Formato | 1000 x 700 mm Papel | Apresentação 145 g/m² Cor | 4/0 Figura 2.91 — Persona | Cartaz final.

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O sétimo selo Diretor | Ingmar Bergman Ano | 2013 Design | Hana Luzia Especificações gráficas Formato | 1000 x 700 mm Papel | Apresentação 145 g/m² Cor | 1/0 Figura 2.92 — O sétimo selo | Cartaz final.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Este trabalho de graduação apresentou o desenvolvimento de cartazes para filmes de Ingmar Bergman através do processo de design thinking e do método criativo por Retórica Visual. A cinematografia de Bergman foi estudada e cenas dos filmes foram analisadas a fim de se reconhecer características que também poderiam ser encontradas nos cartazes, como uma série. Como prática persuasiva, a Retórica é inerente à todas as linguagens, logo ela é encontrada na linguagem gráfica praticada pelos designers gráficos, porém de uma maneira muitas vezes intuitiva. Os processos projetuais geralmente demandam curtos prazos aos designers e os processos conceituais em geral demandam tempo e maturação de suas operações para um resultado satisfatório e coerente. É importante a compreensão de que o estudo dos processos em qualquer campo profissional valoriza, diferencia e impulsiona o mesmo. O Design, como é reconhecido atualmente, é uma área nova em comparação a outras já estabelecidas. A prática e ‘controle’ do discurso são importantes para a configuração de subsídios teóricos e metodológicos consistentes. Logo, a metodologia utilizada neste projeto teve como objetivo desmistificar a Retórica e proporcionar resultados mais criativos, em que o conceito, aliado a uma estética apropriada e fundamentada, é o fio condutor de todo o processo. A experiência na fundamentação e análise para a produção dos cartazes foi profunda em relação ao que se é pontuado dentro de um projeto de design. Nem sempre esse tipo de processo é possível. A Retórica é pouco abordada dentro do Design e há poucos experimentos. É importante reforçar que este projeto baseou-se em métodos que estão em constante experimentação, e que podem e devem ser ampliados. A paixão pelo diretor e obras em questão também facilitaram a fluência, incentivando assim o desejo em melhor compreender e operar a Retórica Visual. Portanto, os cartazes produzidos tiveram como objetivo antecipar a essência dos filmes, acima de vícios estilísticos e estéticos, e o resultado corresponde à essas peculiaridades.

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