FDC-49-2013-Governadores de armas, mestres de campo e capitães mores no Alentejo na Guerra da Restauração

August 16, 2017 | Autor: F. Dores Costa | Categoria: Portuguese Studies, History Portuguese and Spanish, Portuguese Restoration War
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III

DO CENTRO À PERIFERIA REDES SOCIAIS E CLIENTELAS POLÍTICAS

GOVERNADORES DAS ARMAS, MESTRES DE CAMPO E CAPITÃES-MORES NO ALENTEJO DURANTE A GUERRA DA RESTAURAÇÃO: INOVAÇÕES NA ADMINISTRAÇÃO E CENTROS PERIFÉRICOS DE PODER ________________________________________________________ Fernando Dores Costa CEHC – Instituto Universitário de Lisboa

A guerra da Restauração ou da Aclamação (1641-1668) criou novas instâncias de decisão e de mando, tanto na Corte como à escala local. A situação excepcional de conflito bélico produziu sempre a justificação para a inovação (nestas épocas sempre vista com desconfiança) e uma oportunidade para a afirmação dessas novas autoridades, em conflito com as anteriores. Ao nível da administração régia, a mais destacada expressão disso foi a criação do Conselho de Guerra, cujos membros ensaiaram, por várias vezes, o alargamento dos seus poderes, entrando em colisão com o papel dos outros “tribunais”. Tudo indica contudo que não houve, no caso português de 1641-1668, uma subversão “constitucional” provocada pelo estado de guerra. Portugal constitui um exemplo de uma revolta que conseguira ser vitoriosa escapando, ao mesmo tempo, ao “efeito Cromwell”, designando desta forma a criação paradoxal de um Estado justificado pelas exigência da defesa de uma situação de rebelião que fora inicialmente motivada pelo sentimento de ilegitimidade das exigências crescentes do Estado. A revolta paralela da Catalunha ilustraria esse efeito desmobilizador interno das revoltas obrigadas a uma longa resistência.1 1

Sobre a Guerra da Restauração remeto, para além das obras de Gastão de Melo Matos, em especial o estudo sobre André de Albuquerque publicado nos Anais, Academia Portuguesa de História, volume XII, 1954, para as minhas publicações: 2000 – “As quatro forças que comandam a guerra… Um panorama sobre a Guerra da Restauração”, www.fronteira-alorna.pt/Textos/asQuatro.htm. 2001 – “Formação da força militar durante a Guerra da Restauração”, Penélope, 24 (2001),

Centros Periféricos de Poder na Europa do Sul, Lisboa, Edições Colibri/CIDEHUS-UÉ, 2012, pp. 199-227

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Mas a competição pelo mando entre conselhos régios (Conselhos de Guerra e Conselho Ultramarino, Desembargo do Paço, Junta dos Três Estados, neste caso) também se colocou à escala provincial e local e são estes níveis que mais interessam para uma análise dos «centros periféricos»2. A guerra impôs novos postos e cargos. Na província, a acção militar era dirigida por um governador das armas, tendo como seu segundo um mestre de campo general. Formaram-se vários terços de infantes e companhias de cavalaria, dirigidos pelos respectivos mestres de campo e capitães de cavalos3. Criou-se, para mais, uma rede de capitães-mores pagos nas praças de fronteira, a par dos capitães honorários4. Previsivelmente, o jogo de autoridades alterou-se e o poder social por excelência, aquele que se manifesta pela capacidade de arbítrio sobre os homens, passou a ser disputado de forma mais intensa. Mobilizaram-se inicialmente ordenanças e depois os auxiliares, estes sendo a resposta ensaiada face às dificuldades encontradas na utilização das primeiras. Os militares retiravam às nobrezas locais o poder sobre os seus subordinados. Alguns membros das governanças podiam ganhar uma preeminência sobre os outros indivíduos das nobrezas locais. O problema é pois o de saber em que medida e de que forma o surgimento das autoridades assentes na esfera bélica modificou o exercício do poder à escala local, sobrepondo-se às instâncias tradicionais.

87-119. 2002 – “As forças sociais perante a guerra: as Cortes de 1645-46 e de 1653-54”, Análise Social, 161 (2002), 1147-1181. 2004 – A Guerra da Restauração – 1641-1668, Livros Horizonte, Lisboa. 2005 – “A nobreza é uma elite militar? O caso Cantanhede-Marialva em 1658-1665”, Nuno Gonçalo Monteiro, Pedro Cardim, Mafalda Soares da Cunha (orgs.) Optima Pars. Elites do Antigo Regime no espaço Ibero-americano, Instituto de Ciências Sociais. 2005 –”Interpreting the Portuguese War of Restoration (1641-1668) in a European Context”, www.e-Journal of Portuguese History, vol. 3, n.º 1, Summer 2005. 2009a – “O Conselho de Guerra como lugar de poder: a delimitação da sua autoridade após a aclamação de D. João IV.”, Análise Social, 191 (2009), 379-414. 2009b – “A paz de 1668 e a ilegitimidade dos exércitos permanentes”, Revista de História das Ideias, volume 30, 355-374. Ainda para o estudo de Jorge Penim de Freitas, O Combatente durante a Guerra da Restauração, Lisboa, Prefácio, 2007. 2 A investigação que se apresenta inclui informação presente nas consultas do Conselho de Guerra e aponta para a possibilidade de uma pesquisa que cruze esta com a de outras instâncias de administração e esclareça melhor os conflitos de que aqui temos notícia. 3 Ver: anexos 2 e 3 – terços formados no Alentejo entre 1641 e 1668 e terços de outras províncias que foram em socorro do Alentejo. 4 Ver: anexo 1 – capitães mores na praças de fronteira em 1645.

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Governadores de armas A primeira dimensão refere-se ao alargamento dos poderes dos governadores das armas para além do campo bélico. O conde de S. Lourenço enquanto governador do Alentejo ilustra esse propósito, justificado por uma orientação de rigor penal que desenvolve insistentemente ao longo do ano de 1648, cuja aplicação impõe a subordinação dos ministros letrados ao governador das armas5. No final do ano, quando protestou contra a sua ineficácia, propôs que não pudesse haver despachos (ou seja, promoções) desses ministros sem que apresentem certidão do governador das armas comprovando o seu empenhamento na captura dos soldados em fuga. Um aviso régio de Julho de 1648 ordenou que alguns bacharéis fossem pelas comarcas e pelas províncias do reino a reconduzir os soldados fugidos, para o que se pediriam às contadorias do exército que mandassem listas. A carta que o conde de S. Lourenço escreveu ao rei e que foi objecto da consulta de 7 de Dezembro de 1648 reportava-se aos seus resultados. Os referidos bacharéis teriam tratado somente dos seus negócios e a maioria deles obtivera “Becas” e o que pretendiam enquanto a recondução dos soldados tinha sido irrelevante. Seria indispensável, segundo o governador, que nenhum dos letrados entrasse em nada que fosse do serviço régio sem que apresentasse uma certidão do governador das armas do que obrara na recondução. O conde queria concentrar nos letrados aquela tarefa. Isto por que os soldados se ausentavam cada dia mais, nenhuns homens iam às fronteiras por sua vontade e o governador não queria mandar capitães nem oficiais de guerra a reconduzi-los por causa das queixas que tinha recebido de que estes tomavam dinheiro, ou seja, deixavam-se premiar para não cumprirem as suas tarefas. Pelo que ao conde parecia que o único remédio era o de que os julgadores de qualquer das províncias não fazerem requerimentos sem uma certidão do governador das armas do Alentejo. O rei ordenaria ao Desembargo do Paço que não aceitasse qualquer petição de bacharel sem estas certidões nem o consultasse sem as apresentar6. Se tivesse vingado esta orientação, as tarefas militares teriam ganho um lugar crucial na vida dos ministros de letras, ficando deste modo subordinados aos governadores das armas. Esta era uma proposta de subversão “consti5

Arquivo Nacional – Torre do Tombo, Conselho de Guerra, Consultas, Consulta n.º 25 de 1648. 6 ANTT, Conselho de Guerra, Consultas, Consulta n.º 271 de 7 de Dezembro de 1648. Continuaram as queixas sucessivas do conde de S. Lourenço sobre a falta de efectivos, constando das consultas n.º 117 de 9 de Junho de 1648, n.º 133 de 25 de Junho de 1648 sobre as cartas de Elvas, de 19 e 22 de Junho de 1648, da consulta n.º 139 de 7 de Julho de 1648 sobre carta de 4 de Julho de 1648.

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tucional” que tinha algum alcance. Os governadores de armas seriam tendencialmente a autoridade que concentraria os poderes à escala provincial e a província poderia eventualmente ganhar o papel de uma unidade de administração encabeçada pelo governador das armas. Mas este poder reforçado dos governadores, tomado em si mesmo, seria insuficiente para se manifestar como factor de polarização social. Para isso seria indispensável que se formassem escoltas dos governadores, ou seja, pequenas Cortes formadas pelos seus dependentes, isto pressupondo a residência por um longo período na fronteira e a existência de meios financeiros capazes de sustentar esses residentes. Mas os governadores sucederam-se no cargo e deixaram frequentemente os seus segundos ou mesmo terceiros na fronteira. Para mais, nada nos indica que gastassem os seus rendimentos na sustentação de um grupo significativo de dependentes. Os meios de financiamento régio eram manifestamente escassos, traço central da Guerra da Restauração portuguesa. As Cortes, ou melhor, o estado dos Povos em Cortes, definiram realmente a dimensão do exército, estabelecendo o tecto da contribuição que punham à disposição do rei para a guerra. O dinheiro efectivamente disponível em 1646, por exemplo, permitia a sustentação de uma força muito mais pequena do que a prevista. Constava ser o assento nos cinco meses entre Junho e Outubro de 120 mil cruzados e de 80 mil cruzados nos sete outros meses. Porque havia alguns abatimentos mensais dessas somas para munições e embaixadores, ficavam para repartir pelas províncias 100.097 cruzados e 60.097 cruzados. O horizonte de 960 mil cruzados permitia manter uma força da dimensão que era referida deste modo:

Alentejo Beira Trás-os-Montes Minho Algarve Cascais Peniche

Dinheiro (a)

Infantaria (b)

24.100.000

5.500

1.750

8.000.000

2.000

460

3.500.000

1.115

220

2.430.000

1.000

65

1.190.000

550

644.000

285

175.000

100

40.039.000

10.650

Cavalaria (c)

2.495

(a) Dinheiro que pro rata nos cinco meses do Verão (b) Infantaria que se pode sustentar nesses cinco meses com este dinheiro (c) Cavalaria idem

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Alentejo Beira Trás-os-Montes Minho Algarve Cascais Peniche

Dinheiro (d)

Infantaria (e)

Cavalaria (f)

14.250.000

3.200

1.000

4.900.000

1.150

278

2.200.000

700

130

1.240.000

600

40

720.000

320

404.000

175

105.000

60

24.039.000

6.205

1.448

(a) Dinheiro que pro rata nos sete meses do Inverno (b) Infantaria que se pode sustentar nesses cinco meses com este dinheiro (c) Cavalaria idem

Concluía-se no documento que no Verão haveria em cada uma das províncias um pouco mais de metade do número de homens que se previra e no Inverno um pouco mais da terça parte7. Com efeito, as forças efectivas no Alentejo eram diminutas. Um mapa da força datado de 1 de Julho de 1646 contava na província 7606 soldados infantes e 1531 de cavalo, sem os oficiais das primeiras planas8. O conde de Alegrete referia, em 8 de Outubro de 1646, a existência no Alentejo de 5980 soldados e 609 oficiais, mais cerca de dois mil nas praças de Olivença, Jerumenha, Campo Maior e Ouguela e ainda 800 enfermos em Elvas9. Joane Mendes de Vasconcelos, em 14 de Janeiro de 1648, assinalava que na última mostra havia 4661 soldados, sem contar com as primeiras planas e um dos terços, mas que na data em que escrevia haveria apenas cerca de 3800 homens em nove terços, sem os doentes e os ausentes10. Para mais, a subsistência era mais difícil no Alentejo, onde os preços eram mais altos. O conde de S. Lourenço reclamava que “nam ha duvida que Alemtejo ha mister que se dê aos officiaes o soldo por inteiro

7

ANTT, Conselho de Guerra, Consultas, Consulta de 18 de Junho de 1646 – sobre a ordem que SM manda dar em repartir pelas províncias do reino o dinheiro do assento que se fez para sustento da gente de guerra da dotação delas anexa à consulta n.º 203 de 1646. 8 ANTT, Conselho de Guerra, Consultas, Consulta n.º 226 de 1646. 9 Cartas dos Governadores da Província do Alentejo a El-Rei D.João IV e a El-Rei D. Afonso VI, volume II, Lisboa, 1940, pp. 126-127. 10 Ibidem, pp. 145-147. Cf. Costa, 2001.

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porque está em grandíssima carestia, e assy se nam póde sustentar nenhum com mêo soldo”11. Punha deste modo em causa esta disposição régia. Mestres de campo Em vez de ser atractiva, muita é a informação que aponta para a sistemática ausência dos “cabos do exército” da fronteira e o seu regresso a Lisboa. Muito frequentes são as súplicas dos governadores de armas em exercício para que o rei mandasse fazer regressar da Corte para o Alentejo os oficiais, incluindo os que ocupavam os mais elevados postos. A regularidade desse comportamento ficou expressa pela excepcionalidade (que há muito foi assinalada por Gastão de Melo Matos) do caso de André de Albuquerque. Este pediu licença para acudir a coisas tocantes à sua fazenda que necesitavam da sua assistência pessoal. O parecer do Conselho de Guerra é desconcertante, assim como a resolução régia12. Albuquerque parece ser castigado pela pouca consideração ostentada pelo periódico retorno a Lisboa para a obtenção de mercês régias ou apenas de promessas de mercês. Seria possível (poderiam pensar) que Albuquerque se movesse por si mesmo sem a motivação do prémio? O conde de S. Lourenço defendia em Dezembro de 1647 a conveniência de as praças maiores que tinham terços de infantaria também tivessem capitães mores ou governadores. Uma das razões que o motivavam, conforme explicava, era a de que os mestres de campo e sargentos mores “deferiam pouco”, ou seja, davam pouca importância, às queixas dos moradores porque todos queriam desculpar os soldados. Por isso, os moradores viviam com “grande sentimento” e apenas se atreviam a queixar-se quando o assunto era de consideração. Esses homens tinham por isso, concluía, padecido e continuavam a padecer de “trabalhos e calamidades” na fazenda e na honra. Outra razão, a maior, era a necessidade de um homem que dirigisse a defesa da praça, ao contrário do que acabara de acontecer com a de Castelo de Vide, um homem que “ouvesse de fazer mais que largar a caza ir-se a alguma parte onde escapassem com vida”13. Contudo, anos depois, no início da fase decisiva da guerra continuavam a ser muitas as praças onde os mestres de campo faziam também as funções de governadores das praças. Assim, em 1661, o conde de Atouguia advertia o rei quanto à necessidade de dar governadores às praças para que estivessem em funções quando os mestres de campo saíssem em campanha. Identificava seis: Castelo de Vide, Campo Maior, Jerumenha, Mourão, Moura e Serpa. Quase quatro meses depois, assinalava que 11 Ibidem,

volume I, p. 206. anexo 4. 13 Ibidem, volume I, pp. 213-214. 12 Ver:

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o seu pedido, apesar das promessas, não obtivera verificação na nomeação de homens para esse posto. Em Elvas, quando o conde saiu em campanha, nomeou para governador dessa praça fulcral do reino o mestre de campo D. Luís de Menezes14. Capitães Mores À escala local, as inovações feitas a pretexto da guerra produziram conflitos. Nalguns casos, chegaram ao Conselho de Guerra. Temos alguns exemplos de contendas criadas pelo exercício do posto de capitães mores em terras fora do Alentejo sobre as quais as consultas do referido Conselho nos fornecem uma informação um pouco mais detalhada. Interessam-nos porque ilustram os possíveis efeitos de subversão da ordem local pelo aparecimento de uma autoridade que pretende estar acima da nobreza local e das outras autoridades. São os casos de Torres Novas e de Viseu. O capitão mor de Torres Novas Manoel de Vasconcellos escreveu ao rei dando conta das “calúnias” de algumas pessoas daquela vila suas inimigas e mal afectas ao serviço régio contra ele por ter agido contra elas por serem “revéis” e desobedientes aos mandados régios, amotinando o povo e persuadindo-o a que se queixasse dos procedimentos do capitão mor na execução das ordens vindas do rei. Para tal reuniam-se em casa de Jacinto de Vasconcellos, morador na mesma vila, “tratando de lhe fazerem culpa da prontidão” com que as executava, como o fizera “nesta leva passada” em que recebera ordem régia para que marchasse com a gente de sua jurisdição para Elvas, sendo o primeiro capitão mor que o fizera. E essa sua diligência levara a que a carta régia que mandava suspender essa leva já o encontrara no Ervedal, junto a Estremoz. Esta acção foi publicamente reprovada pelos clérigos daquela vila por terem sido a isso induzidos, segundo dizia, por Jacinto de Vasconcellos e seu cunhado Alvaro Lopez Correa. Estes eram os mesmos que também tinham querido impedir em Câmara que tomasse posse do cargo de capitão mor quando o rei dele fizera mercê, querendo já nessa altura amotinar o povo, tal como agora o procuravam fazer, persuadindo-o a que se levantasse. Tudo isto fomentavam com grandes demonstrações o juiz de fora da mesma vila e o dos órfãos, vereador esse ano, e outras pessoas desta “parcialidade”. Na sua carta, o capitão mor apontava as causas de tão grandes ódios e a maioria deles decorria do zelo e prontidão com que dava execução às ordens régias e cumpria com sua obrigação “como verdadeiro Portuguez” e leal vassalo como fizera na leva passada obrigando-os a que fossem nela. O ponto capital de conflito estaria nesta estrita obrigação de participação nas ordens para acudir às acções militares na fronteira. Sabemos que o modo de 14 Ibidem,

volume III, pp. 104,151,163.

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formação dos exércitos em campanha passava pela reunião de forças vindas de vários pontos do território. Tal impunha uma obediência às ordens para tal recebidas e, à escala local, a sobreposição do executante destas disposições a todos os demais. Os conselheiros de Guerra tomaram, como frequentemente aconteceu e era coerente com a defesa do ponto de vista da guerra, uma posição de apoio ao capitão mor. Escreveram que o povo daquela vila “está muy alterado, occasionado tudo do cap.tam mor executar tão promptam.te a ordem q. teve de VM para prevenir a gente, e marchar com ella como o fez dentro em dous dias seguintes ao em q. recebeo a ordem achandoo a segunda que se lhe enviou para sobrestar na marcha já perto da Villa de Estremoz, donde se tornou com quatrocentos homens que levava.”

O Conselho, considerando que muito conviria que se acudisse antes que o dano fosse maior e ficasse mais difícil remediá-lo, foi de parecer que deveria o rei ordenar ao corregedor João Carneiro de Almada ou a um outro ministro da justiça de que se tivesse satisfação para que fosse com suma brevidade a Torres Novas a devassar as queixas e inquietações, levando ordem para que prendesse e enviasse presos os principais culpados ao Limoeiro, trazendo os autos das culpas para se sentenciarem naquele Conselho de Guerra nos que se fazem de justiça, visto serem culpas cometidas em actos de milícia, desobediência, e conspiração contra o capitão mor. O rei não acompanhou, porém, os conselheiros. Note-se bem que nesta oposição não estamos perante um detalhe: os conselheiros consideravam que o assunto estava no âmbito da sua jurisdição, devendo ser julgados naquele Conselho os homens que tinham desobedecido e conspirado contra o capitão mor de uma terra que não era de fronteira. Mas eram culpas em actos de milícia. A resolução régia datada de 3 de Agosto foi conciliadora, parecia desvalorizar os acontecimentos e retirou o poder disciplinar dos conselheiros de cena: “A estes homens se diga q. tratem de se aquietar e cumprir as ordens q. se lhe derem como a cada hum tocar de maneira q. me não tornem segundas queixas.”15 Outra ilustração provém de Viseu. A Câmara e o cabido da Sé de Viseu queixaram-se do capitão mor João Paes do Amaral. O capitão mor era contestado pelos notáveis locais e defendido pelo Conselho de Guerra. Os fundamentos do conflito são assim explicados: “o odio q. lhe tem não procede de nenhuma outra cousa mais q. de os obrigar a hir a servir a VMg.de quando se offerece occasião para isso, merecendo elle assi por isto, como pella qualidade de sua pessoa, sendo huma das 15 ANTT,

Conselho de Guerra, Consultas, Consulta n.º 299 de 1644 – sobre o que escreve o capitão mor de Torres Novas acerca das alterações que ali há com ele.

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mais principaes daquella cidade e dos mais afazendados della, e dos q. mais promptamente acodem ao Real serviço de VMg.de a fronteira com seus filhos e criados, fazendoo sempre a sua custa em q. tem despendido muita fazenda16.”

Este era, segundo o resumo inscrito na consulta, o resultado da investigação que fora feita sobre os conflitos. Para se verificar com certeza este assunto, explicavam os conselheiros, mandara o rei que fossem remetidos os papéis ao conde de Serem, governador das armas da provincia, e que este, informando-se em segredo com pessoas livres e sem suspeita, avisasse o rei com o seu parecer. O governador encomendara esta diligência ao provedor da comarca de Viseu por ser um ministro de satisfação e este na sua carta dizia que João Paes de Amaral, capitão mor da cidade era um homem nobre, rico e afazendado e que exercia “o dito cargo com brandura, e suavidade sem oppressão do Povo”. Identificava deste modo a raiz do problema: “Os homens nobres daquella cidade tem grande descontentamento de elle occupar aquelle lugar; e bem considerada a causa não há outra, se não de não quererem ser mandados por um vesinho, nem verem hum homem seu natural em posto mais levantado. A gente do Povo esta contente, e quieta, livre das oppressões q. costumão padecer os Povos em q. há semelhantes ministros estrangeiros17.”

Os equilíbrios internos das nobrezas locais podiam ser deste modo subvertidos pela importância ganha por um membro que se destacava através deste cargo e do poder de dar ordens a todos, nobres e seus dependentes, para acorrerem às situações de urgência bélica. O conselheiro de guerra e antigo governador das armas da província da Beira, D. Álvaro de Abranches, caracterizava de forma expressiva o que estava em causa: esses homens estavam habituados a ser uns pequenos reis nas suas terras e a mobilização militar dos homens punha em causa essa capacidade de disposição ilimitada dos homens. Numa sociedade obcecada pela hierarquização, certas promoções eram interpretadas como afrontosas. Ser mestre de campo de um terço era menos do que ser capitão mor, pelo menos de uma praça como Elvas. Manuel Freire de Andrade, recebendo do secretário António Pereira a informação de que o rei o nomeara para mestre de campo do terço que tinha sido do visconde D. Diogo de Lima, respondeu:

16 ANTT,

Conselho de Guerra, Consultas, Consulta n.º 105 de 1646, de 26 de Abril, sobre o capitão mor de Viseu João Paes do Amaral. 17 ANTT, Conselho de Guerra, Consultas, Consulta n.º 105 de 1646, de 26 de Abril, sobre o capitão mor de Viseu João Paes do Amaral.

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“a pouca conta que com sua pessoa se teve despois de tantos annos de serviço e sofrim.to assi nas merçes como nos postos; e que sendo este que agora se lhe offerece reputado por menor q. o q. ategora occupou não sera justo que comece por elle o exemplo de desautorizar a opinião que se tem daquella praça; Com tudo por mostrar que serve ainda alem do que pode, se offereçe a servir este verão de Capitão mor Delvas, servindosse VM de que acabado elle sem nova Licença se possa recolher á sua caza e que quando VM não seia assi servido, naquella praça, na campanha, ou em qualquer outra parte hira servir de soldado com huma piqua, porq. para isto não necessita de merçes, ou favores.”

A resolução da consulta, datada de vários meses depois, 17 de Agosto de 1648, afastava Freire de Andrade: “Consultemseme pessoas pera este Terso e a M.el Freire se escuse da occupação q. tem.”18 O conflito previsível opunha os capitães mores aos homens de leis, tanto no espaço local como no espaço da administração da Corte. Manoel Lobo da Silva, capitão mor da cidade de Portalegre, respondeu a uma carta que do rei havia recebido sobre as queixas que dele haviam feito o corregedor Simão Pereira e o juiz de fora daquela cidade. Estes afirmavam que se intrometia nas suas jurisdições e nas dos mais ministros de justiça, o que, alegava o capitão mor, “tudo era ao contrário”. Tinham feito tais queixas com o pressentimento de que o capitão mor iria representar ao rei as suas culpas e que deste modo poderiam ficar sem castigo. Não o havia feito antes por considerar que, no tempo que passava, apenas se deveria tratar de ofender o inimigo e de prevenções de guerra. O capitão mor relatava, pormenorizadamente, os procedimentos do corregedor que, de acordo com o resumo dos conselheiros, indicavam ser ele muito ambicioso. Tratava apenas de juntar dinheiro pelos modos que se referiam e seria muito remisso na obrigação do seu ofício e no que se ordenava do serviço régio. Pedia que esta carta e os capítulos que dos procedimentos deste corregedor se tinham dado se remetessem a um ministro que, desinteressadamente e sem respeitos, os examinasse para que constasse ao rei quão prejudicial era ao seu serviço. A resolução régia ordenava efectivamente ao desembargo do Paço que mandasse tomar informação dos procedimentos daquele corregedor mas acrescentava que, porque a justiça deveria ser igual para todos, também dispunha que o ministro que fosse ao Alentejo devassar dos ministros de guerra se informasse do modo como Manuel Lobo da Silva se tinha havido com o mesmo corregedor.19 Crucial é 18 ANTT,

Conselho de Guerra, Consultas, Consulta n.º 91 de 1648 – 9 de Maio de 1648 – sobre Manoel Freire de Andrade, CM de Elvas. 19 ANTT, Conselho de Guerra, Consultas, Consulta n.º 15 de 1644, de 14 de Janeiro – sobre os procedimentos do corregedor de Portalegre de que avisa o capitão mor Manuel Lobo da Sylva.

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a referência em régia resolução à justiça igual para todos. Os conselheiros estavam claramente a favor do capitão mor. Contudo, o rei mandava inquirir sobre o letrado, mas fazia o mesmo com o capitão mor, invocando uma equidade face à “justiça”. Além do que significa “justiça” neste contexto, confirma-se que D. João IV (e os que com ele despachavam) não reconhecia aos homens de armas o privilégio que reclamavam de não serem sindicados devido ao carácter da sua autoridade, que não se compadeceria com o efeito público das maledicências. O assunto Manuel Lobo da Silva regressou pouco depois ao Conselho. Temos imagens completamente opostas da acção do capitão mor na terra20. A consulta respeita, em primeiro lugar, à carta remetida ao rei pelos oficiais da Câmara, nobreza e misteres da cidade de Portalegre, abonando os seus procedimentos no exercício do cargo de capitão mor daquela praça e pedindo que lhes fizesse mercê de o mandar continuar nele por se ter procedido com tal zelo do serviço régio, assim na fortificação da cidade como na sua guarda, que entendiam que nenhum outro poderia ocupar este posto com mais satisfação. Mas em uma outra carta, que o rei também mandou remeter ao Conselho, Simão Pereira Botelho particularizava as causas que deveriam levar o rei a não permitir que Lobo da Silva voltasse a exercitar o cargo por ter procedido no exercício dele com tal tirania e atrocidade nos passados dois anos e meio em que o servia. Seria grande inconveniência do serviço tornar a ocupar este posto pelo pouco conhecimento e experiência que tinha das coisas da guerra e porque o exercitava com tão absoluto poder que, não só desobedecia às ordens do governador das armas e mais ministros superiores, mas também afrontava os ministros da justiça, prendia os oficiais desta por causas leves e que lhe não tocavam, suspendia-os dos seus cargos, tratando-os com tão injuriosas palavras que nenhum se atrevia a fazer diligência com ele, atropelando a todos com público escândalo, e contra toda a razão e justiça, usando os mesmos rigores com as pessoas que o não querem servir de graça, retendo-os na prisão o tempo que lhe parecia. O rei deveria mandar informar-se sobre isto e achando ser verdade todo o que relatava, ordenar que Manuel Lobo não tornasse a Portalegre a exercitar o cargo de capitão mor. Os conselheiros de Guerra, embora afirmassem que tudo isto poderia proceder dos confrontos que Manuel Lobo tivera com os ministros e oficiais da justiça daquela cidade por causa das jurisdições, deu parecer para que houvesse um apuramento do que se passava. Para tal, o rei mandaria as duas cartas ao desembargador Jorge da Silva Mascarenhas, que ia visitar a província do Alentejo, com ordem para que averiguasse tudo e fizesse uma infor20 Exemplo

que é sempre desconcertante para os historiadores pois os testemunhos ostentam esta divergência remetem para a amizade/inimizade como matriz social organizadora e desvalorizam os relatos literais constantes das fontes.

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mação secreta ao rei. A resolução régia aprovou o parecer, mas acrescentou: “E esta diligencia se encomende logo a Mathias d’Albuquerq.”, ou seja, ao governador das armas e não a um homem de leis21. Fica-nos deste modo a sensação de que a divergência de informações fazia hesitar os próprios conselheiros e o rei. Outro exemplo é o conflito entre a Câmara e o capitão mor de Avis. O ouvidor afirmou que não existiam fundamentos para as queixas contra o capitão mor e que o juiz de fora era a causa dos conflitos; a Câmara, contudo, insistia nas acusações. O ouvidor foi mandado inquirir e remeteu carta com um instrumento de testemunhas e que foi remetida ao Conselho de Guerra. Diz ele que juraram pessoas nobres e as mais desinteressadas e dignas de fé que lhe pareceram. Do instrumento e carta constava que D. Miguel da Silva tinha procedido e procedia no exercício do cargo de capitão mor com grande satisfação, sem se achar que houvesse cometido nele desordem alguma. Pelo contrário, seria muito capaz para o exercitar, muito zeloso do serviço régio e muito cortês, sem aceitar nada. Advertindo o mesmo ouvidor que seria muito conveniente, para evitar as desinquietações e diferenças que havia entre o capitão mor e os oficiais da Câmara, mandar o rei tomar residência ao juiz de fora daquela vila e tirá-lo dali por ele ser quem as movia. Vista a informação do ouvidor e como constava dela que este capitão mor procedia bem, entendera o Conselho, conforme explicavam os seus membros, que não havia que prover de novo. Sem embargo disto, insistiam os oficiais da Câmara que o rei mandasse tomar conhecimento dos capítulos que tinha dado contra o mesmo capitão mor e que o rei mandara remeter ao Conselho com a carta e petições que apresentaram, nos quais se continham defeitos de incapacidade, insuficiência e de pouco talento para o exercício do cargo e outros de malquisto, descortês e “rigoroso” no cumprimento das ordens régias. Estas ordens executava com excesso apenas com o fim de molestar os moradores daquela vila, de quem se teria mostrado inimigo capital, intimidando-os e, pelas prevenções desordenadas que fazia, levando-os a imaginar que o poder do inimigo era muito avantajado ou que já se encontrava sobre o reino. Além disto, tinha desonrado e infamado algumas mulheres naquela vila, solicitando-as com grande demasia e público escândalo. Pediam, em suma, que o rei mandasse tomar conhecimento para que cessassem as queixas daquele povo e as “sem razões” de que o capitão mor usava contra ele. Provados, que fosse servido remover do cargo a D. Miguel da Silva e provê-lo em pessoa que cumprisse inteiramente com as obrigações. Os conselheiros de Guerra tomaram a defesa do capitão mor. Da informação 21 ANTT,

Conselho de Guerra, Consultas, Consulta n.º 146 de 1644 – 23 – sobre o que escrevem os oficiais da Câmara, misteres e nobreza da cidade de Portalegre e Simão Pereira Botelho acerca dos procedimentos de Manuel Lobo da Silva.

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do ouvidor se entenderia que o capitão mor procedia bem e supunha-se que as alegações da Câmara procederiam de diligências feitas pelo vereador que fora mandado ir preso a Évora. Entendiam que não haveria lugar a mais nenhuma averiguação e o rei mandaria responder aos oficiais da Câmara que estava informado dos procedimentos do capitão mor e que determinava que acudissem pontualmente ao que ordenasse. Por fim, por que o ouvidor apontava que estas desavenças procediam de ser o juiz de fora “naturalmente revoltoso”, deveria o rei mandar retirá-lo do cargo. Na resolução, D. João IV concordava com o parecer do Conselho22. Em Avis, tal como em outras terras, houve formação de “partidos” e o encabeçado pelo ouvidor suplantou o camarário. Note-se, entretanto, a acusação de “rigor” na aplicação das ordens, a qual sempre dá corpo às acusações contra os capitães mores. Alguns homens parecem ter tomado o posto de capitão mor motivados pelo ideal do serviço militar feito à custa do próprio. Este ideal deveria ser supostamente “natural” entre a nobreza e o desejado pelos reis. A riqueza que a classe superior detinha era justificada, nos discursos legitimadores da nobreza, para que dispusesse de meios para poder servir o seu rei e, em primeiro lugar, através da guerra. Os reis deveriam receber esse serviço sem terem a necessidade de mais nenhum aliciamento material dos nobres. Quando muito, haveria prémios para os que especialmente se distinguissem. Sabemos, contudo, que, praticamente, se estava longe disto. Assim, António de Sousa de Meneses representava ao rei que havia dois anos que estava servindo de capitão mor da vila de Estremoz à sua custa, com notória (segundo o próprio) satisfação e zelo do serviço e com tal cuidado e aplicação que logo que entrara naquela praça, achando-a sem fortificação nem reparação, tratara de fortificá-la, cercando de trincheiras o arrabalde e fechando com quatro portas fortes, reparando a muralha e o castelo em muitas partes em que estava para cair e fazendo grandes lanços de parapeitos e portais. Fizera desentulhar um poço muito antigo existente no castelo utilizando, durante um mês, quarenta homens trabalhando de dia e de noite, os quais fizera vir das freguesias do campo alternadamente, sem custos para a fazenda régia. Achando naquela praça somente nove companhias com pouca gente, nas novas listas que fizera formara onze com 150 homens cada, nelas separando para os socorros mais de 500, com que se acudira às fronteiras por três vezes que lho ordenara o governador das armas, formando também nas freguesias do campo (onde não havia companhias) cinco de 230 homens cada, separando nelas mais de 300 para os socorros. A estas cinco companhias, assim como às onze da vila fizera armar à sua custa, e comprar, por conta dos moradores, algumas bocas de fogo. Estando tudo isto concluído e ficando ape22 ANTT,

Conselho de Guerra, Consultas, Consulta n.º 46 de 1644 – sobre o capitão mor de Avis Dom Miguel da Silva

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nas a tarefa de governo e guardas das companhias da terra para a qual havia um sargento mor e tenente do castelo posto pelo rei, pedia a mercê de ser desobrigado da dita praça para poder servir nas fronteiras. A consulta foi objecto de duas resoluções. Uma, de 13 de Abril, determinando que assim que se lhe nomeasse a comenda de que fora feita mercê não venceria a soldo. Outra, de 26, precisava que, nomeada a comenda e servindo no mesmo posto de capitão mor, não venceria soldo23. O serviço à sua própria custa podia ser assim o passo preliminar para forçar à obtenção de remunerações régias. Um conflito teve igualmente lugar entre o capitão mor e o “povo” de Jerumenha, tendo a particularidade de nele se ter destacado um eclesiástico. A devassa mandada fazer ao licenciado António Pimenta de Araújo concluiu que “nem com deligencias secretas” e ouvindo grande número de testemunhas encontrara faltas dos moradores. Pelo contrário, estando estes muito pobres por não granjearem as suas fazendas pelo impedimento feito pelo inimigo, tinham acudido ao trabalho da reparação da praça e na vigilância das guardas. Quanto aos “motins” que tinham tido lugar contra a pessoa do capitão mor, “achou ser o principal autor delles o Padre frey Balthazar prior, ou cura da Igreja Matris, q. acostumado a dominar os moradores, e parciandosse com alguns dos capitães mores antecessores de Balthazar Telles, os dominava; e por não se ajustar com elle este capitão mor vierão alguas vezes a ter palavras descompostas, e delle resultar convocar o Padre algumas pessoas de sua facção, e tocando o sino da Camara ajuntar aos officiaes della, e fazerem capitolos contra o capitão mor.”

Com ele escrevera ao governador das armas que o retirasse do posto por tratar mal os moradores com palavras e ter algumas vezes espancado alguns por não acudirem ao trabalho com a diligência com que o capitão mor mandava e também por ser algumas vezes “demasiadamente apaixonado”. Os conselheiros davam parecer para que se “estranhasse” o procedimento do padre e o rei concordava: “Como parece e assi se ordena a Mesa da Consciencia.”24 Um último exemplo de conflito envolvendo os capitães mores é protagonizado por Gomes Freire de Andrade, capitão mor de Beja. Encontra-se em 1648 preso no Limoeiro. As raízes do conflito são assim referidas: “as

23 ANTT,

Conselho de Guerra, Consultas, Consulta n.º 105 de 1644 – sobre António de Sousa de Meneses 24 ANTT, Conselho de Guerra, Consultas, Consulta n.º 228 de 1646 – sobre a diligência que fez o auditor geral do exército de Alentejo acerca das dúvidas que houve entre o capitão mor de Jerumenha e o povo.

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causas porq. os poderosos da Cidade de Beja lhe cobrarão odio procederão de aver elle comprido inteiram.te com as obrigações do serviço de VM no exercicio do cargo de Capitão mor daquella Cidade”25. Uma vez mais, o antagonismo entre a autoridade do capitão mor e a consagrada e tradicional da nobreza local era a razão identificada para os conflitos à escala local. A amizade – inimizade (que se deve entender como a inclusão ou exclusão do próprio em um grupo de protecção) organizava as redes e conduzia os homens, pelo que os letrados que faziam as inquirições seriam eles próprios movidos pelas paixões. Assim, Gomes Freire apontava que lhe era notoriamente suspeito o desembargador que conduzira a recolha de testemunhos, havendo procedido como seu inimigo capital no “tirar da devassa”, aceitando capítulos contra ele sem serem assinados, mostrando claramente este ódio e inimizade ajudando os seus caluniadores, interrogando as testemunhas de sua parcialidade e que eles apontavam e interrogar os capitães e oficiais das companhias que havia naquela cidade por entender que haveriam de jurar com inteireza procedendo em tudo “absolutamente”. Mandando também que se abrissem as portas da sua casa, arcas e escritórios e inventariando a sua fazenda como se tivera cometido crime de lesa Majestade, divina ou humana, executando-o em mais de duzentos mil réis sem ter para isto ordem régia. A seu favor, referia o capitão mor o serviço régio durante seis anos e também o do seu filho Gil Vaz Lobo, com muita satisfação e despesa de sua fazenda, por cuja causa padeceria ele e sua família grandes apertos e necessidades. O parecer dos conselheiros era que o rei mandasse ordenar ao desembargador Jorge da Silva que, depois de acabados os negócios que o ocupavam em Beja e Serpa, voltasse a Elvas e ali sentenciasse em alçada a causa de Gomes Freire e as mais que não estavam ainda sentenciadas. Gomes Freire seria notificado para se apresentar em Elvas. Mas, em 1649, Gomes Freire estava preso de novo na cadeia da Corte e pedia alvará de fiança. Por isso eram apresentadas as acusações que recaíam sobre ele. Ao promotor fiscal da assessoria deste Conselho de Guerra, o desembargador João Carneiro de Morais, fora pedido parecer sobre a petição, no qual refere que em duas devassas tiradas pelo doutor Jorge da Silva Mascarenhas ficou “culpado” – ou seja, nos termos da época, o equivalente ao que a penalidade moderna designa por acusado – o suplicante Gomes Freire. A primeira devassa, tocante a seus procedimentos, na qual tinha formado a justiça seu libelo com 43 artigos sobre os crimes conteúdos na petição que fazia ao rei e estava 25 ANTT,

Conselho de Guerra, Consultas, Consulta n.º 81 de 1648 – sobre Gomes Freire de Andrade.

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“muy culpado [ou seja, indiciado] o supplicante não so por inimigos, mas por muito grande numero de testemunhas q. iurão contra elle assi na materia de ser muy insolente no officio de capitão mór, com grande vexação dos moradores da cidade de Beja, como tambem na falta de limpeza soltando prezos por dinheiro, e recebendo peitas em prejuizo dos Povos, e do serviço de VM”. A segunda devassa dizia respeito ao caso qualificado como “grave”, acontecido em Elvas, do ferimento mortal do juiz de Beja, o licenciado Sebastião Vieira de Matos, e morte do seu escrivão Manuel Fialho dentro de sua casa. Nesta devassa era acusador o referido Sebastião Vieira e nela não havia nenhuma testemunha contra o suplicante e somente constava haver inimizade entre eles por lhe haver posto “suspeição” e pela fama de se ter cometido o dito crime por Gil Vaz Lobo, filho do suplicante, com outros homens da sua parcialidade e mais alguns indícios considerados não “veementes”26.

O capitão mor interpretava ou deveria interpretar o ponto de vista da guerra contra os interesses e atavismos locais. A carta de 5 de Agosto de 1648 de Jerónimo de Melo de Castro, depois de tomar a posse da capitania mor de Évora, segunda cidade do reino, reportava como “se encaminhava nella as cousas da guerra”. Haveria bastantes armas para toda a gente, mas toda ela pouco acostumada a entrar nas guardas e à vigilância e os que eram ali tidos por melhores até aquela altura nada disso haviam feito. Ainda que fosse muito dificultoso introduzi-lo (ao costume de vigilância), procuraria com todas as forças que ninguém faltasse à sua obrigação. Na companhia dos auxiliares achara grandes desordens porque não se acertara o modo de serem feitos e por isso era forçoso que quando a ocasião o pedisse, faltasse a maior parte, tal como acontecera o ano anterior. Isto porque os auxiliares haviam sido feitos pela Câmara e corregedor da “peior gente”, que não sabia estimar os privilégios que o rei lhes dava e daqueles que tinham saído da cidade há poucos dias tinham fugido quase todos. Se obtivesse do rei ordem para, com a Câmara, acudisse a essa desordem, seria o mais conveniente para a cidade porque ficando tais auxiliares prontos se estaria em toda a ocasião (ou seja, momento de urgência militar) cansando menos o povo. Encontrara ainda as portas da cidade muito arruinadas. Os oficiais da Câmara haviam referido a mercê régia de cem mil réis para “estas cousas”, fortificação e artilharia, mas ainda não estavam cobrados. Faltavam quatro capitães, porque esse cargo 26 ANTT,

Conselho de Guerra, Consultas, Consulta n.º 37 de 1649 – sobre Gomes Freire de Andrada preso na cadeia da Corte, que pede alvará de fiança para solto se livrar. Na capa da consulta foi escrito: “na petição de q. se faz menção nesta cons.ta se fez o Alvará de fiança por ser assi estilo”. O parecer do desembargador era que o rei podia conceder a Gomes Freire o alvará pedido “para se livrar solto com fiança” de dois mil cruzados. Os conselheiros de Guerra tinham sido favoráveis ao parecer e assim seria a resolução régia.

Governandores de armas, mestres de campo e capitães-mores no Alentejo 215

que “ha tão pouco se procurava tanto, se tem hoie por afronta. E acho grande sentimento em toda esta cidade dos Cappitaes q. se tem escusado de poucos dias a esta parte”. O remédio que apontava para que houvesse a “estimação” desse posto seria escrever o rei à Câmara para que não inscrevesse nas pautas dos vereadores nenhuma pessoa que não fosse ou que houvesse sido capitão. A resolução régia determinava com efeito que fosse remetida “daquela Comarca” uma “lista das pessoas q. se tem escusado de servirem os postos de Capitães porq. quero me fiquem em lembrança pera não se consultarem em nenhuns outros off.os nem ainda de vereadores”27. Num caso pelo menos, os interesses locais guiavam a celebração de um cessar-fogo local, com o acordo do rei, mas sem o conhecimento do governador das armas e dos conselheiros de guerra. É o caso de Serpa. Os conselheiros, não tendo notícia das ordens que o governador das armas dizia que lhe tinham sido enviadas pela secretaria de Estado para que fosse feito um acordo entre os moradores de Serpa e os do condado de Niebla sobre a cultura de seus campos e pasto dos gados, era de parecer que o rei mandasse escrever ao conde de São Lourenço, advertindo-o que porquanto este negocio tocava também a jurisdição do Algarve se ajustasse com o governador daquele Reino. Lembrava o Conselho, como já por outras vezes o havia feito, quão danoso e prejudicial era enviarem-se ordens tocantes à guerra e ao bom governo das fronteiras a pessoas particulares para lhes darem execução, sem primeiro se dar notícia delas ao Conselho e aos governadores das armas28. Confluíam neste caso os planos régios e as vantagens locais. Destes exemplos de conflitos envolvendo capitães mores podemos inferir que, à escala local, estes puderam ser efectivos elementos de subversão da autoridade e sujeitos às acusações de abuso dos seus poderes através da aplicação excessiva das ordens régias respeitantes aos assuntos da guerra. Podemos suspeitar com fundamento que os membros das nobrezas locais não viram com bons olhos este destacamento de um indivíduo acima deles e com a capacidade de dar-lhes ordens e de disposição dos seus homens. 27 ANTT,

Conselho de Guerra, Consultas, Consulta n.º 184 de 1648 – 21 de Agosto – sobre o que escreve Jerónimo de [ Melo de] Castro capitão mor de Évora do estado […] que achou algumas coisas que pedem remédio. 28 ANTT, Conselho de Guerra, Consultas, Consulta n.º 72 de 1649 – sobre o que a Câmara de Serpa escreveu em ordem a se observar a correspondência que tem aquele povo com os moradores do condado de Castela na cultura dos campos e pasto dos gados com ordens de VM. A resolução régia foi a seguinte: “Prohibãosse sob pena de caso maior as entradas em Castella q. se poderão fazer somente com ordem expresa do governador das armas, e isto asi nas terras do condado como em todas as maes e nesta conformidade se escreva aos governadores das armas; e quanto a se não fazer aviso em ordem a ellas se não pello conselho de guerra há annos q. se observa inviolavelmente nesta conformidade.” Ver: anexo n.º 6.

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As conclusões que podemos retirar desta incursão nas consultas do Conselho de Guerra são, por um lado, a de que a Aclamação de 1640 estabeleceu um novo centro na Corte de D. João IV (e dos seus sucessores) e que atraía constantemente os homens deslocados para as fronteiras. Por outro, os detentores dos novos cargos de direcção dos assuntos da guerra não tinham meios para a criação de núcleos de atracção nas fronteiras. Predomina do estudo da documentação a imagem de uma presença forçada pela oportunidade de fazer serviços que dariam valor aos indivíduos na Corte. Nalguns casos, porém, os poderes dos capitães mores terão desequilibrado as governanças e conduzido a conflitos com expressão local e à criação de uma tensão latente entre as vereações, os capitães mores e os ministros letrados. Índice de Anexos 1. 2. 3. 4. 5. 6.

Uma rede de capitães mores nas praças de fronteira (1645) Terços criados para o Alentejo durante a guerra Forças chamadas ao Alentejo para reforço da sua defesa A consulta sobre o pedido de licença de André de Albuquerque A hipótese da força militar paga pelas Câmaras (1664) Carta da Câmara de Serpa sobre o acordo com o condado

1. A rede de capitães mores no reino em 164529 Província do Alentejo Manoel Freyre de Andrade Rodrigo de Miranda Henriques Ruy de Britto Falcão Gracia Soares Coutinho D. Teodósio Coutinho de Bragança Manoel Coutinho Pereyra Luis Mendes de Vasconcelos António Salvago de Souza Manoel Roiz Raposo D. Henrique Henriques 29 “Rellação

CM de Elvas CM de Olivença CM de Estremoz CM de Monforte (*) CM de Veiros (*) CM de Niza CM de Vila Viçosa CM de Cabeça de Vide (*) CM de Mourão CM de Moura

23.200 23.200 18.000 8.000 8.000 8.000 18.000 13.000 8.000 18.000

das praças da Raya, das Provincias de Alentejo, Bejra, Tras os montes, Entre Douro e Mynho, e do Reyno do Algarve, e nomes dos Cap.es mores dellas, e os que vencem soldo e servem a sua custa”, anexa à consulta n.º 56 de 1645 de 21 de Junho – sobre a relação dos postos de capitães mores das praças da raia e das pessoas que os ocupam. Siglas usadas na transcrição: CM – Capitão-mor; SM – Sargento-mor.

Governandores de armas, mestres de campo e capitães-mores no Alentejo 217 D. Francisco de Souza João Vieira de Araujo Manoel Alz Belchior Lobato da Costa Gonçalo de Siq.ra Estevão de Pino Limpo Pascoal da Costa Francisco Paes

Governador de Alconchel CM de Alegrete CM de Alegrete (sic) CM de Mértola CM de Arronches CM de Noudar CM de Ouguela SM em Vila Nova del Fresno

24.000 8.000 8.000 13.000 8.000 8.000 8.000 26.000

(*) (indicação à margem) “está reformado”

Capitães mores que não vencem soldo Luís de Miranda Henriques Cristóvão de Mello Manoel de Lemos Mourão Tomé Pereyra de Andrade António Pereyra de Lacerda D. Miguel da Sylva Terena não tem CM Portalegre está vago

CM da cidade de Évora CM de Serpa CM de Monsaraz CM de Jerumenha CM de Mourão CM de Avis

Uma ordem régia mandava ao contador geral que, face à relação, desse conta da razão de cada um dos que ocupavam esses postos para que se pudesse com bastante notícia obrar e se convinha extinguirem-se alguns. O contador geral respondia que na província de Alentejo o rei ordenara que houvesse praças “prezidiais”, cada uma com sua dotação e que a praça de armas estivesse em Estremoz, aonde estaria o “troço” do exército que restava depois das praças dotadas. Determinara que somente nas vilas de Montalvão, Castelo de Vide, Alegrete, Ouguela, Jerumenha, Mourão e Moura houvesse capitães mores pagos e em Vila Viçosa e na vila de Estremoz, havendo de ser praça de armas. Parecia-lhe que se deviam extinguir os capitães mores de Nisa, Veiros, Monforte e Cabeça de Vide. O sargento mor de Vila Nova del Fresno tinha soldo de 26 mil “sendo q. não deve vencer mais q. metade” e o soldo do capitão mor de Mértola vencia 13 mil, sendo que “pelo cargo” lhe tocariam oito mil. Província da Beira João Freire da Cunha Paulo de Andrade Francisco Soares Homem

CM de Escalhão CM de Castelo Bom CM de Vilar Maior

8.000 8.000 8.000

218

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Sargento mor Mateus da Rocha Jerónimo Borges Luís Vaz Pinto Francisco de Freitas de Payva Custódio Favacho Francisco Barroso Simão da Costa Fejo

CM de Alfaiates CM de Penamacor CM de Monsanto CM de Proença CM de Penagarcia CM de Salvaterra Governador de Segura

13.000 8.000 4.000 4.000 4.000 4.000 8.000

Capitães mores que não vencem soldo Manuel Monteiro Barbosa CM de Castelo Rodrigo serve à sua custa Mestre de Campo Diogo Gomes de Figueiredo CM da praça de Almeida Não se sabe ainda o soldo que há de vencer suposto que a seu antecessor D. Sancho se pagaram por mês 46.400 Francisco Coelho Ozorio CM de Castelo Bom serve à sua custa Mestre de Campo Manuel Lopez Brandão CM de Sabugal Pagou-se nos tempos passados 23.200 ainda que por não haver regimento naquela província se não sabe o que há de vencer de soldo Tomás de Afonceca CM da Idanha a nova serve à sua custa Pero Domingues Cordeiro CM de Rosmaninhal serve à sua custa A praça de Val de Lamula governam por seu turno os capitães a que toca cada mês. Província de Trás os Montes Manuel Roiz Furtado CM do Castelo de Montalegre Manuel Barreto de Menezes CM do Castelo de Monforte do Ryo Livre Rodrigo Dourado de Maris CM de Vinhais Salvador de Mello de Britto CM de Bragança Nicolau de Sequeira Freire CM do Castelo do Outeiro João Duque CM de Vimioso Frei Pedro de Araujo CM de Miranda As praças de Chaves e de Lomba e o castelo de Algoso não têm capitão mor Província de Entre Douro e Minho Rui Pereyra Sottomayor

CM e Alcaide mor de Caminha Vence o soldo de capitão de infantaria com uma companhia que tem que são 8.000

Governandores de armas, mestres de campo e capitães-mores no Alentejo 219 Manuel de Souza de Abreu Cristóvão Mousinho Francisco Soares de Castro João Tavares António de Souza de Menezes Pedro de Faria alferes reformado Alexandre de Souza Vasco de Azevedo

CM de Vila Nova Vence o soldo de SM q. são 13.000 Governador de Valença tem o soldo de capitão de infantaria 8.000 CM de Monção não goza soldo CM de Valadares Vence o soldo de capitão Governador de Melgaço “he pago” governa o castelo da vila de Castro Laboreiro “onde he soccorrido” CM de Lindoso serve à sua custa CM de Portela de Homem serve à sua custa

2. Terços formados para a província do Alentejo – 1641-1668 Guarnição

Primeiro mestre de campo D. Miguel de Azevedo

1

1641-1668

2

1641-1668

3

1641-1645

4

1641-1668

Campo Maior

5

1641-1668

Castelo Vide

de

6

1641-1645

Moura Mourão

e

7

1643-1668

Elvas e Mourão

8

1643-1668

Olivença e Vila Viçosa

9

1643-1668

Campo Maior

30 algumas

para a guarnição de Elvas

D. João da Costa D. João de Souza

Data de formação Formado de novo no ano de 1641 Formado de novo em 30 de Janeiro de 1641 30 de Janeiro de 1641

Aires de Saldanha de Albuquerque D. Nuno Mascarenhas

1.º de Fevereiro de 1641

D. Francisco de Sousa, conde do Prado Francisco de Mello

30 de Janeiro de 1641

D.António Hortis de Mendonça Martim Ferreira da Câmara

1643

companhias passaram a outros terços

29 de Janeiro de 1641

1643

1643

Data da reformação do terço 30 de Maio de 1668 7 de Agosto de 1668 20 de Maio de 1645 1.º de Junho de 1668 1.º de Setembro de 1668 20 de Março de 164530 22 de Agosto de 1668 24 de Agosto de 1668 2 de Junho de 1668

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220 10

1643-1645

David Calé [Caley]

11

1643

12

1644-1645

13

1645-1668

Olivença

D. Luís de Almada conde de Penaguião, camareiro mor Belchior de Lemos de Britto

14

1657-1668

Elvas

15

1657-1659

Mourão

16

1663-1668

Portalegre

Alexandre de Moura

1663

17

1663-1668

Estremoz

João da Costa de Brito

1663

18

1665-1668

Valença

Francisco Mendes Homem

166534

conde de São João Francisco Mascarenhas

Foi para a província do Alentejo em 23 de Junho de 1643 e de novo em 23 de Abril de 164431 1643 1644 em Lisboa no ano de 1645 e veio para a guarnição de Olivença em 5 de Novembro desse ano 165733

9 de Março de 1645

Outubro de 164332 4 de Março de 1645 26 de Junho de 1668

29 de Maio de 1668 22 de Janeiro de 1659 31 de Agosto de 1668 24 de Agosto de 1668 31 de Agosto de 1668

Fonte: Torre do Tombo, Conselho de Guerra, Lº n.º 273

31 “Estas

listas não se formarão pella Cont.ª g.al e recolherãose estas comp.as p.ª as suas terras em 7 de 9bro. de [1643] por terem vindo a servir so por tres mezes”. “Tornou a vir este 3.º em 23 de Abril de 1644” 32 reformou-se este terço no fim de 8bro. de 1643 “por ter vindo a gente delle a servir por tres mezes som.e” 33 formado de novo no ano de 1657 com algumas companhias que se tiraram do 3.º de Agostinho de Andrade e outras que se levantaram de novo 34 com diversas companhias que se haviam levantado para a guarnição de outras praças que se declara em suas adições

Governandores de armas, mestres de campo e capitães-mores no Alentejo 221

3. Terços de infantaria pagos que de outras províncias foram em socorro do Alentejo Data de partida para o Alentejo

Data de regresso à província de origem

Mestre de campo

TERÇO DA ARMADA REAL 11 de Dezembro de 1642 24 de Julho de 1646 Luís da Silva Telles 15 de Abril de 1657 17 de Novembro de 1657 conde de Miranda e depois Diogo Gomes de Figueiredo 24 de Maio de 1658 19 de Janeiro de 1659 Diogo Gomes de Figueiredo 17 de Junho de 1661 12 de Agosto de 1661 Diogo Gomes de Figueiredo 20 de Março de 1662 26 de Julho de 1662 Diogo Gomes de Figueiredo 24 de Março de 1663 4 de Julho de 1663 Simão de Vasconcelos e Sousa 21 de Abril de 1664 14 de Julho de 1664 21 de Maio de 1665 13 de Julho de 1665 Matias da Cunha

TERÇO DA GUARNIÇÃO DE LISBOA 15 de Novembro de 1657 Rui Lourenço de Távora e depois D. Pedro de Almeida 24 de Março de 1658 31 de Janeiro de 1659 19 de Abril de 1661 12 de Agosto de 1661 Jerónimo Mendonça Furtado 19 de Novembro de 1661 12 de Março de 1663 27 de Abril de 1663 4 de Julho de 1663 Roque da Costa Barreto 24 de Abril de 1664 17 de Julho de 1664 20 de Novembro de 1664 31 de Março de 1665 Gonçalo da Costa de Meneses 27 de Março de 1666 ?? 1 de Junho de 1667 ?? 1 de Abril de 1657

Terço do presídio de Cascais 6 de Março de 1661 14 de Março de 1662 26 de Abril de 1663 22 de Março de 1664 12 de Março de 1665

12 de Agosto de 1661 12 de Agosto de 1662 4 de Julho de 1663 ?? ??

Sebastião Correa de Liriolas

José de Sousa Cid

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11 de Dezembro de 1665 ?? 24 de Março de 1666 5 de Dezembro de 1666 Terço da guarnição de Setúbal 1 de Julho de 1661 7 de Abril de 1662 26 de Outubro de 1662 1 de Maio de 1663 17 de Junho de 1664 18 de Junho de 1665 25 de Outubro de 1665 3 de Junho de 1666 12 de Setembro de 1666

12 de Agosto de 1661 11 de Agosto de 1662 10 de Janeiro de 1663 4 de Julho de 1663 ?? ?? ?? ?? 9 de Novembro de 1666

D. Manuel da Câmara Fernando Mascarenhas

Martim Correa de Saa

Terço da Armada da Bolsa 27 de Março de 1658 1646

Manuel Velho da Guerra Minho – terço do mestre de campo Francisco Barretto

RIBA COA Terço do mestre de campo D. Rodrigo de Castro 1648 7 de Abril de 1650 30 de Abril de 1657 27 de Março de 1658

17 e 18 de Dezembro de 1648 14 de Junho de 1650 17 de Novembro de 1657 29 de Janeiro de 1659

9 de Abril de 1661

Fim de Agosto de 1661

13 de Março de 1663

7 de Julho de 1663

30 de Abril de 1664

10 de Julho de 1664

22 de Março de 1665

??

Sucedeu-lhe João Fialho (13 companhias) (5 companhias) (9 companhias) (13 companhias) governou o sargento mor Pedro Craveiro de Campos (15 c.) Diogo Gomes de Figueiredo (15 c.) Bernardo de Miranda Henriques (14 c.) Fr. Rui Pereira da Silva (23 c.) Baltasar Lopes Tavares

Terço do mestre de campo João de Mello Feio 14 de Maio de 1657

20 de Novembro de 1657 11 companhias mais 6 de auxiliares agregadas

Governandores de armas, mestres de campo e capitães-mores no Alentejo 223 1 de Março de 1658

??

Bartolomeu de Azevedo Coutinho 17 companhias, uma formada em Elvas e outra de auxiliares de Viseu 22 de Junho de 1661 23 de Agosto de 1661 Sargento mor Alvaro de Sarayva 15 companhias 6 de Abril de 1662 20 de Julho de 1662 10 companhias 19 de Março de 1663 6 de Julho de 1663 Manuel Ferreira Rabello 14 companhias 1665 25 de Junho de 1665 13 companhias mais duas auxiliares agregadas Beira – terço do mestre de campo Paulo Freire de Andrade (Castelo Branco) 6 de Março de 1663 ?? 9 companhias Penamacor – terço do mestre de campo frei Rui Pereira da Silva 1665

5 companhias TRÁS-OS-MONTES

Terço do mestre de campo Gergório de Castro de Moraes 12 de Setembro de 1658

28 de Janeiro de 1659

25 de Abril de 1664

12 de Agosto de 1664

1665

??

Terço do mestre de campo Francisco de Moraes Henriques 1 de Março de 1663 1 de Maio de 1665

?? ??

Terço do mestre de campo Sebastião da Veiga 1 de Março de 1665

??

Terço do mestre de campo Manuel Pacheco de Mello 25 de Abril de 1664 4 de Março de 1665

11 de Julho de 1664 ??

Vindo agregadas 13 companhias do terço de António Jaques de Payva Francisco de Távora a quem sucedeu Diogo de Caldas

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ALGARVE Terço do mestre de campo D. Francisco de Castelo Branco 14 de Outubro de 1646

22 de Novembro de 1646

Terço do mestre de campo António Galvão 14 de Março de 1657 7 de Outubro de 1658

2 de Setembro de 1658 26 de Janeiro de 1659

8 de Abril de 1662 26 de Outubro de 1662 7 de Março de 1663 30 de Abril de 1664 9 de Junho de 1665

13 de Agosto de 1662 4 de Março de 1663 4 de Julho de 1663 16 de Julho de 1664 ??

Sucedeu-lhe Manuel de Sousa de Castro Com três companhias agregadas de auxiliares Manuel de Sousa de Castro

Fonte: Torre do Tombo, Conselho de Guerra, Lº 273

4. A consulta sobre o pedido de André de Albuquerque

“Andre de Albuquerque Geral da artelharia do ex.to de Alentejo. Pede a VM na carta inclusa lhe faça merce conceder a L.ça para vir acodir a algumas cousas tocantes a sua fazenda que por a falta q. lhe faz há m.tos tempos, necessitão, para se poderem remedear, de sua assistencia pessoal. “o Cons.º tendo por muy iustificada a pretensão de Andre de Albuquerque p.las rasões que aponta na sua petição referida e inclusa, e plo zelo, e assistencia com que tem continuado o serviço de VM vay em sete annos sem fazer ausencia, nem procurar L.ça para isso. E considerando a falta que há de cabos no ex.to e que emq.to os não ouver não convem faltar Andre de Albuquerque nelle, he de parecer que VM diffira a Licença que elle pede para quando os ouver. Lembrando o Cons.º tambem a VM que convem m.to nomealos logo; porque da dilação q. nisto tem havido, e da falta delles se seguem ao serviço de VM os inconvenientes, e danos, que se tem exprimentado e cada hora se exprimentão. [data] Joanne Mendez de V.cos q. se acha prez.te ao rubricar desta Cons.ta diz q. se conforma com o parecer do cons.º accrecentando q. se ouver dilação em VM nomear, e enviar os cabos ao ex.to a não deve haver em conceder a Andre de Albuquerque a licença q. tão justificadamente pede por ser a pr.ª que pede no discurso do tempo q. há serve a VM com tanta satisfação nelle, e q. nestes tres messes de Inverno não

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fara falta consideravel no seu posto mas lembra tambem a VM e o cons.º juntam.te o torna a fazer os graves danos q. se estão expirimentando há m.to annos no ex.to de Alentejo por faltar g.l de Cavallaria delle, mostrando a exp.ª q. enviando VM aquella Prov.ª perto de mil Cavallos cada anno nunca nelle se conserva este n.º para o serviço, o q. proçede de não haver g.l com as partes zelo e cuidado q. se requere p.ª conservar a Cavallaria como tanto convem ao serv. de VM.” Resolução régia de 4 de Novembro: “Como parece em q.º a licença; e p.ª a nomeação de Cabos, não sei q. falte mais q. nomear q. o Geral da Cavalaria, q. nomearei quando for tempo; e pellos grandes inconvenientes q. Joane Mendes de Vasconcelos aponta de falta de Cabos, pois he o major q. aqui está deve acudir logo a seu posto, e porq. ategora se poderia deter com mais causa pella pretenção em q. andava, agora a não tem já porq. está respondido.”35 5. Um modelo alternativo de financiamento da tropa: os terços pagos pelas Câmaras (1664) A esta iniciativa referem-se as consultas de 19 de Julho e de 27 de Agosto de 1664. A primeira refere-se a cartas do marquês Mordomo Mor e das Câmaras de Lamego, Viseu e Esgueira a propósito da iniciativa que o Marquês desenvolvia, “correndo pessoalmente as Comarcas e persuadindo os povos a que assistão ao serviço de VMag.de com a contribuição possivel para se formar […] corpo de gente paga que será sem duvida de mayor effeito a deffensa deste Reyno do que os terços auxiliares que nellas se tem formado”. Tratava-se de propor às Câmaras uma troca: a extinção dos auxiliares e da sua mobilização (ou, mais exactamente, a tentativa de mobilização) periódica para a fronteira pela formação de um terço pago de certo número de homens sustentado pelas Câmaras durante alguns meses durante o ano. No fundo, o modelo que fora adoptado no caso da cidade do Porto. Mas esta proposta sofreu resistência, levando os conselheiros a sugerir uma atitude “suave”: “considerandosse as razões que appontão as Camaras de Lamego e Vizeu e o aperto a que mostrão que aquelles povos estão reduzidos com as levas e contribuições reprezentando a de Lamego que de sua Comarca saem os effeitos com que se pagão os terços do Porto”. A proposta seria uma duplicação da tributação com destino militar. No caso de Lamego, segundo a sua alegação, uma triplicação. Aos conselheiros parecia que não conviria que “se apertem demasiadamente as cameras para que senão embaracem as decimas e mais contribuições que estão assentadas”. O Marquês deve, pelo contrário, procurar “suavemente encamin35 Consulta

n.º 21 de 1647 – sobre a licença que o geral da artilharia do exército de Alentejo André de Albuquerque pede e sobre o muito que convém nomear-se cabos para a cavalaria.

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halas a este fim, mostrandolhes que receberão menor prejuizo em sustentar hum terço quatro mezes que em acodirem com os auxiliares de que resulta mayor opressão”. Mas, não sendo persuadidas, “se não devem exasperar de sorte que cheguem a algum excesso que possa necessitar de castigo”. Entretanto, a Câmara de Esgueira dispusera-se a dar exemplo, oferecendo 400 soldados pagos por três meses. A resolução régia de 23 de Julho de 1664 fazia, contudo, parar a iniciativa de um sistema alternativo: “Por agora se não proceda nesta materia; há (sic) Camera de Esgueira tenho mandado escrever”.

6. Carta da Câmara de Serpa sobre o acordo com o condado.

Carta de Serpa em Câmara, 29 de Dezembro de 1648 [4 assinaturas] com decreto de 14 de Janeiro de 1649: “Vejasse e difirasse logo plo Cons.º de guerra na conformidade de minhas ordens” “Nesta Villa se publicou com bandos huma ordem de q. VM ouve por seu serviço mandar ao capp.am mór desta praça, q. com pena de vida, não consentisse q. pessoa alguma fosse furtar aos lugares do Condado Rn.º de Castella, em q.to de lá se tivesse a mesma correspondençia, q. elles observão tam pontualm.te q. pação os lemites de sua obrigação, restituindonos ainda os escravos q. de quá nos fogem; e desta reciproca conveniencia autorisada com a ordem de VM resultão m.tas aos moradores desta villa em benifiçio comum de todos, porq. lhes fica lugar, q. atté gora não tinha, assi para a lavoura como p.ª a criação dos gados, único trato de q. se sustentão, e de q. tambem proçedem notorios interesses a fazenda real, acrescentandosse com o terço do dizimo q. pertençe a VM o lançam.to da decima, e milhor cobrança do cabeção e por estas razoens se fas mais dezeiada nos moradores a observançia desta ordem, mal guardada da ambição da Cavallaria de VM q. assiste nas praças de Moura, Mourão, e Monçaras, porq. com repetidos furtos infestão estes lugares do Condado em grande preiuizo desta respublica, cuia utilid.e por ser comum deve VM preferir à particular de quatro Cappitaens de Cavallos, q. só respeitão seu interesse; maiorm.te q. os Castelhanos destes lugares com notiçias dos bandos q. se lançarão em nome de VM introduzirão e açeitarão esta conveniençia, e cessão de hostilidades, e confiados nella trazem os seos gados com menos cudado de lhe ser roubado, e não pareçe razão lhe seia damnosa assegurança, com q. justam.te se confião nos bandos lançados em nome de VM antes quando aja razão particular do serviço de VM q. se anteponha á comum deste Povo p.ª se revogar este decreto, deve VM ser servido mandar p.ro q. se dê notiçia aos Castelhanos de q. está revogado, porq. elles nunca possão dizer, q. forão enganados de baxo do nome do VM e assi esta Camara em nome de todo o Povo, prostrada aos reaes pées de VM reprezenta esta queixa, e pede com toda a humildade seia VM servido mandar resolver com brevid.e o particular desta Carta, ordenando aos Cappitaens mores das praças referidas, dem noticia a cavallaria de VM q. nellas se aloja p.ª q. não fação

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semilhantes furtos nos lugares do Condado em q.to de lá se tiver a mesma comrespondençia na forma das ordens de VM cuia catholica pessoa g.de ds. p.ª amparo de seos vassalos Serpa em Camara 29 de dez.bro 1648” Jeronimo Frz Bras Luis da Costa Bento Teixeira de Saldanha Antonio de Quadros

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