Fora das cidades do Norte da Lusitânia

September 27, 2017 | Autor: João Luís Inês Vaz | Categoria: Arqueología, Arquitectura, Arquitetura e Urbanismo
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Descrição do Produto

Ciudad y foro en Lusitania Romana Cidade e foro na Lusitânia Romana T. Nogales Basarrate (Ed.)

Studia Lusitana 1. M.P. REIS Las termas y balnea romanos de Lusitania Mérida, 2004 2. L.J. RODRIGUES GONÇALVES Escultura romana em Portugal. Uma arte do cuotidiano Mérida, 2007 3. F. TEICHNER Entre tierra y mar / Zwichen Land und Meer Mérida, 2008 4. T. NOGALES BASARRATE (ED.) Ciudad y foro en Lusitania Romana / Cidade e foro na Lusitânia Romana Mérida, 2009 5. J. DE ALARCÃO; P.C. CARVALHO; A. GONÇALVES (COORD.) Castelo da Lousa. Intervenções Arqueológicas de 1997 a 2002 Mérida, 2010 6. V. GIL MANTAS Vías romanas de Lusitania (en preparación) 7. A. DE MAN Defesas Urbanas Tardias da Lusitânia (en preparación) Ficha técnica Coordinación: María José Pérez del Castillo y Eugenia López González Diseño: Ceferino López El texto y las opiniones de este volumen son responsabilidad de los autores. Esta publicación se intercambia por otras similares de todos los países con el fin de potenciar la Biblioteca del Museo Nacional de Arte Romano de Mérida. Para intercambios y suscripciones: Museo Nacional de Arte Romano C/ José Ramón Mélida, s/n 06800 Mérida (Badajoz) España [email protected] Pedido de libros: Asociación Amigos del Museo: C/ José Ramón Mélida, s/n 06800 Mérida (Badajoz) España [email protected] y a través de: http://museoarteromano.mcu.es/ Adquisiciones: Pórtico Librerías, S.A. Muñoz Seca, 6 50005 Zaragoza - España www.porticolibrerias.es ISBN: 978-84-613-4193-1 Depósito legal: BA-381-2010 Maquetación e Impresión: Artes Gráficas Rejas (Mérida) JUNTA DE EXTREMADURA Vicepresidencia Segunda, Consejería de Economía, Comercio e Innovación Dirección General de Universidad y Tecnología

Proyecto 3PR05B003 Lusitania romana: investigación para la difusión del pasado cultural del occidente de la Península Ibérica. Vicepresidencia Segunda y Consejería de Economía, Comercio e Innovación de la Junta de Extremadura.

Proyecto PRI06B286 Foros Romanos de Extremadura. Análisis y Difusión del Patrimonio Extremeño. Vicepresidencia Segunda y Consejería de Economía, Comercio e Innovación de la Junta de Extremadura.

Proyecto PRI09A140 Arte Romano en Extremadura I. Creación de modelos en el occidente hispano. Vicepresidencia Segunda y Consejería de Economía, Comercio e Innovación de la Junta de Extremadura.

DIRECCIÓN CIENTÍFICA: PROF. DR. JORGE ALARCÃO Catedrático de Arqueología Universidad de Coimbra PROF. DRA. TRINIDAD NOGALES BASARRATE Departamento de Investigación Museo Nacional de Arte Romano COMITÉ CIENTÍFICO: PROF. DR. JOSÉ Mª ÁLVAREZ MARTÍNEZ Director del Museo Nacional de Arte Romano DR. JOSÉ LUIS DE LA BARRERA Conservador del Museo Nacional de Arte Romano PROF. DR. ENRIQUE CERRILLO Departamento de Arqueología Universidad de Extremadura PROF. DR. JONATHAN EDMONDSON Departmento de Historia Universidad de York (Canadá) PROF. DR. JOSÉ D´ENCARNAÇÃO Director del Instituto de Arqueología Universidad de Coimbra PROF. DR. CARLOS FABIÃO Departamento de Arqueología Universidad de Lisboa PROF. DR. JEAN-GÉRARD GORGES C.N.R.S. Universidad de Toulouse II Ex director-adjunto de la Casa de Velázquez DR. VIRGILIO HIPÓLITO CORREIA Director del Museo Monográfico de Conimbriga PROF. DR. PATRICK LE ROUX Departamento de Historia Universidad de Paris XIII D. MIGUEL ALBA CALZADO Director Científico del Consorcio de la Ciudad Monumental HistóricoArtística y Arqueológica de Mérida PROF. DR. MANUEL SALINAS DE FRÍAS Departamento de Historia Antigua Universidad de Salamanca PROF. DR. THOMAS SCHATTNER Subdirector del Instituto Arqueológico Alemán de Madrid PROF. DR. WALTER TRILLMICH Antiguo Director del Instituto Arqueológico Alemán de Berlín

Índice

9

Presentación.

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Laudes Urbium Lusitaniae. SANTIAGO LÓPEZ MOREDA

27

Algumas observações nas construções do foro de Ebora Liberalitas Iulia. THEODOR HAUSCHILD

37

Esculturas do fórum de Ebora: programa iconográfico. LUÍS JORGE GONÇALVES y PANAGIOTIS SARANTOPOULOS

47

Os fora de Bobadela (Oliveira do Hospital) e da Civitas Cobelcorum (Figueira de Castelo Rodrigo). MARIA HELENA SIMÕES FRADE

69

Caminhando em redor do forum de Aeminium (Coimbra, Portugal). PEDRO C. CARVALHO, DINA CUSTÓDIO MATIAS, ANA PAULA RAMOS ALMEIDA, CARLA ALEGRIA RIBEIRO, FERNANDO PEREIRA DOS SANTOS y RICARDO COSTEIRA DA SILVA

89

O forum de Conimbriga e a evolução do centro urbano. VIRGÍLIO HIPÓLITO CORREIA

107

Collippo: análise dos espaços públicos. JOÃO PEDRO BERNARDES

121

Das Inscrições em Foros de Cidades do Ocidente Lusitano-Romano. JOSE D´ ENCARNAÇÃO

127

El foro de Capara. ENRIQUE CERRILLO MARTÍN DE CACERES

137

Un posible complejo forense de la colonia Norbensis Caesarina. ENRIQUE CERRILLO MARTÍN DE CACERES y TRINIDAD NOGALES BASARRATE

167

Ammaia e Civitas Igaeditanorum. Dois espaços forenses lusitanos. VASCO GIL MANTAS

189

O recinto Forense de Pax Iulia (Beja). MARIA DA CONCEIÇÃO LOPES

201

Caracterização Geral de Miróbriga. MARIA FILOMENA BARATA

231

Foros de Augusta Emerita. Modelos en Lusitania. TRINIDAD NOGALES BASARRATE y JOSÉ MARÍA ÁLVAREZ

261

El urbanismo del conjunto provincial de culto imperial y del foro de Augusta Emerita. ROCÍO AYERBE, TERESA BARRIENTOS, PEDRO MATEOS, FÉLIX PALMA y ANTONIO PIZZO

273

Agrippina y la Concordia Augusti. Elementos para la interpretación del “foro provincial” de la Colonia Augusta Emerita. NICOLE RÖRING y WALTER TRILLMICH

285

Tanques, fontes e espelhos de água nos fora lusitanos. MARIA PILAR REIS

315

Elementos para o estudo dos fora das cidades do norte da Lusitânia. JOÃO L. INÊS VAZ

325

O Forum de Seilium/Sellium (Tomar). SALETE DA PONTE

333

El foro y el templo de Lancia Oppidana: nueva interpretación de Centum Celas (Belmonte). AMÍLCAR GUERRA y THOMAS G. SCHATTNER

343

Modelos forenses nas cidades da Lusitania: balanço e perspectiva. CARLOS FABIÃO

361

Listado de Autores.

Elementos para o estudo dos fora das cidades do norte da Lusitânia João L. Inês Vaz Professor Associado da Universidade Católica e investigador do CEAUCP

RESUMO Analisam-se as capitais da civitates dos Arabrigenses, Coilarni, Interannienses e Aravi, com base nos parcos elementos arqueológicos que existem actualmente. O autor localiza Arabriga na região do actual concelho de Moimenta da Beira e a capital dos Coilarni em Lamego. A cidade romana melhor conhecida é Viseu, capital dos Interannienses, apesar de se desconhecer o seu nome romano. Com base na identificação de um templo em Marialva, onde se localizava a capital dos Aravi, faz-se a reconstituição do possível forum desta cidade romana. PALAVRAS CHAVE: Civitas; Forum; Arabrigenses; Coilarni; Interannienses; Aravi.

ABSTRACT The author analyses the capitals of civitates of the Arabrigenses, Coilarni, Interannienses and Aravi, on the basis of the archaeological elements that we know today. The author locates Arabriga in the region of current municipality of Moimenta da Beira and the capital of the Coilarni in Lamego, presenting its arguments. The roman city better known is Viseu, capital of the Interannienses, but we don’t know his roman name. On the basis of the identification of a temple in Marialva, where was located the capital of the Aravi, becomes the reconstitution of the possible forum of this roman city. KEY WORDS: Civitas; Forum; Arabrigenses; Coilarni; Interannienses; Aravi.

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O nome deste povo aparece ainda na inscrição da ponte de Alcântara (CIL II 716) e é também no bem conhecido término augustal de Goujoim publicado em 1979 (Vaz, 1979). O nome aparece ainda como origo em várias inscrições funerárias romanas encontradas em Mérida. Tendo em conta o término augustal de Goujoim, é ponto assente entre os arqueólogos que os Arabrigenses estavam localizados a oriente dos Coilarni e “iriam até ao rio Torto ou à ribeira da Teja” (Alarcão, 2004, p. 333) num território que abrangeria, portanto, desde as arribas da margem esquerda do Távora até às margens de um daqueles rios enunciados. O seu território ocupava importantes castros como o de Longa, localizado mesmo em frente do alto onde está o término augustal de

A localização da maioria das capitais de civitates das cidades do Norte da Lusitânia continua a ser discutida. No entanto, conhecem-se alguns elementos monumentais, arquitectónicos, escultóricos ou epigráficos que têm que forçosamente se relacionar com um meio urbano e, neste, apenas se poderão integrar nos programas iconográficos dos fora dessas mesmas cidades. É o caso das cidades capitais dos Interannnienses, dos Coilarni, dos Arabrigenses, dos Meidubrigenses ou da civitas Aravorum. Desde há muitos anos se sabe que a localização da civitas Aravorum era em Marialva, vila do concelho português da Meda, as civitates dos Interannnienses e dos Coilarni estão também seguramente localizadas em Viseu e Lamego, respectivamente, mas a dos Arabrigenses é desconhecida e por isso apenas podemos propor localizações, sem ter certezas. São os fora destas quatro cidades que irão ser tratados no texto que se segue (fig. 13).

Goujoim e as importantes minas de ouro de Santo António de Penedono onde houve exploração de ouro na época romana e o castro do Monte Airoso, na Granja de Penedono onde foram encontrados alguns objectos em ouro depositados no Museu Nacional de Arqueologia. Para capital deste povo tem sido apontada uma cidade que existiria na zona de Caria, Vide e Faia (Vaz, 2004) onde se têm feito inúmeros achados que Jorge Alarcão elencou (Alarcão, 2004, p. 332) (fig. 16). À lista elaborada por Jorge Alarcão haverá que acrescentar as inscrições paleocristãs indicadas por Viterbo que, embora sendo posteriores, mostram uma persistência forte do povoamento naquela zona e ainda a tradição popular de ali ter existido a cidade de Arrochela, apesar de não se conhecer ali nenhum vestígio epigráfico onde tal nome se possa ter originado. Mesmo assim, a verdade é que o sufixo –ocelum que deverá estar naquela palavra é bem conhecido de outros topónimos de diferentes regiões do país, como Araocelum, bem próximo de Mangualde. A haver aqui uma capital, ela estaria mesmo no extremo do território, o que não seria óbice se pensarmos, por exemplo, na civitas Taporum ou na civitas Aravorum, respectivamente em Bobadela e Marialva ou até na própria capital

Fig. 13. Territórios das civitates romanas do Norte da Lusitãnia.

CIVITAS ARABRIGENSIUM Arabriga, seria a caput dos Arabrigenses que se situavam entre os Coilarni e os Meidubrigenses, junto ao rio Douro. Esta cidade aparece citada em Ptolomeu (Geografia, 7) entre as cidades de Chretina e Scalabiscos Colonia. Se a primeira não sabemos identificá-la, a segunda será Santarém, a Scallabis romana que é apresentada com as coordenadas erradas como são todas as que Ptolomeu nos indica. 316

berrão em pedra com a inscrição Ambroecon. No entanto, os vestígios romanos abundam pelas casas da povoação reaproveitando-se bases de coluna, troncos de coluna de vários diâmetros e uma ara anepígrafa a par (fig. 19), segundo se diz, de muitas outras coisas que ali se terão encontrado. Face a estes achados, nos painéis existentes na sala de Arqueologia do Museu de S. João da Pesqueira (fig. 17) é colocada a hipótese de ali se localizar a capital dos Arabrigenses. Não nos parece muito provável e o que deveria existir era um povoado romano cuja principal actividade seria a exploração mineira. Com efeito, nos arredores de Paredes da Beira, existem quatro povoados fortificados (Cocheira, Chão do Murganho, Senhora da Assunção e Castelinhos) que terão mais a ver com a exploração mineira que deverá ter existido na área da povoação e que mostram um importante povoamento nas épocas pré-romanas e que, já na época romana, se teria concentrado no sítio da actual povoação (fig. 18).

Fig. 16. Miliario da Quinta da Alagoa.

da província lusitana que ficava no extremo sudeste do território lusitano. Outra zona deste território arabrigense onde os vestígios romanos abundam é em Paredes da Beira que se incluía no território dos Arabrigenses e pertence ao actual concelho de S. João da Pesqueira. Os vestígios arqueológicos mais conhecidos desta povoação são o abrigo préhistórico da Fraga d’Aia com figuras pintadas e o

Fig. 19. Ara anepigrafa de Paredes da Beira.

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disso, acreditamos que seria no lugar de um destes topónimos Ónia hoje ainda existentes que se localizaria aquela paróquia suévica. Ainda a respeito da localização de Arabriga, um outro elemento que nos parece importante é a estátua que se encontra na Assembleia Distrital de Viseu (fig. 14) e a que já nos referimos em várias ocasiões anteriores (Vaz, 2004, por exemplo). Foi encontrada na freguesia de Quintela da Lapa, do concelho de Sernancelhe e sabemos hoje que foi retirada da parte posterior da igreja da Senhora da Lapa. A esta igreja de peregrinação andam associadas fortes tradições de estranhos milagres e misteriosos aparecimentos de imagens debaixo de penedos e superstições relativas aos penedos em que assenta o próprio santuário. Esta estátua é de mármore, representa um togado, com a figura muito mutilada porque a pedra foi reaproveitada como tampa de sepultura, tendo por isso uma inscrição funerária, possivelmente medieval, na parte posterior. Ora, não cremos que esta estátua fosse da própria Lapa, pois não se conhece ali nenhum vestígio de romanização. Assim, teria que vir de uma zona próxima e onde servisse de elemento decorativo de qualquer edifício. Esse lugar, estamos convictos, teria que ver com o programa iconográfico do forum da civitas Arabrigensium localizada ali bem próxima. Outro elemento significativo é a inscrição que se encontra embutida na fachada da capela do Espírito Santo de Vide. Trata-se de um bloco

Fig. 17. Base de coluna reaproveitada em Paredes da Beira.

Fig. 18. Varrão com inscrição no dorso e mós achadas em Paredes de Beira.

Sendo assim, cremos que a capital dos Arabrigenses seria mesmo na área da maior concentração de achados que será no triângulo já atrás definido pelas povoações de Caria, Vide e Rua. Além da tradição já referida da existência da cidade de Arrochela, há toda uma continuidade de povoamento que levou a que na época seguinte ali se estabelecesse uma paróquia suévica com o nome de Omnia, topónimo que ainda hoje sobrevive nas freguesias de Sernancelhe e Caria. Este topónimo está localizado na encosta norte de Sernancelhe e nos terrenos da povoação de Caria virados àquela vila e a verdade é que, apesar de ainda haver pelo meio a povoação de Vila da Ponte, relativamente moderna, os dois lugares são virados um para o outro. Por outro lado, a barragem do Vilar poderá ter submergido muitos outros vestígios pois não foi elaborado qualquer estudo de impacte ambiental ou arqueológico aquando da sua construção. Assim, poderá haver muitos vestígios cujo conhecimento se perdeu para sempre. Apesar

Fig. 14. Estátua da Lapa, provavelmente da civitas Arabrigensium.

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prismático que diz simplesmente BONO REIP NATO (fig. 15) e que poderá ser a base de algum monumento consagrado ao imperador, o que só será compreensível em ambiente urbano. Face a todos estes elementos cremos que estaremos algures nesta zona em presença de uma sede de civitas, cujo assentamento exacto não é possível determinar neste momento.

Fig. 20. Urbanismo romano da Civitas Coilarnorum, sobreposta a cidade actual de Lamego.

- aras da capela de S. Pedro de Balsemão (fig. 1), uma consagrada a F(ortunae) e outra a I(ovi) O(ptimo) M(aximo), sendo esta dedicada pela C(ivitas) C(oilarnorum).

Fig. 15. Inscrição romana de Vide.

CIVITAS COILARNORUM (fig. 20) Não temos hoje qualquer dúvida em localizar a sede da civitas Coilarnorum em Lamego. Em publicação que recentemente fizemos (Vaz, 2007), indicámos os argumentos a favor desta tese que podemos resumir em quatro principais: - indicação geográfica dos povos na ponte de Alcântara que faz coincidir a localização naquela área. - o marco terminal de Goujoim que divide os Coilarnos dos Arabrigenses. - vestígios romanos encontrados em Lamego e arredores, nomeadamente a abundância de inscrições, e elementos escultóricos, estátua de Fortuna e cabeça feminina, apenas compatíveis com a existência de um forum e um templo. - ara de Britiande em que se cita um C(urator) R(eipublicae) C(oilarnorum).

Fig. 1. Ara de Balsemão dedicada pela Civitas Coilarnorum.

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Na publicação acima referida, fizemos ainda a localização do forum, no sítio onde hoje está o castelo de Lamego e determinámos o urbanismo da cidade romana que ocuparia uma área bastante pequena, de cerca de 4 hectares, e apenas com um mínimo de estruturas para poder albergar alguns serviços públicos essenciais, nomeadamente da cobrança dos impostos a cargo do curator. Enquanto não se fizerem escavações na área da cidade, nada mais podemos acrescentar sobre a capital dos Coilarnos.

existia já na Idade do Ferro mas cujo nome se desconhece. No entanto, como já dissemos noutras ocasiões, o nome Viseu terá a mesma origem do nome da divindade Besencla, cujo culto se conhece exclusivamente de Canas de Senhorim. O radical Besen- ou Vesen- do teónimo é o mesmo que encontramos em Vesensis ou Besensis. Ora, a “mais antiga referência paleográfica que se conhece à diocese de Viseu é relativa à presença do bispo Remissol, no segundo concílio de Braga, em 572. O bispo aparece aí designado como Vesensis episcopus.“ (Vaz, 1987, p. 348). Já alguns anos mais tarde, um seu sucessor, no III concílio de Toledo reunido em 589, aparece desigando como civitatis Vesensis episcopus. Sisebuto, rei visigodo, cunha moeda em Viseu e dá-nos o nome da cidade nesse período do primeiro quartel do século VII, Vezeo e em 681, no XII concílio de Toledo, o bispo de Viseu é Besensis ecclesiae episcopus (Vives, 1963, p. 85, 122, 402, 407 e 520). Uns séculos depois, nos finais do século XI ou XII, no Cronicon Silense, Viseu aparece designada como Castrum Vesensis. Vemos assim que, desde o domínio suévico-visigótico até aos primeiros tempos da nacionalidade, Viseu foi sempre designada com uma palavra que é um substantivo semelhante ao nome de hoje ou um adjectivo formado a partir da mesma base. (Vaz, 1987, p. 347-348) Sendo a Igreja católica romana uma instituição conservadora, é natural que também em relação ao nome da diocese fosse conservadora e por isso o nome da cidade já na época romana poderia ser algo como Castellum ou Castrum Vesensis. Poderá contrapor-se a esta hipótese que uma capital de civitas não teria um nome começado por castellum ou castrum. Contra isto, poderemos dizer que o território a que presidia era a Civitas Interanniensium e que o facto de se designar por castellum ou castrum Vesensis a sua sede significaria apenas o reaproveitamento do nome do povoado fortificado anterior ou que

CIVITAS INTERANNIENSIUM Desde há uns anos que pensamos que a civitas Interanniensium tinha a sua caput no lugar onde está Viseu, independentemente de não se saber o nome verdadeiro que ostentaria na época romana. Em 1993, definimos o território da civitas, que passaria pelas linhas de altura e não pelos rios que, apesar de limitantes, deram o nome à civitas criada pelos Romanos. Assim, a ocidente seria a Serra do Caramulo, onde vários rios nascem e onde existe um trifinium que delimita povos pré-romanos e o conhecido término augustal de Guardão, a sul, o rio Mondego, a norte o rio Paiva que nasce na serra da Lapa, onde deveria existir outro trifinium e a oriente a ribeira da Muxagata que nasce também na mesma na serra da Lapa. Era um território bastante vasto com uma capital bem localizada num ponto central. A única referência que se conhece nas fontes antigas aos Interannienses, é a da ponte romana de Alcântara, na famosa inscrição que recorda os povos que contribuíram para a sua construção e nalgumas inscrições existentes na capital da Lusitânia, Emerita Augusta em que aparece como origo. À chegada dos Romanos, no lugar onde está Viseu, existia desde já um povoado de que hoje se conhecem vestígios em vários pontos: Praça D. Duarte, Rua de D. Duarte, rua do Gonçalinho, encosta norte. Era um povoado que

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derivaria o seu nome do acampamento romano que teria existido na base do mesmo povoado, no sítio hoje designado por Cava de Viriato. As alterações provocadas pelos Romanos neste povoado levaram a uma verdadeira refundação de Viseu com a sua extensão mais para oriente e sul, onde o terreno era mais plano e mais abundante de água. O seu urbanismo foi adaptado não só aos conceitos hipodâmicos romanos mas também à orografia do terreno, definindo-se uma zona de ruas ortogonais, na zona es-sudeste, mas mantendo-se no antigo castro um traçado mais irregular cujas características permaneceram até aos nossos dias (fig. 2). O forum da cidade romana deveria situarse na zona mais alta. Há uns anos, cheguei a supor que ele se localizaria na parte baixa, sobrevivendo no actual Largo da Prebenda. No entanto, observando outras cidades romanas com uma topografia semelhante como Mirobriga Celticorum ou Lamego (caput Coilarnorum) e sobretudo graças à descoberta dos restos de um templo de características céltico-gálicas no claustro do actual Museu de Grão Vasco (Almeida, 2006), inclinamonos antes para que ele estivesse na parte mais alta, no actual Largo da Sé (fig. 3). Este forum assentaria sobre uma plataforma de regularização do terreno construída para o tornar mais plano. Os vestígios dos muros dessa plataforma, poderão ver-se nos paramentos que ainda se observam na parte posterior da Sé (fig. 4) onde há um claro cunhal que parece in situ, constituído por pedras almofadadas intercalando com algumas pedras lisas. Do lado contrário, a sul, há outro paramento que não foi mexido e que foi integrado numa das torres ali construídas na Idade Média. O paramento entre estes dois cunhais, com cerca de 3 metros, foi claramente mexido e reconstruído. Por outro lado, numa cripta existente sob o altar-mor da catedral, a uma profundidade de cerca de 3 metros e sensivelmente à mesma altura que os outros vestígios já referidos, existe um

Fig. 2. Viseu

Fig. 3. Vista aérea da acropóle de Viseu, com a localização do templo.

Fig. 4. Parte posterior da Sé de Viseu.

lajeado muito bem construído com grandes lajes de granito que poderá talvez ser o que resta do pavimento do próprio forum. (fig. 5).

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Fig. 5. Lajeado da cripta sob o altar-mór da Sé de Viseu.

Quando esta cripta foi escavada, apareceram uma base de coluna com 75 cm de diâmetro e um capitel jónico de igual diâmetro, tudo de granito. Na escavação a que procedemos no ângulo noroeste da Praça D. Duarte em que encontrámos a basílica paleocristã da cidade de Viseu, estava a servir de cunhal uma outra base de coluna com 75 centímetros de diâmetro e sobre ela uma enorme pedra almofada em três faces, reaproveitamento de outras construções anteriores. Por sua vez, são semelhantes a outras que foram encontradas perto da Rua Direita. (fig. 7). Estas colunas, com o respectivo capitel, permitem-nos imaginar um edifício com colunas com mais de 7 metros de altura, que não poderia ser outra coisa senão um edifício público, possivelmente um templo. As colunas serão da primeira metade do século I e iguais às do templo de Diana do forum de Mérida. (fig. 6). Um outro elemento que poderá ser proveniente do forum é uma cabeça feminina, muito mutilada, que se guarda no Museu de Grão Vasco e que foi encontrada junto à entrada da rua do Gonçalinho. Apesar de atribuirmos todos estes elementos ao forum e começarmos assim a fazer alguma ideia do que ele seria, a verdade é que eles não são suficientes para nos permitir uma reconstituição do forum da civitas Interanniensium.

Fig. 7. Coluna da Quinta da Carreira, Viseu.

Fig. 6. Base de coluna e bloco almofadado reaproveitados num cunhal da basilica paleocristá de Viseu.

CIVITAS ARAVORUM A civitas Aravorum foi a primeira do Norte da Lusitânia a ser localizada graças ao achamento de uma inscrição romana consagrada pela civitas ao Imperador Adriano (CIL II 429). Conhecia-se também o achamento de muitos vestígios na zona chamada Devesa que mais não é que a povoação actual.

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Graças ao trabalho que o arqueólogo Sá Coixão tem vindo a desenvolver na região, foi por ele identificado, há uns anos, um pequeno templo que se localiza no topo do largo principal da Devesa e deverá ser o templo do antigo forum da cidade. (fig. 8).

Fig. 10. Troncos de coluna de Marialva.

Fig. 8. Templo romano da civitas Aravorum.

A identificação do templo na Devesa mostra como a sede da civitas se localizava na parte plana, tendo sido abandonada a parte alta onde mais tarde se veio a localizar a povoação medieval fortificada. (figs. 9, 10 e 11).

Fig. 11. Base de coluna junto ao templo romano, a servir de base de um cruzeiro.

estruturas arquitectónicas, mas permaneceu o espaço com as suas funções sociais e religiosas. Fazemos uma tentativa de reconstituição do que poderia ser o forum desta cidade, assumindo que o templo estaria num dos topos do forum. (fig. 12).

Fig. 9. Largo actual de Marialva no sítio do forum romano.

Se o templo estava no topo do forum, então o forum deveria ser relativamente pequeno, como aliás, o próprio templo, mas o que não deve deixar de se assinalar é que ali permaneceu o largo principal da povoação até aos nossos dias. A função religiosa continua presente na igreja construída a deslado do templo romano, desapareceram quase completamente as infra-

Fig. 12. Forum da civitas Aravorum.

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BIBLIOGRAFIA

INÊS VAZ, J. L., 1982: Inscrições romanas de Balsemão (Lamego), Beira Alta, 41 (1), Viseu, pp. 257-267. INÊS VAZ, J. L., 2004: Os Povos da Beira Douro citados na inscrição da ponte romana de Alcântara, Tarouca e Cister – Espaço, Espírito e Poder, Actas, Setembro, 2002, Tarouca, 2004, p. 189-202. INÊS VAZ, J. L., 2007: Lamego na época romana, Capital dos Coilarnos, Associação para a Valorização e Defesa do Património do Vale do Douro, Lamego.

ALARCÃO, J., 2004: Notas de arqueologia, epigrafia e toponímia - I, Revista Portuguesa de Arqueologia, volume 7, número 1, p. 317342. ALMEIDA, S. O., 2006: A Idade do Ferro no Planalto de Viseu: o caso do Morro da Sé, Coimbra, 2006 (tese de mestrado policopiada). INÊS VAZ, J. L.,1979: Término augustal de Goujoim (Armamar), Conimbriga, XVIII, 1979, p. 133-138.

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LISTADO DE AUTORES Pedro C. Carvalho Instituto de Arqueologia da FLUC Palácio de Sub-Ripas 3000 Coimbra Portugal 00351 – 919514988 E-mail: [email protected]

Carla Alegria Ribeiro Arqueóloga, IPM/MNMC Portugal José María Álvarez Martínez Museo Nacional de Arte Romano José Ramón Mélida s/n 06800 Mérida España E-mail: [email protected]

Enrique Cerrillo Martín de Cáceres Departamento de Historia (Área de Arqueología) Facultad de Filosofía y Letras Universidad de Extremadura Campus Universitario s.n. 10071 Cáceres España E-mail: [email protected]

Rocio Ayerbe Consorcio de la Ciudad Monumental, Histórico-Artística y Arqueológica de Mérida Reyes Huertas, 5 06800 Mérida España E-mail: [email protected]

Ricardo Costeira da Silva Arqueólogo, IPM/IMC/MNMC R. Vale S. Miguel, lote 4, 2º esq. 3020-113 Coimbra Portugal E-mail: [email protected]

Filomena Barata Instituto de Gestão do Património Arquitectónico e Arqueológico (IGESPAR) Palácio Nacional da Ajuda 1349-021 Lisboa Portugal E-mail: [email protected]

Dina Custódio Matias Arqueóloga, IPM/MNMC Portugal

Teresa Barrientos Consorcio de la Ciudad Monumental, Histórico-Artística y Arqueológica de Mérida Reyes Huertas, 5 06800 Mérida España E-mail: [email protected]

José d’Encarnação Centro de Estudos Arqueológicos das Universidades de Coimbra e Porto Rua Eça de Queirós, 89, Pampilheira, P-2750-662 Cascais Portugal E-mail: [email protected]

João Pedro Bernardes Departamento de História, Arqueologia e Património Universidade do Algarve Campus de Gambelas 8005-139 Faro Portugal E-mail: [email protected]

Carlos Fabião Dpto. de Historia Faculdade de Letras Universidade de Lisboa/ UNIARQ Alameda da Universidade 1600-214 Lisboa Portugal E-mail: [email protected]

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Maria da Conceição Lopes Universidade de Coimbra Centro de estudos Arqueológicos das Universidades de Coimbra e Porto (CEAUCP) Palácio de Sub-Ripas 3000-395 Coimbra Portugal E-mail: [email protected] [email protected]

Maria Helena Frade Direcção Regional da Cultura do Centro Rua Fernandes Tomás, nº 76 3000 - 167 Coimbra Portugal E-mail: [email protected] Vasco Gil Mantas Instituto de Arqueología. Facultad de Letras Universidad de Coimbra Palacio de Sub-Ripas 3000-447 Coimbra Portugal E-mail: [email protected]

Santiago López Moreda Departamento de Ciencias de la Antigüedad Facultad de Filosofía y Letras Universidad de Extremadura Avda. de la Universidad s/n 10071 Cáceres España E-mail: [email protected]

Luís Jorge Gonçalves Centro de Investigação e Estudo em Belas-Artes e Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa Largo da Academia Nacional de Belas-Artes 1249-058 Lisboa Portugal E-mail: [email protected]

Pedro Mateos Instituto de Arqueología de Mérida Plaza de España, 15 06800 Mérida España E-mail: [email protected]

Almilcar Guerra Dpto. de Historia Faculdade de Letras Universidade de Lisboa Alameda da Universidade 1600-214 Lisboa Portugal E-mail: [email protected]

Trinidad Nogales Basarrate Museo Nacional de Arte Romano Dpto.de Investigación José Ramón Mélida s/n 06800 Mérida España E-mail: [email protected]

Theodor Hauschild Antiguo Subdirector del Instituto Arqueológico Alemán-DAI Madrid Fax: (+351) 21 960 710 141

Félix Palma Consorcio de la Ciudad Monumental, HistóricoArtística y Arqueológica de Mérida Reyes Huertas, 5 06800 Mérida España E-mail: [email protected]

Virgilio Nuno Hipólito Correia Museu Monográfico de Conimbriga 3150 – 120 Condeixa Portugal E-mail: [email protected]

Fernando Pereira dos Santos Arqueólogo, EDIFER, Reabilitação, S.A. Largo Álvaro Velho, 8 7000 Évora Portugal E-mail: [email protected]

João L. Inês Vaz Universidade Católica e investigador do CEAUCP Centro Regional das Beiras Estrada da Circunvalação 3504-505 Viseu Portugal E-mail: [email protected]

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Antonio Pizzo Instituto de Arqueología de Mérida Plaza de España, 15 06800 Mérida España E-mail: [email protected]

Maria de La Salete da Ponte Instituto Politécnico de Tomar Quinta do Contador - Estrada da Serra 2300-313 Tomar Portugal e-mail: [email protected]

Ana Paula Ramos Almeida Arqueóloga, IPM/MNMC

Panagiotis Sarantopoulos Centro de Investigação e Estudo em Belas-Artes

Portugal

e Câmara Municipal de Évora Rua da Carta Velha 7000 Évora Portugal E-mail: [email protected]

Pilar Reis Centro de Estudos Arqueológicos das Universidades de Coimbra e Porto (CEAUPE) Palácio de Sub-Ripas 3000-395 Coimbra Portugal E-mail: [email protected]

Thomas G. Schattner Deutsches Archäologisches Institut Abt. Madrid Calle Serrano 159 28002 Madrid España E-mail: [email protected]

Nicole Röring Deutsches Archäologisches Institut Abt. Madrid Calle Serrano 159 28002 Madrid España E-mail: [email protected]

Walter Trillmich Antiguo Director del Instituto Arqueológico Alemán DAI Berlín E-mail: [email protected]

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