\"Francisco António Silva Oeirense (1787-1868) – O Pintor e o Poder\" - Tese de mestrado (excertos) / Master Thesis (excerpts)

Share Embed


Descrição do Produto

Ana Paula Bandeira Morais Valongueiro Nunes

FRANCISCO ANTÓNIO SILVA

(1797 – 1868) O Pintor e o Poder

VOLUME I

Dissertação de Mestrado em História da Arte em Portugal

Orientador: Professor Doutor Agostinho Rui Marques Araújo

Secção de História da Arte Departamento de Ciências e Técnicas do Património

Faculdade de Letras da Universidade do Porto PORTO 2009

Aqui jaz pó. Eu não; eu sou quem fui. - Raio animado dessa luz celeste À qual a morte as almas restitui, Restituindo à terra o pó que as veste. João de Deus (Epitáfio a Antero de Quental, Junho de 1894)

Ao meu amado Pai. Ao meu querido Sogro.

Aos meus três Homens; Fernando Afonso e Duarte

RESUMO

Esta dissertação tem como objecto a figura do artista Francisco António Silva Oeirense. Pintor, litógrafo, Académico de Mérito da Academia Real de Belas Artes de Lisboa, Lente de Gravura e Desenho Histórico da Academia Portuense de Belas Artes, Pensionista Viajante, coleccionador, negociante de arte e liberal convicto. Apesar desta versatilidade é mais um exemplo de uma figura portuguesa cuja vida e obra permanecem num quase total desconhecimento. Com este trabalho propusemo-nos desvendar, ou apenas abrir caminhos, para um melhor conhecimento do artista no seu todo, partindo do levantamento e análise das diversas facetas que o caracterizam e procurando encontrar-lhe um lugar no panorama artístico português do século XIX. Este estudo terá sempre presente, o enquadramento da vida e actividade do indivíduo, no contexto sócio económico que o envolve, tendo em atenção, a situação particular de instabilidade política, económica e social que caracterizou o nosso país durante o espaço de tempo que coincidiu com o seu período de vida. Em conclusão, procuraremos caracterizar a clientela-tipo para quem trabalhou, essencialmente como pintor, tentando entender de que forma essas encomendas reflectem um certo gosto estético influenciando a qualidade técnica da sua produção e noutra perspectiva, também a sua posição na sociedade portuguesa de oitocentos. Palavras-chave: Pintura, gravura, Academias, Liberalismo, retrato, técnica.

I

ABREVIATURAS

Anon. – Anónimo Art. – Artigo (leis e similares) Cap. – Capítulo. Plural capp. [ca. ] – livro ou artigo não paginado. Cf. – Confrontar, também, referir-se a Ed. /ed. – editores et tal. – e outros ex. – por exemplo fl. – folha Ibidem – no mesmo lugar (ou seja, mesma obra e mesma página) coord. – coordenação fig. – figura fl. – fólio fls. – fólios fr. – frente in – em, dentro de inv. – inventário loc. cit – lugar citado mç. – maço MS – manuscrito, plural MSS NB – Note bene op. cit. - a mesma obra mas não a mesma página. p. – página, também pág., plural pp. [S.l.] – sine loco (sem local) [s.n.] – sine nomine (sem editor) sic – escrito assim pelo autor que se cita s.d. – sem data NA – nota do autor rs. - reis II

tab. – tabela V. – ver Vd. – vide, ver vol. - volume, plural vols. vs. – versus, em oposição

SIGLAS

AFBAUP – Arquivo da Faculdade de Letras da Universidade do Porto BPMP – Biblioteca Publica Municipal do Porto FLUP – Faculdade de Letras da Universidade do Porto MAR – Museu da Assembleia da Republica MNSR – Museu Nacional Soares dos Reis TT – Torre do Tombo

III

AGRADECIMENTOS

Agradecer é sempre falar com o coração, sobre aqueles que por força dos seus actos, da sua presença, ou apenas, e só, da sua existência, contribuíram para a orientação dos nossos passos, o sucesso da nossa “empreitada”, o final do nosso caminho. Aqueles que nos deram tempo do seu tempo, afecto e palavras de encorajamento. O Professor Doutor Agostinho Araújo, nosso orientador e ousamos, nosso amigo, é o principal destinatário do nosso “obrigado”, por todo o apoio, auxílio, orientação científica e pelas palavras certas, no momento certo, que mantiveram a nossa vontade e força para continuar, mesmo nos momentos mais difíceis por que passámos este ano; orientou sem dirigir, apoiou sem facilitar, exigiu sem ordenar, foi o apoio seguro e certo, na “frente de batalha”. A nossa família, Fernando, Afonso e Duarte, são os outros importantíssimos destinatários do nosso agradecimento, aqueles que, na retaguarda, garantiram as condições emotivas e materiais indispensáveis, o amor e confiança incondicionais, para conseguirmos levar com êxito esta tarefa a que nos propusemos. Só o Amor é capaz de tanto. Ao nosso colega de Mestrado, Artur Vasconcelos, no momento certo, um Amigo. A todos os nossos Professores de Mestrado que, com os seus diversos contributos e saberes, foram arquitectos do todo que somos hoje e que nos permitiu encarar e abraçar este desafio, iniciado por outros, também Professores, grandes Mestres que tivemos a felicidade de ter na nossa vida e que sempre souberam alimentar a nossa curiosidade e vontade de aprender. A todos os que algum dia, em algum momento, de algum modo nos ensinaram como tudo é importante e digno, desde pregar um prego, observar uma flor, ler um livro, admirar um gesto, ouvir o silêncio ou aprender a esperar. Outras pessoas contribuíram, e muito, com a sua acção. A todas elas agradecemos seguidamente. A ordem alfabética é apenas sistemática. No nosso íntimo sabemos bem o lugar e papel que cada qual teve no resultado final.

IV

- Carla Morais, Técnica Profissional de Biblioteca (FBAUP) - Doutora Cátia Mourão Rodrigues – Técnica Superior Parlamentar na Área de Assuntos Culturais (Museu da A.R.)

- Doutora Elisa Soares (Museu Nacional Soares dos Reis) - Doutora Fernanda Paiva Correia (Arquivo da FBAUP, Técnica Superior de 1ª classe) - Doutora Teresa Parra da Silva – Responsável pelo Museu da Assembleia da República - Dr. António Tomás Correia – Presidente do Conselho de Administração do Montepio Geral - Dr. João Maria D’Orey Azevedo Coutinho - Dr. Nuno Miguel Benzinho Fonte (Chefe do Gabinete da Presidência da C. M. de Sintra) - Dr.ª Regina Andrade – (Serviços de Património da Santa Casa da Misericórdia do Porto) - Dr.ª Sofia Faria – Gabinete de Relações Públicas Institucionais (Montepio Geral) - Funcionários da Torre do Tombo - Funcionários da Biblioteca Publica do Porto - José Pedro Bessa de Albuquerque de D’Orey - Professora Doutora Maria Clara L. B. Paulino Kulmacz

V

APRESENTAÇÃO

“O tempo é o melhor autor: encontra sempre um final perfeito”. Charles Chaplin (como Calvero em Limelight), 1952.

“Longa é a viagem e começa com um passo”; esta começou com um pequeníssimo, quase de criança mas cheio de ambições como as desses pequenos seres que começam a desbravar o mundo com os seus trémulos arremessos. Estas ambições pareciam-nos exequíveis, apesar do curto espaço temporal disponível de dois anos e, por isso propúnhamo-nos fazer um percurso bastante profundo de pesquisa, de estudo e de escrita, através da multifacetada vida, daquele que é hoje o objecto deste trabalho e que simultaneamente, trouxesse à luz do dia, um pouco do que estava oculto. Mas, “mais depressa se diz do que se faz” e nós, sujeitos às diversas limitações que foram surgindo, rapidamente tivemos que reformular, não os objectivos de carácter mais geral, mas sim as ambições. Sabemos que este tipo de discurso na apresentação de um trabalho, não é de forma nenhuma inédito. É no entanto verdadeiro. Julgamos saber também que “grandes projectos” resultam normalmente em muito menos. Neste trabalho, também a sua total concretização foi, parcialmente, adiada. Por vezes as limitações foram-nos impostas por terceiros; quando provocada pela falta de resposta atempada de alguns serviços aos quais tivemos que recorrer ou, em casos mais raros mas completamente condicionantes, pela pura e simples inexistência de uma resposta, como no caso em que as sucessivas tentativas de contacto com à Leiloeira Nascimento receberam, como resposta, um longo e total silêncio, ou então, a liminar mas “polida recusa” VI

de acesso a determinado serviço, como foi o caso dos Arquivos da Academia de Belas Artes de Lisboa. No entanto, como em tudo, houve aqueles que nos ajudaram, que gentil e simpaticamente nos franquearam as portas, ou dos serviços dos locais onde trabalhavam ou mesmo, das suas próprias casas. Alguns, cuja disponibilidade e atenção recordamos reconhecidos. Esses são os que contribuíram para o bom sucesso desta “empreitada”. Esses são aqueles a quem dirigimos no início do trabalho, os nossos agradecimentos. Devido às condicionantes, anteriormente referidas, houve sucessivas adaptações do plano inicial. Estes percalços foram limitativos para o desenvolvimento de parte das pesquisas, obrigando, portanto, aos referidos “ajustes”. Optámos também, por investir menos na pesquisa dos aspectos biográficos propriamente ditos, não porque consideremos menos importantes, mas para uma melhor gestão e realização do trabalho nas áreas directamente relacionadas com o tema escolhido. Ao longo deste percurso de trabalho poderemos dizer que nos tornámos um tudo-nada, “íntimos” de Oeirense, desse tipo específico de intimidade de quem é “visita frequente”. No entanto, não o descobrimos na sua totalidade, existem facetas que estão ainda vedadas, não porque não existam ou sejam demasiado íntimas, mas porque a gestão do nosso projecto não permitiu a exploração de todos os recursos disponíveis. Para concluir, diremos ainda que a paixão pela investigação, e o trabalho “por amor” e não apenas por obrigação ou dever têm e tiveram em nós, o efeito de algum tipo de “identificação” com o objecto de estudo. Contudo, esta adesão não colocou em risco a objectividade necessária para analisar aquilo que ia surgindo, a cada passo. Para nós, funcionou antes de mais, como um desafio estimulante. No final, gostaríamos de pensar que trouxemos um pouco mais de luz, a um vulto de quem apenas distinguíamos alguns contornos, na penumbra do tempo, irregulares e mal definidos.

VII

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

INTRODUÇÃO “Cada sociedade tem o seu regime de verdade, a sua “política geral” da verdade: Isto é, o tipo de discursos que ela aceita e faz funcionar como verdadeiros; os mecanismos e instâncias que possibilitam distinguir entre afirmações verdadeiras e falsas, o meio pelo qual cada valor é sancionado…” Paul Rabinow, “Michel Foucault” 1984.

“Abençoados sejam os esquecidos, pois tiram maior proveito dos equívocos.” Friedrich Nietzsche, “A Genealogia da Moral”

A pintura portuguesa dos séculos XVIII e XIX, sempre qualificada de pobre em quantidade e fraca em qualidade, é comummente caracterizada pelos casos de uma “meia dúzia” de pintores cuja obra se destacou por ser de nível internacional, quer no respeitante à quantidade e projecção, quer à qualidade geral da produção. Neste sentido, são exemplos constantemente mencionados os casos de Domingos António Sequeira e Vieira Portuense, entre outros. No entanto, esquecemos, ou ignoramos mesmo, um grande número de pintores que, por força das circunstâncias particulares das suas vidas, tiveram e produziram um conjunto significativo de obras, porventura de menor qualidade que os atrás citados mas que, sem dúvida, formaram a realidade que envolveu aqueles, que os condicionou e até mesmo, concorreu com eles. A obra destes homens é importantíssima para a compreensão dos acontecimentos e do ambiente do tempo em que viveram, não falando já, na compreensão, dentro da História da Arte, do devir, da evolução dos gostos e modas, da criação dum certo ambiente artísticocultural e da definição de uma “clientela-tipo” que os sustentou, promovendo, pelas suas encomendas, os meios para a sua sobrevivência e a das suas famílias. Muitos destes artistas permanecem ainda hoje “escondidos” entre as páginas de um ou dois livros, citados de passagem, para ilustrar ou corroborar alguma afirmação mais ou menos acessória, dentro de uma monografia ou estudo, dedicados a algum dos nomes consensuais do nosso panorama pictórico. Eventualmente, algum destes “esquecidos”, vai rompendo através da poeira dos livros, ou aparecendo do fundo escuro dos porões e caves das reservas dos nossos museus, trazidos à

Ana Paula Nunes

1

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

luz do dia por quem resolve olhar para um destes “pintores menores”, descobrindo nele e/ou na sua obra “encantos” até aí insuspeitos. Francisco António Silva Oeirense, pode ser enquadrado neste grupo, confinado como tem estado, às citações pontuais numa ou outra obra e a um ou dois esboços monográficos (que nunca chegaram a ser desenvolvidos), ou ainda às referidas reservas de (quem sabe quantos) museus e às paredes de, provavelmente, bastantes colecções particulares. Uns e outros, museus e particulares, desconhecendo totalmente ou quase, quem é o homem por detrás do nome ou não sabendo, talvez mesmo, esse nome. O nosso trabalho centrou-se na figura, podemos agora afirmar, interessantíssima e cativante, porque polémica, de Oeirense. Difícil foi, de início vasculhar, seguindo as poucas pistas que se colocavam perante nós. Por outra parte, alguns pequenos, mas interessantes trabalhos de pesquisa em volta da pessoa deste artista, os “bons companheiros” nas palavras do nosso Professor, ofereciam-nos generosos, as suas dádivas. Tudo o mais foram pontas soltas de uma grande rede que foi preciso reunir e entretecer, de modo a formar um todo coerente e com algum interesse e utilidade para o nosso estudo. Para o conhecermos, e portanto para a realização do nosso trabalho, partimos da pesquisa e análise de informação recolhida em fontes secundárias; primeiro em bibliografia de carácter geral e depois, vagueando pela reduzida bibliografia específica para, numa segunda fase, enveredarmos pelas fontes primárias, explorando as gazetas e periódicos da época em paralelo com os documentos manuscritos existentes, particularmente no acervo da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto e também daqueles que conseguimos seleccionar na Torre do Tombo para digitalização e posterior leitura e transcrição. A esta busca juntámos a pesquisa e recolha, sempre que possível de forma directa, das fontes iconográficas. As imagens que fomos juntando, quer das gravuras e desenhos, quer dos quadros a óleo que identificámos e conseguimos localizar, foram obtidas recorrendo à fotografia e quando essa opção não era possível, às digitalizações ou às fichas de catalogação de fundos, que continham arquivos de imagem. Aquilo que resultou no final, foram vários “metros” de documentos transcritos e centenas de páginas de periódicos e gazetas folheados, bem como um considerável número de fotografias. Procuraremos pois e dentro do possível, reuni-los, dando uma visão breve da biografia do artista, mas investindo principalmente, na análise da sua actividade artística como pintor e gravador e da sua actividade ligada às Academias de Belas Artes de Lisboa e Porto. Outro aspecto não menos importante é o da actividade como negociante de arte que, foi desenvolvendo, em paralelo com os outros cargos ou funções e ainda como subsidiária da sua Ana Paula Nunes

2

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

outra faceta também não menos importante, de coleccionador de pintura, desenho e gravura. Temos também consciência que nem todos os documentos que recolhemos, iremos explorar na totalidade, ou mesmo sequer usar. Isto porque, para além de alguns deles necessitarem de uma prolongada “mastigação e posterior digestão”, outros há que necessitam do contributo dado por outros documentos cujo acesso não nos foi facilitado. Resolvemos, no entanto, mantê-los no nosso trabalho, para assim poderem, eventualmente servir a outros que neles também possam estar interessados. Algumas das nossas dificuldades prenderam-se com outro aspecto importante; aquele relacionado com o estudo de alguém cuja vida e obra, são de forma geral pouco valorizadas, quer por alguns dos seus contemporâneos, quer pelas mais respeitadas figuras que fizeram e outras fazem ainda, a História de Arte em Portugal. Quem escolhe ou opta, conscientemente, por um “artista medíocre” para, sobre ele, desenvolver uma pesquisa e estudo sabe que se defrontará com várias opiniões, não apenas negativas, mas, frequentemente devastadoras, em paralelo com algumas, poucas, mais favoráveis. Para nós, foi mais um desafio. Se identificar Oeirense pode ser considerada uma tarefa difícil, compreendê-lo é uma tarefa enorme, hercúlea mesmo, “contaminada” que está muita da informação, mesmo a produzida na época em que viveu (talvez até principalmente essa), e que nos apareceu a todo o momento. Estamos no entanto convencidos que, muita documentação, em particular manuscrita, haverá ainda para procurar, descobrir e explorar. Não a esgotámos, por certo. Para dar corpo ao nosso trabalho tentaremos enquadrar, sempre que possível, o artista na época em que viveu, evidenciando alguns dos acontecimentos que marcaram esse período. Procuraremos também, tentar perceber o, ou os “meios” em que se movimentava tentando conhecer, a clientela para quem trabalhava e o que essa mesma clientela esperaria ao encomendar um retrato. No final, gostaríamos de poder dizer que ficámos e entender melhor o artista e a pessoa. O nosso trabalho contará com três corpos em que o primeiro será o resultado da nossa pesquisa, o corpo da dissertação e os dois outros, constituídos por documentação reunida; o segundo pelas transcrições que fizemos e o terceiro, pela recolha de material iconográfico. Descrever, tanto quanto possível, o percurso inicial de Oeirense compreendendo as suas envolventes e condicionantes e o “ambiente” artístico e político em que se enquadrou, as mentalidades e também as rivalidades em que esteve envolvido, serão os principais objectivos que gostaríamos de atingir no final. Tentaremos saber por de lado os excessos e procurar a verdade. Ana Paula Nunes

3

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

1. O HOMEM E A SUA ÉPOCA “Ognun vede quel che tu pari. Pochi sentono quel che tu sei.” Niccolò Machiavelli, O Príncipe, (cap. XVIII)

Oeirense vê, pela primeira vez, a luz do dia, numa época em que o mundo, e particularmente o continente europeu, atravessa uma fase especialmente difícil e complexa. Internacionalmente, o final do séc. XVIII, traz consigo a Revolução Francesa e, com ela, a total dissolução do Feudalismo, uma ordem produtiva e social primordialmente agrícola e submetida a uma rígida hierarquia que sobrevivera durante sete séculos,1 e que, de um momento para o outro, deixa de existir para surgir um novo poder, de contornos económico-sociais, marcadamente burgueses. O poder deixará de ser “depositado” por Deus nas mãos do Soberano, para que a sua posse passe a ser atribuída e legitimada pelo Povo. Mais tarde, novas transformações se geram em França quando, após um conturbado e anárquico período pós revolucionário, Napoleão ao serviço do exército francês, conquista o respeito e a fama devidas às vitórias que alcançou chefiando, como General, as tropas francesas entre 1796 e 1797. Em 1799 comanda o golpe militar que o coloca no poder, possibilitando-lhe a concretização do seu sonho; a criação de um Império europeu. Iniciará então, a expansão das fronteiras do território, à custa do sacrifício de milhares de pessoas, em invasões e batalhas, visando entre outros objectivos, abalar o poderio dos “tradicionais” rivais ingleses. Entre acordos políticos e comerciais de curta duração, em 1805, tenta a expedição marítima de invasão da Grã-Bretanha que resultará na célebre derrota na batalha de Trafalgar. Por terra, no entanto, continua o seu percurso vitorioso através de uma extensa área territorial. As Guerras napoleónicas, irão gerar profundas transformações, no mapa europeu mas em particular, na organização política interna dos países.

1

EISENMAN, Stephen F; CROW, Thomas; LUKACHER, Brian; NOCHLIN, Linda e POHL, Frances K. HISTORIA CRITICA DEL ARTE DEL SIGLO XIX : 1ª Ed., Madrid, Ediciones Akal, 2001, p. 7. Tradução livre da autora.

Ana Paula Nunes

4

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

Para Portugal, este acontecimento terá consequências particularmente importantes, a todos os níveis e em todas as áreas vitais do país. “Foi o invasor que separou o Portugal velho do novo Portugal. Depois dele, as coisas não podiam tornar a ser o que tinham sido”2. Efectivamente, num espaço de cerca de sete anos, o país muda radicalmente. Economicamente, o nosso território, sacudido por convulsões e movimentos invasores sucessivos, exaurido pelo consumo de homens, animais e materiais diversos, para prover a manutenção forçada dos exércitos (invasores ou não) fica, para sempre, submergido numa crise da qual não sabemos bem quando, ou mesmo se, chegou a sair. A população, directamente afectada, sofre, não apenas a fome e a falta de recursos básicos essenciais, mas também muito duramente as mortes das suas gentes. Esta mortalidade surge sob as mais diversas formas e pelas mais variadas razões; ou pela participação directa no confronto militar, ou pelos “efeitos secundários” dessa mesma guerra. Politica e socialmente, e fruto da fuga da família real e da classe dirigente nacional, para o Brasil, seremos, durante algum tempo, marcados por uma espécie de “síndrome do abandono” fazendo-nos permanecer, estranhamente passivos, atordoados, perante o domínio do invasor, pelo menos, entre aqueles que ficaram com a responsabilidade da chefia do país. Na arte, surgem situações de alguma “adesão” a esta nova ordem de coisas, se não já por convicção, pelo menos por necessidade. Sequeira, por exemplo, faz uma alegoria exaltando a figura de Junot.3 Como crianças abandonadas já em idade de entendimento assim ficou parte do país, durante algum tempo, alheado, inerte. “Durante seis meses, os funcionários portugueses obedeceram sem protesto ou desvio ao invasor”4 . Deste torpor, só acordamos “empurrados” pelo exemplo da revolta e pela resistência popular que desde bem cedo, começara a insurgirse contra o domínio francês, demonstrando-o em pequenas sublevações e, a outro nível, em quadras e desenhos alegóricos de cariz marcadamente popular, manifestações às quais, viriam a aderir bastantes artistas e escritores. É nos primeiros anos deste cenário de profunda mudança que nasce, em 24 de Dezembro de 1797, em Oeiras, Francisco António da Silva,5 filho de António da Silva e Francisca Luísa. Do assento de baptismo, feito na Paróquia e Igreja de Nª Senhora da Purificação de Oeiras, em 3 de Janeiro de 1798 constam os nomes dos avós maternos 2

VALENTE, Vasco Pulido - Portugal - Ensaios de História e de Política. Lisboa: Editora Aletheia, 2009, p. 7. FRANÇA, José-Augusto - A Arte em Portugal no Século XIX, vol I, 3.ª ed. Lisboa, Livraria Bertrand, 1990, p. 120. 4 VALENTE, Vasco Pulido – Portugal… op. cit., p. 10. 5 LIMA, Henrique de Campos Ferreira – Silva Oeirense, litógrafo. Porto: Círculo Dr. José de Figueiredo, 1943, sep. de “Museu”, vol. I, n.º 1. Porto: Círculo Dr. José de Figueiredo, 1942, p. 6. 3

Ana Paula Nunes

5

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

(António João e Ana Joaquina) e paternos (Teodoro da Silva e Teresa Gomes), bem como o do padrinho, Francisco Xavier de Santa Bárbara e Moura.6 Terá, naturalmente crescido, dentro dos modelos comuns naquela época, possivelmente duma família da pequena burguesia. Desde esta data, até à adolescência, nada sabemos até à idade de catorze anos. Nesta altura, sabemos que foi aluno de Bartolozzi uma vez que, por volta de 1811, e segundo informação escrita pelo próprio punho de Oeirense7, entra para a aula daquele reconhecido Mestre gravador; “… fui despachado em 5 de Novembro de 1811, com a penção de 480 r.s diarios, como Alumno da Aula de Gravura de que era Professor Francisco Bartolozzi…”8. Dado muito importante e que é corroborado por alguém que viveu naquela época e cuja importância e conhecimento do nosso panorama artístico deste período é, praticamente, incontestada. Efectivamente, Cirilo Volkmar Machado, nas suas Memórias relativas às vidas dos Pintores e Escultores, quando se refere a Bartolozzi e aos seus discípulos da Aula de Gravura, depois de elencar uma série de nomes que nos são familiares, indicando as actividades que cada um deles desenvolveu com mais dedicação, termina dizendo: “ Francisco Antonio da Silva, applicou-se á pintura.”9 Esta pequena informação garante-nos, não só a veracidade da declaração escrita por Oeirense em 1841, mas também que o artista apesar de ter feito a sua aprendizagem em gravura se irá dedicar essencialmente à pintura. Esta sua formação em gravura, não terá sido longa pois só frequentou a aula a partir de 1811, ou seja, à data da morte do professor Bartolozzi (2 de Março de 1815), teria tido sensivelmente, 4 anos de ensino. A grande qualidade do Mestre é inquestionável e da sua oficina saíram nomes que, anos mais tarde, fizeram parte do panorama artístico nacional. Quando pensamos que Oeirense é comummente tido como um artista medíocre, perante nós levanta-se, senão a dúvida, pelo menos a questão; Será que Oeirense seria aceite na aula deste Mestre, recebendo uma pensão de 480 reis diários se aquele qualificado professor lhe não encontrasse algumas qualidades?

6

LIMA, Henrique de Campos Ferreira – Silva Oeirense… ibidem. Vd. Anexo II-B, Doc.1. 8 Vd. Anexo I, Doc. Nº 104. AFBAUP. 9 MACHADO, Cirilo Volkmar, Collecção de Memórias relativas às vidas dos Pintores e Escultores, Coimbra, Imprensa da Universidade, 1823, p.233. 7

Ana Paula Nunes

6

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

Por outro lado, o trabalho na Aula de Gravura, ao que parece era exigente pois, a qualidade e rigor de execução assentava na transmissão aos seus discípulos, de um “severo método de trabalho”.10 No entanto, não deixa também de ser verdade que esta exigência poderia estar um pouco enfraquecida fruto de um período menos feliz que o artista estaria a atravessar em Portugal.11 Por outro lado, autores há que referem também a indisciplina que se viveria nas suas aulas, em razão de Bartolozzi ter já bastante idade e ser estrangeiro12. De que forma poderá esta situação ter influenciado a sua qualidade ou a sua exigência como professor. Será que estas dificuldades “amoleceram” os seus critérios e rigor. Ingressando Oeirense na sua aula, precisamente nesta mesma altura, 1811, até que ponto poderá ter sido fruto de uma aprendizagem marcada por este tipo de ambiente que o envolveu. Analisando ainda a declaração de Oeirense, anteriormente referida, sabemos que é após a sua aprendizagem com Bartolozzi que Francisco António da Silva, acrescenta a designação de Oeirense ao seu nome. De acordo com as suas próprias palavras é “… que depois desta épocha por haver varios Artistas appelidados Silvas, juntei ao meu nome de Francisco António da Silva, o apelido de Oeirense, por ter nascido em Oeiras, e isto ser costume dentro e fora de Portugal,…”13 O percurso biográfico e artístico-profissional de Oeirense passará, após este período inicial que terá sido, pensamos, essencialmente de aprendizagem, passará, dizíamos por uma série de actividades e pelo envolvimento em diversos projectos, não exclusivamente artísticos, entre os quais se salienta, sem dúvida o ambiente criado com revolução de 1820, como a “oportunidade” de projecção da sua carreira e/ou da sua própria pessoa e da qual nos ocuparemos com mais pormenor nos capítulos seguintes. No entanto, deveremos lembrar que este “fervor patriótico” foi, não só uma oportunidade para Oeirense como para muitos outros, multiplicando-se as mais diversas “manifestações de criatividade artístico-revolucionária”, “…1820 e a sua revolução

10

JATTA, Barbara; coord. - Francesco Bartolozzi. Desenhos de um gravador. Museu Nacional de Arte Antiga. Lisboa:Instituto Português de Museus, 1996, p.13. 11 JATTA, Barbara; coord. – Francesco…, op. cit., p. 13-14. O Mestre escreve, em 1811 a Domenico Pellegrini, queixando-se da sua sorte pois atravessava um período difícil, fruto da situação política que Portugal vivia desde 1807. 12 SOARES, Ernesto - História da Gravura Artística em Portugal: os Artistas e as suas Obras. Instituto para a Alta Cultura, Lisboa, [s.n.], 1940-1941, vol. I, p. 102. Esta indisciplina, estender-se-ia ao seu próprio ajudante Queirós. 13 Ibidem, Anexo I, Doc. Nº 104.

Ana Paula Nunes

7

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

ofereceram aos alegoristas portugueses vasto campo de especulação e de entusiasmo, num arroubo patriótico que visava agora também”14 o domínio da Inglaterra. Mas, quem era ou como era, efectivamente este homem sobre cuja vida e actividade nos debruçámos? É “O Oeirense patriota de 20, negociante de quadros, desenhador medíocre, foi mais político do que artista.”15 E o “… Silva Oeirense, académico que, (…) artisticamente nunca voou alto.”16 Ou ainda “O que se sabe, sem dúvidas, é que foi um influente liberal de alto valor e figura de extraordinário relevo dentro da arte portuguesa …”17 São variadas as opiniões a seu respeito e algumas bem diferentes, senão mesmo, opostas. Do seu aspecto físico muito pouco ou quase nada sabemos. Curioso é que, um artista (bom ou mau, é irrelevante), quase exclusivamente pintor retratista, normalmente e por natureza da própria arte observador e valorizando a imagem física e, sempre (uns mais que outros), um pouco narcisistas, alguém, repetimos, com estas características, não possui um único retrato ou auto-retrato conhecido. Mais evidente se torna esta situação, quando sabemos que ocupou, durante bastante tempo, uma posição social de alguma relevância. Estamos convictos que algum existiu (ou existe?), no entanto, desapareceu ou estará por identificar ou encontrar. Seria também importante o contributo da sua análise pois a imagem física ajuda frequentemente, na compreensão do todo, pese embora ser considerada acessória, não deixa de ser também a “mensagem” que primeiro recebemos do “outro”, aquilo que esse indivíduo “quer que vejamos”. Depois de limpa de todos os “ruídos” com que vem envolvida, é mais um elemento de informação. Do seu aspecto físico resta-nos pois muito pouco. A única referência encontrada é diminuta e resume-se a um pequeno excerto, redigido por um estrangeiro, contemporâneo de Oeirense, com quem se encontrou pontualmente e que dele observou o seguinte; “Francisco António da Silva, Oeirense, um senhor baixo e bem vestido que vem carregado com um

14

FRANÇA, José-Augusto - A Arte em Portugal…, op. cit., p. 121. FRANÇA, José-Augusto - A Arte em Portugal…, op. cit., pp. 124 e 125. 16 CARVALHO, José Alberto Seabra - O Retrato ao Serviço da História [ca.8]. [Em linha]. Lisboa: SecretariaGeral do Ministério das Finanças e da Administração Pública, 2006 – actual. 06 Set. 2009. Disponível em: http://www.sgmf.pt/Institucional/Historia/Indice/Documents/f887640b0ab547b9a92bfd35fc8f19f9ensaios2_josé albertoseabracarvalho.pdf. 17 SOARES, Ernesto - História da Gravura… op.cit., vol II, p.388. 15

Ana Paula Nunes

8

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

elegante portfolio debaixo do braço. Em mau francês, pede a Heeringen18 o recomende ao príncipe cujo retrato teria muito gosto em pintar.”19 Nas notas pessoais colhidas na leitura do original20 em alemão, do livro acima citado, o texto surge-nos com ligeiríssimos pormenores que o completam; “Uma manhã, em Lisboa, o autor recebe um cartão dizendo: Francisco António da Silva, Oeirense, Largo do Carmo, n.º 6, 2º andar” e logo de seguida entra na sala um homem pequeno, bem vestido, pálido, com um elegante “portefeuille” debaixo do braço.” Ficamos portanto, e apenas, a saber que o nosso homem se apresenta bem, elegantemente vestido, provavelmente seguindo a moda da época, é baixo e pálido. O seu gosto e a sua já referida elegância são reforçados pela nota que complementa a descrição, especificando que não trazia apenas um portfolio, mas sim um “elegante portefólio”, ou seja, preocupava-se e por certo gostava da sua imagem, como um todo, cuidando os mais pequenos pormenores. Poderemos, com alguma propriedade pensar que, para além de um certo “bem-estar” económico, existia um carácter um pouco vaidoso ou apenas confirmar a nossa ideia de um certo narcisismo próprio dos artistas (pintores em particular), recordando-nos a frase bem significativa atribuída a Cosme de Médicis; “ogni pittore dipinge sè.”21 Como “elegante” que era, não desconheceria a importância do francês, à época a língua dominante, a mais importante internacionalmente, na Europa culta e cosmopolita. No entanto, Oeirense fala um “mau francês”, possivelmente por não ter realizado uma aprendizagem formal. Mas se o não fez, como a falava? Terá o nosso pintor e “pensionista viajante”22 viajado mesmo, estado alguma vez, de visita ou aprendendo, em terras gaulesas? Efectivamente, os mais aguerridos detractores seus contemporâneos, uma das armas de arremesso que usam frequentemente é acusá-lo de que o título de pensionista viajante, não 18

KULMACZ, Maria Clara Loureiro Borges Paulino - Arte e património em Portugal: olhares norte-europeus (da segunda metade do século XVIII a meados do século XIX). Porto: Dissertação de mestrado em História da Arte em Portugal (sob a orientação de Agostinho Araújo), apresentada à Faculdade de Letras da Universidade do Porto: Edição de 2001, vol. II, p. 120. “Gustav Adolf von Heeringen, de pseudónimo Ernst Wodomerius, nasce em 1800, em Mehlra bei Muelhausen, oriundo de uma família tradicional de altos funcionários administrativos. Estuda Direito e Ciências Políticas em Jena e logo ocupa funções de bibliotecário, conselheiro e Camareiro em Coburgo. Foi como camareiro que acompanhou os príncipes de Coburgo, Fernando e Alberto, nas sua respectivas viagens de casamento a Lisboa e a Widsor, …”. 19 KULMACZ, Maria Clara Loureiro Borges Paulino - Arte e património em Portugal …, op. cit., vol.I, p. 67. 20 Apud KULMACZ, Professora Doutora Maria Clara, (notas pessoais gentilmente cedidas pela) HEERINGEN, Gustav Adolf von, (1799-1851) – Meine Reise nach Portugal im Fruehjare 1836. Leipzig: Brockaus, 1838. 2 vol., p. 57. 21 PONTÉVIA, Jean-Marie – "Tout peintre se peint soi-même: Ogni Dipintore Dipinge Sè", Ecrits sur l’art et pensée detaches. Vol.III, Bordeaux, William Blake & Cie, Bordeaux, 2002, p. 38. 22 APUD LISBOA, Maria Helena; As Academias e Escolas de Belas Artes e o Ensino Artístico (1836-1910), Edições Colibri - Instituto de História da Arte / Estudos de Arte Contemporânea, F.C.S.H.U.N.L., 2007, p.101, nota 7 “… volta a ser nomeado pensionista viajante em Outubro de 1836.”

Ana Paula Nunes

9

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

correspondia à actividade ou função que deveria realizar, ou seja, viajar! Como tal, encontrámos com muita frequência em textos da época, referências como as seguintes; “… dissessem que o pensionista viajante parado é muito útil (não sei para que) …”23 ou então “… a respeito do tal viajante em secco, só diz que é muito util, mas não diz para que…”.24 Estas afirmações, não se limitam à crítica pura, o sarcasmo é evidente e reforça a intencionalidade da mensagem; desacreditar esta sua função, a sua actividade. Cresce em nós a dúvida sobre o seu percurso de aprendizagem e sobre se realmente saiu do país e aprendeu algo mais lá fora, ou mesmo se realmente exerceu este último cargo. Não encontrámos, entre os documentos que transcrevemos nada que o confirmasse cabalmente mas também, é certo, nada que o negasse, uma vez que as acusações que lemos apenas se ficam por este tipo de atoardas, alusões e insinuações, nunca sendo apresentados factos. Permitimo-nos, no entanto, discordar da opinião de que “Francisco Silva Oeirense, só foi nomeado em 1838, já que no ano da fundação da Academia fora enviado uma segunda vez para o estrangeiro como pensionista viajante.”25 Aliás, poderemos afirmar que Oeirense nunca esteve nos planos iniciais para leccionar no Porto, qualquer que fosse a Cadeira.26 Certo é que, quanto ao seu temperamento e carácter, continuamos divididos entre “dois Oeirenses” distintos. Um elegante, bem relacionado social e politicamente27 que dominava uma certa arte de “bem se posicionar” e que portanto, não poderia ser, de forma alguma personalidade incómoda ou inconveniente no que respeita ao trato social e educação. Esta opinião reforçou-se com a análise dos seus documentos manuscritos (e passaram-nos bastantes pelas mãos), que revelam uma letra regular, bonita, elegante e uma redacção bastante correcta, contrastando com a de alguns seus contemporâneos que a deveriam ter igualmente desenhada e gramaticalmente, se não irrepreensível, pelo menos razoável, pois que, em termos sociais e profissionais, estariam sensivelmente ao mesmo nível que o nosso artista. 23

Vd. Anexo I, Doc. Nº 151, O TOUREIRO, nº 175 de 29 de Novembro de 1837, p. 699. Este artigo surge assinado por: “um amigo dos concursos”, (sublinhado nosso). 24 Vd. Anexo I, Doc. Nº 175, O TOUREIRO, ibidem, (sublinhado nosso). 25 - LISBOA, Maria Helena; As Academias e Escolas de Belas Artes e o Ensino Artístico (1836-1910), Edições Colibri - Instituto de História da Arte / Estudos de Arte Contemporânea, F.C.S.H.U.N.L., 2007. ISBN: 972-772688-7, p.206. Efectivamente, à data da fundação da Academia (Novembro de 1836), estava Oeirense a receber, em Lisboa, na Academia, Joaquim Rodrigues Braga que lá ia apresentar uma proposta de professores para as diversas Aulas da Academia Portuense. Oeirense leva-o inclusivamente, à Comissão dos Artistas, onde falam sobre esse assunto, tal como consta em documento que transcrevemos. Vd., DOC. nº 3, de 20 de Novembro de 1836, Torre do Tombo, Pasta – Academia Portuense de Belas Artes – 1836/1843. 26 Vd. DOCs. Nº1 e Nº2, Torre do Tombo, Pasta – Academia Portuense de Belas Artes – 1836/1843. Proposta de Joaquim Rodrigues Braga e de Oeirense, respectivamente, para leccionar as diversas aulas. 27 Tentaremos mostrar, um pouco mais à frente, o conjunto de personalidades da época com que se relacionou, por razões profissionais, por encomendas de retratos e também através da forma, relativamente fácil, com que recorria às instâncias superiores, quando necessitava de alguma licença ou outra qualquer decisão oficial.

Ana Paula Nunes

10

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

Fig. 1 Excerto de documento existente na Torre do Tombo (digitalização nº 0137).

Bem sabemos que esta característica não pode definir a personalidade de alguém, no entanto também não é de desprezar a sua análise. Neste caso, pode revelar algum equilíbrio de carácter e organização pessoal. Aliás, esses mesmos documentos, mostram sempre uma forma “polida” de se expressar, mesmo quando o assunto ou a situação a que se reportam não são agradáveis ou favoráveis à sua pessoa ou aos seus interesses. Nunca usa palavras grosseiras ou indecorosas. O mesmo não podemos afirmar de alguns seus colegas e opositores que usavam linguagem pouco elevada, e se serviam do insulto quer em documentos pessoais quer mesmo e registos oficiais. Tal é o caso de António Manuel da Fonseca e de João dos Santos Mendes, como adiante veremos. Ainda relacionado com o polimento e educação que teria que possuir para conviver em sociedade, ele era tanto mais necessário quanto Oeirense se encontrava ligado a determinadas funções e cargos honoríficos como é o caso a que alguns autores se referem apenas como uma hipótese não confirmada, ou seja, ao facto de Oeirense poder ter pertencido à Ordem de Cristo.28 Claro está que estamos cientes que, também naquela altura (como hoje), certos “lugares” se tivessem tornado acessíveis a pessoas que até aí não os poderiam sequer pensar, independentemente da sua preparação para os desempenhar, assim mesmo, a situação não seria geral e não o era talvez neste caso. Efectivamente, julgamos poder afirmar com segurança, a partir do documento publicado no Periódico dos Pobres no Porto, que o artista foi cavaleiro da ordem de Cristo. Nele, podemos ler numa listagem, por ordem alfabética, de “Cavalheiros, que tem residência nesta Cidade, ainda que alguns estejão ausentes ao tempo”, a dado passo, o nome de FRANCISCO ANTONIO DA SILVA OEIRENSE e no final a referência seguinte: “Estes são os Cavalheiros das Ordens de Christo, Aviz, e Conceição, pois não existe de presente cavalheiro

28

LIMA, Henrique de Campos Ferreira – Silva Oeirense… op. cit., p.8.

Ana Paula Nunes

11

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

algum no Porto da Ordem de Sant-Iago. Não mencionamos os Cavalheiros da Ordem da Torre e Espada”.29 A publicação da listagem de “ilustres”, que se estende por diversos números daquele jornal, justificava-se em vista das comemorações do dia do Corpo de Deus e da obrigatoriedade dos detentores destes títulos e outros cargos relevantes, acompanharem a procissão, para a qual eram convocados por Edital do Governador Civil do Distrito do Porto. Oeirense encontrava-se, portanto, entre estes notáveis. Em oposição a um Oeirense refinado e polido, aparece-nos outro nos seus antípodas. Intratável, irritadiço, grosseiro e agressivo, roçando, por vezes o violento. Este é o homem que nos é apresentado pelos seus opositores e principais detractores. Veiculada, essencialmente pelos periódicos da época, mas também, nalguns documentos particulares e oficiais esta imagem assenta em descrições do género: “… tiveram de sujeitar-se aos golpes da ignorância e da impostura, o sr. Oeirense, atirando-lhe quatro cajadadas de saloio, os transtornou por tal modo, e por gosto seu, que preparou os meios de mostrar a sua vileza, e baixos sentimentos, vingando-se de quantos homens honrados …”30 ou então “… por influencia do sr. Oeirense, desse homem que (…) comendo ociosamente 800$000rs. sem querer, nem saber fazer cousa alguma, salvo enredar, e insultar grosseiramente os alumnos da academia, …”31 e outros mais. Esta faceta de Oeirense é aquela que mais frequentemente encontrámos ao longo das nossas pesquisas mas que pela forte intencionalidade que transparece deste tipo de escrita, nos parece ter um objectivo bem definido de difamação e de criação de um “ambiente desfavorável” ao artista e uma opinião pública que se posicionasse anti-Oeirense. Convirá talvez aqui relembrar que, estamos na fase que se seguiu à vitória liberal de 1834 cujos anos iniciais representam um momento político particularmente conturbado, anos marcados por sucessivas revoluções, golpes, contra-golpes, movimentos, sublevações, governos que caíam e outros que se formavam, etc. 32 Além disto, ontem como hoje, a força e o poder de manipulação da opinião pública pela comunicação social da época (os periódicos), não era de forma alguma desconhecida dos

29

Vd. Anexo I, doc. Nº 159, Periodico dos Pobres no Porto Nº46, 4 de JUNHO de 1844, p. 185. Vd. Anexo I, Doc. Nº 148, O EXAMINADOR, Lisboa, Nº92, 9 de Junho 1837, pp. 371 e 372, (sublinhados nossos). 31 Vd. Anexo I, Doc. Nº 148, O EXAMINADOR, … ibidem (sublinhados nossos). 32 MOREIRA, Fernando – «As dinastias liberais. Relações de parentesco entre membros do parlamento no período da monarquia constitucional (1834-1910)». Análise Social, 2006, Lisboa. ISSN 0003-2573. Vol. XLI, nº.178, 2006, p.125. “ Os anos iniciais foram tempos de reconhecida instabilidade: a revolução de Setembro (1836), a revolta dos marechais (1837), a rebelião arsenalista (1838), o golpe de Costa Cabral (1842), a revolta de Torres Novas (1844) a Maria da Fonte (1846), a Patuleia (1846-1847). (…) Tal facto sai até reforçado se atendermos a que durante os setenta e seis anos que mediaram entre 1834 e 1910 ocorreram 40 legislaturas, … ” 30

Ana Paula Nunes

12

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

próprios políticos e jornalistas que usavam estes meios para melhor atingirem o objectivo de construírem as imagens desejadas (favoráveis ou não), relativamente à pessoa ou coisa em vista. Também neste caso, a utilização da palavra publicada e acessível a um maior número de pessoas era (por vezes), “moldada”, para que o leitor pensasse que estava a criar uma opinião sua, estando efectiva e inconscientemente a “absorver” as ideias daquele que escrevia. Alguns equívocos e falsas verdades históricas se criaram desta forma. 33 Para concluir o nosso pensamento, diríamos que certos periódicos, politicamente identificados com franjas radicais, usavam uma linguagem dura e excessiva, recorrendo sem grandes pruridos ao insulto, e com objectivos bem definidos de difamação e descrédito do “objecto” visado. Efectivamente julgamos que o tom, por vezes muito exagerado que encontrámos ao longo das nossas pesquisas terá algo a ver com estes objectivos, menos “claros”, de cariz político e visando interesses, talvez, de promoção profissional e social, usando uma das técnicas (infelizmente) mais eficazes, a curto e médio prazo; a calúnia e o boato. Claro está que não pretendemos ser os “justiceiros” nem tão pouco dizer que Oeirense estaria “limpo” de culpas ou responsabilidades. Achamos sim, que os exageros e o demasiado óbvio nos devem fazer sempre pensar com prudência e alguma contenção. Continuando a analisar o pouco que temos sobre a vida pessoal do artista, sabemos que o pintor foi casado com D. Joana Rita Caldeira e Silva e teve, pelo menos, um filho, Caetano da Silva Oeirense. A fase final da vida de Oeirense caracteriza-se por uma certa perda de influência e de aparentes dificuldades financeiras, patentes na venda, ainda em vida, de alguns objectos da sua colecção (adquiridos com dotação do Rei D. Fernando, para a Academia). Deste modo, são alienados em 1865, quatro trabalhos de Domingos António Sequeira, a saber; Um embarque, Scena do Apocalypse e Allegoria (respectivamente, dois esboços e um esboço incompleto) e o quadro Egas Moniz e sua família perante Affonso VII de Leão. Em 1866 o quadro Marinha de Jules Nöel.34

33

BONIFÁCIO, Maria Fátima - «O proteccionismo como ideologia radical». Análise Social, 1988, Lisboa. ISSN 0003-2573. Vol. XXIV (4.º-5.º), n.º 103-104, pp. 1017 e 1018. “A falsificação desta história já foi operada na época. Quem leia os periódicos setembristas fica convencido de que a esquerda tinha eternamente a combater e a denunciar uma vasta e permanente conspiração dos cartistas…”. Para um melhor entendimento do assunto, sugerimos a leitura integral do capítulo. 34 LIMA, Henrique de Campos Ferreira – “O artista Silva Oeirense e a sua colecção de retratos dos heróis da Revolução de 1820”, Anais das Bibliotecas e Arquivos, vol. X, n.os 37-38. Lisboa: 1932, p. 40. Lamentavelmente imposições rígidas de tempo não possibilitaram a consulta directa das fontes indicadas pelo autor.

Ana Paula Nunes

13

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

Também num anúncio do seu falecimento no Jornal do Comércio de 10 de Janeiro de 1868, podemos ler: “… Á causa liberal também o Sr. Silva prestou valiosos serviços, sacrificando-se e arruinando a sua casa com a dedicação de um liberal convicto. (…) Morreu pobre.”35 Talvez esta informação não seja de desprezar pois, também a Academia Nacional de Belas-Artes, em meados do séc. XIX comprará a uma senhora que assina como “viúva Oeirense”, os apontamentos manuscritos de Cirilo Wolkmar Machado que terão servido de base ao seu livro, “Collecção de memórias relativas às vidas dos pintores, e escultores, architetos, e gravadores portuguezes, e dos estrangeiros, que estiverão em Portugal recolhidas e ordenadas por Cyrillo Volkmar Machado, Pintor ao serviço de S. Magestade. O SENHOR D. JOÃO VI.”36 Além disto, a família venderá mais tarde, alguns quadros. Entre eles, um do séc. XVII italiano Christo triumphando da Morte; um esboço da 2ª metade do séc. XVIII Apollo e Marsyas; de Jacinto Romano Santa Maria esposa de Santo Izidoro e, finalmente um retrato de desconhecido da segunda metade do séc. XVII. Existem ainda alguns desenhos, hoje na colecção do Museu Nacional de Arte Antiga, comprados durante a gestão do Marquês de Sousa Holstein. A venda destes documentos e obras de arte, poderá ter sido um recurso utilizado pela viúva para prover à sua subsistência, situação infelizmente bastante comum naquela época quando, por morte do marido e a braços com problemas de sobrevivência económica, à mulher, pouco mais lhe restava do que (caso os tivesse) vender alguns ou mesmo todos os bens com que ficava. A luz do dia que brilhara pela primeira vez a Francisco António, na véspera de Natal de 1797, extinguia-se completamente, setenta e um anos e treze dias depois, corria o ano de 1868, em plena tarde lisboeta, enquanto as ruas fervilhavam de vida.

35

LIMA, Henrique de Campos Ferreira – Silva Oeirense Litógrafo, op. cit., p. 8. MACHADO, Cirilo Wolkmar; paleografia INÁCIO, Ana Calado; transcr., pref. e notas BERGER, Francisco Gentil; nota de abertura BRANDÃO Augusto Pereira - Tratado de arquitectura & pintura. Lisboa : Fundação Calouste Gulbenkian, 2002, p.7. 36

Ana Paula Nunes

14

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

2. O PINTOR Um pintor mui medíocre, vendo que pela sua arte pouco ou nada adquiria, largou-a, e abraçou a profissão de medico: e como lhe perguntassem a razão desta mudança, respondeu - «Na pintura todas as faltas são expostas á vista; na medicina porèm enterrão-se com o doente, e em consequencia tudo é lucro sem risco.» Anónimo, in. PERIODICO DOS POBRES NO PORTO, nº21 de 1845.

Ao longo de toda a pesquisa sempre vimos, o nome de Oeirense, aparecer associado à gravura. Deve-se isto, por certo, quer ao facto de ter sido professor desta Cadeira, na Academia Portuense, quer porque, como já tivemos oportunidade de verificar, anteriormente, realizou a sua aprendizagem com o Gravador Bartolozzi, quer ainda também, por estar relacionado com a produção de uma das mais conhecidas colecções de gravuras daquela altura, género de exaltação patriótica e política muito em voga, a “Collecção dos Retratos dos Varoẽs Esclarecidos” representando figuras ilustres da sua época, envolvidas na Revolução de 1820, bem como por ter estado ligado à direcção da Oficina Litográfica Nacional e, finalmente porque é nesta área que lhe tem sido dado maior espaço e atenção por parte dos críticos e historiadores de arte. Apesar de tudo isto, julgamos que ele próprio se reconhecia e identificava mais como pintor e, concretamente, pintor retratista. Várias evidências, parecem, em nossa opinião, concorrer para essa ideia e suportá-la. O pintor Oeirense apesar de aprender gravura opta, pela pintura tal como resulta da leitura da pequena frase que lhe dedica, na sua obra, Cirilo Wolkmar Machado e à qual fizemos já referência. Outro estrangeiro, o Conde Raczynski, define-o também como pintor.37

Fig. 2 Excerto do livro de Raczynski, Dictionnaire Historico-Artistique du Portugal.

37

RACZYNSKI, A. - Dictionnaire Historico-Artistique du Portugal pour faire suite à l’ouvrage ayant pour titre: Les Arts en Portugal. Lettres adressées à la Société artistique et scientifique de Berlin accompagnées de documens. Par Le Comte A. Raczynski. Paris: Jules Renouard et C.ie, Libraires-Éditeurs, et Commissionnaires pour l’ Étranger, 1847, p.276.

Ana Paula Nunes

15

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

Além disto, durante a nossa pesquisa, foram vários os anúncios que recolhemos nos quais promove as suas actividades, indica a morada e põe à disposição dos interessados, os seus serviços e nos quais se apresenta, sempre, como “pintor retratista”. Em 1830, publica na Gazeta de Lisboa, um desses anúncios (o mais antigo que até agora encontrámos) em que publicita os seus serviços como pintor, apresentando-se disponível para ensinar desenho e pintura bem como para mostrar as suas obras, a qualquer interessado, como referência do seu trabalho, identificando-se como pintor retratista em grande e pequeno: “Francisco António Silva Oeirense, Artista Pensionario do Estado, Pintor Historico, e Retratista em grande e em pequeno, mudou a sua habitação para a rua nova do Carvalho, ao arco pequeno do Marquez, proximo ao cáes do Sodré n.º 31, 2.º andar: o mesmo artista acceita em sua casa discipulos de Desenho, e Pintura, e mostrara as suas obras, para poderem ajuizar do seu merito, ás pessoas que precisarem dos seus trabalhos.”38 Sucedem-se outros anúncios do mesmo teor em diversos periódicos, O Nacional39, O Diário do Governo40, O Periódico dos Pobres no Porto41, etc. Até mesmo num anúncio publicado pela Academia de Belas Artes do Porto, onde se torna publica a informação sobre a data de abertura das matrículas e das aulas de gravura, se anuncia que o professor Oeirense também dá aulas particulares; (…) “Igualmente se annuncia, que o Lente respectivo se offerece, como Professor particular, a fazer seguir a prelecção propria da sua Cadeira de outra de desenho de Figura, e de Paisagem, assim para utilidade particular dos seus discipulos, como para a geral do publico. = Paulino José de Carvalho, Secretario.”42 É realmente indiscutível que toda a pintura de Oeirense que hoje conhecemos e está identificada, é exclusivamente constituída por retratos, pelo que parece ter sido esta a área em que realmente se especializou ou, pelo menos aquela em que era mais procurado pelos seus clientes. Esta clientela, aparentemente influente e bem posicionada socialmente, é constituída essencialmente por homens, directa ou indirectamente, ligados à política e eventualmente em simultâneo, à economia da época. Efectivamente, a importância de se fazer retratar é tão relevante para essa clientela, como, de forma geral, sempre foi para o ser humano particularmente quando investido de algum poder. Se olharmos para trás, desde bem cedo na História do homem, a representação da imagem adquire uma dimensão áulica, ligada às elites cortesãs e palacianas, evoluindo, em 38

Vd. Anexo I, Doc. Nº 135, Gazeta de Lisboa, Lisboa, Nº25, 29 de Janeiro 1830, p. 100. Vd. Anexo I, Doc. Nº 139, O Nacional, Lisboa - Nº196, 13 de JULHO 1835, p.921 40 Vd. Anexo I, Doc. Nº 138, Diario do Governo, Lisboa, nº163, 13 de Julho 1835, p. 681. 41 Vd. Anexo I, Doc. Nº 157, PERIODICO DOS POBRES NO PORTO, Nº40, 28 de MAIO 1844, p. 157 42 Vd. Anexo I, Doc. Nº 155, O Athleta. Porto - Nº167, 24 de Dezembro 1838. 39

Ana Paula Nunes

16

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

certos casos, até se chegar a confundir com o divino (caso do Egipto e mais recentemente da corte francesa do Rei-Sol). O retrato ganha autonomia como género artístico com o Renascimento e a consequente valorização do indivíduo, como ser criador, inteligente e único, portanto indissociável da necessidade de ser representado para a “posteridade”, para a permanência mesmo depois (ou especialmente depois), de ter partido. No Antigo Regime o retrato de corte, mais propriamente o retrato real, tende a representar uma entidade mais próxima de Deus do que dos seres humanos seus semelhantes. As revoluções liberais trarão consigo uma nova realidade e também uma nova clientela; o poder, económico e político, mudando de mãos, passa a pertencer a uma burguesia, mais ou menos culta, mas sem dúvida, na maioria dos casos (e muito especialmente em Portugal), bem menos exigente que a clientela anterior. De acordo com a definição mais comum e imediata, o retrato é a representação de alguém, considerado por si próprio. No entanto e parafraseando Jean-Luc Nancy, “Cette définition est aussi correcte qu’elle est simple. Cependant, elle est loin d’être suffisante.” 43 Na verdade, um complexo conjunto de intenções, envolve a “construção” do retrato; ele é testemunho de existência, símbolo de poder, recordação de afectos, permanência e perenidade do ”eu” finito, fixação ou paralisação de um momento, uma fase ou época, etc. “Un tableau s’organise autour d’une figure en tant que celle-ci est proprement en elle.même la fin de la representation…”44 Em todas as épocas históricas o homem procurou essa “infinitude” que o retrato possibilita (ou parece possibilitar) e, ao longo dos tempos a representação do “eu” e do “ele”, recorrendo a diversos meios (o retrato pintado ou esculpido), foi evoluindo, condicionado por modas e pelos estatutos socioculturais de pintor e “pintado” mas também acompanhando outros movimentos, intelectuais, literários e políticos, que marcariam este tipo específico de representação. Veja-se no entanto, que a memória desse eu/ele representado termina, quando esse mesmo objecto deixa de ter valor, e o ter valor, passa por ser reconhecido pelos que o rodeiam e portanto ter significado. Mas e se apesar disso o objecto “retrato” continua a ter existência física, o seu “valor extrínseco”, entretanto, deixa de existir. O objecto de arte que até aí era admirado (ou não) mais pelo “que representava”, pelo conjunto de “acessórios” emocionais, afectivos, políticos, 43 44

NANCY, Jean-Luc - Le Regard du Portrait. Paris: Éditions Galilée, 2000, p.11. NANCY, Jean-Luc - Le Regard…, op. cit., p. 14.

Ana Paula Nunes

17

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

reverenciais, etc., a que estava ligado, passa a ser avaliado e apreciado pelo “como representa”, pelo objecto de arte em si mesmo, ou então, como acontece mais frequentemente é simplesmente esquecido. Tal é, precisamente, o caso que estamos a analisar, quer o do próprio artista, quer de alguns daqueles que pintou. Daqui decorre a próxima etapa do nosso trabalho. Oeirense, ao que parece pelos anúncios que publica, apesar de já exercer a actividade de pintor retratista anteriormente, deverá ter ganho grande projecção com o lançamento da colecção das gravuras dos heróis de 1820 criando vasta clientela (supomos), com especial predominância de pessoas vindas da classe média alta da sociedade portuguesa e que, à época tinham lugares de destaque na sociedade, economia e política do país. Foi, aliás, esse tipo de clientela que resultou do (pequeno) levantamento que fizemos do conjunto de pinturas que conseguimos identificar e/ou localizar. Para tentar demonstrar esta afirmação, passemos à sua análise. Analisaremos não apenas as pinturas que vimos in loco mas também aquelas de que lemos referências e das quais faremos apenas um breve resumo daquilo que conseguimos reunir quanto à informação. Como um dos objectivos deste estudo é a identificação de uma “clientela-tipo” que suportava a existência e sobrevivência económica de Oeirense, bem como, com toda a probabilidade, viabilizava o seu acesso a determinados cargos (directa ou indirectamente), julgamos importante fazer esta análise, a análise de quem é o representado. Para tal, seguiremos a ordem do quadro abaixo, organizado cronologicamente. ÓLEOS DE OEIRENSE Data 1827 1833 1834 (?) Anterior a 1836 Anterior a 1836 1837 Anterior a 1839 1845 1846 (?) 1851 1856

Identificação do Representado D. Maria II Luís da Silva Mouzinho de Albuquerque Marechal Saldanha Duque da Terceira Marquês de Loulé Diogo Carlos Duff António Pedro Cardoso Manuel de Cerqueira Vilaça Bacelar Manuel da Silva Passos (Passos Manuel) Francisco Manuel Álvares Botelho D. Pedro V

D. Maria II (04-01-1819 a 15-11-1853)

Rainha de Portugal desde que seu pai, D. Pedro IV abdicou do trono em seu favor. Sua mãe D. Maria Leopoldina de Áustria fora a primeira consorte do rei.

Ana Paula Nunes

18

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

Maria II nasceu no Rio de Janeiro em 4 de Abril de 1819 e faleceu em Lisboa a 15 de Novembro de 1853. Casou primeiro em 1835 com o Príncipe Augusto de Leuchtenberg e depois, por sua morte com o Príncipe Fernando de Saxe CoburgoGota, no mesmo ano. Anteriormente tinha estado prometida ao tio D. Miguel. Foi um dos soberanos portugueses mais representados ao longo do seu reinado o que proporciona a existência de imagens, umas mais fiéis que outras, representando várias fases da sua vida, desde a juventude até aos últimos dias, possibilitando uma visão da evolução do seu aspecto físico. É também uma oportunidade de ver a interpretação que dela fizeram, dezenas de artistas, portugueses e estrangeiros, entre os quais se conta Oeirense.

Fig. 3 D. MARIA II RAINHA DE PORTUGAL. Gravura água-forte e ponteado. Silva Oeirense, atribuído. DIM. – 154x130.

Não nos sendo possível observar este quadro da Rainha D. Maria II por não o conseguirmos localizar, pese embora as diversas tentativas que desenvolvemos, tentaremos apesar disso, contribuir para alguns esclarecimentos. A actual leiloeira Nascimento será a “herdeira” da antiga casa liquidadora “do Sr. Nascimento, na Rua do Alecrim, em Lisboa”45, a quem terá pertencido o quadro a que agora nos reportamos. Segundo testemunhos avalizados de estudiosos deste tema, existe uma gravura, não assinada nem datada, em tudo semelhante ao quadro, esse sim, assinado e datado46 e observado pelo proprietário da referida obra gráfica. Analisando a estampa (fig. ao lado47), a rainha ainda criança, representada emoldurada por uma cercadura oval, apresenta-se com um diadema sobre um penteado de caracóis tendo ao pescoço um colar com um medalhão pendurado, representando a Rainha sua mãe. 48 No entanto, acedendo à descrição do quadro encontramos a identificação das seguintes características; óleo sobre tela, representando a rainha quase de frente, mas ligeiramente 45

LIMA, Henrique de Campos Ferreira – Silva Oeirense…, op. cit., p. 6. Visitada pelo Coronel Ferreira Lima, por volta dos anos 40 do século passado, onde se deslocou para ver a pintura, a convite do seu proprietário. 46 SOARES, Ernesto; e LIMA, Henrique de Campos Ferreira - Dicionário de Iconografia Portuguesa (Retratos de Portugueses e de Estrangeiros em relações com Portugal), II vol. Lisboa: Instituto de Alta Cultura, 19471960, p.339. 47 Portugal. Biblioteca Nacional – Biblioteca Nacional Digital [Em linha]. Lisboa: BN, 2002. [Consulta em 07 Set. 2009]. Disponível em www: http://purl.pt/5303 48 Vd. Anexo III-A, fig.I.

Ana Paula Nunes

19

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

deslocada para a direita. A sua imagem é a de uma pessoa muito jovem, quase criança, ricamente vestida e adornada com várias jóias. Dois colares, um mais curto, junto ao pescoço, de duas fiadas de pérolas e outro de pedrarias (de tamanho considerável), do qual está pendente um medalhão-retrato, representando sua mãe. Tem ao peito, a grã-cruz e comendas. O braço direito dobrado, tem três pulseiras também de dimensão razoável e termina na mão que segura um leque. Um elaborado diadema coroa-lhe a cabeça. A tela apresentava ainda a seguinte inscrição; F. A. S. Oeirense – 182749. Não tendo visto o original a óleo (datado), torna-se-nos impossível responder a um pequeno problema; se Oeirense tiver pintado este quadro “do natural”, como aconteceu com a maioria dos restantes que fez e, se D. Maria foi enviada para a Europa em Julho de 1828, para defender os seus direitos ao trono, tendo ficado a residir em Londres, e a partir de 1831 em França e só em 24 de Setembro de 1834, com o fim da Guerra Civil e a posterior morte do pai, tendo quinze anos de idade, assumiu o governo do País50, e se a datação do quadro é de 1827, como terá Oeirense representado o modelo? Ter-se-á deslocado, viajado ao encontro da representada ou terá pintado a partir de outra imagem. Sem a observação directa do quadro e a atenta comparação com a gravura, responder a estas questões será mais do campo da especulação do que da análise e estudo. Fica, no entanto, a referência para um possível aprofundamento futuro. Para além destes testemunhos apresentados, a única alusão que possuímos, relativamente a uma pintura de Oeirense, representando a rainha (que poderá ou não ser esta imagem de que falamos) é, uma vez mais, a que se refere à visita do pintor Oeirense ao viajante alemão Heeringen: “Da sua pasta tira vários retratos, um dos quais da rainha, que Heeringen admite ter alguma qualidade particularmente no que respeita à pintura do vestido de cetim, bem como à fita e ao símbolo que o adornam. Infelizmente, as faces da soberana são de um vermelho vivo mais próprio dos efeitos do vinho do que do tom rosado de uma jovem de 16 anos.” 51 Uma vez mais, da leitura do texto original resulta, nas notas pessoais da autora citada, alguns elementos de caracterização um pouco mais pormenorizados.52

49

SOARES, Ernesto - Dicionário de Iconografia… op. cit., vol. V (Sup. II), p. 390. O Coronel Ferreira Lima termina a descrição da seguinte forma: “Pertenceu ao antiquário S. Nascimento e foi por mim identificado por uma gravura que possuo”. 50 BONIFÁCIO, Maria de Fátima - D. Maria II. Mem Martins: Círculo de Leitores, 2005. - (Reis de Portugal; 30), 265-270. 51 KULMACZ, Maria Clara Loureiro Borges Paulino - Arte e património em Portugal …, ibidem. 52 Apud KULMACZ, Professora Doutora Maria Clara, (notas pessoais cedidas pela) - HEERINGEN, Gustav Adolf von, (1799-1851) – Meine Reise nach …, op. cit., 2 vol., pp. 57-58. “O autor comenta que este era o único que poderia julgar no que respeita à semelhança. O retrato está bem feito mas o colorido é de má qualidade pois, em vez do vermelho delicado da face da Rainha, vê-se um vermelho sangue que mais faz lembrar os efeitos

Ana Paula Nunes

20

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

Se parece haver alguma concordância, ou antes, confluência de opiniões entre esta observação e a que anteriormente reproduzimos, quanto à qualidade da pintura do vestido e adornos, já o mesmo não se passa relativamente à questão do rosado das faces. Será que este viajante norte europeu, habituado à tez branca, confundiu as cores tropicais da pequena rainha (não esqueçamos que por muito resguardada que fosse, a princesa era nascida e criada no Brasil), com as cores dos efeitos etílicos? Tratar-se-ia do mesmo quadro ou de outro? Uma vez mais faltam-nos respostas e sobejam-nos as perguntas.

Luís da Silva Mouzinho de Albuquerque (16-06-1792 a 27-12-1846)

Luís Mouzinho, representa uma das figuras da História portuguesa, mais ricas e importantes e cuja acção, a vários níveis, seria digna de ser lembrada, pela sua abrangência de conhecimentos e pelos cargos e funções que desempenhou, sempre com elevado grau de dedicação, competência e envolvimento pessoal. Foi poeta e tradutor da Andrómaca de Racine e dirigiu um periódico científico em Paris. Dedicou-se ao coleccionismo de minerais interessando-se também pelas áreas da Entomologia e da Química. Foi agricultor no Fundão, actividade de que viveu durante bastante tempo e com que sustentou a família. Frequentou a Academia da Marinha. Enquanto esteve em Paris realizou diversos cursos ligados à Química, tendo construído algo semelhante a uma tábua sinóptica de reacções. Foi Provedor Real da Casa da Moeda. Fez parte do exército que defendeu a Carta Constitucional. Mais tarde D. Pedro nomeia-o governador da Madeira. Daí para a frente desempenha diversos cargos políticos, diplomáticos e outros ligados às obras públicas. Relacionadas com esta última actividade, escreverá duas obras; Guia do Engenheiro na Construção de Pontes de Pedra (1844) e Memória Inédita sobre Edifício Monumental da Batalha (1857), esta, só publicada postumamente, na qual descreve a sua intervenção na reconstrução e conservação deste edifício histórico. Ainda no cargo das obras públicas, encontrámos, no Arquivo da FBAUP, uma Circular do Governo, datado de 9 de Maio de 1840, informando que a este “… Conselheiro Luiz da Silva Mosinho de Albuquerque encarregado, por Decreto de 7 de Março ultimo, da Inspecção Geral das Obras Publicas do Reino (…) d’ora em diante todos os Requerimentos, Requisições, Mappas, Orçamentos, e quaesquer outros objectos relativos a obras publicas, que até agora erão remettidos do vinho do que o rosado de uma Rainha de 16 anos. Já o vestido de cetim e a banda e placa da Ordem, bem como todo o traje, estão muito bem executados. “

Ana Paula Nunes

21

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

directamente a este Ministerio (…), sejão dirigidos ao referido Conselheiro Inspector Geral das Obras Publicas do Reino …”53. A sua ligação às Belas Artes é porém mais directa, uma vez que, é comummente considerado como o introdutor da litografia em Portugal (ao que se julga inventada por volta de 1795 por Senefelder), sobre a qual escreve em 1822 um artigo, onde descreve este processo que conhece em Paris. Refere ainda o envio que fez, de Paris de uma prensa litográfica e respectivos acessórios, que terá mandado a Domingos António Sequeira, por que “… este habil artista e cidadão benemerito deixara ver a aquelles que nisso poderem ter interesse…”54 Participa na “revolta dos Marechais” na tentativa de restaurar a Carta Constitucional mas em razão do seu insucesso vai para Paris. Quando regressa ocupa durante quinze dias as pastas do Reino e da Justiça que abandona por graves divergências com o Governo. Participará ainda na Câmara dos Deputados mas vai lentamente tornando essa participação menos activa. Após a Revolta da Maria da Fonte assume o governo civil desse distrito. Com o golpe que destitui o ministério do Duque de Palmela, participa na Guerra da Patuleia, à frente do exército do Conde das Antas, acção que lhe irá custar a vida. “É muito difícil encontrar explicações totalmente satisfatórias para o esquecimento de que a sua vida parece ter sido vítima.”55 A este propósito lembramos uma das poucas e singelas, homenagens póstumas que lhe foi dedicada, em que esta questão do esquecimento já era aflorado por Almeida Araújo na “Illustração Popular” de 1866.56 Este quadro que localizámos numa colecção particular, em Lisboa tendo, o seu actual proprietário e descendente do retratado, contribuído com alguns elementos que completaram os que já havíamos recolhido na monografia sobre Luís de Albuquerque57, realizada em parte com recurso aos arquivos privados da família. Neste livro, encontrámos a certa altura, a informação dada pelo irmão de Luís (João Mouzinho de Albuquerque), de que o quadro foi pintado em vida do retratado, com a idade de

53

Vd. Anexo I, AFBAUP, Doc. Nº 88. [Oficinas litográficas de Vilanova, Francisco Rodrigues de Faria, José Lourenço de Sousa e outras, trabalhando no Porto entre 1835 e 1849]: cf. CABRAL, Luís; MEIRELES, Maria Adelaide; e COSTA, Jorge - Joaquim Cardoso Vitória Vilanova. Litógrafo Portuense do Séc. XIX. Porto: Biblioteca Pública Municipal do, 1996, 12. 55 PINHEIRO, Magda - Luis Mousinho de Albuquerque. Um Intelectual na Revolução. Lisboa, Fundação Maria Manuela e Vasco de Albuquerque D'Orey, Quetzal Editores, 1992, pp. 8-9. Importante ver a referência da autora à descrição do tecto de Columbano no Museu Militar (na edição de 1913 do catálogo), em que se observa que esta importante figura do liberalismo, das artes e das ciências é completamente esquecida, assim como o é noutras obras de referência no campo da História e da Literatura. 56 Vd. Anexo II-B, Doc. 2. "Ilustração Popular" (nº 33), Lisboa, 1866. Na 1ª página parte é dedicada à memória de Luís Mouzinho. Portugal. Biblioteca Nacional – Biblioteca Nacional Digital [Em linha]. Lisboa: BN, 2002. [Consulta em 07 Set. 2009]. Disponível em www: http://purl.pt/5993/1/ 57 PINHEIRO, Magda - Luis Mousinho de Albuquerque… op. cit., p. 203. 54

Ana Paula Nunes

22

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

41 anos e trajando à civil, “na ocasião da chegada a Lisboa da expedição ao Algarve em 1833” e acrescenta que “o artista Oeirense lhe tirou ao natural.” Na altura em que é feito o quadro, estamos em presença de um Oeirense ainda bastante jovem (teria cerca de 36 anos) e talvez por isso, o retrato de Luís de Albuquerque apresenta uma força e intensidade, de representação, em especial do olhar, e da postura do modelo que imprime uma ideia de determinação e nos consegue transmitir um pouco do carácter recto e probo de Luís de Albuquerque. Julgamos que esta nossa opinião não é despicienda e acaba por ser partilhada por outro cotado crítico e especialista58. Com esta pintura, apesar de continuar a ser artisticamente pouco “cotado”, Oeirense consegue demonstrar aos mais reticentes uma “sensibilidade” que lhe possibilitou reter, com bastante sucesso, o carácter e a “simplicidade civilista” do retratado, em conjugação com a energia e iniciativa que marcaram a sua vida, sempre iluminada por uma brilhante inteligência. Apesar de usar de recursos simples que poderiam funcionar em desfavor da obra final, o artista consegue colocá-los ao serviço de um “produto” bem sucedido e que reflecte a personalidade da personagem59. O tempo que decorreu entre os visionamentos deste quadro e o trabalho final, tivemos oportunidade de ir “afinando” o olhar e amadurecendo as “conclusões” A personagem fitanos, não com ar de superioridade ou exibição de poder, mas antes com uma determinação afável e “sorridente”, simpática mesmo, de alguém seguro de si e das suas opções, por estar

Fig. 4

Fig. 5

Luís da S. Mouzinho de Albuquerque (gravura).

Luís da S. Mouzinho de Albuquerque (pintura).

58 59

CARVALHO, José Alberto Seabra - O Retrato ao Serviço da História [ca.8 ]… op. cit. CARVALHO, José Alberto Seabra - O Retrato … ibidem.

Ana Paula Nunes

23

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

verdadeiramente convicto delas. Apesar das imperfeições que apresentava, quando observado mais de perto, fruto de intervenções de restauro pouco cuidadosas e mesmo invasivas, feitas na pintura, o efeito de conjunto continuava a ser claramente positivo. Entretanto, soubemos também que este quadro feito para oferecer a D. Ana (esposa do retratado), teria ficado na posse da família, mas que a partir de dada altura, deixaria de haver noção de ter sequer existido. Efectivamente, a família considerava haver poucas representações de tão ilustre personagem à excepção de uma gravura,60 porventura a sua imagem mais divulgada, que o representa, sensivelmente com a mesma idade da que teria na pintura, mas em traje militar. Desta imagem, lembrava-se o nosso anfitrião de sempre ter existido uma, a cores, em casa dos seus pais. Foi aliás, a partir desta gravura que ele, quando contava apenas quinze anos, descobriu o quadro,

61

quando com um amigo, casualmente,

deambulava pelos antiquários de Lisboa, procurando alguma curiosidade para comprar com o dinheiro de uma prenda de aniversário. Encontrando este quadro a óleo, em muito mau estado, sujo e com alguns rasgos na tela mas reconhecendo a figura nele retratada (pois desde pequeno lhe fora dito que aquele – o da litografia - era o seu trisavô), imediatamente procurou fazer negócio, que conseguiu, levando depois o quadro à aprovação paternal que o envia para restaurar. Este restauro, que não deverá ter sido o único a que o quadro foi sujeito, contribuiu, em nossa opinião, para uma diminuição considerável da qualidade da pintura. Por outro lado, com esta mesma limpeza e conservação, alguns aspectos positivos houve. Terá sido possível perceber que alguns elementos que hoje nele figuram, não são originais, facto que se pode constatar com relativa facilidade, quer no original quer também pela observação das imagens fotográficas. Tal é o caso das condecorações, cujas pinceladas são claramente feitas por “outras mãos”, por certo pouco qualificadas (em vista da fraca qualidade técnica). Se observadas em pormenor, as condecorações têm um tratamento muito rudimentar assemelhando-se a esboços mal definidos, em contraste com outras partes da pintura como o tratamento dado ao rosto e, em parte, ao cenário de fundo. Segundo o actual proprietário, estes elementos já estavam representados na pintura, aquando da sua compra, portanto foram resultado de pelo menos, outra intervenção anterior.

60

SERRANO, F. A., fl. 1857-1869 - Retrato incluído na "Ilustração Popular" (nº 33), Lisboa, 1866. Portugal. Biblioteca Nacional – Biblioteca Nacional Digital [Em linha]. Lisboa: BN, 2002. [Consulta em 07 Set. 2009]. Disponível em www: http://purl.pt/5993/1/ 61 Luís da Silva Mouzinho de Albuquerque - Pintura a óleo sobre tela de F. A. Silva Oeirense. Foto da autora.

Ana Paula Nunes

24

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

Além disto, quem encomendou o trabalho ou quem o executou, estaria pouco habilitado a fazê-lo, ou conheceria mal o assunto, uma vez que as insígnias representadas não são as que Luís Mouzinho possuía. Luís de Albuquerque era cavaleiro da Ordem de São João de Jerusalém, tinha a grã-cruz da Ordem de Nossa Senhora da Conceição e era comendador da Ordem da Torre e Espada.62 Efectivamente, observando atentamente estes dois elementos que foram acrescentados ao original, reparamos no erro, pois trata-se provavelmente e em nosso entender, de uma tentativa (de muito fraca qualidade) de representação da ordem Militar de S. Tiago da Espada e da Ordem Militar de Cristo.63 Outro aspecto que se destaca no quadro é o tratamento dado às mãos e ao cenário de fundo composto por uma espessa cortina que apenas deixa entrever, uma pequena embarcação, vogando em mar de calmaria e um sextante, pousado sobre uma mesa.64 Relativamente às mãos enluvadas, embora saibamos que, de uma forma geral Oeirense evita tratar as mãos dos seus modelos, ou escondendo-as por detrás do corpo do retratado ou de algum objecto, e que quando as trata é bastante “sintético” e linear, usando pinceladas largas e trabalhando pouco as formas e os volumes, reparamos que neste caso esta situação é extremamente acentuada facto que se deve, em grande parte, à intervenção (ou intervenções) de restauro, as quais se limitaram a cobrir, uniformemente as superfícies em causa, com a mesma cor.65 Mesmo podendo tratar-se de “falta de jeito crónica” da sua parte, para representar estas partes do corpo (ao que julgamos saber, pés, mãos e membros superiores e inferiores, são das partes mais difíceis de desenhar), obrigando-o a usar recursos e alguns expedientes mais ou menos engenhosos, para contornar o problema, achamos muito exagerada a diferença de qualidade entre o trabalho e atenção dados, por exemplo, à cara e a que é concedida a este último pormenor, até porque, como veremos um pouco mais adiante é capaz de melhor, mesmo nesta área. Quanto à cortina, a situação será semelhante, adicionando o facto de que a tinta espessa e muito escura dada, por certo, com o restauro, eventualmente para esconder outras imperfeições de conservação da pintura, confere um aspecto demasiado uniforme e bidimensional a este objecto. Os elementos de “iconografia” marítima que tentam relacionar a personagem ao mar e à sua actividade militar nesta arma, são de alguma forma muito “naïf” mesmo para um pintor considerado pouco talentoso como Oeirense, especialmente quando 62

Vd. Anexo II-A, figs. 5 e 7. Vd. Anexo II-A, fig. 6. 64 Vd. Anexo II-A, fig. 10. 65 Vd. Anexo II-A, figs. 9 e 11. 63

Ana Paula Nunes

25

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

comparados, uma vez mais, com o cuidado com que trata a expressão de alguma profundidade psicológica de Luís Mouzinho. Talvez Oeirense tivesse bastante trabalho e como pintor de “encomendas” que era, facilitasse quanto ao tratamento destes pormenores, como forma de não “perder muito tempo”, em todo o caso, vendo o quadro ao natural notam-se qualidades que não são compatíveis com certos “defeitos” observados, nesta como noutras pinturas. Finalmente, a assinatura.66 O pintor, assina o quadro, no lado inferior esquerdo (com o observador de frente), em letras bem visíveis; Sª Oeirensi Pin(…).67 O pintor costumava colocar a data, senão na frente, pelo menos na parte traseira da tela mas não nos foi possível observar o quadro pela parte detrás, pelas condicionantes próprias da situação. Contudo, o seu proprietário afirmou que a tela não será a original, uma vez que na altura da sua aquisição, uma das intervenções de restauro foi o reentelamento facto que nos impossibilita de saber se teria alguma inscrição ou outro elemento de interesse para este estudo.

Marechal Saldanha (1790 a 1876) João Carlos Gregório Domingos Vicente Francisco Saldanha de Oliveira e Daun – Marechal-general, foi conselheiro e ministro e também o primeiro Conde, primeiro Marquês e primeiro Duque de Saldanha. Reagindo às invasões francesas de 1807, alista-se em1808, num grupo de conspiradores contra a ocupação estrangeira e, foi no contexto da Guerra Peninsular, que se afirmou e ganhou prestígio militar, regressando a Portugal investido do posto de tenente-coronel. Segue para o Brasil em 27 de Junho de 1815, como adido do Estado-Maior do Exército que viria a tomar Montevideu, em que dá prova do seu valor sendo promovido ao posto de general, com apenas 27 anos. A partir daqui ocupa diversos cargos de responsabilidade militar e chega inclusivamente a estar preso. À morte do rei D. João VI, tudo faz para que a infanta regente, D. Isabel Maria, publique e jure a Carta Constitucional, conseguindo-o a 12 de Julho de 1826. Formado novo ministério em 1 de Agosto seguinte, assume a pasta dos Negócios da Guerra.

66 67

Vd. Anexo II-A, fig. 12. Vd. Anexo II-A, fig. 12.

Ana Paula Nunes

26

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

A partir daqui a sua actividade política e militar, é marcada por uma constante e permanente mudança participando em diversas revoltas e manobras golpistas mesmo



em

avançada

idade.

Possuía

várias

condecorações nacionais e estrangeiras. As referências que possuímos sobre este quadro são poucas e pouco esclarecedoras. Uma curta frase a propósito da gravura de Oeirense68 que aqui se reproduz, refere que “O original que serviu para esta litografia pertence ao A. H. M. Nele se lê: F. A. Silva Oeirense delineou do vivo no Cartaxo em Abril de 1834.”69 Fig. 6 Marechal Saldanha (gravura de Oeirense)

A outra alusão a este quadro é a de Heeringen, na visita que faz a Oeirense, retribuindo a que este lhe fizera

anteriormente. “No cavalete encontram-se várias das suas próprias criações … Os outros são retratos de D. Pedro e de uma dúzia de generais de uniformes com muitos dourados e muitas condecorações. Nalguns Heeringen reconhece imediatamente o Duque da Terceira, o Marechal Saldanha e o Marquês de Loulé com a sua bela barba.”70 Para além destas referências, apenas sabemos que o Arquivo Histórico Militar possui algumas telas representando este estadista, cujos autores ainda não foram identificados. Quem sabe, estará entre elas o quadro de Oeirense. Duque da Terceira (1792 – 1860)

António José de Sousa Manuel e Meneses Severino e Noronha, primeiro Marquês de Vila Flor e 4º Duque da Terceira. Par do Reino, Marechal, Diplomata e Ministro. Do seu quadro, nada mais sabemos para além da referência já citada anteriormente, sobre a visita de Heeringen a casa do nosso pintor que é a única informação que possuímos. Marquês de Loulé (1780 – 1824)

68

Vd. Anexo II-A, fig. 13. Portugal. Biblioteca Nacional – Biblioteca Nacional Digital [Em linha]. Lisboa: BN, 2002. [Consulta em 08 Set. 2009]. Disponível em www: http://purl.pt/5993/1/ 69 SOARES, Ernesto; e LIMA, Henrique de Campos Ferreira - Dicionário de Iconografia… op. cit.,vol. III, p. 256. As iniciais A.H.M. referem-se à colecção do Arquivo Histórico Militar. 70 KULMACZ, Maria Clara Loureiro Borges Paulino - Arte e património em Portugal …, ibidem.

Ana Paula Nunes

27

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

Tal como no caso anterior, também para Agostinho Domingos José de Mendonça Rolim de Moura Barreto, Marquês de Loulé em 1799, a única referência ao seu retrato a óleo é aquela feita por Heeringen. Esta personagem, foi coronel de cavalaria em 1807, tendo-lhe sido confiado por Junot o comando do regimento de cavalaria da Legião Portuguesa, participando assim, nas campanhas da Áustria e da Rússia. Fez parte da invasão de Massena sendo, por tal razão, condenado à morte (à revelia), em 1811. Perdoado em 1818 parte para a corte brasileira de D. João VI. Foi partidário do constitucionalismo e odiado pelos absolutistas. Morreu em circunstâncias pouco claras quando acompanhava o rei em Salvaterra de Magos.

Diogo Carlos Duff (1779 -

Este estrangeiro, pertencente à colónia inglesa que se estabeleceu em Lisboa era descendente de James Charles Duff, Earl of Fife, na Irlanda, e segundo a tradição familiar, com pergaminhos bastante antigos remontando ao séc. XV. Este fidalgo, de origem escocesa, nasceu em Inglaterra em 1779 e veio casar em Portugal. A propriedade, do Casal dos Sobreiros, que se encontra nos limites das freguesias de Ribafria e Aldeia Gavinha (Alenquer), pertencia em 1873 a Diogo Carlos Duff. Bastante estimado por D. João VI, foi condecorado com a comenda da Torre e Espada.

Grande

comerciante,

era

particularmente activo nas áreas do comércio com os territórios coloniais portugueses, em particular o negócio do tabaco com as ilhas adjacentes e Macau, do qual, em sociedade com outros comerciantes, possuía um contrato de exploração. Deste contrato e dos problemas por ele levantados em relação a uma suposta sublocação feita pelo Conde de Farrobo, existe uma extensa publicação, em livro.71 Deixou vastos bens, tendo o seu filho Fig. 7 Diogo Carlos Duff (segundo óleo por Silva Oeirense, 1837) 71

Refutação analytico-juridica do folheto intitulado Questão ácerca do agio do papel-moeda, que, em Novembro de 1842, foi publicado por parte de L. Silveira, M. J. Pimenta e Comp.ª : Lisboa : Typ. da Sociedade Propagadora dos Conhecimentos Uteis, 1843, p. 10.

Ana Paula Nunes

28

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

Diogo Champalimaud Duff, nascido em Lisboa em 1836, e herdado entre outros bens, a Quinta de Chocapalha na aldeia da Merceana, Abrigada.72 Sobre o seu quadro pintado por Oeirense, além da curta referência no, já largamente citado trabalho do Coronel Ferreira Lima, existe uma pequena e fraca reprodução da tela nas Memórias Autobiográficas de Lopes de Carvalho que não permite, de forma alguma fazer qualquer tipo de análise mas, datando a tela, de 1837. Aqui a deixamos apenas como referência visual. António Pedro Cardoso (1791 – 1839)

Acerca desta personagem pouco se conseguiu saber. Para além de ser médico-cirurgião e Lente da Escola Médica de Lisboa, escreveu o livro intitulado Do estado actual da cirurgia em Portugal, trabalho muito importante que foi publicado no Jornal das Ciências Médicas, para além de muitos outros artigos. A referência existente sobre este quadro é a de que o seu neto, o escritor Francisco Alves de Azevedo, entre 1947 e 1954, possuía “… um bom retrato a óleo assinado por F. A. Silva Oeirense.”73 As diversas tentativas que fizemos para localizar possíveis descendentes destas duas personalidades, existentes actualmente, foram totalmente infrutíferas. Apenas surgiu um nome aproximado, durante a procura, mas o seu contacto foi impossível.

Manuel de Cerqueira Vilaça Bacelar ( 04-03-1766 a 15-05-1860)

Esta é sem dúvida, uma das mais interessantes figuras deste grupo e, simultaneamente, em nosso entender, um dos retratos mais bem conseguidos de Oeirense. Praticamente incógnito, numa dessas reservas de museus de que falávamos no início, o quadro, repousava silenciosamente numa das salas do MNSR, no Porto. De tal modo estava sossegado que só a insistência fez com que o encontrássemos. Perante o quadro (a primeira pintura a óleo que víamos deste artista), Oeirense não pareceu tão mau pintor como até aquele momento achávamos e “ouvíramos” através das nossas leituras. A figura representada, robusta e de aspecto respeitável, possuía um olhar intenso, determinado e uma latente “vaidade”, ou antes, uma consciência de poder.74

72

CARVALHO, A. M. Lopes de - Memórias Autobiographicas, Lisboa, s.d. (1910), pp. 342 – 344. SOARES, Ernesto - Dicionário de Iconografia… op. cit.,vol. IV (Sup.), p. 88. 74 Vd. Anexo II-A, fig.14 73

Ana Paula Nunes

29

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

Para além da visível qualidade das tintas, e do acabamento do desenho, os próprios materiais de suporte tinham também uma aparente boa qualidade que se revelou verdadeira. No verso da tela, além do carimbo do seu fabricante (inglês), havia uma grande e bem desenhada inscrição do pintor, que nos esclarecia: “Manoel de Cerqueira Villaça Bacelar, nasseo a 4 de Março de 1766. Retra/ctado por F. A. Silva Oeirense, em 4 de Junho de 1845.”75 Manuel de Cerqueira Vilaça Bacelar. Este “ilustre desconhecido” parecia no início sêlo, não só para nós mas também para muitos livros, exposições e trabalhos sobre o Porto. No entanto, teria que ter “alguma” importância na época para se fazer assim representar. A ficha de catálogo do museu76 também não respondia ou acrescentava algo de mais relevante ao que víramos. Também as primeiras buscas bibliográficas foram inconsequentes. Encontrámos as primeiras pistas relevantes no Cemitério do Prado do Repouso. 77 Daqui recolhemos importantes informações no mausoléu dos três irmãos, conseguimos ler as três diferentes inscrições, respeitantes a cada um deles78. Assim foi que soubemos que o nosso retratado era um de três irmãos, e que todos eram ou tinham sido elementos do clero. O mais velho, Jerónimo Cerqueira Vilaça Bacelar (1761 a 1836), pertenceu à Ordem de S. Domingos e morreu com 75 anos de idade. O mais novo dos três, António de Cerqueira Vilaça Bacelar (1767 a 1844) fora Abade de N.ª Sr.ª dos Anjos de Goivães79 e faleceu com 77 anos. O nosso retratado, Manuel de Cerqueira Vilaça Bacelar (1766 a 1860) também foi Abade, Egresso da Ordem Trinitária e faleceu com a respeitável idade de 94 anos. Resumindo: Irmãos Cerqueira Vilaça Bacelar Nome

Jerónimo Manuel António

Data de Nascimento 28 – 06 – 1764 04 – 03 – 1766 02 – 11 – 1767

Data da morte 06 – 06 – 1836 15 – 05 – 1860 11 – 12 – 1844

Idade

Actividade

75 94 77

Ordem de S. Domingos Egresso da Ordem Trinitária Abade de N.ª Sr.ª dos Anjos de Goivães

Mas as informações não eram suficientes apesar de sabermos que o mausoléu fora mandado fazer por Manuel, por altura da morte do seu segundo irmão (António) 80, e 75

Vd. Anexo II-A, fig. 19 Vd. Anexo II-C, tabela 1. 77 QUEIROZ, José Francisco Ferreira - Os cemitérios do Porto e a Arte Funerária oitocentista em Portugal : consolidação da vivência romântica na perpetuação da memória. Dissertação de doutoramento em História da Arte, (sob a orientação de Agostinho Araújo), apresentada à Faculdade de Letras da Universidade do Porto.3 vol. Porto: [Edição do Autor], 2002, Vol. I, pp. 601-602 - “O monumento ao Abade de Vilaça, no antigo Cemitério de Santo Ildefonso.” 78 Vd. Anexo II-A, transcrição das inscrições e fotos do monumento. 79 BAPTISTA, João Maria; OLIVEIRA, João Justino Baptista de, (co-autor) - Chorographia moderna do Reino de Portugal. Vol. 1. Lisboa: Typographia da Academia Real das Sciencias, 1874, p. 726. Vd. Anexo II-B; Doc. 3, digitalização da p. 726, na qual se caracteriza o local onde se situava esta abadia. 80 Vd. Anexo II-A, fig. 17. 76

Ana Paula Nunes

30

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

mandandos para lá trasladar os restos mortais do mais velho (Jerónimo)81. Houve anúncio de inauguração publicado no jornal82. Na lápide dedicada a António, Manuel revela-se “Seu saudoso e agradecido Irmão”. Novas pesquisas aumentaram as informações, mostrando-nos esta figura sob várias perspectivas. Politicamente, Manuel Cerqueira Vilaça Bacelar e os seus dois irmãos foram exilados do país, durante “o tempo da Usurpação”83. Pensamos que parte da importância social e política que parecem ter tido, se relaciona mesmo, com este facto. Julgamos, que o acontecimento relatado sobre um empréstimo em dinheiro que terá sido pedido pelo rei, a vários empresários e capitalistas portugueses, adeptos da Carta, empréstimo esse ao qual poucos acabaram por corresponder espontaneamente, à excepção do “abbade de Goivães” e outro elemento presente identificado como Adrião Ribeiro Neves84. Este facto terá, sem dúvida, favorecido a imagem daquele clérigo. Na altura que descobrimos este texto, ainda sem identificar a sua origem, achámos que pelas datas (Julho de 1831) e pela referência ao facto da situação se passar fora de Portugal e aos restantes nomes de portugueses mencionados, poderíamos identificar este abbade como sendo António, irmão de Manuel Bacelar. Efectivamente confirmou-se a identificação, com o acesso à totalidade da obra. Num outro volume, existe a referência explícita ao seu nome85. São os textos que referem o juramento de reconhecimento e obediência, prestado em 29 de Agosto de 1830, pelos súbditos portugueses residentes em Londres à Regência estabelecida na Ilha Terceira86. O irmão mais velho, faleceu após o regresso ao país natal. Por morte do mais novo, António, em 1844, o irmão do meio, Manuel, herda considerável fortuna. É este irmão sobrevivente que nos interessa, por ser esse, o retratado que estamos a analisar. Se repararmos, Manuel Bacelar, é pintado por Oeirense, um ano apenas, após a morte de seu irmão e portanto, depois de se ter tornado herdeiro universal dos seus bens, “uma grande

81

Vd. Anexo II-A, fig. 16. Vd. Anexo I, Doc. Nº 167 - Periodico dos Pobres no Porto, Nº117, 19 de Maio1845, p.473 – EM “NOTICIAS LOCAES” 83 Vd. Anexo I, Doc. Nº 162 - Periódico dos Pobres no Porto, nº209, ano 1844, quinta-feira 12 de Dezembro p.447. 84 Documentos para a historia das Cortes Geraes da Nação Portugueza – Coordenação da Câmara dos Senhores Deputados. - Lisboa : Imp. Nacional, 1883-1891. - 8 v. Tomo VIII (anno de 1831), pp. 508-510. Vd. Anexo II-B, Docs. 4 e 5. 85 Documentos para a historia das Cortes Geraes … op. cit., Tomo VII (anno de 1830), pp. 509-511. Vd. Anexo II-B, Doc. 7. 86 Documentos para a historia das Cortes Geraes … op. cit., Tomo VII (anno de 1830), pp. 509-511. Vd. Anexo II-B, Doc. 6. 82

Ana Paula Nunes

31

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

fortuna”87, facto aliás, realçado também numa outra notícia da mesma altura, que depois de referir as principais disposições testamentárias, especula sobre o valor dessa herança que atingiria o montante de “… 200 contos de reis, entre propriedades, capitaes, etc.”88. A sua pose no quadro, demonstrativa de um claro “bem-estar” geral, está em parte explicada, assim como a qualidade dos materiais empregues, e os acessórios com que é representado. Relativamente a este último aspecto, parece-nos importante notar a “exibição” de um anel89, de tamanho considerável, duplo e com uma pedra (diamante?) de grandes dimensões. É também digno de nota o alfinete (ou abotoadeira?), que usa na camisa branca e engomada, constituído pelo que aparentam ser também, brilhantes. Um último adorno, um grosso cordão em ouro, realça sobre a alvura da camisa e o tom muito escuro do casaco90. Por outro lado, na mão esquerda segura um objecto que tivemos alguma dificuldade em identificar91. Provavelmente, pela forma como o segura mostrando-o ao observador, parece ser um elemento que pretende destacar e realçar deliberadamente, por isso e apesar de considerarmos que o seu tamanho é, de certa forma exagerado, pensamos poder tratar-se da representação das armas da família (os Bacelares), naquilo que poderá ser considerado um selo ou sinete. No entanto, os contornos dos elementos identificativos do seu brasão não são visíveis no desenho92. Abrimos aqui um parêntesis para nos concentrarmos por breves momentos na análise do tratamento das mãos nesta pintura de Oeirense. Longe de estarmos perante um “virtuoso” nesta matéria conseguimos no entanto e com alguma facilidade, ver que neste quadro, além de Oeirense não as tentar esconder, teve mesmo que as representar e uma delas, a que segura, chamemos-lhe o sinete, numa perspectiva bastante difícil e conseguiu-o, sem sair muito da qualidade que conferiu ao todo da obra. Salientaremos ainda que, esta pintura, apesar de ter sofrido intervenções de restauro, é a menos “mexida” e também a que se conserva em melhor estado. Voltando às reflexões que estávamos a desenvolver, diremos que estamos perante um homem de poder económico evidente e, como veremos mais adiante, também apreciador das artes e que se movimenta no meio das elites da cidade do Porto, mesmo entre a poderosa comunidade de comerciantes ingleses. 87

Vd. Anexo I, Doc. Nº 162, ibidem. Vd. Anexo I, Doc. 164, Periodico dos Pobres no Porto, Nº215, 19 de Dezembro de 1844, p.472 – em “Noticias Locaes” 89 Vd. Anexo II-A, fig. 22. 90 Vd. Anexo II-A, fig. 21. 91 Vd. Anexo II-A, fig. 23. 92 Vd. Anexo II-A, fig. 25. 88

Ana Paula Nunes

32

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

É assim que o vemos encomendar (directamente ou não), uma tela para suporte do seu retrato, a um dos grandes fornecedores ingleses, de materiais para as artes plásticas. O fabricante assinalado na parte posterior da tela com as letras T. BROWN 163 High Holborn LONDON93, tomou conta deste negócio a partir de 1805 ou 1806.94 O acesso ou apenas conhecimento, destes produtos de qualidade, para além do poder de compra que o dinheiro lhe possibilitava, poderá ser perfeitamente justificado pela sua permanência em Londres durante o exílio (embora as referências nos documentos que apresentámos, sejam ao irmão, eles terão estado todos juntos) e o consequente contacto com outras realidades e outras pessoas. Datará dessa altura, o estreitamento de laços com a comunidade inglesa (já existentes anteriormente ou não) e que continuou a cultivar no seu regresso. Aliás, vimos que também se encontravam em Londres, à época, alguns dos nomes mais conhecidos do Porto do séc. XIX. Esta particularidade parece confirmar-se, numa gravura da época (1834), desenhada pelo Barão de Forrester, representando a Rua Nova da Alfândega95, repleta de homens em trajes característicos da Alta Burguesia. Na legenda desta gravura encontramos, a dada altura, entre outros 42 nomes, predominantemente ingleses, e bem conhecidos na cidade, como é o caso de Allen, Clamouse, Forrester, o Coronel Owen, etc., a referência ao “Padre M. Vilaça”. Esta identificação terá sido da autoria de Charles Sellers, no seu livro “Oporto Old and New”.96 O nome de Manuel Cerqueira Vilaça Bacelar, aparece ainda ligado, a dois factos de carácter artístico e social de relevo. Um deles, é o da criação do Museu Allen, mais tarde Museu Portuense e actual Museu Soares dos Reis. Efectivamente, a propósito da morte do coleccionador João Allen e, da mais que eventual, dispersão dos objectos que compunham a sua colecção, é relatada a resolução de um conjunto de individualidades do “Pôrto do Romantismo” que se teriam unido para em conjunto levar uma representação à Câmara do Porto para a compra do chamado “Museu Allen”. Na reprodução do texto dessa

93

Vd. Anexo II-A, fig. 20. Thomas Brown ficou com esta empresa a William Legg e este, anteriormente a James Poole. A empresa toma então a designação de “Brown T., Colour and Primed Cloth Manufactory, 163, High Holborn, Successor to Mr Legg, late Poole”. Thomas Brown, também conhecido por Old Brown, morreu em 1840, deixando o negócio ao seu filho, também chamado Thomas Brown, e conhecido por Young Brown. Para além de se declararem os principais fornecedores da Royal Academy foram também os introdutores dos primeiros tubos metálicos flexíveis para cores. As telas com a marca deste fabricante são muito comuns em toda a Grã-Bretanha (e fora dela), e estão presentes nas obras dos principais pintores ingleses do séc, XIX, muitos deles parte da colecção da National Portrait Gallery, facto que indica a extensão do seu negócio. Inglaterra. National Portrait Gallery. [Em linha]. Londres: 2009. [Consulta em 15 Set. 2009]. Disponível em www: http://www.npg.org.uk/ 95 Vd. Anexo III-A, fig. nº 21. 96 Pôrto - ENCICLOPEDIA PELA IMAGEM: História. Porto: Livraria Lello, Lda., [19--?], p.27. 94

Ana Paula Nunes

33

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

representação, depois de se enunciar as razões da proposta e explicar o valor da colecção para a cidade do Porto, seguem-se as assinaturas dos referidos “ilustres”. Uma vez mais assiste-se ao desfilar de uma série de nomes sobejamente conhecidos, entre os quais, aparece, após “Joaquim Rodrigues Braga, Lente e Director da Academia Portuense de Belas-Artes e do Museu Portuense – Manuel Cerqueira Vilaça Bacelar …”97. Trata-se, do nosso retratado e portanto, de alguém bem relacionado, frequentando os meios culturais, as “elites portuenses”, com poder e influência e, acima de tudo, culturalmente activas. A outra situação de relevo é a dos chamados “cálices góticos do Porto” ou “cálices da Misericórdia”. Vilaça Bacelar, herdeiro rico dos seus irmãos (especialmente, segundo parece, do irmão mais novo), é homem de gostos refinados. Não pudemos saber se já anteriormente os cultivaria, provavelmente sim, atendendo até à sua origem aristocrática. Interessa-se pela arte, como já vimos na situação relatada anteriormente. Surge agora, ligado à posse dos referidos cálices98, autênticas preciosidades que adquirira num leilão dos bens de João Allen, em 1849 (após a morte deste), pela quantia de 240.000 reis (o maior) e 96.000 reis (o menor)99 uma aquisição realmente digna de nota e, feita também, poucos anos após ter recebido a herança do irmão. Estes cálices foram avaliados por João Baptista Ribeiro e Joaquim Cardoso Vitória Vila Nova, chamados como peritos avaliadores, respectivamente por 78.165 e 44.096 reis100 mas o autor desta afirmação, não clarifica quando foi feita essa avaliação, se antes ou depois de comprados por Bacelar, ou até, se na altura da doação. João Allen, por seu turno, adquirira-os à Abadessa do Mosteiro de Arouca, após 1834 (com a extinção das ordens religiosas), devido à necessidade que estas tiveram de obter rendimentos para prover ao seu sustento. Estes verdadeiros tesouros de ourivesaria foram mandados fazer por algumas ilustres habitantes daquele Mosteiro, entre as quais se conta D. Melicia de Mello.101 Os cálices, são hoje, propriedade da Misericórdia do Porto, deixados em testamento por morte de Manuel V. Bacelar; “Tres calix, o mais rico á misericordia, outro ao recolhimento

97

BASTO, Artur de Magalhães - O Porto do romantismo. Coimbra: Imprensa da Universidade, 1932, pp. 99102. 98 Vd. Anexo II-A, figs. 27 e 28. 99 PASSOS, Carlos - “Os Cálices Góticos do Porto”. Revista Lusíada. Porto. Nº 7, 1955, p. 186. 100 PASSOS, Carlos - “Os Cálices…”, ibidem. 101 VITORINO, Pedro – “Um cálice do século XVI”. Portucale; revista ilustrada de cultura literária, scientífica, e artística. Porto. Vols. 4-5, 1931, p. 273.

Ana Paula Nunes

34

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

das meninas do Postigo do Sol.”102 Registos destas doações encontram-se também referidos nos fundos arquivísticos da Santa Casa da Misericórdia.103 Manuel Cerqueira Vilaça Bacelar morre em 1860, deixando a sua fortuna a quatro sobrinhos (D. Luísa Vilaça Bacelar Garrett, D. Maria Augusta Vilaça Sousa Guedes, D. Marta Botelho Lacerda e Francisco Botelho Lacerda), deixando também alguns bens de menor relevo a diversas pessoas, entre empregados, pobres e testamenteiros.104 Não sabemos, se algum destes sobrinhos seus herdeiros está de algum modo relacionado familiarmente a um aluno cujo processo consultámos no Arquivo da FBAUP. No entanto a total coincidência de apelidos comuns aos do nosso retratado, levou-nos a achar importante fazer esta referência. Trata-se de Francisco de Cerqueira Villaça Bacellar que, em Setembro de 1849 requer licença à Academia para se matricular, como voluntário a Desenho. Acresce que, o pai do requerente, Doutor Joaquim Maria Botelho de Lacerda, aparenta também possuir alguma afinidade familiar com os acima referidos herdeiros.105 Anos mais tarde fruto das suas doações beneméritas à Santa Casa é homenageado, postumamente, através da encomenda pela Misericórdia, de um retrato seu, ao pintor José Vitorino Ribeiro, no qual é representado com uma idade já bastante avançada. 106 À época (1898), foi considerado, segundo a crítica, como um dos melhores trabalhos daquele artista.107 Pensamos que, por ambos estarem ligados à arte, e terem nela como ponto comum, o facto de ambos gostarem de objectos artísticos pois, para além de Oeirense trabalhar na área, também gostava de os possuir, era coleccionador, aspecto que teriam, aparentemente em comum, os poderá ter aproximado. Por outro lado, por Oeirense ser negociante e Bacelar ser potencialmente um comprador, tanto um como outro, num meio pequeno como o Porto, teriam grandes probabilidades de conviver fora dos meios profissionais, e eventualmente ganhar algumas afinidades e desenvolver uma possível amizade. Uma porta aberta para um contracto de realização de um “bom retrato”. Estamos convencidos de que a “qualidade” e o poder económico do encomendante deverão ter condicionado positivamente Oeirense na realização de uma obra mais cuidada e rigorosa do que o habitual. Também consideramos que, o próprio cliente terá feito exigências de qualidade, podia pagar, tinha conhecimentos, queria um retrato com determinadas características e de boa qualidade. Contrata um professor da Academia, Académico de Mérito, 102

Vd. Anexo I, Doc. Nº 176 - O Commercio do Porto Nº112 – Quarta-feira 16 de Maio 1860, p.2. Vd. Anexo I, Docs. Nºs 130 e 131. 104 O Commercio do Porto … ibidem. 105 Vd. Anexo I, Docs. 125 e 126. 106 Vd. Anexo II-A, figs. 29 e 30. 107 O tripeiro – Associação Comercial do Porto, Porto nº 8, Dezembro de 1948, V Série – Ano IV, p. 189. 103

Ana Paula Nunes

35

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

espera um bom trabalho. Oeirense esforça-se, aplica-se. Pensamos que não terá sido caso único, foi sim, aquele que chegou em melhores condições até nós.

Manuel da Silva Passos (Passos Manuel, 05-01-1801 a 16-01-1862 )

Figura marcante do período liberal, admirado por muitos, detestado por outros, advogado, formado em Coimbra, natural de Guifões (actualmente Concelho de Matosinhos), irmão de José, a quem se mantém sempre muito ligado. A revolução de 1820, apanha-os ainda em Coimbra a estudar. Passos Manuel, excelente aluno, recebe um prémio pecuniário pelos bons resultados e forma-se em 1822. Dirige com o irmão um jornal de ideias liberais (em Coimbra) que pouco dura em virtude do regresso do absolutismo em 1823. Advogado no Porto, toma parte em 1828 na insurreição de 16 de Maio que, mal sucedida, o obriga ao exílio na Inglaterra, Bélgica e França de onde começa a escrever contra o absolutismo e a favor da restituição do trono a D. Maria II. Em 1834 é eleito para as primeiras cortes de deputados, começando a fazer-se notar pelas suas brilhantes intervenções parlamentares (de tal forma que “converte” Garrett que muda de bancada passando a lutar pelos mesmos ideais108), defendendo como ideia-chave da sua acção de que, Um bom principio, vale mais do que um homem. Admirado pelos seus seguidores é tido como bom negociante, parlamentar de mérito, democrata de corpo e alma, defensor acérrimo dos seus ideais mas sempre cortês e educado. Com a sucessiva e crescente instabilidade governativa nascem as condições para a revolução de Setembro (1836). A rainha, perante as evidências é obrigada a aceitar o grupo que representa os futuros ministérios da ditadura, entre eles, Passos Manuel. Assumindo funções, o novo governo convoca imediatamente cortes constituintes e começa a criar importantes infra-estruturas ou reformar outras, através das iniciativas de Passos Manuel; o Conservatório das Artes e Ofícios, o Conservatório Portuense de Artes e Ofícios, as Academias de Belas Artes, o plano para a fundação e organização do Teatro Nacional de Lisboa (atribuído a Garrett), entre outras. A Belenzada faz terminar rapidamente os projectos deste governo, que mesmo reassumindo o poder, acaba por se demitir em 1837109.

108

GOMES, Joaquim Costa – Almeida Garrett no Parlamento. Boletim da Associação Cultural dos Amigos de Gaia, Nº 48. Vila Nova de Gaia: Associação Cultural Amigos de Gaia. Porto -- Imprensa Portuguesa, 1999, p.35. 109 [CORDEIRO, José M. Lopes, texto; FERREIRA, Virgílio, foto] - O rasgo e a vontade Associação Empresarial de Portugal - [Porto]: Exposição AEP, 2004, pp.33-34.

Ana Paula Nunes

36

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

Passos Manuel retira-se silenciosamente da política, voltando uma vez ou outra, a pedido de alguns amigos ou em circunstâncias particulares, mas irá dedicar-se quase completamente à agricultura. Não recebeu nem esperou ou aceitou, honrarias ou benefícios. O quadro de Oeirense que representa este estadista, pertencente ao MNSR,110 não está assinado mas é atribuído ao artista. Apresenta todas as características que marcam a sua técnica e, em particular o estilo que utilizava neste tipo de retrato de encomenda, o retrato de prestígio ou de função, o retrato a óleo ao serviço de uma demonstração de poder. A posição do corpo, o tipo de símbolos ou elementos que o rodeiam, o cenário ou fundo envolvente e a associação a algum acto ou função que desempenha, são técnicas recorrentes neste estilo e em Oeirense tem tipos bem identificados. Para a sua identificação terá também contribuído, sem dúvida, a gravura de Oeirense111

Fig. 8 Passos Manuel, gravura de Oeirense (pormenor).

Fig. 9 Pormenor do quadro representando Passos Manuel. Algumas características comuns.

representando o mesmo parlamentar. Apesar de não se tratar de uma cópia, há no entanto elementos e “traços característicos” que aproximam as duas imagens. Poderemos talvez contribuir com uma pequena informação que, embora inserida num texto que tinha como objectivo a destruição da imagem de diversas pessoas, mas em particular de Oeirense, não deixa de fazer uma ligação entre o pintor e a realização de um retrato de Passos Manuel: “D’entre esta miuçalha surgiu o sr. Francisco Antonio da Silva Oeirense. Este sr., despresado pelos homens de bem, e que se tem em conta de grande artista; mas que nada

110

Vd. Anexo II-C, Tabela 2 (cópia da existente nos registos do Museu). Vd. Anexo II-A, fig. 32. Portugal. Biblioteca Nacional – Biblioteca Nacional Digital [Em linha]. Lisboa: BN, 2002. [Consulta em 08 Set. 2009]. Disponível em www: purl.pt/6764/1/ 111

Ana Paula Nunes

37

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

sabe, como o atestam as suas obras, entre outras a caricatura que fez do ex-ministro das mulheres novas112. Este celeberrimo sujeito obteve do referido ministro retratado, carta branca para formar a nova academia: ..."113 Julgamos, no entanto, que esta alusão se refere à gravura, em virtude do ano da publicação do artigo e da gravura serem os mesmos, 1837. Neste quadro114, podemos dizer que acontece de certa forma, uma situação semelhante à que se verifica com o retrato de Luís Mouzinho. O pintor parece conseguir captar um pouco do carácter da pessoa e, neste caso, o representado tem uma atitude afável mas ao mesmo tempo, apresenta segurança, força de carácter, produz um sentimento de simpatia e empatia no observador. Além da atitude e semblante calmos mas determinados, esta figura aparece bem mas discretamente vestida, postura irrepreensível, algo rígida mas simultaneamente elegante. O resultado final inspira um sentimento agradável. Trata-se de um homem simples, pragmático, um homem de acção, sem artifícios, jóias ou acessórios demonstrativos de riqueza ou sequer de poder. Este é um homem que se apresenta perante nós em pleno desenvolvimento de seu trabalho, da sua acção como governante e/ou homem de leis, trabalho esse que apenas interrompe para nos olhar. Rodeado de “ícones”, as suas “alfaias”, os seus instrumentos de trabalho, relacionados com as suas funções de Estado, de Ministro, de legislador e também de advogado. Passos Manuel, representado sentado de lado e com o cotovelo apoiado numa secretária de tampo verde (normalmente carneira verde), sobre a qual repousa um papel em que escrevia, quando suspendeu a acção para olhar para nós, observadores. A pena que segura na mão direita, assim o indica, bem como o papel que está escrito quase até meio. Nele conseguimos ler o seguinte: 22 de Novembro de 1846___________________________________________ Decreto. Desejando dar á Muito. Nobre e SempreLe/al Cidade do Porto. um novo testemunho de/ quanto Me desvelo em promover Estabeleci/mentos de que possa resultar utilidade aos/ seus heroicos Habitantes: Hei por bem De/(cret)ar o seguinte: É creada na Cidade do Porto uma/ (…) 115

Este texto levanta, contudo, uma questão importante. Em 1846, Passos Manuel estava já, praticamente, afastado do exercício de cargos públicos. Na Primavera desse ano (1846), 112

“Ministro das mulheres novas” era uma das designações dada a Passos Manuel pelos seus opositores políticos, justificando-se que o próprio teria confessado no Parlamento ter uma “inclinação” por jovens mulheres. Vd. Anexo I, Doc. Nº 148, O EXAMINADOR, Lisboa - Nº 92, – 9 de Junho 1837- p. 371 e 372. EM “ACADEMIA D’ARTES”. 113 Vd. Anexo I, Doc. Nº 148, O EXAMINADOR,… op. cit. Sublinhados nossos. 114 Vd. AnexoII-A, fig. Nº 31. 115 Vd. AnexoII-A, figs. Nº 35 e 36.

Ana Paula Nunes

38

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

rebentara a revolta da Maria da Fonte e depois a guerra da Patuleia, colocando-se Passos Manuel, efectivamente, ao lado da Junta do Porto, ajudando no que fosse necessário, mas sem se envolver directamente no conflito e na política. Não sabemos até que ponto, poderá ter sido neste contexto que tenha tomado alguma decisão importante, à qual o quadro quisesse reportar-se. Apesar das dúvidas, em relação a esta data inscrita no texto, é a partir dela que propomos a datação do quadro, mesmo porque, aproxima-se da data de realização do anterior, Padre Bacelar, com o qual parece ter características comuns em termos de uma qualidade de execução semelhante, podendo revelar que o artista estaria no mesmo patamar de evolução e maturação da sua arte. Ainda relativamente ao texto, podemos aventar várias hipóteses; poderá ter sido apenas a utilização de um artifício artístico, exclusivamente ligado à necessidade de criar um envolvimento coerente, sem olhar ao rigor histórico. Apesar disso a situação que será talvez mais plausível é a de que o quadro, ao ter sido restaurado (pois apresenta marcas e sinais de intervenções), o texto tenha sido reescrito, sobre partes mais ou menos deterioradas, e que a pessoa (ou pessoas) que o fizeram tenham completado o texto, conforme aquilo que lhes parecia ali estar não olhando a outras questões de rigor.

Fig. 10 – Pormenor do início de texto pintado no quadro de Passos Manuel (invertido).

Finalmente, também neste caso, parece ter havido grande empenho da parte do artista, na realização de um bom trabalho que não deixasse desfavorecido ou descontente o retratado, até porque, embora não tenhamos provas concretas da existência de algum laço de amizade entre os dois, artista e modelo, temos no entanto, muitas referências a esse facto, nos periódicos, opositores à linha política do Ministro, que utilizam essa possível relação como razão para “favores” recebidos por Oeirense, neste período. No entanto, independentemente deste aspecto, há efectivamente um acabamento de qualidade equivalente à do quadro de Bacelar (e de Luis Mouzinho, nas poucas partes em que

Ana Paula Nunes

39

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

não sofreu tantas intervenções), mas, em particular realçam-se as mãos, que desta vez, parecem ter recebido uma maior atenção, por parte do artista.116

Francisco Manuel Álvares Botelho (1803 a 1875)

O penúltimo retratado que analisaremos é Francisco Manuel Álvares Botelho, que nasceu em Tavira e morreu em Lisboa. No início de 1840, este ex-professor do Colégio dos Nobres, na altura a trabalhar para o Tesouro e depois na Contadoria da Junta do Crédito Público idealiza a criação do Montepio uma instituição que é, de algum modo, precursora do sistema de segurança social actual. Para tal, redige um Plano, base de toda a sua obra, inspirado em opiniões de seus conhecidos e amigos e contando com o apoio de algumas das pessoas das suas relações que ocupavam uma boa posição social. Não desistindo do seu fito, apesar das dificuldades, incompreensão e até de algum ridículo por que passou, consegue, pela persistência e diplomacia com que actuou, convocar 270 pessoas (homens e mulheres) para em 19 de Março desse ano, estarem presentes na primeira reunião realizada na Academia de Belas Artes. 117 No entanto, destas só conta com a presença de 15 (!), de entre as quais escolherão os cinco que darão início e forma ao seu projecto filantrópico e humanitário, elaborando com Alvares Botelho os Estatutos. Entre estes cinco estão um Cónego da Sé Patriarcal (Pretextato de Pina e Melo), um Professor de Medicina e Director da Academia de Belas Artes de Lisboa (o nosso já conhecido André de Sousa Loureiro!), um Professor de Filosofia, escritor e reitor do primeiro liceu de Lisboa (António Maria do Couto) e entre os restantes dez, o pintor André Monteiro da Cruz e o pintor portuense Joaquim Rafael.118 Preocupados com o futuro dos seus familiares em caso de morte do chefe de família, situação que na época levava frequentemente à miséria, por vezes total, da mulher e filhos, era seu objectivo levar a cabo uma tarefa que, se bem que se afigurasse difícil, pudesse assegurar pensões e benefícios para filhos menores e viúvas. A 24 de Agosto de 1840 foi concedido por Carta Régia o alvará que permitiu o início do seu funcionamento. Muito para além da sua profissão, Francisco Manuel A. Botelho dedicará toda a sua vida, ao Montepio onde desempenhará os mais diversos cargos desde Director, até 116

Vd. AnexoII-A, figs. Nº 34. História breve dos primeiros 100 anos do Montepio Geral, Lisboa, 1940, s/pg., sn. autor. 118 MURTA, Guerreiro: Álvares Botelho e o Montepio Geral : discurso proferido na inauguração do mausoléu consagrado ao iniciador da secular instituição mutualista e de crédito. Lisboa: Montepio Geral, 1968, pp.8-9. 117

Ana Paula Nunes

40

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

contabilista, actividade que fazia graciosamente, de tal modo que lhe foi concedida uma gratificação de 6 mil reis, por decisão da Assembleia. Trabalhou sempre nesta instituição até à sua morte. 119 Este seu quadro que agora analisamos, é mais um caso de desconhecimento total por parte das gerações que se lhe seguiram, da identidade quer do pintor, quer da pessoa representada. De tal forma esse desconhecimento era total que, foi necessário, em reunião da Assembleia Geral, em 28 de Março de 1939, encarregar uma pessoa, recaindo a escolha sobre um dos seus elementos, o Dr. Guerreiro Murta, de proceder a investigações que pudessem esclarecer esta situação.120 Durante as investigações e vasculhando os registos e livros de actas lê, em acta da Assembleia Geral do Montepio, de 1 de Fevereiro de 1852, que havia sido lida uma carta do sócio Tito Augusto de Carvalho (um dos elementos que desde a fundação acompanhou Botelho e que, muitas vezes, ofereceu a sua casa para a realização das reuniões da Assembleia), carta essa na qual oferecia o retrato de Álvares Botelho, que mandara fazer de propósito, com a condição de que este só fosse entregue ao Montepio, após a morte da esposa do retratado. O retrato está datado de 1851. Esta carta é lida em 1852. Este documento oficial do Montepio, permite uma primeira identificação do quadro que é reforçada com uma outra identificação, feita por comparação com uma antiga fotografia existente em casa da segunda mulher do retratado que o representa, mais velho (com 68 anos), mas com os mesmos traços característicos, o olhar, o nariz, a cova do queixo e a tão característica barba. 121 Acresce que como a tela se encontra assinada e datada pelo pintor, fica assim, completamente esclarecido quem era o retratado, o pintor e ainda, a forma como o quadro chega à posse do Montepio. O quadro representa um homem na casa dos 40 anos, com aspecto austero, sério, segurando entre as mãos um livro de capa vermelha com as palavras “Estatutos do Montepio Geral”,122 pormenor “iconográfico”, relacionando o retratado com as funções desempenhadas e a paternidade do projecto, recurso muito característico na retratística de Oeirense. É sem

119

Catálogo da Exposição Comemorativa do primeiro centenário do Montepio Geral, inaugurada em 9 de Outubro de 1940. Lisboa: Montepio Geral, 1940, pp. 6-7. 120 O Montepio Geral e o seu iniciador : parecer duma proposta. Lisboa: Montepio Geral, 1939, pp. 3-4. Vd. Anexo I, Doc. 182. 121 O Montepio Geral e o seu… op. cit. pp.53-54. Vd. Anexo II-A, fig. 38. Estes traços marcantes também estão bem evidentes no retrato feito por Oeirense. Vd. Anexo II-A, figs. 37 e 38. 122 Vd. Anexo II-A, figs. 40 e 41.

Ana Paula Nunes

41

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

dúvida o retrato de um homem trabalhador, de responsabilidades, nada tem de leviano ou mundano. Se observarmos, é um homem que apesar de dirigido para nós, observadores, tem no entanto, o fundo do olhar perdido, num horizonte distante. Olha-nos mas não nos fita, como fazem os outros retratados, o seu olhar perde-se algures, nos seus pensamentos, provavelmente nas suas grandes responsabilidades, para com aqueles que dele, indirectamente, dependem, os beneficiários do Montepio. A tela apresenta-se de forma geral bastante deteriorada, embora, como soubemos, tenha sido restaurada, à data da sua identificação (por volta de 1939-40), de forma graciosa, pelo pintor e sócio do Montepio, António Saúde que o considerou uma “obra curiosa e de maior valia do que o retrato-desenho de 1876”123 Em nosso entender, e salvo opinião tecnicamente mais avalizada, as intervenções de restauro são demasiado “visíveis” no quadro, alterando contornos e “desfazendo” volumes. Caso evidente é o da orelha do modelo,124 na qual se nota claramente a diferença de pincelada; manchas corridas, lineares, sem jogo de luz/sombra, sem relevo nem contornos. O mesmo acontece com as mãos, em que o correr das próprias pinceladas é bem visível, sobre a pintura anterior. Finalmente, não esqueçamos também que, se o retrato de Luís Mouzinho era o de um Oeirense ainda bastante jovem representando outro também jovem adulto, este é já o quadro de um pintor que está também mais maduro, provavelmente mais introspectivo, quem sabe mais deprimido ou preocupado. Talvez também, o facto de sofrer de diabetes, lhe abalasse o espírito e condicionasse a acção. Independentemente de qualquer outra justificação dúvidas não há que é o retrato de um homem de responsabilidades, pintado por um homem maduro.

D. Pedro V (16-09-1837 a 11-11-1861)

O jovem rei D. Pedro V, jovem em tudo, até no fim, assume o trono com apenas 16 anos de idade mas já lhe eram reconhecidas capacidades extraordinárias de estadista e particularmente de homem preocupado com as questões e valores sociais. Estudou, viajou, preocupou-se com os problemas do esclavagismo particularmente nos territórios coloniais portugueses. 123

O Montepio Geral e o seu… op. cit. pp.56. Este retrato-desenho de que se fala é um outro quadro, feito a partir de uma fotografia, postumamente e que representa Álvaro Botelho já muito envelhecido e debilitado. 124 Vd. Anexo II-A, fig. 39.

Ana Paula Nunes

42

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

Teve uma completíssima preparação moral e intelectual e deverá ter sido muito influenciado por Alexandre Herculano, seu educador Morreu jovem, vítima da febre tifóide, aquele que foi cognominado, O Esperançoso ou O Bem-Amado, pois assim o via o povo, uma esperança de progresso para um velho e massacrado país. No Palácio da Ajuda, anteriormente ao incêndio de Setembro de 1974, que destruiu a Chamada Galeria de Pintura do rei D. Luis, composta por cerca de 500 obras, entre as quais, algumas dignas de nota, encontrava-se um retrato de D. Pedro V da autoria de Oeirense, representado fardado, a três quartos, condecorado com a banda das três ordens e um chapéu de plumas no braço esquerdo. A pintura estava assinada; F. A. S. Oeirense Pintou em 1856. Na parte da grade da tela tinha um papel colado com a inscrição: “Pertence a Sua Alteza o Sr. Infante D. Affonso”. Medidas: 1,03 x 0,77. Para além destas observações e do número de inventário anterior ao incêndio (nº 41 315), existe uma pequena referência indicando que era uma pintura de péssima qualidade. Aparentemente, não existe nenhum registo fotográfico do quadro.125 Uma vez mais, Heeringen, será os nossos olhos a nossa boca. Quando visitou Oeirense, este, “De seguida mostra-lhe o seu proprio cavalete, onde já estavam encostadas várias das suas pinturas […] Os outros quadros eram retratos de D. Pedro e de uma dúzia de generais de uniformes dourados e pujantes …”. Este D. Pedro, de que aqui se fala, não é o do quadro agora em análise, uma vez que à data da vinda a Portugal deste estrangeiro, D. Pedro teria acabado de nascer pouco tempo antes. Parece pois decorrer, da análise desta pequena recolha de telas de Oeirense, que o pintor é capaz de uma melhor qualidade geral do seu trabalho, quando, por alguma razão para além do cumprimento de uma encomenda, é “obrigado” a empenhar-se na execução do produto final. Um outro aspecto aparece evidente e claro, a clientela é de elevada posição social, ou em razão do cargo que desempenha, ou do poder económico e político que possui. Não vimos, até agora, retratos de indivíduos anónimos ou de senhoras, à excepção, claro está, da rainha que, pela sua própria condição deverá ser considerada num tipo específico de clientela. Como nota final, deveremos referir que Oeirense, aparentemente, fazia algumas incursões na pintura de paisagens, para além dos já conhecidos retratos. Pelo menos, é aquilo

125

CARVALHO, Ayres de - A Galeria de Pintura da Ajuda e as galerias do século XIX , Lisboa : [s.n.], 1982 ( Lisboa : -- Tip. Silvas), p.26.

Ana Paula Nunes

43

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

que diz Heeringen, quando observa o estúdio do pintor e este lhe diz que também faz paisagens. Entusiasmado, o alemão espera ver lindas vistas de Lisboa ou locais pitorescos. Desilusão, “… o pintor mostra-lhe uma simples gravura em cobre de um parque inglês, grande e bonita, e uma aguarela da sua autoria feita a partir da gravura, o que muito desilude Heeringen. Aliás, tudo o que o pintor tem para mostrar são parques ingleses, todos copiados de gravuras.”126

126

Apud KULMACZ, Professora Doutora Maria Clara, (notas pessoais gentilmente cedidas pela) HEERINGEN, Gustav Adolf von, (1799-1851) – Meine Reise nach Portugal im Fruehjare 1836. Leipzig: Brockaus, 1838. 2 vol., p. 57.

Ana Paula Nunes

44

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

3. O GRAVADOR E DESENHADOR "Nas revoluções há duas espécies de homens: os que as fazem e os que delas se aproveitam." Napoleão Bonaparte

Tivemos já oportunidade de ver que o início formativo de Oeirense foi feito na área específica da gravura, sob a orientação e ensino de Bartolozzi. Também já referimos que a época em que frequentou a aula deste professor, não terá sido uma das melhores que o Mestre atravessou. Diversos autores que têm estudado esta área da arte, consideram que o gravador italiano, terá tido, em Portugal o seu pior período no que respeita à qualidade da obra geral produzida127 mas da qual se destacam, pela superior qualidade, os desenhos, base para a produção da gravura. Recordemos que a gravura em Portugal, até à chegada deste italiano, tem uma história algo irregular e, de forma geral, sem reflexos de grande implantação ou popularidade no nosso país. Mesmo até no que concerne ao conhecimento dos métodos de gravar, que vão surgindo Europa fora, Portugal parece sempre atrasado vários anos relativamente à realidade europeia. Alguns nomes surgem, do meio do quase desértico anonimato dos sécs. XV, XVI e XVII. A (pouca) gravura portuguesa existente nestes anos é especialmente feita sobre madeira mas apresenta características bastante grosseiras e temas populares. Deverá ser destacado, no entanto, o nome de Jerónimo Dias que, no séc. XVI, faz gravura em chapa de metal. Só em finais do séc. XVII, a nossa gravura e começa a revelar uma maior qualidade de execução, de técnica e também de diversificação das temáticas, apesar de a maioria dos assuntos serem ainda os de carácter religioso, frontispícios de obras literárias ou brasões de armas128. Aumenta a quantidade de artistas nacionais e também vários estrangeiros que se estabelecem em Portugal.

127

Vd. JATTA, Barbara; coord. – Francesco…, pp. 14-16. e SOARES, Ernesto - História da Gravura… op.cit., vol I, p.112. 128 LIMA, Henrique de Campos Ferreira - O Dr. Xavier da Costa e a História das Belas-Artes Menores em Portugal, V. N. de Famalicão, 1943, p.8.

Ana Paula Nunes

45

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

O séc. XVIII com D. João V e a mecenática em relação às artes, trará artistas de diversas áreas para o nosso país mas, acima de todos, produzirá o nosso melhor gravador português desta época; Vieira Lusitano. No entanto, só com a criação da Aula de Gravura (24 de Dezembro de 1768), conjuntamente com a Impressão Régia e a Real Fábrica de Cartas de Jogar, com a finalidade de ter um especialista que ensinasse a arte de gravar em chapa metálica,129 se verificará algum incremento. Justificava-se esta criação, com a necessidade de que nada faltasse à impressão régia, em particular, uma arte como esta, de grande utilidade para variados fins. Nomeado como mestre desta aula, Joaquim Carneiro da Silva, deveria aceitar ensinar todos os que a quisessem aprender. Formou alguns nomes conceituados mas com a sua saída, em 1786, termina esta aula. O método usado era essencialmente o buril e água-forte. Até 1801, funciona a escola de gravura do Arco do Cego, continuando com o ensino do mesmo processo que já se tornava pouco satisfatório para as necessidades. No séc. XIX, D. João VI encarrega D. Rodrigo de Sousa Coutinho da reforma da Imprensa Régia, o qual contrata em Londres, o gravador Bartolozzi, que traz consigo a inovadora técnica do pointillé (pontilhado)130. A morte do italiano, passa a direcção do ensino para o seu ajudante, Gregório Assis e Queiroz que não deixa uma boa imagem do seu ensino. A litografia, cujo conhecimento em Portugal é atribuído à acção, já anteriormente abordada, de Luis Mouzinho, será objecto da criação de uma Oficina Régia Litográfica dirigida por João José Le Cocq. Agregada em 1836, à Academia Real de Belas-Artes (acabada de fundar) passará a ser uma aula de gravura dirigida por Comte e Domingos José da Silva que promoveram a formação de alguns artistas de relevo. Esta “aglutinação” das duas instituições, foi feita por proposta de Oeirense em sessão de Conferência de 28 de Novembro de 1836.131 Ainda sobre este assunto, o autor anteriormente consultado, afirma que todo o processo foi pouco curial e injusto para com o professor, não apresentando, contudo, as razões que o levam a afirmar tal facto.132 O problema terá sido resolvido por decisão da rainha, fazendo cessar as funções de Le Coq. Três dias depois é eleita uma comissão formada por

129

SOARES, Ernesto - Francisco Bartolozzi e os seus discípulos em Portugal, Gaia: Ed. Apolino, 1930, p.11. SOARES, Ernesto – Francisco… op. cit. pp. 12-15. É interessante notar o desconhecimento, ou antes, a omissão total de qualquer referência a Silva Oeirense, na listagem dos discípulos de Bartolozzi, apesar de ser citada como uma das fontes, a obra de Cirilo, onde, como vimos é referido o seu nome. 131 SOARES, Ernesto – “A Oficina Régia Litográfica: pequenas achegas para o estudo da História da Litografia em Portugal”, Arqueologia e História, vol. X. Lisboa: 1932, pp. 7-8. 132 Aliás, o próprio reconhece: “Não possuo elementos probatórios que me habilitem a indicar com precisão as razões que levaram a Academia a proceder deste modo que julgo injusto, mas o excessivo liberalismo tantas vezes patenteado nas actas académicas, (…) faz-me supor que não foi estranha a esse esbulho a política …” SOARES, Ernesto – “A Oficina Régia Litográfica… op. cit. pp. 7-12. 130

Ana Paula Nunes

46

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

Silva Oeirense, José Botelho e Joaquim Manuel da Silva. Datará sensivelmente desta altura, a portaria do Ministério do Reino, nomeando Oeirense, Fiscal da Oficina Litográfica Nacional, em 15 de Dezembro de 1836, à qual se faz referência em documento bastante posterior, que transcrevemos.133 Entretanto, em despacho da Secretaria de Estado dos Negócios do Reino, de 1 de Abril de 1837, a rainha concede a Le Cocq, a pedido do próprio, a exoneração do cargo de Director da Escola Normal de Lisboa.134 Apesar de aparentemente solucionadas as situações, os casos ligados a esta oficina, continuam. A 24 de Abril a Academia de Belas Artes de Lisboa, aparece a pedir à Oficina Litográfica, material daquela oficina para servir nas aulas de Gravura. Este curioso documento, refere especialmente, dois “magficos porculos q.e serviram na Aula de Gravura de Historia do Professor = Bartolozzi =; varios objectos e utensílios d’uma Estamparia; e as chapas de primorosas gravuras d’aquelle insigne artista que tudo existe na Imprensa Nacional (…)”, ao que se opõe o Administrador, propondo uma situação de compromisso que contentasse ambas as partes.135 A 27 de Junho de 1838, a Academia em ofício dirigido ao Ministério acusa a entrega e consequente recepção de duas chapas gravadas por Bartolozzi que haviam sido também pedidas, mas volta a insistir no facto de não ter sido feita a entrega do torculos. O documento vai assinado por Francisco de Sousa Loureiro, logo seguido de Oeirense como Director Honorário e ainda vários professores (proprietários e substitutos).136 Finalmente, Oeirense deixará este cargo quando, por força da sua nomeação para professor de gravura histórica da Academia Portuense de Belas Artes, tem que abandonar Lisboa para passar a exercer no Porto. A Academia reúne (em 11 de Julho de 1838) e elege por voto secreto aquele que será proposto ao Ministério do Reino para ocupar o lugar deixado vago pelo nosso artista.137 Desta votação, sairão três professores agregados, de entre os mais

133

Vd. Anexo I – DOC. 22 – Torre do Tombo MAÇO 2122 – Ministério do Reino e Instrução Pública. Pasta – A. N. B. A. L. – 1838/1839. Tanto o Coronel Ferreira Lima (citando Ernesto Soares, na sua obra: “A Oficina Régia Litográfica: pequenas achegas …”, a p. 8), como o próprio Ernesto Soares parecem ter-se equivocado nas datas desta nomeação. Efectivamente, Ferreira Lima refere a data 3 de Fevereiro de 1837 e remete-nos para a leitura da obra de Soares. Este, na página referida, indica a data de 9 de Dezembro de 1836. 134 Vd. Anexo I – DOC. 147 - DIARIO DO GOVERNO. Lisboa - Nº76. – 1 de Abril 1837, p. 455. Em, “Parte Official.” 135 Vd. Anexo I – DOC. 5 – Torre do Tombo MAÇO 2122 – Ministério do Reino e Instrução Pública. Pasta – A. N. B. A. L. – 1838/1839. 136 Vd. Anexo I – DOC. 20 – Torre do Tombo MAÇO 2122 – Ministério do Reino e Instrução Pública. Pasta – A. N. B. A. L. – 1838/1839. 137 Vd. Anexo I – DOC. 22 … op. cit.

Ana Paula Nunes

47

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

votados; Francisco Vasques Martins, com dez votos; Manuel Joaquim de Sousa, com nove e Joaquim Gregório da Silva Ratto, com quatro votos.138 Terminam aqui as funções de Oeirense à frente dos destinos, como fiscal, da Oficina Régia Litográfica, passando o cargo para o mais votado, Francisco Vasques Martins que, ao que parece, começa a ter bastantes dificuldades em controlar quer o absentismo, quer o mau comportamento dos desenhadores da oficina. Para além disto, agravavam-se os problemas económicos, por falta de pagamento dos clientes em particular as próprias repartições públicas, mas também, pela fama de má qualidade dos serviços prestados por aquela oficina.139 No respeitante ao seu desempenho artístico nesta área, Oeirense, como já tivemos oportunidade de verificar, é considerado um artista medíocre, também ao nível da arte litográfica, caracterizada como “… de muito reduzido valor, os seus retratos são duros e inexpressivos, e as gravuras, abertas a ponteado largo, estão industrializadas mesmo da parte dos gravadores que entraram na sua execução”.140 Talvez por esta razão, e por outras que a ela se encontrassem associadas, este artista, só começa a ser “mais falado” após a revolução de 1820, altura em que assistimos, à publicação de diversos anúncios, nos quais apresenta a sua colecção de gravuras dos heróis de 1820, quem sabe, vendo talvez nesta oportunidade criada pelo entusiasmo revolucionário a sua hipótese de se fazer notar. Esta colecção, de entre outras manifestações patrióticas e de fervoroso apoio ao movimento revolucionário, é considerada como uma das mais representativas, até pelo número de estampas que a constituem. O primeiro anúncio promovendo a colecção é publicado pelo próprio artista. Data de 16 de Abril de 1821, e surge no Diario da Regencia,141 indicando que retratara os Varões Illustres que haviam contribuído para o plano da Regeneração. Informa que quem quiser a colecção de 24 estampas se deverá dirigir a uma das duas lojas que recebem os nomes e inscrições. Mais informa que irá iniciar a sua produção cujo custo será de 14$400 reis para assinantes e de 24$000 para os restantes. Em sessão de Cortes Constituintes de 18 de Agosto, o deputado Ferreira Borges, apresenta a relação das pessoas que projectarão e promoverão os sucessos do dia 24 de 138

Vd. Anexo I – DOC. 21 – Torre do Tombo MAÇO 2122 – Ministério do Reino e Instrução Pública. Pasta – A. N. B. A. L. – 1838/1839. 139 SOARES, Ernesto – “A Oficina Régia Litográfica… op. cit. pp. 13. 140 SOARES, Ernesto - História da Gravura… op.cit., vol II, p.389. 141 Vd. Anexo I – Doc. Nº 132 - DIARIO DA REGENCIA., Lisboa - Nº91. – 16 de Abril 1821 – S/ p.

Ana Paula Nunes

48

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

Agosto.142 Não sabemos até que ponto, esta situação foi mera coincidência, no entanto é curioso notar que, esta relação lida nas Cortes, aparece apenas dois dias depois da publicação do anúncio do artista Oeirense. No final da apresentação, o mesmo deputado informa que o Conselho Militar e os Chefes dos Corpos (que tinham sido contactados pela referida associação), também deveriam constar deste grupo e que se as Cortes lhe dessem essa ordem ele os incluiria naquela lista. Fica então decidido associá-los ao grupo de ilustres heróis. Reformulado esse rol com a junção dos militares que se associaram ao movimento, fica, pelo menos de momento, concluída a relação dos participantes.143 O processo é complexo e não termina por aqui. Aparentemente, muitos querem ficar ligados a este testemunho histórico e comprovar a sua presença no acontecimento. À primeira vista, a iniciativa estava e ser bem sucedida. Assim é que o artista renova o anúncio inicial, agora com mais informações, mas também mais apelos ao orgulho pátrio e à memória histórica. A possibilidade de assinar a colecção alarga-se às “províncias”.144 Procurando apoios mais influentes, Oeirense toma a iniciativa de pedir a protecção de Cândido José Xavier, futuro Ministro da Guerra. Na carta-circular que lhe dirige e no prospecto promocional que lhe junta, volta a justificar esta colecção como uma forma de prestar homenagem aos heróis deixando ao mesmo tempo, um testemunho para os vindouros. Aproveita para informar que juntará à primitiva colecção mais estampas, como forma de satisfazer a todos e que as entregará a quem já tiver adquirido as outras, passando a colecção a possuir, ao todo 33 estampas, actualizando, claro está, o respectivo preço.145 Uma acusação não se poderá fazer ao artista; a de deixar sem informação os seus “clientes” uma vez que, novamente pelo Diário do Governo, dá conta daquilo que já tem feito e da razão pela qual houve algum atraso nas entregas, até aquela data – a falta do material – “… o que não acontecera para o resto da collecção por se achar já prevenido.” Termina, uma vez mais com uma actualização do número total de representações, bem com os preços, locais de compra e condições de assinatura.146 142

Vd. Anexo I – Doc. Nº 133 - DIARIO DO GOVERNO. Lisboa - Nº196. – 20 de Agosto 1821 - em, “CORTES – Sessão 161.ª” - p. 255. Vd. Anexo II-C, Tabela 3 com a relação, por ordem de entrada para a associação. 143 Vd. Anexo I, Doc. Nº 134 - DIARIO DO GOVERNO - Lisboa - Nº207 – 1º de Setembro 1821 – p. 326. Em, “CORTES – Sessão 171.ª” 144 Vd. Anexo I, Doc. Nº 132/A - DIARIO DA REGENCIA., Lisboa - Nº121. – 23 de Maio 1821 – S/ p. 145 Vd. Anexo II-B, DOC. 8. Cf. - LIMA, Henrique de Campos Ferreira – “O artista Silva Oeirense e a sua colecção de retratos dos heróis da Revolução de 1820”, Anais das Bibliotecas e Arquivos, vol. X, n.os 37-38. Lisboa: 1932, p. 30. 146 Diário do Governo, Nº 49, de 27 de Fevereiro de 1822, p. 350. Cf. - LIMA, Henrique de Campos Ferreira – “O artista Silva …”, op. cit. pp. 30-31.

Ana Paula Nunes

49

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

Finalmente, na sessão das Cortes, Oeirense faz oferta formal da colecção, ao rei, através de Felgueiras Junior, o secretário, que lê uma exposição enviada pelo artista. Esta missiva é um exemplar extraordinário do melhor estilo literário de exaltação dos valores pátrios e nacionais. Nela, explica que não duvidando que os historiadores se encarregarão de deixar para os vindouros, os relatos de tão grandes feitos, acha no entanto que o seu contributo seria útil “…para eternizar aquelles Varões Illustres de um modo mais vantajoso, que o de qualquer Historiador; pois que sendo possível a este descrever o homem moral, o não pode fazer todavia por sua descripção, quando pertende copiar-lhes as físicas feições, como as destes Regeneradores forão copiadas. (…)”. Bem patente fica pois, aquilo que no início dizíamos sobre a necessidade de “eternizar” ligada à noção de retrato, o próprio Oeirense a usa para justificar que não bastará eternizar pela letra do historiador, é necessário também “copiar-lhes as físicas feições” Continua no mesmo estilo de elogio aos valores pátrios, alargando-os agora, à própria arte dizendo que ele próprio “… desenhou trinta e dous Retratos dos mencionados Heroes, gravou elle mesmo alguns, e fez gravár os outros por Artistas Nacionaes,…”, ou seja, para aqueles retratos que não foram por ele gravados, escolheu artistas nacionais para o fazer, justificando deste modo que o país, não só era capaz de produzir valentes homens e grandes feitos, como, igualmente, os artistas seus conterrâneos para os representar. Termina agradecendo a bondade do Soberano em aceitar a sua humilde oferta, sempre dentro do melhor registo de um súbdito obediente, dedicado e agradecido, por tão subida honra. Estava assim oficialmente completa e entregue a dupla colecção (gravuras e respectivos desenhos), ao representante máximo da nação portuguesa.147 Analisando agora, a colecção propriamente dita, devemos começar por referir que tivemos acesso a dois conjuntos das referidas gravuras; um pertencente à BPMP148 e outro do MAR.149 Para além destas imagens, lemos atentamente as descrições feitas por Ernesto Soares na sua obra de referência150 e concluímos que as gravuras variam de colecção para colecção, em ligeiros pormenores relacionados especialmente com os textos que acompanham as figuras (em rodapé) e aqueles que fazem parte da própria imagem.

147

Cf. - LIMA, Henrique de Campos Ferreira – “O artista Silva …”, op. cit. p. 31. Esta colecção, mandámo-la digitalizar, na Biblioteca Publica do Porto. 149 Este conjunto, foi-nos gentil e graciosamente enviado, já digitalizado, pelos serviços do arquivo do Museu da Assembleia da República. 150 SOARES, Ernesto - Dicionário de Iconografia… op. cit., 5 vols. 148

Ana Paula Nunes

50

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

No mesmo Museu da Assembleia estão os desenhos que Oeirense “tirou do vivo” e a partir das quais foram feitas as gravuras. Hoje em dia são apenas 22, mas eram o mesmo número que as gravuras. Aliás, é esta “dupla collecção” a que se refere o artista no texto analisado anteriormente; a colecção das gravuras e a dos desenhos aguarelados. Abrimos aqui um espaço, para referir que optámos por incluir neste ponto dedicado à gravura, e não no capítulo anterior, os desenhos, por acharmos que são indissociáveis uns dos outros e, por tal facto parece-nos justificada a sua inclusão neste capítulo. Os desenhos entraram para esta colecção, em 1936, comprados a Tanissa e Tavares (Lisboa) pelo antigo Museu da Assembleia Nacional e as litografias (33) foram doadas em 1940, por Joaquim da Cunha Souto Maior. Todos os exemplares estão emoldurados em mogno liso e passe-partout bege. Foram objecto de restauro em 1986.151 Os desenhos são interessantes pois apresentam um certo domínio

Fig. 11 José da Silva Carvalho (1820-21) tinta-da-china sobre papel (um dos desenhos de Oeirense tirados do natural).

da aguarela e captam, por vezes alguma expressividade do retratado. Dúvidas parecem não restar, no entanto, de que naquilo que diz respeito à quantidade da sua produção, ela revela uma elevada actividade produtiva, não se limitando à colecção analisada.

151

Informação directa, Doutora Cátia Mourão Rodrigues.

Ana Paula Nunes

51

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

4 – O COLECCIONADOR E O “MARCHAND” DE ARTE

Quando apontares um dedo a alguém, lembra-te de que há três dedos virados para ti. (Provérbio inglês)

Relativamente a este ponto e à medida que o nosso trabalho ia avançando, apercebíamonos de que, regra geral, se encontravam, directa ou indirectamente relacionadas as actividades de coleccionador e de comerciante de arte. Portanto, foi por tal facto que optámos por não tratar separadamente cada um deles, mas sim em conjunto, individualizando, sempre que necessário, os aspectos que pontualmente fosse necessário abordar com mais pormenor. As primeiras referências que encontrámos sobre a sua actividade de coleccionador, foram os já “clássicos” trabalhos, sempre citados, do Conde Raczynski, no qual indica a colecção de Oeirense, que observou no Porto, como um conjunto de obras dignas de nota e que destacou por serem bastante numerosas e com algumas peças particularmente valiosas: “M. Silva Oeirense, peintre, possède aussi de bonnes choses. Il faut remarquer dans sa collection, qui est assez nombreuse, deux fort tableaux de fleurs, plusieurs vieux portraits et une bonne esquisse de Vieira Portuense, représentant Viriatus qui jure sur le cadavre d’une jeune fille de se venger des Romains.”152 Nesta época, 1844, Oeirense vive no Porto, na Praça de D. Pedro, nº 94. Em 1846, aparece em grande destaque, no Almanak da cidade do Porto, não só na sua faceta de Lente de Gravura e Desenho (morando agora, na Rua do Almada nº 13 e 14), mas ainda como proprietário de uma Galeria de Pinturas (na mesma morada anterior), referida, em lugar de destaque, logo após o Museu Portuense e o Museu Allen. Também é aqui referido, como Retratista, juntamente com outros (lentes ou agregados de Belas Artes). No item dedicado aos Gravadores, o seu nome não é mencionado.153 Também no Directorio para esse ano, é igualmente referida a sua colecção e a sua actividade profissional, mas neste, a morada é corresponde só ao nº 13 da Rua do Almada.154 152

RACZYNSKI, A. - Les Arts en Portugal. Lettres adressées a la Société Artistique et Scientifique de Berlin, et accompagnées de documens. Par Le Comte A. Raczynski. Paris: Jules Renouard et C.ie, Libraires-Éditeurs, et Commissionnaires pour l’ Étranger, 1846, p. 385. 153 Vd. Anexo I, Doc. Nº 169 - ALMANAK da cidade do Porto para o anno de 1846, pp. 20-102. 154 Vd. Anexo I, Doc. Nº 170 - DIRECTORIO Civil, Político, Commercial, Histórico e Estatístico da cidade do Porto e Villa Nova de Gaya para o anno de 1846. Porto – 1846, pp. 66-67 e 165-166.

Ana Paula Nunes

52

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

Em 1849, novamente instalado em Lisboa às Portas de Santo Antão e, ao que parece, rodeado da sua colecção, abre a sua casa e respectiva galeria de arte, ao “repórter” do jornal A União que faz uma extensa descrição do que viu, realçando algumas das telas, quer devido ao autor, ou à qualidade da pintura, ou ainda ao tamanho da tela ou à sua raridade; Caravaggio, Van der Werff, Rembrandt Van Ryn, Rubens e entre os portugueses, Grão Vasco e Sequeira. Possui ainda diversos esboços, e muitas miniaturas, algumas delas muito antigas. De acordo com o artigo, muitas mais coisas haveria a destacar, deixando antes a recomendação de que cada um fosse visitar a referida galeria, uma vez que estava à disposição de quem o quisesse fazer, todos os dias, a partir do meio-dia. Termina dizendo que esta colecção fora “… colligida no espaço de 30 annos com improbo trabalho e avultada despeza…”.155 Anteriormente, em 1836, quando ainda morava em Lisboa, a sua colecção fora visitada por outro estrangeiro, o alemão Heeringen que, como já tivemos oportunidade de referir, retribuiu a visita que Oeirense lhe fizera, anteriormente. Aquilo que este viajante e amante das artes vê, é descrito desta forma: “Em sua casa estavam dependuradas cerca de duas centenas de quadros, todos misturados. Havia muita coisa mediana, muita coisa má, mas algumas peças de arte valiosíssimas da flor da arte espanhola e portuguesa: Murillos, Trurillos e outros. D. António sabia bem o que era bom. Fez-me saber que tinha acumulado estes tesouros aquando da “abolição dos mosteiros”, muitas vezes por um preço realmente baixo.” Como se não bastasse, esta revelação é complementada com o seguinte: “O pintor conta a Heeringen que muitos quadros haviam sido vendidos na Feira da Ladra no “Campo de Santa Anna” e diz-lhe que ali conseguira comprar este ou aquele quadro e a que preço…”156 Esta é realmente uma outra faceta, convergente com aquela que estamos a analisar, pelas oportunidades que possibilitava, a todos os que nelas participaram. Naturalmente a uns mais que outros, dependendo da sua ética, seriedade e rigor. Falamos, claro está, da Comissão Administrativa do Depósito das Livrarias, Cartórios e Pinturas dos extintos Conventos, criada a 30 de Dezembro de 1836, para proceder ao levantamento e realização do catálogo de todos os bens que tivessem sido recolhidos com a nacionalização dos bens da Igreja ou que estivessem dispersos por locais distintos.

155

Vd. Anexo I, DOC. Nº 171 - A UNIÃO, Lisboa - Nº 374. – 11 de Abril 1849, p. 1508. [NdA] – Julgamos que após tão elogioso texto, quer em relação à colecção quer a Oeirense, o autor, quereria usar, não a palavra improbo, tal como aparece no texto, mas antes probo, como parece ser óbvio. 156 Apud KULMACZ, Professora Doutora Maria Clara, (notas pessoais cedidas pela) - HEERINGEN, Gustav Adolf von, (1799-1851) – Meine Reise nach …, op. cit., 2 vol., p. 60-64.

Ana Paula Nunes

53

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

Oeirense não faz parte deste órgão. No entanto, o mesmo documento que cria a referida comissão, determina que a Academia de Belas Artes de Lisboa, ficava com o encargo de proceder à classificação, ordenação, escolha e restauro dos quadros recolhidos. Para tal, são investidos dessa responsabilidade, o Conde da Taipa, Vasco Pinto Balsemão, Francisco de Sousa Loureiro, António Nunes de Carvalho, António José de Lima Leitão, Luís Duarte Vilela da Silva, André Monteiro da Cruz, Manuel Sérgio da Silveira e José Gregório Lopes da Câmara Sinval, formando a Comissão que iria orientar os trabalhos.157 Esta Comissão, por sua vez, nomeia, para proceder à referida classificação, dois académicos; António Manuel da Fonseca (professor de pintura) e Francisco Antónia Silva Oeirense.158 Em 9 de Março, novo despacho do Ministério, especifica que os artistas agregados deveriam ficar com o encargo de restaurar e conservar os quadros assim como fazer cópias litográficas dos mesmos. Determina ainda que a já referida escolha e catalogação destas obras de arte fique dividida em duas grandes partes; a zona constituída pelos distritos de Coimbra para Norte, ficam atribuídos à Academia Portuense de Belas Artes. Os distritos abaixo dessa zona, ficariam sob a responsabilidade da Academia de Belas Artes de Lisboa. Efectivamente, declarações como a que Oeirense fez ao alemão que o visitou são bastante “perigosas”, principalmente feitas por alguém que, como ele, teve de alguma forma acesso privilegiado a essas mesmas obras. Esta situação valer-lhe-á, aliás, alguns dissabores e acusações graves de que vai ser alvo por parte de alguns elementos da Academia e de que falaremos no próximo capítulo. Contudo, apesar disto estamos convictos que embora a colecção particular de Oeirense possa ter sido adquirida, como ele próprio diz, “por um preço realmente baixo”, não terá sido por meios menos lícitos. Dúvidas não há que o cargo lhe daria diversas “vantagens” na obtenção dos “bons negócios”, mas também e ao que parece, sempre prestou boas contas dos seus serviços. Até mesmo a forma quase inocente como revela a Heeringen, a origem da sua colecção, parece ser reflexo de que não se sentiria culpado deste facto. Assim é que, tanto ele como o outro académico nomeado pela Comissão, além de terem que entregar cópia assinada de recibo de levantamento e depois recibo de entrega, de todos os objectos, à Comissão, eram, por seu turno, fiscalizados pelos vogais (Luís Duarte Vilela e André Monteiro da Cruz) e por último, por toda a secção de Artes da Academia. Todos estes 157

Boletim da Academia Nacional de Belas-Artes – Documentos. Vol. III: Documentos relativos à Recolha e Distribuição dos Quadros e Livros após a Extinção dos Conventos (1.ª Parte). Lisboa: Academia Nacional de Belas-Artes, 1938, p.85. 158 Boletim da Academia Nacional de Belas-Artes, … op.cit., p.92.

Ana Paula Nunes

54

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

elementos, em 7 de Agosto de 1838, assinam uma declaração em que testemunham “… o activo zelo e laboriosa fadiga com que o referido Francisco Antonio Sª Oeirense se houve no desempenho d’aquelle encargo, com o que prestou um relevante serviço á Academia …”159 Existe no entanto uma situação que parece indiciar que poderia ter retirado benefícios de ser negociante de arte e de andar frequentemente, entre o Porto e Lisboa, onde fazia negócios, conseguindo desta forma, facilmente, vender a uma das Academias materiais de que necessitassem. Uma dessas situações prende-se com as gravuras que era necessário comprar para as aulas da Academia Portuense. Em 16 de Setembro de 1838, Oeirense já como Lente de Gravura no Porto, envia à Academia de Belas Artes de Lisboa, uma “Relação das gravuras, ja indispensáveis, que requisito para ensino da Aula de Gravura da Academia Portuense de Bellas Artes…”160 Nesta lista vão descriminadas as gravuras e respectivos preços, que este professor diz serem os mais em conta. Entretanto, como apêndice nº1161 do seu trabalho “O artista Silva Oeirense e a sua colecção de retratos dos heróis da Revolução de 1820”, o Coronel Ferreira Lima, apresenta uma relação, em tudo semelhante àquela que apresentamos; designação das gravuras, autores, forma de apresentação (emolduradas) e preços, datada de Lisboa, 31 de Novembro de 1838. Nem dois meses medeiam estas listagens e, na segunda, que vai acompanhada de instruções para o procurador de Oeirense, no Porto, só existe de diferença o valor total apenas porque não são incluídas na primeira listagem algumas das obras. Feitas as contas, verificámos que o total, retiradas as gravuras que não constam da requisição oficial de Oeirense, é exactamente igual ao apresentado na referida requisição. Em nosso entender, o pintor Oeirense, poderá ter arranjado forma de vender ele (a partir de Lisboa), as estampas que ele próprio tinha pedido como Lente, para a Academia Portuense (possivelmente através de um intermediário). Não podemos saber se especulou ou não no seu preço, pois não possuímos termo de comparação.162 Entretanto, outra situação surge que, de algum modo, vem contradizer esta e dar-nos uma perspectiva diferente, sobre um assunto semelhante. Em 27 de Março de 1840, o Director da Academia Portuense, Joaquim Rodrigues Braga, em ofício dirigido ao Sub-inspector da 159

Boletim da Academia Nacional de Belas-Artes, … op.cit., p.111-112. Vd. Anexo I - TORRE TOMBO – DOC. Nº 23. MAÇO 2122 – Ministério do Reino e Instrução Pública. Pasta – A N B A de Lisboa – 1838/1839, Lista de Gravuras. 161 LIMA, Henrique de Campos Ferreira – “O artista Silva …”, op. cit. pp. 41-42. 162 Para uma melhor compreensão daquilo que dizemos, sugerimos a comparação entre o documento que transcrevemos (DOC. nº 23- Anexo I), e a digitalização do texto do trabalho citado de Ferreira Lima (Anexo IIB). 160

Ana Paula Nunes

55

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

mesma Academia, explica que Oeirense se queixara “… que os exemplares que na Aula de desenho tem servido de Estudo, (emprestados por elle L.e) se lhe estaõ estragando todos os dias…”163 por ainda não terem chegado os requisitados à comissão, para esse fim. Portanto, Oeirense emprestava as suas estampas para os alunos trabalharem. Interessante se pensarmos que podendo vendê-las, as emprestava e além disso, estava a emprestar objectos da sua própria colecção (que em princípio teriam algum valor), para serem manuseados por alunos. Julgamos que, embora não inocente, Oeirense não seria o “oportunista” que se pretende, por vezes, mostrar, até porque, parece ter confiado bastante ao nível dos negócios, saindo gravemente prejudicado por um “sócio” nos seus negócios de artes e antiguidades, como fica claro pelo longo documento transcrito com o nº2, no trabalho de Ferreira Lima164. Convenhamos, que para um tão “sabido” e experiente negociante e oportunista, se deixou enganar com alguma simplicidade. Numa longa exposição, datada de 22 de Dezembro de 1837, António Manuel da Fonseca, apresenta uma pormenorizada relação de “infracções”, segundo ele, praticadas por Oeirense, das quais se destaca, logo de início, a compra de documentos falsos (uma Portaria do Governo) que lhe permitiu assistir e ter voto nas conferências permitindo-lhe realizar bons negócios, “…e entaõ teve lugar de vender á Academia todas as estampas velhas (inda que algumas bôas) e jessos para esta e a do Porto, fazendo compare nestas vendas diversos vendedores”.165 Ligado ainda com a sua faceta de coleccionador/comerciante, deveremos dizer que Oeirense vai ser acusado pelo mesmo colega da Academia, António Manuel da Fonseca (sem apresentação de provas) de desviar, ou poder, ele ou um familiar, vir a desviar algum quadro valioso, por insistir em passar pela sua aula para ir para a que lhe pertencia. Ora, segundo o acusador, esta situação “…poẽ em risco de ser robado o quadro de Rafael, que por seu dimenuto tamanho o pode ser facilmente por algum dos familiares do suppd.º…”166. Este é um problema que se irá arrastar por bastante tempo. Vai acabar por ser tema dos principais jornais, em artigos anónimos e conduz mesmo a um processo interno de investigação, dentro da própria Academia.

163 164

Vd. Anexo I, DOC. nº 83 Torre do Tombo. LIMA, Henrique de Campos Ferreira – “O artista Silva …”, op. cit. pp. 42-44.

165

Vd. Anexo I, Doc. n.º 11 Torre do Tombo. Vd. Anexo I, DOC. nº 10. Torre do Tombo. Quando o autor da exposição, António Manuel da Fonseca, se refere ao “suppd.º” (supradito), refere-se objectivamente a Oeirense, pois que o nomeara no início do texto. 166

Ana Paula Nunes

56

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

A todas estas acusações, são feitas averiguações, lavradas diversas opiniões todas elas apontando culpas, exageros e interesses mais ou menos declarados, ao acusador, Antóno Manuel da Fonseca, e não ao principal acusado, Oeirense.167 O ajudante do Procurador Geral da Coroa, José de Cupertino d’Aguiar Ottolini, reforça esta ideia e acentua o facto de não haver um único documento ou evidência que suporte qualquer das declarações. Relativamente à acusação da venda de material (estampas e gessos), afirma o seguinte: No simples facto da venda de Estampas e gessos feita á Academia pelo mencionado Director Honorario por meio de interpostas pessoas, q. o Supp.te allega, naõ encontra crime, nem motivo de censura, quando mesmo fôra verdadeiro; o abuso, a prevaricaçaõ só podiaõ consestir no dolo, na lesaõ, no preço excessivo, com q. se fizesse a venda, ou ainda na inutilidade para a Academia dos objectos comprados, e o Supp.te naõ prova, nem sequer allega nenhuma destas circunstancias.168

167

Vd. Anexo I, Documentos da Torre do Tombo, do desenvolvimento e instrução deste longo processo, com os números 4 a 20 e 25 a27. Salientamos particularmente, os documentos 10 e 11 onde se tratam as acusações de António Manuel da Fonseca e da resposta do Director, Francisco de Sousa Loureiro e o documento nº 16. 168 Vd. Anexo I, DOC. Nº 19, Torre do Tombo.

Ana Paula Nunes

57

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

5 – O PROFESSOR “Não basta conquistar a sabedoria, é preciso usá-la.” Cícero

A actividade lectiva de Oeirense é um dos aspectos da sua vida cujo início de actividade não se consegue determinar com clareza bem como saber quais as habilitações que possuía para poder ensinar. Fica claro que, até uma dada altura ele se apresenta apenas como “Artista do Estado”, em virtude, de receber a pensão à qual já fizemos referência no primeiro capítulo deste trabalho. Recordemos que, ainda em 1821, quando coloca o anúncio (também já citado no ponto anterior), publicitando a sua colecção dos Varões Ilustres, essa continua a ser a única característica que apresenta quanto à sua condição sócio-profissional,169 a de artista do Estado. Observamos (pelas informações que nos são dadas através dos anúncios) que, durante algum tempo, a sua actividade como professor, se resume às aulas particulares que se propõe dar em sua casa, actividade essa de que não temos nenhuma informação sobre o tipo de adesão que teria, ou seja; se tinha alunos, se eram muitos ou poucos, quem eram e quais os resultados desse ensino. Efectivamente, não encontrámos, um único texto em que houvesse alguma referência relacionada com tal actividade, que realizava a título particular. Em 1835, num anúncio do mesmo teor, continua a identificar-se exactamente da mesma maneira.170 Será, num documento datado de 25 de Outubro de 1836 que ele irá aparecer já ligado à Academia de Belas Artes de Lisboa. Como lá chegou, o que lhe deu condições para tal, são questões que tentaremos abordar seguidamente.

169 170

Vd. Anexo I – Doc. Nº 132, … ibidem. Vd. Anexo I – Doc. Nº 139, … ibidem.

Ana Paula Nunes

58

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

5.1 – A ACADEMIA DE LISBOA

A Academia Real de Belas Artes de Lisboa, nasce após uma série de tentativas, mais ou menos bem sucedidas, no sentido de formar uma instituição que congregasse os diversos Estudos dispersos pela cidade. No entanto, e uma vez mais devido às sucessivas mudanças governativas, à instabilidade que elas mesmas provocavam e mesmo à falta de vontade na tomada de decisões por parte do poder, vai sendo adiada a criação desse tipo de instituição. Apesar disto, nem tudo está parado e há decisões que vão surgindo, tomadas neste sentido. Não nos cabe aqui fazer o desenvolvimento de todo esse processo pois, para além de não ser esse o objecto deste trabalho, outros houve já que o fizeram de forma intensiva e profunda. As nossas achegas são apenas e só, pinceladas, no sentido de ambientar o leitor para uma melhor compreensão do nosso raciocínio. A primeira medida para a formação de uma Academia está consignada na Portaria publicada a 25 de Fevereiro de 1835, onde se estabelecem os fins para os quais, a rainha cria a futura Academia de Belas Artes ou seja, para a; …civilisação geral dos portuguezes, diffundir por todas as Classes o gosto do Bello (…).171 Para que tudo fosse bem preparado, a Soberana decidia “crear previamente uma Commissão para Lhe propor um Projecto dos referidos Estatutos”.172 Nasce assim, uma comissão que, com base em 14 artigos orientativos, criará os estatutos da nova instituição. Em 13 de Março surgem as notícias da primeira reunião dessa comissão, as informações são de que os trabalhos decorrem a bom ritmo e no sentido de em breve outros artistas serem consultados para dar a sua opinião.173 Depois de prontos os Estatutos ficam “parados” no Governo, para só serem aprovados quando Passos Manuel sobe ao poder. Este laborioso Ministro, cinco dias depois de assumir já tem todo o processo de formação desta academia a funcionar e, a 29 de Outubro de 1836, estava a ser publicado o decreto de fundação desta instituição. Nele, cerca de cinquenta pessoas, entre professores (proprietários e substitutos), artistas agregados e outros funcionários ficavam a trabalhar para a Academia. Todos estes nomes, terão sido indicados a Passos Manuel pois que, vindo havia pouco do Porto, não conhecia a maioria das pessoas e as 171

Vd. DOC. Nº 136 - DIARIO DO GOVERNO, LISBOA - Nº48, 25 de Fevereiro 1835, p. 201 - EM, “Parte Official.” 172 Vd. DOC. Nº 136 - DIARIO DO GOVERNO, LISBOA - Nº48, …, ibidem. 173 Vd. DOC. Nº 137 - DIARIO DO GOVERNO, LISBOA - Nº62, 13 de Março 1835, p. 260 - EM, “ANNUNCIO.”

Ana Paula Nunes

59

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

suas aptidões para cada cargo. Entre esses nomes, encontram-se os de muitos opositores políticos a Passos Manuel. Esse facto não o demove de lhes atribuir cargos e de lhes dar empregos. Esta imparcialidade, justiça e por vezes mesmo generosidade,174 confundem os opositores. Deste modo, sem argumentos para objectivamente atacar a sua acção governativa, começam a surgir as críticas viperinas e destrutivas, procuram o descrédito, usando artigos difamatórios nos periódicos apoiantes (a maioria), atingindo de igual modo tanto o Ministro como aqueles que dele eram próximos.175 Aqueles que anteriormente criticavam a acção dos outros governos por não apoiarem as artes, as letras e a cultura, atacavam agora, duramente (até insolentemente), agora, por serem tomadas as medidas que anteriormente tanto pediam. Efectivamente, o que parecia estar em causa (e estava realmente), eram questões ideológicas e partidárias e não o superior interesse da Nação. A extensa lista dos empregados da Academia de Belas Artes de Lisboa, criada com o decreto de 25 de Outubro de 1836, apresentava, num total de cerca de meia centena de indivíduos, desde o de Director até ao secretário. Por entre estes aparece, na parte dedicada à gravura, como Professor, Domingos José da Silva; Substituto, João Vicente Priaz; Professor da aula de gravura de paisagem, Benjamim Comte; Professor da Aula de cunhos e medalhas, José António do Vale; Artistas agregados a estas aulas: Da 1ª Classe, Gregório Francisco de Queiroz, Francisco Tomás de Almeida e Teodoro José Lima; Da 2ª Classe, António Maria Monteiro e Gregório José de Queiroz; pensionista viajante, Francisco António da Silva Oeirense; estampador, António Joaquim. Ao todo, entre as Academias do Porto e Lisboa, estavam agora ligados ao Estado, com remuneração fixa, cerca de 76 pessoas das Artes. Lamentavelmente, os grandes nomes, os que dariam projecção e importância a tal instituição, já não existiam; Machado de Castro, Vieira Portuense, Vieira Lusitano, Joaquim Manuel da Rocha, Cirilo, Bartolozzi, Pedro Alexandrino, José da Cunha Taborda, etc.176 No entanto, outros nomes viriam e, agora já teriam alguma instituição que os pudesse representar ou apoiar. 174

ALDEMIRA, Luiz Varela - Um ano trágico: Lisboa em 1836: a propósito do centenário da Academia de Belas Artes: impressões, comentários, documentos. Lisboa: La Bécarre [depos.], 1937, p. 187. Veja-se o caso dos irmãos Taborda, filhos do pintor do mesmo nome falecido havia pouco ou a aposentação concedida ao escultor João José de Aguiar. 175 Vd. Anexo I, DOC. Nº 184 - “Viasacra de Guinfoens”, in. PERIODICO DOS POBRES NO PORTO, N.º 158, 7 de Julho 1838, pág. 641. 176 ALDEMIRA, Luiz Varela - Um ano trágico… op. cit. pp. 209-211.

Ana Paula Nunes

60

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

Colocamos a mesma pergunta que já antes tínhamos enunciado e que Varela Aldemira também levanta; Como aparece Oeirense na Academia? Considerado frequentemente um oportunista, um “espertalhão” e por vezes alguém menos escrupuloso, pensamos, por aquilo que lemos na documentação que reproduzimos e segue em anexo que Oeirense foi provavelmente e antes de mais, um homem activo e com iniciativa, teria tido sucesso durante grande parte da sua vida e terá tido algumas pessoas influentes que se tornaram da sua confiança e alguns deles seus amigos. Estas situações geram frequentemente rivalidades e algumas invejas. Já vimos anteriormente, que aparece fazendo parte da lista de funcionários do Estado ligados à Academia de Lisboa. Também, sabemos que foi proposto pelo pintor André Monteiro da Cruz (24 de Novembro de 1836) para Académico de Mérito por, “… com o maior disvello, e assiduidade procurando illucidar as Beneficas intenções do actoal Ministro do reino, para se formar nesta cidade de Lisboa hua Academia de Bellas-Artes, e que felismente se concluio com grande utilidade Publica. e amparo honesto de tantos Artistas que andavão mendigando o escasso alimento (…); e fazendo ver toda a verdade destes tristes factos, e indicando ao Ex.mo Ministro do Reino, os Artistas desamparados, para que fossem contemplados como as circunstâncias o permitissem, sendo praticada por elle esta tão singular como louvável virtude, e tendo como Artista hum reconhecido talento tão transcendente, que foi com toda a Justiça Despachado pencionista para viajar e torna-se Digno á Patria que o vio nascer, por estes motivos.”177 É pois desta forma, pela porta dianteira, que entra para a Academia. O seu oportunismo será talvez mais no sentido de aproveitar para si e para os outros, as oportunidades que a vida traz, na verdadeira acepção da palavra, como parece ter sido aquilo que fez relativamente à Academia e que lhe deu o direito a que André Monteiro o indicasse para este cargo honorífico. Foi sem dúvida amigo de Passos Manuel, de tal maneira são, frequentemente atacados, em conjunto, pelos seus opositores, nos periódicos, em longos artigos que os caracterizam com os piores epítetos. Entre eles temos que destacar o artigo do Examinador, nº92, o Toureiro nº153 e nº175, o Periodico dos Pobres no Porto nº157.178

177 178

Cf., ALDEMIRA, Luiz Varela - Um ano trágico… op. cit. pp. 214-215. Vd. Anexo I, DOCs. N.os 148, 149, 151, 154, respectivamente.

Ana Paula Nunes

61

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

5.1.1. – O “Caso” António Manuel da Fonseca

Destacamos desta forma, um longo processo que começou, desde bem cedo, na Academia de Lisboa, partindo deste conhecido professor, António Manuel da Fonseca e que visou, acima de tudo a pessoa de Oeirense, mas também do Director, Francisco de Sousa Loureiro, sobre quem contestava a capacidade de estar à frente deste cargo (pois parece que o desejaria para si próprio), e em última análise, contra toda a Academia. Carecem, normalmente de fundamento factual, as acusações que são feitas a Oeirense e ressaltam, como opinião dominante dos diversos elementos, quer da Academia quer do Ministério do Reino, que são chamados a pronunciar-se sobre o caso, a ideia de que aquele Lente de Pintura Histórica, apesar de muito talentoso na sua arte, mas um “espirito inquieto do Professor Fonseca um ciúme de Artista, julgando-se prejudicado e ofendido, naõ só no seu merecim.to conhecido, mas principalm.te no seu orgulho, taõbem de Artista, e que na verdade he demasiado, e insuportável.”179 Ou ainda; “…há neste Professor uma certa philancia, uma certa jactância e vaidade, e uma tal versatilid.e de génio e talento pictórico innegavel, faltalhe o conhecim.to essencial de algumas das outras Artes, falta-lhe o mais simples conhecim.to litterario, e o ainda mais essencial conhecim.to dos homens, e daquelles deveres e obrigaçoẽs que nos-unem em sociedade. A prova disto está no seu Requerim.to, e na minha informaçaõ.”180 Esta curta caracterização feita pelo Director, Francisco de Sousa Loureiro, é bastante correcta e objectiva. Toda a Academia se une, não só contra as graves acusações deste professor que a todos afectam, mas também em defesa do Académico de Mérito, Oeirense que é o principal visado dos ataques. Assim mesmo, Julgamos que a situação se deverá ter tornado difícil de suportar, para todos, em especial para Oeirense, que se vê a braços, com constantes ingerências na sua actividade, bem como ataques ao seu bom-nome feitos permanentemente nos jornais. Daí que, em nossa opinião, a saída encontrada, não sabemos se em conjunto (Académicos e Oeirense), ou tomada individualmente, tenha sido a vinda de Oeirense, para o Porto, leccionar a aula de Gravura que entretanto vagara. Contribui para confirmar esta ideia que defendemos, o carácter de urgência que decorre da leitura do documento nº 22; “Achando-se vago o Emprego de Fiscal da Officina Lithografica Nacional, em consequência de ter sido nomeado para Professor da Aula de 179 180

Vd. Anexo I, DOC. Nº 11, Torre do Tombo. Vd. Anexo I, op. cit.

Ana Paula Nunes

62

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

Gravura Historica da Academia Portuense de Bellas Artes, o Director Honorario Francisco Antonio Silva Oeirense que occupava aquelle emprego em virtude da Portaria do Ministerio do Reino de 15 de Dezembro de 1836. É pois, desta forma que Oeirense nos aparece a leccionar Gravura, no Porto. Achamos que, nunca esteve nos planos de Oeirense, ou mesmo de alguém com mais responsabilidade que ele, e com poder para o nomear, nunca esteve, dizíamos, contemplada a hipótese deste professor ir leccionar para o Porto, facto, julgamos, confirmado pelas duas listagens (às quais já nos referimos anteriormente), apresentadas por Oeirense e por Joaquim Rodrigues Braga, onde nunca é mencionado o nome deste pintor, no conjunto de professores escolhidos para formar o primeiro Corpo Académico.

Ana Paula Nunes

63

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

5.2 – A ACADEMIA PORTUENSE

Oeirense toma posse do seu cargo de professor, na Academia Portuense, no dia 30 de Agosto de 1838, como consta da acta da respectiva sessão de conferência ordinária. 181 Quase no final da sessão, este professor apresenta um pedido bastante curioso, ou antes, útil para nós investigadores; “(…) O mesmo Lente pedio que certos documentos que apresentava, como attestados dos relevantes serviços que fisera a Academia de Bellas Artes de Lisboa, fossem Archivados, a conferencia annuio.” De início tudo parece correr normalmente, e as situações normais, decorrentes do exercício lectivo, vão sendo organizadas. O pintor parece, inclusivamente, bastante activo e até mesmo algo entusiasmado como a nova actividade. Oeirense vai tentando adaptar-se a um meio e uma organização diferentes e, ao que parece, a um conjunto de académicos que não teria visto com muito bons olhos, a sua nomeação para esta Cadeira, em parte devido à fama que o acompanhava e chegara mesmo antes dele, veiculada pelos periódicos, principalmente. Por outro lado, ao que nos parece ter entendido até aqui, da leitura da documentação, enquanto esteve na Academia em Lisboa, na prática, Oeirense não deu aulas, na verdadeira acepção da palavra. Até que ponto estaria preparado e apto para o fazer com eficácia. Além disto, negócios pessoais, outros oficiais e também, pensamos, apenas o gosto de ir até à Capital, fizeram com que logo após a sessão de 14 de Setembro182 seguinte, se tivesse deslocado para esta cidade, de onde só voltou a 20 de Dezembro.183 É bem certo que também levava uma incumbência da Academia Portuense, mas apenas porque foi aproveitando o facto de ele ter que ir a Lisboa. Os pequenos problemas diários, de convivência com os seus colegas e mesmo com alunos, começam bastante cedo. Primeiro, as questões surgidas entre o Director Interino e o Lente de Escultura, respectivamente, Joaquim Rodrigues Braga e Constantino José dos Reis que o obrigaram a

181

Vd. Anexo I, DOC. nº31, AFBAUP, Livro Nº 105 – Actas das Conferências Ordinárias da Academia Portuense das Bellas Artes (1839 a 1849) . 182 Vd. Anexo I, DOC. nº34, AFBAUP, Livro Nº 105 – Actas das Conferências Ordinárias da Academia Portuense das Bellas Artes (1839 a 1849) . 183 Vd. Anexo I, DOC. nº38, AFBAUP, Livro Nº 105 – Actas das Conferências Ordinárias da Academia Portuense das Bellas Artes (1839 a 1849) .

Ana Paula Nunes

64

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

tomar uma posição “oficial” perante um dos dois, da qual tentou escusar-se,184 pedido esse que foi recusado, obrigando-o a tomar partido por um dos dois. Outros problemas surgem com Joaquim da Costa Lima Júnior, devido à partilha de salas de aula (de que é carismático o caso dos “mochos”) mas especialmente com, João dos Santos Mendes. Parece-nos que Oeirense sai de Lisboa para se afastar das constantes reclamações de António Manuel da Fonseca e vem encontrar no Porto alguém semelhante àquela personagem. Estes factos deverão estar ligados “à fama” que já teria antes de cá chegar, uma vez que este professor, estava ao corrente dos problemas havidos em Lisboa e dos quais já falámos anteriormente, tendo seguido, inclusivamente pelos jornais as “novidades”, pois que cita alguns artigos desses periódicos em documento de 27 de Fevereiro de 1840185, no qual é duríssimo para com Oeirense, acusando-o, entre outras coisas de faltar indevidamente e de forma pouco honesta: “… tomei conta da Cadeira de Gravura pela supposta e falsa molestea do L.e Propriet.º que por via indirecta communicou estar em estado de nem, poder escrever, supposta e falsa porque descaradamente andou na rua como eu sei, e no dia 29 foi pedir licença e tirar passaporte de 30 dias p.ª Lx.ª como igualmente presenceei continuando a passear ate o seu embarque no vapor.”186 Neste documento usa de linguagem muito pouco apropriada e insultuosa. Além deste facto, começam a suceder-se os pedidos de despensa, atestados e faltas prolongadas de Oeirense, que se já não eram bem aceites antes, agora, são cada vez mais mal vistos e começam a gerar reacções de várias pessoas ligadas à Academia. Por outro lado, João dos Santos Mendes, move uma “vigilância cerrada” a todos os movimentos de Oeirense, dentro e fora da Academia e mesmo no Porto e fora dele, em Lisboa. O próprio João dos Santos Mendes quando é reintegrado no seu anterior emprego na Alfandega do Porto, local onde antes de leccionar na Academia, já trabalhava, deixa de responder às solicitações e mesmo convocatórias da Academia, apesar de ainda a ela se encontrar ligado.187 “(…) Pela régia deliberação de S. Magestade foi o mesmo Substituto de Gravura novamente reintegrado à Alfandega do Porto, aonde actualmente permanece…” A doença de Oeirense levou a Academia a “… enviar no dia doze do mesmo mês, participação 184

Vd. Anexo I, DOC. nº43, AFBAUP, Cota Nº 212 “Secretaria, Correspondência Recebida e Minutas” (1839-

6) 185

Anexo I, AFBAUP, DOC. Nº 81 – Nº 212 “Officios do Snr. Mendes” (1840 – 6) Anexo I, AFBAUP, DOC. Nº 81 – ibidem. 187 Anexo I, AFBAUP, DOC. Nº 90 - Livro Nº 125 – Correspondência da Academia para o Governo 186

Ana Paula Nunes

65

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

official ao referido substituto, para que promptamente comparecesse na Aula respectiva, com o fim de prelléccionar os Alumnos. Este officio assim dirigido nenhum effeito teve, recusando-se o mesmo igualmente a apresentar-se, ou a responder com os motivos que a isso o compelião…”188 Entretanto, através de circular dirigida ao ministério do Reino, acompanhada de mapa da frequência de alunos das diversas aulas, e possivelmente, fruto de todos estes problemas e alguma desorganização, nota-se um decréscimo considerável de frequência das aulas de gravura, entre os anos de 1838 e 1841.189 Efectivamente, de um total de 18 alunos, desce a frequência para apenas 8. Constantes problemas com o pagamento dos honorários de Oeirense, a regularização dos direitos de mercê e ordens de pagamento do ordenado e outras de suspensão, criam um clima constante de irregularidades, que o próprio Oeirense tem dificuldade em gerir. Veja-se, a título de exemplo o seguinte ofício do Visconde de Beire: Ilm. Snr. Pode abonar ao Snr.e Lente de Gravura o ordenado do mez passado, com o Competente desconto. O Snr.e Braga naõ fez bem, mas emfim he melhor fechar os olhos, e tome-mos as ferias juntos como todos os mais; desejaria porem que V, S.ª escrevesse ao Secretario da Academia de Lisboa perguntando o que la se pratica; isto he, no caso que as ferias em Lisboa sejaõ do mesmo modo, que as-do Porto; o que se pode ver do respectivo Decreto. De V. S.ª Obseq.º Pen.or, Visconde de Beire190 É bastante claro, um certo desfasamento das decisões, entre aqueles que dirigem os destinos da Academia. Entretanto, Oeirense parece continuar a receber a confiança de Lisboa, sendo-lhe atribuídas novas gratificações e novas funções, como seja, o ensino de Desenho Histórico por vaga deixada pelo professor proprietário da Cadeira. A 31 de Janeiro de 1844, Oeirense apresenta o programa para esta cadeira que passará também a leccionar. Um outro problema, bem mais grave, mas simultaneamente curioso, do qual não conseguimos saber o desfecho, envolve novamente este professor. Trata-se de uma questão com Francisco José de Resende, cujo pai apresenta uma reclamação, acusando Oeirense de falta de competências para ensinar desenho.191

188

Anexo I, AFBAUP, DOC. Nº 90 – ibidem. Anexo I, AFBAUP, DOCs. Nºs 93 e 94 -Livro Nº 125 – Correspondência da Academia para o Governo 190 Anexo I – AFBAUP, DOC. Nº 100, Cota Nº 212 (1841 - 3) – “Vários officios e papeis” 191 Vd. Anexo I - AFBAUP, DOC. Nº 120, Livro Nº 137 – Copiador dos Officios a Aucthoridades, Lentes, Substitutos e Empregados 189

Ana Paula Nunes

66

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

“(…) Este Lente, Ex.mo S.or, tem por abito praticar estas indignidades e falta de delicadeza porque com outros alumnos tem praticado da mesma maneira, por isso para o Filho do primeiro Supplicante levar o seu estudo ao fim que deseja pede a V.ª Ex.ª, providencias mandando que o dito Lente exerça a sua cadeira de gravura e naõ o dezenho que lhe naõ pertence do contrario continuará a insultar os Alumnos.” Ou seja, pede-se, não o afastamento ou outro qualquer castigo, mas sim que deixe de ensinar desenho e passe a ensinar apenas gravura. A dada altura, Oeirense deixa mesmo de vir para o Porto, permanecendo grandes temporadas em Lisboa, com licença do Ministério do Reino, abandonando praticamente na totalidade as suas obrigações e aulas na Academia. Perante esta situação, a Academia convoca-o, no sentido de se apresentar ou trazer justificação. Como tal não se verifica, continuando o referido professor a faltar, acaba por lhe ser cortada a remuneração mensal. Os anos passam. Sobre Oeirense, na Academia do Porto, não conseguimos saber o que se terá passado mais, se algo mais aconteceu. A 19 de Janeiro de 1868, um lacónico pedido de esclarecimentos por parte da Academia Portuense, é dirigido a Lisboa. Soubera-se da morte de Oeirense e pedia-se a confirmação, para poder tirar o seu nome dos livros, “… muito embora lhe não fosse abonado o seo vencimento.”192 Uma não menos lacónica resposta veio de Lisboa confirmando o triste desfecho, e esclarecendo a data até a qual deveria ir abonado.193 Apesar da formalidade da comunicação, não há, assim mesmo uma palavra que seja, reveladora de alguma “estima” ou pesar pelo antigo membro daquelas duas Academias. Oeirense já fora esquecido antes mesmo de ter morrido! Como se de uma peça de humor negro se tratasse em que uma “charada” final remata a cena, deixando que o espectador fique a interrogar-se sobre alguma coisa e, talvez mesmo demonstrativo da peculiaridade da vida de Oeirense, é o último documento que recolhemos sobre ele. Completamente desconcertante, continuamos ainda sem decifrar o seu total significado e alcance; Exc. mº Snr.e. Conde de Smodães, Vice-Inspector da Academia das Bellas Artes do Porto. – Na arte sempre fui pouco, nas letras ainda menos; a amisade porém, que ao

192 193

Vd. Anexo I - AFBAUP, DOC. Nº 127, Nº 212 - 1868 – “Outros documentos” . Vd. Anexo I - AFBAUP, DOC. Nº 128, Nº 212 - 1868 – “Outros documentos” .

Ana Paula Nunes

67

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

finado professor consagrei, me aconselhou que, em sua memoria aproveitasse o que podesse, tanto o pouco como o menos. Tal qual offereço a V. Exc.ª e aos dig.mºs professores da Academia das Bellas Artes do Porto. Se for acceita, desde já confessa o auctor que, os seus agradecimentos vão muito além do pouco e do menos que val a obra. – Lisboa e Junho 3 de 1868 – Ill.mº e Exc. mº Snr.e. Vice-Inspector da Academia das Bellas Artes do Porto – O aggregado á aula de Gravura – João José dos Santos.194

194

Vd. Anexo I - AFBAUP, DOC. Nº 129, Livro Nº 7 – Officios de diversas Aucthoridades – 11.

Ana Paula Nunes

68

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

6. – CONCLUSÃO

Quando nos propomos a fazer um trabalho deste tipo, mesmo convencidos de que possuímos uma perfeita noção da realidade, caímos invariavelmente, sempre no mesmo erro, “estamos convencidos”. Por muito controlado que seja o raio de influência do tema que estamos a estudar, ele ultrapassa sempre os nossos mais condescendentes cálculos e consegue surpreender-nos com quantidades de material de pesquisa e estudo, para as quais raramente estamos preparados. Oeirense foi um caso exemplar, poderíamos arriscar. A um período inicial de um quase total deserto de informação, o qual atravessámos, pensando nunca chegar a encontrar um oásis de informação como aquele com que viemos a deparar. A quantidade de informação para recolher e posteriormente tratar foi realmente superior às nossas melhores expectativas. As fontes manuscritas eram (e são) consideráveis. Como já referimos no início do trabalho, tal facto fez afunilar o nosso projecto, contribuindo para isso também o tempo disponível. Consideramos, no entanto, ter atingido alguns objectivos que nos deixam algo confortáveis connosco próprios. Pensamos ter contribuído para um “honesto”, embora pequeno, levantamento e localização (esta nem sempre conseguida), de um conjunto de obras da autoria de Oeirense, pinturas que, como concluímos representam um leque significativo de figuras de “poder”, mais ou menos transitório, mas de qualquer forma, à época em actividade, em pleno exercício de influência. E, este poder a que nos referimos e que dá subtítulo ao nosso trabalho é o poder, genericamente definido, talvez melhor definido como influência, predomínio, em qualquer área ou a qualquer nível, não o poder tido apenas como atributo de uma acção política. Resultou evidente, pensamos, que as clientelas eram normalmente pertencentes a representantes de altas patentes do exército, quadros de chefia políticos, grandes proprietários ou comerciantes de trato internacional, “elites” culturais, estadistas, reis e rainhas. Outro aspecto que consideramos ter aflorado e, nalguns casos conseguido foi o de encontrar algo que confirmasse as nossas hipóteses, e portanto, “abanar” uma série de preconceitos em relação às actividades desenvolvidas por Oeirense e à sua forma de as desempenhar. Claro está que esta é uma das áreas que consideramos necessitar de uma pesquisa mais intensiva mas, principalmente, de um trabalho de “cruzamento de dados” mais profundo e exaustivo que julgamos ficou incompleto no nosso trabalho pelas razões que, também já anteriormente aflorámos, ligadas com o acesso a algumas fontes. Ana Paula Nunes

69

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

Pensamos que contribuímos um pouco para encontrar ou apenas vislumbrar, um Oeirense melhor executante, do ponto de vista artístico, especialmente na pintura. Finalmente pensamos que, se nada do que atrás dissemos tiver sido conseguido, pelo menos relembrámos que, como todo o ser humano, Oeirense é também (e não apenas), fruto da época que o viu desenvolver-se. Ora, e sem querer desenvolver juízos de valores, para quem como ele cresceu numa época turbulenta, insegura e imprevisível, a sobrevivência deve ser, pensamos, uma necessidade bem mais premente do que aquilo que já é normalmente. Daí que, conseguir equilibrar algo que é em grande parte uma pulsão quase exclusivamente natural, com um código de boa conduta, boa moral e valores respeitados, deverá ser um exercício bastante mais difícil numa época com aquelas características. Não descobrimos um grande pintor, não trouxemos à luz um grande homem, não reconhecemos um ilustre desconhecido. Desocultámos pelo menos em parte um homem que ainda dará bastante assunto de estudo.

Ana Paula Nunes

70

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

SILVA OEIRENSE (1797 – 1869) FONTES E BIBLIOGRAFIA DOCUMENTOS MANUSCRITOS

1. Arquivo da Faculdade de Belas Artes do Porto •DOCUMENTOS AVULSOS Maço, Cota AFBAUP Nº 212 (1839 – 5) - “Officios do Snr.e Visconde de Beire” Maço, Cota AFBAUP Nº 212 (1839 - 6) – “Documentos avulsos” Maço, Cota AFBAUP Nº 212 (1839- 4) - “Officios do Snr.e Braga” Maço, Cota AFBAUP Nº 212 (1839-3) – “Officios do Snr. Mendes” Maço, Cota AFBAUP Nº 212 (1840 - 1) – “Officios do Governo” Maço, Cota AFBAUP Nº 212 (1840 - 5) Maço, Cota AFBAUP Nº 212 (1840 - 6) Maço, Cota AFBAUP Nº 212 (1841) – “Secretaria. Expediente; correspondência recebida e minutas” Maço, Cota AFBAUP Nº 212 (1841-1) – “Officios do Governo” Maço, Cota AFBAUP Nº 212 (1841-2) – “Officios da Administração Geral do Distrito do Porto” Maço, Cota AFBAUP Nº 212 (1841-2) – “Secretaria. Expediente; correspondência recebida e minutas” Maço, Cota AFBAUP Nº 212 (1841-3) – “Varios Officios e Papéis” Maço, Cota AFBAUP Nº 212 (1868) – “Outros Documentos” •LIVROS DE REGISTOS AFBAUP, Livro Nº 7 – Officios de diversas Aucthoridades AFBAUP, Livro Nº 26 – Inventario de todos os objectos e papeis pertencentes á Secretaria da Academia Portuense das Bellas Artes

Ana Paula Nunes

71

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

AFBAUP, Livro Nº 28 – Folhas de Pagamentos dos Lentes, Substitutos e demais Empregados (de 1837 a 1847) AFBAUP, Livro Nº 29 – Folhas de Pagamentos dos Empregados da Academia Portuense das Bellas Artes (de 1847 a 1850) AFBAUP, Livro Nº 30 – Folhas de Vencimentos dos Empregados da Academia Portuense das Bellas Artes (de 1850 a 1857) AFBAUP, Livro Nº 49 – ( Programmas e outros papeis) (1844) AFBAUP, Livro Nº 105 – Actas das Conferências Ordinárias da Academia Portuense das Bellas Artes AFBAUP, Livro Nº 125 – Correspondência da Academia para o Governo AFBAUP, Livro Nº 137 – Copiador dos Officios a Aucthoridades, Lentes, Substitutos e Empregados

2. Arquivo Nacional da Torre do Tombo •MAÇO 2122 – Ministério do Reino e Instrução Pública. Pasta – Academia Nacional Belas Artes de Lisboa – 1838/1839 Pasta – Academia Portuense de Belas Artes – 1836/1843

3. Arquivo da Santa Casa da Misericórdia do Porto

- Relatorio dos Trabalhos da Mesa Administradora da Santa Casa da Misericordia do Porto (Anno Economico de 1859 a 1860) - Registo de Testamentos (dos Benfeitores), Livro 1º

DOCUMENTOS IMPRESSOS (PERIÓDICOS)

- Almanak da cidade do Porto e Vila Nova de Gaia para o anno de 1850, Porto. - Almanak da Cidade do Porto para o anno de 1846. Porto. - Artilheiro (O), Porto. - Athleta (O), Porto. - Bibliophilo (O), Revista de 1849. Ana Paula Nunes

72

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

- Brados do Alentejo. Estremoz, 1931. - Coallisão A. Porto. - Correio (O). Lisboa. - Correio de Lisboa. Lisboa. - Diario da Regencia. Lisboa. - Diario do Governo. Lisboa. - Directorio – Civil, Político, e Commercial, da Antiga, Muito Nobre, Sempre Leal, e Invicta cidade do Porto e Villa Nova de Gaya. - Directorio Civil, Político, Commercial, Histórico e Estatístico da cidade do Porto e Villa Nova de Gaya para o anno de 1846. - Examinador (O), Lisboa. - Gazeta de Lisboa. Lisboa. - Jornal de Annuncios (O). Lisboa. - Miscellânea Política. Lisboa. - Nacional (O). Lisboa. - Noticiador (O) da cidade do Porto para o anno de 1842, Porto. - Periodico dos Pobres no Porto, Porto. - The Anglo-Portuguese News. Lisboa. - Toureiro (O). Lisboa, 1836-1840.

DOCUMENTOS IMPRESSOS (MONOGRAFIAS e ARTIGOS)

- [CABRAL, Luís] - Edifícios do Porto em 1833. Álbum de Desenhos de Joaquim Cardoso Vitória Vilanova. Manuscrito 1479. Porto: Biblioteca Pública Municipal do Porto, 1987. - [Oficinas litográficas de Vilanova, Francisco Rodrigues de Faria, José Lourenço de Sousa e outras, trabalhando no Porto entre 1835 e 1849]: cf. CABRAL, Luís; MEIRELES, Maria Adelaide; e COSTA, Jorge - Joaquim Cardoso Vitória Vilanova. Litógrafo Portuense do Séc. XIX. Porto: Biblioteca Pública Municipal do Porto, 1996. - [TAVARES, Couto] – Wenceslau Cifka. Ceramista, Litógrafo e Esmaltador. (II Exposição Temporária). Catálogo. Sintra: Palácio Nacional da Pena, 1949.

Ana Paula Nunes

73

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

- [VIANA, Teresa Pereira; VASCONCELOS, Flórido de; FERRÃO, Bernardo José; et al.] João Baptista Ribeiro. Uma figura do Porto Liberal no Bicentenário do seu nascimento. Exposição (Museu Nacional Soares dos Reis, Novembro de 1990 a Janeiro de 1991). Catálogo. Porto: Universidade do Porto - Fundação Gomes Teixeira, 1990. - ALDEMIRA, Luiz Varela - Um ano trágico: Lisboa em 1836: a propósito do centenário da Academia de Belas Artes: impressões, comentários, documentos. Lisboa: La Bécarre [depos.], 1937. - ARAÚJO, Agostinho – “O Infante D. Henrique visto pela Época Romântica”, O Rosto do Infante. Exposição (Comissário científico: Pedro Dias). Convento de Cristo - Tomar / Pavilhão das Indústrias - Viseu. Catálogo. Lisboa: Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, 1994. - ARAÚJO, Agostinho - apres. em 1997 à F.C.S.H.U.N.L., s/n [Edição de Autor, com apoio da Fundação para a Ciência e a Tecnologia e do Instituto Português de Museus], 2005. - ARAÚJO, Agostinho - Experiência da Natureza e Sensibilidade Pré-Romântica em Portugal. Temas de Pintura e seu Consumo. 1780-1825, 2 vols. Tese de Doutoramento em História da Arte, Polic., apresentada à F.L.U.P., 1991. - ARAÚJO, Agostinho - O palácio neogótico de Monserrate e a sua leitura ao longo do PréRomantismo (1791-1836), (comunicação ao "I Congresso Internacional: Sintra e o Romantismo Europeu", Sintra, 23 a 27 de Setembro de 1985). Sintra: Instituto de Sintra, 1988 (sep. das Actas do Congresso supra cit., vol. II: "Romantismo - Sintra nos Itinerários de um Movimento"). - ARAÚJO, Agostinho - Uma pintura de Joaquim Vilanova, com alguns subsídios de índole biográfica e crítica (comunicação ao I Congresso sobre a Diocese do Porto "Tempos e Lugares de Memória" - Homenagem a D. Domingos de Pinho Brandão, Porto, 5 a 8 de Dezembro de 1998), in Actas do Congresso supra cit., Porto: Departamento de Ciências e Técnicas do Património da Faculdade de Letras da Universidade do Porto / Centro Regional do Porto da Universidade Católica Portuguesa / Centro de Estudos D. Domingos de Pinho Brandão, 2002. - ARAÚJO, Agostinho et al. - Jean Pillement e o Paisagismo em Portugal no Século XVIII. Catálogo, Fundação Ricardo do Espírito Santo Silva, 1997.

Ana Paula Nunes

74

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

- ARRIAGA, Dr. José de - História da Revolução Portuguesa de 1820, Porto, 4º vol. capítulo “As artes e a Revolução”, 1889. - BAPTISTA, João Maria; OLIVEIRA, João Justino Baptista de (co-autor) - Chorographia moderna do Reino de Portugal. Vol. 1. Lisboa: Typographia da Academia Real das Sciencias, 1874. - BASTO, Artur de Magalhães - O Porto do romantismo. Coimbra: Imprensa da Universidade, 1932. - Boletim da Academia Nacional de Belas-Artes – Documentos. Vol. III: Documentos relativos à Recolha e Distribuição dos Quadros e Livros após a Extinção dos Conventos (1.ª Parte). Lisboa: Academia Nacional de Belas-Artes. - BONIFÁCIO, Maria de Fátima - D. Maria II. Mem Martins: Círculo de Leitores, 2005. (Reis de Portugal; 30). ISBN 972-42-3468-1. - BONIFÁCIO, Maria de Fátima - Seis Estudos sobre O Liberalismo Português. Lisboa: Editorial Estampa, 1996. - BONIFÁCIO, Maria Fátima - «O proteccionismo como ideologia radical». Análise Social. 1988, Lisboa. ISSN 0003-2573. Vol. XXIV (4.º-5.º), n.º 103-104, pp. 1017-1036. - BRANDÃO, Júlio – Miniaturistas Portugueses. Porto: Litografia Nacional, s/d [1933?]. - BRIGOLA, João Carlos Pires - Colecções, Gabinetes e Museus em Portugal no Século XVIII, Fundação Calouste Gulbenkian / Fundação para a Ciência e a Tecnologia, 2003 - Câmara Municipal de Oeiras - A obra do pintor Silva Oeirense (1797- 1869). (Catálogo); MIRANDA, Jorge Manuel de Araújo de Oliveira. Oeiras: 1992. - CARVALHO, A. M. Lopes de - Memórias Autobiographicas, Lisboa, s.d. (1910). - CARVALHO, Augusto da Silva - Comemorações do Centenário da Fotografia. Subsídios para a história da introdução da fotografia em Portugal. Lisboa: 1940 (sep. das "Memórias da Academia das Ciências de Lisboa", tomo III). - CARVALHO, Ayres de - A Galeria de Pintura da Ajuda e as galerias do século XIX , Lisboa : [s.n.], 1982 ( Lisboa : -- Tip. Silvas). - CARVALHO, J. Santos – “Domingos António de Sequeira, desenhador e iniciador da litografia em Portugal", O Gráfico, ano IV, n.º 41. Lisboa: Dezembro de 1953.

Ana Paula Nunes

75

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

- CASTRO, Zília Osório de (dir.); CLUNY, Isabel; LOBO, Sandra e MACHADO, Adelaide (coord. Editorial); FERREIRA, Luíza e RASCÃO, Paulo (fotografias); et. al. - Lisboa 1821: A Cidade e os Políticos. Projecto Seminário Livre de História das Ideias, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas - Universidade Nova de Lisboa. Lisboa: Livros Horizonte, 1996. ISBN 972-24-0989-1. - Catálogo da Exposição Comemorativa do 1º Centenário do Montepio Geral, Lisboa, 1940. - Catálogo da Exposição Comemorativa do primeiro centenário do Montepio Geral, inaugurada em 9 de Outubro de 1940. Lisboa: Montepio Geral, 1940. - CHAGAS, Pinheiro - Diccionario popular historico, geographico, mythologico, biographyco, artistico, bibliographico e litterario. Lisboa : Lallement Freres, 18761886, 15 v. - CHAVES, Luís - Subsídios para a história da gravura em Portugal; (Subsídios para a história da arte em Portugal). Coimbra: [s.n.], 1927. - CHICÓ, Mário Tavares; SANTOS, Armando Vieira e FRANÇA, José Augusto Dicionário da pintura portuguesa. Vol. III - Lisboa: Estúdios Cor, 1973. - CORDEIRO, José M. texto, FERREIRA, Virgílio Lopes; foto - O rasgo e a vontade Associação Empresarial de Portugal; [Porto]: Exposição AEP, 2004. ISBN: 972-870217-5 - COSTA, Luís Xavier da - A obra litográfica de Domingos António de Sequeira. Com um esboço histórico dos inícios da litografia em Portugal. Lisboa: 1925 (sep. de "Arqueologia e História", vol. IV). - COSTA, Luiz Xavier da - Domingos António de Sequeira desenhador de Medalhas, (2ª comunicação), 1923. - COSTA, Luiz Xavier da - Domingos António de Sequeira e Francisco Vieira Lusitano, desenhadores de Medalhas, 1923. - COSTA, Luiz Xavier da - O Ensino das Belas-Artes nas obras do Real Palácio da Ajuda (1802 a 1833), Academia Nacional de Belas Artes, 1936. - COUTINHO, B. Xavier - Camões e as Artes plásticas : subsídios para a iconografia camoneana. Volume I e II, Porto, Livraria Figueirinhas, 1946-48. - CRUZ, Mário Pinho da, coord.; textos MARTINS, Guilherme d'Oliveira... [et al.] - Dos Secretários de Estado dos Negócios da Fazenda aos Ministros das Finanças : 1788-

Ana Paula Nunes

76

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

2006: uma iconografia. Lisboa: Secretaria-Geral do Ministério das Finanças e da Administração Pública, 2006. ISBN 978-972-9244-67-4. -

DIDI-HUBERMAN,

Georges

-

Images

Malgré

Tout.

Colection

Paradoxe,

Paris: Les Éditions de Minuit, 2005. - Documentos para a historia das Cortes Geraes da Nação Portugueza – Coordenação da Câmara dos Senhores Deputados. - Lisboa : Imp. Nacional, 1883-1891. - 8 v. - EISENMAN, Stephen F; CROW, Thomas; LUKACHER, Brian; NOCHLIN, Linda e POHL, Frances K. – HISTORIA CRITICA DEL ARTE DEL SIGLO XIX: 1ª Ed., Madrid, Ediciones Akal, 2001. ISBN: 9788446010555. - FALCÃO, Isabel - Pintura Portuguesa. Casa-Museu Dr. Anastácio Gonçalves, Instituto Português de Museus, 2003 - FARIA, Miguel Figueira de - José Joaquim Freire 1760-1847 : desenhador militar e de história natural : arte, ciência e razão de Estado no final do Antigo Regime. Dissertação de Mestrado em História da Arte (sob a orientação de Agostinho Araújo) apresentada à Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 1 vol. Porto: ed. Autor, polic., 1996. - FARIA, Miguel Filipe Ferreira Figueira de – A Imagem Impressa: Produção, Comércio e Consumo de Gravura no Final do Antigo Regime. Tese de Doutoramento em História da Arte (sob a orientação de Agostinho Araújo) apresentada à Faculdade de Letras da Universidade do Porto. 2 vols. Porto: ed. Autor, polic., 2005. - FEIO, Alberto - Um Artista Minhoto. Braga: Oficinas Gráficas "Pax", 1946 (sep. do vol. I de "Minia", Revista do Instituto Minhoto de Estudos Regionais). - FERNANDES, Lopes - Memória das medalhas e condecorações portuguesas e das estrangeiras com relação a Portugal, 1861. - FERREIRA-ALVES, Joaquim Jaime B. - Os Nascimentos dos Infantes D. Isabel Maria (1801) e D. Miguel (1802), Estudos em Homenagem a Luís António de Oliveira Ramos, Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 2004, p. 527-535. - FRANÇA, José Augusto – O Retrato na Arte Portuguesa. [Lisboa]: Livros Horizonte, [1981]. - (Colecção Estudos de Arte). - FRANÇA, José Augusto - A Arte portuguesa de oitocentos; Lisboa, Instituto de Cultura portuguesa, 1979.

Ana Paula Nunes

77

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

- FRANÇA, José-Augusto - A Arte em Portugal no Século XIX, 2 vols., 3.ª ed. Lisboa, Livraria Bertrand, 1990. - FREITAS, Eugénio de Andrea da Cunha e – “Notas de História, de Arte e de Arqueologia. XXII - Artistas portuenses em 1850”, Diário do Norte. Porto: 10 de Outubro de 1951. - GARCIA, M. Graça Silva; FRANÇA, José-Augusto (pref. de) - Luís de Camões : Álbum de Estampas. Lisboa, Ed. Banco de Portugal, 1983. - GOMES, Paulo Varela - A Cultura Arquitectónica e Artística em Portugal no Séc. XVIII, Editorial Caminho, 1988 - Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira. Lisboa: Editorial Enciclopédia, [1960] - HEERINGEN, Gustav Adolf von, (1799-1851) – Meine Reise nach Portugal im Fruehjare 1836. Leipzig: Brockaus, 1838. 2 vols. APUD KULMACZ, Maria Clara Loureiro Borges Paulino - Arte e património em Portugal: olhares norte-europeus (da segunda metade do século XVIII a meados do século XIX). Porto: Dissertação de mestrado em História da Arte em Portugal (sob a orientação de Agostinho Araújo), apresentada à Faculdade de Letras da Universidade do Porto: Edição de 2001, 2 vols. - História breve dos primeiros 100 anos do Montepio Geral, Lisboa, 1940. - INOCÊNCIO - Diccionário Bibliographico, vol.III.

- JATTA, Barbara coord. - Francesco Bartolozzi. Desenhos de um gravador (27 Junho-29 Setembro 1996); Museu Nacional de Arte Antiga. Instituto Português de Museus; Lisboa: Instituto Português de Museus, 1996. ISBN: 972-8137-51-6. - KULMACZ, Maria Clara Loureiro Borges Paulino - Arte e património em Portugal: olhares norte-europeus (da segunda metade do século XVIII a meados do século XIX). Porto: Dissertação de mestrado em História da Arte em Portugal (sob a orientação de Agostinho Araújo), apresentada à Faculdade de Letras da Universidade do Porto: Edição de 2001, 2 vols. - LAMAS, Dr. Artur - Medalhas portuguesas e estrangeiras referentes a Portugal. Memória - LIMA, Henrique de Campos Ferreira - "Um documento iconográfico relativo à Batalha de Santa-Bárbara em 13 de Março de 1823", Portucale, vol. XVI, Porto, 1943. - LIMA, Henrique de Campos Ferreira – “Alentejanos em destaque. João Macphail o famoso litógrafo e desenhador de costumes portugueses era filho de um oficial inglês que

Ana Paula Nunes

78

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

serviu no exército português durante a Guerra Peninsular”, Brados do Alentejo. Estremoz: 4 de Julho de 1943. - LIMA, Henrique de Campos Ferreira – “António Manuel da Fonseca, litógrafo”, Museu, n.º 6. Porto: 1944. - LIMA, Henrique de Campos Ferreira – “Colecções de Estampas. Apontamentos Bibliográficos”, Anais das Bibliotecas e Arquivos, II série, vol. VII. Lisboa: 1926. - LIMA, Henrique de Campos Ferreira - “História da Litografia no Porto”, O Tripeiro, 5.ª série, vol. I, n.º 5. Porto: Setembro de 1945. - LIMA, Henrique de Campos Ferreira – “João Macphail, litógrafo estremocense”, Brados do Alentejo. Estremoz: 11 de Janeiro de 1942. - LIMA, Henrique de Campos Ferreira – “João Macphail”, The Anglo-Portuguese News. Lisboa: 1 de Julho de 1943. - LIMA, Henrique de Campos Ferreira – “O artista Silva Oeirense e a sua colecção de retratos dos heróis da Revolução de 1820”, Anais das Bibliotecas e Arquivos, vol. X, n.os 37-38. Lisboa: 1932. - LIMA, Henrique de Campos Ferreira - “O pintor José Alves Ferreira Lima, litógrafo”, Museu, vol. II, Porto, 1943. - LIMA, Henrique de Campos Ferreira – “Retratos litografados de artistas líricos dos Teatros de S. Carlos e Lisboa e de S. João do Porto”, Revista de Guimarães, vol. LI, n.º 4. Guimarães: Sociedade Martins Sarmento, Outubro-Dezembro de 1941. - LIMA, Henrique de Campos Ferreira – “Retratos litografados de artistas líricos dos Teatros de S. Carlos e Lisboa e de S. João do Pôrto (2.ª série)”, Revista de Guimarães, vol. LII, n.º 1. Guimarães: Sociedade Martins Sarmento, Janeiro-Março de 1942. - LIMA, Henrique de Campos Ferreira – “Senhoras que, em Portugal, se dedicaram à arte litográfica”, Museu, vol. I, n.º 3. Porto: Dezembro de 1942. - LIMA, Henrique de Campos Ferreira - Alguns artistas portugueses e estrangeiros no Arquivo Histórico Militar, Separata do Tomo 2º da “Revista de Arqveologia”, Lisboa, 1935. - LIMA, Henrique de Campos Ferreira - Cartas dirigidas pelo Conde de Raczinski a Ferdinand Denis, Lisboa, 1932.

Ana Paula Nunes

79

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

- LIMA, Henrique de Campos Ferreira - Catálogo da Exposição Iconográfica de D. João VI e a sua época, Lisboa, 1929. - LIMA, Henrique de Campos Ferreira - Joaquim Rafael, pintor e escultor portuense, Coimbra, 1923. - LIMA, Henrique de Campos Ferreira – O Conde Palatino António Jacinto Xavier Cabral. Calígrafo e Gravador. (Com um Esbôco histórico àcêrca das Belas-Artes Plásticas em Portugal, de 1820 a 1823). Coimbra: Universidade de Coimbra, 1946 (sep. da “Revista da Universidade de Coimbra”, vol. XVI). - LIMA, Henrique de Campos Ferreira - O Dr. Xavier da Costa e a História das Belas-Artes Menores em Portugal, V. N. de Famalicão, 1943 - LIMA, Henrique de Campos Ferreira - O Ensino, Em Portugal, Da Arte Litográfica Nos Colégios, Separata da Revista “Museu”, vol. II, Porto, 1943 - LIMA, Henrique de Campos Ferreira - O pintor Sequeira no Arquivo Histórico Militar, Lisboa, 1931 - LIMA, Henrique de Campos Ferreira – Silva Oeirense, litógrafo. Porto: Círculo Dr. José de Figueiredo, 1943, sep. de “Museu”, vol. I, n.º 1. Porto: Círculo Dr. José de Figueiredo, 1942. - LIMA, Henrique de Campos Ferreira - Subsídios para a História da Litografia em Portugal. Vila Nova de Famalicão: Minerva, 1942. - LISBOA, Maria Helena; As Academias e Escolas de Belas Artes e o Ensino Artístico (18361910), Edições Colibri - Instituto de História da Arte / Estudos de Arte Contemporânea, F.C.S.H.U.N.L., 2007. ISBN: 972-772-688-7. - MACHADO, Cirilo Wolkmar; paleografia INÁCIO, Ana Calado; transcr., pref. e notas BERGER, Francisco Gentil; nota de abertura BRANDÃO Augusto Pereira - Tratado de arquitectura & pintura. Lisboa : Fundação Calouste Gulbenkian, 2002. - MACHADO, Cirilo Volkmar, Collecção de Memórias relativas às vidas dos Pintores e Escultores, Coimbra, Imprensa da Universidade, 1823. - MADAHIL, António Gomes da Rocha - Trajos e Costumes Populares Portugueses do Século XIX, em litografias de Joubert, Macphail e Palhares. s/l [Lisboa]: Panorama, 1968.

Ana Paula Nunes

80

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

- MESQUITA, João Carlos de Vilhena e César - A Ilustração nas Publicações Periódicas Portuguesas (1820-1850), 3 vols. Dissertação de Mestrado em História da Arte apresentada à Faculdade de Letras da Universidade do Porto (sob a orientação de Agostinho Araújo). Porto: ed. do Autor, policop., 1997. - MORAIS, Maria Antonieta Lopes Vilão Vaz de - Pintura nos séculos XVIII e XIX na galeria de retratos dos benfeitores da Santa Casa da Misericórdia do Porto. Porto : Dissertação para a candidatura ao grau de Mestre em História de Arte em Portugal (sob a orientação de Agostinho Araújo) [Edição do Autor], 2001. - MOREIRA, Fernando – «As dinastias liberais. Relações de parentesco entre membros do parlamento no período da monarquia constitucional (1834-1910)». Análise Social, 2006, Lisboa. ISSN 0003-2573. Vol. XLI, nº.178, 2006, p.125-143. - MURTA, Guerreiro: Álvares Botelho e o Montepio Geral: discurso proferido na inauguração do mausoléu consagrado ao iniciador da secular instituição mutualista e de crédito. Lisboa: Montepio Geral, 1968. - NANCY, Jean-Luc - Le Regard du Portrait. Paris: Éditions Galilée, 2000. - NEVES, António Amaro das e BERNARDO, Carlos António Alves - Francesco Bartolozzi e os seus discípulos, Exposição de gravuras dos séculos XVIII e XIX, CATÁLOGO, Sociedade Martins Sarmento, Casa de Sarmento – Centro de Estudos do Património, Guimarães 2004. - O Montepio Geral e o seu iniciador: parecer duma proposta. Lisboa: Montepio Geral, 1939. - O tripeiro – Associação Comercial do Porto, Porto nº 8, Dezembro de 1948, V Série – Ano IV, p. 189. - PAMPLONA, Fernando de - Um século de pintura e escultura em Portugal. - PASSOS, Carlos - “Os Cálices Góticos do Porto”. Revista Lusíada. Porto. Nº 7, 1955, pp. 185-187. - PASSOS, Dr. Carlos de - A Arte Litográfica, 1932 - PEREIRA,

Firmino - O Porto d'Outros Tempos:

Notas Históricas – Memorias -

Recordações. Porto: Livraria Chardron, de Lello & Irmão, 1914. - PEREIRA, Gaspar Martins, A População de Cedofeita em Meados do Séc. XIX, in Revista da Faculdade de Letras, pag 253 a 298.

Ana Paula Nunes

81

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

- PEREIRA, Maria da Conceição Meireles - O Porto no tempo de Garrett. Porto: Biblioteca Pública Municipal do Porto, 2000. ISBN 972-634-103-5 - PINHEIRO, Magda - Luis Mousinho de Albuquerque. Um Intelectual na Revolução. Lisboa, Fundação Maria Manuela e Vasco de Albuquerque D'Orey, Quetzal Editores, 1992. - PONTÉVIA, Jean-Marie – "Tout peintre se peint soi-même: Ogni Dipintore Dipinge Sè", Ecrits sur l’art et pensée detaches. Vol.III, Bordeaux, William Blake & Cie, Bordeaux, 2002. ISBN – 2841030970. - Pôrto - ENCICLOPEDIA PELA IMAGEM: História. Porto: Livraria Lello, Lda., [19--?]. - QUEIROZ, José Francisco Ferreira - Os cemitérios do Porto e a Arte Funerária oitocentista em Portugal : consolidação da vivência romântica na perpetuação da memória. Dissertação de doutoramento em História da Arte, apresentada à Faculdade de Letras da Universidade do Porto (sob a orientação de Agostinho Araújo). 3 vol. Porto: [Edição do Autor], 2002. - RACZYNSKI, A. - Dictionnaire Historico-Artistique du Portugal pour faire suite à l’ouvrage ayant pour titre: Les Arts en Portugal. Lettres adressées à la Société artistique et scientifique de Berlin accompagnées de documens. Par Le Comte A. Raczynski. Paris: Jules Renouard et C.ie, Libraires-Éditeurs, et Commissionnaires pour l’ Étranger, 1847. - RACZYNSKI, A. - Les Arts en Portugal. Lettres adressées a la Société Artistique et Scientifique de Berlin, et accompagnées de documens. Par Le Comte A. Raczynski. Paris: Jules Renouard et C.ie, Libraires-Éditeurs, et Commissionnaires pour l’ Étranger, 1846. - RAMOS, Carlos; Dois séculos de modelo vivo 1765-1965: Homenagem a Calouste Gulbenkian no décimo aniversário da sua morte, catálogo. Escola Superior de Belas Artes do Porto, Porto 1966. - RAMOS, Rui, A formação da intelligentsia portuguesa (1860-1880), investigação iniciada no âmbito do projecto «As elites e o poder em Portugal: da Regeneração à República», in, Análise Social, vol. XXVII (116-117), 1992 (2.°-3.°), 483-528. - Refutação analytico-juridica do folheto intitulado Questão ácerca do agio do papel-moeda, que, em Novembro de 1842, foi publicado por parte de L. Silveira, M. J. Pimenta e Comp.ª . Lisboa : Typ. da Sociedade Propagadora dos Conhecimentos Uteis, 1843.

Ana Paula Nunes

82

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

- REIS, António do Carmo - A Imprensa do Porto Romântico (1836-1850): Cartismo e Setembrismo. Lisboa: Livros Horizonte, 1999. ISBN 972-24-1093-8 - RIBEIRO, Aquilino, Oeiras - Câmara Municipal, 2ª ed.1980 - RIBEIRO, Aquilino, Oeiras – Monografia, Lisboa, 1941 - RODRIGUES, Carlos Telo - Maurício José Sendim. Professor e Litógrafo (1790-1870), 3 vols. Dissertação de Mestrado em História da Arte em Portugal apresentada à Faculdade de Letras da Universidade do Porto (sob a orientação de Agostinho Araújo). Porto: ed. do Autor, polic., 2001. - SALDANHA, Nuno - Artistas, Imagens e Ideias na Pintura do Século XVIII, Livros Horizonte, 1995 - SALDANHA, Nuno - Poéticas da Imagem. A Pintura nas Ideias Estéticas da Idade Moderna, Editorial Caminho, 1995 - SANTOS, Paula M. M. Leite - Um coleccionador do Porto romântico. João Allen (17811848). Dissertação de Mestrado em Museologia e Património, sob a orientação de Henrique Coutinho Gouveia e Agostinho Araújo, apres. em 1997 à F.C.S.H.U.N.L., s/n [Edição de Autor, com apoio da Fundação para a Ciência e a Tecnologia e do Instituto Português de Museus], 2005 - SEVERO, Portela - A cidade do Porto. Porto: Companhia Portugueza Editora, L.DA, [19--]. - SOARES, Ernesto – “A Oficina Régia Litográfica: pequenas achegas para o estudo da História da Litografia em Portugal”, Arqueologia e História, vol. X. Lisboa: 1932. - SOARES, Ernesto - Dicionário de Iconografia Portuguesa (Retratos de Portugueses e de Estrangeiros em relações com Portugal), 2 vols. (sup.). Lisboa: Instituto de Alta Cultura, 1947-1960. - SOARES, Ernesto - Francisco Bartolozzi e os seus discípulos em Portugal, Gaia: Ed. Apolino, 1930. - SOARES, Ernesto - História da Gravura Artística em Portugal: os Artistas e as suas Obras. 2 vols. Instituto para a Alta Cultura, Lisboa, [s.n.], 1940-1941. - SOARES, Ernesto (org. e prefácio) - Inventário da Colecção de Estampas. Série Preta. Lisboa: Biblioteca Nacional de Lisboa, 1975.

Ana Paula Nunes

83

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

- SOARES, Ernesto; e LIMA, Henrique de Campos Ferreira - Dicionário de Iconografia Portuguesa (Retratos de Portugueses e de Estrangeiros em relações com Portugal), 5 vols. Lisboa: Instituto de Alta Cultura, 1947-1960. - TEIXEIRA, José - D. Fernando II : Rei-Artista, Artista-Rei. Lisboa : Fundação da Casa de Bragança, 1986. - VALENTE, Vasco Pulido - Portugal - Ensaios de História e de Política. Lisboa: Editora Aletheia, 2009. ISBN: 9789896221621. - VALENTE, Vasco Pulido - Uma Educação Burguesa: Notas Sobre a Ideologia do Ensino no Século XIX. 27º volume. Lisboa: Editor: Livros Horizonte, 1974. - VASCONCELOS, A. Tibúrcio de - Sociedade Martins Sarmento. Colecção de estampas e índice de gravadores. Guimarães: 1931 (sep. da "Revista de Guimarães", vol. XLI). - VASCONCELOS, Luís Teixeira de, Oeiras de ontem, de hoje e de amanhã [S.l.: s.n.], 1941 - ( Lisboa -- Imprensa Portugal-Brasil) - VITORINO, Pedro – “Museus, Galerias e Colecções. VIII - Miniaturistas e Litógrafos”, Revista de Guimarães, vol. XLI, n.º 3. Guimarães: Sociedade Martins Sarmento, Julho-Setembro de 1931. - VITORINO, Pedro – “Museus, Galerias e Colecções. XIX - Litografias de João Baptista Ribeiro”, Revista de Guimarães, vol. XLIX, n.º 3-4. Guimarães: Sociedade Martins Sarmento, Julho-Dezembro de 1939. - VITORINO, Pedro – “Museus, Galerias e Colecções. XXI - J. C. Vila Nova, desenhador, gravador e litografo”, Revista de Guimarães, vol. LI, n.º 1-2. Guimarães: Sociedade Martins Sarmento, Janeiro-Junho de 1941. - VITORINO, Pedro – “Um cálice do século XVI”. Portucale; revista ilustrada de cultura literária, scientífica, e artística. Porto. Vols. 4-5, 1931, pp. 271-273. - VITORINO, Pedro; e BASTO, A. de Magalhães - Catálogo da Exposição Histórica do Pôrto (Junho de 1934). Porto: Câmara Municipal do Porto, 1935. histórica e descritiva, 1916.

Ana Paula Nunes

84

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

DOCUMENTOS ELECTRÓNICOS

CARVALHO, José Alberto Seabra - O Retrato ao Serviço da História [ca.8]. [Em linha]. Lisboa: Secretaria-Geral do Ministério das Finanças e da Administração Pública, 2006 - actual.2009. [Consult. 06 Set. 2009]. Disponível em: http://www.sgmf.pt/Institucional/Historia/Indice/Documents/f887640b0ab547b9a92bf d35fc8f19f9ensaios2_joséalbertoseabracarvalho.pdf. Inglaterra. National Portrait Gallery. [Em linha]. Londres: 2009. [Consulta em 15 Set. 2009]. Disponível em www: http://www.npg.org.uk/ Portugal. Biblioteca Nacional – Biblioteca Nacional Digital [Em linha]. Lisboa: BN, 2002. [Consulta em 07 Set. 2009]. Disponível em www: http://purl.pt/5303 Portugal. Ordens de Cavalaria da Real Casa de Portugal [Em linha]. Lisboa: BN, 2002. [Consulta em 08 Set. 2009]. Disponível em www: .royalhouseofportugal.org/.../chivalric.html Portugal. Santa Casa da Misericórdia. [Em linha]. Porto: 2009. [Consulta em 15 Set. 2009]. Disponível em www: http://www.scmp.pt/pagegen.asp?SYS_PAGE_ID=897440

DOCUMENTOS ICONOGRÁFICOS

- Colecção de gravuras da BPMP - Desenhos aguarelados do MAR - Fotos da Autora

Ana Paula Nunes

85

Silva Oeirense (1797-1868)

2009

ÍNDICE VOLUME I

Resumo Abreviaturas e Siglas Agradecimentos Apresentação Introdução 1. O HOMEM E A SUA ÉPOCA 2. O PINTOR 3. O GRAVADOR E DESENHADOR 4. O COLECCIONADOR E O “MARCHAND” DE ARTE 5. O PROFESSOR 5.1. A ACADEMIA DE LISBOA 5.1.1. O “CASO” ANTÓNIO MANUEL DA FONSECA 5.2. A ACADEMIA DO PORTO 6. CONCLUSÃO

I II IV VI 1 4 15 45 52 58 59 62 64 69

VOLUME II

ANEXO I Apresentação

2

Abreviaturas Documentação Transcrita

2 3

1. Arquivo Nacional da Torre do Tombo 2. Arquivo da Faculdade de Belas Artes do Porto 3. Arquivo da Santa Casa da Misericórdia do Porto 4. Periódicos 5. Outros ANEXO II ANEXO II - A ANEXO II - B ANEXO II - C

Ana Paula Nunes

86

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.