FREQUÊNCIA DE NEVOEIRO NA CIDADE DE SÃO PAULO

July 27, 2017 | Autor: Gustavo Armani | Categoria: Climate Change, Climate Change Impacts, Urban Climate, Urban Climatology
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FREQUÊNCIA DE NEVOEIRO NA CIDADE DE SÃO PAULO Gustavo ARMANI¹, Frederico Luiz FUNARI², Márcia Elizabeth HAEGELY³ 1

Doutor, Geógrafo - Instituto Geológico - SMA - SP ([email protected]) Doutor, Geógrafo - Laboratório de Hidrometeorologia - IAG - USP ([email protected]) 3 Estagiária (meteorologia) - Instituto Geológico - SMA - SP ([email protected]) 2

RESUMO: O presente trabalho analisa a frequência de dias com nevoeiro na cidade de São Paulo e sua relação com outros atributos climáticos, tais como a temperatura do ar, temperatura do ponto de orvalho e umidade relativa. Foram utilizados dados da Estação Meteorológica do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) – USP, localizada no Parque Estadual das Fontes do Ipiranga (PEFI) no período de janeiro de 1958 a dezembro de 2007, detalhando a análise em termos horários no período de janeiro de 1992 a dezembro 2007. Nos 50 anos detectou-se uma diminuição do fenômeno, sendo que para o período 1992 a 2007 análises estatísticas de regressão linear mostraram um ligeiro aumento do número de dias com nevoeiro no período. Nos três anos padrão, a duração mais frequente do fenômeno é de uma hora, decrescendo com comportamento exponencial até o máximo observado, que foi de apenas um caso de dez horas de duração em 2007. PALAVRAS CHAVE: nevoeiro, climatologia, clima urbano, São Paulo.

ABSTRACT: The aim of this work is to analyze the frequency of days with fog in São Paulo and its relation to other climatic attributes such as air temperature, dew point and relative humidity. The data were obtained at Meteorological Station of the University of São Paulo Institute of Astronomy, Geophysics and Atmospheric Sciences (IAG-USP), located at Parque Estadual das Fontes do Ipiranga (PEFI) for the period from 1958 to 2007, detailing the analysis in time from January 1992 to December 2007. In 50 years it was detected a decrease in the phenomenon, and for the period 1992 to 2007 statistical analysis of linear regression shows an increasing in the frequency of the phenomenon in these 16 years, especially in the winter (June to August), as well as an increase in temperature and a decrease in relative humidity in the city of São Paulo. In the three standard-years the duration of the phenomenon more frequent is one hour, decreasing exponentially up to the maximum observed, that was just a case of ten-hour in 2007.

KEYWORDS: fog, climatology, urban climate, São Paulo.

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INTRODUÇÃO O nevoeiro é caracterizado como um fenômeno meteorológico, ligado, via de regra, à estabilidade da atmosfera, e obstrui a visibilidade horizontal. O nevoeiro é a condensação da umidade sob a forma de gotículas menores que 60 microns, com seu tamanho mais freqüente em torno de 12 microns (LA CUESTA e MARTINEZ, 1993). Uma das suas propriedades é não conseguir molhar os objetos em contacto com ele. Já as partículas maiores que 60 microns, molham os objetos, pois suas partículas não contornam os objetos, e, sim, chocam-se contra a sua superfície. Neste caso o fenômeno é denominado neblina (TUBELIS e NASCIMENTO, 1980). O processo termodinâmico da condensação é sempre o mesmo, mas as situações e condições meteorológicas de sua formação imprimem características próprias, promovendo diferentes tipos de nevoeiros. A formação desse fenômeno está principalmente condicionada pelas seguintes condições: 1) Existência de partículas higroscópicas (núcleos de condensação); 2) Umidade no ar; 3) Resfriamento; 4) Vento calmo (normalmente). O nevoeiro de superfície ocorre com céu claro, e os bancos de nevoeiro são comuns sobre lagos e florestas. Meteorologicamente, o nevoeiro é uma nuvem Stratus junto ao solo que reduz a visibilidade. A formação do nevoeiro é um processo complexo, derivado de processos de radiação, advecção, evaporação e mistura. É possível classificar os nevoeiros conforme sua gênese, sendo que a proximidade com o solo é o principal fator de origem. Segundo Serra (1977) existem os seguintes tipos de nevoeiro: a) Nevoeiro marítimo – ocasionado pela advecção de ar quente sobre mar frio; b) Nevoeiro de rampa – formado pela ascensão de ar nas montanhas (descompressão adiabática); c) Nevoeiro de radiação- resultante do resfriamento noturno, agrava-se sobre o continente e nas formas côncavas do solo como os vales. O maior número de noites limpas permite grande freqüência deste tipo de nevoeiro, nas estações da primavera e outono; d) Nevoeiro de advecção – proveniente da passagem de ar quente sobre solo mais frio. e) Nevoeiro de vapor – neste tipo se enquadram os nevoeiros formados sobre rios e lagos, decorrentes da evaporação da superfície líquida para um ar mais frio; 2

f) Nevoeiros frontais – as gotas de chuva que caem das nuvens atravessam muitas vezes, ar apenas úmido e frio, no qual se evaporam. Tal condição pode ultrapassar a saturação, formando então nevoeiro, quando o fenômeno atinge a superfície. Serra (1977) estabeleceu cartas mensais de ocorrência de nevoeiro em seu Atlas Climatológico do Brasil (1969), onde foram delineadas as regiões e Estados onde valores máximos e mínimos da ocorrência podem ser visualizados. Na escala microclimática Geiger (1980), estudou os efeitos de topografia, inversões térmicas e fluxos de calor relacionados com o fenômeno. Como o nevoeiro é um fenômeno que prejudica bastante a área de transportes tanto rodoviário como aéreo, existem para o nosso país, vários trabalhos sobre o assunto. Dessa forma, Cabral (1991, 1998, 2005) investigou a ocorrência de nevoeiro nos aeroportos de Guarulhos e Congonhas na cidade de São Paulo, e na cidade de São José dos Campos - SP. Segundo este autor está ocorrendo uma diminuição na freqüência do fenômeno, devido ao aumento das temperaturas mínimas e médias e do efeito da urbanização nas proximidades dos citados aeroportos. O período de dados analisado foi de 1969 a 2000. Além disso, a ocorrência da brisa marítima na parte da tarde possibilita a formação de nevoeiro. Villela (1992) estudou a freqüência e número de horas da ocorrência do fenômeno no aeroporto de Congonhas no período de 1982-1991, e verificou que de maio a agosto é a época que ocorre mais nevoeiro nesta localidade. Piva e Fedorova (1998) concentraram seus estudos no nevoeiro de radiação, suas características, duração e análise sinótica para o aeroporto Salgado Filho (Porto Alegre-RS). Nesta localidade o nevoeiro ocorre mais no outono (72,7 %). Uma análise estatística, termodinâmica e de previsão para nevoeiro foi feita por Oliveira e Fedorova (1998) para Pelotas-RS no período de 1995-1996. Eles constataram que a estação em que ocorre a maioria dos nevoeiros é o outono. A partir de uma correlação entre o nevoeiro e as variáveis meteorológicas umidade relativa, temperatura, pressão e vento, aliada à análise sinótica para o período de março e maio de 1998 conseguiram estabelecer uma previsão com acerto de 95%. Perella e Sakuragi (1998) avaliaram o número de horas e a média horária em S. José dos Campos – SP, constatando que o horário mais freqüente para a ocorrência de nevoeiro é das 5 às 9h, e que está havendo uma diminuição na freqüência de nevoeiros. Reboita e Krusche (2000) fizeram uma análise da ocorrência do fenômeno na cidade gaucha de Rio Grande e verificaram que a maioria dos nevoeiros ocorre na parte da manhã. Estudando três cidades de Santa Catarina (Ararangua, Urussanga e São Joaquim) Monteiro (2007) fez uma análise comparativa desse fenômeno nessas três localidades constatando que S. Joaquim é a que apresenta o maior número de dias de nevoeiro por ano (30 dias), sendo o 3

fator preponderante mais importante a altitude. Petto Jr. (2008) fez um estudo de tendência da ocorrência de nevoeiro no período 1933 a 2005 na Região Metropolitana de São Paulo (RMSP) utilizando um modelo que simula o fenômeno. Ele verificou que existe uma tendência de queda do número de dias de nevoeiro e a incidência de nevoeiro é maior com umidade relativa do ar acima de 98%. Uma comparação entre as séries de registro de nevoeiro em Porto Alegre e Congonhas - SP foi realizada por Araujo et al.(2008) que verificou a diminuição da ocorrência de nevoeiro no período de 1975-2005, constatando a influência do aumento das temperaturas nas duas localidades. Ainda usando dados de Porto Alegre, Almeida (2008) realizou um trabalho sobre a freqüência e horas de início e duração de nevoeiro e avaliou a diminuição deste último. Costa (2008) realizou um levantamento estatístico do comportamento do nevoeiro de 1972 a 2004, no aeroporto de Guarulhos-SP constatando que o fenômeno diminuiu. O presente estudo tem como objetivos analisar a freqüência (anual, mensal, diária e horária) de nevoeiros (N) e discutir suas possíveis relações com a temperatura do ar (T), umidade relativa (UR), e temperatura do ponto de orvalho (Td) para a cidade de São Paulo no período de 1958 a 2007, sendo esta análise detalhada em nível horário para o período 1992-2007.

MATERIAL E MÉTODOS Os dados (anuais, mensais, diários e horários) de ocorrência de N, T e Td (°C), UR (%) foram coletados na Estação Meteorológica do IAG-USP, instalada no Parque Estadual das Fontes do Ipiranga (PEFI), na zona sul da cidade de São Paulo (latitude: 23°39’S; longitude: 46°37’W; altitude: 799,22 m, com registro na Organização Meteorológica Mundial – OMM, sob o número 83.004). A observação de N é feita visualmente pelo observador meteorológico da estação, sendo sua intensidade realizada de forma indireta pela visibilidade horizontal. Neste trabalho não se utilizou os dados de visibilidade. O observador anota sua ocorrência na folha de observação no espaço reservado para fenômenos diversos. Esse fenômeno é registrado pelo observador e posteriormente revisado por técnicos, sendo que as falhas de observação podem ser consideradas nulas, ou praticamente nulas, já que eventuais dúvidas são dirimidas no cruzamento entre dois ou mais elementos. Por exemplo, é impossível ocorrer N com visibilidade igual a 6. Como o período de observação da estação é das 07:00 h às 24:00 h, durante a madrugada não há registro de fenômenos e nem de nebulosidade; caso, eventualmente, ocorra formação de N neste intervalo e ele se dissipar antes das 07:00h, a ocorrência do fenômeno não será 4

registrada. O período da madrugada, entre 00:00h e 07:00h é um dos que, a partir da literatura consultada, o fenômeno aumenta gradualmente até o início da manhã. Este fato prejudica em parte este estudo, pois algumas das ocorrências de N não foram registradas. A partir do conjunto dos dados foram elaboradas tabelas com o registro diário de N (sim ou não) e dos totais mensais e anuais de dias de ocorrência e de duração do fenômeno para o período de 1958 a 2007. Para o período de 1992 a 2007 realizou-se uma análise mais refinada na escala horária. Para se verificar a variação de N, T, Td, UR com o tempo cronológico foi realizada uma análise de regressão linear pelo método dos mínimos quadrados, a partir de dados diários. Nos gráficos de tendência anual dos atributos, optou-se por realizar a apresentação sem os dados diários no intuito de não poluir visualmente os gráficos muito embora as análises tenham sido conduzidas a partir de dados diários. Foram elaborados vários histogramas de freqüência para detectar quais classes são mais frequentes com nevoeiro e quais os meses com mais formação do fenômeno. Foi calculada a frequência de T, Td e UR durante a ocorrência de N. Quando a duração do fenômeno foi maior que uma hora foi calculada a média aritmética dos valores desses horários.

RESULTADOS E DISCUSSÃO A princípio uma análise rápida indica a diminuição de ocorrência de N na cidade de São Paulo no período 1958 a 2007 (Figura 1). Entretanto, deve-se observar que a distribuição de frequência apresenta dois patamares. O primeiro oscila com frequências em torno de 140 dias de N no ano e compreende o período de 1958 a 1972; o segundo patamar mantém a ocorrência de N na faixa de 70 dias por ano e situa-se entre os anos 1990 a 2007. Entre estes dois patamares ocorreu um pico durante a década de 1970, com seu máximo entre 1975 e 1976 (acima de 210 dias de N no ano, ou cerca de 60% do ano); depois desse pico a frequência de N diminuiu progressivamente até meados da década de 1980. Este pico de N pode estar relacionado a algum ciclo de longa duração, à poluição industrial desenfreada da década de 1970, que lançou mais núcleos higroscópicos na atmosfera, ou à elevada atuação de sistemas atmosféricos favoráveis à formação de N. Este período merece um estudo detalhado quando dados horários estiverem disponíveis para serem utilizados.

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FIGURA 1. Número de dias com nevoeiro em São Paulo (série 1958-2007).

A frequência mensal de nevoeiro no período de 1958 a 2007 (Figura 2a) indica que o outono e o inverno são as estações em que predomina a ocorrência do hidrometeoro, sendo junho o mês com maior ocorrência. O verão e a primavera apresentam relativamente poucas ocorrências de nevoeiros em relação ao outono-inverno. Esses resultados concordam com aqueles obtidos por Cabral (1991, 1998, 2005), Villela (1992) e Serra (1977). Separando-se estes 50 anos (1958-2007) em três períodos comentados anteriormente (dois patamares e um pico), observa-se que a freqüência de nevoeiros nos meses muda conforme o período (Figuras 2a, 2b, 2c, 2d). O período de 1958 a 1972 (14 anos) (Fig. 2b) tem praticamente a mesma configuração da distribuição mensal do período de 50 anos, com o outono-inverno com um número relativamente maior de ocorrências que a primavera-verão, sendo que do verão para o outono e inverno há um aumento progressivo da frequência de nevoeiros até junho. Durante o pico da década de 1970 e 1980 houve um aumento considerável na freqüência de nevoeiros no verão, principalmente em fevereiro e março, e no início do outono, nos meses de abril e maio (Fig. 2c). Já no segundo patamar da figura 1, período 1992-2007, o verão e os meses iniciais de outono, abril e maio, houve uma redução significativa na freqüência de nevoeiros (Fig. 2d). Fica difícil explicar essas mudanças na freqüência mensal do nevoeiro, mas provavelmente estão relacionadas aos padrões de circulação atmosférica. Um cruzamento mais cuidadoso entre outras variáveis aliado a análises sinóticas podem ajudar a explicar esse padrão. Talvez o cruzamento com boas séries de dados de poluição do ar da cidade de São Paulo possam ajudar também a explicar esse padrão.

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FIGURA 2. Frequência relativa mensal de nevoeiro: (a) período de 1958 a 2007; (b) período de 1958 a 1972 (1° patamar); (c) período de 1973 a 1989 (pico); (d) período de 1990 a 2007 (2° patamar).

Pôde-se perceber que no período 1992-2007 foi mais frequênte a ocorrência do fenômeno N com duração de uma hora, apresentando um decrescimento exponencial até o valor máximo observado, que corresponde a um caso de dezoito horas de duração de N. Neste evento máximo é provável que N tenha durado 24 horas, pois as seis horas restantes para integrar as 24 horas restantes são aquelas em que não há observação na estação meteorológica. No entanto, isso é impossível de se confirmar com estes registros. Verificou-se que a ocorrência de N se dá principalmente ao amanhecer e ao anoitecer (Figura 3b), quando T é normalmente mais baixa e UR relativamente mais alta. Os nevoeiros do período da manhã são preferencialmente decorrentes da perda noturna de radiação, e aqueles do final da tarde relacionados à entrada da brisa marina, conforme sugeriu Cabral (2005). Para que haja ocorrência de nevoeiro próxima ao período mais quente do dia a UR deve estar alta, fato relativamente mais raro, já que é o período com maior radiação solar e aquecimento, Estes nevoeiros devem ser decorrentes ou de passagens frontais, ou inseridos em sistemas polares Atlânticos, que injetam umidade oceânica na cidade de São Paulo a baixas temperaturas.

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(a)

(b)

FIGURA 3. Frequência de nevoeiro em São Paulo (série 1992-2007): (a) tempo de duração; (b) horário de ocorrência

A partir da análise da distribuição de frequência de dias e horas de duração de ocorrência do fenômeno (Figuras 4a e 4b), foram selecionados os anos padrão, ou seja, anos que apresentaram valores máximos e mínimos. O ano de 1995 apresentou o menor número de dias de ocorrência de N, enquanto que 2007 apresentou o maior número de dias. Em relação ao número de horas de duração, 1996 classificou-se como mínimo e 2007 como máximo.

(a)

(b)

FIGURA 4. Nevoeiro em São Paulo de 1992 a 2007: a) número de dias; b) número de horas.

Com os anos padrão identificados, realizou-se uma análise da freqüência do tempo de duração do fenômeno (Figura 5a), de dias com N por mês (Figura 5b), do número de horas de N por mês (Figura 5c) e do horário do dia com ocorrência de N (Figura 5d) para cada ano.

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Figura 5. a) Frequência de duração do nevoeiro em São Paulo nos anos extremos; b) Frequência de dias com ocorrência de nevoeiro em São Paulo nos anos extremos; c) Frequência da quantidade de horas com ocorrência de nevoeiro em São Paulo nos anos extremos; d) Frequência de ocorrência de nevoeiro em São Paulo em função da hora do dia nos anos extremos

A partir da análise da figura 5a nota-se que nos três anos estudados é mais frequente a ocorrência de N com duração de uma hora, apresentando um decrescimento exponencial até o valor máximo observado, que corresponde a um caso de dez horas de duração, registrado em 2007. Analisando a figura 5b, percebe-se que a ocorrência de N na cidade de São Paulo nos anospadrão se deu principalmente nos meses de inverno (junho, julho e agosto). Isto ocorre, pois para a formação de N, são necessárias principalmente T relativamente baixa e UR alta suficiente, ou seja, um valor de Td próximo a T, além de maior estabilidade atmosférica, fato freqüente no inverno, quando a alta subtropical ou a alta polar controlam grande parte do tempo na cidade de São Paulo. No inverno, geralmente tem-se noites de céu claro que favorecem um resfriamento do solo (estabilidade atmosférica/altas pressões). Portanto, para a formação de N é necessário que Td esteja próxima a T, ou seja, uma UR elevada o suficiente para a condensação ocorrer. Desta maneira, pode-se explicar também o motivo de se ter nevoeiro principalmente ao amanhecer e 9

ao anoitecer (Figura 5d), quando T é normalmente mais baixa e UR relativamente mais alta. Para que haja ocorrência de nevoeiro próxima ao período mais quente do dia, a UR deve estar alta, fato relativamente mais raro, já que é o período com maior radiação solar e aquecimento. O ano de 1995 mostrou-se inferior à média do período em relação à ocorrência de N, observado nas figuras 5a, 5b e 5c, pois apresentou temperaturas acima da média durante o inverno, como pode ser observado nas figuras 6a e 7a. A quantidade de horas de ocorrência de nevoeiro é mais intensa também nos meses de inverno, pelo mesmo motivo dito anteriormente. Maior estabilidade atmosférica e por mais tempo (as noites são relativamente mais longas que o período diurno, que aumenta a instabilidade), baixas temperaturas e vapor d’água disponível na atmosfera suficiente para que a condensação ocorra.

FIGURA 6. Variação anual (série 1992-2007): (a) Temperatura média; (b) Umidade relativa média; (c) Temperatura do ponto de orvalho média; (d) Ocorrência de nevoeiro.

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TABELA 1. Equações de regressão e coeficientes de determinação e correlação de Pearson para N, T, UR e Td, na série 1992-2007 (obs: para 1992 x = 1 e para 2007 x = 16).

Equação de regressão

Coef. Det. (R²)

Coef. Corr. (R)

N = -891,962+0,481x

0,0404

0,2009

T = 10,666+0,004x

0,0029

0,0534

Td = 31,704-0,008x

0,0131

-0,1146

UR = 230,275-0,075x

0,1097

-0,3312

A partir da análise da tendência anual de T, UR, Td, e N (Figura 6) constata-se que T e N tiveram um ligeiro, praticamente imperceptível e desprezível, aumento ao longo dos anos, enquanto que UR e Td diminuíram. As equações de regressão linear e os coeficientes de determinação para T, Td, UR e N (Tabela 1) indicam que o número de dias com nevoeiro aumenta à razão de 0,48 dias por ano; a T aumenta 0,004°C por ano; UR diminui a uma taxa de 0,075% ao ano e Td decresce 0,008°C por ano no período 1992 a 2007. Analisando esse conjunto de variáveis, verifica-se que as tendências da UR e de T são opostas ao longo dos anos, ou seja, enquanto T aumentou, UR diminuiu. Este fato também foi constatado em análise estatística realizada por Pereira Filho et al. (2007), que estudaram o período de 1936-2005 na mesma Estação Meteorológica. Essa redução da umidade pode ter favorecido os resfriamentos noturnos, contribuindo para a ocorrência de nevoeiro de radiação (início da manhã). No entanto, é importante ressaltar que para uma melhor precisão na análise de tendência é necessário um maior número de dados para que a regressão seja mais precisa, pois os coeficientes de correlação de Pearson e de determinação obtidos neste estudo não fornecem nenhum tipo de conclusão segura. Pode-se levantar a hipótese de que esteja ocorrendo um aumento na quantidade de vapor de água na atmosfera sobre a cidade de São Paulo, fato que contribuiria para justificar em parte o aumento observado no nevoeiro. Esse aumento de vapor de água na atmosfera urbana de São Paulo pode estar relacionado a um ciclo natural, mas provavelmente pode ser atribuído à dinâmica da cidade, principalmente da queima de combustíveis fósseis, pois toda combustão gera como produto água. Além disso, o aumento na emissão de núcleos higroscópicos (poeiras e materiais particulados) também pode induzir um aumento na freqüência de nevoeiros. Essa tendência de aumento verificada deve ser tida com cautela, pois na série de 50 anos observou-se a diminuição (não necessariamente progressiva) de N da década de 1960 para a de 1990. 11

Para um melhor entendimento da variação da ocorrência de nevoeiro nos anos estudados foram analisados a variação mensal da temperatura (Figura 7a), da temperatura do ponto de orvalho (Figura 7b) e da umidade relativa (Figura 7c). A partir da análise da figura 7 pode-se observar que a ocorrência de um menor número de dias de nevoeiro no ano de 1995 deve-se a um aumento da temperatura e diminuição da umidade relativa nos meses de inverno, fazendo com que a frequência de nevoeiro diminuísse, concordante com a literatura. A UR muito alta indica condições de forte tensão de vapor, com perda radiativa noturna pouco intensa. Já com UR muito baixa, a queda noturna de temperatura, embora acentuada, não permite que T alcance Td. Já o ano de 1996 apresentou temperaturas abaixo da média praticamente o ano todo, chegando a atingir as temperaturas mais baixas do período (1992-2007) nos meses de inverno. A umidade relativa manteve-se acima da média durante quase todo o ano. A ocorrência de uma diminuição nas horas de duração de nevoeiro neste ano deve-se talvez por influência de fatores mecânicos, como o vento por exemplo. O ano de 2007 apresentou T, Td e UR praticamente na média, o que favoreceu um aumento do número de dias e de horas de ocorrência de nevoeiro, conforme pode ser observado nas figuras 6 e 7.

FIGURA 7. Variação mensal máxima, média, mínima da série 1992-2007 e dos anos-padrão: a) T; b) Td; c) UR.

A análise da frequência de N em função de T, Td e UR (Figura 8) revela que nos três anos estudados a formação de nevoeiro ocorreu principalmente quando a temperatura do ar encontrava-se próxima a 15°C, sendo que o ano de 1996 apresentou a maior amplitude, oscilando entre 8°C a 24°C. Para os três anos-padrão a faixa preferencial de ocorrência de N em função da temperatura situa-se no intervalo de 15°C a 18°C. A ocorrência do fenômeno apresenta a mesma característica segundo Td, porém situada no intervalo de 12°C a 16°C. Grande parte de ocorrência de nevoeiro foi registrada com a umidade relativa elevada, no intervalo de 90% a 98%. No entanto, pode-se observar que no ano de 1995 ocorreram dois casos em que a UR estava relativamente baixa e T relativamente alta. A explicação para estes

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acontecimentos pode ser determinada devido a diferenças de tipos e densidade do nevoeiro, conforme visto no início deste trabalho.

FIGURA 8. Frequência de ocorrência de N em São Paulo nos anos-padrão em função de: a) T; b) Td; c) UR.

CONCLUSÕES Nos 50 anos detectou-se uma diminuição do fenômeno nevoeiro, sendo que para o período 1992-2007 a análise dos dados evidencia um aumento no número de dias, sendo que os meses de junho a agosto apresentam maior incidência e tendência de aumento, por apresentarem condições favoráveis a este fenômeno (estabilidade atmosférica, perda noturna de radiação, menor umidade absoluta). Constatou-se que a maior frequência de dias de nevoeiro ocorre com UR média diária na faixa de 90% a 98%. Verificou-se, ainda, com o curso do tempo, diminuição da umidade relativa, fato este também constatado por Pereira Filho et al. (2007). Isto está associado ao aumento do número de dias com ocorrência de nevoeiro e da temperatura. Além disso, o aumento de nevoeiro também está relacionado ao aumento da quantidade de vapor disponível na atmosfera (umidade absoluta) na cidade de São Paulo nos últimos 16 anos, fato que pode estar relacionado ao processo de urbanização, mas, principalmente, ao “metabolismo” urbano. A despeito dos resultados obtidos, lembrando que são apenas resultados parciais, pode-se concluir que um estudo detalhado se torna necessário, já que os dados do período analisado (1992-2007) diferem dos dados do período 1958-2007. A análise em detalhe deste último período já está em andamento pelos autores deste trabalho.

AGRADECIMENTOS Agradecemos à Estação Meteorológica do IAG-USP, pelo gentil fornecimento dos dados utilizados neste trabalho.

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