Fundamentação e nulidade na nova lei processual, Portal Processual, 2015

June 3, 2017 | Autor: M. Perez de Oliveira | Categoria: Direito Processual Civil, Nulidades, Dever de Fundamentação
Share Embed


Descrição do Produto

Digite sua b

MENU

ARTIGOS

FUNDAMENTAÇÃO E NULIDADE NA NOVA LEI PROCESSUAL CADASTRE‐SE NO CAMPO

ABAIXO E RECEBA OS POSTS

NO EMAIL.

Junte-se a 2.447 outros assinantes Endereço de email Enviar

COMPARTILHE:

Like

217

Tweetar

0

PUBLICIDADE

Por Marco Antonio Perez de Oliveira O novo Código de Processo Civil (Lei n. 13.105/15) sequer entrou em vigor, mas talvez não seja cedo para apontar como um de seus pontos mais polêmicos o novo regime da fundamentação das decisões judiciais. Tal como a lei de 1973, o novo regramento processual de ne a fundamentação como o elemento estrutural da sentença, reputado a ela essencial, em que cabe ao juiz analisar as questões de fato e de direito suscitadas pelas partes (art. 489, inc. II). Ele vai além, no entanto, ao dispor que não serão consideradas fundamentadas as decisões judiciais – não apenas a sentença e acórdão, mas

também interlocutórias – em diversas situações exempli cativas, bem como ao impor ao juiz uma forma mais complexa de argumentação, em contrapartida ao que enxergamos como uma signi cativa potencialização da jurisdição de equidade. Assim, nos termos do art. 489, §1º., quando a decisão se limitar a indicar, reproduzir ou parafrasear ato normativo “sem indicar sua relação com a causa decidida”, quando empregar conceitos jurídicos indeterminados “sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso”, quando invocar motivos genéricos, “que se prestariam a justi car qualquer outra decisão”, quando não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo “capazes de, em tese, in rmar a conclusão adotada pelo julgador”, o ato jurisdicional será considerado pela lei como desprovido de fundamentação. De igual maneira, quando houver súmula, jurisprudência ou precedentes suscitados pelas partes, caberá ao juiz demonstrar ou que o caso se ajusta aos “fundamentos determinantes” desses paradigmas, ou então que o caso se distingue daquela situação típica ou que o próprio entendimento ali estampado se encontra superado. Todas essas situações con guram omissão para ns de embargos de declaração (art. 1.022, p. ún., inc. II). Já o art. 489, §2º., dispõe que no “caso de colisão entre normas, o juiz deve justi car o objeto e os critérios gerais da ponderação efetuada, enunciando as razões que autorizam a interferência na norma afastada e as premissas fáticas que fundamentam a conclusão”. Se o esforço argumentativo exigido do juiz parece excessivo, isso parece ser compensado com uma grande abertura do Código ao julgamento por equidade. De fato, embora o texto aprovado continue a a rmar a excepcionalidade desse critério de julgamento (art. 140), a dicção do código de mostra mais tíbia nesse propósito ao temperar o dever de o juiz aplicar o “ordenamento jurídico” na atividade jurisdicional com os deveres de “atender aos ns sociais e às exigências do bem comum”, bem como de “resguardar e promover” valores como a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a e ciência (art. 8º.), entre os quais não se estabeleceu qualquer hierarquia. Pode-se eventualmente rejeitar o rótulo, portanto, mas o fato é que a lei parece conceder ao juiz uma margem muito maior para julgar fora dos limites da lei positiva, em uma concessão à realidade de nossa prática judiciária que talvez houvesse merecido maior re exão à luz da conformação constitucional da função jurisdicional. Para retomar a ordem de nosso argumento, a partir das regras dos §§1º. e 2º. pode se dizer que alguns desvios correntemente observados na prática judiciária ao longo dos últimos tempos encontrarão um meio e caz de controle, e também que em alguma medida a fundamentação das decisões judiciais se torna mais complexa sob a lei que entrará em vigor a partir do ano que vem. Ou pelo menos isso é o que pode parecer a uma primeira vista, caso

nos limitemos a ler esses dispositivos de forma isolada. Isto porque, sendo o processo civil um ramo essencialmente formal do direito, nenhuma análise a respeito de suas regras, ou do papel que elas desempenham no sistema, pode ser considerada completa se não for acompanhada do exame do respectivo regime de nulidades. E nesse sentido é que se veri ca que o aparente rigor dos parágrafos do art. 489, na prática, acaba por se ver esvaziado por uma disposição situada na regulamentação do efeito devolutivo dos recursos, que determina que, mesmo diante da invalidade da sentença por falta de fundamentação, caberá ao tribunal decidir desde logo o mérito da causa se o processo estiver em condições de julgamento (art. 1.013, §3º., inc. IV). Ou seja, caso o processo esteja su cientemente instruído, a nulidade decorrente da falta de fundamentação deverá ser relevada, e o tribunal passará desde logo ao julgamento do mérito. Se bem analisarmos as cadeias de causalidade e consequencialidade presentes nos termos da lei, iremos assim concluir que anulação haverá não propriamente pela falta de fundamentação, mas sim pelo abreviamento irregular da instrução. Não se trata, como se pode perceber, de tomar em consideração eventos posteriores que supram, sanem, ou convalidem a de ciência de fundamentação. Se o tribunal estiver em condições de examinar o mérito, a nulidade simplesmente não deverá ser pronunciada. Sem que à sua inobservância corresponda a sanção de nulidade, portanto, com a supressão da decisão viciada do mundo jurídico, o dever de motivar as decisões judiciais na forma posta pelo art. 489, §§1º. e 2º., se converte para todos os efeitos em uma espécie de recomendação ou de conselho aos juízes, a que não se seguirá qualquer repercussão prática de maior relevância. O afastamento da anulação da sentença não se dá como medida de contenção ou con namento, justi cada pela instrumentalidade das formas: na disciplina que entrará em vigor a partir do ano que vem, ela é a regra geral. Pode se dizer mesmo que a emenda trazida pelo novo Código é em alguma medida pior do que o soneto de Buzaid, pois a desconsideração da nulidade por falta de fundamentação não ocorrerá apenas nas situações dos parágrafos, mas se estenderá também a omissões grosseiras como a absoluta ausência de análise das questões de fato e direito em que se fundam a demanda e a resposta. De igual modo, a nova abertura para os juízos de equidade, sob a rubrica de “ponderação”, não exigirá em contrapartida uma justi cação mais robusta, como aquela pretendida pelo legislador. É um verdadeiro anticlímax para a crença no potencial transformador do novo Código, nesse particular. A indagação que naturalmente ocorre a quem se depara com a observação exposta nas linhas precedentes é a de se essa disciplina de julgamento da apelação, em caso de decisão não fundamentada, pode ser conciliada com o dever de motivação das decisões judiciais, assegurada aos cidadãos como uma garantia processual pelo artigo 93, inc. IX, da Constituição de 1988.

Nesse sentido, é pertinente ressaltar que o texto constitucional comina ele próprio a sanção de nulidade para as decisões não fundamentadas, o que salvo melhor juízo proscreve do legislador ordinário a faculdade de permitir que sua pronúncia seja genericamente relevada, nos moldes do que foi feito no art. 1.013. De fato, simplesmente declarar a invalidade da sentença, sem retirá-la do mundo jurídico para que um novo julgamento seja imposto ao órgão de origem, não corresponde materialmente a uma anulação, mas sim a uma simples observação marginal na fundamentação do acórdão. Por essa razão,

a

regra

aqui

comentada

nos

parece

irremediavelmente

inconstitucional.

Marco Antonio Perez de Oliveira é  Mestre e Doutorando em Direito Processual (USP). Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP). Membro do Centro de Estudos Avançados de Processo (Ceapro). Advogado da União. Foto: Equipe Portal Processual

Like

217

Tweetar

0

COMPARTILHE:

Tags:fundamentação, Novo CPC, nulidades, sentença LEIA TAMBÉM:

A aplicação da “teoria da causa madura” em caso de nulidade da sentença por falta de fundamentação: um diálogo com Marco Antonio Perez de Oliveira

Fundamentação das decisões judiciais no Novo CPC: vetar por quê? O juiz está obrigado a apreciar todos os argumentos da parte vencida?

Copyright @ 2014 Portal Processual | Todos os Direitos Reservados | Design por XCake | Desenvolvimento por Mario Ernesto

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.