Gustav Klimt - Mulheres Fatais e Arabescos d\'Ouro

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Patrícia Ferrari

GUSTAV KLIMT Mulheres Fatais e Arabescos d'Ouro

Gustav Klimt nasceu em 1862 na Áustria, filho de um artista cinzelador e gravador que trabalhava com metais preciosos. Estudou Artes Decorativas em Viena, onde aprendeu várias técnicas, desde o mosaico à pintura a fresco. Juntamente com o seu irmão Ernst e com Franz Matsch, seu colega de ateliê, criou diversos trabalhos nesta área que, após serem divulgados pelo seu professor Ferdinand Laufberger, ganharam reconhecimento suficiente e resultaram em várias encomendas de decoração. Nesta fase, Klimt segue uma temática baseada nos antigos e nas gravuras de Durer, tendo contacto com um mundo iconográfico que estará presente até ao final sua obra. Inicialmente apresenta um gosto pelos motivos clássicos e pelo realismo, retratando figuras com precisão fotográfica, sobretudo ao nível do rosto, que distinguem a sua pintura da dos seus colegas. Inspira-se na obra de Hans Makart, mestre e vedeta da pintura vienense, que segue um estilo realista e barroco, algo que fascina Klimt e o faz desenvolver o horror vacui (horror ao vazio). Uma das suas primeiras obras foi uma série com várias alegorias chamada Allegories and Emblems. Gustav iniciou a sua carreira quando era ainda estudante, apresentando uma pintura de grande realismo, no entanto, atinge o auge da sua obra através de um estilo mais livre, de carácter decorativo, explorando a cor e os apliques de folhas de ouro e prata, seguindo sobretudo uma vertente erótica e um fascínio pela figura feminina. Utilizava flores estilizadas e motivos ornamentais com um formato geometrizado, devido à inspiração oriental dos mosaicos bizantinos das igrejas de Ravenna, em Itália, cujo brilho influenciou também a utilização das folhas metálicas (com as quais já tinha contacto, devido à profissão do pai). As criações da sua "Fase Dourada" são compostas por vários elementos, desde figuras geométricas, animais e flores, a turbilhões místicos, acumulações de cores ardentes, orientalismos e personagens exóticas. As pinturas de Klimt são um misto de

cor e brilho que surgem na fusão entre motivos simples e figuras sinuosas. Os corpos realistas das suas ninfas penetram num mar imaginário de pedaços de ouro e elementos estilizados. Há um contraste, claramente expresso, entre o realismo destas figuras e a simplicidade do que as rodeia. Tal característica poderá ser vista como um reflexo da importância que o artista confere ao ser humano, sobretudo às mulheres. Klimt alia a figura humana e concreta a um ambiente abstracto e diferente, capta a alma da pessoa e envolve-a num ambiente "vazio" que a faz sobressair. A mulher tem o papel principal na pintura de Gustav Klimt, é transversal a toda a sua obra. Desde o realismo classicista às composições efusivas de inspiração bizantina, a figura feminina está presente em quase todos os seus quadros, sejam alegorias ou retratos, a mulher é uma obsessão do pintor. Klimt representa-a como uma deusa, um ser superior e perfeito, enquanto lhe confere também um ar pecaminoso e tentador, através do seu olhar e da nudez do seu corpo. Fá-lo em várias perspectivas: a mãe protectora, a ninfa provocadora, a dama da alta sociedade, a amante carinhosa ou a figura alegórica; revelando as várias facetas deste sexo. As mulheres de Klimt são, ao mesmo tempo, doces e fatais, apresentando um dualismo entre a imagem imaculada de uma deusa e o olhar feroz de um demónio tentador. A forma como o artista usa e abusa do corpo feminino pode fazer com que este seja visto como um objecto, no entanto, Klimt explora e representa este elemento de uma forma única, transmitindo o seu fascínio e mostrando a beleza feminina com todo o seu esplendor e naturalidade, estas musas não são figuras simples, elas têm poder e o observador consegue senti-lo. A mudança na obra artística de Klimt está relacionada com o contexto artístico da época, em que se verifica uma fase de sufoco no mundo das artes. As academias determinavam o que era bom e o que era mau, apenas quem seguisse as regras académicas, baseadas no classicismo, poderia ambicionar expor o seu trabalho e ser aclamado pelos críticos. Há uma estagnação na criatividade, a academia nega tudo o que ultrapasse as suas convenções. Surgem reacções a este naturalismo, há uma procura do simbolismo e de um significado novo na arte, mas estes artistas são postos de parte. Gustav Klimt, que fazia parte da Academia, começa a ser criticado pelo excesso de erotismo nas suas obras, e responde com pinturas ainda mais provocadoras. Circulava pelos grupos vanguardistas, o que também fez com que o seu

trabalho começasse a sofrer alterações. Em 1897, junto com cerca de 40 artistas, funda a Secessão Vienense, um movimento que contraria a Künstlerhaus de Viena (Academia) e o seu conservadorismo. Inicia-se uma revolução cultural, a partir deste momento há um "grito de liberdade", não é preciso estar na academia para se ser reconhecido, existe uma alternativa. Os artistas da Secessão queriam mostrar que a Arte tinha seguido em frente, libertando-se das regras naturalistas. Em França acontecia uma situação semelhante, com as primeiras exposições independentes dos impressionistas. Klimt era um mestre da pintura académica mas preferiu deixar essa via e seguir este novo estilo, atraído pelo Simbolismo e pela sinuosidade da Art Nouveau (contrária às regras academistas). A sua inspiração nos mosaicos bizantinos confere um carácter decorativo à sua obra, aproximando-a da Arte Nova. Esta corrente é um pouco controversa na sua teoria, vista como algo belo e fútil, mas na qual que se podem inserir vários significados; por um lado é apenas uma corrente ligada à arquitectura decorativa e às artes aplicadas (joalharia, mobiliário, objectos, etc), por outro lado é um estilo que eleva as artes decorativas e as aproxima das Belas Artes, democratizando o conceito de Arte ao tornar objectos simples do dia-a-dia em criações artísticas. A simbologia da Arte Nova pode não estar em cada uma das suas criações, mas está no seu todo. É também um estilo que, tendo em conta o seu contexto histórico, se revela como um elo de ligação entre a natureza e o homem moderno, tentando devolver o natural à cidade industrializada, procurando reunir o homem à sua origem. Existe, neste sentido, um interessante contraste entre a cidade governada pelo ser masculino e a natureza da arte nova, onde a figura feminina tem um papel central, tal como na obra de Klimt. As características decorativas da pintura deste artista aproximam a Pintura à Decoração, deitando abaixo o tal muro que separa as artes maiores das menores. No entanto, fazem-no no sentido contrário, ou seja, em vez de uma arte menor se desenvolver ao ponto de poder ser considerada como arte maior, como acontece com a joalharia de René Lalique, neste caso existe uma arte maior, a Pintura, que absorve características de uma arte menor. Estará a pintura a rebaixar-se? Ou estará, ao incluir em si novos motivos, mais próximos do abstracto, a elevar-se àquilo que será a pintura moderna? Uma pintura desprovida de realismo absoluto, que procura

transmitir algo e não imitar simplesmente a realidade. Por outro lado, a decoração na obra de Klimt continua a assumir importância por si mesma, não se eleva através do seu próprio desenvolvimento, mas fá-lo ao ser incluída na pintura, servindo como uma "distração" que o pintor utiliza para direcionar o olhar do observador. A obra de Gustav Klimt, que faleceu em 1918, marca a História da Arte pela sua dualidade, nele podemos ver o reflexo da revolução artística do século XIX. É também importante pelo estilo único que desenvolve, e que tanto o caracteriza; as cores, a folha d'ouro, as mulheres e os contrastes entre as figuras reais e o ambiente que as envolve, são as principais marcas do seu trabalho, que irá inspirar outros pintores, como Galileo Chini. Klimt é também um reflexo da Arte Nova e do Simbolismo, elevando as artes decorativas, conferindo um novo significado à arte e antecedendo a pintura moderna do século XX.

Referências Bibliográficas MADSEN, S. Tschudi, Art Nouveau, Porto, Editorial Inova, 1967. NÉRET, Gilles, Gustav Klimt, Colónia, Taschen, 2004.

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