Habitacao e Desenvolvimento Urbano analise PMCMV

June 4, 2017 | Autor: L. Mestrinho | Categoria: Sustainable Urbanism, Sustainable Urban Environments, Sustainable Urban Planning
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Habitação e Desenvolvimento Urbano- uma análise introdutória da implementação da arborização urbana no âmbito do Programa Minha Casa Minha Vida. de Medeiros Raposo, LC. M. M.*

Resumo Este trabalho tem como objetivo destacar a importância da arborização urbana tomada como um componente essencial da infraestrutura urbana básica nos projetos de moradia no âmbito do Programa Minha Casa Minha Vida. A revisão da legislação vigente e a análise dos estudos de caso (Residencial Viver Melhor/Amazonas e Residencial Ismael Silva-Zé Kéti e /RJ) pretende demonstrar como os benefícios trazidos pela arborização urbana podem ser vistos por estarem em harmonia com os objetivos do Programa, especialmente como componente da habitabilidade das moradias, mas vem sendo atualmente subestimados por suas ordenanças o que leva os seus empreendedores a uma implementação discricionária da arborização urbana como componente da infraestrutura. Palavras-chave: Programa Minha Casa Minha Habitabilidade. Infraestrutura Urbana Básica.

Vida.

Arborização

Urbana.

Abstract This paper aims to highlight the importance to consider urban forestry as an essential component of the urban basic infrastructure under the housing Program Minha Casa Minha Vida. The review of the current legislation and the analysis of the case studies (Viver Melhor-Amazonas, Ze Keti e Jujubão Rio de Janeiro) intended to demonstrate how the benefits of urban forestry can be seen to be in harmony with the objectives of the Program, specially as a component of liveability, but are currently underestimated by its ordinances what leads developers to a discretionary implementation of urban forestry as an infrastructure component. Key words: Minha Casa Minha Vida Program. Urban Forestry. Liveability. Urban Infrastructure.

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Introdução. O Programa Minha Casa, Minha Vida – PMCMV é o principal instrumento em curso no país visando diminuir o déficit habitacional e tem por finalidade criar mecanismos de incentivo à produção e aquisição de novas unidades habitacionais ou requalificação de imóveis urbanos e produção ou reforma de habitações rurais, para famílias de baixa renda (Lei Federal nº 11.977/2009 Art. 1o.) O Programa é operacionalizado em parceria com os demais Entes Federados e Entidades Organizadoras (entidades civis sem fins lucrativos cadastradas pelo Ministério das Cidades) que assumem diversas responsabilidades previstas em legislação quando de sua implementação. Tendo em vista que o PMCMV visa, sobretudo, promover a inclusão social por meio da provisão de moradia digna pode-se afirmar que o Minha Casa Minha Vida seja também uma preciosa oportunidade de transformação integral do espaço urbano uma vez que já foi defendido por de Oliveira Vilaça e de la Mora (2004) que as condições de habitabilidade se referem não apenas às questões relacionadas à unidade habitacional em si, mas à configuração urbana e, como mencionado por Bonduki (2002), o conceito de habitabilidade urbana está ligado à idéia que a habitação deve ser entendida em um sentido mais abrangente e sistêmico incluindose a provisão e o acesso por parte da população excluída à rede de infraestrutura urbana e ao usufruto dos equipamentos públicos. Nesta concepção a arborização urbana exerce um papel fundamental na ambiência das moradias devido aos diversos serviços ambientais que provê para o entorno das edificações tais como: serviços regulatórios de conforto ambiental (temperatura, luminosidade, qualidade do ar e ruído) e serviços culturais (contemplação e entretenimento) podendo, portanto, ser considerada como elemento básico de infraestrutura promotor da qualidade de vida e comodidade dos habitantes, uma das diretrizes gerais do PMCMV (Portaria 465 Ministério das Cidades, Anexo I, 2, a) . O PMCMV e a infraestrutura do entorno. O Programa Nacional de Habitação Urbana- PNHU, um dos subprogramas componentes do PMCMV dispõe, entre outros, sobre a infraestrutura básica necessária aos Projetos segundo o disposto no artigo 5o-A da Lei 11.977/2009: Art. 5º-A. Para a implantação de empreendimentos no âmbito do PNHU, deverão ser observados: III - infraestrutura básica que inclua vias de acesso, iluminação pública e solução de esgotamento sanitário e de drenagem de águas pluviais e permita ligações domiciliares de abastecimento de água e energia elétrica; e IV - a existência ou compromisso do poder público local de instalação ou de ampliação dos equipamentos e serviços relacionados à educação, saúde, lazer e transporte público.”

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Nota-se a partir da disposição legal que não há referência à arborização urbana como elemento de infraestrutura básica do entorno nem cominação que indique a obrigatoriedade de sua implantação aos Entes parceiros. O conceito da arborização urbana como elemento de infraestrutura do entorno tem, contudo, evoluído tendo sido pela primeira vez avaliada no CENSO 2010 como característica do meio urbano no entorno dos domicílios (CENSO, 2010). De fato, o agente operador dos recursos do PMCMV, a Caixa Econômica Federal, promove entre os tomadores um indicativo de plantio de árvores na proporção de uma espécie por unidade habitacional o mesmo não sendo, porém, um critério de obrigatoriedade para liberação do recurso mas, tão somente, uma recomendação (Caixa, 2014). Não obstante uma evolução na concepção da arborização como elemento significativo da infraestrutura, a Portaria 465 do Ministério das Cidades, versando sobre o tema quando estabelece as diretrizes para elaboração de projetos no PNHU embora amplie o dispositivo legal do artigo 5o-A da lei mencionada anteriormente, omite a arborização urbana: 2.2. Os empreendimentos deverão ser dotados de infraestrutura urbana básica: vias de acesso e de circulação pavimentadas, drenagem pluvial, calçadas, guias e sarjetas, rede de energia elétrica e iluminação pública, rede para abastecimento de água potável, soluções para o esgotamento sanitário e coleta de lixo. A omissão da arborização urbana como elemento estruturador do entorno gera ainda efeitos em outros dispositivos legais que, baseados no disposto na Lei instituidora do Programa, refletem a omissão em seus próprios dispositivos como se pode observar na Resolução CONAMA 412 que estabelece critérios e diretrizes para o licenciamento ambiental de novos empreendimentos destinados à construção de habitações de Interesse Social que em seu art. 7o dispõe sobre requisitos mínimos para novos empreendimentos e, surpreendentemente em se tratando de um dispositivo de cunho ambiental urbano, cala-se sobre a arborização urbana: Art. 7o No licenciamento ambiental simplificado para novos empreendimentos habitacionais de interesse social deverão ser atendidos, no mínimo, os seguintes critérios e diretrizes: I - implantação, de sistemas de abastecimento de água potável, coleta e tratamento de esgoto sanitário, nos locais não dotados de sistema público de esgotamento sanitário e destinação adequada; II - a coleta e disposição adequada de resíduos sólidos e manejo de águas pluviais que contemple a retenção, captação, infiltração e lançamento adequados dessas águas; e III - destinação de áreas para circulação, implantação de equipamentos urbanos e comunitários, áreas verdes e espaços livres de uso público, que garantam a

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qualidade e segurança ambiental do empreendimento, compatível com plano diretor e lei municipal de uso e ocupação do solo para a zona em que se situem. A implementação da arborização urbana nos Projetos do Programa Minha Casa Minha Vida. A carência de uma cominação legal que disponha sobre a implementação da arborização urbana no PMCMV levou a uma inconsistente adoção da iniciativa nos diferentes Projetos em curso pelo país nestes cinco anos da existência do Programa o que leva a admitir a existência de uma discricionariedade dada ao empreendedor sobre a implementação ou não da arborização urbana em seus projetos em que pese seus múltiplos benefícios para os futuros usuários. Em Manaus- AM o Projeto Viver Melhor, constituído em área de expansão urbana, deu-se a supressão de vegetação arbórea para a construção de 3.511 unidades habitacionais (Foto 1) sem que, no entanto, fosse realizada a compensação adequada do território por meio de um extensivo programa de arborização (Foto 2) a fim de adequar o Projeto as condições climáticas da localidade de elevadas temperaturas e rica biodiversidade, fato que certamente compromete a consecução da adequação ambiental do projeto, requisito básico do PNHU (Lei 11.977/2009, art. 5o-A, II).

Foto 1. Residencial Viver Melhor-implantação (Chico Batata-2014)

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Foto 2. Residencial Viver Melhor-detalhe (SUHAB-2014)

Não obstante a incongruência da ausência de árvores em um Projeto localizado na região amazônica, outros empreendimentos do PMCMV parecem ter dado ao tema um maior cuidado como na implantação do Residencial Ismael Silva- Zé Keti no Rio de Janeiro-RJ (Foto 3). O empreendimento fica localizado no terreno onde funcionou um presídio, área originariamente desprovida de arborização. No Projeto para 998 unidades habitacionais foram plantadas 140 mudas de árvores em localidades indicadas pela Fundação Parques e Jardins do Rio de Janeiro.

Foto 3. Residencial Ismael Silva- Zé Keti- detalhe (EMCCAMP-2014)

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O futuro da arborização urbana no âmbito do PMCMV. Considerando que o incremento na qualidade de vida das populações beneficiárias do PMCMV é uma das razões de ser do Programa e, considerando ainda os diversos estudos relacionando a arborização e seus efeitos junto às populações quer sejam estes em sua saúde física como os apontados por Ulrich, (1984) ou ainda os de natureza mental explorados por Kaplan e Kaplan (1989) e mesmo sua influência no processo de socialização dos residentes apontados por Kou et al.(1998); aliado aos demais serviços ambientais já citados, estes trazem, no conjunto, uma condição mais favorável à habitabilidade dos espaços, mostrando ser possível estabelecer uma sinergia entre os objetivos do PMCMV e a presença da arborização urbana nos projetos do Programa. Todavia, o que temos hoje ainda é um reflexo da dificuldade em integrar as políticas habitacionais e de desenvolvimento urbano e, neste ainda precário contexto, a arborização urbana não assumiu ainda seu status de direito. A integração dos programas habitacionais, em especial do PMCMV que é a verdadeira força motriz da política habitacional brasileira na atualidade aos Programas de Arborização Urbana traria benefícios para ambos, de qualidade de vida para as populações e de gestão para a arborização urbana uma vez que esta poderia ser manejada adequadamente, desde sua origem e nos logradouros adequados e beneficiar, por meio do financiamento à habitação, do aporte de recursos necessários à arborização que são, comumente, escassos. Destarte, elencar a arborização urbana aos requisitos básicos de infraestrutura do Programa Minha Casa Minha Vida tais como saneamento, estrutura viária e abastecimento de água e energia é, portanto, uma via essencial de alavancagem da arborização no desenvolvimento das cidades e, em especial, na provisão de arborização aos domicílios menos favorecidos. A tarefa é precípua da União uma vez que cabe a ela, por intermédio do Ministério das Cidades a definição da tipologia e o padrão das moradias e da infraestrutura urbana, com observância da legislação municipal pertinente (Decreto 7499/2011, art. 10. § 1o). Não obstante, uma vez que a política habitacional no Brasil tem como princípio ser democrática e participativa (Lei Federal nº 11.124/2005 Art. 4o, I, c) em seu processo decisório cabe também à sociedade construir esta nova concepção em que a arborização urbana é vista como infraestrutura urbana básica e, por conseguinte, complementar ao direito à moradia.

Referências Ambiente, C.N.d.M. Resolução CONAMA 412 Estabelece critérios e diretrizes para o licenciamento ambiental de novos empreendimentos destinados à construção de habitações de Interesse Social, Brasília, MMA, 2009. Bonduki, N. Tendências e perspectivas na avaliação de políticas e programas sociais- uma metodologia para avaliação de programas habitacionais. São Paulo, IEE-PUC/SP, 2002.

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República, P.d. Lei Federal nº 11.124/2005 - Dispõe sobre o Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social – SNHIS, cria o Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social – FNHIS e institui o Conselho Gestor do FNHIS, Brasília, Governo Federal, 2005. República, P.d. Lei Federal nº 11.977/2009- Dispõe sobre o Programa Minha Casa, Minha Vida – PMCMV e a regularização fundiária de assentamentos localizados em áreas urbanas; altera o Decreto-Lei no 3.365, de 21 de junho de 1941, as Leis nos 4.380, de 21 de agosto de 1964, 6.015, de 31 de dezembro de 1973, 8.036, de 11 de maio de 1990, e 10.257, de 10 de julho de 2001, e a Medida Provisória no 2.197-43, de 24 de agosto de 2001; e dá outras providências, Brasília, Governo Federal, 2009. Cidades, M. Portaria 465/2011 Dispõe sobre as diretrizes gerais para aquisição e alienação de imóveis por meio da transferência de recursos ao Fundo de Arrendamento Residencial -FAR, no âmbito do Programa Nacional de Habitação Urbana – PNHU, integrante do Programa Minha Casa, Minha Vida – PMCMV, Brasília, Ministério das Cidades, 2011. Federal, C.E. Árvores em empreendimentos do Minha Casa Minha Vida garantem qualidade de vida. Disponível em Brasília , Caixa Economica Federal, 2014.Acesso em: 25 de ago. 2014. IBGE. Censo Demográfico 2010- Características Urbanísticas do Entorno dos Domicílios, Rio de Janeiro, IBGE, 2010. Kaplan, R. e Kaplan, S. The Experience of Nature: A Psychological Perspective. New York, Cambridge University Press, 1989. Kou, F.E. et al. Transforming inner city landscapes: trees, sense of safety, and preference. Environment and Behavior 30(1), 28–59, 1998. República, P.d. Decreto 7499/2011 Regulamenta dispositivos da Lei no 11.977, de 7 de julho de 2009, que dispõe sobre o Programa Minha Casa, Minha Vida, e dá outras providências, Brasília, Governo Federal, 2011. Ulrich, R.S. View through a window may influence recovery from surgery. Science 224 (4647), 420–421, 1984 Vilaça, AP. d. O. e Mora, L. d. l. Habitabilidade e lutas pelo direito à moradia. São Paulo , Anais claCS 04/ ENTAC 04, ,s .n., p.9, 2004.

* Advogado, D.E.A. em Direito Ambiental- Université Paris I/Panthéon-Sorbonne, M.B.E. COPPE/UFRJ, Mestrando em Urbanismo Sustentável UCL-University College London. UCL-University College London [email protected]

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