INFORMAÇÃO, COMPLEXIDADE E AUTO-ORGANIZAÇÃO: ESTUDOS INTERDISCIPLINARES VOLUME 73 -2015 COLEÇÃO CLE

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Mariana Claudia Broens João Antonio de Moraes Edna Alves de Souza (orgs.)

INFORMAÇÃO, COMPLEXIDADE E AUTO-ORGANIZAÇÃO: ESTUDOS INTERDISCIPLINARES

VOLUME 73 - 2015 COLEÇÃO CLE

COLEÇÃO CLE Editor: Itala M. Loffredo D’Ottaviano Conselho Editorial: Newton C.A. da Costa (USP) - Itala M. Loffredo D’Ottaviano (UNICAMP) - Fátima R. R. Évora (UNICAMP) - Osmyr F. Gabbi Jr. (UNICAMP) - Michel O. Ghins (UNIV. LOUVAIN) - Zeljko Loparic (UNICAMP) - Oswaldo Porchat Pereira (USP) Centro de Lógica, Epistemologia e História da Ciência Cidade Universitária “Zeferino Vaz” - C.P. 6133 - 13083-970 Campinas, SP. www.cle.unicamp.br [email protected] Copyright by Coleção CLE, 2015

ISBN 978-85-86497-23-0

Capa:

SUMÁRIO Prefácio .........................................................................................

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Apresentação .................................................................................

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PARTE 1 REFLEXÕES ACERCA DA INFORMAÇÃO EM SUA COMPLEXIDADE Passado, presente e futuro do conceito de informação Rafael Capurro ...............................................................................

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Afinal, o que é informação? Alfredo Pereira Júnior .....................................................................

51

Percepção/ação: uma abordagem ecológica e informacional Ramon Souza Capelle de Andrade ...................................................

71

Mente-mundo: uma proposta de análise realista natural Edna Alves de Souza .......................................................................

91

Notas para uma fenomenologia da vida informacional João Antonio de Moraes; Eloísa Benvenutti de Andrade .....................

115

PARTE 2 INFORMAÇÃO, AUTO-ORGANIZAÇÃO E AÇÃO: DESDOBRAMENTOS INTERDISCIPLINARES Eppur si muove! Lauro Frederico Barbosa da Silveira.................................................

135

O estudo das fronteiras da amizade na academia Claus Emmeche ..............................................................................

145

Processo de iluminação e processo de auto-organização Ettore Bresciani Filho ......................................................................

177

Implicação e informação: uma análise quantitativo-informacional da implicação material Marcos Antonio Alves; Itala M. Loffredo D’Ottaviano.......................

195

A dimensão ontológica do conceito de ação na filosofia de Charles S. Peirce Ivo A. Ibri ......................................................................................

223

A criação e a escuta musicais a partir do conceito de auto-organização Luis Felipe Oliveira ........................................................................

239

Registros descritivos no contexto da complexidade Placida L. V. A. da Costa Santos; Ana Maria Nogueira Machado ......

257

Perspectiva em primeira pessoa e identidade narrativa: para uma abordagem prática-linguística da identidade pessoal Cristina Amaro Viana Meireles........................................................

273

PARTE 3 CONSIDERAÇÕES SOBRE UMA TRAJETÓRIA INTELECTUAL Entrevista com o Prof. Dr. Antonio Trajano Menezes Arruda ........

307

Entrevista com a Profa. Dra. Carmen Beatriz Milidoni ..................

315

Jogos epifenomenistas Osvaldo Pessoa Jr. ...........................................................................

319

Um breve relato pessoal Ramon Souza Capelle de Andrade ...................................................

333

PREFÁCIO Esta coletânea de artigos é uma homenagem aos 60 anos da Professora. Maria Eunice Quilici Gonzalez. Nela estão reunidos vários artigos de alguns de seus principais ex-alunos e colaboradores, versando sobre os temas da Auto-Organização, Complexidade e da Filosofia da Informação. Em 1978, Maria Eunice chega à UNICAMP para cursar o Mestrado em Lógica e Filosofia da Ciência. O Mestrado, naquela época, era oferecido pelo Centro de Lógica, Epistemologia e História da Ciência, o CLEHC, ou simplesmente CLE como passou a ser chamado por professores e alunos. O CLE acabara de ser inaugurado pelo seu fundador e diretor (por muitos anos) o Prof. Oswaldo Porchat. Era uma iniciativa pioneira no país, que visava estimular o estudo da Filosofia da Ciência e da Filosofia Analítica no Brasil que, já havia alguns anos, andava de lado, sem grandes progressos. A maioria dos professores que se afiliou ao CLE e que passaram a dar aulas na Pós-Graduação tinha saído da USP, mas havia também muitos professores estrangeiros e professores visitantes que chegaram ao Brasil atraídos pela proposta inovadora do CLE. A proposta do CLE era, também, formar os melhores professores de Filosofia do Brasil e, por isso, os alunos tinham de fazer muitos cursos antes de apresentar sua dissertação de Mestrado. É preciso lembrar que, nessa época, o final dos anos 1970 e início dos 1980, um Mestrado no Brasil durava uma média de cinco anos ou mais. Poucas pessoas tinham Mestrado em Filosofia no Brasil, mesmo aquelas que já integravam os quadros universitários de várias instituições públicas. Por isso, professores de Filosofia de várias partes do Brasil afluíram ao CLE. Mas, havia ainda algo mais interessante no início do CLE. Ele abriu a perspectiva para que alunos graduados em Ciências, sobretudo Física e Matemática pudessem cursar um Mestrado em Filosofia. Maria Eunice tinha acabado de se formar em Física pela UNESP/ Rio Claro e, como todos os físicos, tinha muitas indagações filosóficas que

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tinham ficado no ar. Por ocasião do seu ingresso no CLE as questões ainda eram muitas e, só algum tempo depois, ela se decidiu por estudar um dos temas mais interessantes da Filosofia da Ciência: a natureza da descoberta científica. Essa possibilidade foi aberta pelo Professor Zeljko Loparic, um integrante do corpo docente do CLE que tinha um leque grande de interesses em diversos temas filosóficos. As questões que Maria Eunice enfrentava no seu Mestrado eram complexas. Será que as descobertas científicas são sempre produto de um acaso feliz, a famosa “serendipity” da qual, até hoje, falam os americanos? A maçã que caiu na cabeça de Newton ou o sonho de Kekule que deu origem à química orgânica? Havia também uma outra questão candente: será que os processos psicológicos que levam à descoberta não poderiam ser abordados pela Psicologia Cognitiva e, a partir dessa abordagem, serem, então, mecanizados, ou seja, realizados por um programa de computador? Naquela ocasião ainda não se falava quase nada sobre Inteligência Artificial no Brasil. Nos anos 1970 tinham aparecido os sistemas especialistas nos Estados Unidos e havia notícia de que um deles tinha realizado uma descoberta importante em prospecção de petróleo. Mas ainda era tudo muito vago. Maria Eunice começara a ler filósofos como N.R. Hanson, K. Popper, que tinham visões diferentes sobre a natureza da descoberta científica. Leu também alguns pioneiros da inteligência artificial como, por exemplo, Alan Newell e Herbert Simon. Mas, o evento mais interessante, a “serendipity” ocorreu em 1980. O filósofo inglês Andrew Woodfield, da University of Bristol, veio ao Brasil para uma visita a vários departamentos de Filosofia do país. O encontro com Woodfield mudou totalmente o rumo de nossas ambições filosóficas. Ele foi o primeiro a falar de Filosofia da Mente e a estimular leituras de autores como Daniel Dennett, Jerry Fodor, John Searle e outros filósofos da mente contemporâneos. Durante um bom tempo passamos a ler sobre Filosofia da Mente, paralelamente ao desenvolvimento de nossas dissertações de Mestrado. Em Junho de 1984, Maria Eunice apresentou sua dissertação e, em seguida, ingressou também no Departamento de Filosofia da UNESP-

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Marília. Dois anos depois Maria Eunice e eu conseguimos uma bolsa de estudos para fazer o doutorado na Inglaterra, em Filosofia da Mente, pois não havia essa possibilidade no Brasil. Os tempos eram outros, difíceis de imaginar para um estudante de Pós-Graduação brasileiro no século XXI. Não era fácil para um brasileiro conseguir ser aceito para fazer um Doutorado em uma universidade inglesa. Havia pouquíssimo intercâmbio entre Brasil e Inglaterra na área filosófica. Tudo o que se tinha, naquela época, eram contatos com a França, com a Bélgica e um pouco com a Alemanha. Havia dificuldades práticas também. Na década de 1980 o Brasil estava em uma crise cambial profunda. Não entrava e nem saia moeda estrangeira sem uma autorização do Banco Central, difícil de conseguir. Não havia internet, tudo era feito por cartas, que demoravam semanas para ir e vir. Era um mundo inimaginável para os nativos digitais. Fomos para a University of Essex, em Colchester, onde, em 1984, iniciamos o Doutorado na área de Filosofia da Mente. Maria Eunice queria estudar percepção, um assunto muito discutido em ciência cognitiva e também em filosofia da mente. Inicialmente estivemos sob a supervisão do mesmo orientador, o Professor A.D. Smith, mas algum tempo depois, Maria Eunice resolveu focalizar sua pesquisa no estudo das redes neurais artificiais, do qual surgiu seu interesse atual pela Auto-Organização e pela Filosofia da Informação. Em 1990, Maria Eunice já tinha retornado da Inglaterra com seu doutorado concluído e reassumia seu cargo na UNESP/Marília. Pouco tempo depois, Maria Eunice fundou a Sociedade Brasileira de Ciência Cognitiva (SBCC) que passou a funcionar a partir de 1995. Um ano depois ela partiria para uma de suas iniciativas mais ousadas. Em 1996, lutando contra forças conservadoras de todos os tipos, instala na UNESP/ Marilia o primeiro mestrado em Filosofia da Mente e Ciência Cognitiva. Essa trajetória intelectual, aqui apenas esboçada em seus traços gerais, é que buscamos homenagear nesta coletânea. João de Fernandes Teixeira Departamento de Filosofia, Universidade Federal de São Carlos, UFSCar

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APRESENTAÇÃO Os conceitos de informação, complexidade e auto-organização que compõem o título desta coletânea constituem elementos-chave para refletir sobre importantes aspectos do mundo contemporâneo em uma perspectiva filosófico-interdisciplinar. Mais, a descrição de parte significativa dos objetos e eventos considerados cognitivamente instigantes (como sistemas estelares, nichos ecológicos, sistemas sociais, organismos, suas redes metabólicas e as estruturas fundamentais da matéria que os constituem, dentre inúmeros outros) envolve o fluxo de informação em organizações complexas auto-organizadas. Esses conceitos adquiriram alta relevância nos últimos anos, especialmente quando se busca explicações sobre a natureza e propriedades dos sistemas naturais e artificiais e de seus processos de progressiva complexificação. Uma estratégia explanatória, acompanhada de uma nova linguagem, foi progressivamente sendo desenvolvida por pesquisadores de diversos campos do saber para criar modelos explicativos de organizações complexas. Mas os idealizadores de tais modelos acabam também enfrentando problemas que intrigam há muito tempo filósofos e pensadores das mais diversas tradições. Um dos problemas a que nos referimos é o da relação matéria/forma, o qual, na linguagem contemporânea, se manifesta quando se tenta definir a natureza da informação. O problema de definir a natureza ontológica da informação se coloca porque tanto a abordagem reducionista da informação à matéria que a instancia quanto a que lhe atribui estatuto ontológico autônomo enfrentam problemas. A abordagem reducionista é problemática porque a mesma informação pode ser instanciada em – e compartilhada por meio de – diferentes estruturas materiais: a informação de que x é p, por exemplo, pode estar na mente de uma pessoa, em um documento digital ou em um livro impresso. Como aponta o argumento funcionalista da múltipla realizabilidade, distintas bases materiais podem instanciar e processar a mesma informação.

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Mas será que esse argumento basta para fundamentar a crença de que a informação tem um grau de autonomia significativo em relação às suas instâncias materiais, como se as pudesse sobrevoa-las ou desprender-se delas? Será que, desaparecendo todas suas instanciações, a informação perduraria? Em relação a certos tipos de informação, pelo menos, esta última possibilidade parece contra-intuitiva: mesmo tendo registros escritos de línguas mortas como a egípcia, por exemplo, que permitiram até decifrá-la, a informação de como a língua egípcia era pronunciada pelos seus falantes parece irremediavelmente perdida. Além disso, para não ficar apenas na informação associada à linguagem natural humana, basta lembrar que, quando uma organização natural complexa se desagrega, quando um organismo morre, por exemplo, suas experiências individuais, isto é, as informações sobre sua trajetória enquanto organização viva, também parecem perdidas. Estes exemplos parecem indicar que existe um tipo de vínculo forte entre a informação e a matéria que lhe serve de base, mas, novamente, enfrentamos o argumento de que a mesma informação pode ser instanciada em diferentes estruturas materiais. Nem redutível à matéria e nem inteiramente dissociável dela, talvez uma abordagem mais aristotélica, por assim dizer, da informação possa nos auxiliar pelo menos a compreender a extensão do problema de definir as principais propriedades da informação. Pondo a formulação aristotélica da relação indissociável entre matéria/forma em uma roupagem mais contemporânea, matéria-energia/informação seriam mutuamente co-dependentes em um sentido fraco: para a informação interferir no mundo, ela precisa estar instanciada em uma organização com uma estrutura material/energética capaz de propiciar seu fluxo entre os elementos, partes ou agentes que compõem tal organização e o meio de que faz parte e com o qual interage. Os conceitos de auto-organização e complexidade, por sua vez, veem desempenhando um papel central para a compreensão de processos de organizações que, como aponta Michel Debrun (1996)1, se constituem espontaneamente, sem a interferência de um centro controlador, como resultado das próprias relações estabelecidas por seus elementos compoDEBRUN, M. A ideia de auto-organização. In: DEBRUN, M. A.; GONZALES, M. E. Q.; PESSOA JÚNIOR, O. (Ed.) Auto-organização: estudos interdisciplinares. Campinas: Coleção-CLE, 1996. p. 1-23. 1

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nentes, nas quais emergem propriedades não encontradas isoladamente em tais elementos e não facilmente previsíveis. Enquanto pressuposto ontológico, a noção de auto-organização associada à de complexidade permite conceber o cosmo de uma perspectiva neomecânica em que organizações capazes, por exemplo, de aprender com sua própria experiência podem ser estudadas a partir das interações que ocorrem em suas várias camadas integradas e co-dependentes. No entanto, o estudo dos processos informacionais complexos e auto-organizados, especialmente no que diz respeito às propriedades emergentes que originam, é apenas incipiente e exige um esforço interdisciplinar da comunidade científica que ainda hoje é muito difícil de efetivar. Um dos principais obstáculos, cuja superação demanda muito esforço, é o de encontrar uma linguagem comum e algum consenso metodológico que permita o diálogo entre as diferentes culturas científicas – a cultura das ciências naturais e exatas, de um lado, e a das ciências humanas, de outro. O propósito de concretizar o diálogo interdisciplinar entre as diferentes culturas científicas tem caracterizado o trabalho pioneiro de docência e pesquisa empreendido por Maria Eunice Quilici Gonzalez, em cuja homenagem esta coletânea é organizada, em torno às relações entre os conceitos de informação, auto-organização e complexidade. Para estabelecer tal diálogo, ela busca incansavelmente convergências e intersecções entre as linguagens e estratégias metodológicas da Ciência Cognitiva, da Filosofia da Mente e da Ação, da Filosofia da Informação e da Filosofia Ecológica. Assim, esta coletânea busca homenagear Maria Eunice Quilici Gonzalez e apresentar alguns dos resultados que seu trabalho promoveu ou propiciou. Para isso, a coletânea foi dividida em três partes: a primeira, intitulada Reflexões acerca da informação em sua complexidade apresenta textos de cunho teórico em torno ao conceito de informação e é composta por cinco capítulos escritos, respectivamente, por Rafael Capurro, Alfredo Pereira Júnior, Ramon Capelle de Souza Andrade, Edna Alves de Souza, João Antonio de Moraes e Eloísa Benvenutti de Andrade. A segunda parte, por sua vez, intitulada Informação, auto-organização e seus desdobramentos interdisciplinares é constituída por oito capítulos escritos

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por Lauro Frederico Barbosa da Silveira, Claus Emmeche, Ettore Bresciani Filho, Marcos Antonio Alves e Itala Maria Loffredo D’Ottaviano, Ivo A. Ibri, Luis Felipe de Oliveira, Placida L. A. V. da C. Santos e Ana Maria Nogueira Machado, Cristina Amaro Viana Meireles, respectivamente. Por fim, a terceira parte da coletânea, intitulada Considerações sobre uma trajetória intelectual, reúne as entrevistas de Antonio Trajano Menezes Arruda e Carmen Beatriz Milidoni, nas quais são apresentados testemunhos sobre a vida acadêmica de Maria Eunice Quilici Gonzalez, e os ensaios de Osvaldo Pessoa Júnior e Ramon Capelle de Souza Andrade, os quais tratam de temas e problemas conceituais em diálogo com a trajetória intelectual da homenageada. Dando início à primeira parte da coletânea, no capítulo 1, intitulado Passado, presente e futuro do conceito de informação, Rafael Capurro apresenta considerações a respeito da origem histórico-filosófica do conceito de informação no pensamento grego e medieval, centrado no sentido de “dar forma a”, bem como ressalta a recaracterização contemporânea de tal conceito centrada na noção de mensagem, de “dizer algo (novo) a alguém”. Uma vez estabelecida a relação entre as noções contemporâneas de informação e de mensagem, o autor apresenta um conceito de informação baseado em uma teoria da mensagem. No capítulo 2, intitulado Afinal, o que é informação? Alfredo Pereira Junior ressalta que até o presente a resposta à pergunta sobre a natureza da informação está longe de ser consensual. Em seu texto, o autor procura, a partir da discussão de dois exemplos (o do trabalho do escultor, de Aristóteles, e o da transferência de arquivos entre computadores), combinar a teoria aristotélica da Causa Formal com a teoria da informação de Shannon e Weaver, em busca de um conceito de informação que faça sentido tanto em contextos filosóficos quanto cientifico/tecnológicos. No capítulo 3, Percepção/ação: uma abordagem ecológica e informacional, Ramon Capelle de Souza Andrade defende a tese de que as propriedades ecológicas da percepção direta de affordances no ambiente não são adequadamente descritas por modelos fisicalistas. Segundo o autor, as interações ecológicas do organismo que propiciam a percepção/ação não

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são redutíveis a explicações da percepção restritas à atividade fotônica na retina do percebedor e ao posterior processamento da informação obtida. A partir da teoria gibsoniana da percepção direta, o autor procura defender uma epistemologia ecológica, não fisicalista por excelência. No capítulo 4, Mente-mundo: uma proposta de análise realista natural, Edna Alves de Souza examina um problema clássico da filosofia, mais especificamente, do realismo: é possível o acesso epistêmico à realidade independente da mente consciente? Para apresentar uma resposta a essa indagação, a autora investiga as propostas do realismo natural, do realismo informacional e do realismo ecológico a partir das hipóteses: (1) de que pressupostos do realismo informacional e da filosofia ecológica possibilitam apresentar uma explicação para tal forma de acessibilidade; (2) se a informação está no mundo, como propõe o realismo informacional, e a mente/cérebro (como outros processadores de informação) também está no mundo, como propõe o realismo natural, então é possível o encontro perceptual da mente/cérebro com o mundo sem a necessidade de pressupor a existência de uma interface representacional; (3) uma forma de superar as dificuldades de compreensão da acessibilidade epistêmica da realidade consiste na adoção de uma formulação robusta do realismo natural que conte com uma teoria da percepção direta. Em seguida, no capítulo 5, Notas para uma fenomenologia da vida informacional, João Antonio de Moraes e Eloísa Benvenutti de Andrade buscam possíveis interfaces entre a Fenomenologia e a Filosofia da Informação. Os autores entendem que o paradigma fenomenológico tradicional parece não incorporar em suas análises o ser-no-mundo(-emrede) e suas experiências. Por essa razão, os autores entendem que para abarcar este novo ser no cibermundo, que extrapola a abordagem realizada pela Fenomenologia da Vida, se faz necessário o desenvolvimento de uma Fenomenologia da vida informacional que considere, de um lado, o ser híbrido (aquele para o qual as tecnologias informacionais contemporâneas são intrínsecas às suas próprias relações e dele com o ambiente) e, de outro, a correlação consciência/mundo nos moldes propostos pela Fenomenologia.

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Iniciando a segunda parte desta coletânea, o capítulo 6, de Lauro Frederico Barbosa da Silveira, intitulado Eppur si muove!, apresenta ricas reflexões histórico-filosóficas em torno ao conceito de fronteira e alguns dos problemas e paradoxos que tal conceito suscita ou aos quais está relacionado. O capítulo 7, O estudo das fronteiras da amizade na academia, de Claus Emmeche, busca contribuir para o Estudo de Fronteiras da amizade na pesquisa acadêmica. O Estudo de Fronteiras (borderology no original) focaliza dois ou mais conjuntos de fenômenos informacionalmente complexos (não compreensíveis por descrições simples) e inter-relacionados de modos específicos, especialmente fenômenos envolvendo seres humanos em um contexto organizado de cultura, história, sociedade, constituição psíquica, etc.. Em seguida, o autor investiga como o estudo de fronteiras pode auxiliar a compreender vários aspectos do fenômeno da amizade na pesquisa acadêmica, seus aspectos positivos e negativos e como se relaciona com processos competitivos. No capítulo 8, intitulado Processo de iluminação e processo de autoorganização, Ettore Bresciani Filho investiga aspectos auto-organizados do processo criativo, tanto no âmbito individual quanto no âmbito organizacional. Em especial, o autor busca investigar como o denominado processo de iluminação atua em processos criativos. O capítulo 9, de autoria de Marcos Antonio Alves e Itala Loffredo D’Ottaviano, é intitulado Implicação e informação: uma análise quantitativo-informacional da implicação material. No texto, os autores procuram mostrar que a implicação material usual não captura a noção de informação, tal como desenvolvida na Teoria Matemática da Comunicação por pensadores como Shannon. Inicialmente, é definida essa noção quantitativa de informação e, em seguida, é introduzida uma semântica probabilística para a linguagem da Lógica Proposicional Clássica. São também definidos os valores probabilidade e informacional das fórmulas de tal linguagem, dando ênfase à implicação e são apresentados casos em que o valor informacional de determinadas implicações materiais não são adequados à noção quantitativa da informação. Por fim, os autores introduzem uma

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noção de implicação probabilística, cuja definição do valor informacional é adequada à noção quantitativa de informação, analisando algumas de suas principais características. No capítulo 10, intitulado A dimensão ontológica do conceito de ação na filosofia de Charles S. Peirce, Ivo A. Ibri apresenta a rica trama ontológica e fenomenológica de que faz parte o conceito pragmaticista de ação. Em seu texto, o autor parte de uma caracterização inicial do conceito de ação relativa a seus efeitos práticos, adotada especialmente por John Dewey e William James, para, em seguida, mostrar as interações sistêmicas de tal conceito no contexto das categorias semióticas de primeiridade, segundidade e terceiridade, destacando a relação entre o particular da ação e o geral do pensamento no cerne da filosofia de Peirce. No capítulo 11, A criação e a escuta musicais a partir do conceito de auto-organização, Luis Felipe de Oliveira descreve a criação musical e a escuta musical tomando por base algumas formulações do conceito de auto-organização. Depois de definir auto-organização, investiga como essa noção se relaciona à composição musical e ao entendimento corriqueiro da criação em música. O autor argumenta que a noção da auto-organização oferece um ponto de vista interessante para estudar a criatividade artística, superando o mito do gênio criador que ainda se sustenta de maneira proeminente na cultura ocidental. Na sequência, o capítulo 12, Registros descritivos no contexto da complexidade, de Placida L. A. V. da C. Santos e Ana Maria Nogueira Machado, busca compreender como conceitos relacionados à noção de complexidade aliados a recursos da Teoria da informação podem auxiliar a compreender características do domínio bibliográfico, em especial no que se refere ao registro do conhecimento e aos métodos de sistematização da informação que facilitem seu acesso. Encerrando a segunda parte desta coletânea, o capítulo 13, intitulado Perspectiva em primeira pessoa e identidade narrativa: para uma abordagem prática-linguística da identidade pessoal, de Cristina Amaro Viana Meireles, visa abordar o problema da identidade pessoal a partir de uma abordagem que priorize as dimensões do corpo, da ação e da linguagem,

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em detrimento das análises mais centradas em aspectos meramente cognitivos ou psicológicos. É no contexto dessa abordagem que a autora propõe uma leitura da tese apresentada por Lynne R. Baker, segundo a qual a identidade pessoal ao longo do tempo pode ser pensada como a manutenção de uma mesma perspectiva em primeira pessoa, e busca aproximá-la da tese defendida por Paul Ricoeur, segundo a qual a identidade pessoal ao longo do tempo só pode ser uma identidade narrativa. Por fim, na terceira parte desta coletânea são apresentados depoimentos sobre a trajetória intelectual e acadêmica de Maria Eunice Quilici Gonzalez. Os depoimentos de Antonio Trajano Menezes Arruda, Carmen Beatriz Milidoni, Osvaldo Pessoa Junior e Ramon Capelle de Souza Andrade permitem perceber o impacto e a abrangência do trabalho realizado pela homenageada, fonte de inspiração filosófica e interdisciplinar para os autores dos capítulos desta coletânea e para alunos e colegas que com ela têm a oportunidade de dialogar e interagir. Esperamos que os textos aqui apresentados possam dar continuidade a esse rico diálogo interdisciplinar nas áreas da Ciência Cognitiva, Filosofia da Mente, Filosofia da Informação e Filosofia Ecológica, para as quais o profícuo e incansável trabalho de Maria Eunice continuará a oferecer significativas contribuições. Mariana Claudia Broens Departamento de Filosofia UNESP/Marília

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