Instalação e modificação de estabelecimentos em articulação com as disposições do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação

May 30, 2017 | Autor: Ana Gordinho | Categoria: Planeamento Urbano
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Instituto de Ciências Jurídico-políticas – Faculdade de Direito de Lisboa

Instalação e modificação de estabelecimentos em articulação com as disposições do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação Ana Paula Marques Gordinho 25-09-2014

Índice Nota introdutória ........................................................................................................... 3 Considerações prévias ................................................................................................... 4 Licenciamento Zero vs Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação ...................... 8 A mera comunicação prévia....................................................................................... 8 Articulação da mera comunicação prévia com o RJUE ............................................ 10 A comunicação prévia com prazo ............................................................................ 13 Articulação da comunicação prévia com prazo com o RJUE .................................... 17 O licenciamento zero em edifícios construídos em data anterior à entrada em vigor do RGEU ......................................................................................................................... 26 Considerações finais ................................................................................................... 28 Bibliografia ................................................................................................................. 34

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Nota introdutória O presente trabalho pretende analisar a aplicabilidade prática dos procedimentos de instalação ou modificação de estabelecimentos no âmbito das disposições consagradas no “Licenciamento Zero”, regime aprovado pelo Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril, e a sua articulação com os procedimentos aplicáveis às operações urbanísticas consagrados no Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação, aprovado pelo Decreto-Lei nº 555/99, de 16 de dezembro, alterado pelo Decreto-Lei nº 26/2010, de 30 de março, e pela Lei nº 28/2010, de 2 de setembro. Na ótica do utilizador, entendido como o particular e como os serviços da Administração

local

responsáveis

pela

aplicação

destes

regimes,

surgem

recorrentemente algumas incoerências relativamente à articulação dos procedimentos neles consagrados que acabam por culminar na dúvida da efetiva desburocratização de procedimentos e, consequentemente, na aplicabilidade do Programa Simplex. Assim, e na ótica do utilizador que presentemente representa um serviço da Administração local responsável pela aplicação do regime do “Licenciamento Zero” e do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação, desenvolvo uma análise crítica aos procedimentos neles consagrados, obrigações deles decorrentes para os particulares e elementos de instrução obrigatória associados a cada procedimento, bem como das responsabilidades de apreciação técnica e verificação que recaem sobre o serviço, no intuito de dar a conhecer as dificuldades práticas que decorrem da “letra da lei” para além das interpretações e anotações que dela tão bem se fazem e que, porém, não satisfazem as efetivas necessidades do utilizador particular que depende deste serviço para instalar ou modificar um estabelecimento.

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Considerações prévias Os anteriores regimes de instalação e modificação de estabelecimentos, constantes do Decreto-Lei nº 234/2007, de 19 de junho 1, e do Decreto-Lei nº 259/2007, de 17 de julho 2, revogados pelo Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril, continham no seu espírito o controlo preventivo da instalação ou modificação das atividades neles previstas e a articulação expressa com as disposições do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação (adiante designado RJUE) que, no caso dos estabelecimentos de restauração ou de bebidas, impunha ainda a realização de consultas externas obrigatórias. Não obstante, a autorização de utilização dos estabelecimentos já não dependia de vistoria obrigatória uma vez que este procedimento passou a tramitar ao abrigo do RJUE, que consagra no nº 1 do artigo 64.º que a autorização de utilização é concedida no prazo de 10 dias, com base nos termos de responsabilidade previstos no artigo 63.º daquele diploma, passando a vistoria a ser a exceção e não a regra, conforme previsto no nº 2 do mesmo artigo 64.º o qual enumera os casos excecionais em que deve ser determinada vistoria. Estes regimes consagraram ainda o regime da “declaração prévia” que se traduz na comunicação do titular da exploração, à Câmara Municipal, à Direção-Geral das Atividades Económicas (DGAE)3, ou à Direção-Geral da Empresa (DGE)4, do início ou da modificação da atividade, na qual este se responsabiliza que o estabelecimento cumpre todos os requisitos adequados ao exercício da mesma. Inclusivamente, no caso dos estabelecimentos de restauração ou de bebidas, o DecretoLei nº 234/2007, de 19 de junho, consagrou no seu artigo 12.º que constitui título válido

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Aprovou o anterior regime jurídico de instalação e modificação de estabelecimentos de restauração ou de bebidas, bem como o regime aplicável à respetiva exploração e funcionamento. 2 Aprovou o anterior regime jurídico de instalação e modificação dos estabelecimentos de comércio ou de armazenagem de produtos alimentares, bem como dos estabelecimentos de comércio e produtos não alimentares e de prestação de serviços cujo funcionamento pode envolver riscos para a saúde e segurança das pessoas. 3 No caso do Decreto-Lei nº 234/2007, de 19 de junho, consagrou-se a competência da DGAE para promover o registo obrigatório dos estabelecimentos de restauração ou de bebidas mediante a entrega da declaração prévia prevista no artigo 11.º do diploma. 4 No caso do Decreto-Lei nº 259/2007, de 17 de julho, consagrou-se a competência da DGE para promover o registo obrigatório dos estabelecimentos de comércio ou de armazenagem de produtos alimentares, bem como dos estabelecimentos de comércio e produtos não alimentares e de prestação de serviços cujo funcionamento pode envolver riscos para a saúde e segurança das pessoas, mediante a entrega da declaração prévia prevista no artigo 4.º do diploma.

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de abertura do estabelecimento a posse, pelo titular da exploração, do comprovativo da entrega da declaração prévia e que o seu funcionamento bem como as transações comerciais e imobiliárias a ele respeitantes não podem ser prejudicadas pela inexistência de um título formal emitido pela câmara municipal, para os casos de deferimento tácito do procedimento de autorização de utilização 5. 5

Já no caso dos estabelecimentos comerciais, de prestação de serviços ou de armazenagem, o Decreto-Lei nº 259/2007, de 17 de julho, apenas não se admitia a declaração prévia como título válido para abertura ou modificação do estabelecimento se estivesse em causa a realização de obras sujeitas a controlo prévio ou a alteração de utilização do espaço afeto ao estabelecimento, nos termos do RJUE, tal como previsto no nº 5 do artigo 4.º daquele diploma 6. Independentemente desta articulação dos regimes, qualquer dos estabelecimentos abrangidos estavam obrigatoriamente sujeitos à entrega de declaração prévia antes da sua abertura ou modificação.

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Esta consagração tem toda a lógica se tivermos em consideração o previsto nos artigos 111.º, 112.º e 113.º do RJUE, relativamente ao deferimento tácito do procedimento de autorização de utilização, cuja decisão deve ser proferida no prazo de 10 dias a contar da receção do requerimento, com base nos termos de responsabilidade apresentados e caso não se verifique nenhuma das situações previstas no nº 2 do artigo 64.º daquele diploma, que leve à determinação de vistoria para efeitos de autorização de utilização, por parte do presidente da câmara municipal, no mesmo prazo de 10 dias. Efetivamente, tendo ocorrido o deferimento tácito do pedido de autorização de utilização e tendo o titular do estabelecimento pago as taxas devidas, conforme previsto no nº 2 do artigo 113.º do RJUE, bem como estando entregue a declaração prévia na câmara municipal com cópia à DGAE, conforme previsto no nº 4 do artigo 10.º do Decreto-Lei nº 234/2007, de 19 de junho, nada obsta ao início da utilização do espaço e do funcionamento do estabelecimento, mesmo sem o título formal emitido pela câmara municipal. 6 Tendo em consideração a estreita articulação entre as disposições do RJUE e as disposições do DecretoLei nº 259/2007, de 17 de julho, e sempre que se mostrasse necessária a realização de obras sujeitas a controlo prévio para instalação ou modificação de estabelecimentos de comércio ou de armazenagem de produtos alimentares, bem como dos estabelecimentos de comércio e produtos não alimentares e de prestação de serviços cujo funcionamento pode envolver riscos para a saúde e segurança das pessoas, não poderia o pedido de autorização de utilização merecer deferimento sem que se mostrassem cumpridas as obrigações previstas no Decreto-Lei nº 259/2007, de 17 de julho, relativamente aos requisitos aplicáveis a estes estabelecimentos. Esta consagração abre portas à derrogação das disposições do RJUE relativas ao deferimento tácito do procedimento de autorização de utilização uma vez que este procedimento não está sujeito à intimação judicial para a prática de ato legalmente devido, conforme previsto no artigo 112.º do RJUE, aplicandose, sim, o disposto na alínea c) do artigo 111.º daquele diploma. Nestes termos, e para garantia do cumprimento das obrigações previstas no Decreto-Lei nº 259/2007, de 17 de julho, teria o presidente da câmara municipal que, mesmo perante termos de responsabilidade, verificar se estes constituem garantia suficiente do cumprimento dessas obrigações e, caso tal não se verifique, determinar vistoria para efeitos de autorização de utilização no prazo de 10 dias.

Neste contexto, o particular interessado na instalação ou modificação de um estabelecimento abrangido por estes diplomas poderia estar sujeito à entrega de até três procedimentos, senão vejamos: 

Caso o espaço não dependesse de obras sujeitas a controlo prévio e detivesse alvará de utilização compatível com a atividade, a instalação ou modificação estaria sujeita a: 1. Declaração prévia para instalação ou modificação do estabelecimento.



Caso o espaço não dependesse de obras sujeitas a controlo prévio mas dependesse da obtenção de alvará de utilização compatível com a atividade, a instalação ou modificação estaria sujeita a: 1. Autorização de utilização ou de alteração de utilização, a formalizar nos termos do RJUE, para obtenção de alvará compatível com a atividade pretendida; 2. Declaração prévia para instalação ou modificação do estabelecimento.



Caso o espaço dependesse de obras sujeitas a controlo prévio, a instalação ou modificação estaria sujeita a: 1. Licença ou comunicação prévia, a formalizar nos termos do RJUE, para execução da obra; 2. Autorização de utilização ou de alteração de utilização, a formalizar nos termos do RJUE, para obtenção de alvará compatível com a atividade pretendida, após conclusão da obra; 3. Declaração prévia para instalação ou modificação do estabelecimento.

Estes diplomas foram, como já referido, revogados pelo Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril, no âmbito do Programa Simplex, que tem por objetivo a simplificação administrativa e legislativa e a implementação de medidas de administração eletrónica de modo a facilitar o acesso ao exercício das atividades económicas abrangidas, identificadas no anexo I do diploma. No nº 1 do artigo 1.º do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril, consagra-se, portanto, a simplificação do regime de exercício de diversas atividades económicas, destinado a reduzir encargos administrativos sobre os cidadãos e empresas, mediante a eliminação de licenças, autorizações, validações, autenticações, certificações, atos emitidos na

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sequência de comunicações prévias com prazo, registos e outros atos permissivos, substituindo-os por um reforço da fiscalização sobre essas atividades. Esta consagração, para além de inovadora em termos de abordagem administrativa ao exercício de diferentes atividades económicas é, também, um exercício experimental de uma Administração habituada a um elevado nível de burocracia que, apesar de pretender criar um novo paradigma ao substituir o controlo preventivo pelo controlo sucessivo e assim demonstrar maior confiança nos agentes económicos e técnicos envolvidos, denota ainda alguma dificuldade em desvincular-se do seu papel efetivamente controlador, nomeadamente no que respeita à maior novidade em termos procedimentais trazida pelo diploma que é a figura da comunicação prévia com prazo quando aplicável à instalação ou modificação de estabelecimentos, com dispensa de requisitos, e a sua articulação com as disposições do RJUE sempre que se verifica necessária. É esta nova “relação” que se pretende analisar, não sem antes tecer algumas considerações sobre a mera comunicação prévia para instalação ou modificação de estabelecimentos e a sua articulação com as disposições do RJUE.

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Licenciamento Zero vs Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação A mera comunicação prévia Conforme dispõe o artigo 2.º do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril, a mera comunicação prévia aplica-se à instalação e à modificação de estabelecimentos de restauração ou de bebidas, de comércio de bens, de prestação de serviços ou de armazenagem e às secções acessórias que neles existam e consiste numa declaração que permite ao interessado proceder imediatamente à abertura do estabelecimento, após pagamento das taxas devidas, conforme previsto no nº 2 do artigo 4.º do mesmo diploma. Os elementos instrutórios são simples7 e deles se salienta a declaração do interessado em como tem conhecimento da necessidade do edifício ou fração onde vai instalar o estabelecimento possuir título de autorização de utilização compatível com a atividade a exercer. Esta declaração que se junta aos elementos instrutórios da mera comunicação prévia, atesta que foram realizados os procedimentos constantes do RJUE, nomeadamente o procedimento de autorização de utilização ou de alteração de utilização do edifício ou fração. Assim, a mera comunicação prévia não mais é do que a declaração prévia que se encontrava prevista no âmbito do Decreto-Lei nº 234/2007, de 19 de junho, que aprovou o regime jurídico a que fica sujeita a instalação e a modificação de estabelecimentos de 7

Parte dos elementos instrutórios da mera comunicação prévia de instalação e modificação de estabelecimentos encontram-se previstos no corpo do artigo 4.º do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril, e são elementos passíveis de ser preenchidos no próprio modelo de formulário aplicável à declaração. Os restantes elementos instrutórios da mera comunicação prévia de instalação ou modificação de estabelecimentos encontram-se identificados no nº 1 do artigo 2.º da Portaria nº 239/2011, de 21 de junho e, também estes, são passíveis de ser preenchidos no próprio modelo de formulário. Conforme consta do modelo de formulário disponível no portal do “Balcão do Empreendedor”, o único elemento que será carregado, para além do formulário e juntamente com este, é uma planta identificativa da localização do estabelecimento. Ocasionalmente pode também ocorrer a necessidade de juntar uma procuração, nos casos em que o declarante é representante do titular de direitos e não detém o código de consulta da procuração online e, caso o estabelecimento disponha de secção acessória de caráter industrial enquadrada no tipo 3 do SIR, deve igualmente ser junto o formulário de enquadramento respetivo.

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restauração ou de bebidas, bem como o regime aplicável à respetiva exploração e funcionamento, e no âmbito do Decreto-Lei nº 259/2007, de 17 de julho, que aprovou o regime de instalação e modificação dos estabelecimentos de comércio ou de armazenagem de produtos alimentares, bem como dos estabelecimentos de comércio de produtos não alimentares e de prestação de serviços cujo funcionamento envolve riscos para a saúde e segurança das pessoas.

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Articulação da mera comunicação prévia com o RJUE A maior novidade implementada pelo Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril, relativamente aos regimes anteriormente aplicáveis a estes estabelecimentos, foi a eliminação das consultas externas obrigatórias, no âmbito dos procedimentos de controlo prévio previstos no RJUE, sempre que a instalação ou modificação do estabelecimento dependa da realização de obras sujeitas a controlo prévio, relembrando que no caso dos estabelecimentos de restauração ou de bebidas era obrigatória a consulta à Autoridade de Saúde e a outras entidades externas ao Município 8, transferindo-se agora para os técnicos autores dos projetos a responsabilidade de atestar o cumprimento dos requisitos aplicáveis ao estabelecimento, alteração esta que, efetivamente, agiliza o procedimento e reduz os prazos de decisão. Neste contexto e perante procedimentos de controlo prévio no âmbito do RJUE que sejam necessários para instalação ou modificação de um estabelecimento, cabe à Administração verificar e garantir as questões de interesse público em matéria de ordenamento do território, saúde e segurança9. A mera comunicação prévia é também instruída com uma outra declaração do titular da exploração, onde este declara que tem conhecimento das obrigações decorrentes da 8

Conforme previsto no artigo 7.º do Decreto-Lei nº 234/2007, de 19 de junho, sempre que a instalação ou modificação de estabelecimentos de restauração ou de bebidas dependesse da realização de obras sujeitas a controlo prévio, nos termos do RJUE, o procedimento de licença ou de comunicação prévia para a realização dessas obras estava ainda sujeito aos pareceres da Autoridade Nacional de Proteção Civil, no que respeita a medidas de segurança contra incêndios; da Direção Regional de Economia ou Associação Inspetora de Instalações Elétricas, para verificação das regras relativas à instalação elétrica, sempre que aplicável; da Autoridade de Saúde, para verificação do cumprimento de normas de higiene e saúde públicas; e do Governo Civil, para verificação de aspetos de segurança e ordem pública quando estejam em causa estabelecimentos desta natureza que disponham de salas ou espaços destinados a dança. Sempre que os pareceres destas entidades se mostrassem desfavoráveis, os mesmos eram vinculativos com a consequência necessária de indeferimento do pedido de licença ou de rejeição da comunicação prévia para realização da obra. 9 Neste sentido cfr. Maria Manuel Leitão Marques, Fernanda Paula Oliveira, Ana Cláudia Guedes e Mariana Maia Rafeiro, in “Licenciamento Zero – Regime Jurídico comentado”, 2012, editora Almedina, excerto do comentário nº 1 ao artigo 1.º do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril: “Foi este tipo de razões, bem como os seus impactos negativos na iniciativa económica, na complexidade e na eficiência da Administração pública, que justificaram a intervenção legislativa aqui em análise, no âmbito do Programa Simplex, com a qual pretendeu simplificar-se o exercício de atividades económicas, sem, contudo, descurar o interesse público em matéria de ordenamento do território, saudé e segurança. Efetivamente, eliminam-se, em regra, licenças, autorizações, vistorias e outras permissões que antes eram necessárias para o acesso e o exercício de diversas atividades e, em contrapartida, responsabilizam-se os empresários pelo cumprimento das suas obrigações e agravam-se as sanções em caso de incumprimento. Está, pois, aqui em causa uma verdadeira mudança de paradigma: em vez de um controlo preventivo reforçado, passa-se para um controlo sucessivo; em vez da desconfiança sistemática por parte da Administração em relação ao cidadão, a confiança passa a ser a regra.”

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legislação identificada no anexo III do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril, e de que as respeita integralmente. Esta declaração veio reforçar, também, a responsabilização dos particulares intervenientes, técnicos e titular da exploração, passando para as entidades fiscalizadoras a responsabilidade de confirmação do cumprimento desses mesmos requisitos, após instalação ou modificação do estabelecimento, fazendo, portanto, sentido a dispensa de consultas externas obrigatórias em prol da simplificação administrativa. Tendo, ou não, existido obras sujeitas a controlo prévio, no âmbito do RJUE, para a instalação ou modificação de um estabelecimento, a mera comunicação prévia atesta que foram cumpridos todos os procedimentos e também todos os requisitos aplicáveis ao tipo de estabelecimento, tal como acontecia com as declarações prévias previstas nos regimes anteriores. Assim, o particular interessado na instalação ou modificação de um estabelecimento abrangido pelo Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril, poderá, também, estar sujeito à entrega de até três procedimentos, tal como acontecia nos regimes anteriores, senão vejamos: 

Caso o espaço não dependa de obras sujeitas a controlo prévio e detenha alvará de utilização compatível com a atividade, bem como estando cumpridos todos os requisitos aplicáveis ao tipo de estabelecimento, a instalação ou modificação está sujeita a: 1. Mera comunicação prévia para

instalação ou modificação do

estabelecimento. 

Caso o espaço não dependa de obras sujeitas a controlo prévio mas dependa da obtenção de alvará de utilização compatível com a atividade, bem como estando cumpridos todos os requisitos aplicáveis ao tipo de estabelecimento, a instalação ou modificação está sujeita a: 1. Autorização de utilização ou de alteração de utilização, a formalizar nos termos do RJUE, para obtenção de alvará compatível com a atividade pretendida; 2. Mera comunicação estabelecimento.

prévia para instalação ou modificação do

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Caso o espaço dependa de obras sujeitas a controlo prévio, a instalação ou modificação está sujeita a: 1. Licença ou comunicação prévia, a formalizar nos termos do RJUE, para execução da obra; 2. Autorização de utilização ou de alteração de utilização, a formalizar nos termos do RJUE, para obtenção de alvará compatível com a atividade pretendida, após conclusão da obra; 3. Mera comunicação

prévia para instalação ou modificação do

estabelecimento. A mera comunicação prévia é, assim, um procedimento conhecido com uma nova designação e que foi facilmente implementado nos serviços e aceite pelos particulares, independentemente de, até à presente, data o “Balcão do Empreendedor” ainda não se encontrar totalmente implementado e em funcionamento e, portanto, ainda ser aceite na maior parte dos municípios do país a entrega da documentação em suporte de papel.

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A comunicação prévia com prazo A instalação ou modificação dos estabelecimentos previstos no anexo I do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril, pode, também, estar sujeito ao regime de comunicação prévia com prazo, sempre que a referida instalação ou modificação dependa de dispensa prévia de requisitos legais ou regulamentares aplicáveis às instalações, aos equipamentos e ao funcionamento das atividades económicas a exercer no estabelecimento, conforme dispõe o nº 1 do artigo 5.º do diploma. Esta nova figura consiste numa declaração que permite ao interessado proceder à abertura do estabelecimento caso o presidente da câmara municipal, ou em quem este delegar, emita despacho de deferimento no prazo de 20 dias contados a partir do momento em que estão entregues todos os elementos de instrução obrigatória 10 e do pagamento das taxas devidas. A comunicação está implicitamente deferida caso, decorrido esse prazo, não exista despacho de decisão11.

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Previstos no nº 1 e no nº 2 artigo 3.º da Portaria nº 239/2011, de 21 de junho. Neste sentido cfr. Dulce Lopes, “A Comunicação Prévia e os Novos Paradigmas de Controlo Administrativo da Atividade Privada”, in Revista de Direito Regional e Local, nº 14, abril/junho de 2011, excerto do artigo na alínea b. do ponto 2 – “Comunicação prévia com prazo no regime do licenciamento zero”: “Do ponto de vista da caracterização jurídica da comunicação prévia com prazo, é de ressaltar que o n.º 2 do artigo 5.º parece colocar em pé de igualdade o acto de deferimento expresso ou a omissão do despacho de deferimento; não obstante, o artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 48/2011 clarifica que a ausência formal de decisão é, afinal, uma solução de recurso ou supletiva, equivalente, por isso, a um tradicional deferimento tácito e não ao figurino inovador das comunicações prévias delineado no regime jurídico da urbanização e edificação (cfr. supra). Efectivamente, deste artigo 15.º resulta que os actos praticados em sede de comunicação prévia com prazo devem ser comunicados ao requerente, através do «Balcão do empreendedor» e consistem no despacho de deferimento ou no despacho de indeferimento, o qual contém a identificação das desconformidades do pedido com as disposições legais e regulamentares aplicáveis e cujo cumprimento não é dispensado. O que aponta para que o desfecho normal do procedimento de comunicação prévia com prazo se faça por intermédio de uma decisão expressa e fundamentada (um despacho do presidente da câmara ou do órgão delegado ou subdelegado). A estas duas hipóteses acresce uma terceira, surgida, no entanto, apenas na ausência de decisão expressa: o deferimento tácito ou silente da pretensão no termo do prazo legal de decisão. O deferimento tácito mantém-se, assim, actual no nosso ordenamento jurídico, ainda que possa continuar a estar sujeito a críticas, desde logo por potenciar a inactividade da Administração, com os riscos inerentes de permissão do exercício de actividades sem o adequado controlo prévio administrativo, e por ser um acto menos adaptado à reacção contenciosa pelos contra-interessados, já que lhe falta um suporte formal imediato. Não obstante, o risco de diluição do controlo prévio foi plenamente assumido pelo legislador, que tem transformado radicalmente, como vimos, os termos em que a dicotomia controlo prévio/ controlo a posteriori deve ser entendida.” 11

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Ainda neste âmbito pode o presidente da câmara municipal proceder à consulta de outras entidades, porém, tais consultas não suspendem a contagem do prazo de 20 dias para despacho de decisão. A decisão só poderá ser de deferimento caso se verifiquem, cumulativamente, as seguintes condições12: 1. Cumprimento de condicionamentos legais ou regulamentares imperativos relativos à segurança contra incêndios, à saúde pública ou a operações de gestão de resíduos, e; 2. Cumprimento de requisitos imperativos de higiene dos géneros alimentícios expressamente previstos nos Regulamento (CE) nº 852/2004, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril, e; 3. Contributo para a requalificação ou revitalização da área circundante do edifício ou fração autónoma onde se instala o estabelecimento, ou; 4. Contributo para a conservação do edifício ou fração autónoma onde se instala o estabelecimento, ou; 5. Estar em curso ou a ser iniciado procedimento conducente à elaboração, revisão, retificação, alteração ou suspensão de instrumento de gestão territorial que não seja impeditivo do funcionamento, por prazo determinado, do estabelecimento, ou; 6. Quando a estrita observância dos requisitos exigidos para as instalações e equipamentos afetar significativamente a rendibilidade ou as características arquitetónicas ou estruturais dos edifício que estejam classificados como de interesse nacional, público ou municipal ou que possuam valor histórico, arquitetónico, artístico ou cultural, ou; 7. Quando o estabelecimento está integrado em conjunto comercial que já cumpra esses requisitos e isso aproveite ao estabelecimento. A decisão é sempre publicada no portal do “Balcão do Empreendedor” sendo que, em caso de indeferimento, o despacho deve conter a identificação das desconformidades do

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Conforme previsto no nº 5 e no nº 6 do artigo 5.º do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril.

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pedido com as disposições legais e regulamentares aplicáveis e cujo cumprimento não é dispensado13. Em resumo, o regime da comunicação prévia com prazo é um novo procedimento de controlo prévio ainda que possa ser entendido como simplificado 14 e, em caso de indeferimento, deve ser concedida audiência dos interessados15. Ao contrário da mera comunicação prévia, os elementos instrutórios da comunicação prévia com prazo implicam já alguma complexidade na medida em que, para além dos elementos instrutórios que ficam identificados no próprio modelo de formulário, e da planta de localização do estabelecimento, disponíveis no portal do “Balcão do Empreendedor”, deve ainda ser entregue a seguinte documentação: 

Termo de responsabilidade subscrito por pessoa habilitada a ser autor de projeto, segundo o regime da qualificação profissional dos técnicos responsáveis pela elaboração e subscrição de projetos, quanto ao cumprimento de todos os requisitos legais e regulamentares para os quais não se pede dispensa;



Planta e corte do edifício, fração ou da área objeto da comunicação à escala 1:100 ou superior, contendo as dimensões, áreas e usos de todos os compartimentos, bem como a apresentação do mobiliário fixo e equipamento sanitário;

Do modelo de formulário consta ainda um campo adicional, de preenchimento obrigatório, para a identificação dos requisitos legais ou regulamentares a dispensar, 13

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Conforme previsto no artigo 15.º do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril.

Neste sentido cfr. Maria Manuel Leitão Marques, Fernanda Paula Oliveira, Ana Cláudia Guedes e Mariana Maia Rafeiro, in “Licenciamento Zero – Regime Jurídico comentado”, 2012, editora Almedina, excerto do comentário nº 1 ao artigo 5.º do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril: “… Ao contrário da mera comunicação prévia, o que está aqui em causa é o desencadeamento de um procedimento (ainda que simplificado) tendente a obter da Administração uma decisão (que como veremos deve ser expressa, mas pode ser tácita) e, portanto, destinado à prática de um ato administrativo que aprecie as pretensões privadas.” 15 Neste sentido cfr. Maria Manuel Leitão Marques, Fernanda Paula Oliveira, Ana Cláudia Guedes e Mariana Maia Rafeiro, in “Licenciamento Zero – Regime Jurídico comentado”, 2012, editora Almedina, no comentário nº 4 ao artigo 5.º do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril: “Estando em causa um procedimento administrativo tendente à prática de um ato de deferimento ou de indeferimento da pretensão, tem aplicação subsidiária o CPA, sendo, por isso exigível, quando se trate de indeferimento da pretensão ou de um deferimento em termos distintos do solicitado (por exemplo, dispensando-se o cumprimento de certos requisitos, mas exigindo-se o cumprimento de outros), o cumprimento do trâmite da audiência dos interessados, com as implicações deste em termos do prazo de decisão: a suspensão do prazo de decisão da comunicação prévia com prazo.”

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aplicáveis às instalações, aos equipamentos e ao funcionamento das atividades económicas a exercer no estabelecimento, e a justificação das razões do seu não cumprimento. Também deste formulário consta a declaração do titular da exploração, onde este declara que tem conhecimento das obrigações decorrentes da legislação identificada no anexo III do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril, e de que as respeita integralmente, com exceção das relativas aos requisitos a que solicita dispensa, porém, não consta dos elementos de instrução obrigatória deste procedimento, nem sequer do modelo de formulário, a declaração do titular em como tem conhecimento da necessidade do edifício ou fração onde vai instalar o estabelecimento possuir título de autorização de utilização compatível com a atividade a exercer 16. Assim, perante a ausência desta declaração nos elementos instrutórios da comunicação prévia com prazo, não é possível atestar, no imediato, que foram realizados os procedimentos constantes do RJUE, nomeadamente o procedimento de autorização de utilização ou de alteração de utilização do edifício ou fração de modo a comprovar a existência de alvará compatível com a atividade. Inclusivamente, se um dos requisitos sobre os quais se solicita dispensa for, concretamente, a existência de alvará de utilização compatível com a atividade a exercer no edifício ou fração autónoma, não resulta claro se este será um requisito passível de dispensa, face à margem de discricionariedade possível no ato de decisão deste procedimento17.

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Nestes termos a Administração não tem legitimidade legal para exigir ao titular que declare que tem conhecimento da necessidade de dispor de alvará de utilização compatível com a atividade que vai exercer no edifício ou fração autónoma. 17 Neste sentido cfr. Maria Manuel Leitão Marques, Fernanda Paula Oliveira, Ana Cláudia Guedes e Mariana Maia Rafeiro, in “Licenciamento Zero – Regime Jurídico comentado”, 2012, editora Almedina, excerto do comentário nº 2 ao artigo 5.º do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril: “Mencione-se que a comunicação prévia com prazo a que se refere o presente artigo contém uma margem relativamente ampla de discricionariedade que não é muito comum neste tipo de atos. Com efeito, permite-se aqui que se dispense quaisquer disposições (que são as referidas no anexo III) inclusive de nível legislativo, com exceção dos condicionalismo legais ou regulamentares imperativos relativos à segurança contra incêndios, à saúde pública ou a operações de gestão de resíduos ou de requisitos imperativos de higiene dos géneros alimentícios, sem, portanto, os identificar (nº 5 do artigo 5.º) e sem que se exija que estejam em causa situações específicas em que já se reconhece de forma ampla desvios à regra de aplicação das leis no tempo (como é o que sucede quando se trata de intervenções em edifícios nos termos do artigo 60.º do RJUE ou do artigo 51.º do RJRU).

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Articulação da comunicação prévia com prazo com o RJUE

Os efeitos e até a aplicabilidade prática da comunicação prévia com prazo podem ser postos em causa quando a instalação ou modificação de um estabelecimento envolva a realização de obras sujeitas a controlo prévio, nos termos do RJUE, conforme previsto no artigo 7.º do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril. Efetivamente mantém-se a articulação entre regimes, tal como acontecia nos regimes anteriores e, portanto, a realização de obras que não sejam consideradas de escassa relevância urbanística, mantém-se sujeitas ao controlo prévio previsto no RJUE. Nesta fase é importante fazer notar a “letra da lei”. O nº 1 do artigo 7.º do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril, dispõe concretamente o seguinte: “Sem prejuízo do disposto nesta subsecção, sempre que a instalação ou modificação de um estabelecimento abrangido pelos n.os 1 e 2 do artigo 2.º envolva a realização de obras sujeitas a controlo prévio*, antes de efetuar a mera comunicação prévia prevista nos n.os 1 e 2 do artigo 4.º ou a comunicação prévia com prazo referida nos n. os 1 e 2 do artigo 5.º, deve o interessado dar cumprimento ao regime jurídico da urbanização e edificação (RJUE), aprovado pelo Decreto–Lei n.º 555/99, de 16 de Dezembro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 26/2010, de 30 de Março, e pela Lei n.º 28/2010,de 2 de Setembro.”*(sublinhado nosso) Nas definições constantes do artigo 2.º do RJUE são consideradas “obras”, as seguintes: 

“Obras de construção”;



“Obras de reconstrução sem preservação das fachadas”;



“Obras de ampliação”;



“Obras de alteração”;



“Obras de conservação”;



“Obras de demolição”;



“Obras de urbanização”;

17



“Obras de escassa relevância urbanística”;



“Obras de reconstrução com preservação das fachadas”.

No artigo 6.º do RJUE encontram-se consagradas as obras isentas de controlo prévio: 

As obras de conservação 18;



As obras de alteração no interior de edifícios ou suas frações que não impliquem modificações na estrutura de estabilidade, das cérceas, da forma das fachadas e da forma dos telhados ou coberturas;



As obras de escassa relevância urbanística 19.

Assim todas as restantes obras não previstas neste artigo estão sujeitas a procedimento de controlo prévio, nos termos do RJUE. Ora, perante a instalação ou modificação de um estabelecimento que envolva a realização de obras sujeitas a controlo prévio, nos termos do RJUE, terá o interessado que lançar mão do procedimento de licença ou do procedimento de comunicação prévia20 previstos no n.º 2 e no nº 4 do artigo 4.º do RJUE, respetivamente. Estes procedimentos são instruídos com os elementos previstos na Portaria nº 232/2008, de 11 de março, e ambos implicam a entrega de termos de responsabilidade dos técnicos autores dos respetivos projetos e do coordenador de projetos, em conformidade com o disposto no artigo 10.º do RJUE. Tratando-se de um estabelecimento que irá requerer a dispensa de requisitos, os termos de responsabilidade em causa poderão recorrer ao disposto no nº 5 do artigo 10.º do RJUE21, para fundamentar a dispensa das normas técnicas ou regulamentares que não

18

Desde que não incidam sobre imóveis classificados ou em vias de classificação, bem como dos imóveis integrados em conjuntos ou sítios classificados ou em vias de classificação as quais, nesses casos, estão sujeitas a procedimento de licença conforme previsto na alínea d) do nº 2 do artigo 4.º do RJUE. 19 Consagradas no artigo 6.º-A do RJUE. 20 Relativamente a obras sujeitas ao procedimento de comunicação prévia, com enquadramento no nº 4 do artigo 4.º do RJUE, o nº 1 do artigo 8.º do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril, apresenta já a possibilidade de o procedimento ser submetido pelo “Balcão do Empreendedor”. Prevê, inclusivamente, este artigo que a mesma obra possa ser sujeita a mera comunicação prévia, porém, este artigo não se encontra em vigor na medida em que as portarias que iriam regulamentar estes casos nunca chegaram a ser publicadas. 21 Sendo que o nº 5 do artigo 10.º dispõe que os autores e coordenador dos projetos devem declarar, nomeadamente nas situações previstas no artigo 60.º, quais as normas técnicas ou regulamentares em

18

serão cumpridas, nomeadamente quando se trate de intervenção em edificação existente, construída ao abrigo do direito anterior, e mantendo-se a sua utilização originária22. Ainda assim, da análise técnica que terá que ser efetuada aos projetos constantes do procedimento à que ter em conta o âmbito concreto da apreciação da obra proposta e, forçosamente podem não ser aceites os fundamentos apresentados para o incumprimento de determinadas normas técnicas ou regulamentares, o que resultará no indeferimento do pedido de licença ou na rejeição da comunicação prévia para execução da obra23. Neste caso as normas técnicas e regulamentares que se propunha incumprir terão que ser cumpridas para que a obra possa ser licenciada ou admitida obtendo-se, no seu final e através do procedimento de autorização de utilização, o alvará de utilização e, portanto, a comunicação prévia com prazo que se seguiria para declarar a instalação ou modificação do estabelecimento não terá aplicabilidade prática uma vez que já não estará em causa a necessidade de dispensa de requisitos. Por outro lado, e admitindo-se que a obra é licenciada ou admitida aceitando-se a fundamentação

apresentada

para

o

incumprimento

de

normas

técnicas

ou

regulamentares conforme os termos de responsabilidade entregues, concluída a obra terá que ser submetido o procedimento de autorização de utilização para obtenção do alvará.

vigor que não foram observadas na elaboração dos mesmos, fundamentando as razões da sua não observância. 22 O artigo 60.º do RJUE dispõe que as edificações construídas ao abrigo do direito anterior e as utilizações respetivas não são afetadas por normas legais e regulamentares supervenientes, desde que as obras a executar não originem ou agravem desconformidade com as normas em vigor ou tenham como resultado a melhoria das condições de segurança e de salubridade da edificação Relativamente a atividades terciárias em concreto, consagra ainda este artigo que a lei pode impor condições específicas para o exercício de certas atividades em edificações já afetas a tais atividades ao abrigo do direito anterior, bem como condicionar a execução de obras à realização dos trabalhos acessórios que se mostrem necessários para a melhoria das condições de segurança e salubridade da edificação. 23 Neste sentido cfr. Maria Manuel Leitão Marques, Fernanda Paula Oliveira, Ana Cláudia Guedes e Mariana Maia Rafeiro, in “Licenciamento Zero – Regime Jurídico comentado”, 2012, editora Almedina, excerto do comentário nº 1 ao artigo 7.º do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril: “Refira-se, a este propósito, que nem sempre estes regimes estão articulados uma vez que, enquanto para efeitos do artigo 5.º do presente Decreto-Lei se admite a instalação do estabelecimento com dispensa de requisitos referentes às acessibilidades aos edifícios e estabelecimentos que recebem público (DecretoLei nº 163/2006, de 8 de agosto) – cfr. Anexo III que expressamente se refere a este como um requisito a observar e que, por isso, pode ser dispensado nos termos do referido artigo 5.º -, já se for necessário realizar obras sujeitas a prévio controlo municipal não vemos como possa ser dispensado o cumprimento destas exigências fora da própria previsão legal (que apenas admite, em situações muito contadas, o seu não cumprimento).”

19

De seguida teria o interessado que lançar mão, também, do procedimento de comunicação prévia com prazo para obtenção da decisão sobre a dispensa dos requisitos, juntando novamente: 

Planta de localização do estabelecimento;



Termo de responsabilidade subscrito por pessoa habilitada a ser autor de projeto, segundo o regime da qualificação profissional dos técnicos responsáveis pela elaboração e subscrição de projetos, quanto ao cumprimento de todos os requisitos legais e regulamentares para os quais não se pede dispensa;



Planta e corte do edifício, fração ou da área objeto da comunicação à escala 1:100 ou superior, contendo as dimensões, áreas e usos de todos os compartimentos, bem como a apresentação do mobiliário fixo e equipamento sanitário;

Bem como a descrição e fundamentação dos requisitos legais ou regulamentares a dispensar, os quais já haviam sido aceites no âmbito do controlo prévio da obra. Para além disso terá ainda o interessado que proceder ao pagamento da taxa devida e aguardar mais 20 dias úteis para abertura do estabelecimento, situação que culmina na total ausência de efeitos práticos da comunicação prévia com prazo revelando-se esta inútil e servindo apenas para criar um compasso de espera de 20 dias, pelo menos, entre a obtenção do alvará de utilização e a abertura do estabelecimento ao público e impondo ao particular a entrega de documentação que já havia sido entregue junto com o procedimento de controlo prévio da obra. Quanto aos serviços e ao município, terão que analisar e decidir novamente sobre uma matéria que já havia sido objeto de decisão.

Note-se que, neste exercício, abordou-se um caso de instalação ou modificação de estabelecimento que envolva a realização de obras sujeitas a controlo prévio, e que careça de dispensa de requisitos, conforme previsto no nº 1 do artigo 7.º do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril, à “letra da lei”.

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Pensemos agora num caso de instalação ou modificação de estabelecimento que não envolva a realização de obras sujeitas a controlo prévio, mas implique a alteração de utilização e careça de dispensa de requisitos. Foi já referido no subcapítulo anterior que a comunicação prévia com prazo não exige que o particular declare que tem conhecimento da necessidade do edifício ou fração onde vai instalar o estabelecimento possuir título de autorização de utilização compatível com a atividade a exercer. Inclusivamente ficou lançada a dúvida se seria requisito passível de ser dispensado, a ausência de título de autorização de utilização compatível com a atividade a exercer, face á ampla margem discricionária da Administração no âmbito deste procedimento. Nas definições constantes do artigo 2.º do RJUE, para além das referidas anteriormente, existe, também, a definição de “Operações urbanísticas”: “Operações urbanísticas” - as operações materiais de urbanização, de edificação, utilização dos edifícios* ou do solo desde que, neste último caso, para fins não exclusivamente agrícolas, pecuários, florestais, mineiros ou de abastecimento público de água. *(sublinhado nosso) A utilização de edifícios ou suas frações é, portanto, uma operação urbanística que, nos termos do RJUE, está também sujeita a procedimento de controlo prévio, neste caso de autorização, conforme previsto no nº 5 do artigo 4.º daquele diploma 24. Porém, o artigo 7.º do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril, em momento algum se refere a operações urbanísticas, refere-se apenas a obras e, provavelmente, fará sentido que assim seja, senão vejamos: Considerando que a instalação ou modificação de um estabelecimento, que carece de dispensa de requisitos, implica a realização de procedimento de autorização para alterar a utilização originária do edifício ou fração onde se pretende instalar ou modificar o estabelecimento o interessado terá de submeter o pedido ao município, nos termos do

24

O qual consagra que está sujeita a autorização a utilização dos edifícios ou suas frações, bem como as alterações da utilização dos mesmos.

21

RJUE, e instrui-lo com os elementos previstos no artigo 15.º da Portaria nº 232/2008, de 11 de março25. Dos elementos instrutórios deste procedimento, entre outros, fazem parte: 

Planta de localização do estabelecimento;



Termo de responsabilidade subscrito por pessoa habilitada a ser autor de projeto,

22

segundo o regime da qualificação profissional dos técnicos responsáveis pela elaboração e subscrição de projetos, a elaborar nos termos do nº 2 do artigo 62.º, por remissão do nº 2 do artigo 63.º, em conjugação com o nº 5 do artigo 10.º do RJUE26; 

Planta e corte do edifício ou da fração com identificação do respetivo prédio.

Faz-se, desde já, notar que estes mesmos elementos fazem parte da instrução obrigatória da comunicação prévia com prazo. Instruído o pedido, o mesmo deve ser analisado com base no disposto na alínea c) do nº 2 do artigo 64.º do RJUE27, de modo a aferir tecnicamente se existem sérios indícios de que o edifício, ou sua fração autónoma, não é idóneo para o fim pretendido, tendo em conta as declarações constantes do termo de responsabilidade apresentado e tendo por base que, à Administração compete verificar e garantir as questões de interesse público em matéria de ordenamento do território, saúde e segurança. Caso a análise técnica conclua nesse sentido terá o presidente da câmara municipal que determinar a realização de vistoria para efeitos de autorização de utilização com as consequências previstas no artigo 65.º do RJUE, podendo, na pior das hipóteses, a decisão ser desfavorável.

25

Conforme previsto no artigo 9.º do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril, o procedimento de autorização para alteração de utilização pode já ser submetido ao município através do “Balcão do Empreendedor”, exclusivamente em suporte digital. 26 Devendo, portanto, o técnico responsável atestar que o edifício ou fração é idóneo para o fim pretendido e identificar, bem como fundamentar, as normas técnicas ou regulamentares que não se encontram cumpridas. 27 A partir do momento em que o técnico responsável identifica normas técnicas ou regulamentares que não se encontram cumpridas, não será viável o deferimento do pedido de autorização de utilização exclusivamente com base no termo de responsabilidade sem uma prévia análise e avaliação das normas técnicas e regulamentares em causa, sob pena de ignorar o princípio da proporcionalidade, relativamente a casos em que o termo de responsabilidade declara que todas as normas técnicas e regulamentares foram cumpridas.

Neste caso as normas técnicas e regulamentares que se propunha incumprir terão que ser cumpridas para que se obtenha o alvará de utilização e, portanto, a comunicação prévia com prazo que se seguiria para declarar a instalação ou modificação do estabelecimento não terá aplicabilidade prática uma vez que já não estará em causa a necessidade de dispensa de requisitos. 23

Por outro lado, sendo o pedido de autorização para alteração de utilização objeto de decisão de deferimento e emitido o alvará, de seguida teria o interessado que lançar mão, também, do procedimento de comunicação prévia com prazo para obtenção da decisão sobre a dispensa dos requisitos, juntando novamente: 

Planta de localização do estabelecimento;



Termo de responsabilidade subscrito por pessoa habilitada a ser autor de projeto, segundo o regime da qualificação profissional dos técnicos responsáveis pela elaboração e subscrição de projetos, quanto ao cumprimento de todos os requisitos legais e regulamentares para os quais não se pede dispensa;



Planta e corte do edifício, fração ou da área objeto da comunicação à escala 1:100 ou superior, contendo as dimensões, áreas e usos de todos os compartimentos, bem como a apresentação do mobiliário fixo e equipamento sanitário;

Bem como a descrição e fundamentação dos requisitos legais ou regulamentares a dispensar, os quais já haviam sido aceites no âmbito do controlo prévio da obra. Para além disso terá ainda o interessado que proceder ao pagamento da taxa devida e aguardar mais 20 dias úteis para abertura do estabelecimento, situação que culmina na total ausência de efeitos práticos da comunicação prévia com prazo revelando-se esta inútil e servindo apenas para criar um compasso de espera de 20 dias, pelo menos, entre a obtenção do alvará de utilização e a abertura do estabelecimento ao público e impondo ao particular a entrega de documentação que já havia sido entregue junto com o pedido de autorização para alteração de utilização. Quanto aos serviços e ao município, terão que analisar e decidir novamente sobre uma matéria que já havia sido objeto de decisão, tal como se demonstrou no exercício anterior.

Conclui-se, assim, que, não só faz sentido que a comunicação prévia com prazo não exija que o particular declare que tem conhecimento da necessidade do edifício ou fração onde vai instalar o estabelecimento possuir título de autorização de utilização compatível com a atividade a exercer, como também o artigo 7.º do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril, se refere apenas a obras e não a operações urbanísticas e, portanto, neste aspeto não podemos acompanhar outros entendimentos 28 que não sejam os resultantes da “letra da lei”. Aqui chegados, podemos ainda concluir que, na verdade, a comunicação prévia com prazo apenas terá efeitos práticos quando se reporte à instalação ou modificação de um estabelecimento cujo edifício ou fração já disponha previamente de alvará de utilização compatível com a atividade a exercer, sem necessidade de executar obras sujeitas a controlo prévio ou de alterar a utilização, caso contrário volta-se a colocar a questão: 

Estando cumpridos todos os requisitos imperativos relativos à segurança contra incêndios, à saúde pública ou a operações de gestão de resíduos e, estando cumpridos todos os requisitos imperativos de higiene dos géneros alimentícios expressamente previstos nos Regulamento (CE) n.º 852/2004 e nº 853/2004, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril, pode o presidente da câmara municipal indeferir a comunicação prévia com prazo por ausência de alvará de utilização compatível com a atividade a exercer, caso se demonstre um dos fundamentos para o deferimento do pedido enunciados no nº 6 do artigo 5.º do Decreto-Lei nº 48/2011,de 1 de abril?

28

Nomeadamente o entendimento constante do primeiro comentário ao artigo 7.º do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril, cfr. Maria Manuel Leitão Marques, Fernanda Paula Oliveira, Ana Cláudia Guedes e Mariana Maia Rafeiro, in “Licenciamento Zero – Regime Jurídico comentado”, 2012, editora Almedina, excerto do comentário nº 1 ao artigo 7.º do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril: “Há, assim, várias formas possíveis de relacionamento entre a instalação da atividade (do estabelecimento) com o RJUE já que: a)A instalação do estabelecimento pode implicar a construção de uma nova edificação (o que exige o controlo prévio das obras e a obtenção de uma autorização de utilização); b) A instalação do estabelecimento ocorre num edifício já existente: i) com necessidade de realização de obras sujeitas a controlo e com eventual mudança de uso (controlo da obra e da utilização); ii)sem necessidade de realização de obras, mas com eventual mudança de uso (controlo da utilização); iii) com necessidade de realização de obras mas isentas de controlo municipal (podendo, todavia, haver lugar a autorização de utilização). É com este sentido que deve ser entendido o artigo aqui em anotação ao estabelecer a aplicação do RJUE sempre que a instalação ou modificação de um estabelecimento abrangido pelo nºs1 e 2 do artigo 2.º envolva a realização de obras sujeitas a controlo prévio, devendo os procedimentos regulados naquele regime ser desencadeados em momento anterior à mera comunicação prévia ou à comunicação prévia com prazo reguladas no presente diploma.”

24

Se tivermos em conta que a decisão de indeferimento da comunicação prévia com prazo deve ser devidamente fundamentada e precedida de audiência dos interessados, caso o particular submeta pronúncia que conteste esta decisão, com base nas disposições deste artigo 5.º, julga-se que a mesma teria que ser acolhida, caso contrário outros requisitos passíveis de ser dispensados também teriam que ser indeferidos, quando mais não fosse, por não ser o município a controlá-los29.

29

Neste sentido cfr. Dulce Lopes, “Repercussões do licenciamento zero na gestão (urbanística) municipal”, in Revista de Direito Regional e Local, nº 17, janeiro/março de 2012, excerto do artigo no ponto 5 – “Apreciação casuística dos processos”: “… Esta cláusula que confere discricionariedade à Administração municipal merece-nos alguns reparos, desde logo, o facto de ser o município a pronunciar-se sobre requisitos que depois não controla, uma vez que as competências de fiscalização relativas ao exercício da atividade se encontram cometidas à Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (art. 25.º). Apesar de todos os atos praticados ao abrigo do artigo 5.º, devem ser divulgados no Balcão do Empreendedor (art. 5.º, nº 7) – balcão este a que aquela autoridade terá facilmente acesso, não devendo, por isso, exigir ao titular da exploração o cumprimento de requisitos que foram previamente dispensados -, esta dissociação entre controlo preventivo e controlo a posteriori pode trazer consigo conflitos institucionais relevantes.”

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O licenciamento zero em edifícios construídos em data anterior à entrada em vigor do RGEU

Nesta análise não podemos deixar de abordar a instalação ou modificação de estabelecimentos em edifícios ou frações autónomas integradas em edifícios construídos em data anterior à entrada em vigor do Regulamento Geral das Edificações Urbanas (a diante designado RGEU). Como é sabido estas edificações são isentas de licença de habitabilidade e, muitas delas detêm afetações originárias de caráter comercial, de prestação de serviços ou de armazenagem. Aparentemente o legislador omitiu esta particularidade do âmbito do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril, ao não prever a possibilidade de a mera comunicação prévia incidir sobre a instalação ou modificação de estabelecimento integrado em edifício ou fração autónoma construído em data anterior à entrada em vigor do RGEU e, cuja afetação se mantém idêntica à originária, ou seja, sem ocorrer alteração de utilização. Ao impor ao titular da exploração que declare que tem conhecimento da necessidade do edifício ou fração onde vai instalar o estabelecimento possuir título de autorização de utilização compatível com a atividade a exercer, tal declaração só irá corresponder à verdade caso o particular submeta, efetivamente, o pedido de autorização de utilização para obtenção do alvará. No entanto, a imposição de tal procedimento ao particular seria inadequada uma vez que a edificação mantém a afetação originária e não está sujeita a licença de habitabilidade, tal como prevê o artigo 60.º do RJUE, isto, claro, no pressuposto de não estar em causa a realização de obras sujeitas a controlo prévio e a não ser que esta afetação seja alterada. Já no caso da comunicação prévia com prazo, que não impõe ao titular que declare que tem conhecimento da necessidade do edifício ou fração onde vai instalar o estabelecimento possuir título de autorização de utilização compatível com a atividade a exercer, parece-nos muito mais razoável esta abordagem para os casos em que a

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instalação ou modificação de estabelecimento integra edifício ou fração autónoma construído em data anterior à entrada em vigor do RGEU e, cuja afetação se mantém idêntica à originária, ou seja, sem ocorrer alteração de utilização e desde que não esteja em causa a realização de obras sujeitas a controlo prévio. Neste caso, ocorrendo deferimento relativamente aos requisitos sobre os quais se solicita dispensa, sem impor ao particular a entrega de procedimento de autorização de utilização, o estabelecimento poderá funcionar com o comprovativo do deferimento da comunicação prévia com prazo como titulo válido para o efeito, julgando-se que esta situação será suficiente para comprovar a legalidade da situação do estabelecimento e, portanto, dando verdadeiro sentido à aplicabilidade do Programa Simplex que esteve na origem do regime do licenciamento zero.

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Considerações finais Na Alemanha dos anos 90 houve a perceção de que o controlo prévio Administrativo excessivo que existia sobre as atividades económicas era um obstáculo ao livre desenvolvimento económico. 28

Assim, a Alemanha tinha uma economia pouco competitiva. A Administração pública tinha que acompanhar o desenvolvimento económico e dar respostas com a celeridade suficiente para a viabilidade dos investimentos. Mais tarde a União Europeia publicou a Diretiva nº 2006/123/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro, melhor conhecida como “Diretiva de serviços”, a qual foi transposta para o ordenamento jurídico nacional pelo Decreto-Lei nº 92/2010, de 26 de julho 30. A filosofia subjacente a este diploma é a eliminação do controlo prévio e o reforço da fiscalização sucessiva, no intuito de facilitar a vida às pessoas e às empresas prestadoras de serviços, através da implementação de quatro iniciativas perfeitamente identificadas no preambulo do diploma: 1. Criação do balcão único dos serviços que disponibiliza toda a informação necessária para o desenvolvimento da atividade em Portugal, bem como informação relevante para os destinatários dos serviços; 2. Limitação dos casos em que é possível exigir-se uma licença ou autorização para a prestação de serviços em território nacional; 3. Eliminação de formalidades consideradas desnecessárias, como, por exemplo, a necessidade de obter pareceres prévios ou de realizar vistorias no âmbito dos procedimentos administrativos; 4. Reconhecimento da liberdade de prestação de serviços e de estabelecimento de qualquer pessoa ou empresa da União Europeia no território nacional.

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Diploma que estabelece os princípios e regras para simplificar o livre acesso e exercício das atividades de serviços realizadas em território nacional.

Também neste sentido foi lançado o Programa Simplex de 2010, que continha 129 medidas de simplificação aplicáveis aos vários setores da Administração pública, com impactos sobre cidadãos, empresas e sobre a própria Administração, entre elas, o Licenciamento Zero, aprovado pelo Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril. Assim, o Licenciamento Zero pretende concretizar as filosofias inerentes ao Decreto-Lei nº 92/2010, de 26 de julho, e ao Programa Simplex de 2010 criando, no referente à instalação ou modificação de estabelecimentos, um regime simplificado, substituindo a permissão administrativa destes estabelecimentos por uma mera comunicação prévia, num balcão único eletrónico, da informação necessária à verificação do cumprimento dos requisitos legais. A informação registada é partilhada por todas as autoridades com interesse relevante no seu conhecimento, nomeadamente para efeitos de fiscalização ou de cadastro31.

A mera comunicação prévia é, portanto, a figura principal deste regime ou, se quisermos, a regra aplicável à instalação ou modificação de estabelecimentos. Porém, este diploma encontra-se ainda profundamente articulado com as disposições do RJUE e, perante a análise realizada neste trabalho à figura da mera comunicação prévia, podemos concluir que: 

A mera comunicação prévia não mais é do que a declaração prévia que se encontrava prevista nos anteriores regimes 32 revogados pelo Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril, tendo apenas sido eliminada a obrigatoriedade realização de consultas externas;

Considera-se ainda que este regime peca por não ter previsto a possibilidade de constituir título válido de abertura do estabelecimento a posse, pelo titular da exploração, do comprovativo da entrega da mera comunicação prévia e que o seu 31

Cfr. Preambulo do diploma. Decreto-Lei nº 234/2007, de 19 de junho, que aprovou o regime jurídico a que fica sujeita a instalação e a modificação de estabelecimentos de restauração ou de bebidas, bem como o regime aplicável à respetiva exploração e funcionamento, e o Decreto-Lei nº 259/2007, de 17 de julho, que aprovou o regime de instalação e modificação dos estabelecimentos de comércio ou de armazenagem de produtos alimentares, bem como dos estabelecimentos de comércio de produtos não alimentares e de prestação de serviços cujo funcionamento envolve riscos para a saúde e segurança das pessoas. 32

29

funcionamento bem como as transações comerciais e imobiliárias a ele respeitantes não podem ser prejudicadas pela inexistência de um título formal emitido pela câmara municipal33, para os casos de deferimento tácito do procedimento de autorização de utilização ou de alteração de utilização, o qual se mantém obrigatório sempre que aplicável. 30

No âmbito da presente análise, abordou-se ainda a opinião de que as disposições do licenciamento zero, relativamente à instalação ou modificação de estabelecimentos, não previram claramente a aplicabilidade em edifícios ou frações integradas em edifícios construídos em data anterior à entrada em vigor do RGEU. Esta lacuna é flagrante quando a instalação ou modificação de um estabelecimento cumpre todos os requisitos obrigatórios incluindo a afetação originária, porém, integra edifício ou fração integrada em edifício construído em data anterior à entrada em vigor do RGEU que, portanto, não detém alvará de utilização por ser isento. Nos termos do licenciamento zero o procedimento aplicável seria a mera comunicação prévia, no entanto, o recurso a este procedimento obrigaria o particular a recorrer em primeiro lugar ao RJUE, para realização do procedimento de autorização de utilização e assim obter o alvará de utilização, alvará de que está isento, isto porque o procedimento de mera comunicação prévia exige a existência de alvará compatível com a atividade exercida. Tal exigência é uma total incoerência, neste caso concreto, na medida em que, conforme prevê o nº 1 do artigo 60.º do RJUE, as edificações construídas ao abrigo do direito anterior e as utilizações respetivas não são afetadas por normas legais e regulamentares supervenientes34.

33

Cfr. Previsto no artigo 12.º do Decreto-Lei nº 234/2007, de 19 de junho. Neste sentido cfr. Fernanda Paula Oliveira, Maria José Castanheira Neves, Dulce Lopes e Fernanda Maçãs, in “Regime Jurídico da Urbanização e Edificação - Comentado”, 2012, editora Almedina, excerto do comentário nº 1 ao artigo 60.º do Decreto-Lei nº 555/1999, de 16 de dezembro, na redação conferida pelo Decreto-Lei nº 26/2010, de 30 de março: “1. O artigo em apreço corresponde à consagração, entre nós, do princípio da garantia do existente, quer na sua vertente passiva, quer activa. A primeira destas vertentes, prevista no nº 1 do presente normativo, corresponde à consagração da situação geral de aplicação das normas no tempo traduzida no princípio tempus regit actum que se encontra consagrada no artigo 62,º do presente diploma, normativo que determina que a validade das licenças ou autorizações depende da sua conformidade com as normas legais e regulamentares aplicáveis em vigor à data da sua prática. Por isso se afirma que as edificações construídas ao abrigo do 34

Assim, a aplicabilidade das disposições do licenciamento zero para a instalação ou modificação de estabelecimentos em edifícios ou frações integradas em edifícios construídos em data anterior à entrada em vigor do RGEU que não dependam de obras sujeitas a controlo prévio e que não alterem a afetação originária do edifício ou fração só serão válidas com recurso à comunicação prévia com prazo, que não exige ao particular que declare que tem conhecimento da necessidade de dispor de alvará compatível com a atividade, desde que o particular solicite expressamente a dispensa deste requisito fundamentado no fato de estar isento e, cumulativamente, preencher um dos fundamentos de dispensa previstos no nº 6 do artigo 5.º do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril. Julga-se, portanto, ser forçoso concluir que a mera comunicação prévia poderia estar melhor adaptada à realidade urbanística se previsse a possibilidade de o particular declarar o cumprimento de todos os requisitos obrigatórios ao funcionamento do estabelecimento e declarar que dispõe de alvará compatível com a atividade a exercer ou, a alternativa adicional de declarar que, sendo o edifício isento de licença de habitabilidade, mantém a sua afetação originária.

A exceção será, naturalmente, a comunicação prévia com prazo, para instalação ou modificação de estabelecimentos com dispensa de requisitos, que consubstancia ainda um procedimento de controlo prévio que, pela forma como se encontra regulado, quando exigida a articulação com o RJUE, pode não ter aplicabilidade prática ou pode até não produzir qualquer tipo de efeito, realidade que se crê absolutamente contrária à pretendida pelo legislador. Da análise realizada neste trabalho abordou-se o amplo caráter discricionário subjacente à comunicação prévia com prazo e constatou-se que tal amplitude de discricionariedade não se aplica no âmbito do RJUE. Assim, os requisitos legais ou regulamentares que são direito anterior e as utilizações respetivas não são afectadas por normas legais e regulamentares supervenientes. (…) Assume particular relevo prático, nestes casos, a comprovação e atestação de que um edifício é anterior à aplicação do RGEU, ou à entrada em vigor do regulamento de extensão da aplicação do RGEU à área do concelho não incluída na sede do município (£ único do artigo 1.º do RGEU), de modo que se possa considerar estar perante um edifício legalmente existente, não obstante a ausência de actos autorizativos.”

31

suscetíveis de ser dispensados no âmbito do artigo 5.º do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 abril, podem não ser dispensados no âmbito dos procedimentos de controlo prévio previstos no RJUE, resultando em incoerências entre os procedimentos que resumimos no quadro seguinte:

Obra

Utilização

Controlo prévio

Decisão

Licença ou Comunicação Prévia

Favorável

Autorização de utilização ou alteração de utilização

Favorável

Desfavorável

Desfavorável

Comunicação prévia com prazo Favorável Sem aplicabilidade* Favorável Sem aplicabilidade*

Decisão Sem efeitos práticos** -----------Sem efeitos práticos** --------------

*Considerando que no controlo prévio da obra ou da utilização não foram aceites as fundamentações apresentadas para o incumprimento dos requisitos legais ou regulamentares identificados pelo técnico responsável, a comunicação prévia com prazo não terá aplicabilidade prática para a instalação ou modificação do estabelecimento, uma vez que os requisitos que se pretendia dispensar terão que ser cumpridos.

**Considerando que no controlo prévio da obra ou da utilização foram aceites as fundamentações apresentadas para o incumprimento dos requisitos legais ou regulamentares identificados pelo técnico responsável, a comunicação prévia com prazo não terá efeitos práticos para a instalação ou modificação do estabelecimento, uma vez que a análise e decisão em causa já ocorreram na fase de controlo prévio do RJUE e não fará sentido aguardar mais 20 dias por uma decisão que já foi tomada.

Assim, a comunicação prévia com prazo só terá aplicabilidade prática nos casos em que a instalação ou modificação de um estabelecimento, com dispensa de requisitos, não dependa da realização de obras sujeitas a controlo prévio. No entanto, e caso o legislador tivesse adensado de modo mais aprofundado os efeitos produzidos por este procedimento, julga-se que seria, de todo em todo, aceitável que a decisão de deferimento de uma comunicação prévia com prazo, devidamente publicada no “Balcão do Empreendedor” e a posse, pelo titular da exploração, do comprovativo da entrega da comunicação prévia com prazo, constituísse título válido de abertura do estabelecimento e que o seu funcionamento bem como as transações comerciais e

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imobiliárias a ele respeitantes não podem ser prejudicadas pela inexistência de um título formal emitido pela câmara municipal, substituindo-se, portanto, o procedimento de autorização, previsto no RJUE, por este novo procedimento que produz efeitos idênticos, porém, sem emissão de um titulo formal. Não tendo sido prevista esta possibilidade, a realidade traduz-se na clara duplicação de procedimentos para a mesma formalidade com a penalização adicional de estes procedimentos poderem conflituar entre si, em termos da decisão, para além de impor ao particular a entrega de elementos idênticos para ambos os procedimentos e ainda o pagamento de duas taxas distintas para o mesmo fim e um compasso de espera de 20 dias, pelo menos, entre a obtenção de um alvará de utilização e a efetiva data da abertura do estabelecimento ao público. Para a Administração, implica a duplicação de análises e decisões sobre apenas um objeto, com as eventuais entropias nos serviços que tal realidade possa vir a causar. Ainda assim julgamos que, se um dos requisitos sobre os quais se solicita dispensa for a existência de alvará de utilização compatível com a atividade a exercer, não haverá fundamento suficiente, no âmbito do artigo 5.º do Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril, para não aceitar a dispensa deste requisito desde que se verifique um dos fundamentos para o deferimento da comunicação, conforme previsto no nº 6 do mesmo artigo.

Convicta de que a exposição apresentada neste trabalho é clara e fundamentada e que se pretende, com ela, demonstrar que o regime do Licenciamento zero, quando aplicável à instalação ou modificação de estabelecimentos, pode ainda ser melhor adensado e articulado com o RJUE e também com os restantes regimes conexos no intuito de, verdadeiramente, facilitar a vida às pessoas e às empresas prestadoras de serviços, nomeadamente no que à figura da comunicação prévia com prazo diz respeito, é nossa opinião que esta figura, de caráter experimental, carece de melhores desenvolvimentos e melhor articulação com os regimes conexos, nomeadamente com o RJUE, para que a sua aplicabilidade prática seja plena e assim se atinjam, efetivamente, as premissas do Decreto-Lei nº 92/2010, de 26 de julho, do Programa Simplex de 2010.

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Bibliografia 

Leitão Marques, M. M., et al. (2012). Licenciamento Zero Regime Jurídico Comentado. Coimbra, Almedina



Lopes, D. (2011). A Comunicação Prévia e os Novos Paradigmas de Controlo 34

Administrativo da Actividade Privada. Direito Regional e Local. 14 abril/junho, p. 07 

Lopes, D. (2012). Repercussões do licenciamento zero na gestão (urbanística) municipal. Direito Regional e Local. 17 janeiro/março, p. 18



Oliveira, F. P., et al. (2012). Regime Jurídico da Urbanização e Edificação – Comentado. Coimbra, Almedina

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