Introdução á Psicomotricidade Profa Érica Fróis CURSO DE PÓS GRADUAÇÃO LATO SENSU EM PSICOMOTRICIDADE

May 24, 2017 | Autor: Edward Jerônimo | Categoria: N/A
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Descrição do Produto

CURSO DE PÓS GRADUAÇÃO LATO SENSU EM PSICOMOTRICIDADE

Disciplina: Introdução á Psicomotricidade

Professora: Érica Fróis Contato: [email protected]

Junho/2010 Introdução á Psicomotricidade Profa Érica Fróis

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PLANO DE ENSINO

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM 1. IDENTIFICAÇÃO DA DISCIPLINA Disciplina

Introdução á Psicomotricidade

Carga horária

32 horas

Professor

Érica Silva Fróis

Coordenador

Sônia Onofri

Ano

2010

Semestre



2. EMENTA

Bases, histórico e conceitos da Psicomotricidade 3. OBJETIVOS 3.1.

Geral

Levar o aluno a conhecer, situar e definir a Psicomotricidade 3.2.

Específicos

Introduzir os conceitos pertinentes à corporeidade e à organização psicomotora 4. CONTEÚDO PROGRAMÁTICO

Bases, histórico e conceitos da psicomotricidade: Histórico da psicomotricidade Conceitos psicomotores: Tônus e postura Movimento Esquema Corporal e Imagem Corporal Espaço - Tempo e Lateralidade Coordenação Motora, Equilíbrio e Percepção 5. CRONOGRAMA PREVISTO DIAS

CONTEÚDO

METODOLOGIA

CH

02/07/2010 Apresentação e Prática Psicomotora: O Aula Noite corpo em questão expositiva e 4 prática 03/07/2010 História do corpo e Manhã Psicomotricidade Exercício e discussão 03/07/2010 Conceitos Introdução á Psicomotricidade Profa Érica Fróis

histórico

Psicomotores:

tônus

da Aula expositiva e 4 seminário e Aula

4

2

Tarde

postura

expositiva

07/08/2010 Conceitos Psicomotores: Movimento Manhã Prática Psicomotora

Aula expositiva e 4 prática

07/08/2010 Conceitos Psicomotores: Esquema e Aula Tarde Imagem Corporal expositiva

4

21/08/2010 Conceitos Psicomotores: Esquema e Aula Manhã Imagem Corporal expositiva e 4 Vídeo comentado- Atividade avaliativa vídeo comentado 04/09/2010 Conceitos Psicomotores: Estruturação Aula Manhã Espacial e Estruturação Temporal expositiva e 4 Exercício Avaliativo exercício 18/09/2010 Conceitos Psicomotores: Lateralidade, Aula Manhã Coordenação motora, ritmo, Equilíbrio e expositiva Percepção

4

TOTAL DE DIAS: 8 dias 6. SISTEMA DE AVALIAÇÃO

03/07/2010 Manhã

Trabalho avaliativo “A história da Psicomotricidade”

21/08/2010 Manhã

Atividade avaliativa: vídeo comentado

04/09/2010 Manhã

Exercício Avaliativo: Conceitos Psicomotores

18/09/2010 Manhã

Trabalho final: O Desenvolvimento Psicomotor

7. BIBLIOGRAFIA BÁSICA: Apostila da disciplina 8. BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR

COSTE, Jean-Claude Coste.A Psicomotricidade.RJ, Guanabara. 1992 LE BOULCH, Jean. O desenvolvimento psicomotor: do Nascimento aos 6 anos. Porto Alegre:Artes Médicas,1982

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Érica Silva Fróis

É graduada e licenciada em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, especializada em Psicomotricidade, Educação inclusiva e Psicopedagogia. Atualmente é professora da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, campus Arcos, São Gabriel e campus Coração Eucarístico. Cursa mestrado em Psicologia nesta instituição com previsão de término para dez/2010. Participa do curso de formação pelo Método Aucouturier no Espaço Nectar/RJ e coordena projeto de extensão pela PUC Minas/Arcos focando práticas psicomotoras com crianças. É funcionária da Prefeitura de Belo Horizonte desenvolvendo trabalho de docência e gestão junto à equipe pedagógica responsável pela alfabetização no Ensino Fundamental. Atua também em consultório como psicóloga especialista em Psicomotricidade na clinica infanto-juvenil. Tem experiência na área de Psicologia e Educação com ênfase em Psicomotricidade, atuando principalmente com os seguintes temas: terapia psicomotora e educação psicomotora, psicologia infantil, educação escolar, psicomotricidade, corpo, ensino fundamental, aprendizagem, psicomotricidade, alfabetização, inclusão, intersetorialidade, possibilidades de ensino e organização escolar.

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Prezado aluno, O material que se segue pretende organizar o conteúdo da disciplina “Introdução á Psicomotricidade”, dinamizando a aula através de textos-apoio1. A sugestão é que os mesmos sejam lidos previamente, para que a discussão em sala seja aproveitada da melhor maneira possível.

Desejo a todos boas vindas e um ótimo percurso! Abraços Profa Érica Fróis [email protected]

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O material apresentado é parte do texto de qualificação de Mestrado da autora, intitulada “A imagem do corpo no processo de

construção da subjetividade da criança na contemporaneidade: a psicomotricidade e o brincar - o concreto e o virtual”, e deste modo não pode ser usado em partes ou na íntegra para quaisquer outros fins.

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ÍNDICE 1.

A HISTÓRIA DO CORPO E A HISTÓRIA DA PSICOMOTRICIDADE ............... 7 1.1. A HISTÓRIA DO CORPO ............................................................................. 7 1.2. A HISTÓRIA DA PSICOMOTRICIDADE .................................................... 18 1.2.1. ARCABOUÇO DA PSICOMOTRICIDADE ............................................ 18 1.2.2. A PSICOMOTRICIDADE EM CENA ..................................................... 19

2.

CORPOREIDADE ............................................................................................. 25 2.1. A CONSTRUÇÃO DA CORPOREIDADE: A ORGANIZAÇÃO PSICOMOTORA

25

2.1.1. ESQUEMA CORPORAL ....................................................................... 25 2.1.2. IMAGEM CORPORAL .......................................................................... 28 2.1.3. ESTRUTURAÇÃO ESPACIAL .............................................................. 29 2.1.4. ESTRUTURAÇÃO TEMPORAL ............................................................ 31 2.1.5. TÔNUS ................................................................................................. 33 2.1.6. MOVIMENTO ........................................................................................ 36 2.1.7. COORDENAÇÃO MOTORA, EQUILÍBRIO E PERCEPÇÃO................ 38 3.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................. 40

4.

ANEXOS ........................................................................................................... 41 4.1. TRABALHO AVALIATIVO “ A HISTÓRIA DA PSICOMOTRICIDADE” ........ 41 4.2. ATIVIDADE AVALIATIVA: VÍDEO COMENTADO ....................................... 42 4.3. EXERCÍCIO AVALIATIVO: ESQUEMA CORPORAL, IMAGEM CORPORAL, ESTRUTURAÇÃO ESPACIAL E ESTRUTURAÇÃO TEMPORAL ....................... 43 4.4. TRABALHO FINAL ...................................................................................... 44

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1. A HISTÓRIA DO CORPO E A HISTÓRIA DA PSICOMOTRICIDADE A Psicomotricidade

é uma área de conhecimento que estuda o homem com seu corpo em

movimento na relação com o mundo. Possui um arcabouço estruturante próprio construído na interface de vários campos científicos. Esse arcabouço, construído a partir de campos de saber distintos, passou por conhecimentos que se estendem desde o saber filosófico acerca da visão de corpo até pressupostos médicos, sociológicos, psicanalíticos e desenvolvimentistas. Nessa medida, para estudar o organismo psicomotor torna-se necessário situar paradigmas acerca da visão de corpo, do campo complexo de saber no qual se insere a Psicomotricidade e por fim, retomar a historicidade do conceito de infância.

1.1.

A HISTÓRIA DO CORPO

O corpo, elemento de estudo da psicomotricidade, e seu percurso histórico, segue as diferentes concepções que o homem vai construindo ao longo da história. O termo corpo vem do latim corpus, que significa tecido de membros, envoltura da alma, embrião do espírito, e do grego, que diz da perfeição marcada pela beleza, pela razão e pela justiça.

A história do corpo, segundo Vigarello, Courtine e Corbin(2008) é marcada por referências que se estendem desde aspectos religiosos até estudos científicos. A visão antropológica do corpo feita pelos autores ressalta aspectos que retomam as marcas do sagrado e religioso, os valores, costumes e crenças de épocas distintas. Retomando a perspectiva cultural, artística, religiosa e científica desde o fim da Idade Média até a modernidade, os autores ressaltam que o corpo é o ponto-fronteira situado no centro da dinâmica cultural. O corpo marca a transição do espaço individual

para a dimensão social. “A originalidade última da experiência corporal é estar no

cruzamento do invólucro individualizado com a experiencia social, da referencia subjetiva com a norma coletiva.” (VIGARELLO,p.11,2008) O autor, ao se referir ao corpo como fronteira, aponta ser no corpo a morada das vivências subjetivas e sociais e ainda, ao traçar um recorte antropológico Vigarello(2008) retoma a singularidade do corpo enquanto instrumento que vai do sagrado ao profano, das forças ocultas e da magia até o saber científico, da expressão ao controle, da sensibilidade a sujeição.

Gélis (in Vigarello,2008) contribui nessa pesquisa antropológica ao

descrever os apontamentos do corpo na perspectiva do sagrado. Nessa dinâmica o corpo é morada Introdução á Psicomotricidade Profa Érica Fróis

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do sagrado bem como do pecado, sendo assim requer adoração como também punição e dor. O corpo, inicialmente representado como elemento do sagrado (Corpo de Cristo) deve ser controlado, pois está sujeito ao pecado. A ambigüidade do corpo santo e pecador atribuem ao sofrimento do Cristo um símbolo de adoração e veneração, um meio para a redenção e ressurreição do fiel sob os moldes de Jesus Cristo. O corpo enquanto símbolo de salvação aponta para a prevalência de rituais de tortura e auto-flagelação como meios de purificação e garantia de salvação eterna. “A submissão e sofrimento da carne visa buscar a salvação d‟alma, do espírito”(Gélis in Vigarello,p.55, 2008) Nessa perspectiva as doenças e todo o sofrimento ao corpo eram desejados, pois assim a condição do corpo sagrado aos moldes do Cristo, estaria em evidência. “Um martírio muito breve não pode fazer um grande santo”( Gélis in Vigarello ,p.83,2008) Nesta perspectiva a imagem do corpo, isto é, a percepção que o indivíduo tem de si, perpassa pelo culto á dor e ao sofrimento. A Renascença, período que marca a transição da Idade Média á Idade Moderna, marca o apogeu das artes, filosofias e ciência, afirmando a repercussão da mudança de estado político-sócio-econômico. O abandono dos modos feudais de produção e a ascensão do capitalismo marcam novos lugares para o corpo e sua imagem. Longe de trazer uma perspectiva linear a visão antropológica dos autores citados no início do texto traça várias linhas de conduta que revelam imagens distintas do corpo apontando para as mudanças sócio-politicas vividas da idade Média, idade Moderna e Contemporaneidade. A Renascença, como auge das mudanças econômicas, culturais e artísticas, é escolhida enquanto ponto de partida para uma retrospectiva histórica sobre a visão de corpo, indo até a Contemporaneidade, contemplando o século XX.

No período da Renascença o religioso impinge ao corpo uma perspectiva coletiva, emergindo a comunhão da pessoa com o sagrado. Duas entidades abrigando em um corpo. A unidade, porém coletiva, do sagrado com o profano, marca uma dimensão totalizante do individuo. A imagem que se impunha era exatamente a imagem de uma dupla pertença, de um corpo duplamente vivido. O indivíduo possuía seu corpo como algo próprio dele, pois seu nascimento era sinônimo de um novo corpo, mas ele se sentia ao mesmo tempo solidário do grande corpo coletivo da linhagem. (VIGARELLO,p.124, 2008)

Porém, com o avanço científico, os ideais e descobertas, a igreja se vê confrontada diante a sua perspectiva do corpo sagrado. Com o uso das práticas de dissecação do corpo a anatomia ganha novos parâmetros e o corpo, outrora místico em coletividade entre o sagrado e o profano, passa a atender á perspectiva do corpo individual. Com o surgimento do corpo individual, com suas partes,

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diagnósticos e curas, o lugar do corpo são ganha vazão. Não mais o sofrimento e a punição corresponderiam á imagem corporal, mas agora um corpo saudável e vivaz. Como conciliar um discurso que pretende penalizar o corpo pecador com as expectativas de homens e mulheres preocupados com um desabrochamento pessoal que coincide justamente com uma valorização da imagem de seu corpo? (VIGARELLO,p.124, 2008)

Desse modo, na idade moderna, a partir do conflito: corpo sagrado e coletivo versus corpo cientifico e individual outra consciência de corpo emerge junto á sociedade. Porém, longe de ser uma solução para as respostas sobre o homem e suas experiências esse novo referencial passa a ser um desafio. O homem ancorado na sua verdade advinda da fé, se vê ameaçado na sua crença e, contudo, não pode transpor tal crença no foro científico, visto que este âmbito imputa justamente a negação da crença apontando para a fidedignidade do físico, palpável, comprovável. Porém, o ideal científico aponta para explicações insuficientes sobre as percepções, os sentidos e as emoções. Tentativas neurológicas e fisiológicas buscam sustentar a hegemonia médica-clínica sem, contudo obter êxito. É nessa medida que coexistem na visão de corpo as perspectivas do sagrado e cientifico, do individual e coletivo. É na ambigüidade que se instaura a imagem de corpo do homem contemporâneo. Um corpo inquieto que arrancando-se do grande corpo coletivo, paga muito caro esta sua emancipação. Porque esse corpo que o ser humano faz agora passar para o primeiro plano de suas preocupações, para protegê-lo, cuidar dele, prolongá-lo, encontra-se só no momento da morte, sem a assistência moral do corpo da linhagem, desse corpo coletivo que, este sim, não morre jamais.Enfrentar essa solidão e assumi-la é possível para quem tem fé. Se vier a perdê-la, o individuo fica então entregue a si mesmo. É preciso talvez, ver nessa subversão das crenças e dos comportamentos uma das principais fontes do mal-estar do ser humano contemporâneo. (VIGARELLO, p.130,2008)

Nesse ínterim, Vigarello(2008) aponta que as primeiras definições sobre o corpo dirigem-se para uma dimensão mais técnica e cientificista. O corpo é então tudo que tem consciência material ou intelectual: coisas condensadas como uma construção ou uma coletânea de textos, fundamento de um sujeito ou de um objeto, enfim, e sobretudo muitas pessoas que formam uma companhia. (VIGARELLO, p.137,2008)

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Nesta medida as medições concretas do corpo passam a ser mais significativas do que as percepções em si. Enquanto nos séculos XIV, XV e XVI o corpo e seus fluidos sagrados, as magias e crenças compunham a imagem do corpo, ao longo dos séculos XVII e XVIII o corpo mecânico e mensurado ocupava espaço. A altura do corpo, a graciosidade do andar e a aparência máscula, firme e vivaz, garantiam o crivo social. “Sonho de retidão, moral e dorsal”(Vigarello,p.160,2008) Advém desse ideal de corpo o uso de instrumentos como os andadores que deveriam corrigir o modo de andar das crianças. A preocupação com os calçados e as vestes também caracterizavam os corpos de modo particular. Os rituais para se expor o corpo passaram a ter lugar social. A dança aparece enquanto primeiro exercício do corpo. “Exercício corporal e divertimento ritualizado, a dança é de essência geométrica” (VIGARELLO, p.168,2008) A valorização de uma imagem do corpo ágil e vivaz correspondia ás aspirações sociais de um corpo pronto para as guerras e para a lavoura e deste modo as práticas corretivas ganharam vazão na educação do corpo.

Contudo, a partir do auge do corpo anatômico, regido por forças mecânicas, as ginásticas e as práticas para mostrar uma imagem saudável e de bem estar foram progressivamente assumindo importância ao longo dos séculos XVII ,XVIII e XIX. Os exercícios físicos e os jogos aparecem como meios de potencializar o corpo. Embora não datando deste período o surgimento dos jogos, estes marcam a evolução da dinâmica do corpo mecânico para o corpo sensual e controlado. A história dos jogos é a história do controle exercido sobre os corpos; uma vigilância supostamente capaz de conter as violências e paixões.É o desenvolvimento de práticas não partilhadas entre os sexos ou grupos sociais, um modo bem concreto de confirmar pelo corpo distâncias ou distinções.(VIGARELLO, p.352,2008)

Por volta dos séculos XVI e XVII aparecem os jogos como práticas de encenação e rituais. Os jogos na corte apresentam fortes cenas de violência a fim de mostrar o poder, a superação física e a supremacia.O intuito era o de revelar o domínio do homem sobre os animais. Ao longo do século XVIII estes jogos violentos passam a ser extintos, visto que agora o corpo deveria ser cuidado e preservado, não sendo desejável um corpo marcado pelo sofrimento e violência. Os jogos então, no século XVIII e XIX passam a ser símbolos de elegância e sociabilidade. Aparecem a esgrima enquanto jogo conciliando o símbolo da força com a harmonia dos movimentos e habilidades. A imagem do corpo másculo e disciplinado imprime ao corpo novos valores, aparências e condutas. Cria-se uma sociedade esportiva, aparece, no século XVIII, o caráter lúdico dos jogos com objetivo de entreter e divertir. Introdução á Psicomotricidade Profa Érica Fróis

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Nessa medida o corpo e a sexualidade, bem como a instituição do casamento, ganharam novos lugares na trama social. O jogo sensual, porém, contido ganha lugar nos relacionamentos. No fim do século XVIII a prática do casamento apontado com fins reprodutivos e os rituais para escolha dos cônjuges pelos seus pais estavam em desuso. O amor romântico entrava em cena afirmando uma escolha afetiva dos parceiros. Porém, a forte influência religiosa marcava este amor por rituais que a dimensão cristã afirmava ser de pudor, religiosidade e morais aceitáveis ás pessoas de boa índole segundo a igreja. Assim, a sexualidade estaria reservada ao casamento, ainda assim com restrições. O corpo assumia, portanto um agregado de valores morais e físicos voltados a uma imagem valorizada pela sociedade da época: o corpo vivaz, saudável e domesticado.

O corpo, portanto recebe novas significações diante ás variadas práticas sociais. De um corpo maculado pelo sagrado e profano em coletividade com o divino a um corpo mecânico, orgânico, másculo, viril, porém contido, escapa ainda o corpo das emoções e percepções. A história das linguagens não objetivas do corpo, embora mais valorizadas ao longo dos séculos XIX e XX com a perspectiva do indivíduo e sua imagem, ganham olhares curiosos desde o século XVI. Embora não tratar-se de uma história linear o corpo e suas subjetividades, emoções e percepções refere-se, segundo Vigarello(2008) á fisiognomonia, isto é, ao estudo dos sinais e expressões do rosto do individuo. A fisiognomonia seria a arte de decifrar a linguagem do corpo. Nessa prática a observação era o ponto central. Não se trata ainda de um estudo pormenorizado sobre as emoções e individualidades, a fisiognomonia procura catalogar as expressões faciais vinculando-as a comportamentos. “A fisiognomonia ensina a decifrar a linguagem da alma estampada no exterior, promove normas corporais, estabelece definição da fisionomia, nomeia a beleza.”(VIGARELLO, p.405,2008) Este estudo estava calcado nas relações entre o corpo físico, os aspectos psicológicos e o poder da natureza (astros, divindades).As figuras eram catalogadas e representadas a partir de expressões estáticas. No curso dos séculos XVI e XVII, com a ascensão da racionalidade, a fisiognomonia entra em descrédito. A leitura dos sinais do corpo vai então apropriar-se de duas vias divergentes: -perspectiva aberta pelos desenvolvimentos da anatomia e pela descoberta do ângulo facial. A ciência moderna atribui novos significados ao corpo e ás expressões, a partir do estudo anatômico e científico do corpo os sinais ganhavam novo sentido. A expressão facial catalogada pela fisiognomonia entrava em descrédito pela dimensão estática não característica da visão do homem moderno. Uma concepção dinâmica próxima aos ideais modernos ganhava espaço, o estudo dos órgãos e da neurologia contribuíram ao longo do século XVIII para compreensão do homem e seu corpo. Introdução á Psicomotricidade Profa Érica Fróis

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As ações humanas dirigidas para fins não podem ser inteiramente explicadas por reações mecânicas em cadeia, á maneira de uma pilha de dominós que desmorona. Os “todos” são maiores do que a soma de suas partes.A atividade humana dirigida para fins supõe a presença de uma alma. Para compreender as operações do corpo é preciso compreender a alma e a própria vida. (VIGARELLO, p 466, 2008)

O estudo da dinâmica externa e interna do corpo caracterizam o vitalismo, uma perspectiva voltada para a relação entre o corpo interno e externo, para a organização neurofisiológica e os aspectos ambientais. A ciência, embora assumisse função de explicar o corpo de modo objetivo, escapava á dinâmica das emoções. Contraditoriamente a ciência, que tinha o propósito de confirmar a dualidade clássica que faria do corpo apenas uma máquina, suscitou a percepção que o corpo é percebido como uma potência ativa portador de inquietantes poderes, terríveis e obscuros, uma vez que vacilam as luzes da razão.(VIGARELLO, p.609,2008)

Assim, Vigarello(2008) destaca que a ciência, que devia esclarecer as condições puramente mecânicas do funcionamento corporal, faz surgir a idéia de uma vida própria ao corpo que coloca em questão a supremacia que o espírito e a razão pensavam exercer sobre ele. Nem a razão nem as leis místicas explicavam os aspectos da ordem da emoção. Sobretudo os sonhos, inicialmente explicados pela neurologia como manifestações do corpo em estado de desconforto durante o sono, permaneciam na obscuridade por não se enquadrarem nos moldes da razão e da fé. É portanto, ao final do século XIX que a cisão entre corpo, psiquismo e organismo social começa a perder força e uma nova perspectiva impõe-se no cenário de compreensão sobre o corpo. Nesta nova perspectiva culturalista, o corpo aparece como resultado de uma construção, de um equilíbrio estabelecido entre o dentro e o fora, entre a carne e o mundo. Um conjunto de regras, rituais de interação, liberdade para cada um lidar com o estilo comum das posturas, as atitudes determinadas, os modos usuais de olhar, portar-se, mover-se, compõem a fábrica social do corpo. (CORBIN, p.9,2008)

Apenas no século XX com Freud, há uma significativa aproximação entre a visão dicotômica entre corpo e alma. “ Só com Freud no século XIX é que teremos um rompimento apontando para a aproximação do corpo anatômico com o „segredo‟ (insconsciente) do homem moderno.” (CORBIN,p.620,2008)

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Assim, segundo Corbin (2008) é a partir do século XIX que instaura-se a dinâmica do corpo através do olhar do outro, o que aponta para a imagem, a perspectiva de ver e ser visto ganha lugar na cena social. O corpo funcional e instrumental ganhou análises fundamentadas no ambiente e no comportamento, apontando para a dimensão psicoafetiva do corpo. A própria medicina da época parte para uma visão mais integrada do corpo e a observação ganha lugar na dinâmica clínica . Nesta medida o paradigma dualista entre corpo e alma passa a ceder espaço para uma integralidade do corpo. Nesta medida atua na cena o corpo da sexualidade e do olhar. “A historia do corpo é indissociável da história do olhar que se lança sobre ele”(Corbin,p.255,2008) afirma o autor a fim de marcar a era da visibilidade do corpo. A imagem está em voga e a cena da sedução também, Porém, o impacto do movimento higienista e a descoberta das doenças venéreas vão marcar enfaticamente nova consciência do corpo ao final do século XIX. O corpo, embora conheça os prazeres de ver e ser visto, aprende, pelas leis da doença e dos impactos produzidos pelo movimento da industrialização, o sofrimento e a contenção de seus impulsos.

Portanto, no inicio do século XX, a representação e o tratamento do corpo enfermo assumem cuidados, agora marcados pelo viés público. O corpo ferido em guerra, os deficientes e incapazes recebem tratamento e são considerados na cena social. Percebe-se,

contudo, que o corpo

descoberto na lógica do prazer e da imagem, massacrado pelas leis da industrialização e pelas marcas da guerra, ganha nova significação. O século XX aponta então para um corpo na cena social. A recuperação e o bem estar do corpo recebem foco na dinâmica cientifica. O esporte e o cuidado do corpo entram no cenário apontando para a necessidade de um corpo preservado e cuidado. Contudo, a perspectiva do controle está apontada: métodos e manuais para os cuidados do corpo previnem, remediam e dirigem o corpo para uma organização determinada, produzida pelo controle da saúde.

Assim, o corpo no século XX afirma sua condição interativa, dinâmica. A linha divisória entre corpo e “espírito”, percebida até então, perde espaço para um corpo animado pelo desejo. “O século XX é que inventou teoricamente o corpo” (Courtine, p.7,2008) A invenção do corpo animado pelo desejo advém da psicanálise. Freud, nas suas investigações clínicas, traz á tona à dinâmica do inconsciente que fala através do corpo. Inaugura-se a questão das somatizações marcando espaço para a imagem do corpo na formação do sujeito.

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Segundo Courtine(2008), é posteriormente com Edmund Husserl, que o corpo passa a ser apontado como “berço original de toda significação”(Courtine,p.8,2008). Logo, na França, Maurice Merleau Ponty, na direção entre a fenomenologia e a perspectiva existencial, afirma o corpo como “encarnação da consciência” apontando os desdobramentos deste no tempo e no espaço. A antropologia também contribuiu no processo de descoberta do corpo no século XXI. Marcel Mauss, analisando o desfile da infantaria britânica e comparando tal cena á marcha dos franceses, aponta para a noção de técnica corporal fundada na cultura e na organização social. “[...] as maneiras como os homens, sociedade por sociedade, de maneira tradicional, sabem servir-se do seu corpo.” (Mauss in Courtine, p.8,2008)

O corpo, portanto, ainda que desperto pela dinâmica do inconsciente e da imagem, marcado enquanto núcleo existencial da pessoa e apontado como mostras da cultura e organização social, via-se diante das amarras do estruturalismo.“A obsessão lingüística do estruturalismo, desde o pósguerra até a década de 1960, ia com efeito, enterrar a questão do corpo com a do sujeito e suas ilusões.” (Curtine, p.8,2008) Contudo, o movimento dos pensadores da época incitava questionamentos e protestos contra o peso das políticas. O corpo ocupava o centro dos movimentos individualistas e igualitaristas. No começo dos anos 70 as mulheres já gritavam protestos contra as leis que proibiam o aborto apontando para um movimento de propriedade sobre o corpo. Os homossexuais seguiriam o mesmo caminho. A reivindicação social contra o controle dos corpos através do postulado das estruturas e consequente apropriação deste corpo como núcleo individual e pessoal, marcava ao longo dos anos 70, a luta por um pertencimento ao próprio corpo. O discurso e as estruturas estavam estreitamente ligados ao poder, ao passo que o corpo estava do lado das categorias oprimidas e marginalizadas: as minorias de raça, de classe ou de gênero pensavam ter apenas o próprio corpo para opor ao discurso do poder, á linguagem como instrumento para impor o silêncio dos corpos.(Courtine, p.9,2008)

Contudo, nesse “sentimento de propriedade do corpo” a dinâmica do individual, legitimidade outorgada ao prazer, aferem um novo posicionamento do corpo. A saúde torna-se um direito e a ansiedade face ao risco, a busca do bem estar individual e a saturação do espaço público, são alguns dos paradoxos e dos contrastes da história do corpo no século XX. Na hora em que se multiplicam os corpos virtuais, em que se aprofunda a exploração visual do ser vivo, em que se comerciam sangue e os órgãos, em que se programa a reprodução da vida, em que se vai apagando a fronteira entre o mecânico e o orgânico mediante a multiplicação dos implantes, em que a genética se aproxima da replicação da individualidade, é mais que nunca

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necessário interrogar, experimentar o limite do humano: meu corpo será sempre meu corpo? (Courtine, p.12,2008)

Assim, a dinâmica do individuo no seu apogeu, pode ser retratada através do esporte, da dança e da arte. O sucesso e a imagem destacam-se no cenário social através da figura do campeão, do astro e do artista. O rádio e a televisão tornam-se dispositivos centrais no século XX e o circuito de imagens e sons passa a ser imperativo informacional apontando para um corpo fluídico que percorre distâncias e fascina através das aparências e visibilidades. A tela da TV impacta na dinâmica do corpo apontando para uma nova organização espaço-temporal. O foco é preciso e dirigido, o espectador ao vivo seleciona seu olhar a assistir um jogo ou uma corrida. O espectador pela tela volta-se para o recorte da imagem no qual se sobressai a cena dos ganhadores e perdedores. Observar da beira da calçada e assistir a uma passagem e a uma sucessão.Já observar da tela é nunca se atrasar, acompanhar os corredores e, de modo particular, os primeiros. A sucessão é aí de ponta a ponta diferente: não mais a renovação dos perseguidores, mas a renovação das posições, o desfilar sem fim de um avanço. A sucessão se torna progressão vista da tela, é regressão vista da rua. A imagem televisada se limita á cabeça da corrida, mantendo o telespectador perto do primeiro colocado. Ela apaga a emoção da passagem, da fugacidade, a consciência de um sem-numero de perseguidores. Ela anula também o estranho sentimento de fragilidade oferecido pelos corredores que se arriscam em um cenário superdimensionado. Perde em densidade para aquele que olha a calçada; multiplica as informações para aquele que assiste à transmissão. (Courtine, p.474,2008)

Paralelamente ao corpo retratado pela notícia está o corpo da encenação, o corpo do cinema e da TV. Não se trata apenas de contar histórias, mas de vivê-las, dramatizá-las. Simular emoções contagiando platéias compõe o cenário do corpo no jogo do prazer. Está em destaque não apenas o corpo expresso pela linguagem, mas também o corpo expresso pela dança e pelos movimentos. Nesse ínterim o corpo do desejo aponta para o foco perceptivo que conecta sons e cores selecionando e produzindo sensações.

Motivado pelas pesquisas científicas a visão ocupa papel importante no redimensionamento do corpo. Visto que cores e imagens podem continuar sendo percebidas pelo olho mesmo que qualquer referência exterior já tenha desaparecido, conclui-se que há uma capacidade fisiológica de produzir fenômenos sem uma necessária correspondência com o mundo material. Assim, não se trata de um registro neutro, a visão aparece como um sistema de impressões subjetivas do mundo exterior. “Enquanto se torna indistinta a fronteira entre sensações interiores e sinais exteriores, o papel do Introdução á Psicomotricidade Profa Érica Fróis

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movimento na construção da percepção suscita um interesse cada vez maior.” (Courtine,p.514,2008) A visão impõe-se aos poucos como uma realidade física, exigindo o exercício ativo da força e do movimento. Portanto, aliado á dinâmica do corpo e do movimento encontra-se a questão do desejo, que liga tais instâncias. Com efeito, o abalo sofrido pelo corpo no ato da percepção não é mecânico, mas é função da intenção, do desejo, que fazem o sujeito voltar-se para o mundo. Um componente afetivo filtra sem cessar o exercício da percepção. È esse componente que colore e interpreta o trabalho da sensação para organizá-la em uma paisagem de emoções. (Courtine,p.514,2008)

Este movimento inaugura não apenas o foco para a imagem do que se vê, mas a auto-imagem, ou seja, a percepção do que se sente sobre si. Os movimentos involuntários do organismo entram em cena na dança e vão agregar-se, o corpo-sensação, ao corpo do olhar e do movimento. A escuta dos ritmos fisiológicos desempenha nesta perspectiva um papel preponderante desde o inicio da dança moderna. O silencio e a imobilidade são as condições primeiras dessa atenção nova aos rumores do ser. Abre igualmente o caminho para a tomada de consciência de um espaço intracorporal plástico, simultaneamente volumétrico e direcional: pela respiração, o corpo se dilata e se contrai, se estira e se encolhe. Deste modo se produz a relação encadeada e continua entre o espaço interior e o espaço exterior. (Courtine, p.519,2008)

Assim, nesse modo integrado entre corpo externo e interno se imprime a consciência do movimento como um continum. Nesta medida não existe imobilidade, apenas níveis de energia que circulam também internamente. Não apenas as características de peso, emoções e movimentos articulam-se, mas o ínfimo dos movimentos imprime ao individuo uma nova dinâmica funcional.

O corpo impresso na imagem e nas sensações será também anunciado nas fotografias e nas artes cênicas e plásticas. Courtine(2008) afirma que são 3 os grandes registros do corpo-imagem, foco do século XX: o corpo mecanicizado da cultura, do esporte, focado na performance exigida pela publicidade e pelo mundo do espetáculo. O corpo desfigurado das guerras retratado na influência da arte revelando, nas imagens recortadas e bricoladas, a influência da perspectiva dos corpos desmembrados, desarticulado pelas guerras. E, finalmente o corpo da beleza retratado pela medicina estética e engenharia biotecnológica.

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Este corpo do século XX extrapola o limite do possível, transforma-se através da cirurgia e da estética desafiando os contornos do corpo material. Assim, a valorização da beleza e o sistema iconográfico como os símbolos de luxo e de conforto, introduzem a valorização da banalidade e do cotidiano. Ao longo dos anos 80 os meios técnicos de produção de imagens e de reprodução digital facilitada, propagam o voyerismo influenciando os valores estéticos. Tal dinâmica aponta para uma associação entre o belo e o bem, a beleza assume um valor moral e os marcadores do moralismo e da correção vão lentamente se infiltrando na perspectiva estética. Aliados a isso o deslocamento dos limites entre o público e o privado impacta sobre o corpo e seu novo formato no plano do século XX. A substituição do privado pelo intimo trará repercussões junto á organização do corpo nesta perspectiva da imagem. Nessa proporção é tudo ou nada, ou se esconde ou se exibe e esta exibição é da ordem do espetáculo e do sensacionalismo assistidos por espectadores onipresentes via meios tecnológicos e de comunicação. Na sua antiga significação, o privado era conceitualmente unido ao público. Não podia tornar-se público a não ser através de transgressões escandalosas ou de disposições jurídicas estudadas e negociadas. Quando o privado começa a ser pensado sob a categoria do intimo, perde suas fronteiras.(Courtine, p.557,2008)

O corpo passa então da lógica de objeto da arte para a dinâmica ativa e de suporte da atividade artística. Ao longo do século XX ocorre uma transposição para o corpo como veículo da arte e das experiências artísticas. O corpo é ao mesmo tempo sujeito e objeto do ato artístico.

Assim, o corpo, no século XX ocupa a centralidade no plano do individuo. È a memória viva, testemunha cinética, das mudanças e transformações expostas de modo escancarado e brutal. Desse modo a estranheza provinda da revelação nítida do corpo e suas mutações aparentes assumem um aspecto indiferente na dinâmica humana. Olha-se um corpo, uma carne, uma careta, uma silhueta e esta visão traduz-se em estranheza, em um materialismo impactante. “Onde havia consciências, almas, fantasia e desejo, só resta um corpo e suas marcas.” (Courtine, p.565,2008) Deste modo o autor conclui a retomada histórica do corpo ao longo dos século XX, apontando os marcos históricos do corpo. Refere-se á dinâmica da imagem, da estranheza dos corpos construídos, formatados, disfarçados de individuais, mas que se veem questionados ante á perspectiva do encontro público de subjetividades. Apresentam-se, com estranheza, os corpos isolados buscando, via holofotes, traduzir os valores do bem e do belo circunscritos na valoração da imagem marcada no século XX. Introdução á Psicomotricidade Profa Érica Fróis

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1.2.

A HISTÓRIA DA PSICOMOTRICIDADE

1.2.1. ARCABOUÇO DA PSICOMOTRICIDADE

Perfazendo assim a história do corpo, circunscreve-se a história da Psicomotricidade de modo solidário. Como explicar as emoções e as sensações do corpo e qual a relação entre corpo e alma, foram questionamentos que sustentaram diversos estudos científicos ao longo do tempo conforme podemos verificar na retomada histórica no cenário do corpo. A leitura da Psicomotricidade, disciplina que estuda o corpo em movimento na relação inter humana, sobre o corpo segue, em paralelo, a visão e a apropriação do corpo no cenário do estudo do homem e sua subjetividade.

Segundo Coste (1992), Platão já afirmava haver uma separação distinta entre corpo e alma, colocando o corpo apenas como lugar de transição da existência no mundo de uma alma imortal. Aristóteles via o homem com um corpo, quantidade de matéria, moldado numa forma, a alma. No século XVII René Descartes propõe uma visão dualista na qual corpo e alma seriam dicotômicos. O corpo seria algo que não pensa e deste modo não pode dizer da verdade humana, e a alma, seria uma substância pensante distinta do corpo. Ainda segundo Descartes (1641): Eu sou uma coisa que pensa, uma coisa da qual toda a essência decorre de pensar; entretanto, eu possuo um corpo ao qual estou estreitamente vinculado , mas que é somente uma coisa extensa e que não pensa.Por conseguinte, parece certo que a minha alma é inteiramente distinta do meu corpo, mas não pode existir sem ele. (DESCARTES apud COSTE, 1992.p.40)

A alma é tida para Descartes como tudo aquilo que não é corpo: pensamento, cognição e sentimentos. É esta alma cartesiana que comandaria o corpo. O corpo seria uma máquina guiada e dirigida pela alma.

Seguindo o percurso investigativo sobre o corpo, Coste (1992) afirma que, no século XIX, a questão corpo versus psiquismo é amplamente debatida pelos neurologistas e médicos. Com o curso das investigações em neurologia o dualismo cartesiano cederá espaço para o paralelismo. Certos fenômenos patológicos já não podiam ser explicados através da rigorosa correspondência lesãoIntrodução á Psicomotricidade Profa Érica Fróis

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sintoma, então Charcot, psiquiatra famoso da época e contemporâneo de Freud, aponta para as evidências do psiquismo sobre o corpo e vice-versa, quando estuda o fenômeno “membro fantasma”. Ao referir-se a um indivíduo amputado que conserva a impressão do membro que perdeu, Charcot apresenta à comunidade médica o fato de disfunções graves não apresentarem acometimento lesional (patologia cortical). Este novo dado suscitou intensas pesquisas que culminaram em estudos médicos e antropológicos. Estes apontaram o fato de que todo movimento tem um significado biológico e social, os reflexos tem importância de defesa para o homem e estão inseridos, portanto, em um sistema social. Dupré (1909) ao estudar a debilidade motora composta de inabilidades, verifica que estas ocorrem sem necessariamente um correlato lesional neurológico. Algumas perturbações motoras da infância, por exemplo as sincinesias (repetição de movimento com membro parético não envolvido diretamente na ação), ocorriam sem a localização patológica ou lesional.

Portanto, através destes pontos, a visão dualista - corpo versus psiquismo- perdia a validade para explicar patologias e características do movimento. Via-se que o corpo e o psiquismo eram elementos paralelos que não estavam tão isolados como tratava o pensamento cartesiano. A partir daí Dupré em 1909, ocupou-se em investigar as relações da motricidade com a inteligência e percebeu que déficits motores ocorrem mesmo em pessoas com inteligência superior e idiotas podem realizar movimentos com precisão e eficácia. Juntamente com Dupré, Henri Wallon em 1925, se dedicou aos estudos sobre a motricidade, porém investigou mais a fundo as relações da motricidade com o caráter. Wallon definia caráter enquanto manifestações observáveis da atividade, afetividade, relações sociais, vontade e hábitos da criança. Através de seus estudos afirmou que o movimento é expressão e o primeiro instrumento do psiquismo, com isso estabeleceu relações entre movimento, emoção, indivíduo e meio ambiente. Para Wallon, citado por Coste (1992), o movimento humano é elemento fundante na construção do psiquismo. Nesta visão a ação é organizadora da emoção.

1.2.2. A PSICOMOTRICIDADE EM CENA

Segundo Coste (1992), a psicomotricidade nasce dentro do modelo médico, a partir da visão de disfunções e distúrbios que precisam ser reeducados. Desse modo, uma das primeiras visões da psicomotricidade é a da Reeducação Psicomotora(RPM) proposta por Edouard Guilmain. Precursora à RPM tem-se a influência de Tissié - 1852-1935- que, questionando as práticas corretivas aplicáveis

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na ginástica da época propõe uma nova concepção da Educação Física, a Psicodinamia, que seria uma educação pelo movimento procurando dar caráter científico ao seu método de trabalho. Procura conciliar uma visão anteriormente apenas motora (mecânica) com uma visão psicológica. Com Guilmain, em 1935, nasce a Reeducação Psicomotora. Nesta prática a disfunção motora tem posição marcante junto à psicomotricidade. Contribui investigando as relações do exame psicomotor com medida, diagnóstico, terapêutica e prognóstico das patologias motoras.

A visão do

corpo

pautava-se pelo paralelismo científico, abordagem não mais isolada, independente, mas aproximada e possivelmente comunicante. Porém tínhamos um corpo ainda receptor de comandos, manifestante deste psiquismo, um corpo que precisava ser corrigido, reeducado. No desenrolar da história da psicomotricidade e conseqüente evolução da visão de corpo percebe-se que a visão do corpo dissociado do psiquismo vai cedendo lugar a uma aproximação inevitável que, posteriormente, amplia o foco de uma junção corpo e psiquismo para um enfoque de um corpo totalizante que não segue apenas um comando, mas que fala por si, que é libidinizado, está em relação. Nesse ínterim a ciência psicanalítica de Freud influencia o movimento da Terapia Psicomotora e os estudos de Wallon, Piaget e Gesell marcam os primórdios dos trabalhos da Educação Psicomotora. O movimento biologicista e a perspectiva estruturalista de Piaget cedem lugar a dinâmica do corpo social proposta por Wallon e posteriormente, influenciado pelas contribuições da fenomenologia de Sarte á perspectiva existencialista de Merleau Ponty, o corpo no cenário Psicomotor ganha nova significação.A fenomenologia de Sartre, 1905-1980, e de Merleau Ponty, 1908-1961, muito influenciou o desenvolvimento da psicomotricidade. Nesta concepção o conceito de esquema corporal vai revelar uma imagem que cada um tem de si, traduzindo nesta época o que seria hoje a imagem corporal. Nesta visão a consciência do mundo passa pela consciência do próprio corpo. Segundo Ponty citado por Coste(1992) “Vejo o mundo de acordo com a estruturação do meu próprio corpo.” Esta afirmação desloca o plano motor, retira a sua total ênfase para dividir sua importância como plano psicológico. Outra influência da psicologia na ciência psicomotora foram as teorias gestaltistas que marcaram uma concepção funcional do movimento. Em vez de deter-se às condições de possibilidade do movimento investigando condições fisiológicas, propõe-se investigação das relações e valores do movimento como forma de comportamento e produtos de situação como tomadas de posição, ações e reações. Assim condições físicas para mantermos o equilíbrio, para andarmos, implicam muito mais do que uma sucessão de eventos, é definida pelo objetivo, pela intenção. Para tanto, toda atividade é a manifestação de um diálogo entre o organismo e o mundo circundante. O importante não é uma visão progressista situada e ligada ao seu objetivo com o intuito de questionar “onde leva esta ação”, mas o proposto é enfocar o sujeito no momento

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atual, seu estar no mundo se perguntando “qual é a situação deste sujeito” independente de sua possibilidade futura.

Assim como fenomenologistas e gestaltistas deixaram suas contribuições, os psicólogos do desenvolvimento também promoveram a construção da psicomotricidade atual. A contribuição oferecida por estudiosos como Wallon, Piaget e Gessel foi de grande valor, sobretudo para o desenrolar de uma psicologia infantil.Tais estudiosos propuseram um caminho evolutivo, um desenvolvimento motor observável e estudado que traça as etapas motoras sobretudo da criança. Henri Wallon dentre várias contribuições, destacou a importância do movimento no desenvolvimento psicológico da criança. Explorou o estudo da gênese do Esquema Corporal afirmando que não se tratava apenas de uma organização biológica ou psíquica, mas de uma construção e, é a partir dessa construção, que a criança chega à representação mais ou menos global, específica e diferenciada do seu próprio corpo. Wallon sublinha, acima de tudo, que o estado tônico é um modo de relação, hipertonia de solicitação, hipotonia de alívio, de relaxamento ou satisfação. Ajuriaguerra, discípulo de Wallon, acentua a importância da relação tônico-emocional para o processo terapêutico. Através do fenômeno motor, elevado ao valor de gesto e de atitude, Wallon procura captar o conjunto da expressão de uma personalidade, um modo de ser no mundo. O fenômeno tônico é a função postural de comunicação, essencial para a criança pequena, função de troca por meio da qual a criança dá e recebe intervenções do mundo. A função postural está essencialmente vinculada à emoção que, para Wallon, corresponde a exteriorização da afetividade.

Jean Piaget, ao ocupar-se em estudar a construção da inteligência, compreendeu que o movimento era a única manifestação e instrumento do psiquismo. Propôs, através da coordenação dos esquemas sensório-motores (sensações e movimentos) que o indivíduo aprende assimilando (incorporando) e acomodando(ajustando) (Ex: os esquemas de sucção, visão e preensão, constituem as ferramentas da adaptação precoce e enriquecimento, sua diferenciação e coordenação permitem ao bebê passar progressivamente da mais extrema dependência à autonomia.) Piaget afirma que na falta da etapa sensório motora em conseqüência de perturbação, todo o arcabouço corre o risco de ser comprometido.Os práticos da reeducação e da terapia psicomotora deverão dedicar-se ao menos um pouco,

a refazer as etapas que faltaram no

desenvolvimento, pontua Piaget citado por Coste (1992).

E por fim, na história da ciência psicomotora, a influência dos psicanalistas aponta para outra fonte de construção. O corpo já não é apenas a sede das reações emocionais que unem a criança a seu Introdução á Psicomotricidade Profa Érica Fróis

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grupo, nem o instrumento graças ao qual a inteligência é construída, ele passa a ser lugar de prazer, e é precisamente a prevalência desta ou daquela zona erógena que pontua a evolução libidinal (fase oral, anal, fálica, genital). Freud acentua a complexidade da natureza do movimento: não se trata apenas de manifestação mecânica e neurofisiológica, mas de investimento afetivo, emocional. Os distúrbios orgânicos podem ser de tipo psicogênico, isto é, sem invocarmos o modelo anátomoclínico.(exs: histerias, paralisia, parestesia, descarga de tensões emocionais). É a descoberta do corpo pulsional como substrato e revestimento do corpo funcional uma das mais pontuais contribuições da psicanálise.

Assim, com o surgimento da psicomotricidade, no período do pós-guerra os serviços de ajuda, apoio e preventivos ganharam importância. Desta forma esse movimento promoveu o crescimento das práticas psicomotoras: reeducação psicomotora, terapia psicomotora e a educação psicomotora. As primeiras práticas terapêuticas foram marcadas pelo avanço teórico e institucional. Como já visto, segundo Dupré citado por Coste (1992) a debilidade motora não possuía déficit instrumental específico e a partir desta afirmação Ajuriaguerra e Diatkine(1948) propuseram investir em práticas de educação e reeducação psicomotora nos débeis motores.

Le Camus (1986) define a história do corpo psicomotor através de três momentos: Corpo Hábil, Corpo Consciente e Corpo Significante. Este autor situa o nascimento da Psicomotricidade no final do século XIX, associado ao modelo médico. Le Camus (1986) define que são as descobertas na área da clínica médica que irão suscitar o adjetivo “psicomotor”.

As experiências de Broca em 1861 voltadas para a fala, descobrem regiões no Córtex cerebral situadas para além das áreas propriamente motoras. Seria a suspeita que havia algo circunscrito entre a imagem mental e o movimento. Estas áreas ainda pouco precisas recebem o nome de áreas psicomotoras. Assim, segundo Le Camus (1986) o surgimento da Psicomotricidade sustenta-se a partir das experiências clínicas e da descoberta de ligações entre a lesão cerebral localizada e os sintomas da afasia.Essa descoberta aproximava a hipótese de que havia ligação entre o movimento e os processos cerebrais. Tais contribuições inauguram o paradigma Paralelista. Esta dimensão segue atribuindo ao corpo um processo passível de mapeamento a fim de atender as demandas de produção e do capital. Mapear as áreas cerebrais e controlá-las seguindo a dinâmica do capitalismo traduzia a necessidade de estudar o corpo e suas relações. A perspectiva do corpo passa a ser do treino, do controle. A Psicomotricidade surge então nesse cenário, mapear o organismo psicomotor a fim de controlá-lo ante ás demandas de produção. Sendo assim, desde cedo as crianças deveriam Introdução á Psicomotricidade Profa Érica Fróis

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ser preparadas para desenvolver um corpo hábil e são. A Reeducação Psicomotora surge na cena social e as técnicas para produção de um corpo apto e são vigoram.

Em um segundo momento devido á falência do plano domesticável do corpo junto ás necessidades produtivas, percebe-se que o formato da disciplinarização não atendia ás expectativas de outrora. Tornou-se necessária a construção de novos moldes de compreensão a fim de atender a perspectiva do controle e da dominação, já que ás técnicas “preventivas e readaptativas” não andavam atendendo ás intenções. Advém, segundo Le Camus (1896) um segundo período intitulado Corpo Consciente.

Nesta dinâmica, o corpo, a fim de atender ás expectativas de produção necessitava de compreensão dos próprios processos. Autores da psicologia do desenvolvimento dedicaram-se a isso atribuindo ao corpo uma compreensão junto ao desenvolvimento infantil. Conhecer o corpo, seu esquema e sua organização atribuía aos estudiosos a defesa que sendo assim seria possível atender ás demandas burguesas de produção. O individuo que conhece a sua organização corporal pode atender voluntariamente ás exigências produtivas. Conhecer as sensações do corpo e sua organização passa a ser premissa importante para que o individuo pudesse comandar seu corpo para as demandas sociais. Nesse ínterim a dinâmica social apregoava oferecer condições para que todos se apropriassem desse conhecimento. As escolas e creches passavam por aperfeiçoamentos para que os educadores conhecessem o desenvolvimento da criança e pudessem atuar para que a criança pudesse “ter consciência do próprio corpo”. Músicas, jogos pedagógicos e condições técnicas propagavam o pleno conhecimento da criança e do seu corpo. Sendo assim, não havendo correspondência de aprendizagem ante “ a um corpo em condições de ser controlado” , a defesa era de que fatores do individuo perturbavam esse sistema. O fracasso seria da criança e sua família, visto as condições para o desenvolvimento estarem aparentemente postas. As incongruências nessa concepção questionam o paradigma do controle, da sujeição e da obediência do corpo e inauguram a visão do corpo Significante.

Le Camus (1986) aponta os processos de abertura política, a luta pelos direitos humanos e a liberdade de expressão como responsáveis para um novo modo de compreensão do corpo em meados dos anos 1970. O corpo significante seria o corpo do desejo, o corpo que fala e se expressa e que não é subjulgado a um controle. Há uma subjetividade presente e nesse momento a Psicomotricidade recebe grande influencia da Psicanálise inaugurando a Psicomotricidade Relacional. A psicologia das comunicações não verbais aponta para a contribuição de um corpo Introdução á Psicomotricidade Profa Érica Fróis

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expressivo e dinâmico que necessita ser ouvido na relação com o outro. A aceitação e reconhecimento do sujeito e não apenas a sujeição dos corpos, marca esse momento intitulado Corpo Significante.

Paralelo a esta descrição Levin (1995) descreve a história da Psicomotricidade em três cortes epistemológicos. O primeiro corte epistemológico aponta para um corpo mecanicizado, focado no paralelismo mental-motor. As práticas reeducativas configuram esse momento da história da Psicomotricidade. O segundo corte epistemológico é marcado pela apropriação do corpo sensorial, foco para o conhecimento do corpo e suas percepções.A respiração e o esquema corporal ganham centralidade impactando um processo de conhecimento do organismo psicomotor. Perceber o corpo da criança atentando-se para a cena de desenvolvimento esperada a partir das descobertas desenvolvimentistas acresce o cenário pedagógico de manuais sobre a organização do corpo e as estratégias para ensiná-la á criança. O processo de Educação Psicomotora ganha ênfase. Como terceiro corte epistemológico Levin (1995) pontua o corpo do desejo, o corpo expressivo. Marca a influencia da psicanálise e da psicologia das sensações e comunicação não verbal. O corpo fala e a vida psicoafetiva do individuo está presente nessa expressão.

O conceito psicomotor é, portanto, mais profundo do que o de uma simples associação corpopsiquismo. Ele parte, de fato, da concepção do homem como um indivíduo em desenvolvimento que se apóia em um corpo orgânico (hereditário). Entretanto, este nunca pode se manifestar isoladamente, pois desde que o organismo, como pessoa una e inteira, entre em funcionamento já existem interferências das vivências sócio-culturais. De um lado, a interferência de uma atividade organizadora do próprio sujeito e, de outro lado, de uma atividade adaptativa que depende das suas inter-relações com o meio (psicossociais e afetivas). A Associação Brasileira de Psicomotricidade define assim o termo psicomotricidade: Ciência que tem como objeto de estudo o homem através do seu corpo em movimento e em relação com seu mundo interno e externo, bem como suas possibilidades de perceber, atuar, agir com o outro, com os objetos e consigo mesmo. Está relacionada ao processo de maturação, onde o corpo é a origem das aquisições cognitivas, afetivas e orgânicas. (A.B.P 1999)

Assim, já tendo apresentado o panorama da psicomotricidade e seu foco de estudo, faz-se necessário considerar e a constituição do organismo psicomotor. Conhecer o corpo em movimento

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na relação com o mundo implica saber sobre a criança e sua formação corporal. Esta formação corporal requer o conhecimento sobre a estruturação da Imagem Corporal, do Esquema Corporal e das noções espaço- temporais.

2. CORPOREIDADE

Tem-se como corporeidade a organização do corpo em relação á sua estrutura física e afetiva que, em constante interação social, define a condição de movimento do individuo e sua relação no mundo. Esta corporeidade engloba uma estrutura corpórea- os conceitos estruturais- composta por imagem corporal, esquema corporal, noções espaço-temporais e tônus. Dessa estrutura derivam-se outros organizadores como lateralidade, equilíbrio, coordenação motora e ritmo, conceitos que não serão foco desse estudo embora sejam pontuados ao longo do texto. Deste modo apresentam-se, de modo amplo, os conceitos que caracterizam o corpo e suas relações no mundo a partir de uma leitura Psicomotora do homem. Essa leitura, contudo, aparece permeada por contribuições da Psicologia do Desenvolvimento e, sobretudo da Psicanálise. Tais contribuições revelam que estudar o corpo e sua organização a partir do viés da Psicomotricidade não permite uma abordagem unilateral visto ser necessário contemplar as multifacetas do espectro estudado: o corpo em movimento na relação com o mundo.

2.1.

A CONSTRUÇÃO DA CORPOREIDADE: A ORGANIZAÇÃO PSICOMOTORA

Nesta etapa do estudo serão apresentados os conceitos que correspondem á estruturação Psicomotora do indivíduo. Considerando o estudo do corpo em movimento na interação com o meio, a Psicomotricidade apresenta-se como disciplina e, de modo a focar esse desenvolvimento do corpo, compreende-se o individuo a partir da sua organização Psicomotora. Assim, os tópicos que se seguem abordam a organização psicomotora da criança traçando então vieses para a organização da corporeidade. A corporeidade se apresenta de modo vinculado á organização do corpo psicomotor e deste modo compreende o enlaçamento das funções psicomotoras que abaixo serão apresentadas: imagem corporal, esquema corporal, estruturação temporal, estruturação espacial, tônus, coordenação motora, ritmo, lateralidade e equilíbrio.

2.1.1. ESQUEMA CORPORAL Introdução á Psicomotricidade Profa Érica Fróis

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O Esquema Corporal se refere a organização do próprio corpo. Trata-se da consciência de suas partes e movimentos, bem como a percepção da integralidade destes. O Esquema Corporal se organiza a partir das vivências do individuo na relação com o mundo, é adquirido gradativamente, desde o nascimento e passa por alterações ao longo do percurso vivido. É um elemento fundamental que, associado á inscrição da imagem corporal, ganha significação própria subjetivando o corpo e permitindo formas próprias do ser infantil. “O esquema corporal especifica o individuo enquanto representante da espécie. Ele que será o intérprete da imagem do corpo” (DOLTO, 1984, p.14). O esquema corporal é, portanto a organização do corpo, uma materialidade carnal que implica o indivíduo no mundo físico. È estruturado a partir de uma organização física e neurológica, mas só existe enquanto elemento humano na integração com a imagem do corpo. È a associação desses elementos que vai organizar a criança no mundo imbuindo-a de linguagens, inscrições e expressões configurando uma existência única e subjetiva. “O esquema corporal reporta o corpo atual no espaço à experiência imediata. Ele é evolutivo no tempo e no espaço. A imagem do corpo reporta o sujeito à experiência de gozo mediatizado pela linguagem memorizada da comunicação entre sujeitos. Ambos articulam-se através do narcisismo originado na carnalização do sujeito na concepção.” (DOLTO,1984,p.15)

Desse modo a autora retoma a estruturação do sujeito nas suas primeiras relações com o mundo. Marca a condição estruturante da criança na relação com o meio apontando a figura materna enquanto elemento central nessa dinâmica. Dolto(1984) baseia-se na teoria freudiana acerca da estruturação do aparelho psíquico apontando as vivências primárias enquanto marcas fundantes da imagem corporal e integralização do esquema corporal. O corpo do bebê é libidinizado pela mãe, isto é, recebe investimento afetivo que nomeia e estrutura tal corpo. São nessas primeiras marcas que a imagem corporal se baseia. Nessa medida o esquema corporal configura-se paralelamente permitindo que esse corpo infantil atue no mundo através do movimento. Dolto, citada por Cabral (2001), afirma sobre a imagem do corpo: I-MA-GE: I de identidade, MA de minha (ma em Frances) e a primeira sílaba de mamãe, e GE (mesmo som do je em Frances), o pronome Eu. Uma imagem que não é visual, mas algo inscrito sob a forma desse manancial relacional, suporte simbólico das comunicações da ordem da linguagem (verbal e não-verbal), que mediatiza o encontro dos desejos da mãe e do bebê. (CABRAL,p.115,2001)

As experiências vividas desde o inicio da vida da criança impactam na construção do esquema corporal da mesma. As sensações despertam movimentos, inicialmente reflexos, e que posteriormente serão organizadas definindo a propriedade do corpo da criança e de suas percepções em relação ao seu corpo e o ambiente. A criança ao nascer perde seu estado Introdução á Psicomotricidade Profa Érica Fróis

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homeostático e se vê diante ás necessidades corporais. Saí do estado de simbiose fisiológica e busca retornar a essa organização através da expressão psicomotora. Chora, grita e manifesta a sua necessidade. Esta necessidade está ancorada em uma demanda física e posteriormente psicoafetiva. A manifestação da necessidade irá repercurtir um tônus de apelo e, ao se ver satisfeito o tônus será de satisfação. Essas experiências configuram marcas no corpo da criança e configurarão matrizes caracterizando o contato da criança com o mundo. A presença da mãe no atendimento a estas necessidades irá marcar um parâmetro afetivo para o corpo que será definido nesse processo. Ao nascer a criança não sabe que é distinta da mãe, são essas experiências de satisfação e desprazer que auxiliarão na construção do corpo dissociado da mãe. A partir destas primeiras experiências relacionais e das percepções sensoriais é que a criança constrói a percepção do corpo vivido e do corpo próprio. Fonseca (1981) afirma que a consciência do corpo se dá a partir do conhecimento primeiro do outro. Gradativamente a criança percebe que a satisfação das suas necessidades vem de fora e localiza então o que é seu corpo e o que é o ambiente externo a ele. Começa então a atuar sobre o meio exigindo que este a satisfaça. Diante ao não atendimento automático a criança vai vivenciando a realidade e percebe que deve administrar a espera para ser atendida.

Winnicott (1975) vai dizer que a criança inicialmente se situa no enlaçamento dos espaços interno e externo, pois não se distingue nos mesmos. É a partir da segurança na fidedignidade da mãe que ela se separa e localiza o espaço potencial na zona intermediária entre o seu mundo interno e o mundo externo. O espaço potencial será o espaço autônomo de criação, do brincar, do transitável entre as demandas internas e as exigências externas. Assim são essas experiências que comporão a apropriação da criança e seu corpo no mundo. Aos 3 anos aproximadamente a criança já conseguiu construir essa visão e pode dizer “eu sou” , “isso é meu”, se posiciona ante a relação eu-não eu. A criança então constrói-se pela negação do outro, descobrindo o que é seu e o que não é.

Aos 5, 6 anos a criança tem uma propriedade significativa do próprio esquema corporal, pois já aprendeu, através das vivências e atividades, a organização do corpo e suas partes. Contudo, esse esquema não é estático, ante a novas vivencias e significações pode se apresentar bem estruturado ou mal estruturado.

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2.1.2. IMAGEM CORPORAL

O conceito de imagem corporal perpassa por organizadores fisiológicos, psíquicos, corporais e sociais. Segundo Le Boulch “a imagem do corpo se constrói junto com as etapas do desenvolvimento para alcançar a cada nível de organização da personalidade uma unidade provisória e que se deve reconstruir em cada nova etapa.” (LE BOULCH, 1982, p.16) O conceito de imagem corporal foi trabalhado inicialmente a partir de um marco neuropsicológico e nesta medida confundia-se com o conceito de Esquema Corporal. Segundo Le Boulch (1982), é a partir de L‟Hermitte e posteriormente de Schilder que o conceito de imagem corporal é articulado ás dimensões mentais e sociais. A partir de então o conceito de imagem do corpo se diferencia do conceito de esquema corporal. A imagem corporal é permeada por concepções que vão da dimensão centrada no desenvolvimento maturacional biológico até as inscrições psicoafetivas e sociais. Segundo LE BOULCH (1982) “ a imagem do corpo representa uma forma de equilíbrio entre as funções psicomotoras e a sua maturidade.” Nesta medida, segundo o autor, a atividade motora e sensório-motora subsidiam a evolução da imagem do corpo. Já Cabral (2001) definirá a imagem do corpo enquanto o conjunto de fantasias, vivências, afetos e imagens introjetadas que foram definidos nas primeiras relações com o mundo. É o “banho social” e inicialmente materno que definirá a estruturação dessa imagem corporal. Trata-se dos investimentos a que este sujeito foi ou não submetido, é a síntese viva das experiências emocionais. Diz da simbolização do corpo, refere-se ao mundo de registros mnêmicos, que vai dizer do esquema corporal do indivíduo, permitindo a organização do corpo e de seu movimento no mundo. É nessa medida que o indivíduo vai integrar suas partes do corpo, o esquema corporal, com a forma que se vê, a imagem corporal. Este processo vai depender da significação dada ao corpo na infância a partir das vivências sociais da criança. Dolto (1984) afirma que “a imagem do corpo é a síntese viva de nossas experiências emocionais, pode ser considerada como a encarnação simbólica inconsciente do sujeito desejante.” (DOLTO, 1984, p.14) Desse modo pode-se perceber que as relações que a criança constrói no mundo serão fundantes na estruturação do seu corpo. É a partir da imagem corporal que se pode entrar em contato com o mundo e se relacionar com ele. Na mesma medida em que funciona como elemento estruturante da criança fundando-a no espaço relacional a imagem corporal é também o reflexo das memórias corporais que as inscrições no corpo permitem ao longo da vida. Assim a imagem corporal estrutura e é estruturada pelo indivíduo na relação com o mundo, inscreve o corpo e recebe inscrições nele, situando a criança na existência relacional.

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2.1.3. ESTRUTURAÇÃO ESPACIAL

A Estruturação Espacial é a percepção do próprio corpo em relação aos demais elementos do mundo. É orientar-se no espaço físico tendo em vista o próprio corpo e os elementos do ambiente. É na integração das noções de direção (acima, abaixo, à frente, atrás, ao lado) e de distância (longe, perto, curto, comprido) que o indivíduo desenvolve a possibilidade de organizar-se em relação a si mesmo e aos outros. Essa aquisição está diretamente relacionada à percepção, a criança inicialmente percebe apenas aquilo que está bem próximo ao seu campo perceptivo. Os objetos não são tidos enquanto exteriores a ela são o resultado de prolongamentos de sua ação. Este espaço está diretamente relacionado às sensações táteis associadas ao corpo materno. É na medida que a criança tem a oportunidade de explorar o ambiente, de atuar no espaço vivenciando os outros elementos que poderá representá-los mentalmente, isto é, perceberá que a imagem mental pode substituir o objeto. Assim, no processo de diferenciação e representação a criança poderá situar-se em relação aos objetos e situar os objetos entre si. Segundo Piaget e Fraisse (1969) é no período das primeiras aquisições sensório motoras que a criança se apropria das primeiras noções em relação ao espaço e ao tempo. Na medida em que a criança percebe, diferencia e integra percepções em relação ao seu corpo e o mundo que a mesma começa seu percurso em direção à estruturação espaço-temporal, o que implica também um percurso de diferenciação entre corpo próprio e mundo dos objetos. Nesta medida o processo de aquisição do esquema corporal está atrelado à estruturação espacial. É apenas quando a criança reconhece-se diferente dos outros elementos, quando integra as partes do seu corpo em um todo diferenciado dos demais objetos que poderá organizar este todo, este corpo no mundo. A percepção em relação ao mundo é uma percepção espacial na qual o corpo é a referência. A estruturação do esquema corporal é condição primeira para a criança organizar-se no espaço. A percepção desse esquema corporal e ação deste corpo no mundo serão fundamentais para a estruturação espacial e temporal do sujeito. Segundo Le Boulch (1982) o espaço é o lugar ocupado pelo corpo no qual se desenvolvem os movimentos. São as primeiras relações da criança no mundo que subsidiarão sua organização espaço-temporal. Um espaço postural escalonado pela estação sentada, depois a estação de pé permitindo recolher informações cada vez mais numerosas até a descoberta do objeto. O espaço se tornará um espaço de “configuração”, definindo os limites da exploração através da manipulação. A locomoção permitirá estender o campo de ação e ter acesso a novas descobertas com mais profundidade. Este espaço vivido com limites suaves é objeto de uma experiência emocional intensa, fonte de insegurança, na medida em que as possibilidades de tomada de informação visual permanecem muito limitadas. A importância do meio humano é de criar a atmosfera de estabilidade e de tranqüilidade, dando segurança à criança de aprofundar suas investigações. (LE BOULCH, 1982,p.118.)

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Sobretudo a ação manual, inicialmente a partir da coordenação óculo-manual, será muito importante na estruturação da organização percepto-motora. A etapa do treino da coordenação óculo-manual, que implica a percepção de objetos e a tentativa de agarrá-los, promoverá as bases para o principio de constância do objeto que implica também uma percepção acerca de certa constância espacial: o espaço (da casa, da escola, do quarto) permanece ainda que não esteja diante do campo visual. Le Boulch (1982) afirma que “o ajustamento ao espaço e o ajustamento ao objeto precedem a entrada ao universo perceptivo e a fortiori naquele da representação mental”(LE BOULCH,1982,p.118) Desse modo segundo Coste (1992) a criança transita de um espaço topológico vivido cuja referencia são necessariamente pontos do corpo próprio à construção de um espaço representativo euclidiano que implica o reconhecimento das formas geométricas. Após essa aquisição seu dimensionamento no espaço é acrescido pelo “espaço projetivo intelectualizado no qual os pontos de referência são exteriores ao sujeito sem referencia exclusiva ao seu corpo”( COSTE,1992,p.54).

A estruturação espacial está diretamente associada á do esquema corporal. O corpo se movimenta em um determinado espaço. É o centro de referencia em um ambiente situado. A apropriação do espaço se dá a partir do espaço vivido e depois passa a ser espaço representado. Toda essa noção necessita da vivencia da criança no mundo, as construções do espaço topológico e euclidiano marcam a apropriação das formas no espaço. Através das suas ações no mundo a criança vai percebendo que seu corpo, eixo espacial, se situa em relação aos objetos a partir de relações de proximidade. Experimenta essas relações a partir da proximidade, separação e ordem.Conquista o espaço topológico. Aos 3 anos inicia nessa percepção de que as tampas das vasilhas se encaixam em alguns recipientes e não em outros, que os objetos cabem aqui ou ali. No decorrer da infância irá se apropriar do espaço topológico, euclidiano e projetivo, adquirindo aos 10 anos uma razoável conquista esapcial dando-lhe a capacidade de planejar e projetar-se num futuro. A estruturação espacial permite a construção da noção de distância e proximidade. As vivências afetivas e os pontos referenciais que então marcaram a organização desse constructo. Enfim, a noção espacial está diretamente ligada aos fatores psicoafetivos da vida da criança.

As aquisições espaciais estão atreladas a estruturação temporal. Essa relação espaço-temporal permitirá que o indivíduo se movimente, reconheça-se no espaço e perceba de modo concatenado e seqüencial os seus gestos, tornando possível a coordenação de atividades e organização da vida cotidiana. Portanto se faz salutar estabelecer norteadores, de modo didático, sobre a aquisição temporal ainda que esta não se dissocie da estruturação espacial.

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2.1.3.1.

LATERALIDADE

Lateralidade é a dominância de um dos lados corporais. Está diretamente associada á mielinização, á maturação neurológica e á atividade práxica, ou seja, á utilização e exploração desse lado prevalescente. Segundo Le Boulch (1982) é a partir dos dois anos de idade que esse sistema de prevalência lateral irá se definir, pois trata-se do período de maturação dos principais centros corticais e motores. A lateralização acomete todo o eixo do corpo da criança e não apenas o manual, como muitas vezes é apontado. Esta definição perpassa pela organização cerebral e direcionará o eixo dominante do individuo. A comprovação da dominância se dá por volta dos 3, 4 anos e deve ser observada a partir do movimento espontâneo da criança. Neste período é comum haver troca de mãos na escrita. Comumente este tema é confundido com o conhecimento de direita e esquerda. Esta aprendizagem, mediada pela familia e pela escola, é uma aquisição construída e deste modo não significa necessariamente uma “patologia” com relação á lateralidade. A noção de direita e esquerda está diretamente associada á aquisição espacial e sua aprendizagem é vivenciada. Não se trata de apenas “decorar” cognitivamente os conceitos direita-esquerda, mas explorar cenas que possibilitem ao corpo conhecimento e exploração espaço-temporal. Aos 7 anos a criança já é capaz de situar seu corpo e o dos outros, percebendo a noção de direita e esquerda de modo mais amplo. Só aos 10 anos aproximadamente é que haverá uma ¨descentração completa e a criança poderá manipular as noções de direita e esquerda sobre outrem, sobre o mundo exterior, independente de sua própria situação.¨ (COSTE,p.61, 1992) Quando a organização da lateralidade e as possibilidades de vivência e explorações espaçotemporais não são respeitadas, haverá possibilidades das crianças desenvolverem dificuldades psicológicas, como dificuldade de lidar com o fracasso, dificuldades em estabelecer relações com outras crianças, dificuldades de aprendizagem escolar.

2.1.4. ESTRUTURAÇÃO TEMPORAL

A estruturação temporal é a capacidade de situar-se em relação a um antes e um depois, é a percepção sucessiva de elementos levando-se em consideração a duração e a ordem. A orientação temporal está indissociada da percepção espacial, pois é apenas quando percebo os elementos e me situo em relação a eles que tenho condições de avaliar a duração, a sucessão e a organização Introdução á Psicomotricidade Profa Érica Fróis

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dos acontecimentos. Para haver comparações, condição essencial para avaliar o processo de temporalidade, é necessária a localização dos demais elementos do ambiente. Nessa medida a estruturação espacial é condição para o processo de organização temporal. Como já colocado anteriormente as primeiras relações da criança com o ambiente, os cuidados que recebe e o ritmo no atendimento ás suas necessidades, incidirão na estruturação espacial e também na estruturação temporal da criança. Segundo Le Boulch (1982), as primeiras marcas temporais incindem na estruturação temporal a partir da vida intra-uterina. O ritmo cardíaco e respiratório, os movimentos do bebê na barriga da mãe, os sons provindos do exterior são registros preliminares que comporão posteriormente a estruturação temporal da criança. “ O ritmo registra-se primeiro no corpo da criança, durante a embriogênese e mais particularmente nos seus movimentos, primeiro parcelares e depois mais globais” ( LE BOULCH,1982,p.106) Após o nascimento a criança precisará ajustar seu ritmo interno ás condições externas.O espaço de vida é outro (da barriga da mãe ao mundo externo) e as condições de temperatura, som, textura, alimentação e atendimento ás demais necessidades são diferentes o que implica em uma sincronização dos ritmos motores espontâneos a partir das condições externas. O organismo deve adaptar-se e para isso as condições de cuidado devem tratar esse ajustamento com cuidado respeitando, portanto, uma experiência relacional afetiva que considere as reações tônicas (manifestação da condição de sustentação corporal e estrutural) a adaptação do bebê na organização dos grandes ritmos biológicos. As experiências sonoras e musicais vividas no balanceio do ninar contribuem para esse ajustamento dos ritmos corporais contribuindo tanto na criança como na relação da mãe com os novos ritmos do bebê. Durante os intercâmbios corporais entre a mãe e a criança, o ritmo dos movimentos da mãe deve-se adaptar ao próprio ritmo da criança, realizando assim um intercâmbio tônico síncrono, mediante um verdadeiro fenômeno de ressonância. A utilização rítmica da linguagem e do canto contribuem para consolidar os ritmos motores espontâneos da criança, cuja estabilidade é paralela a um bom equilíbrio tônico-emocional. (LE BOULCH,1982,p.110)

Portanto, o ajustamento ao tempo perpassa pela sincronização sensório-motora entre a mãe e o bebê. As experiências vividas no cuidado maternal subsidiarão o ajustamento ao tempo e posteriormente a percepção do tempo. A percepção do tempo implica uma diferenciação entre criança e mundo e indica desenvolvimento das habilidades de memória, já o ajustamento ao tempo é anterior, diz de uma percepção ainda não diferenciada entre corpo-mundo, indica uma organização automática do corpo no ambiente de modo a garantir-lhe condição de equilíbrio e bem estar.

A percepção temporal implica a percepção de ordem e organização de eventos e sob a dimensão quantitativa, na percepção de intervalos e sequências de fatos. As experiências auditivas e cinestésicas compõem relações importantes na estruturação temporal. A duração das mamadas e os Introdução á Psicomotricidade Profa Érica Fróis

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intervalos entre essas, as relações do bebê com a experiência do banho, interlocução com a família marcam suas experiências iniciais junto à estruturação temporal. Posteriormente, na medida em que seu desenvolvimento avança, a criança vai transitando de uma vivência concreta do tempo a partir do vivido para um espaço de representação. Encontra-se inicialmente apegada aos eventos utilizando marcas concretas como o ritmo do dia e da noite, eventos associados à hora da alimentação e do banho para posteriormente projetar e planejar fatos e situações hipotéticas. O desenvolvimento da linguagem também é um importante fator que incide na estruturação temporal, pois a criança aprende a nomear e indicar eventos oferecendo-lhes uma representação, modos de expressão e organização dessa temporalidade no mundo. As vivências afetivas perpassam por todo esse processo, pois estão atreladas ás aquisições de duração e ordem. A criança constrói suas relações espaço-temporais, portanto, a partir de vivências corporais e afetivas que realiza no mundo. É o universo de experimentações que a criança faz no mundo que vão nortear sua localização do corpo no espaço e no tempo. São as experiências do corpo em movimento que permitirão a criança apropriar-se do espaço localizando-se no tempo. Contudo, a estruturação temporal é influenciada também pela genética e formação biológica da criança. Porém não se trata de um dado imutável na medida em que alguns fatores são passíveis de mudança graças à plasticidade cerebral e estimulações do ambiente incidindo no desenvolvimento do organismo. Assim, as noções espaçotemporais estão estritamente associadas á estruturação da imagem do corpo e do esquema corporal.

2.1.5. TÔNUS

Segundo Le Boulch (1982), define-se enquanto tônus o grau de tensão mantida sobre a musculatura focada. É uma contração de base fisiológica mantida por influxos nervosos. Dessa forma tem-se “vários tônus” no indivíduo, isto é, todas as regiões corporais são administradas por um certo grau de rigidez ou extensão.

O tônus está diretamente relacionado à execução do movimento. Para a ação de andar, o tônus garante o enrijecimento de um grupo muscular e o relaxamento do grupo antagônico. É ao unificar as estimulações que o tônus integrará os movimentos possibilitando estados diferenciados para a expressão de situações e circunstâncias distintas.

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Através das vivências corporais o tônus vai se integrando a fim de ajustar as reações do indivíduo às situações do meio. É o tônus que vai dizer do nível comunicacional do indivíduo com o mundo. Dessa forma um tônus rígido da musculatura dos braços pode, em duas crianças, ter significados distintos. Em um contexto a interpretação pode ser de medo, em outro pode ser de raiva. É a função tônica que possibilitará a integração movimento-psiquismo. Sendo assim, é o tônus a base psicomotora, é este quem vai estruturar o movimento. Esta função ancora e interliga-se á todo o organismo psicomotor. A imagem corporal, o esquema corporal e as noções espaço-temporais são construídas a partir de uma base tônica e, com isso, o individuo coloca-se na relação com as pessoas.

Segundo Le Boulch (1982), a construção tônica na criança está amparada pela junção dos aspectos biológicos, psíquicos e sociais e estes vão configurar o arcabouço estrutural do corpo. O recémnascido apresenta-se inicialmente rígido corporalmente, esta rigidez é nomeada enquanto hipertonia dos membros. Porém, nota-se uma hipotonia axial que está relacionada com a posição fetal intrauterina, o tronco e a cabeça são extremamente flexíveis. Nesta medida pode-se traduzir a ausência do tônus de sustentação visto que ainda não é possível, devido a imaturidade corporal e neuronal, que a própria criança sustente seu tronco. A cabeça deverá pender para o lado, o que requer cuidado do adulto. A dependência física é total e o que garantirá suporte à criança é o aparador em que a mesma estiver posicionada.

Os movimentos nesta fase são involuntários e facilmente percebe-se que as crianças, mesmo dormindo, fazem o movimento de chute com as pernas. O nível de extensibilidade é grande visto que o tônus de sustentação ainda não foi estabelecido.

Nessa medida quase não há resistência à

manipulação dos membros sendo alto o nível de passividade ao movimento. Nesta fase não é possível falar de sincinesias, isto é repetição de movimentos não envolvidos na atitude a ser executada, pois, os movimentos ainda não se caracterizam enquanto voluntários.

Segundo Le Boulch (1982), na criança de um ano e meio (18 meses) é possível observar, devido a aquisição de uma maturidade neuronal e uma maior maturidade corporal, a aquisição da atitude bípede, o que gera a aptidão para qualquer forma de ação motora. Tem-se, portanto a aquisição do tônus de postura, tônus de suporte, de repouso e tônus motor. Nesta medida a criança nesta idade volta-se para a satisfação de sua natureza investigadora e suas necessidades de ajustamento ao ambiente.

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O tônus, em função de uma maior utilização do corpo, adquire especialização unilateral em conexão com a estruturação progressiva do cérebro, o que garante maior flexibilidade e autonomia. Com a aquisição da marcha a criança amplia seu universo de investigação . Há momentos alternados de hipotonia e hipertonia.

Devido a aquisição dos movimentos voluntários acredita-se haver menor nível de passividade visto que a criança já não permite uma manipulação excessiva e controlada pelo adulto, já impõe certa resistência diante destas condutas.

Nesta fase, com aquisição de uma maior autonomia e exploração dos movimentos, a coordenação das ações é ainda deficiente, o que pode caracterizar enrijecimento excessivo das pernas, por exemplo, ao caminhar. Cabe ressaltar nesta fase a grande capacidade de extensibilidade, a criança afasta os joelhos aproximando os pés em direção ás costas facilmente.

Com o início da aquisição da marcha, os passos se configuram largos e as pernas afastadas, o que revela uma equilibração do próprio corpo. As noções espaço-temporais encontram-se em ajustamento. A coordenação motora é ainda grossa e o movimento de pinça quase inexistente. Segundo Le Boulch (1987), já a criança com 6 anos pode-se perceber uma maturidade neuronal e corporal ótima. Os movimentos já se caracterizam de forma organizada e independente. Há uma harmonia espacial do movimento. A equilibração do corpo encontra-se ajustada e há inúmeras possibilidades de execução de movimentos. Por serem menos flexíveis a extensibilidade diminui. Há uma atitude mais voluntária de relaxamento dos membros, o que caracteriza uma diminuição da passividade ao movimento.

Na criança de 12 anos pode-se perceber total autonomia de movimentos. Esta já é independente em relação à ação motora. As habilidades motoras finas garantem uma equilibração plena do corpo. As características referentes à extensibilidade são diminuídas o que, cabe destacar, dizem do contexto sócio-cultural em que a criança está inserida. Caso tenha a oportunidade de exercitar, através de danças e esportes, sua flexibilidade muscular , a extensibilidade não de encontrará demasiadamente diminuída. Há uma menor capacidade tônica de passividade. As sincinesias são praticamente inexistentes. Cabe-se também destacar que aspectos emocionais influem diretamente no tônus, ou seja, o psiquismo estará também se apresentando através das características tônicas.

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O meio sócio-cultural em que a criança vive torna-se também relevante na observação tônica. Uma maior exploração dos movimentos é responsável por uma maior ou menor flexibilidade muscular.

Assim, segundo Coste (1992), o tônus, que ampara e estrutura o movimento vai categorizar o diálogo tônico, expressão adotada por Wallon e Ajuriaguerra, importantes pesquisadores do tônus, para explicar o caráter comunicacional tônico. O corpo se expressa pela linguagem tônica e é na relação que essa comunicação se dá. Desse modo todas as demais funções psicomotoras se estruturarão a partir do tônus, adquirido nas relações entre criança e mundo. É a partir dos “diálogos tônicos”, das suas relações com o meio, que a criança construirá sua imagem corporal, esquema e noções espaço-temporais.

Tais noções relacionam-se e comunicam-se reciprocamente não sendo possível precisar separadamente cada uma destas no desenvolvimento do sujeito. O organismo psicomotor funciona na inter relação das funções psicomotoras as quais desenvolvimento

psicomotor

do

sujeito.

Outras

determinam entre si a evolução e

funções

psicomotoras

estão

diretamente

relacionadas nesse processo de desenvolvimento como lateralidade, equilíbrio e tônus, porém não serão pormenorizadas nesse estudo. Entende-se, sobretudo, que o contexto social é o “amarrador” desse sujeito psicomotor. A dinâmica social está na gênese da atividade subjetiva do sujeito, tanto no plano da linguagem como no plano corporal. Torna-se nítido que as funções de tônus, imagem, esquema e as noções espaço-temporais estão delineadas pelo social. A partir da revisão da estruturação do organismo psicomotor percebese que o conhecimento do individuo sobre si se dá a partir da relação social, cultural e biológica. São as vivências do corpo em movimento que possibilitam a representação.

2.1.6. MOVIMENTO Segundo Coste (1992) designa-se movimento para toda “translação ou a todo deslocamento de um corpo ou de um objeto no espaço” (p.32) Tal definição apresenta-se de modo amplo e torna-se necessário a especificação da intencionalidade e das classificações existentes entre reflexos, atos motores intencionais ou não. Há, segundo este mesmo autor, denominações distintas que apontam para os reflexos enquanto movimentos automáticos como o reflexo das pupilas, por exemplo ou discutem o caráter social e Introdução á Psicomotricidade Profa Érica Fróis

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aprendido dos mesmos, como é o caso dos reflexos diante aos estímulos nociceptivos (dor, calor...) Assim, para designar o movimento enquanto imbuído de significado Castets, citado por Coste (1992) definiu o termo gesto. ¨O gesto é um movimento que tem uma finalidade consciente ou inconsciente.” (CASTETS apud COSTE, p. 33, 1992) Deste modo o projeto motor abarca o movimento que está circundado por gestos e por reflexos. Este projeto envolve as faculdades biológicas, psíquicas e sociais e deste modo não é um plano totalmente controlável pelo individuo. Múltiplos fatores o acometem intervindo na execução final do movimento. Há uma discussão significativa entre autores ao apontar a intencionalidade ou não dos movimentos. Wallon, por exemplo, não separa o movimento do âmago social e circunscreve todo e qualquer gesto enquanto imbuído socialmente. Autores que defendem a perspectiva psicanalítica vão apontar para uma intencionalidade sempre presente, ainda que inconsciente. Já para vertentes organicistas a presença dos reflexos como respostas automáticas do organismo que inicialmente busca um ajuste corporal e tônico, marcam visões polêmicas e distintas sobre a perspectiva da intencionalidade do movimento. Ajuriaguerra citado por Coste (1992) descreve as alterações ou perturbações diante á execução do movimento como apraxias, já que nomeia como praxias o conjunto de movimentos (intencionais ou não) responsáveis por uma determinada ação. Coste (1992) denomina praxias como sistemas de movimentos coordenados em função de um resultado ou de uma intenção. As apraxias seriam então a perda ou alterações do ato voluntário. O indivíduo é capaz de formar um plano geral, mas incapaz em transformá-lo em ato. Já ás dispraxias revelam desorganização do movimento e inadaptação dos gestos á finalidade proposta. Assim, o movimento do indivíduo apresenta seu conjunto psicomotor nos âmbitos biológicos, psíquicos e sociais. A ênfase dada a estes fatores vão muitas vezes determinar um foco diretivo e interventivo. Porém, é salutar visualizar essa relação entre tais fatores que subsidiam o movimento. A compreensão do movimento engloba o conhecimento dos gestos inicialmente involuntários e posteriormente voluntários. A criança através dos reflexos, atos motores sem intenção a priori, entra em contato com o mundo para agir e atuar sobre ele. São os reflexos e atos involuntários que subsidiarão um controle motor destes gestos, refinamento das ações motoras, organização e apropriação dos movimentos. É a partir do controle e organização do movimento que as demais funções: coordenação motora e equilíbrio também irão se aprimorar. Introdução á Psicomotricidade Profa Érica Fróis

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2.1.7. COORDENAÇÃO MOTORA, EQUILÍBRIO E PERCEPÇÃO A coordenação motora está estritamente ligada ao equilíbrio e ambos ao tônus e percepção espaçotemporal. A coordenação motora geral refere-se á organização do corpo a partir do sistema de músculos e movimentos a fim de executarem uma ação. Isto é, o tônus muscular deve estar em equilíbrio, mantendo-se em um nível hipertonia-hipotonia a fim de garantir a contração/relaxação muscular para a execução do movimento. A coordenação motora dinâmica geral envolve o controle de cada articulação quanto á dimensão tônica. Assim o equilíbrio tônico e o ajuste espaço-temporal do movimento realizado vai dizer de uma boa coordenação motora geral. A boa integralização desse tônus se dá graças a um conjunto de fatores que são de ordem biopsicossocial. O sistema nervoso central e as vias de comunicação para emissão de impulsos e respostas precisam estar preservadas. O cerebelo terá papel fundamental nessa cena integrativa, pois este órgão é o principal responsável pela regulação da atividade motora. Assim, gradativamente mediante organização das aquisições neuromotoras a criança vai adquirindo maior controle motor havendo maior domínio do equilibrio e da harmonia dos gestos.Gradualmente as sincinesias, que são movimentos parasitas que aparecem na tentativa de ajustamento de equilibrio ainda não conquistado, diminuem e o movimento configura-se de modo harmônico e ajustado. È usual considerar especificações da coordenação motora geral e para tanto usa-se nomeações como coordenação motora fina, coordenação motora grossa e coordenação viso-motora. Todas estas especificações originam-se da coordenação geral e não são desenvolvidas em ordem linear. Tais aquisições são progressivas e não lineares. A criança desenvolve paralelamente ambas, deste modo mesmo não tendo dominado a coordenação motora fina a criança pode realizar movimentos de pinça desde os 2 anos. É capaz de pinçar um objeto pequeno no chão, como um botão ou um alimento, como uma uva-passa, com aproximadamente 2 anos. Esta habilidade não quer dizer que a criança dominou a coordenação motora fina e que sua preensão manual sustenta uma atividade mais elaborada, como a escrita, por exemplo. Esta aquisição está se consolidando paralelamente ao controle óculo-manual e á coordenação motora grossa. O equilibrio está se refinando e deste modo todo esse sistema encontra-se em desenvolvimento. Segundo Le Boulch (1982) a coordenação viso-motora é a capacidade de sincronizar a visão com os movimentos do corpo. O globo ocular pode acompanhar os movimentos amplos do corpo.Derivandose desta habilidade está a coordenação óculo-manual, que é o recorte desta habilidade com relação ao sincronismo entre a visão e o movimento das mãos. Para a escrita esta habilidade é fundamental.

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Nesta medida, é importante que a criança tenha experiencias amplas e diversificadas anteriores á escrita, que exige um controle mais refinado e uma coordenação óculo-manual adquirida. Atividades de vida diária da criança podem ser exploradas para o exercício dessas aquisições. Desde os 3 anos a criança pode dedicar-se a atividades de tampar/destampar, abotoar/desabotoar, fazer desenhos rudimentares e gradativamente, aos 4 anos, geralmente se torna capaz de despir-se, fechar e abrir com precisão, manejar tesouras e fazer tarefas de encaixe e desencaixe. É esperada uma lentidão inicial na execução desses movimentos e esta deve ser respeitada, assim como a torpeza na realização inicial desses movimentos. É salutar lembrar que as aquisições estão subsidiadas aos aspectos psicoafetivos, não se trata apenas de um controle motor e treino com manipulação de situações e objetos. Os sentimentos da criança em relação ás tarefas, como se vê diante destas, é fundamental para a consolidação dessas hablidades. Características como: se ver capaz de realizar determinada tentativa de execução de tarefas, acreditar ser potencialmente valorizada diante aquela ação, receber incentivos e obter prazer nas tarefas que realiza são pontos importantes na aquisição desta e de todas as habilidades psicomotoras. Isto é, o meio social e a dimensão psicoafetiva estão presentes e são determinantes para tais aquisições. A percepção do mundo será construída com base nessa interação. A criança perceberá o ambiente e atuará sobre o mesmo considerando a relação psicomotora e as habilidades conquistadas a partir de então. Importante pontuar que, nesse processo de construção e refinamento do movimento, isto é, no desenvolvimento da coordenação motora e equilíbrio, a dinâmica perceptiva será de fundamental importância. Segundo Davidoff (1983) a percepção depende de quatro operações: detecção, transdução, trasmissão e processamento da informação. Nestes processos os sistemas sensoriais são organizadores ativos, assim, o aparelho auditivo, visual, tatil-cinestésico, gustativo e olfativo são dinamizadores fundamentais na ação de captação de informações. Os sentidos, portanto, detectam, realizam a transdução, isto é transformam o estímulo em dados analisáveis aos outros sistemas e transmitem esses dados aos demais órgãos e receptores do corpo humano. Esse percurso é um processo gradativo que, no decorrer da vida da criança, estabelece o seu desenvolvimento. Porém, o desenvolvimento desse processo não é algo simplesmente natural, recebe também influencias decisivas do meio no qual a criança se insere. Logo, diante a tal consideração, fica evidente que as experiências sensório-motoras são imprescindíveis no percurso de vida da criança. Tais experiências, certamente dinamizadas em um determinado contexto sócio-cultural, influenciam o modo como a criança aprende a perceber o mundo. Isto é, as atitudes perceptivas de uma criança inserida em uma cultura que valoriza a Introdução á Psicomotricidade Profa Érica Fróis

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imagem será diferente da criança inserida em uma outra que prioriza o conteúdo, por exemplo. Desse modo, a compreensão do processo perceptivo da criança, suas condições sócio-culturais e sua história de vida são conteúdos importantes a se considerar, visto que a percepção do indivíduo será importante elemento na sua organização do movimento, da coordenação motora, equilibrio e demais estruturadores corporais. Enfim, o modo como o indivíduo aprende a perceber o mundo será ponto importante ante as experiências que o mesmo buscará a fim de desenvolver seu potencial psicomotor. 3. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CABRAL,Suzana.Psicomotricidade

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1,2,3.

Petrópolis,RJ:Vozes,2008 COSTE, Jean-Claude Coste.A Psicomotricidade.RJ, Guanabara. 1992 DAVIDOFF, Linda. Introdução á psicologia. São Paulo: McGraw-Hill do Brasil,1983 DOLTO, Françoise. A Imagem Inconsciente do Corpo. São Paulo:Ed Perspectiva,1984 FONSECA, Vitor da. Terapia Psicomotora: Estudo de casos.Petropolis,RJ:Vozes,2008 FONSECA, Vitor da. Manual de observação Psicomotora. Porto Alegre:Artes Médicas,1995 LE BOULCH, Jean. O desenvolvimento psicomotor: do Nascimento aos 6 anos. Porto Alegre:Artes Médicas,1982 LE BOULCH, Jean. Educação Psicomotora: psicocinética na idade escolar. Porto Alegre:Artes Médicas,1987 LE CAMUS, Jean. O Corpo em discussão: da reeducação psicomotora ás terapias de mediação corporal. Porto Alegre: Artes Médicas,1986

LEVIN, Esteban. A Clinica Psicomotora:o Corpo na linguagem. RJ:Vozes, 1995 PIAGET, Jean; FRAISSE, Paul. Tratado de Psicologia Experimental: a percepção. Trad. Eliseu Lopes. Rio de Janeiro: Forense, v. 6, 1969. PIAGET, J. Seis estudos de psicologia. Tradução Maria Alice Magalhães D‟Amorim e Paulo Sérgio Lima Silva.23ª edição, Rio de Janeiro: Forence Universitária,1998. SBP. SOCIEDADE BRASILEIRA DE PSICOMOTRICIDADE. A psicomotricidade. Disponível em: www.psicomotricidade.com.br. Acesso em junho de 2009 VIGARELLO,George;COURTINE, Jean-Jacques;CORBIN, Alan. História do corpo:as mutações do olhar – o século XX. Petrópolis,RJ: Vozes,2008 Wallon, Henri.As origens do caráter na criança. São Paulo: Difusão Européia do Livro,1971 WALLON,Henri. A evolução psicológica da criança. Lisboa:Edições 70,1995 Introdução á Psicomotricidade Profa Érica Fróis

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4. ANEXOS

4.1.

TRABALHO AVALIATIVO “ A HISTÓRIA DA PSICOMOTRICIDADE”

1. ¨A história do corpo é solidária á história da Psicomotricidade¨. Explique e comente esta afirmativa. 2. Construa um breve esquema apontando as marcas culturais do corpo ao longo da História. 3. A Psicomotricidade se originou a partir de quais fenômenos? 4. Explique a visão de Corpo a partir dos paradigmas Dualista e Paralelista. 5. Faça um breve histórico dos três momentos que marcam a história da Psicomotricidade a partir de LE CAMUS E LEVIN. 6. A perspectiva do corpo Hábil aponta para um “cuidado e exercício do corpo”. Qual a dinâmica desse fato para a sociedade da época? 7. Quais autores marcaram o “nascimento” da Psicomotricidade? Como eles contribuíram nesse movimento? 8. Quais questões põem em xeque o modelo do Corpo Hábil? 9. O que define a perspectiva do Corpo Consciente? Como seria o viés prático da Psicomotricidade nessa perspectiva? 10. Quais pontos questionam a perspectiva do Corpo Consciente? 11. O que propõe a dinâmica do Corpo Significante? 12. Como podemos definir a Psicomotricidade hoje? Com qual “corpo” esta Psicomotricidade atua?

ENTREGA: 07/08/2010

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4.2.

ATIVIDADE AVALIATIVA: VÍDEO COMENTADO

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4.3.

EXERCÍCIO

AVALIATIVO:

ESQUEMA

CORPORAL,

IMAGEM

CORPORAL,

ESTRUTURAÇÃO ESPACIAL E ESTRUTURAÇÃO TEMPORAL

1. O que é Esquema Corporal? 2. O que é Imagem Corporal? 3. Explique a influência das vivências afetivas e das marcas do “outro” na determinação da Imagem Corporal. 4. Explique a influência das experiências e ações no mundo, na determinação do Esquema Corporal. 5. Fale sobre a importância da estruturação do Esquema Corporal e formação da Imagem Corporal na vida de uma criança/pessoa. 6. Em que consiste a estruturação espacial? Como se desenvolve esta noção na criança? Relacione-a a aquisição do esquema corporal. 7. Em que consiste a estruturação temporal? Qual a relação desta aquisição com a aquisição espacial? 8. Explique como estas noções são construídas no desenvolvimento da criança. 9. Explique a influência das marcas afetivas na vida da criança na estruturação das noções de espaço e tempo. 10. Entreviste e observe duas crianças (0 a 12 anos) e registre as características vistas em relação ao esquema corporal e imagem corporal. (Indicar a idade da criança observada) 11. “A vivência espacial e temporal é afetada pela afetividade”. “entreviste”, observe, duas crianças e tente confirmar esta afirmação. Descreva o que verificou.

ENTREGA: 4/9/2010

Introdução á Psicomotricidade Profa Érica Fróis

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4.4.

TRABALHO FINAL

O DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR

Do nascimento até os sete anos é o período mais importante quanto ao desenvolvimento psicomotor da criança. Nesta faixa etária a criança adquire maturação neuronal para aperfeiçoar os seus movimentos. O desenvolvimento geral da criança abrange o desenvolvimento psicomotor pontuando as organizações biológicas, psicoafetivas e sociais, descritas com ênfases diferentes a partir dos autores e estudiosos da área. O presente trabalho propõe enfocar o desenvolvimento Geral/Psicomotor através de uma breve análise do desenvolvimento infantil segundo os autores abaixo: Wallon: Coste: Gesell: Le Boulch  Pesquise e descreva teoricamente o desenvolvimento Geral/ Psicomotor de 0 a 6 anos a partir destes autores.  Apresente exemplos ou descreva observações de 3 crianças nas idades entre : 0 a 1 ano, 2 a 3 anos e 4 a 6 anos, estabelecendo análises e comparações com as contribuições sobre o desenvolvimento geral/Psicomotor a partir dos autores estudados.  Normatização: o Texto digitado, fonte Times New Roman, 12, margens 2,5 , alinhamento justificado, parágrafo espaço 1,5 o Máximo de 20 laudas o Normas ABNT para citações e organização textual  Data de entrega: 18/09/2010

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