Jornadas de Junho: explorando os sentidos da indignação social contemporânea no Brasil
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Jornadas de junho: explorando os sentidos da indignação social contemporânea no Brasil Renata Barbosa Lacerda 1 Thiago Brandão Peres 2
Resumo O presente artigo expõe uma interpretação possível acerca dos “protestos que marcaram o país”. A argumentação divide-se em dois planos analíticos complementares. O primeiro, histórico, segue os cuidados metodológicos propostos por Bringel (2013), cujo objetivo principal é corrigir uma série de miopias presentes nas análises sobre o que vem se convencionando denominar as jornadas de junho. O segundo plano observa como demandas já existentes convergiram nessas manifestações e como as principais pautas foram sendo construídas no processo. Desse modo, as manifestações multitudinárias são tratadas como um processo histórico, inteligível em sua complexidade somente quando abordado em retrospectiva. Palavras chave: jornadas de junho, ação coletiva, direito à cidade, protestos de rua, redes sociais digitais
Abstract The present article expounds a possible interpretation about the “protests that marked the country”. The argumentation is divided in two complementary analytical plans. The first plan, historical, follows the methodological concerns proposed by Bringel (2013), which the main purpose is to correct a series of short-sightedness in the analyses about what it is being called journeys of June. The second plan observes how already existing demands converged in these protests and how the main items on the agenda have been constructed in the process. Therefore, the massive protests will be treated as a historical process, intelligible in its complexity only when is addressed in retrospective. in the process. Therefore, the 1
Mestranda em Antropologia no Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (PPGSA/UFRJ) 2 Mestrando em Sociologia no Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IESP/UERJ)
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massive protests will be treated as a historical process, intelligible in its complexity only when is addressed in retrospective. Keywords: journeys of June, collective action, right to the city, street protests, digital networks
Introdução
anos – por vezes, décadas – por vários coletivos. Desse modo, as manifesta-
Neste artigo,3 é exposta uma in-
ções
multitudinárias
são
tratadas
terpretação possível, entre muitas,
como um processo histórico, inteligível
acerca dos “protestos que marcaram o
somente quando abordadas em re-
Brasil”. A argumentação divide-se em
trospectiva.
dois planos analíticos distintos e com-
De acordo com Bringel (2013), a
plementares. O primeiro, historiográ-
dificuldade interpretativa relativa às
fico, segue os cuidados metodológicos
manifestações de junho não é resul-
propostos por Bringel (2013), cujo ob-
tado apenas da complexidade de se
jetivo principal é evitar uma série de
examinar um contexto em constante
miopias ao analisar o que vem se con-
mudança. É também a consequência
vencionando denominar as jornadas
de uma série de miopias, a saber: mio-
de junho. O segundo plano, etnográ-
pia temporal passado/presente; mio-
fico, permite observar convergências
pia da política; e a miopia do visível. A
entre as mobilizações de junho de
primeira tende a sobredimensionar as
2013 e demandas reivindicadas há 3
O presente texto faz parte de um projeto maior sobre as jornadas de junho. Agradecemos aos pareceristas
anônimos da revista Enfoques as críticas e sugestões que nos foram oferecidas e que serviram, indubitavelmente, para aprofundar os temas aqui debatidos. Agradecemos em especial à fotógrafa e cientista social Stéphanie Nicolato Chauvin os comentários e o fornecimento de fotos dos cartazes dos quais nos valemos para escrever este artigo.
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lutas atuais classificando-as como no-
pulsionadas pelo Movimento Passe Li-
vos mitos fundadores; a segunda res-
vre (MPL) e as mobilizações anteriores,
tringe a política à sua dimensão polí-
as quais, por meio de suas redes (visí-
tico-institucional, impossibilitando a
veis e subterrâneas), produziram o
compreensão da reinvenção da polí-
acúmulo necessário para que trans-
tica e do político a partir das práxis so-
bordasse nas manifestações multitudi-
ciais emergentes. A miopia do visível
nárias. Em sua argumentação, Bringel
refere-se à limitação interpretativa das
analisa os protestos de junho de 2013 apoiando-se na distinção analítica pro-
mobilizações contemporâneas à sua
posta por McAdam (1995) entre movi-
face visível (nas ruas e nas praças),
mentos iniciadores (“initiator” move-
sendo incapaz de captar os sentidos das
ments)
redes submersas, suas identidades e os
e
movimentos
derivados
(“spin-off” movements):
significados das dimensões invisíveis para um observador externo. (BRINGEL, 2013: 44).
Os primeiros seriam responsáveis por identificar brechas, realizar enquadra-
Concordamos com a pondera-
mentos provisórios, agitar e encorajar a
ção de Arbex Jr. (2013), segundo a qual
mobilização social, e, quando bem-sucedidos [...], passariam a acompanhar-se
as manifestações no Brasil vinham se
dos segundos, os derivados, “intérpre-
anunciando há tempos, embora “só re-
tes criativos” do cenário aberto.
trospectivamente os sinais ganhem vi-
Haveria, assim, movimentos madruga-
sibilidade”. Dessa forma, analisamos as
dores que acendem a chama da mobili-
manifestações como um processo,
zação social. No caso brasileiro, há certo consenso que um dos principais atores
corrigindo historicamente nosso foco
iniciadores foi o Movimento Passe Livre
interpretativo por meio da associação
(MPL), movimento social autônomo
entre as primeiras manifestações im-
que, por meio da reivindicação do passe livre estudantil, abriu um campo de conflito e de debate mais amplo sobre o
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No início de 2011, seguiram-se
transporte coletivo urbano. (BRINGEL, 2013: 44, grifos do autor).
manifestações semanais com a mesma pauta e exigindo a abertura de diálogo
Vejamos esse ponto mais deti-
com o secretário de Transportes e com
damente. O MPL de São Paulo começa
Gilberto Kassab – na época, prefeito de
a fazer debates acerca da possibilidade
São Paulo. Mesmo sofrendo repres-
de se estabelecer o passe livre desde
sões sucessivas durante as manifesta-
2005 na cidade de São Paulo. Sua carta
ções, tanto pela polícia militar quanto
de princípios é redigida e aprovada na
pela guarda civil, outros grupos se mo-
Plenária Nacional pelo Passe Livre, no
bilizaram junto ao MPL, conseguindo
V Fórum Social Mundial, realizado em
reunir mais de 5 mil pessoas no centro
Porto Alegre. Em 2006, foi criada a
da cidade de São Paulo no 7o ato de
Frente de Luta Contra o Aumento, que
2011.4 Nesse mesmo ano, manifesta-
realizou uma série de manifestações
ções em Belém e em Porto Velho con-
em São Paulo nos dias 25 e 30 de no-
seguiram reverter o aumento das tari-
vembro, assim como no dia 1o de de-
fas na primeira cidade e suspendê-lo
zembro, além de outros atos regionais.
por duas semanas na segunda.
Em janeiro e fevereiro de 2010, o
Contudo, já em 2003, em Salva-
MPL/SP organizou outros protestos
dor, contínuas manifestações – deno-
contra o aumento das tarifas por meio
minadas pelos militantes de Revolta
da criação, junto com outros grupos
do Buzu – com milhares de pessoas fe-
políticos, da Rede Contra o Aumento
charam as vias públicas protestando
da Tarifa. No final de 2010, houve mais
contra o aumento da tarifa e parali-
três manifestações no centro da ci-
sando a cidade por três semanas. Se
dade.
4
Para uma cronologia das manifestações organizadas pelo MPL, ver MPL-SP (2013: 18).
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mesmo com a intensidade das mani-
çaram o poder público a revogar o au-
festações não se obteve a redução da
mento e serviram de base para a fun-
tarifa do transporte público, a experi-
dação do MPL no ano seguinte” (MPL-
ência de Salvador inspirou, um ano de-
SP, 2013: 15).
pois, em 2004, a realização de protes-
As revoltas em Salvador e em
tos pela redução das tarifas em Floria-
Florianópolis, portanto, são lembradas
nópolis – conhecidos como a Revolta
como referências-chave para a funda-
da Catraca. A pressão exercida pelos
ção do movimento. Percorrer os cami-
milhares de manifestantes – a prefei-
nhos dos fluxos de inspiração que cada
tura decretou ponto facultativo para
mobilização produz sobre as outras
funcionários estaduais, suspensão das
nos fornece elementos para irmos
aulas de colégios municipais e estadu-
além da face visível das manifestações:
ais, e a “Câmara dos Dirigentes Lojistas
a ênfase na repressão e a mobilização
orientou os comerciantes do centro da
via redes sociais digitais como vetores
cidade a não abrirem as portas” (LUDD,
privilegiados do protesto.
2004: 15) ― concretizou-se na suspen-
Vejamos dois exemplos:5 em Li-
são do reajuste por meio de uma me-
fschitz (2013), acompanhamos a histó-
dida judicial levada a cabo pelo juiz fe-
ria da trajetória de Guy Fawkes, cató-
deral Jurandi Borges Pinheiro: “Ocu-
lico inglês que pertencia a um grupo
pando terminais e bloqueando a ponte
religioso que lutava contra a proibição
que dá acesso à ilha, os protestos for-
dos direitos políticos papistas cujo
5
As miopias sugeridas por Bringel (2013) são adotadas neste artigo como “cuidados metodológicos” para
nossa análise sobre as manifestações. Selecionamos dois artigos como exemplo da ausência desse rigor metodológico. Cabe salientar a estratégia muito comum, porém grosseira, de acusar de reducionismo uma teoria previamente reduzida. Entretanto, os dois artigos são abordados aqui menos por sua miopia que por serem representativos na ênfase de determinados elementos (nesse caso, a repressão e as redes sociais digitais) nas interpretações das manifestações.
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plano era explodir a “Câmara dos Lor-
grupos avancem nas ruas como um po-
des quando o rei anglicano Jaime I es-
der demolidor e destrutivo. (LIFSCHITZ, 2013: 701).
tivesse reunido com os parlamentares” (LIFSCHITZ, 2013: 705). Enforcado,
No artigo de José dos Santos e
Fawkes é alçado a símbolo cuja história
Valmaria Santos, podemos conferir,por
inspirou o romance gráfico V de vin-
meio de mapas e ilustrações, a geogra-
gança, de Alan Moore, e o filme homô-
ficidade dos protestos contra o rea-
nimo dirigido por David Lloyd em
juste da tarifa do transporte – que, se-
2006. Em seu artigo, Lifschitz aborda o
gundo os dados levantados, ocorre-
uso de máscaras de Fawkes por alguns
ram, “pelo menos, em 104 cidades de
manifestantes. Entretanto, em termos
17 estados, conforme levantamento
de análise crítica, as jornadas de junho
do Portal G1, em três de julho de 2013”
aparecem como uma relação de causa
(SANTOS; SANTOS, 2013: 18). Pode-
e efeito de repressão policial e reação
mos conferir também o papel das re-
à repressão:
des sociais digitais nas manifestações – chamado de meio comunicacional e
Causa 1: protesto pelo aumento do
entendido como uma fase atual do es-
preço das passagens de ônibus. Efeito 1:
paço geográfico, em que
passeata pela redução do preço das passagens de ônibus. [...] Causa 4: a violência policial é registrada
a informação e os instrumentos de co-
nas redes sociais e provoca fortes rea-
municação (computadores, notebooks,
ções na mídia internacional. Efeito 4: nas
celulares, smartphones etc.) constituem
manifestações seguintes, a polícia faz
objetos técnicos presentes, possibili-
“corpo mole” (expressão popular que
tando redes de comunicações entre su-
bem caracteriza uma atitude de resigna-
jeitos socioespaciais diversos. (SANTOS;
ção e complacência), permitindo que
SANTOS, 2013: 8).
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Segundo os autores, conecta-
tantes, mas sobre-estimados. Ao inter-
das umas às outras, as pessoas intera-
pretá-las historiograficamente, como
gem e articulam-se de forma descen-
veremos no caso do Rio de Janeiro,
tralizada, horizontal. As redes sociais
compreendemos os fluxos que inspira-
digitais alterariam as escalas, dissolve-
ram outras movimentações pelo Brasil,
riam fronteiras, sendo “extremamente
as quais emergiram dialogicamente
usadas, nesse meio técnico-científico-
tanto pelos laços de solidariedade
informacional, como mecanismo de
(contra a repressão) quanto pelos de
poder e lutas por melhorias” (SANTOS;
inspiração – o acúmulo do debate so-
SANTOS, 2013: 20). De fato, há rele-
bre mobilidade urbana para além das
vante papel das redes como meio de
redes sociais digitais (VIANA, 2013),
organização das manifestações. Con-
conforme veremos mais adiante. Porto
forme pesquisa realizada pelo Ibope,6
Alegre, São Paulo, Goiânia, Natal, Be-
86% dos manifestantes se mobilizaram
lém, Florianópolis, Brasília, Rio de Ja-
por meio de redes sociais como o Face-
neiro, Teresina, Maceió, Curitiba, Re-
book e o Twitter, e os que utilizaram al-
cife, Fortaleza, além de outras cidades,
guma rede social para convocar outras
inclusive do interior, foram marcadas
pessoas somam 75%.
por grandes manifestações a partir de
Entretanto, a reação à repressão
2013 por meio desses fluxos – ainda
e o uso de redes sociais digitais para
que com especificidades locais quanto
convocar protestos são a face visível
aos agentes que tiveram mais desta-
das manifestações – elementos impor-
que no processo e às suas formas de atuação.
6
A pesquisa foi realizada nas capitais de sete estados (SP, RJ, MG, RS, PE, CE, BA) e em Brasília na quinta-feira, dia
20 de junho de 2013. Foram entrevistados 2.002 manifestantes com 14 anos ou mais, com margem de erro de 2 pontos percentuais para mais ou para menos. Segundo o Ibope, as entrevistas foram feitas por uma equipe de entrevistadores treinada para a abordagem desse tipo de público. Mais detalhes em: . Acesso em: junho de 2013.
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essa convergência também nos permiMiopia temporal presente/passado:
tiu corrigir o foco do que Bringel
o caso do Rio de Janeiro
aponta como miopia temporal presente/passado – uma miopia que
Na cidade do Rio de Janeiro, a
tende a sobredimensionar as lutas atu-
pauta sobre mobilidade urbana pas-
ais considerando-as novos mitos fun-
sou a ganhar espaço com o Fórum de
dacionais:
Lutas contra o Aumento da Passagem, Se isso, em geral, acontece com os jo-
em janeiro de 2012, que se voltou con-
vens, gerações que participaram de ou-
tra os aumentos nas barcas, nos ônibus
tras lutas sociais de relevância societária
e no metrô. Ao lado dos exemplos de
tendem sempre a compará-las, superva-
outras cidades quanto à redução das
lorizando aquelas nas quais estiveram
tarifas de transporte, houve, no Rio de
mais diretamente envolvidos (algo habi-
Janeiro, uma convergência entre diver-
tual no Brasil com as lutas contra a ditadura). Em ambos os casos, há um pro-
sas mobilizações anteriores à primeira
blema sério de memória histórica e de
grande manifestação no dia 10 de ju-
transvase intergeracional da militância.
nho na Cinelândia. Através de uma
(BRINGEL, 2013: 44).
breve etnografia das manifestações, demonstraremos essa convergência
Portanto, para corrigir nosso
por meio dos cartazes, bandeiras e pa-
foco interpretativo, faz-se necessário
lavras de ordem entoadas pelos mani-
destacar essas lutas e observar suas
festantes, que, ao lado de outras ban-
convergências com as jornadas de ju-
deiras mais pontuais, exigiam o cum-
nho. Encontramos uma primeira con-
primento de demandas específicas e
vergência nas lutas contra a remoção
reivindicadas há anos – por vezes, há
dos indígenas e na tentativa de demo-
décadas – no Rio de Janeiro. Analisar
lição do prédio da Aldeia Maracanã.
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Completamente
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abandonado
para os povos indígenas por seu valor
(vidros quebrados, paredes pichadas,
histórico. Contudo, este local também é alvo de grande especulação imobiliária,
fachada deteriorada, lixo acumulado),
pois a proximidade ao bairro central da
o prédio foi ocupado por indígenas em
Capital, a proximidade do trem e metrô,
20 de outubro de 2006. Com o auxílio
e principalmente por ficar ao lado do Es-
de militantes de outros movimentos
tádio do Maracanã, torna-se um atrativo
sociais, os indígenas realizaram muti-
para os grandes empresários da região. (2013: 3-4).
rões de limpeza para a reapropriação do local. Sensibilizado com a manifes-
A disputa pelo local por interes-
tação do grupo, Pedro Cabral, superin-
ses privados foi acentuada em virtude
tendente do Ministério da Agricultura,
da eleição do Rio de Janeiro como
Pecuária e Abastecimento (MAPA), re-
sede da Copa de 2014. A notícia da re-
cebeu-o “em sua sede no centro do
moção dos indígenas e da demolição
Rio de Janeiro e deu parecer favorável
do prédio veio com a justificativa da
para a construção do centro de cultu-
otimização do escoamento dos torce-
ras indígenas” (BARRETO; LOPES, 2013:
dores para assistirem aos jogos no es-
1). Por muitos anos os subsídios para a
tádio do Maracanã de acordo com o
reforma do prédio foram aguardados.
padrão da Federação Internacional de
Segundo Barreto e Lopes,
Futebol (Fifa). Na manhã de 12 de janeiro de 2013, chegam os primeiros
enquanto isso o grupo de ocupantes re-
carros da Polícia Militar do Rio de Ja-
cebia visitas de simpatizantes que apresentaram ideias para revitalização do
neiro para cumprir a ação de reintegra-
espaço, não dependendo apenas da
ção de posse. Contudo, sensibilizados
venda do artesanato, mas realizando
com a resistência dos indígenas do lo-
cursos, palestras, para as escolas e uni-
cal, militantes de partidos políticos e
versidades do Rio de Janeiro. [...] A loca-
movimentos sociais, estudantes, pro-
lização do espaço ocupado pela Aldeia Maracanã é de extrema importância
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fessores, pessoas com pouco ou ne-
SILVA, 2010; entre outros). Mobiliza-
nhum contato com uma organização
ções contra as remoções já emergiram
política deslocaram-se de várias regi-
no Horto, em Manguinhos, no Morro
ões da cidade para impedir o cumpri-
da Providência, na Vila Autódromo, no
mento da reintegração. Mídias alterna-
Morro da Indiana, no Morro da Babilô-
tivas denunciaram abusos por parte
nia, além de resistências em outras fa-
dos policiais. Fotos e vídeos de indíge-
velas. Mobilizações foram organizadas
nas algemados, pés descalços sobre o
ainda no Borel para lembrar a chacina
asfalto, sofrendo com o gás lacrimogê-
sofrida em 2003. No Morro do Alemão,
neo e com o spray de pimenta ou bra-
no Morro São Carlos e no Morro da
dando palavras de ordem de resistên-
Coroa, moradores denunciaram vio-
cia correram o mundo tanto pelas re-
lência policial – antes e depois da ins-
des sociais digitais quanto pelos gran-
talação da Unidade de Polícia Pacifica-
des veículos de comunicação. Depois
dora
de dois meses de intensa mobilização
2013). É importante lembrar que ou-
e “sob os holofotes de canais interna-
tras comunidades já resistiam aos efei-
cionais, indígenas e ocupantes foram
tos das UPPs nos últimos anos, especi-
expulsos” (BARRETO; LOPES, 2013: 6).
almente em 2011; além de desapareci-
(UPP)
(RODRIGUES;
MOTTA,
Cabe acentuar que outras re-
mentos, assassinatos e agressões físi-
moções, por ordem da prefeitura, vêm
cas e/ou verbais pela Polícia Militar,
ocorrendo por toda a cidade em razão
são destacados por moradores de fa-
dos interesses vinculados à Copa do
velas ocupadas pela UPP o encareci-
Mundo e às Olimpíadas e aos projetos
mento da vida e as proibições às suas
de revitalização da zona portuária (ver
atividades culturais, como o baile funk
MONTEIRO; ANDRADE, 2012; FER-
(FREIRE, 2011). No Morro do Turano,
REIRA,
por exemplo, moradores reagiram ao
2010;
VASCONCELLOS
DA
toque de recolher pela UPP, no Dia dos 52
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Pais, “atirando pedras, paus e garrafas
movimentos relacionados às pessoas
nos policiais, que tiveram que correr da
em situação de rua contra políticas de
multidão” (GRANJA, 2012). Em 2013, é
repressão da prefeitura (mais recente-
criada a Rede de Comunidades Impac-
mente, com o Choque de Ordem). Po-
tadas, por meio de encontros entre mi-
dem-se citar ainda os atos contra o fe-
litantes de favelas desde o Fórum So-
chamento de escolas, como o Colégio
cial Urbano de 2010, assim como o
Estadual Vicente Licínio Cardoso, na
movimento Favela Não Se Cala, articu-
Saúde,7 no início de 2013 e contra o fe-
lado no final de 2012, o qual busca ar-
chamento de hospitais públicos, como
ticular os interesses de moradores de
o Instituto de Assistência dos Servido-
diferentes favelas para lutarem contra
res do Estado do Rio de Janeiro (Iaserj)
as remoções – inclusive indiretas, asso-
em julho de 2012.8
ciadas ao processo de gentrificação
Outra pauta presente nas mani-
(DAVIS, 2006).
festações está relacionada às ocupa-
Paralelamente a isso, temos as
ções urbanas. Moradores de ocupa-
resistências de camelôs – sobretudo
ções, muitos despejados violenta-
por meio do Movimento Unido dos
mente9 depois de decisões judiciais de
Camelôs (Muca), criado em 2003 – e os
reintegração de posse
7
– mesmo
Até maio de 2013, foram fechadas 50 escolas da rede estadual do Rio de Janeiro. Cf. “Em processo de
'otimização', RJ já tem 50 escolas fechadas”. Terra, 30 maio 2013. Disponível em: . Para um exemplo de protesto referente, entre outras pautas, ao fechamento do Colégio Estadual Vicente Licínio Cardoso, cf. “Ato contra as remoções de casas e fechamento de escolas da Zona Portuária”, 20 out. 2013. Disponível em: . Acesso em: 28 de maio de 2014. 8
Cf. “Domingo tem caminhada em Copacabana em defesa do IASERJ”, 27 ago. 2012. Disponível em:
. Acesso em: 28 de maio 2014. 9
Recordemos a remoção de cerca de cinquenta famílias que ocupavam o prédio do Instituto Nacional do
Seguro Social (INSS), desativado há quinze anos e localizado no centro do Rio de Janeiro. Sob balas de borracha e spray de pimenta, oito manifestantes foram presos, uma defensora pública do Estado foi agredida e “as cinquenta famílias que moravam no edifício foram postas para fora” (DEFENSORES, 2010).
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quando o imóvel não cumpre sua fun-
portanto, que uma breve etnografia –
ção social e, portanto, segundo a
orientada para os cartazes, bandeiras e
Constituição Federal de 1988, deveria
palavras de ordem das manifestações
ser destinado à moradia popular –,
em junho – nos permita demonstrar
compareceram às manifestações ento-
essa convergência.
ando “Se morar é um direito, ocupar é um dever”. Também foram marcantes
A construção das manifestações
nos últimos anos os protestos contra a
dentro e fora das ruas: junho de
homofobia e o machismo. As experi-
2013
ências das marchas LGBT realizadas anualmente (no Dia Mundial do Orgu-
É interessante atentar para o
lho LGBT, 28 de junho) e das Vadias
fato de que as primeiras manifestações
(HELENE, 2013; FERREIRA, 2013) – or-
do Rio de Janeiro, no início de junho
ganizada a partir dos protestos realiza-
de 2013, contavam com poucos parti-
dos em Toronto (Canadá) e iniciada no
cipantes (a primeira continha cerca de
Brasil em junho de 2011 – também ti-
cem pessoas), e a palavra de ordem
veram visível importância nas manifes-
que se propagou ao longo dos atos
tações de 2013, junto com outros gru-
impulsionados pelo Fórum de Lutas
pos feministas e transfeministas (JE-
contra o Aumento da Passagem (reali-
SUS; ALVES, 2010).
zados comumente às segundas e quin-
Entretanto, abordar a movimen-
tas-feiras) foi “Vem pra rua”. Mais es-
tação de mobilizações e de lutas ante-
pecificamente, os dizeres dos cartazes
riores e contextualizá-las não é sufici-
e as palavras de ordem eram “Vem pra
ente para verificarmos a convergência
rua, vem, contra o aumento”, “Se a ta-
entre demandas reivindicadas há dé-
rifa não baixar, o Rio vai parar”, “O meu
cadas no Rio de Janeiro e as manifes-
‘direito’ de ir e vir aumentou para
tações
multitudinárias.
Esperamos, 54
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R$2,95”; ou seja, demandava-se a re-
é só por 20 centavos, é pelo fim da vi-
vogação do aumento da tarifa de
olência policial”, “Enfia 20 centavos no
R$2,75 para R$2,95. Clamava-se pela
SUS”, “Não é Egito. Não é a Grécia. É o
adesão irrestrita de pessoas que com-
Brasil saindo da inércia”, “O Brasil acor-
partilhavam dessa causa única em
dou contra a roubalheira”, “Eu sou
torno do transporte. Ainda que outras
contra a PEC 37 porque não aceito cor-
pautas tenham ganhado força posteri-
rupção” se multiplicaram pelas ruas.
ormente, muitas das quais já vinham
Nesse ponto, houve certa infle-
sendo demandadas há anos ou déca-
xão no teor das manifestações e, à me-
das, conforme exposto na seção ante-
dida que as repressões aos atos se in-
rior, a pauta central, estabelecida e
tensificavam e se visibilizam – che-
propagada no próprio nome do fórum,
gando ao ápice em termos de visibili-
eram os 20 centavos.
dade no próprio dia 13 (quinta-feira),
No entanto, após o discurso po-
quando uma jornalista da Folha de S.
lêmico de Arnaldo Jabor, no dia 13 de
Paulo foi atingida por uma bala de
junho, declarando que “os revoltosos
borracha da PM em São Paulo, além de
de classe média não valem 20 centa-
outros jornalistas agredidos ou presos
vos”,10 os manifestantes e seus apoia-
–, milhares de pessoas começaram a,
dores passaram a proclamar “Não são
de fato, atender ao clamor “Vem pra
só 20 centavos”, enumerando outras
rua”. Com isso, o próprio Jabor mudou
causas em questão, desde o fim da de-
o discurso publicamente, afirmando,
sigualdade social ao fim da corrupção.
em 17 de junho em entrevista à rádio
Cartazes como “Não é por centavos, é
CBN, que errou11 e que as manifesta-
por direitos”, “Copa pra quem?”, “Não
ções eram, sim, por muito mais do que
10
Disponível em: . Acesso em: agosto de 2013. 11
Disponível em: . Acesso em: agosto de 2013.
55
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20 centavos, uma vez que o próprio ca-
de Geografia e Estatística (IBGE) em
ráter das manifestações se havia modi-
6,323 milhões de habitantes – por-
ficado. Dessa forma, as manifestações
tanto, mesmo com a variação das esti-
foram crescendo exponencialmente e,
mativas referentes à quantidade de
no Rio de Janeiro, observou-se que, de
participantes conforme as versões em
cerca de cem manifestantes na pri-
disputa pela representação desses
meira semana de junho, passaram a in-
eventos, pode-se afirmar o cresci-
tegrar os atos mil (10 de junho), 10 mil
mento exponencial dos protestos.
(13 de junho), 100 mil (17 de junho) e
Em pesquisa realizada pela Pin-
1 milhão (20 de junho) de pessoas, se-
terest12 no Rio de Janeiro, 33% dos
gundo afirmaram diversos movimen-
presentes no protesto do dia 20 de ju-
tos sociais. De acordo com o portal de
nho têm idade entre 19 e 24 anos, e
notícias G1, o ato do dia 10 de junho
38,8% estão entre 25 e 34 anos; 70,4%
contou com 300 manifestantes. No dia
estão no mercado de trabalho; e a
13, o comando da Polícia Militar con-
renda familiar de 64,6% é de até três
tabilizou 2 mil pessoas. O comandante
salários mínimos; e 23,8 % têm renda
do 5o Batalhão da Polícia Militar, coro-
familiar entre quatro e cinco salários
nel Camargo, estimou um público en-
mínimos. Esses dados nos permitem
tre 40 e 50 mil pessoas no protesto do
assegurar que as manifestações do
dia 17, e 1 milhão e 50 mil pessoas no
mês de junho não foram compostas de
dia 20, ou seja, 16,6% da população ca-
setores da tradicional classe média13
rioca, estimada pelo Instituto Brasileiro
carioca, cujos rendimentos vão além
12
Em um total de 498 questionários, com intervalo de confiança de 95%, a pesquisa foi realizada entre 16h e
20h30 no dia 20 de junho de 2013. Disponível em: . Acesso em: 13 de fevereiro de 2014. 13
Os limites do presente artigo nos impedem de trazer à tona o debate sobre o que vem se convencionando
denominar “nova classe média” – classe em crescente expansão nos últimos dez anos no Brasil cujo poder de consumo foi ampliado por mecanismos como o recente processo de valorização do salário mínimo e a difusão do crédito. Para uma análise crítica sobre esse debate, ver Pochmann (2012) e Souza e Arenari (2010).
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Vol. 13 (1) Junho-2014
dos três salários mínimos, estando
inscritos no território que dá materiali-
mais perto do que Braga (2012) deno-
dade ao que as jornadas de junho popularizaram como “direito à cidade”. [...]
mina “precariado”: jovens trabalhado-
Sem mobilidade, os espaços da cidade
res com baixa remuneração, cujas con-
se tornam privilégio de uns (quando
dições de trabalho e contrato são pre-
plenos de recursos) ou condenação de
cárias, além da alta rotatividade e do
outros (quando privados deles), e a im-
intenso ritmo de trabalho. São traba-
possibilidade ou a dificuldade reiterada de trânsito entre uns e outros pode con-
lhadores e trabalhadoras com extensa
solidar mundos segregados, mesmo
jornada de trabalho acompanhada de
que em termos jamais absolutos, já que
longas viagens até a chegada em casa.
a “miséria” ou o “privilégio” são parte da
E amanhã tudo de novo. Como Adal-
compreensão do mundo disponível aos
berto Cardoso aponta, a tarifa de ôni-
citadinos, e a “opressão” de uns é vivida como injusta porque comparada com o
bus foi o estopim, mas não um esto-
“privilégio” de outros. Os moradores do
pim qualquer. Pesquisando em jornal
Grajaú paulistano depredaram seis ôni-
de grande circulação pelo termo “ôni-
bus em protesto contra as enchentes
bus incendiado”, o sociólogo encontra
porque não conseguiram chegar em
559 ocorrências entre novembro de
casa, direito inalienável do citadino. E não conseguiram chegar pela combina-
2011 e junho de 2013:
ção perversa de condições precárias de habitação com serviço precário de
Isso dá quase uma notícia por dia sobre
transporte. (CARDOSO, 2013: 23-25, gri-
depredações de ônibus, em média. A
fos do autor).
grande maioria dos incêndios foi provocada por “criminosos”, “bandidos” ou
Não é coincidência que a ideia
“traficantes”, termos intercambiáveis na
do próprio MPL em São Paulo era jus-
cobertura do jornal, e por vezes eles ganham estatuto de grande aconteci-
tamente discutir a necessidade do
mento.
passe livre como direito à cidade, além
[...] A palavra central, aqui, é mobilidade, elemento de uma síndrome de recursos
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de evidenciar que as altas tarifas im-
nunca dormiu”, “Eduardo Paes, vai pro
postas inviabilizam o deslocamento de
inferno e remove o Satanás”.
muitas pessoas para o trabalho ou for-
Depois da aprovação do projeto
çam o corte de gastos em áreas impor-
denominado “Cura gay”, em 18 de ju-
tantes do orçamento para permitir o
nho, na Comissão de Direitos Huma-
pagamento das passagens de ônibus
nos da Câmara dos Deputados, presi-
para toda a família, seja para a escola,
dida por Marco Feliciano, as pautas do
para o trabalho, seja para o lazer. Com
movimento LGBT também se expandi-
a inflexão do “Não é apenas por vinte
ram e se tornaram mais recorrentes
centavos, é por direitos”, outras pautas
nas redes sociais e nas ruas, mesmo
ganharam as ruas, e não relacionadas
entre pessoas que não tinham contato
apenas à mobilidade urbana, mas à
anterior com a militância LGBT: “Que-
educação e à saúde públicas, à desmi-
remos cura para a fome”, “Mais felici-
litarização da Polícia Militar, à demo-
dade, menos Feliciano”, “Liberdade
cratização da mídia e contra as remo-
não tem cura. Fora, Feliciano!”, entre
ções. Tornaram-se mais comuns nos
outros.
atos os cartazes, faixas e palavras de
Por outro lado, irromperam os
ordem relacionadas a temas como:
mais variados – ainda que com o foco
“Era um país muito engraçado, não ti-
na corrupção – e, por vezes, contradi-
nha escola, só tinha estádio”, “Quando
tórios clamores pelo antipartidarismo
seu filho ficar doente, leve ao estádio”,
nos protestos. O último parece ter se
“Saúde e educação de qualidade para
colocado abertamente nas ruas desde
todos”, “Fim da PM”, “A PM que bate
o dia 17 de junho (terça-feira), quando
aqui é o PM que mata na favela”, “A
militantes do Partido Socialista dos
verdade é dura: a Rede Globo ainda
Trabalhadores Unificado (PSTU) tive-
apoiou a ditadura”, “O povo não é
ram suas bandeiras arrancadas à força
bobo: abaixo a Rede Globo”, “A favela
e foram agredidos fisicamente em 58
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frente à Assembleia Legislativa do Es-
conter a agressão a militantes de par-
tado do Rio de Janeiro (Alerj). Muitos
tidos políticos. É preciso salientar que,
manifestantes que estavam ao redor
no Brasil, há um “reduzido índice de
não perceberam a agressão e até
adesão às organizações político-parti-
aplaudiram as bandeiras abaixadas.
dárias” (BAQUERO; VASCONCELOS,
Lincoln Secco também cita esse episó-
2013: 6) por diversos motivos,14 mas o
dio em São Paulo: “Na manifestação de
que antes era uma crítica de parte dos
20 de junho, a direita mostrou uma
manifestantes contra a tentativa de li-
face dupla: grupos neonazistas ser-
derança do Fórum de Lutas pelos par-
viam para expulsar uma esquerda des-
tidos (sobretudo PSTU e Partido Soci-
prevenida, enquanto inocentes ‘cida-
alismo e Liberdade – PSOL), que se re-
dãos de bem’ de verde-amarelo aplau-
vezavam nos canais abertos de televi-
diam” (SECCO, 2013: 74).
são e nas mesas das plenárias, parecia
A partir do ato do dia 17 de ju-
ter começado a se confundir com um
nho, que reuniu cerca de 100 mil pes-
antipartidarismo, não raro, violento.
soas, e da divulgação da agressão
Com isso, tornou-se corrente, nas ple-
ocorrida, começa a emergir nas plená-
nárias do Fórum de Lutas e em canais
rias do Fórum de Lutas e nas redes so-
de debate na internet, a propagação
ciais uma problematização do clamor
da distinção entre antipartidarismo e
indiscriminado “Vem pra rua, vem”,
apartidarismo, vinculando o último aos
buscando-se reforçar cada vez mais as
princípios do movimento que impulsi-
pautas sociais e as alternativas para
14
Ainda segundo Baquero e Vasconcelos, entre os principais elementos que inibem o fortalecimento dos par-
tidos, podem-se citar: seu caráter regional; programas partidários desconhecidos da maioria da população; a ausência de incentivo à participação das pessoas em sua organização; a presença de uma ideologia híbrida, mais vinculada à defesa de interesses pessoais e corporativos “e que não correspondem a qualquer organização real do corpo eleitoral” (2013: 7).
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onou as jornadas de junho a fim de re-
Partido Comunista Brasileiro (PCB),
pudiar a violência aos partidos e aos
Partido dos Trabalhadores (PT), Partido
movimentos sociais em geral.
da Causa Operária (PCO) e Partido Co-
Depois do ato do dia 20 de ju-
munista do Brasil (PC do B) também se
nho, que contou com cerca de 1 mi-
deu como resposta à presença cada
lhão de pessoas – mesmo com a revo-
vez mais frequente de faixas e cartazes
gação do aumento da passagem no
com dizeres de aversão aos partidos
dia anterior –, quando todos os mili-
nos atos, como “Fora, todos os parti-
tantes de partidos (um militante do
dos”, “Fora, PT”, “Meu partido é meu
PSTU foi internado por causa das
país”. Se já no dia anterior ao grande
agressões), além do Movimento dos
ato na Av. Presidente Vargas circulava
Trabalhadores Sem Terra (MST) e da
nas mídias sociais digitais o relato de
Central
Trabalhadores
um militante ameaçado caso vestisse a
(CUT), foram agredidos fisicamente
camisa de seu partido e levantasse sua
por neonazistas ou skinheads, assim
bandeira, no dia seguinte milhares de
identificados pelos presentes por sua
manifestantes, incluindo aqueles sem
aparência e/ou tatuagens da suástica –
filiação partidária ou vinculação com
e também por milicianos infiltrados,
sindicatos e outros movimentos soci-
como bem aponta José Maria de Al-
ais, passaram a temer por essa tendên-
meida em artigo da revista Piauí (VIE-
cia – também observada em outras ci-
GAS, 2013) –, foi levantada em reuni-
dades, como em São Paulo, resultando
ões de organizações políticas e nas re-
no afastamento temporário do MPL
des sociais a necessidade de criar uma
das ruas. Em nota em sua página do
“união de esquerda” que defendesse
Facebook, o MPL afirma
Única
dos
militantes e bandeiras de todas as orque é um movimento social apartidário,
ganizações diante dos agressores. A
mas não antipartidário. Repudiamos os
tentativa de união entre PSOL, PSTU,
atos de violência direcionados a essas
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Enfoques
Vol. 13 (1) Junho-2014
organizações [partidos políticos e movi-
outros protestos, entretanto, a ocor-
mentos sociais] durante a manifestação
rência de pessoas atingidas por bala
de hoje, da mesma maneira que repudi-
de borracha nem sequer era mais
amos a violência policial. Desde os pri-
mencionada, tamanha sua frequência.
meiros protestos, essas organizações tomaram parte na mobilização. Oportu-
Em São Paulo, no dia 13 de junho,
nismo é tentar excluí-las da luta que
houve cerca de cem feridos, entre eles
construímos juntos.15
sete jornalistas (dois atingidos por balas de borracha na cabeça), segundo o
A violência policial a que se re-
jornal Folha de S. Paulo.17
fere a nota do MPL foi sentida em to-
Cabe lembrar que, com essa vi-
das as manifestações mencionadas an-
sibilidade da repressão policial, especi-
teriormente, desde a Revolta do Buzu,
almente contra a imprensa, a grande
em 2003, aos dias atuais. Velha conhe-
imprensa mudou o discurso sobre as
cida dos movimentos sociais, a repres-
manifestações. Até o dia 13, como a
são policial contra os protestos foi tra-
própria Folha de S. Paulo alardeava,
tada na mídia como espetáculo de
eram todos considerados “vândalos”
brutalidade. Na manifestação do dia 6
ou, de acordo com Jabor, “rebeldes
de junho de 2013, o prof. Pedro Eugê-
sem causa. Depois das agressões, po-
nio foi atingido na coxa direita por
rém, passaram a diferenciar a minoria
uma bala de borracha.16 Esse foi um
“vândala” da maioria “pacífica”. Em
caso de grande repercussão na mídia nos dias subsequentes. No decorrer de 15
“Nota n. 11: sobre o ato dessa 5a-feira”. Movimento Passe Livre São Paulo. Disponível em: . Acesso em: 13 de janeiro de 2014. 16
“Detidos
e
feridos
em
protesto
no
Centro”.
O
Globo,
6/6/2013.
Disponível
em
http://oglobo.globo.com/rio/detidos-feridos-em-protesto-no-centro-8615741>. Acesso em: 17 de outubro de 2013. 17
“Protesto deixa cerca de cem feridos no centro de SP, diz movimento”. Disponível em:
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