LEBRUN, Gérard. Sombra e luz em Platão. In: NOVAES, Adauto (org.). O olhar. São Paulo: Cia das Letras, 1988. p. 21-30. (RESUMO)

May 31, 2017 | Autor: Jonatas Ferreira | Categoria: Plato, IMAGEM, Artes, Platão, Platón, Republic (Plato), Resumo, Gérard Lebrun, Republic (Plato), Resumo, Gérard Lebrun
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Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ Faculdade de Letras Disciplina: Teoria Literária III (LEL200) Professor(a): Ricardo Pinto de Souza Estudante: Jônatas Ferreira de Lima Souza (DRE: 115044769)

RESUMO LEBRUN, Gérard. Sombra e luz em Platão. In: NOVAES, Adauto (org.). O olhar. São Paulo: Cia das Letras, 1988. p. 21-30.

Dentre todos os sentidos, os filósofos privilegiaram o sentido da visão. Por quê? Tais filósofos relacionavam a visão com o saber. Será observada essa relação: visão e conhecimento, entre Descartes e Platão. Descartes aproxima o sentido da visão com uma ideia reformulada de intuição (retomando o sentido latino de intueri). Não se trata de uma intuição comum, mas de uma intuição intelectual, que observa atentamente, de forma concentrada um objeto simples. Esse é um tema cartesiano. A questão é saber qual a relação entre essa visão intelectual de que falou Descartes e aquela dos gregos, neste caso, de Platão. Serão observados três pontos para isso. O primeiro ponto é a medição da capacidade de observação. Platão preferia o dialético, ou seja, observar o conjunto dos saberes/Formas, dominando-os e entrando em suas conexões. Descartes preferia a observação atenta, justificando que o olhar que busca muitos objetos ao mesmo tempo, não vê distintamente nenhum deles. São entendimentos opostos da visão, neste caso. Platão quer abarcar o conjunto de saberes e Descartes que atentar ao discernimento do menor detalhe das coisas simples, chamando de capacidade perspicaz de observação. Isso são questões acerca da performance do filósofo. O segundo ponto é a validade da visão para o saber. Para Descartes, com a habilidade intuitiva acionada, o ver já seria válido para a captação da compreensão dos objetos simples. O ver, com a intuição, seria suficiente para expurgar a dúvida. Em Platão, a visão é limitada, a dialética não forma certezas e o saber não pode ser comprovado satisfatoriamente. Wolfgang Wieland reforça a dificuldade de encontrar, em Platão, algo semelhante ao evocado por Descartes. Contudo, será no Banquete, em uma única página (201e), que Platão arrisca uma intuição, neste caso, para apreender a Forma do Belo. Isso mostra que Platão não é um précartesiano.

O terceiro ponto é a associação do ver com a luz. Para Descartes, a intuição e a vista atenta, são suficientes para atingir o saber. A razão é a luz que precisa ser estimulada em todo espírito humano, sendo o próprio detentor, a esfera que ilumina o tal conhecimento, o tal conteúdo. Para Platão, o olho é limitado. Para ver, há a necessidade de que o objeto esteja bem iluminado. Essa luz, limita a vontade da visão e, logo, também limita o conhecimento que se abstrairia do objeto. O olho não poderia encontrar o objeto sem a iluminação. Assim, esclarece Brunschwig, que Descartes é avesso a tradição, atribuindo luminosidade ao detentor da razão, dessa sabedoria, enquanto que, anteriormente, há a necessidade de um foco luminoso exterior ao homem para se poder ver. Para Descartes a sabedoria humana é ativa, ilumina e para Platão ela é passiva a luminosidade. Para compreender melhor o caso de Platão, será observado o livro VI da República. Diante da complexidade de se encontrar e saber a verdade acerca do Bem, Sócrates compara-o com a importância do Sol. Aqui, o Sol é um elemento indispensável para a vista e as coisas que podem ser vistas quando iluminadas, assim como o Bem é necessário a inteligência e para o saber das coisas inteligíveis. O sentido da visão é entendido como o único que depende do meio (da luz) para visualizar corretamente. Sócrates, explicando a Glaucón, remete a cosmogonia mítica do Timeu (45b-d), explanando a questão da pergunta aos deuses sobre a formação dos olhos, isto é, como eles foram feitos. A associação feita aqui, é entre o olho – que na ausência de luz, tende a adormecer – e a alma – que não apreende satisfatoriamente o saber por estar num meio de coisas submetidas a corrupção. Ou seja, Platão, por meio de Sócrates, defende a existência de luz para que olho e alma trabalhem com perfeição. Essa lógica, deve ser questionada. Para Wolfgang Wieland, esse saber platônico é dado àquele que sabe manipular melhor os lógoi (argumentos ou razões). Esse homem-que-sabe, em Platão, será o que possui uma visão ampla, que argumenta segundo princípios bastante afastados. A questão da luz entra quando esse homem, alegoricamente, liberta-se das trevas anteriores em que vivia sem saber. Aqui entra a sua alegoria da caverna. Essa alegoria pode ser resumida em quatro partes: 1) prisioneiros numa caverna acreditam que sombras são verdades; 2) um liberto descobre a luz de fogueira que formavam as sombras; 3) saindo da caverna, identifica a luz do sol, forte no início, mas se acostuma e observa os verdadeiros objetos; 4) o liberto compreende a importância do Sol para a vida, e projeta o seu retorno a caverna. A alegoria remete principalmente a um sistema de educação (paideía). Os que estão na caverna creem de fato nas sombras como as coisas reais. A luz da fogueira também é a verdadeira luz. O liberto identifica a origem das sombras pela fogueira, não sendo esta ainda

toda a verdade. Quando sai da caverna, o liberto identifica a verdade e vai se acostumando com ela. A verdade é a sua compreensão acerca do Sol e toda sabedoria que implica essa compreensão. O homem-que-sabe platônico é o desprovido de confusão entre aparência e realidade. Tal homem realiza uma contínua autocrítica da sua experiência anterior. O tema platônico em questão será a ingenuidade, não a ignorância. Os homens não sabem separar aparência de realidade, são ingênuos. Não pensam nisso, nessa possibilidade de distinção. Eles não costumam desconfiar naturalmente das aparências. No entanto, essa ingenuidade talvez seja indispensável à vida. O liberto, será o que aprendeu a desconfiar do seu saber anterior. Que esse saber, era um falso saber. Passa a não mais reconhecer seu local de origem, e indagar-se de como vivia imerso naquilo. Seus companheiros de caverna, também não o reconhecerão pois, agora, está parecendo outro. Esse é um sistema de educação e aprendizado proposto por Platão aos gregos atenienses. A ideia é perturbar a ingenuidade, saber a sua posição na geografia. Esses elementos também aparecem no Fedão, no mito cosmológico que o cerra. Trata-se de uma desconfiança sobre uma Terra aparente e outra, uma Terra verdadeira. Um problema de provincianismo. A ignorância que nos envergonha seria a cegueira mais estupidez. Essa é a amathía: “nada saber e crer que sabe”. Essa amathía é remediada com a paideía, esse sair da caverna. Platão dirige uma guerra, com isso, ao “senso comum”. Descartes, ao contrário, também investe sua filosofia no senso comum – escrevendo suas obras também em francês, não apenas em latim –, este que poderá, dessa forma, desprender-se do aprendizado dos sentidos e aderir ao Método, aprendendo a concentrar a atenção e a preocupar-se com questões anteriormente não consideradas. Em Descartes, o discípulo deverá abrir seus olhos e observar com atenção o que está ao seu alcance, pensar o que jamais foi pensado e aproveitar-se disso. Pascal retomará esse elemento cartesiano. Para Platão, isso não é suficiente devido aos limites de tal visão natural. É necessário forçar os capazes a olhar para além, para outra localidade. Será de suma importância, para Platão, uma tomada de consciência. O tema da visão, essas metáforas são sedutoras. Mas deve-se, pensa-se, entender-nos ainda em uma caverna, e talvez, mesmo conseguindo-se sair dela, não seria nada percebido, nenhum sol, permanecendo-se ainda na alienação. Diante disso há prisioneiros reincidentes que perguntam-se se não seria o ouvir (discursos, textos) mais relevante do que o ver para fora ou o ver com atenção.

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