LEI MARIA DA PENHA, FEMINISMO E SISTEMA DE JUSTIÇA CRIMINAL – UMA ABORDAGEM TEÓRICA A PARTIR DAS CRIMINOLOGIAS FEMINISTAS

July 25, 2017 | Autor: C. Magalhães Gomes | Categoria: Feminismo, Criminología Crítica, Violência Doméstica, Lei Maria da Penha
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LEI MARIA DA PENHA, FEMINISMO E SISTEMA DE JUSTIÇA CRIMINAL – UMA ABORDAGEM TEÓRICA A PARTIR DAS CRIMINOLOGIAS FEMINISTAS Camilla de Magalhães Gomes1 Resumo: O trabalho que aqui se apresenta pretende investigar, a partir das criminologias feministas, as bases teóricas da aplicação da Lei Maria da Penha. Inspirada na Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e fruto do trabalho de um consórcio de ONG´s feministas, a Lei trouxe uma nova forma de tratamento da violência de gênero no ambiente doméstico. Mais do que isso, a lei em questão reconhece os direitos das mulheres como direitos humanos e, assim sendo, reconhece a violência de gênero no ambiente doméstico como violação dos direitos humanos das mulheres. Esses deveriam ser os parâmetros teóricos de qualquer estudo a respeito da referida lei, bem como – e especialmente - da interpretação judicial na sua aplicação. Assim, esse estudo procura investigar as bases teóricas em que as sentenças dxs juízxs da Vara de Violência Doméstica da Comarca de Vila Velha-ES se apóiam. A proposta é analisar que papéis aqueles cânones de interpretação aqui considerados como essenciais para a aplicação da lei – quais sejam o feminismo e o reconhecimento da violação dos direitos das mulheres como violação dos direitos humanos - tem nessas decisões, se são ou não utilizados e com que freqüência o são. Palavras-chave: Lei Maria da Penha; Feminismos; Criminologias; Interpretação. Introdução O trabalho que aqui se apresenta analisa, a partir das criminologias feministas, as sentenças condenatórias proferidas no ano de 2011 em processos por crime de lesões corporais na Vara de Violência Doméstica da Comarca de Vila Velha-ES. A proposta inicial era a de analisar que papéis os cânones de interpretação da Lei Maria da Penha– quais sejam o feminismo e o reconhecimento da violação dos direitos das mulheres como violação dos direitos humanos - tem nessas decisões. Com o andamento da pesquisa, a análise acabou por restringir-se nos fundamentos das sentenças que dizem respeito à “vítima” – o valor da sua palavra e seu comportamento. 1. A lei maria da penha – feminismo e paradigmas do direito A Lei 11340 de 7 de agosto de 2006 – Lei Maria da Penha (LMP) (BRASIL, 2006), inspirada na Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher - Convenção de Belém do Pará - e fruto do trabalho de um consórcio de ONG´s feministas, (BANDEIRA, 2009, p. 418) trouxe uma nova forma de tratamento da violência de gênero ocorrida

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Camilla de Magalhães Gomes, mestre em Direito pela UFES e doutoranda em Direito, Estado e Constituição pela UnB. Advogada.

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no ambiente doméstico. Mais do que isso, a lei em questão reconhece os direitos das mulheres 2 como direitos humanos e, assim sendo, reconhece a violência de gênero no ambiente doméstico como violação dos direitos humanos das mulheres. Não há dúvidas de que a Lei representou avanços no tratamento do tema na ordem jurídica brasileira. Contudo, sua publicação, vigência e aplicação, nesses seis anos, não foram capazes de alterar o paradigma do direito para esse tipo de violência, nem de levar às mulheres a sensação de proteção pela lei. Segundo pesquisa realizada pelo Instituto Avon há uma baixa confiança ou credibilidade na Lei referida. Entre as mulheres 38% confiam na proteção jurídica e policial nos casos de violência doméstica, contra 59% que afirmam não confiar. Dentre os homens, os índices são mais equilibrados: 47% confiam, contra 48%. (INSTITUTO AVON, 2011, p. 24) A desconfiança por parte das mulheres na aplicação da Lei revela um retrato do sistema de justiça criminal que deve ser levado em conta: o sistema penal não está estruturado para receber “as mulheres”. Com isso quer se dizer que o sistema espera uma espécie de “mulher”: a mulher vítima3 de violência que deseja se separar. O porquê desse descompasso entre o sistema e as mulheres é demonstrado pela criminologia feminista. Em primeiro lugar, as pesquisadoras feministas, ao lançarem sua crítica sobre a criminologia, apontaram que a sua vertente crítica produziu avanços, ao descortinar os erros da criminologia positiva, mas deixou de fora um ponto fundamental: a pergunta da “mulher”. 4 Todos os estudos promovidos pela criminologia – ou melhor, pelas criminologias - eram estudos de homens, sobre homens, para homens. A crítica das criminologias feita pelas feministas mostra que,

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O estudo usará “mulheres” como categoria de análise, por compreender que não há uma Mulher, como uma representação única do gênero. Segundo Butler “there is very little agreement after all of what it is that constitutues, or ought to constitute, the category of women”. (BUTLER, 1990, p. 1). Há que se dizer, ainda, que a referência a mulheres inclui toda forma de orientação afetiva, sexual ou de gênero. 3 A Lei Maria da Penha, ao tratar da mulher e da violência doméstica, abandona a expressão “vítima”, substituindo-a pela expressão “mulher em situação de violência doméstica”. A expressão escolhida e utilizada diz muito sobre a diretriz da Lei, sobre como se quer tratar a mulher no contexto da Lei 11430/06. O uso de vítima “coloca a mulher em situação passiva”. A expressão vítima mantém a forma tradicional de tratamento da mulher dentro do Direito e do Poder Judiciário. A segunda expressão, de outro lado, realiza um deslocamento discursivo e a coloca em um lugar diferente “em um lugar de transição de uma situação vitimizante para a de superação”. (CAMPOS, 2011, p. 6) 4 O “método legal feminista”, definido por Katherine Bartlett, busca encontrar um fazer feminista no direito. Usar um método legal feminista significa, em primeiro lugar “ask the woman question”. Segundo Bartlett, uma pergunta se torna um método quando feita regularmente e esse o ponto fundamental de aplicar o método feminista no direito: sem essa forma de questionar o sistema, discriminações e diferenças associadas ao gênero não são percebidas. O método também consiste em aplicar a razão prática feminista e utilizar de procedimentos de conscientização das mulheres e entre as mulheres. (BARTLETT, 1999, p. 836). Talvez mais do que fazer a pergunta da mulher, seja necessário fazer a pergunta do gênero, uma vez que esse é uma estratégia criadora de gênero: não só é responsável por reproduzir as diferença de gênero presentes na sociedade, como é uma das instituições responsáveis por criar o gênero e suas diferenças. (SMART, 2000, p. 42).

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no que diz respeito às mulheres, o sistema também é seletivo e é criminalizante e vitimizante.5 Segundo Elena Larrauri, as mulheres em situação de violência doméstica retiram suas denúncias por diversos motivos e, entre eles, destaca três: a consideração de que a mulher que retira a denúncia é tida por irracional; o fato de que o processo penal lança pouca atenção sobre esse tema, ao lado da grande quantidade de estudos dogmáticos – e aqui acrescento de criminologia – sobre esse tema e, por fim, a discrepância entre o que querem as vítimas e o que o sistema pode oferecer, que acaba gerando frustração nos profissionais. (LARRAURI, (a), p. 1-2) Como o sistema não sabe lidar com o fato de que, muitas vezes, a mulher que denuncia a violência doméstica sofrida tem por objetivo que a essa cesse ou que o companheiro mude de comportamento, a solução fixa do processo e da sentença condenatória e o preparo dos operadores do direito para a aplicação apenas dessa forma de solução não conseguem atender a essa intenção e, não raro, esse panorama gera um sentimento de inutilidade na mulher e de frustração em juízes e promotores. (LARRAURI, (a) passim) Conforme ressalta a autora, o sistema cria um paradoxo: “la paradoja de no permitir que la mujer retire la denuncia y luego absolver al agresor por ‘falta de pruebas’.” O sistema, ao invés de dar soluções flexíveis para esse problema, trata a mulher como alguém que não sabe o que quer. (LARRAURI, (a), p. 28). Por essas razões, necessário é incluir o paradigma do gênero no direito, abandonar os essencialismos, e reconhecer que as formas de pensamento, de linguagem e as instituições da nossa civilização possuem uma implicação estrutural com o gênero, ou seja, com a dicotomia masculinofeminino; que os gêneros não são naturais, mas o resultado de uma construção cultural e não dependem do sexo biológico e que os pares de qualidades contrapostas atribuídas aos dois sexos são instrumentos simbólicos da distribuição de recursos entre homens e mulheres e das relações de poder existentes entre elas. (BARATTA, 1999). 6 E o direito, nesse sentido, é uma estratégia criadora do gênero (SMART, 2000, p. 42), assumindo-o para si, bem como essas suas divisões, contribuindo para a reprodução do androcentrismo na teoria, na prática forense e na academia. (BATISTA, 2009) 1. Criminologias e criminologias feministas 5

A respeito da vitimização produzida pelo sistema, ver infra item 1.2. Quando se fala em essencialismo significa dizer que a dicotomia masculino/feminino atribui qualidades a cada um, como se fossem esses atributos naturais, exclusivos e/ou próprios de cada um, identificando pares de qualidade, correspondentes a masculino/feminino: racional/irracional, ativo/passivo, pensamento/sentimento, razão/emoção (CAMPOS, 2011, p. 2), público/privado, produtor/reprodutor. (CHANETON, 2007, p. 11) E essas qualidades foram hierarquizadas, alçando as primeiras, supostamente pertencentes ao gênero masculino, à posição de superioridade 6

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Diante desse diagnóstico, faz-se necessária uma mudança do paradigma no direito: o deslocamento de um paradigma biológico para o paradigma de gênero, utilizando-se de um método que contenha ou forneça ferramentas de análise e interpretação focados na mulher e no paradigma de gênero. Há uma necessidade de alteração de paradigma, com a inclusão do discurso feminista dentro do direito – e aqui, dentro da criminologia -, como condição para a implementação dos direitos das mulheres e “para o sucesso da luta emancipatória das mulheres no campo da ciência e da política do direito”. (BARATTA, 1999, p. 23). No entanto, assim como não há uma única criminologia7, não há uma única criminologia feminista, ou uma única visão da legitimidade da adoção do sistema penal como instrumento de combate à violência doméstica. Há diferentes posicionamentos a respeito da relação entre criminologia e violência doméstica. Segundo Vera Regina Pereira de Andrade a solução é a não utilização do sistema penal. (ANDRADE, 1996) A autora sustenta que o direito penal não cumpre com nenhuma das promessas a que se propõe e, também, o saber penal foi construído a partir de um “saber masculino onipresente”, na ausência de um sujeito: o feminino. (ANDRADE, 2004, p. 4) No que tange à vitimização produzida, como aponta Vera Andrade, o sistema penal duplica a violência exercida contra as mulheres, e elas se tornam vítimas da “violência institucional (plurifacetada) do sistema penal que expressa e reproduz a violência estrutural das relações sociais capitalistas (a desigualdade de classe) e patriarcais (a desigualdade de gêneros)”. (ANDRADE, 1996, p. 90-91) É correto dizer, como pretende a autora, que a lei e o saber penal dotam o sistema de “uma ideologia capitalista e patriarcal”. (ANDRADE, 2004) Os fundamentos para a solução de abandono do direito penal, no entanto, não parecem corretos, uma vez que se assentam no fato de ter sido o sistema construído por mentes e mãos masculinas. Esse posicionamento não é aqui aceito por incorrer no risco de ser essencialista ou sexista.8 Também criticando a LMP, Nilo Batista comenta que sua publicação teve o “efeito positivo de estimular o debate sobre as opressões privadas às quais são submetidas as mulheres”., mas que tal debate ficou e tem ficado “um pouco neutralizado pela ênfase que se conferiu à intervenção 7

É a criminologia hoje, muito mais, o “conjunto de conhecimentos, de diversas áreas do saber, aplicados a análise e crítica do exercício do poder punitivo, para explicar sua operatividade social e individual e viabilizar uma redução em seus níveis de produção e reprodução da violência social”. (BATISTA, ZAFFARONI, 2006, p. 288). 8 Embora, é preciso dizer, esse não seja estritamente o pensamento da autora em questão. Fala-se apenas dos riscos de sua adoção. Fala-se de essencialismo aqui, por exemplo, na caracterização do sistema penal de masculino e, assim, agressivo, violento, racional. Como aponta Carol Smart, a lei não é racional porque o homem é racional, mas ambos são constituídos como tais. (SMART, 2002, p. 87) A mesma observação pode ser feita quanto às demais características atribuídas.

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punitiva”. (BATISTA, 2009, p. xix) Com razão o autor, uma vez que, ao mesmo tempo em que se deve criticar a criminologia crítica por falhar em incluir a “pergunta da mulher”, também merece crítica o feminismo que, em sua abordagem teórica e prática da violência de gênero no âmbito doméstico, parece não ter levado em conta os avanços da criminologia crítica. Neste artigo, reconhece-se que a opção punitiva não é a melhor solução para a questão do gênero no direito penal. O abandono completo também não se apresenta como caminho. Como ressalta Zaffaroni, o uso da solução penal pelo feminismo pode ser legítimo como tática, dentro da estratégia política do feminismo (ZAFFARONI, 2001, p. 83).

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A solução, desse modo, não

significará o abandono do Direito Penal. A ideia é desconstruir o gênero no sentido amplo e no específico, dentro do direito penal, a partir de uma criminologia feminista. Esse é o objeto de pesquisa dessa articulista e o artigo que se apresenta aqui é uma primeira aproximação do campo em busca dessa “tática” dentro do feminismo. 2. Decisões da vara de violência doméstica de vila velha Para a análise proposta, foram coletadas as sentenças condenatórias proferidas nos anos de 2011 e 2012 da Vara de Violência Doméstica da Comarca de Vila Velha-ES. A coleta de dados parte do ano de 2011 porque esse foi o ano da especialização da 5ª Vara Criminal de Vila Velha, tornando-se, então, a Vara de Violência Doméstica dessa Comarca. Dessas sentenças, foram separadas para a presente pesquisa apenas aquelas que tratavam de condenações proferidas em 2011. Dessas, apenas as que tratam de lesões corporais. Nesse filtro, uma das sentenças trata de lesões corporais e ameaça, tendo sido o réu absolvido do primeiro crime e condenado pelo último, como será mencionado a seguir. Ainda que não se trate de condenação por lesão corporal, essa sentença foi incluída na análise pois se mostrou relevante. Seriam ao todo 10 sentenças, mas a pesquisa de uma delas no site do Tribunal de Justiça do Espírito Santo não retorna o inteiro teor e o contato da pesquisa na referida Vara não retornou com as informações a tempo desta publicação. São então examinadas nove sentenças condenatórias proferidas no ano de 2011. O exame que aqui é feito não é conclusivo. Trata-se de uma primeira aproximação de um campo de pesquisa: as decisões condenatórias em casos de crimes de lesões corporais decorrentes de violência doméstica. 2.1. Fundamentos das sentenças 9

Esse uso tático não pode configurar, contudo, uma legitimação do poder punitivo. (ZAFFARONI, 2001, p. 84)

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Feita a apresentação do material examinado, uma questão precisa ser levantada. A princípio, a proposta deste trabalho era examinar os fundamentos dessas sentenças, mais precisamente seus fundamentos teóricos. Essa empreitada, no entanto, foi curta. Como as criminólogas feministas apontam, o paradigma de gênero ainda não foi introduzido no direito. Ainda que o tenha sido, em alguma medida, dentro das pesquisas da criminologia, ele não o foi na ciência do direito mainstream, na doutrina10 e menos ainda na prática judiciária. Os processos de violência doméstica, então, seguem ainda muito da tradição do processo penal e do direito penal tradicionais, sem que os temas e conceitos fundamentais na matéria – gênero, violência de gênero, feminismo, machismo, patriarcalismo, misoginia – fossem examinados ou tivessem algum tipo de atenção. E, como apontado anteriormente, a ausência de trato com esses temas é ainda mais sentida no processo penal. Há um prejuízo nesse esquecimento – como será demonstrado no tópico a respeito da avaliação da circunstância judicial do comportamento da vítima – uma vez que, sem esses conceitos, a interpretação, análise e aplicação da lei acaba por ser feita ao largo dos fundamentos que a inspiraram e a construíram – a luta feminista e a luta pelos direitos humanos das mulheres. I. A Palavra da Vítima Uma das grandes questões a destacar quando se fala em violência doméstica, conforme demonstrado pela pesquisa antes citada, é a falta de confiança das mulheres no sistema penal (na aplicação da LMP). Essa falta de confiança pode ter diversas razões, como comentado anteriormente a partir dos estudos de Elena Larrauri e Vera Andrade. O sistema reproduz os estereótipos de gênero e muitas vezes não leva em consideração as palavras da mulher, considerando que ela “não sabe o que quer ou o que faz”. Esse é um ponto que merece atenção nas sentenças examinadas. Em 5 das sentenças examinadas, considera a juíza que, ainda que ausentes provas testemunhais, a palavra da vítima, corroborada pelo exame de lesões, deve ser levada em consideração. Assim se pronuncia em uma das sentenças:11 Ademais, como muito bem obtemperado em julgado exarado pela Egrégia segunda câmara criminal do TJES, nos crimes de lesão corporal em sede do lar, a palavra da vítima deve ser tratada com relevante valor probatório e, se corroborado com os demais elementos 10

Há uma clara distinção entre ciência e doutrina quando se fala em direito. Enquanto a primeira acompanha – ou deve acompanhar – as regras e métodos da ciência de forma geral, como a possibilidade de ser falseada e verificada, o mesmo não se passa com a doutrina, que se apoia apenas em si mesma e não apresenta o processo por meio do qual se chegou às soluções/conclusões que apresenta. 11 Na maioria delas, o pronunciamento é repetido com as mesmas palavras.

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coligidos no tríodo investigativo, se tornam suficientes para o decreto condenatório. (ESPÍRITO SANTO, (b))

O entendimento da juíza segue, na verdade, entendimento adotado pelo Tribunal de Justiça do Espírito Santo de 2009 e que continua sendo ali aplicado em termos de violência doméstica I - As declarações prestadas pela vítima comprovam a autoria delitiva, não havendo que se falar em ausência de provas à condenação. II - Em delitos deste jaez, pela usual ausência de outras testemunhas, a palavra da vítima assume essencial relevância, e, se verossímil e corroborada por outros elementos dos autos, serve de lastro a um édito condenatório. III - Assim, em se tratando de crime praticado dentro do ambiente doméstico, a palavra da vítima assume extrema importância, ainda mais quando confirmada por outros indícios veementes, se apresentando suficiente ao decreto condenatório, independente da negativa do acusado, especialmente porque praticado normalmente na clandestinidade, ausentes testemunhas presenciais. (ESPÍRITO SANTO, (a))

A decisão citada pela juíza é de 2009 e o entendimento continua sendo adotado por aquele Tribunal, como se verifica do acordão a seguir, do ano de 2013. II. A Avaliação do “comportamento da vítima” Um outro ponto de destaque da sentença está na dosimetria. Repetindo a prática de muitos juízes no país, as sentenças examinadas não possuem fundamentação específica e detalhada das circunstancias judiciais do art. 59. E em todas elas a juíza considera, de modo lacônico, que “a vítima contribuiu para a ação” ou “a vítima não contribuiu para a ação”. A Constituição Federal, em seu art. 93, IX, estabelece o princípio da fundamentação das decisões judiciais. (BRASIL, 1988) Como decorrência do princípio constitucional acima citado, o artigo 381, III do Código de Processo Penal determina que a sentença deve conter os motivos de fato e de direito em que se funda: “Art. 381. A sentença conterá: III - a indicação dos motivos de fato e de direito em que se fundar a decisão”. (BRASIL, 1941) A necessidade de fundamentação abrange todo o conteúdo da sentença e isso inclui, além dos fundamentos que levam à condenação ou à absolvição, aqueles que, em se tratando de uma sentença condenatória, sustentam a dosimetria e aplicação da pena. Com isso se quer dizer que o juiz, ao realizar a análise, por exemplo, das circunstâncias judiciais do art. 59 para a fixação da pena base, deve indicar em que elementos probatórios sustenta a avaliação de cada uma delas. Esse procedimento não está – e nem poderia estar – isento da obrigatoriedade de fundamentação. Mas o cotidiano forense mostra que a regra tem sido, em realidade, a exceção. “ao (pré)determinar parâmetros para a aplicação da pena, o Código Penal intenta reduzir ao máximo o arbítrio, muito embora seja ainda elevada a discricionariedade na fixação da sanção penal em decorrência dos

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elementos abertos previstos no art. 59 do Código Penal.” (CARVALHO, 2002, p. 36) Não fosse isso desafio suficiente, há que se destacar ainda que as próprias circunstâncias trazidas no referido artigo possuem conteúdos morais, abstratos e impossíveis de serem verificados, como aponta Salo de Carvalho: “no momento da cominação da pena na sentença condenatória, o sistema revela toda sua perversidade ao admitir o emprego de elementos essencialmente morais, desprovidos de significado, sem averiguabilidade probatória e, consequentemente, isentos de possibilidade de refutação empírica”. (CARVALHO, 2002, p. 31-32)

Este trabalho se foca apenas na primeira crítica acima feita: a da necessidade de fundamentação das circunstâncias, destacando aqui apenas uma delas, a do “comportamento da vítima.

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Como dito acima, as decisões contém uma de das duas apreciações a seguir: “a vítima

contribuiu para a ação” ou “a vítima não contribuiu para a ação”. A frase pode parecer simples ou com poucos efeitos a não ser de tornar essa uma circunstância que favorece o réu, mas há mais. De modo geral, as sentenças analisadas, ao lado das frases referidas, não trazem os fundamentos que levaram a essa conclusão. Em apenas algumas delas é possível encontrar elementos descritos na fundamentação que indiquem alguma forma de agressão ou ameaça anterior da vítima, mas esses elementos não estão indicados como o fundamento para essa avaliação específica na dosimetria. É possível extrair, aqui e ali, referências a brigas, provocações, xingamentos ou desentendimentos anteriores existentes entre réu e vítima.13 A especificação de que dados levam a considerar que a vítima contribuiu ou não para a ação e o porquê de tais dados serem considerados de uma outra forma são procedimentos de extrema relevância: como dizer que a vítima contribuiu para o crime por ter, por exemplo, xingado o réu? É possível estabelecer um nexo causal entre uma ação e outra? A avaliação é perigosa e pode ser, em alguma medida, legitimadora de posturas machistas se não for melhor explicada e devidamente fundamentada, como é o caso das sentenças ora examinadas. Não se descarta a possibilidade de real provocação ou incitação, mas não parece que esse tenha sido o caso de nenhuma das sentenças examinadas. Muito dificilmente se poderia dizer que um xingamento anterior contribui para a ação – no caso, a ocorrência de lesões corporais – sem que isso reproduza o machismo que a LMP pretende coibir, uma vez que, segundo seu histórico, se trata de uma legislação de inspiração feminista, um caso de advocacy feminista.

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É possível realizar uma crítica da própria existência da circunstância “comportamento da vítima” e da forma como essa é aplicada, mas esse não será o objeto deste artigo. 13 Essas ocorrências podem ser verificadas, por exemplo, nas sentenças (e) e (h), conforme listagem nas referências ao final. Na segunda, narra a juíza que “que mesmo que a mulher tenha iniciado as agressões, o varão, que provavelmente é fisicamente superior a ela, revidou dando-lhe um soco, que conforme ele mesmo declarou, acabou por derrubá-la”.

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Uma agressão contra uma mulher no ambiente doméstico não é tão somente fruto do relacionamento, de supostos “desentendimentos naturais”. É a reprodução de uma prática machista que inferioriza a mulher, que, naqueles pares de qualidade citados, coloca-a como propriedade. Em um contexto social machista, a mulher que não cumpre com os papéis de seu gênero precisa ser corrigida. E por isso a consideração de que a “vítima contribuiu para a ação” – assim como todas as demais avaliações das circunstâncias judiciais – deve ser fundamentada. E, ainda que se argumente que apenas as circunstâncias desfavoráveis ao réu dependem de fundamentação, essa apreciação está correta de acordo com os princípios e garantias clássicos do direito e processo penal, mas não subsiste em se tratando de Lei Maria da Penha. Afinal, nela há um elemento de destaque a ser considerado que é a “mulher em situação de violência doméstica”, ou “vítima” para usar o termo clássico do processo penal. Garantismo e feminismo precisam encontrar um equilíbrio em sua aplicação. A LMP vem para dar visibilidade à violência de gênero ocorrida no ambiente doméstico considerada, por muito tempo, questão privada não sujeita à apreciação do Estado. Porém, mais do que isso, é um importante instrumento – que aqui admitimos ao menos como instrumento simbólico, uma vez que sua eficácia ainda é uma dúvida – de combate ao machismo e de afirmação dos valores da luta feminista contra essa forma de violência. Desse modo, sua aplicação não deveria reproduzir os estereótipos que circundam o gênero, provocando assim uma vitimização secundária. A expressão aqui citada e criticada pode representar uma violência institucional de gênero e, assim, ainda que se admitisse desnecessária a fundamentação das circunstâncias judicias para os casos do processo penal tradicional, assim não parece ser para os casos de violência doméstica, quando se trata da circunstância “comportamento da vítima” sob pena de se constituir a aplicação da lei uma vitimização secundária. 14 Considerações finais Como dito acima, este não é um estudo conclusivo. A pretensão é a aproximação do campo de pesquisa no curso de doutoramento da UnB – as decisões das Varas de Violência Doméstica da Comarca da Capital no Espírito Santo (Vitória, Vila Velha, Cariacica, Serra e Viana), em particular 14

Um exemplo dessa aplicação dissociada da base feminista é a decisão proferida pelo TJRJ em Embargos Infringentes apresentados pela defesa do ator Dado Dollabella no processo em que acusado pela atriz Luana Piovani de ter praticado crime de lesões corporais. Em 25 de junho 2013, os embargos foram julgados com a decisão de que a LMP não se aplicaria ao caso por não ser a vítima “hipossuficiente e vulnerável”, reproduzindo aqui os estereótipos do gênero e categorizando mulheres que estariam e outra que não estariam sob a proteção da referida lei.. Disponível em .

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as decisões condenatórias de crimes de lesões corporais. A pesquisa aqui delineada pretendia, de início, analisar os fundamentos teóricos de uma parte dessas decisões (proferidas na Comarca de Vila Velha-ES no ano de 2011). Como essa análise se mostrou infrutífera, optou-se por verificar os fundamentos dessas sentenças e, nestes, analisar os pontos referentes à “vítima”: o valor dado ao seu depoimento como elemento de prova e a avaliação do “comportamento da vítima”. No primeiro, as observações são positivas uma vez que, ao contrário do que aponta a criminologia aqui estudada, o entendimento da juíza da Vara, assim como do Tribunal de Justiça, é o de reconhecer o valor da palavra da vítima especialmente em processos de violência doméstica. O segundo ponto se apresentou complexo e abriu polêmicas a serem futuramente melhor analisadas. A valoração do comportamento da vítima como circunstância judicial, ao ser feita sem a fundamentação devida, deixa espaço para diversos questionamentos: existiu, nos casos examinados, um nexo causal entre o comportamento da vítima e a violência? Caso tenha existido, qual sua comprovação? A consideração desse comportamento como tendo contribuído para o crime pode caracterizar a reprodução do machismo do direito? As reflexões aqui feitas fazem reforçar a necessidade de inclusão do paradigma do gênero no direito, reconhecendo-se que é ele uma estratégia criadora do gênero. Bibliografia ANDRADE, Vera Regina Pereira de. A soberania patriarcal: o sistema de justiça criminal no tratamento da violência sexual contra a mulher. Revista brasileira de ciências criminais, São Paulo, Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, n 48, maio/junho, 2004, pp. 260/290. ________. Criminologia e feminismo: da mulher vítima à mulher como sujeito. In CAMPOS, Carmen Hein de (Org.) Criminologia e Feminismo. Porto Alegre: Sulina, 1999, p.105-117. ________. Violência sexual e sistema penal: proteção ou duplicação da vitimização feminina? Revista Seqüência: estudos jurídicos e políticos, Florianópolis, v. 33, p. 87-114, 1996. BANDEIRA, Lourdes. Três décadas de resistência feminista contra o sexismo e a violência feminina no Brasil: 1976 a 2006. Sociedade & Estado, Rio de Janeiro, v. 24, n. 2, p. 401-438, 2009. Disponível em: , Acesso em 15 de março de 2012. BARATTA, Alessandro. O paradigma do gênero: da questão criminal à questão humana. In: CAMPOS, Carmen Hein de (org.) Criminologia e feminismo. Porto Alegre: Sulina, 1999, p. 19-80. BARTLETT, Katherine T. "Feminism Legal Methods". Harvard Law Review, v. 103, feb. 1990, n. 4, p 829-888. BATISTA, Nilo. Só Carolina não viu. In MELLO, Adriana Ramos de. Comentários à Lei de violência doméstica e familiar contra a mulher. Rio De Janeiro: Lumen Juris, 2009, 2ª Ed, p. ix10 Seminário Internacional Fazendo Gênero 10 (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2013. ISSN 2179-510X

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