Lisboa 1758: o plano da Baixa Hoje, Catálogo da Exposição

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Ficha Técnica do Catálogo [livro+CD] Câmara Municipal de Lisboa Presidente

António Costa

Entrevista a José-Augusto França

Ana Tostões e Walter Rossa (condução) Ricardo Lameiras (realização e montagem)

Urbanismo e Reabilitação Urbana

Vereador Manuel Salgado

Programação Multimédia

Cultura, Educação e Juventude

Carbono 14

Vereadora Rosalia Vargas Impressão e Duplicação Associação de Turismo de Lisboa – Visitors & Convention Bureau Director-Geral

MPO

Vítor Costa

Henrique Cayatte Design com a colaboração de Sara Aguiar e Pedro Gonçalves

Edição

Design, Concepção Gráfica e Paginação

Câmara Municipal de Lisboa Pelouro de Urbanismo e Reabilitação Urbana Pelouro de Cultura, Educação e Juventude

Revisão

Coordenação

Tradução

Ana Tostões e Walter Rossa

Traducta

Autores

ISBN

Ana Paula Moita/Sara Loureiro Ana Tostões António Costa Claudio Monteiro Manuel Salgado Margarida Cunha Belém Raquel Henriques da Silva Rosalia Vargas Walter Rossa

978-972-95472-7-0

António José Massano

Impressão

Norprint Depósito Legal

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Fotografia

Arquivo Municipal de Lisboa – José Luís Neto/José António Santos Instituto Geográfico Português Museu da Cidade (Lisboa) Pedro Santa-Bárbara Acompanhamento Editorial

Maria Cecília Cameira Pedro Serranito Apoio Jurídico, Administração e Gestão de Patrocínios – CML

Margarida Castro Martins Execução e Gestão Financeira – ATL

Caleia Rodrigues Coordenação de Divulgação – CML

Sandra Veiga

Reservados todos os direitos de publicação total ou parcial à Câmara Municipal de Lisboa: Pelouro de Urbanismo e Reabilitação Urbana, Pelouro de Cultura, Educação e Juventude. As imagens seleccionadas pertencem aos arquivos indicados e não podem ser reproduzidas a partir desta edição. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida sob qualquer forma sem autorização expressa do editor e dos autores.

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FICHA TÉCNICA EXPOSIÇÃO ORGANIZAÇÃO

Apoio à Divulgação – CML

Câmara Municipal de Lisboa Presidente

Ana Gracindo Conceição Peixoto Cristiana Afonso Maria José Gomes

António Costa Urbanismo e Reabilitação Urbana

Vereador Manuel Salgado

Programação Cultural – CML

Cultura, Educação e Juventude

Ilda Magro Sandra Veiga

Vereadora Rosalia Vargas Associação de Turismo de Lisboa – Visitors & Convention Bureau Director-Geral

Vítor Costa Coordenação Geral

Manuel Salgado – Vereador do Urbanismo da Câmara Municipal de Lisboa Coordenação

Helena Caria (CML) Paula Oliveira (ATL) Comissários Científicos

Ana Tostões Walter Rossa

Apoio à Organização – CML

Belisaria Cerveira Conceição Pinto Elisabete Dias Hélia Lourinho Joaquim Antunes Jorge Rosa Manuela Cyrne Maria Irene Nunes Maria José Rafael Rui Vieira Sérgio Cipriano Sónia Leandro Tomás Gonçalves Vera Rebelo Investigação e Produção de Conteúdos

Comissário Museográfico

Henrique Cayatte Concepção Geral

Ana Tostões Henrique Cayatte Walter Rossa

Ana Tostões Cecília Cameira (CML) Ilda Diniz (CML) Margarida Cunha Belém Margarida Ramalho Pedro Serranito (CML) Vera Pais (CML) Walter Rossa

Comissários Executivos – CML

Maria Cecília Cameira Pedro Serranito Apoio Jurídico, Administração e Gestão de Patrocínios – CML

Margarida Castro Martins Execução e Gestão Financeira – ATL

Caleia Rodrigues Rui Miguel António

Autoria dos Textos da Exposição

Ana Tostões Walter Rossa Documentário e Entrevista

Ana Tostões e Walter Rossa (condução) Ricardo Lameiras (realização e montagem) Projecto e Design

Coordenação de Divulgação

Maria Tavares (ATL) Sandra Veiga (CML)

Henrique Cayatte Design Cristina Viotti Paula Cabral

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Pedro Gonçalves Rita Múrias Sara Aguiar Susana Cruz

Banda Sonora

Fonoteca Municipal de Lisboa Tradução de Textos

Traducta, Lda. Produção e Montagem da Exposição Coordenação: Henrique Cayatte Design Produção Executiva: Ana Teresa Mota Montagem: Eurostand com a colaboração

de Carpteam e Cineset

Revisão de Textos

António José Massano Pré-Impressão

Critério - Produção Gráfica, Lda. Equipa Técnica de Montagem – CML Coordenação

Impressão

Helena Nunes (Conservadora Residente) Ana Luísa Alvim Cecília Cameira Pedro Serranito

L2 Siprit, Lda.

Cartolinas de Acondicionamento

Equipamentos de Iluminação

Quadrimóvel

Verylight

Fotografia – Tratamento, Conservação e Reprodução de Imagens

Montagem de Iluminação

António Pedro Ferreira BN – Biblioteca Nacional de Portugal Biblioteca da Ajuda – Biblioteca Nacional de Portugal Fundação Calouste Gulbenkian – Biblioteca de Arte José António Santos (Arquivo Municipal de Lisboa – Arquivo Fotográfico) José Pedro Santa-Bárbara José Pessoa/Luísa Oliveira (Instituto dos Museus e da Conservação – DDF – Museu Nacional de Arte Antiga) José António Silva (ANTT – DGARQ – Direcção-Geral de Arquivos) Luís Fradinho (CML) Luís Pavão (Arquivo Municipal de Lisboa – Arquivo Fotográfico) Luísa Ferreira Miguel Levy Rui Luciano (Arquivo Municipal de Lisboa – Arquivo Fotográfico)

Projecto de Iluminação

A Fundição

Eurostand Equipamentos de Som e Audiovisuais

Backlight Acondicionamento e Transporte de Peças

FeirExpo, SA Réplica da Estátua Equestre de D. José I (Execução)

Guliver

COLABORAÇÃO/APOIO Entidades Internas Pelouro da Cultura, Educação e Juventude

Dub Video Connection

Carlos Catalão Isabel Rodrigues Rosária Alves

Aplicações Multimédia

Direcção Municipal de Cultura

BNG, Lda.

Rui Mateus Pereira

Montagem de Filmes da Exposição

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Museu da Cidade Aida Nunes Ana Cristina Leite Ana Paula Rafael Carlos Loureiro Filipa Nunes Henrique Carvalho Maria do Rosário Dantas Arquivo Municipal de Lisboa

Alberto Loureiro Ana Luísa Alvim Ana Paula Moita Ana Tavares Ana Teresa Brito Carla Antunes Célia Liberato Inês Viegas José António Santos José Luís Neto Leonilde Viegas Luísa Costa Dias Maria de Lurdes Baptista Maria Helena Nunes Mónica Queiroz Paulo Barata Rui Luciano Rui Pedro Pereira Sara Loureiro Serviço Educativo – Arquivo Municipal de Lisboa

Alexandra Nunes Ana Brites Ana Paula Moita Filipa Ribeiro Ferreira Paula Figueiredo Susana Cardoso Vitória Pinheiro Gabinete de Estudos Olisiponenses

Elisabete Gama José Mouzinho Luísa Mellid Monteiro Maria Manuela Canedo Paula Candeias Vanda Souto

Direcção Municipal de Gestão Urbanística

Gabriel Cordeiro José Pedro Fragata Direcção Municipal de Planeamento Urbano

Márcia Muñoz Teresa Almeida Direcção Municipal de Conservação e Reabilitação Urbana

Ana Paula Cunha Jorge Catarino Tavares Departamento de Apoio aos Órgãos do Município

Carlos Freitas Carlos Rodrigues Irene Lopes Isabel Anacleto Isabel Pires João Rodrigues José Bastos Teresa Paula Departamento de Abastecimentos

Eduardo Nascimento João Rodrigues Divisão de Aprovisionamentos

Ana Cristina Capelo Ana Luísa Lucas da Silva João Paulo Braga Maria Salomé Vaz Divisão de Gestão de Frota

António Santos Luís Manuel Francisco Manuel Ferreira Ricardo Bandeirinha Divisão de Jardins Ana Júlia Francisco Polícia Municipal de Lisboa

André de Jesus Gomes Manuel Lopes Rodrigues Regimento de Sapadores Bombeiros

Hemeroteca Municipal de Lisboa

Filomena Ferreira

Álvaro Costa de Matos Jorge Trigo

Apoio – Entidades Externas

Academia Nacional de Belas-Artes Associação dos Arqueólogos Portugueses

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Banco de Portugal Biblioteca e Arquivo Histórico do Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra Biblioteca Nacional da Ajuda – Biblioteca Nacional de Portugal BN – Biblioteca Nacional de Portugal ANTT – DGARQ: Direcção-Geral de Arquivos Escritório Álvaro Siza Falcão de Campos, Arquitecto, Lda. Fundação Calouste Gulbenkian – Biblioteca de Arte Igreja de São Luís dos Franceses – Embaixada de França Instituto de Gestão do Património Arquitectónico e Arqueológico – IGESPAR Museu Nacional de Arte Antiga – Divisão de Documentação Fotográfica – Instituto dos Museus e da Conservação, IP – Ministério da Cultura Instituto Geográfico Português Instituto Superior Técnico Ministério da Defesa Nacional Palácio Nacional da Pena Agradecimentos

Ana Delgado Ana Paula Moita Anouk Faria da Costa António Pedro Ferreira Atelier Jean-Michel Willemotte Branca das Neves Carlos Castanheira Claudio Monteiro Coronel Ribeiro de Faria (Director do Museu Militar) Cristina Siza Vieira Daniela Arnout Elvis Veiguinha Fátima Cruz Helena Barranha Inês Medeiros Guerreiro Inês Rapazote Jaime Augusto Kröner Celestino da Costa José Manuel Mesquita José Reis Luís Soares Carneiro Margarida Sousa Lobo Howel Pedro Portugal Raquel Henriques da Silva Sandra Vaz Costa Sara Loureiro Vítor Cóias e Silva

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APRESENTAÇÃO ANTÓNIO COSTA

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A COMEMORAÇÃO, A EXPOSIÇÃO E O CATÁLOGO ANA TOSTÕES E WALTER ROSSA

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O PROCESSO DA BAIXA WALTER ROSSA

024 025 034 039 047 069

NO 1.º PLANO A TOMADA DE CONSCIÊNCIA A CONSCIÊNCIA OS CONTEXTOS O PLANO MENSAGEM

CLAUDIO MONTEIRO

082 083 084 123

ESCREVER DIREITO POR LINHAS RECTAS LEGISLAÇÃO, PLANO E RAZÃO UM NOVO DIREITO PARA A NOVA LISBOA. A LEGISLAÇÃO E O PLANO POMBALINOS DE RENOVAÇÃO DA BAIXA CONCLUSÃO

RAQUEL HENRIQUES DA SILVA

126 128 144 156

LISBOA RECONSTRUÍDA E AMPLIADA (1758-1903) A PRIMEIRA FASE DA RECONSTRUÇÃO, 1758-1777 LISBOA LIBERAL E ROMÂNTICA LISBOA REGENERADA: DA AVENIDA DA LIBERDADE AO PLANO DAS AVENIDAS NOVAS

ANA TOSTÕES

168 177 189 202 216

230

PRECURSORES DO URBANISMO E DA ARQUITECTURA MODERNOS A CIDADE PROGRESSISTA E A BAIXA INCOMPREENSÃO MODERNISTA E DESCOBERTA MODERNA URBANISMO E DESPOTISMO: PROJECTO E UTOPIA A ARQUITECTURA DA CIDADE: RECONSTRUÇÃO E CONTINUIDADE

INTENÇÕES | NOVOS PLANOS MANUEL SALGADO

232 233 235 237 241 245

DO PLANO DE RECONSTRUÇÃO DE 1758 À REVITALIZAÇÃO DO SÉCULO XXI UM PROJECTO URBANO UM PLANO QUE SE ADAPTOU O QUE É HOJE A BAIXA REINVENTAR A BAIXA A LIÇÃO DA EXPOSIÇÃO

ROSALIA VARGAS

248

A POTENCIAÇÃO CULTURAL DA BAIXA ANA PAULA MOITA E SARA LOUREIRO

254 256

LISBOA, 1707-1777: A MEMÓRIA DA CIDADE NOS ARQUIVOS MUNICIPAIS CONSULTAS, DECRETOS E AVISOS

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APRESENTAÇÃO

Há 250 anos, na sequência do grande Terramoto de 1755, criava-se o primeiro Plano da Baixa Chiado para reconstruir a cidade. Tratou-se, do ponto de vista conceptual e do ponto de vista operativo, de um instrumento fundamental e pioneiro. Internacionalmente, esse Plano foi precursor e representou um avanço notável nas concepções e nos métodos, assumindo uma grande importância na história do urbanismo. Em Portugal, o Plano desenhou, definiu e determinou o centro da capital, do País e do Império, desempenhou um papel refundador e estratégico, constituiu um marco fundamental na história da cidade e tornou-se uma das grandes marcas de Lisboa. Como mostra o professor José-Augusto França, no seu indispensável livro de referência, Lisboa Pombalina e o Iluminismo, o Plano de Manuel da Maia, Eugénio dos Santos e Carlos Mardel representou uma visão, traduziu uma filosofia e concretizou um conceito. A Câmara Municipal de Lisboa não podia alhear-se desta celebração e do que ela representa e evoca, inspira e estimula. Por isso se lançou a ideia de uma exposição que assinala a passagem do 250.º aniversário da criação deste Plano. Ao concebê-la, os arquitectos Ana Tostões e Walter Rossa, seus comissários científicos, documentam, interpretam e divulgam esta memória histórica, mas dirigem-na para o presente e para o futuro, que é a boa maneira de tornar fecundo o passado. Aprendemos com a História e com as suas lições, ganhando ao mesmo tempo consciência da responsabilidade que, perante ela, na actualidade, nos cabe. Esta exposição possui ainda um elevado simbolismo e um valioso objectivo pedagógico, acentuados pelo lugar escolhido para a realizar: a Praça do Comércio, verdadeiro ícone espacial e monumental deste Plano. Ao percorrermos a exposição, nos seus três núcleos fundamentais, fazemos uma viagem no espaço e no tempo: partimos de um facto urbanístico matricial do século XVIII e chegamos à cidade contemporânea e às nossas preocupações actuais face a ela. Como disse recentemente o arquitecto Jean Nouvel, Prémio Pritzker de 2008, “o futuro de uma cidade concebe-se sempre em relação com o seu passado”.

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Como se sabe, a “questão” da Baixa-Chiado – nas suas múltiplas dimensões: urbanística, arquitectónica, patrimonial, histórica, sociológica, simbólica, cultural, económica e administrativa – é um dos grandes desafios que a cidade deve enfrentar plenamente. O actual executivo da Câmara Municipal de Lisboa fez seu este desígnio e tem trabalhado nele com sentido de prioridade, com grande empenhamento e entusiasmo mobilizador. Esta exposição e o catálogo que lhe corresponde é, assim, mais uma oportunidade para dar a este tema a visibilidade que lhe é necessária e útil. Quero felicitar os vereadores responsáveis, os comissários e todos aqueles que a apoiaram e nela trabalharam dedicadamente, tornando-a possível. Uma cidade como Lisboa é herança, memória, consciência, responsabilidade, exigência, visão, projecto e plano. E é energia, dialéctica, dinamismo, metamorfose, abertura, debate e prospectiva. Os reconstrutores de Lisboa fizeram de uma catástrofe uma oportunidade para anteciparem o futuro, transformando a destruição em criação. A ambição visionária, a ousadia rigorosa e a capacidade de realização de que deram provas continuam a ser um belo e imperativo exemplo para aqueles que, como nós, têm hoje o dever de fazer a grande cidade do século XXI: uma cidade com história e com futuro, plural, inovadora, cosmopolita e criativa.

António Costa Presidente da Câmara Municipal de Lisboa

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A COMEMORAÇÃO, A EXPOSIÇÃO E O CATÁLOGO A COMEMORAÇÃO A catástrofe que, nos primeiros dias de Novembro de 1755, destruiu o centro de Lisboa – o Grande Terramoto – desde sempre foi celebrizada e até comemorada, em especial quando, em 1955 e em 2005, se contaram, respectivamente, dois séculos e dois séculos e meio sobre a ocorrência. Por razões várias, é tempo, agora, de reforçar a divulgação e a reflexão sobre a excelência, a eficácia e o carácter absolutamente inovador do instrumento de planeamento segundo o qual se processou a reconstrução: o Plano da Baixa de 1758. Em 12 de Maio de 1758, foi promulgado um alvará, com força de lei, que se constituiu como a lei básica do processo da reconstrução da zona de Lisboa destruída com aquela catástrofe (terramoto, tsunami e incêndio). Regulou o sistema fundiário, estabeleceu regras idênticas às que hoje designamos como de perequação, determinou prazos, etc., sendo um dos seus objectivos centrais o cumprimento do novo plano regular, e decoroso cuja publicação anunciava. Num tempo longo, seguir-se-lhe-ia um conjunto considerável e relevante de disposições normativas complementares e de rectificação. Em 12 de Junho de 1758, surgiu então o diploma com o Plano para a reconstrução do centro da cidade, constituído por uma memória descritiva e um conjunto de desenhos. O traçado urbano assinado por Eugénio dos Santos e Carlos Mardel havia sido elaborado, tudo o leva a crer, a partir da proposta que o primeiro desenvolvera, dois anos antes, a um nível de anteprojecto e que fora apresentada ao poder por Manuel da Maia, em 19 de Abril de 1756, com a terceira parte da sua Dissertação. À planta juntava-se um conjunto de desenhos-tipo, designadamente alçados de rua. Durante anos, esses desenhos seriam desenvolvidos e adaptados a cada espaço da reconstrução. Com a promulgação dos regulamentos e desenho urbano, estava concluído o processo de apuramento do Plano iniciado logo após a catástrofe, um verdadeiro plano-piloto, para a renovação da zona baixa da cidade e da colina que a aconchega pelo poente, o Chiado. Mas a catástrofe e o processo que conduziu à sua elaboração e concretização catalisaram ainda a reflexão especulativa, sob a forma de planos sectoriais, acerca do desenvolvimento urbanístico da cidade numa área bem mais vasta, segundo um perímetro

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então definido. O seu conjunto constitui, assim, um primeiro plano global para a cidade, o qual não foi apenas consequente na Baixa-Chiado. No entanto, o Plano da Baixa de 1758 não é apenas princeps para Lisboa. Se entendido na sua globalidade – desenho, instrumentos de regulação, sistema de financiamento e, fundamentalmente, a sua verificada exequibilidade –, ao nível da história da urbanística mundial foi uma peça inovadora cuja relevância ainda não foi devidamente considerada, avaliada e divulgada. Logrou gerir a reconformação de uma área crucial de uma cidade simbólica para a imagem do País e do universo de então, mas teve também a virtude de suportar condignamente a evolução que transformou o espaço até aos dias de hoje. No momento dos 250 anos da sua promulgação e na oportunidade da discussão, mais do que acerca da reabilitação, da replanificação da Baixa-Chiado, a Câmara Municipal de Lisboa não pôde ficar alheia à efeméride e, através de uma exposição, propôs-se não apenas celebrar e dar a conhecer o facto numa dimensão ajustada à sua relevância, mas também potenciá-lo no sentido de catapultar o processo de regeneração da área. Fomos convidados para seus Comissários Científicos e aqui estamos a apresentar essa acção. A iniciativa partiu do Pelouro do Urbanismo e Planeamento Estratégico, na pessoa do respectivo vereador, Manuel Salgado, mas desde logo a ela se associou activamente o Pelouro da Cultura. Para a concepção e execução museográfica e de imagem, a Câmara Municipal de Lisboa convidou o designer Henrique Cayatte. Cedo e prontamente pudemos contar com a extraordinária dedicação e competência dos Comissários Executivos, Maria Cecília Cameira e Pedro Serranito, bem como com o apoio pronto do Arquivo Histórico e do Museu da Cidade. São os nomes de uma vasta equipa que, de forma abnegada, logrou levar a cabo a concepção e montagem da exposição em cerca de quatro meses e agora a manterá aberta, com uma programação de apoio diversificada, até ao final do ano. A designação desta acção – Lisboa 1758: o Plano da Baixa Hoje – resulta de uma reflexão em torno da forma de trazer para o comum entendimento e debate contemporâneo o objecto em questão. Fica-lhe ainda subjacente a ideia do potencial actual daquele Plano. Não é, pois, uma exposição de história, mas sim de urbanismo; não é apenas um acto cultural, é também um apelo à cidadania.

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A EXPOSIÇÃO O processo que conduziu ao Plano e, depois, à sua implementação levou à produção de um impressionante conjunto de textos e desenhos, alguns de uma inquestionável valia estética. O mesmo sucedeu durante o tempo longo da vivência em evolução do espaço que mediou entre a execução do Plano e os dias de hoje. Não tendo como objectivo a produção de uma exposição de desenhos e/ou textos, na realidade era incontornável montar o discurso expositivo com recurso aos mesmos. Se, em muitos casos, era fácil a escolha, noutros tornou-se penosa pelo muito que foi necessário deixar de fora. Também o local nos condicionou, pois alguns dos seus espaços não têm condições para acolher originais com os requisitos que a sua conservação impõe. No entanto, era importante não apenas dar a exposição no vortex da cidade saída do Plano, mas também trazer para fruição pública, assim apelando para a sua reabilitação e refuncionalização futuras, um espaço relevante da arquitectura da reconstrução. Com efeito, o Pátio da Galé há muito que se encontra descaracterizado, espacial e publicamente encerrado. A exposição é, assim, também um voto e uma resposta de projecto para a reabilitação efémera de um espaço. Bilingue (Português e Inglês), a exposição é constituída por três secções, a saber: 1) Contextos; 2) O Plano; 3) A execução e a lição. Cada uma destas secções tem carácter discursivo, material e expositivo diverso. Assim: a primeira, necessariamente resumida, é constituída por painéis unitariamente compostos e impressos, incluindo ainda o recurso a apoio audiovisual e a exibição de uma maqueta; a segunda é essencialmente constituída por originais e foi estruturada segundo uma narrativa sequencial; a terceira é, também, essencialmente composta por originais, mas aposta numa pluralidade discursiva que nos conduz à actualidade e ao debate sobre o futuro. No final, foi conformado um espaço que produz um efeito simultâneo de apoteose, síntese e reflexão. Antecede-o um pequeno auditório onde passa em contínuo uma entrevista que gravámos com José-Augusto França. Conta, ainda, com uma livraria com uma colecção especializada. Na primeira parte – Contextos –, visou-se introduzir o visitante na complexa encruzilhada de factos e dados que nos permitem compreender os antecedentes que levaram à prontidão de resposta em que se constituíram o Plano e o processo da reconstrução. Essa informação foi agrupada segundo os seguintes grandes temas/títulos: a) O Terramoto e

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Lisboa face à sua condição de capital, na qual se coloca em balanço o custo da catástrofe face à oportunidade urbanística em que se revelou; b) A reflexão sobre Lisboa anteTerramoto: planos, projectos, concretizações, segundo um breve percurso por alguns dos desígnios de reforma frustrados; c) A engenharia militar e a escola portuguesa de urbanismo, o material humano e cultural que possibilitou a reacção, o Plano e a sua implementação; d) Experiências anteriores, na qual são referidos os casos mais marcantes de reconstrução à escala urbana, segundo um novo traçado sobre o preexistente (Roma, Londres, Catânia e Rennes). No final, a grande maqueta que representa Lisboa antes do Terramoto visa a produção individual da síntese de todos esses contextos e introduz-nos na passagem em sifão que invoca o próprio Terramoto. Acede-se então à segunda parte da exposição: O Plano. Aqui, o objectivo essencial é tornar claro o processo que conduziu à formulação do Plano e o método segundo o qual foi elaborado e implementado. Num primeiro espaço, segundo o mote da Dissertação do engenheiro-mor Manuel da Maia, aborda-se a reacção à catástrofe, o método e o conceito que conduzirá ao Plano. Expõe-se também o que designamos por ante-Plano, o conjunto de desenhos que configuraram o material entregue ao Poder, com a última parte da Dissertação, em Março e Abril de 1756. O espaço seguinte – literalmente, uma Caixa Negra: de 19/Abril/1756 a 12/Jun/1758 – invoca o período compreendido entre aquela entrega e a publicação. Dá conta do que não se sabe assumindo-o, precisamente, acerca de tudo quanto ocorreu nesses dois anos preparatórios do desenho, legislação, engenharia financeira, etc., necessários não apenas à formulação do Plano, mas também ao assegurar da sua eficácia e implementação. Na sala imediata – Proposta & Desenvolvimento: a Casa do Risco –, exibe-se, finalmente, o Plano, bem como uma selecção de desenhos originais relativos à sua execução, muito restrita se tivermos em conta o universo disponível. Essas peças foram organizadas segundo espaços e temas. Por último, acede-se a um espaço cuja designação dá uma boa ideia do seu conteúdo e da sua mensagem: Além da Baixa. A Execução e a Lição é desenvolvida na terceira parte a partir de sete temas que cruzam cronologias, personagens e ideias. Aqui, o objectivo é mostrar como a unidade entre arquitectura e urbanismo determinou o carácter do Plano e, ao mesmo tempo, a sua elasticidade, a sua capacidade de transformação e resistência. Primeiro, revela-se, com o mote Humanização e Vivências, como o Plano é implementado, interpretado e adaptado, con-

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figurando a humanização da crueza do resultado do projecto original, associada ao romantismo, como novo paradigma de identidade e celebração simbólica. Depois, com o tema Do(s) Passeio(s) à(s) Avenida(s), assinala-se como o Plano determinou o desenvolvimento futuro da cidade a partir de grandes eixos de penetração no interior. Destaca-se, a seguir, o domínio do espaço público como um dos aspectos mais inovadores do Plano. As situações contranatura são agrupadas no tema Corpos Estranhos, segundo três grupos: os aterros; as transformações nos edifícios que modificaram a leitura do quarteirão; o tráfego mecânico. O quinto tema, Projecto e Utopia, revela projectos e ideias de transformação que procuraram recentralizar a Baixa no quadro global da cidade em expansão. Seguidamente, as Catástrofes são apresentadas como uma oportunidade de transformação paradigmaticamente condensada no Plano de reconstrução do Chiado, no que significa a utilização do Plano como mote para a intervenção contemporânea. Finalmente, constatando o quanto a valia da Baixa foi reconhecido tardiamente, destacam-se, no tema Consciência Patrimonial, a olisipografia e a pioneira síntese, de dimensão internacional, realizada por José-Augusto França. A questão que se coloca, hoje, e que é o verdadeiro motor desta acção – Baixa-Chiado Que Futuro? –, formula-se como conclusão em aberto no último espaço da exposição. Apresentam-se números-choque que revelam a decadência e o despovoamento da zona e aponta-se para a necessidade de transformar o círculo vicioso em círculo virtuoso, como chave do processo de regeneração urbana, convidando o visitante a reagir e a pronunciar-se. Pretende-se que todos participem na reurbanização da Baixa-Chiado.

O CATÁLOGO Este catálogo é constituído pelas edições, em Português e em Inglês, de um volume com textos escritos sob encomenda, acompanhado por um CD bilingue no qual estão disponíveis, através de meios dinâmicos de consulta, os textos e elementos gráficos e audiovisuais da exposição, bem como o registo da sua montagem. Mais do que um volume agradável, o catálogo passará, assim, a ser uma ferramenta imprescindível para os que se interessem pelo tema, pois reúne, nesses dois formatos complementares, a investigação centrada sobre o Plano e o seu desenvolvimento em cidade.

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O livro é formado por duas partes. A primeira – O Processo da Baixa – é constituída por um conjunto de quatro textos de enfoque essencialmente histórico e elaborados segundo adequados protocolos científicos. Com esses estudos, criteriosamente encomendados, pretendeu-se a constituição de uma síntese actualizada sobre a temática, integrando algumas novidades factuais e interpretativas. A segunda – Intenções/Novos Planos – conjuga a reflexão dos responsáveis políticos sobre as potencialidades, os desejos, os métodos e os projectos, com uma breve visão, uma amostragem especializada, sobre os acervos municipais, sendo de lamentar o facto de não termos podido contar com um texto sobre a colecção do Museu da Cidade. Na sua essência, o CD contém o registo da exposição, não apenas dos textos, imagens e legendas, que podem ser extraídos e editados em baixa resolução, mas também dos seus espaços e concepção museográfica. A consulta, aliás, pode ser efectuada tema a tema, sala a sala ou, em alternativa, segundo uma barra cronológica. Inclui ainda a entrevista, com a duração de cerca de uma hora, que fizemos a José-Augusto França, a qual constitui um inestimável testemunho acerca do florescimento e desenvolvimento do tema da Baixa e do seu Plano como bens culturais. Sem excessos formais, espera-se que este catálogo se constitua não apenas no testemunho e registo da exposição que, explicitamente, pela primeira vez chama a atenção para a relevância do Plano de Lisboa de 1758, mas também como em mais um marco da evolução do conhecimento sobre o tema. Espera-se ainda que catapulte a sua divulgação internacional, nunca efectivamente conseguida. Como em todos os planos que se tornaram consequentes, a concretização deste Plano foi parcial e evolutiva, revelando uma gestão por vezes sábia, por vezes furtiva e ao serviço de interesses localizados. A eficácia só bem mais tarde pode ser cabalmente avaliada, com frequência em duro confronto com as consequências do seu abandono sem substituição. O abandono ou não deste Plano, a sua eficácia e substituição constituem um outro objectivo desta exposição. 250 anos depois, o Plano da Baixa de 1758 está aí, em Lisboa, aqui… hoje! Ana Tostões e Walter Rossa Comissários Científicos da Exposição e Coordenadores do Catálogo

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