Mapear Goa. Espaços e cenários na representação do mundo oriental.

August 19, 2017 | Autor: M. dos Santos Lopes | Categoria: Asian Studies, History of Cartography, Goa
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Mapear Goa. Espaços

e cenários na representação

do mundo oriental M arília

dos

S antos L opes *

1. Representar a natureza: do crer ao ver No ano de 1508 vêm a lume na Europa as primeiras imagens sobre a Índia, mais concretamente sobre a costa do Malabar. São as gravuras que Hans Bur‑ gkmair, um conceituado artista de Augsburgo, desenhou para acompanhar um relato de viagem à Índia.1 Trata­‑se da edição do diário de Balthasar Springer, um dos alemães que viajou para o Oriente na armada de Francisco Almeida.2 Tal como o autor do diário da viagem inaugural à Índia, Balthasar Sprin‑ ger anotou, como que decalcando o espaço geográfico, informações de etapas definidas e significativas da viagem: costa ocidental africana, cabo da Boa Espe‑ rança, costa oriental e Índia. As imagens irão, pois, dar ênfase a este registo cartográfico e etnográfico, desenhando o mapa da distância e a rota percor‑ rida através da representação de um núcleo familiar em cada uma das regiões evocadas. Apesar da diferença específica que cada uma delas bem evidencia, e também pretendida pelo artista, constata­‑se uma clara intenção de delinear visualmente o trilho geográfico e cultural. Apoiando­‑se no texto do mercador Balthasar Springer, Hans Burgkmair traça assim o primeiro esboço iconográfico da Índia e dos indianos, após a viagem de Vasco da Gama. Note­‑se que o artista procura retratar visualmente os indianos tal como os viu Balthasar Springer.3 Dando assim eco às palavras do autor e via‑ jante, Hans Burgkmair desenha uma primeira categorização visual dos indianos. Na esteira de Álvaro Velho que os descreve como „[...] homens baços. E andam deles com barbas grandes e os cabelos da cabeça compridos, e outros * Centro de Estudos de Comunicação e Cultura (CECC). Universidade Católica Portuguesa 1 Sobre as imagens, veja­‑se Walter Hirschberg, Monumenta Ethnographica, Frühe völkerkundliche Bilddokumente: Schwarzafrika (1508­‑1727), Graz, Akademie, 1962 2 Balthsar Springer, Die Merfart vñ erfahrung nüwer Schiffung vnd Wege zü viln onerkanten Inseln vnd kunigreichen/ von dem großmechtigen Portugalichen Kunig Emanuel Erforscht/ funden/ bestritten vnnd Ingenommen/ Auch wunderbarliche Streyt/ ordenung/ leben wesen handlung vnd wunderwer‑ cke/ des volcks vnd Thyrer dar iñ wonende/ findstu in diesein Buchlyn warhaftliglich beschrybern un abkunterffeyt/ wie ich Balthasar Sprenger sollichs selbs: in kurtzuerschynen zeiten: gesehen vñ erfahren habe, s.l. (Oppenheim), 1509. Sobre o autor e a sua obra, veja­‑se Renate Kleinschmidt, Bal‑ thasar Springer – eine quellenkritische Untersuchung, Diss. Wien, 1966. 3 Balthasar Springers Indienfahrt 1505/06, ed. Franz Schulze, Strassburg, Heitz, 1902.

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Fig. 1. Reproduzida em Stephanie Leitch, Mapping Ethnography in Early Modern Germany, New Worlds in Print Culture, New York, Palgrave Macmillan, 2010, plate 5.

trazem as cabeças rapadas e outros tosquiadas; e trazem em a moleira uns topetes, por sinal que são cristãos; e nas barbas bigodes. E trazem as orelhas furadas, e nos buracos delas muito ouro; e andam nus da cinta para cima, e para baixo trazem uns panos de algodão muito delgados”4, Springer delineia uma nova imagem que Hans Burgkmair vai fixar e fazer circular pela Europa. As gravuras da Die Merfart und erfarung nüwer Schiffung und Wege zu viln unerkanten Inseln und Künigreichen revelam­‑se, por conseguinte, um precioso estudo sobre as gentes recém­‑descobertas. Num exercício compilador entre saber geográfico e etnográfico, Hans Burgkmair introduz um primeiro registo para o que mais tarde, Willem Janszoon Blaeu irá concretizar no seu mapa de África:5 o traçado geográfico será emoldurado, na sua grande maioria, por casais das diferentes redescobertas regiões africanas, definindo hábitos, ves‑ tuário ou até profissões, pelo que o observador terá não só o conhecimento cartográfico dos contornos e limites deste continente, mas também elementos identificadores e determinantes da sua geografia humana. As imagens de Hans Burgkmair dão, desde já, conta deste desejo de repre‑ sentar a diversidade cultural e humana, recorrendo às observações de quem viu esta realidade com os seus próprios olhos. Stephanie Leitch, na sua obra Mapping Ethnography in Early Modern Germany, New Worlds in Print Culture, defende que as gravuras de Hans Burgkmair „were the first images to reflect the nature and degree of cultural difference that this contact represented. Burgkmair’s representations of Africa and Indian natives in a 1508 woodcut edition of a merchant’s voyage is the first print of Africans and Indians to Álvaro Velho, Relação da Primeira Viagem à Índia pela Armada Chefiada por Vasco da Gama, in: José Manuel Garcia (Ed.), Viagens dos Descobrimentos, Lisboa, Presença 1983, pp. 155­‑224, aqui p. 184. 5 Willem Janszoon Blaeu, map of Africa, Nova Africa descriptio, 1630. Veja­‑se Stephanie Leitch, Mapping Ethnography in Early Modern Germany, New Worlds in Print Culture, New York, Palgrave Macmillan, 2010, p. 83. 4

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assume empirical observation as a prerequisite to its production.”6 A atitude deste primeiro registo será o que caracterizará a novidade da obra: a de reco‑ nhecer o valor da observação. Como salienta a autora, em contraste com o Renascimento italiano maioritariamente fundamentado na mimeses, Hans Burgkmair, pelo contrário, terá de criar os seus materiais, recorrendo a recen‑ tes e actuais informes capazes de esboçar uma nova representação e um novo saber. Tal como já o tinham feito os cartógrafos, também Hans Burgkmair irá, a partir da novidade, mapear as realidades recentemente descobertas, traçando novas imagens sobre as terras e as gentes da Índia. De todas as gravuras do artista contemporâneo de Albrecht Dürer, a que alcançou maior notoriedade foi a que representa o triunfo do rei de Cochim. Usando modelos iconográficos familiares – como o cortejo triunfal – Hans Burgkmair relativiza e familiariza os autóctones, tornando a narrativa grá‑ fica numa representação pictórica e iconográfica conhecida e mais comum. Atribuindo­‑lhe aspecto e proporções humanos, Hans Burgkmair retira­‑os das categorias estereotipadas e exóticas que formulavam a imagem do Oriente e cria novas categorias. Reencontrando semelhanças na prosa deste outro/novo mundo, reconhecida estratégia na aquisição do conhecimento, como sublinhou Michel Foucault,7 legitima familiaridades e entrelaça tradições, ao mesmo tempo que delineia outras/novas particularidades da natureza humana. Este seu trabalho irá, por isso, pôr em causa a imagem fantástica e onírica das terras orientais veiculada pelos autores da Antiguidade Clássica e Medieval. A terra das mirabilia, como a descreveu o célebre autor da Historia natural, Plínio,8 ou autores medievais atraídos pela expedição de Alexandre, o Magno,9 irá conhecer novos perfis e paisagens. Na verdade, e como afirma Rudolf Wit‑ tkower, a figura de Alexandre, o Magno, teve um amplo e prolongado impacto na imagem do Oriente cultivada na Europa medieval, que não irá desapare‑ cer rapidamente: „One of the most important sources of inspiration during the Middle Ages was the ‘Romance of Alexander’ which the guise of the great king’s adventurous campaigns many of the Indian fables. The original had been written in Greek; in the early Middle Ages translations into every conceivable Language followed, and in the middle of the 10th century it was recast by the archipresbyter Leo of Naples. It is this version, commonly called the Historia de proeliis, which was of the greatest importance for the future spreading of the Romance and on which most of the translations into the vernacular down to the 14th century depend. In addition the letter by Alexander to Aristotle on the Leitch, Mapping Ethnography in Early Modern Germany, p. 14. Michel Foucault, As palavras e a as coisas, Lisboa, ed. 70, 2002. 8 Sobre a imagem da Índia na Antiguidade, veja­‑se, Jacques André e Jean Filliozat, L’ Inde vue de Rome, Textes latins de l’ Antiquité relatifs à l’ Inde, Paris, Belles Lettres, 1986. 9 Veja­‑se Anthony Pagden, Povos e Impérios, Breve História, Grandes, Temas, Lisboa, Círculo dos Lei‑ tores, 2001, pp 1­‑15. 6 7

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Marvels of India had a wide circulation, which was current as a separate work by about 800 A.D., and which was used over and over again until it appeared in print in 1499 and several times throughout the 16th century.”10 A Europa não ia esquecer facilmente a Índia miraculosa das conquistas de Alexandre, pois o fantástico continuava a preencher os sonhos do homem do século XVI. O Alexandre medieval, indubitavelmente associado ao horizonte onírico do Índico11 e das suas gentes figuras semi­‑humanas, semi­‑fantásticas, como o testemunha a abundante iconografia que ilustram os textos medievais, iria ainda determinar a percepção do Oriente. Na verdade, e mesmo após a publicação de obras, como as de Balthasar Springer e Hans Burgkmair, a presença do fantástico sobre o Oriente continua, ao longo do século XVI, presente no imaginário europeu. Contudo, o mapear das novas regiões, intento de vários trabalhos, como os de Hans Burgkmair ou ainda Laurentius Frisius, na reedição da Cartha Marina de Martin Waldseemüller,12 irá repondo e demarcando a novidade visual das regiões orientais. As imagens de Hans Burgkmair são, neste sentido, um exemplo da criação de categorias, símbolo do que Stephanie Leitch define, como um „contribute to the problem of identification“.13 Ao traçar novas taxinomias e representações do mundo oriental, o artista delineia uma nova descrição visual das sociedades do Oriente, sugerindo como a arte pode ser um modelo de visão e de percepção. Pouco a pouco, e com o contributo de obras como a de Hans Burgkmair, caminhar­‑se­‑á para uma representação, agora, mais perto da „vida real“, como o exprimem os autores coevos.

2. A arte gráfica ao serviço do conhecimento: mapear Goa Em 1543, o erudito alemão, Leonard Fuchs (1501­‑1566), afirmava: „Who in his right mind would condemn pictures which can communicate information much more clearly than the words of even the most eloquent men? Those things that are presented to the eyes and depicted on panels or paper become fixed more firmly in the mind than those that are described in bare words“. 14 Rudolf Wittkower, Marvels of the East. A Study in the history of the monsters, in: Journal of the Warburg and Courtauld Institutes, 5, 159­‑197, aqui 179. 11 Jacques Le Goff, O Ocidente medieval e o Oceano Índico: um horizonte onírico, in: Para um novo conceito de Idade Média. Tempo, trabalho e cultura no Ocidente, Lisboa, Presença, 1980, pp. 263­ ‑280, aqui 275. 12 Martin Waldseemüller, Carta Marina Navigatoria Portugallen Navigationes Atque Tocius Cogniti Orsis Terre Marisque, [Strasbourg?], 1516. 13 Leitch, Mapping Ethnography in Early Modern Germany, p. 14. 14 Leonhard Fuchs, De historia stirpium, Basel, 1542, pp. x–xi. Cit. por Pamela H. Smith, Art, Science, and Visual Culture in Early Modern Europe in: FOCUS—ISIS (The History of Science Society), 97, 1 (2006), pp. 83­‑100, aqui, p. 86 http://195.134.75.14/gsdl/collect/histsc/index/assoc/HASH013a. dir/doc.pdf Cf. também Pamela H. Smith & Paula Findlen (eds.), Merchants & Marvels. Commerce, Science, and Art in Early Modern Europe, New York, Routledge, 2002. 10

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E a posição formulada pelo fundador do estudo da botânica na Alemanha15 é partilhada por muitos dos seus contemporâneos, como Otto Brunfels, Andreas Vesalius, Georgius Agricola, entre outros. Todos estes estudiosos comungam da certeza de que a produção e a respectiva divulgação de imagens têm um peso fundamental na construção do saber na época moderna. A seu ver, ima‑ gens, representações não são apenas ilustrações, mas sim esboços de estudos de teor científico. Neste sentido, também a arte, e a gravura em particular, se reconhecem neste esforço de apreensão do mundo. Como vimos no exemplo do trabalho de Hans Burkgmair, a gravura foi um meio de apreender, desenhar e demarcar formas e realidades desconhecidas. Analisando a imprensa europeia de meados do século XV a meados do século XVI, Peter Parshall e David Landau, na sua obra Renaissance Print, 1470­‑1550, escrevem: „Acurate visual representation was more than just a technical accomplishment. It was a highly specialized form of observation... Making ilustrations was a way of checking facts...“ 16 Este „testar de dados” estará, pois, presente em muitos dos exercícios de estudo e análise da natureza. É a mesma atitude que está subjacente à realização de herbários, de estudos anatómicos, na pintura ou na arte gráfica. Na estreita relação entre a aquisição e a representação visual do novo saber, as imagens revelam­‑se como um meio, um veículo de investigação, compreensão e conhe‑ cimento da natureza. Neste sentido, os trabalhos dos gravadores, muitos deles, como vimos reconhecidos artistas, serão igualmente considerados sérios tra‑ balhos de observação e apropriação da realidade, logo ensaios de investigação. No que respeita ao conhecimento do orbe terráqueo, e paralelamente a uma geografia geral, importava cada vez mais realizar, o que Ptolomeu definira, em contraposição à geografia, como corografia, ou seja, uma descrição de regiões ou localidades que, no Renascimento, se irá dedicar à topografia, a uma descri‑ ção das cidades, dos seus planos ou edif ícios particulares. As cidades aparecem, por exemplo, na célebre Weltchronik de Hartmann Schedel, como um marco fundamental no „localizar“ de cada região, que visu‑ aliza caracterizar e apresentar. Daí que, muitas vezes, o registo seja entendido igualmente numa dimensão histórica, ou seja, localizar determinado conheci‑ A obra de Leonard Fuchs – na esteira de Otto Brunfels (1488­‑1534) e de Hieronymus Bock (1498­ ‑1554) – descreve originalmente quatrocentas plantas oriundas da sua terra natal, a que acrescenta, desde já, algumas plantas do Oriente e da América. Com excelentes ilustrações produzidas por bons artistas e gravadores, esta obra tornar­‑se­‑á um compêndio de referência. Como se pode comprovar por uma das ilustrações da obra, os gravadores fazem os desenhos com as plantas à vista, demons‑ trando o espírito de rigor e veracidade com que o trabalho é feito. Esta, aliás, a novidade dos her‑ bários realizados no norte da Europa que, ao usarem exemplares vivos, ao contrário dos do Sul que usavam plantas secas, introduziam, nestes manuais, um cariz mais naturalista na busca do verdadeiro conhecimento. Veja­‑se Marília dos Santos Lopes, A Revelação das Plantas. Garcia da Orta, Carolus Clusius e as espécies asiáticas na Europa, in: RC Revista de Cultura 20, (2006), pp. 11­‑27. 16 Cit. por Smith, Art, Science, and Visual Culture in Early Modern Europe, p. 88. 15

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mento no espaço e no tempo. A obra de Schedel profusamente ilustrada, com muitas gravuras, da autoria de conceituados artistas, como Michael Wolgemut e Wilhelm Pleydenwurff, tornar­‑se­‑á uma referência neste exercício de visua‑ lizar o espaço urbano, pelo que as suas gravuras serão reutilizadas por muitos outros editores e autores que pretendiam ter acesso e partilhar deste saber geo‑ gráfico. Os custos da produção de gravuras não seria alheio a esta reutilização das xilogravuras, mas não seria este apenas o motivo que levaria os editores a usá­‑las. O que estava em causa era sim a produção de um saber que importava registar e, por conseguinte, divulgar. Se hoje as imagens se assemelham mais a reconstruções da realidade, tem de se ter em atenção o cariz emergente do próprio processo de compreensão e representação da realidade. Se aos leitores de hoje poderá surpreender este conceito de representação, o certo é que estes trabalhos, sinais do nascimento de um espírito científico, procuravam dar res‑ posta a uma cada vez maior exigência visual. No seguimento de Hartmann Schedel, outros trabalhos continuaram este intento de mapear novos locais e territórios do mundo e do Oriente em par‑ ticular.17 Não podemos deixar de mencionar o indelével contributo legado pelos viajantes que, com as suas observações e anotações, foram esquissando e mapeando os locais por onde passaram. Importava, pois, cartografar igualmente cidades orientais. Uma das mais antigas representações de Calecut – a primeira será provavelmente a que figura no frontispício da edição espanhola de 1503 do livro de Marco Polo – encontra­‑se na edição da Cartha Marina de Laurentius Frisius. Fig. 2. Fries, Lorenz / Grü‑ ninger, Johannes: Uslegung der mercarthen oder Cartha Marina, Darin man sehen mag wo einer in der wellt sey und wo ein yetlich Landt, Wasser und Stadt gelegen ist; Das alles in dem büchlin zu finden, Straßburg, 1527; online: http://daten.digitale­ ‑sammlungen.de/~db/0001/ bsb00012489/images/index. html?seite=30&fip=193.174.98.30

Num ambiente exótico que se esperava encontrar em terras orientais, vimos, em primeiro plano, vários tipos de embarcações locais, e entre elas, uma nau portuguesa. Ao fundo, um aglomerado confuso de habitações, onde Alexandra Curvelo Campos, As representações do oceano Índico na cartografia portuguesa do século XVI, in: Culturas do Índico, ed. CNCDP, Lisboa: CNCDP, 1998, pp. 35­‑43.

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se deslumbram muralhas altas de palácios cujos interiores serão povoados de sumptuosos salões plenos de luxo e ostentação. O mito do Oriente mantinha­ ‑se vivo. Contudo, não faltam elementos como as palmeiras e o elefante, des‑ critos logo na primeira viagem à Índia. Não será ao acaso a escolha desta cidade do Malabar, o primeiro porto marítimo de onde chegaram informações do Oriente e que, por isso, se tornou símbolo do cosmopolitismo advindo das viagens e do mundo tal como se reve‑ lava nos inícios do século XVI, como já tivemos oportunidade de demonstrar.18 Atente­‑se que são os espaços urbanos, símbolos da emergência do „Estado moderno”,19 que importa, em primeira instância, cartografar. Assim, não é de surpreender que, entre as muitas cidades europeias, surja mais uma vez uma imagem de Calecut na célebre Civitates orbis terrarum de Georg Braun e Frans Hogenberg, onde é apresentada como uma das mais nobres cidades do Orien‑ te.20 Aliás, será nesta obra, reconhecida como o primeiro atlas das cidades, que irá ser publicada a primeira representação de Goa. Trata­‑se de uma vista da urbe sob o expressivo título:”Goa fortissima India urbs in Christianorum potes‑ tatem anno salutis 1509 deuenit”. Nos finais do século XVI, virá, por fim, a lume uma planta da cidade de Goa no Itinerário do holandês Jan Hugyhen van Linschoten (1596). A imagem visual do importante centro comercial e administrativo português muito ficará a dever a esta planta de Jan Huyghen van Linschoten. Um dos grandes objectivos do trabalho deste viajante e secretário do Arce‑ bispo de Goa, é descrever e apresentar, usando palavras suas, „tudo retratado como na vida real“ ou coisas „representadas de acordo com a vida real“.21 Este anseio de deixar um rigoroso e preciso esboço da cidade de Goa e arredores fica bem explícito não só no texto, como nas imagens que assim inauguram uma nova representação deste espaço oriental. Na continuidade das Civitates Orbis Terrarum, onde Georg Braun e Frans Hogenberg apresentaram mais de quinhentas vistas de cidades, editadas em diferentes estilos de representação, mormente a planta, a vista, e o „byrd eye view“ ou perspectiva cavaleira, que consiste na combinação dos dois estilos, a obra de Jan Linschoten irá editar, em 1595, uma planta da ilha e cidade e Veja­‑se Marília dos Santos Lopes, Tradition und Imagination: ‘Kalikutische Leut’ im Kontext alt­ ‑neuer Weltbeschreibungen des 16. Jahrhunderts, in: Asia Maritima. Images et réalité. Bilder und Wirklichkeit. 1200­‑1800, ed. Denys Lombard / Roderich Ptak, Wiesbaden, Harrassowitz, 1994, pp. 13­‑26. 19 Veja­‑se Catarina Madeira Santos, Goa é a chave de toda a Índia, Perfil político da capital do Estado da Índia (1505­‑1570), Lisboa, Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Por‑ tugueses, 1999, bem como Gérard Sabatier e Rita Costa Gomes (Coord.), Lugares de Poder, Europa séculos XV a XX, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 1998. 20 Georg Braun e Frans Hogenberg, Civitates Orbis Terrarum, Cologne, 1972. Veja­‑se, Braun/Hogen‑ berg, Cities of the World, ed. Stephan Füssel, Köln, Taschen, 2009. 21 Jan Huygen van Linschoten, Itinerário, Viagem ou Navegação para as Índias Orientais ou Portugue‑ sas, Ed. Arie Pos e Rui Manuel Loureiro, Lisboa, C.N.C.D.P., 1997, pp. 140­‑160. 18

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Fig. 3

Fig. 4

Fig. 5 Fig. 3, 4 e 5. Reproduzidas em Jan Huygen van Linschoten, Itinerário, Viagem ou Navegação para as Índias Orientais ou Portuguesas, Ed. Arie Pos e Rui Manuel Loureiro, Lisboa, C.N.C.D.P., 1997.

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Goa, em que pela primeira vez se representará o espaço geográfico da capital da Índia portuguesa. Num minucioso e precioso exercício de criar a planta topográfica, onde se desenham os principais edif ícios, as ruas, praças, hortas e quintais, esta publicação recria o espaço em que se transformou esta destacada localidade, reservando­‑lhe um lugar privilegiado no rol dos territórios orientais. Goa, a cabeça de império, adquire a sua certidão de identidade. A partir de agora está traçado o seu perfil e este moldará a sua marca identitária, como teremos oportunidade de demonstrar. Pensado como modelo urbanístico de referência para as cidades e núcleos urbanos da Índia, como o demonstra uma carta régia de D. João III, datada de 1542, em que se afirma „[...] desejando eu que a minha cidade de Goa seja regida e governada em tal maneira que della saya exemplo para todas as outras minhas cidades e fortalezas das ditas partes... asy e da maneira que se faz em esta cidade de Lisboa [...]”,22 o projecto de Goa adquire uma marca­‑padrão decalcada na sua planta. Concebida e implementada durante a primeira metade do séc. XVI, a estru‑ tura urbana de Goa reflecte, como destacou Helder Carita, uma tradição urba‑ nística aferida às grandes reformas manuelinas.23 Tal como em Lisboa, também aqui podemos visualizar, por exemplo, a Ribeira e o Palácio, o Terreiro do Paço e a Misericórdia. A complexa máquina burocrática, à imagem da de Lisboa, conquista o espaço e imprime­‑lhe na silhueta a marca de centro administra‑ tivo, económico, militar e religioso. Num recorte que muito se assemelha às cidades portuguesas, a capital do Estado da Índia surge junto à barra, símbolo da sua grandeza e singularidade, como os viajantes e cronistas a descreveram. A urbe eleita por Afonso de Albu‑ querque, verá a simbologia da origem e expansão inscrita, como teremos opor‑ tunidade de ver, na sua planta. A emoldurar os espaços da centralidade impe‑ rial, deparamos com os tão referenciados solos adjacentes, não tivessem sido eles um dos motivos para a escolha de Goa como „chave de toda a Índia”.24 As fontes seiscentistas25 descrevem­‑na de modo lisonjeiro e apologético, dizendo tratar­‑se de uma terra formosa e fértil, onde existem muitas hortas com sin‑ gulares frutas, águas sadias, abundância de vinho, arroz, legumes, muito gado, Cit por Helder Carita, O Índico: redes urbanas, instituições e arquitectura, in: Os Portugueses e o Oriente. História, itinerários, representações, Lisboa, Dom Quixote, 2006, pp. 113­‑128, aqui, p. 120. Cf. também Helder Carita, Arquitectura Civil Indo­‑Portuguesa e a Paisagem Urbana de Goa, in: Os Espaços de um Império, Estudos, Lisboa, CNCDP, 1999, pp. 77­‑90. 23 Carita, O Índico. 24 Madeira Santos, Goa é a chave de toda a Índia. 25 Cf. Ana Paula Aavelar, Faces de Goa: estratégicas de representação na cronística de Quinhentos, in: Oriente. Revista da Fundação Oriente 4, pp. 22­‑31 e Diogo Ramada Curto, Representações de Goa: Descrições e relatos de viagem, in: Histórias de Goa, coord. Rosa Maria Perez, Lisboa, Museu Nacional de Etnologia, pp. 45­‑86. 22

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bem como outros mantimentos da terra e do mar; riqueza que, no dizer de Fernão Lopes de Castanheda, proporcionava aos portugueses muitas receitas.26 Em 1612, junto à planta de Goa reproduzida no Livro de plantaforma das for‑ talezas da Índia, podemos ler o seguinte: „A terra é fresca e produz todo o género de mantimentos e frutas, com muito género de gados e é regada de boas águas”.27 O Itinerário de Jan Linschoten não tece, todavia, apenas este incontornável contributo sobre o pujante modelo urbanístico e os primórdios de uma carto‑ grafia do poder territorial. Com efeito, este Itinerário irá ainda, como o próprio nome indica, descrever alguns quadros representativos da vida e das gentes de Goa, como se pode testemunhar na bem conhecida gravura do leilão de Goa. Conhecedor da realidade oriental, Linschoten apresenta visualmente cenas da vida quotidiana de Goa: „Leilão que se faz cada dia pela manhã na Rua Direita na Cidade de Goa”. Neste espaço localizado e definido da cidade encontramos diversos grupos sociais e étnicos que protagonizavam o dia­‑a­‑dia da cidade de Goa, uma cidade „com casas e ruas à maneira portuguesa“.28 Como já o título informa, este é um leilão que se realiza todos os dias, entre as sete e as nove horas da manhã. Trata­‑se assim de um ajuntamento, que Jan Huyghen van Linschoten compara à bolsa de Amsterdão, dado que aqui passam gentes de todas as nações e das regiões circunvizinhas. Só numa coisa é capaz de se diferenciar, pois aqui tanto se reúnem fidalgos como mercadores. Ao fundo, vemos os edif ícios da prin‑ cipal artéria de Goa, com as casas de telhado „de tesoura” e as varandas com tabelas de madeira, caracteristicamente luso­‑indianas e, em primeiro plano, cenas do mundo mercantil: Pregoeiros apregoam mercadorias, vendedores de mercadorias e produtos indianos, desde jóias, cavalos, escravos, especiarias numa „maravilha de contemplar“.29 Quando alguém morre os bens são ali ven‑ didos e, no mundo de negócios, não poderiam faltar os xarrafos, ou seja os cambistas que, como refere, se encontram em todas as esquinas das ruas, e que serão, no seu dizer, indianos cristãos milagrosamente correctos e certeiros nas suas contas. Enquanto uns vendem ou compram, outros passeiam­‑se como as portuguesas transportadas nos famosos palaquins. Mas para além desta imagem, talvez a mais conhecida gravura da sua obra, encontram­‑se ainda outros espaços e outras gentes de Goa, como é o caso da gravura dedicada aos camponeses ou agricultores, os chamados canaris. Em contraposição à anterior, estamos neste caso perante um cenário rural – aliás, Fernão Lopes de Castanheda, História do Descobrimento e conquista da India, Lisboa, 1551­‑1561, ed. M. Lopes de Almeida, Porto, Lello & Irmão, 1979, p. 11. 27 José Manuel Garcia, Cidades e fortalezas do Estado da Índia, séc. XVI e XVII, Lisboa, QuidNovi, 2009, p. 118. 28 Linschoten, Itinerário, p. 146. 29 Linschoten, Itinerário, p. 146. 26

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muito apreciados pelos pintores e gravadores holandeses. Ao centro, e em primeiro plano, vemos uma mulher nua. A seu lado, uma outra mulher derrama água sobre a primeira. Olhando para este quadro, reconhecemos a jovem, cujos elementos iconográficos nos fazem lembrar a Venus de Sandro Botticelli Tal como em O nascimento de Venus (Fig. 6), está representada em primeiro plano, de olhar lon‑ Fig. 6. Sandro Botticelli – La nascita di Venere gínquo e casto, enquanto as demais Google Art Project.jpg. se situam num plano secundário, o que lhes garante o papel de figurantes na cena retratada. O gravador quis ressaltar esta figura central, em relação àquelas que a circundavam, e não a unidade do conjunto e, por isso, criou várias cenas de representação, a fim de que esse efeito fosse alcançado. Daí que se sirva de diferentes planos de repre‑ sentação – bem ao gosto da narrativa gráfica coeva – onde narra a vida das aldeias indianas, mormente dos canarins, lavradores que tratam das palmeiras da índia, nos seus diferentes trabalhos e tarefas, para garantir maior coerência temática à representação cénica da obra. Sobre o significado destas cenas, o texto do Itinerário relata: „São muito limpos de corpo, pois lavam diariamente o corpo inteiro e sempre que evacuam ou vertem as suas águas, o que fazem sempre de cócoras, tanto os homens como mulheres, tal como os mouros e maometanos. Lavam­‑se sempre com a mão esquerda, porque comem com a mão direita, não utilizando colher”30, pelo que podemos reconhecer nos gestos e comportamentos os usos e costumes descritos por Linschoten. Além disso, o significado dado à água, na simbologia de pureza, alude, por certo, ao baptismo, o que a composição reforça, recordando representações cristãs do baptismo de Cristo. Por certo, e em analogia a Vénus,31 também aqui se pretende anunciar um nascimento – humano e espiritual – numa natureza exuberante e promissora, similar à memória dos jardins edénicos. Na esteira de Sandro Botticeli,32 a imagem recria uma concepção renascentista de humani‑ tas, projectando­‑a para outras paisagens e ambiências. Linschoten, Itinerário, p. 164. Note­‑se que Linschoten menciona Venus, quando constata a falta de freiras em Goa, afirmando que „ninguém consegue convencer as mulheres a deixarem­‑se emparedar e a renunciar a Venus, com a qual preferem arriscar e perder a vida, pois fazem poucos esforços para expiar e terminar as suas volúpias“; Linschoten, Itinerário, p.146. 32 Erwin Panofsky, O Significado das Artes Visuais, Lisboa, Presença, 1999, cap. 1. 30 31

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Estes exemplos testemunham, por conseguinte, como as gravuras da obra de Jan Huyghen van Linschoten constituem monumentos ímpares da construção espacial e iconográfica de Goa. Neste trabalho de recolha e categorização geográ‑ fica e visual, Goa torna­‑se uma referência fundamental nos circuitos de produção de conhecimento, surgindo como um espaço físico, onde a presença humana determinou o seu fluir e, por conseguinte, um importante espaço de poder.

3. Goa nas redes de conhecimento O valor, e também, por certo, o gosto, que a cartografia do globo terrestre tra‑ duzia para os coevos está bem patente, por exemplo, na produção de mapas que, como podemos observar na obra pictórica do pintor holandês, Jan van Vemeer, se tornam interessante e significadamente parte integrante do quotidiano euro‑ peu. Grande parte dos quadros do pintor, que estariam pendurados nas salas ou quartos dos seus possuido‑ res, apresentam um mapa, símbolo da posse, do domínio, mas também do conhecimento alcançado nos dois últimos séculos.33 No seu Alegoria da Pintura (1666­‑1667) constata­‑se a presença de um enorme mapa, tecendo, por certo, uma estreita relação entre estas duas artes. Mas muitos outros exemplos se seguem, teste‑ munhando e dando conta da obra geográfica do homem, cidadão do mundo. Introduzindo mapas, Fig. 7. Jan Vermeer van Delft 011b.jpg; Wiki‑ ou seja, o retrato e descrição do media Commons. mundo, no dia­‑a­‑dia do cidadão europeu, Jan van Vemeer dá expressão e notoriedade ao processo que teve lugar de reconhecimento e apropriação do orbe terráqueo. Já o cartógrafo Willem Janszoon Blaeu (1571­‑1638) afirmava que construía os seus mapas para que aqueles que ficavam em casa pudessem viajar.34 E mui‑ tos são os coevos que partilham da sua opinião, como podemos comprovar em diversos prefácios de muitas e variadas descrições de viagens publicadas na

Svetlana Alpers, The Mapping Impulse in Dutch Art, in: S.A., The Art of Describing, Dutch Art in the Seventeenth Century, Chicago, UP, 1981, pp. 119­‑168. 34 Cit. por Alpers, The Mapping Impulse in Dutch Art, p. 159. 33

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Europa dos séculos XVI e XVII. 35 Os viajantes eram, pois, relatores e repórte‑ res das novas realidades, a quem se conferia o poder de construção das ima‑ gens. As suas obras tornaram­‑se verdadeiras fontes de conhecimento, lidas e apreciadas por variados leitores, muitos deles igualmente estudiosos e aprecia‑ dores de histórias de outras terras e suas gentes. O Itinerário de Jan Huyghen van Linschoten vai tornar­‑se uma destas obras de referência e as suas gravuras, nomeadamente a planta de Goa, será reproduzida por muitos outros autores. Na verdade, a obra de Jan Huyghen van Linschoten, com a desenvolvida toponímia que apresenta de Goa e seus arredores revelar­‑se­‑á um precioso corpo de informações sobre a grande urbe, servindo como ilustração para mui‑ tas outras obras publicadas durante os séculos XVII e XVIII. Assim, vamos encontrá­‑la repoduzida na recolha de cidades efectuada por Matthäus Merian, no ano de 1638. O autor de Neuwe Archontologia cosmica, das ist, Beschreibung aller Kaÿserthumben, Königreichen und Republicken der gantzen Welt36 é um reputado gravador e genro de Johann Theodor von Bry, filho do célebre editor de colectâneas de viagens, Theodor von Bry, com quem trabalhou e, por conseguinte, um grande especialista e conhecedor da arte grá‑ fica e dos usos e costumes de outras localidades. No ano de 1672, o viajante Philipp Baldeus irá reproduzir uma gravura formada da planta de Jan Huyghen van Linschoten, encimada por uma pers‑ pectiva da cidade – muito semelhante à de Georg Braun – em escala igual à da

Fig. 8. Philipp Baldaeus, Wahrhaftige Aus‑ führliche Beschrei‑ bung der Berühmten Ost­‑Indischen Kusten Malabar und Coro‑ mandel, als auch der Insel Zeylon samt dero angräntzenden und untergehörigen Reichen..., Amster‑ dam, 1672; Staatsbi‑ bliothek Bamberg. Marília dos Santos Lopes, Da Descoberta ao Saber, Os Conhecimentos sobre África na Europa dos séculos XVI e XVII, Viseu, passagem, 2002. 36 Matthäus Merian, Neuwe Archontologia cosmica, das ist, Beschreibung aller Kaÿserthumben, Königreichen und Republicken der gantzen Welt, Frankfurt/M., 1638. Para as referências seguintes cf. Luís Silveira, Ico‑ nografia das Cidades Portuguesas do Ultramar, 3º vol., Lisboa, Ministério do Ultramar, s.d. 35

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planta, fazendo dela desta composição dos dois trabalhos, planta e vista, uma belíssima gravura de Goa.37 O geógrafo e militar francês Alain Manesson Mallet, no ano de 1683, utiliza­ ‑la­‑á na sua Description de l’ Univers..., onde naturalmente devem aparecer „Les Plans les Profils des principales Villes des autres lieux plus considerables de la Terre”. Entre as principais cidades, Goa ganha assim lugar de destaque.38 Pieter van Aa, um reconhecido editor holandês de mapas, atlas e colectâ‑ neas de viagens dos inícios do século XVIII edita­‑a no ano de 1720,39 enquanto Jacques Nicolas Bellin, cartógrafo, engenheiro hidrógrafo da marinha francesa faz uso dela trinta nos mais tarde, ou seja, no ano de 1750,40 e ainda, em 1764, podemos reconhecê­‑la numa publicação de Jan van Schley, o gravador da edi‑ ção holandesa da Histoire Géneral des Voyages de A. F. Prévost que também recorrerá ao modelo de Linschoten.41 Os exemplos das xilografias de Hans Burgkmair, bem como a planta e outras gravuras sobre Goa demonstram o longo e produtivo trabalho que artistas e estudiosos, a que poderíamos chamar pré­‑cientistas, dos séculos XVI e XVII vinham a fazer: de olhar atento e curioso a representar a natureza. E no âmbito deste sério exercício, coube uma especial atenção à cartografia, nomeadamente à feitura de mapas e de plantas, como a planta de Goa. Nas mãos da ciência e da arte, ambas fazedores de imagem e produtoras de conhecimento, nasceu uma nova representação de Goa, reflexo de mais saberes e mais experiências. E a atestar a importância deste saber cartografado, podemos testemunhar uma interessada e viva rede de conhecimentos a promover a sua difusão e divulgação. Nos diferentes centros produtores de saber, mormente do conheci‑ mento geográfico da Europa, como Holanda, França, Alemanha, a representa‑ ção espacial da capital do estado da Índia surge entre as urbes do mundo, como reflexo de uma importante aquisição científico­‑cultural. Nesta sua presença assídua e fundamental no registo e inventário geográ‑ fico e iconográfico, Goa destaca­‑se como uma das mais representadas urbes em terras orientais, inscrevendo­‑se, no mapa do mundo, como um dos lugares de afirmação político­‑territorial da modernidade.

Philipp Baldaeus, Wahrhaftige Ausführliche Beschreibung der Berühmten Ost­‑Indischen Kusten Malabar und Coromandel, als auch der Insel Zeylon samt dero angräntzenden und untergehörigen Reichen..., Amsterdam, 1672. Cf. Marília dos Santos Lopes, Coisas maravilhosas e até agora nunca vistas. Para uma iconografia dos Descobrimentos, Lisboa, Quetzal, 1998, p. 180­‑181. 38 Alain Manesson Mallet, Description de L’Univers, Paris, 1683, 39 Pieter van Aa, Goa Indiæ Orientalis Metropolis, Leiden, 1720. 40 Jacques Nicolas Bellin, Planta de Goa, Parism 1750. 41 Jan van Schley, Histoire Géneral des Voyages, Amsterdam, 1764. 37

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