Museus e os desafios da democracia

August 29, 2017 | Autor: P. Funari | Categoria: Museum Studies, Cultural Heritage, Democracy, Patrimonio Cultural, Museologia
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FUNARI, P. P. A. . Os museus e os desafios da democracia 19/05/2012. Revista Museu, v. 2012, p. 1-3, 2012. Museus em um Mundo em mudanças: Novas Desafios, Novas Inspirações.

Os museus e os desafios da democracia Pedro Paulo A. Funari1

Quem pensa em democracia, quando se fala em museu? Quem se lembra da democracia ao entrar em um museu? Isso já nos diz muito sobre a imagem que fazemos dos museus e das associações que se nos ocorrem quando a palavra museu é ouvida, ou quando adentramos num deles. Para alguns, eles são apenas lugar de resquícios antigos, locais de recolhimento de tudo que já não serve, de animais antes vivos e agora mortos, ou mesmo depósitos de obras belas, mas que nem sempre entendemos ou apreciamos senão de maneira parcial ou obrigada: como não entender uma obra tão aclamada? Muitos museus reforçam essas percepções, numa estética do estranhamento e da alienação. Aisthesis, percepção, estranha, essa, da distância. Quem já não entrou em exposições com letreiros mínimos, em meio a imagens e inscrições latinas, gregas ou aramaicas sem qualquer tradução, como se devêssemos saber o que se passou na cabeça do curador? Quantas vezes não freqüentamos museus históricos voltados para a mistificação de identidades excludentes, como se devêssemos ser bandeirantes ou imperialistas devotados?

Mas, nem tudo está perdido, ao contrário. Museus já não são só isso, há muito tempo. A participação das pessoas na criação das exposições tem permitido ousar nas representações, que não mais precisam servir apenas a reforçar a hierarquia e a homogeneidade. Os museus, antes arma da exclusão social e da opressão, passaram a explorar seu potencial libertário. Mostraram não apenas o que prevaleceu, como aquilo que foi suprimido para era prenhe de possibilidades, tal a estátua de Giordano Bruno na praça Campo de Fiori, em Roma: no lugar onde foi imolado o pensador, ergueu-se um monumento à liberdade. Algo semelhante se fez nas antigas masmorras da última ditadura (1964-1985), em São Paulo, transformado em Memorial da Resistência. Claro, não se trata, apenas, de retratar os momentos mais sombrios e opressores do gênero humano, como se devêssemos sempre lembrar só do sofrimento. Não! A liberdade consiste em retratar os êxitos da alma humana em sua imensa projeção e os museus também o podem fazer de forma única, pela sua experimentação particular do mundo material. Os museus têm mostrado os êxitos das mulheres, algo tanto mais relevante, quanto elas estiveram alijadas, em grande parte, da História escrita da humanidade, apanágio de varões. Também a produção dos humildes e dos excluídos adentrou os museus, assim como as preocupações das pessoas comuns passaram a fazer parte das próprias concepções das exposições. A valorização da alteridade, do respeito e mesmo admiração da diferença, tudo isso passou ao centro da preocupação de muitos que se ocupam dos museus.

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Professor Titular do Departamento de História e Coordenador do Centro de Estudos Avançados da Unicamp.

Afinal, de quê democracia falamos? Ou, ainda, o que seria democrático no museu? Em primeiro lugar, a perspectiva de conhecimento compartilhado. Em seguida, o repúdio à opressão. Por fim, mas não menos importante, o respeito ao outro.

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