Não conhecemos o Brasil literário
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Não conhecemos o Brasil literário
Cunha e Silva Filho
Num longo e amadurecido artigo no Prosa & Verso do jornal O
Globo (11/02/2012) sobre a realidade da crítica literária brasileira
contemporânea, de título "Desdramatizando a crise da crítica", o
professor da UERJ, João Cezar de Castro Rocha, entre outras ponderações
acerca da importante questão entre críticos e autores, crise da
critica e crise da literatura, nos chama a atenção para a necessidade de
mudanças de estratégias e de procedimentos no terreno da critica
literária a fim de darmos conta da diversidade e da quantidade também
da produção literária contemporânea. Já no seu tempo, o crítico Álvaro
Lins (1912-1970) até via com bons olhos quando se falava em crise da
literatura, visto que para ele a crise é um sintoma de algo que está
vivo.
Segundo Castro Rocha, muito mais do que a produção literária
do passado, a da contemporaneidade está a exigir toda a atenção dos
críticos, sobretudo porque esses numerosos autores, entre ótimos, bons
, médios e ruins, precisam de ser conhecidos, divulgados e analisados
com um aparato teórico-crítico que esteja sintonizado com a nova
realidade das novas mídias eletrônicas advindas dos avanços da internet
e do surgimento de obras de leitura eletrônica, os chamados e-books, da
influência de blogs literários, da pesquisa eletronicamente globalizada
e dos novos recursos tecnológicos da mídia jornalística, dos confusos
e indeterminados tempos pós-modernos, ou para outros estudiosos de
literatura, produção ficcional e poética "pós-pós- moderna," rótulo
resultante de um trabalho de pesquisa do Departamento de Letras da
UFRJ.
Sabemos que as histórias literária de que dispomos se encontram
limitadas a fases já conhecidas da produção literária brasileira. Seus
autores, seja individualmente , seja em trabalhos coletivos, ainda
assim não abarcam de forma mais imediata o que se vem produzindo nos
grandes centros culturais do pais e no interior do país, onde a produção
intelectual se mostra pujante, com autores de talento e dignos de também
serem conhecidos por outros leitores do Brasil.
Dadas as nossas dimensões continentais, o Brasil literário,
considerando-se a produção cultural dos estados separadamente, é um
desconhecido e – o que é de se lamentar -, ainda cheio de preconceitos
entre os autores de outras estados da Federação. Há opiniões tão
grosseiras e carentes de conhecimento e de atualização com respeito a
outras regiões do país que nos deixam perplexos vindo elas de parte
do próprio meio acadêmico universitário.Revelar noções preconcebidas sobre
escritores de outras regiões brasileiras me parece revelar da parte de
quem enuncia um contrassenso desses um tremendo desserviço à cultura
brasileira. É postura inadequada, ignorante e provinciana de quem as
enuncia.Até os desconhecidos, ainda que sem talento, merecem o nosso
respeito ético-profissional.
O professor da UFRJ, crítico e historiador Afrânio Coutinho (1911-
2000) quando projetou organizar a sua monumental obra coletiva A
literatura no Brasil (São Paulo: Global, 2003. 7 v.) , mostrara, no seu
tempo, largueza de visão do que fosse uma história literária mais
abrangente de um país. Hoje, mais do que nunca, vivemos esse impasse,
o de termos que escrever, utilizado-se de recurso eletrônicos de ponta,
ou, nas palavras de Castro Rocha, "... as possibilidades criadas pela
tecnologia digital", uma história da literatura brasileira
contemporânea o mais completa possível, recorrendo à mesma ideia de
visão progressista de Afrânio Coutinho, ele próprio um inovador dos
estudos literários entre nós nos meios universitários. Seria, no caso, uma
história literária que, por ser realizada eletronicamente, poderia
ser, periodicamente, atualizada como já aconteceu com a Enciclopédia
Britânica, que enviava, não sei se ainda o faz, de tempo em tempo, conforme
as necessidades e os progressos e inovações do conhecimento, matéria
atualizadora daquela notável obra para seus usuários.
Naturalmente, no caso de nossa história literária contemporânea,
seria um trabalho de altíssima envergadura intelectual, com um corpo de
organizadores reunindo gente de reconhecido saber na área e com
colaboradores escolhido com o principal critério: conhecimento do
assunto e competência teórica e prática.
Um obra dessa magnitude seria um ponto de partida para
mobilizarmos competentes scholars da literatura brasileira nos diversos
estados e selecionados sem qualquer coloração ideológica ou de
natureza culturalmente tendenciosa, sem ranços, pois, de patrulhamentos,
muito ainda comum em vários estados brasileiros, sobretudo oriundos
dos meios universitários.
No campo da crítica literária, da teoria, e da produção não pode
haver mais estrelismos, comportamentos antidemocráticos de
sobreposição de postura acadêmica sobre críticos teóricos e autores
dos diversos gêneros da literatura e de outras formas de criação
artística, tanto dos grandes centros quanto das capitais e do interior do
país..
Uma passagem do mencionado professor da UERJ sintetiza bem a
condição da crítica e da produção literária brasileira, além de abrir
um caminho de mudanças objetivas e desejáveis para o clima de
"obituário" e de "coveiros" que, de tempos em tempos, discutem a
atividade crítica no país e , muitas vezes, de forma não-construtiva e
desalentadora: "A reinvenção da crítica exige uma nova perspectiva,
capaz de descobrir a potência da circunstância que nos cabe transformar,
em lugar de insistir numa melancolia feita sob medida para o papel
anacrônico do intelectual palmatória do mundo.No reduzido parágrafo
seguinte, conclui Castro Rocha: "É hora de abandonar essa máscara".
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