Nepotismo em Agentes Políticos.

September 20, 2017 | Autor: M. Trindade Paulo | Categoria: Direito Eleitoral
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NOHARA, Irene Patrícia. Direito administrativo, 3 ed. São Paulo: Atlas
Conselho Nacional de Justiça, Resolução n. 07, de 18 de outubro de 2005.
STF, ADC n. 12, Pleno, rel. Min. Carlos Britto, julgado em 20 de agosto de 2008 e publicado no DJE dia 18 dez. 2009.
À título exemplificativo: o Estatuto dos Servidores da União (Lei no 8.112/90), cujo art. 117, VIII, veda ao servidor "manter sob sua chefia imediata, em cargo ou função de confiança, cônjuge, companheiro ou parente até o segundo grau civil"; art. 6. da Lei no 11.416/2006, que regula as carreiras dos servidores do Poder Judiciário da União etc.
Brasil, STF, ADC n. 12, 2006, Petição inicial, p. 13.
STF, RE n. 579.951, 2008, Pleno, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 20 de agosto de 2008 e publicado dia 24 out. 2008.
CRFB, Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei.
ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais da administração pública. Belo Horizonte: Del Rey, 1994. p. 213-214.
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional. Coimbra: Almedina, 1992. p. 352.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 25 ed. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 943.
O exercício de funções de confiança a servidores é restrito a servidores de carreira, nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, limitando a nomeação de pessoas que não integrem o quadro efetivo, devendo as atribuições de tais funções e cargos destinar-se apenas à chefia, direção e assessoramento.
Trecho do voto do Min. Joaquim Barbosa na ADC n. 12 – MC/DF
HESSE, Konrad. A força normativa da constituição. Tradução de Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sergio Antônio Fabris Editor, 1991, p. 14-15.
MEDAUR, Odete. Direito administrativo moderno. 4 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 152.
BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 181-198.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 26 ed. São Paulo: Atlas, 2013. p. 590.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 26 ed. São Paulo: Atlas, 2013. p. 590.
Eis o acórdão e a ementa do referido julgado, que não me deixam mentir:

ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. VEDAÇÃO NEPOTISMO. NECESSIDADE DE LEI FORMAL. INEXIGIBILIDADE. PROIBIÇÃO QUE DECORRE DO ART. 37, CAPUT, DA CF. RE PROVIDO EM PARTE. I - Embora restrita ao âmbito do Judiciário, a Resolução 7/2005 do Conselho Nacional da Justiça, a prática do nepotismo nos demais Poderes é ilícita. II - A vedação do nepotismo não exige a edição de lei formal para coibir a prática. III - Proibição que decorre diretamente dos princípios contidos no art. 37, caput, da Constituição Federal. IV - Precedentes. V - RE conhecido e parcialmente provido para anular a nomeação do servidor, aparentado com agente político, ocupante, de cargo em comissão. (RE 579951, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 20/08/2008, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-202 DIVULG 23-10-2008 PUBLIC 24-10-2008 EMENT VOL-02338-10 PP-01876)

"O Tribunal, por unanimidade, conheceu e deu parcial provimento ao recurso extraordinário, nos termos do voto do Relator. Votou o Presidente, Ministro Gilmar Mendes. Ausentes, justificadamente, a Senhora Ministra Ellen Gracie e o Senhor Ministro Joaquim Barbosa. Plenário, 20.08.2008." (grifou-se)
PIETRO, Maria Sylvia Zanella di. Discricionariedade administrativa constituição de 1988, p. 186.
PIETRO, Maria Sylvia Zanella di. Discricionariedade administrativa constituição de 1988, p. 178.
Citamos, a título de ilustração, a Rcl 15.040 MC/SP, na qual o Reclamante, Prefeito de Salto de Pirapora, alterou o quadro do funcionalismo e trocou a nomenclatura de Diretorias para Secretarias, justamente nos cargos para os quais nomeou as filhas, para concluir que seriam equiparáveis aos Secretários Municipais e, assim, incluídas dentre os chamados agentes políticos. O Min. Rel. Teori Zavascki indeferiu a liminar (Rcl 15.040 MC/SP, DJe 17/12/2012).

PIETRO, Maria Sylvia Zanella di. Discricionariedade administrativa constituição de 1988, p. 176.
GARCIA, Emerson. O nepotismo. Jus Navigandi, Teresina, ano 8 , no 72, 13 set. Disponível em: . Acesso em 2 fev.2014.
Impõe-se a observância à "compatibilidade do grau de escolaridade do cargo de origem, a qualificação profissional do servidor e a complexidade inerente ao cargo em comissão a ser exercido" para os servidores de carreira excepcionados da norma de vedação (ar. 2o, §1o, da Resolução CNJ 7/2005).
Lei n. 8.666/93, Art. 24 É dispensável a licitação: (...) X - para a compra ou locação de imóvel destinado ao atendimento das finalidades precípuas da administração, cujas necessidades de instalação e localização condicionem a sua escolha, desde que o preço seja compatível com o valor de mercado, segundo avaliação prévia;
Lei n. 8.666/93, Art. 9. (…)§ 3o Considera-se participação indireta, para fins do disposto neste artigo, a existência de qualquer vínculo de natureza técnica, comercial, econômica, financeira ou trabalhista entre o autor do projeto, pessoa física ou jurídica, e o licitante ou responsável pelos serviços, fornecimentos e obras, incluindo-se os fornecimentos de bens e serviços a estes necessários; § 4o O disposto no parágrafo anterior aplica-se aos membros da comissão de licitação.
Art. 4º São infrações político-administrativas dos Prefeitos Municipais sujeitas ao julgamento pela Câmara dos Vereadores e sancionadas com a cassação do mandato:
(...)
VII - Praticar, contra expressa disposição de lei, ato de sua competência ou omitir-se na sua prática;
(...)
X - Proceder de modo incompatível com a dignidade e o decoro do cargo.
Importante destacar que, conquanto a norma municipal se refira a "crimes de responsabilidade", para efeito de cassação de mandado de prefeito pela Câmara Legislativa, o termo correto para classificar as condutas a atrair tal competência é infrações político-administrativas, haja vista a disposição do Decreto-Lei de n. 201/1967. Aliás, o Supremo Tribunal Federal deixou isto claro, conforme o seguinte julgado: PENAL. PROCESSUAL PENAL. PREFEITO: CRIME DE RESPONSABILIDADE. D.L. 201, de 1967, artigo 1.: CRIMES COMUNS. I. - Os crimes denominados de responsabilidade, tipificados no art. 1. do D.L. 201, de 1967, são crimes comuns, que deverao ser julgados pelo Poder Judiciario, independentemente do pronunciamento da Câmara dos Vereadores (art. 1.), são de ação pública e punidos com pena de reclusão e de detenção (art. 1., par. 1.) e o processo e o comum, do C.P.P., com pequenas modificações (art.2.). No art. 4., o D.L. 201, de 1967, cuida das infrações político-administrativas dos prefeitos, sujeitos ao julgamento pela Câmara dos Vereadores e sancionadas com a cassação do mandato. Essas infrações e que podem, na tradição do direito brasileiro, ser denominadas de crimes de responsabilidade. II. - A ação penal contra prefeito municipal, por crime tipificado no art. 1. do D.L. 201, de 1967, pode ser instaurada mesmo após a extinção do mandato. III. - Revisão da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. IV. - H.C. indeferido. (HC 70671, Relator(a): Min. CARLOS VELLOSO, Tribunal Pleno, julgado em 13/04/1994, DJ 19-05-1995 PP-13993 EMENT VOL-01787-03 PP-00536 RTJ VOL-00159-01 PP-00152)
FAZZIO JUNIOR, Waldo. Responsabilidade pena e político-administrativa de prefeitos. 1.ed. São Paulo: Atlas, 2007.
Art. 22. O Prefeito é o chefe do governo municipal.
(...)
§ 8º Compete ao Prefeito, além de outras atribuições que lhe forem conferidas em lei:
(...)
IV – nomear e exonerar Secretários Municipais;
Art. 60. Os Secretários do Município, auxiliares diretos e de confiança do Prefeito, serão livremente escolhidos e nomeados dentre os brasileiros de dezoito (18) anos de idade e no exercício de seus direitos políticos.
Art. 59. O prefeito será julgado, nos crimes comuns, perante o Tribunal de Justiça, e nos crimes de responsabilidade pela Câmara Municipal conforme dispuser a lei:
§1º - O prefeito será afastado de suas funções:
(...)
II – se a Câmara Municipal, por dois terços (2/3) de seus membros, admitir a acusação;
Art. 86. Admitida a acusação contra o Presidente da República, por dois terços da Câmara dos Deputados, será ele submetido a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal, nas infrações penais comuns, ou perante o Senado Federal, nos crimes de responsabilidade.
§ 1º - O Presidente ficará suspenso de suas funções:
I - nas infrações penais comuns, se recebida a denúncia ou queixa-crime pelo Supremo Tribunal Federal;
II - nos crimes de responsabilidade, após a instauração do processo pelo Senado Federal.
§ 2º - Se, decorrido o prazo de cento e oitenta dias, o julgamento não estiver concluído, cessará o afastamento do Presidente, sem prejuízo do regular prosseguimento do processo.
§ 3º - Enquanto não sobrevier sentença condenatória, nas infrações comuns, o Presidente da República não estará sujeito a prisão.
§ 4º - O Presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções.
Segundo decisão do Supremo Tribunal Federal, na ADI 1.634-MC, "A Corte, no julgamento de cautelar na ADI 1.628-SC, já adotou posição quanto à aplicabilidade do quorum de 2/3 previsto na CF como o a ser observado, pela Assembleia Legislativa, na deliberação sobre a procedência da acusação contra o governador do Estado." (ADI 1.634-MC, Rel. Min. Néri da Silveira, julgamento em 17-9-1997, Plenário, DJ de 8-9-2000.). Isto significa que, em razão do princípio da simetria, havendo disposição na Constituição dos Estados e na Lei Orgânica do Município, é possível o afastamento do Chefe do Poder Executivo pela respectiva casa legislativa, quando respeitado o quorum para tanto.
Diz o autor: "De qualquer forma, são noções extremamente voláteis que se prestam à infinidade de acepções prestigiadas pela equivocidade" (2007: p. 200).
BERNARDI, Ovídio. Responsabilidade dos prefeitos municipais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1962.
Disponível em: . Acesso em 14 jan. 2014.
Estimativa Populacional 2012. Estimativa Populacional 2012. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) (01 de julho de 2012). Página visitada em 09 de setembro de 2012.
MTP

À PRESIDÊNCIA DA CÂMARA LEGISLATIVA DO MUNICÍPIO DE SANTA RITA – ESTADO DA PARAÍBA




"O Brasil não é isso. É isto. (...) O Brasil é este comício imenso de almas livres. Não são os comensais do erário. Não são as ratazanas do Tesouro. Não são os mercadores do Parlamento. Não são as sanguessugas da riqueza pública. (...) Não são os corruptores do sistema republicano. São as células ativas da vida nacional. É a multidão que não adula, não teme, não corre, não recua, não deserta, não se vende. É o povo, em um desses movimentos seus, em que se descobre toda a sua majestade".

Rui Barbosa




Referente ao processo autuado sob o n.:________________________

MARCOS JOSÉ FERRAZ CABRAL, brasileiro, santa-ritense, portador da Cédula de Identidade de n. 939.993 SSP/PB, inscrito no CPF/MF sob o n. 500.322.164-91, e registrado na Justiça Eleitoral sob o Título de Eleitor de n. 6137612/28, Zona Eleitoral de n. 002, Seção 36, residente e com domicílio eleitoral à Rua da Independência, 180, Bairro da Liberdade, Santa Rita, Paraíba, vem à presença desta Presidência, nos termos do art. 248, I, do Regimento Interno da Câmara Legislativa do Município de Santa Rita, apresentar:

DENÚNCIA

...contra o Prefeito Constitucional do Município de Santa Rita, o senhor REGINALDO PEREIRA DA COSTA, brasileiro, casado, podendo ser encontrado na sede da Edilidade Municipal, na Rua Juarez Távora, 93, Centro, Santa Rita, Paraíba, segundo o disposto na Constituição Federal, no Decreto-Lei de n. 201/1967, na Constituição do Estado da Paraíba e na Lei Orgânica do Município de Santa Rita, fatos e fundamentos a seguir delineados:

DOS FATOS

Trata-se de uma denúncia formulada por este cidadão, acerca do subsunção de condutas praticadas pelo Prefeito Constitucional do Município de Santa Rita, o Sr. Reginaldo Pereira da Costa, enquanto infrações politico-administrativas, previstas no art. 4 do Dec.-lei n. 201/67, para fins de cassação do mandato eletivo.

Como se sabe, o prefeito nomeou inúmeros parentes, consanguíneos e afins, em linha reta e colateral, para diversos cargos da administração direta municipal – a maioria deles, secretarias -, de modo a configurar a prática de nepotismo, que se enquadra nas infrações previstas nos incisos VII e X do art. 4 do Dec.-lei 201/67.

As infrações político-administrativas, aptas a ensejar a cassação do Prefeito, encontram-se listadas nos dez incisos do art. 4 do Dec.-Lei n. 201/67. Os incisos VII e X preveem, respectivamente, a prática de ato de sua competência contra expressa disposição de lei e proceder de modo incompatível com dignidade e o decoro do cargo. Resta saber se tais infrações foram cometidas.

Eis o resumo fático necessário.

FUNDAMENTAÇÃO

A presente denúncia visa trazer, sucintamente, os atos praticados pelo referido gestor, com o fulcro de verificar se determinadas nomeações do Prefeito Constitucional de Santa Rita podem ser qualificadas como prática de nepotissmo. Demonstrada tal prática, requer-se a instauração de processo de sua cassação, em razão do cometimento de infração político-administrativa.

1. Etimologia e histórico do instituto.

A palavra nepotismo possui origem latina e corresponde à autoridade que os sobrinhos (nepotes) e os netos (nepos) do Papa exerciam na administração eclesiástica. Na Administração Pública corresponde à prática de nomear parentes para cargos ou funções de confiança, de livre provimento, apenas em decorrência da vinculação familiar com o governante nomeante.

Desde o início do XXI se aprofundou a discussão acerca da vedação às práticas de nepotismo na Administração Pública, apontado como uma das principais causas do atraso suportado pelo País e da descrença nas instituições públicas. A superposição do interesse particular do governante em detrimento do interesse de toda a coletividade é um mal histórico de nossa sociedade.

Sobre o tema, afirma Irene Patrícia Nohara:

(...) o histórico de atraso enfrentado pelo País faz com que haja ainda fortes resquícios de paternalismo e clientelismo nos espaços jurídicos públicos, em uma lamentável domesticação ou privatização de ambientes destinados originalmente à consecução de interesses coletivos. Esse fenômeno torna ainda mais importante o papel do princípio da moralidade como instrumento de defesa do ideário republicano, avesso à ideia de confuso entre patrimônio publico e coisa privada.

O debate ganhou maior relevo a partir de um ato normativo editado pelo Conselho Nacional de Justiça, enquanto órgão superior de fiscalização do Poder Judiciário, vedando a nomeação de parentes das autoridades detentoras de poder nos órgãos públicos judiciários. A constitucionalidade do ato normativo foi declarada pelo STF, fulminando questionamento judiciais.

Inspirados no expediente do CNJ, o Ministério Público e diversos cidadãos ingressaram judicialmente buscando a extensão da vedação aos demais Poderes da administração. Já existiam, também, normas esparsas, em diferentes níveis e carreias da administração pública que vedavam a nomeação de parentes para o preenchimento de cargos em comissão.

O Supremo Tribunal Federal, na esteira do contexto inicialmente introduzido, e deflagrando mais uma conduta do ativismo judiciário, entendeu que a vedação ao nepotismo encontra fundamento direto nos princípios constitucionais administrativos, estabelecendo padrões objetivos para enquadrar agentes públicos beneficiados por tal prática.

A primeira manifestação do STF se deu com a improcedência na Ação Direita de Inconstitucionalidade (ADIn n. 1.521-4/RS), pela qual se pretendia suspender dispositivos da Constituição do RS, que veiculavam norma genérica de vedação ao nepotismo. Segundo o Min. Marco Aurélio, os referidos dispositivos "esmiuçaram, pedagogicamente, o que se contém na Constituição Federal".

O marco histórico, contudo, foi o ajuizamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC n. 12-6/DF) pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) visando declarar constitucional a Resolução n. 07/05, do Conselho Nacional de Justiça. O julgamento da referida ADC foi responsável por consolidar um entendimento que, posteriormente, seria sumulado.

A resolução dispunha sobre "o exercício de cargos, empregos, e funções por parentes, cônjuges e companheiros de magistrados e de servidores investidos em cargos de direção e assessoramento, no âmbito dos órgãos do Poder Judiciário". O patrocínio da demanda se deu pelo então advogado, e hoje ministro do STF, Luis Roberto Barroso, que assim trouxe na petição inicial:

Do núcleo dos princípios da moralidade e da impessoalidade, extraem-se determinadas regras de forma imediata, sendo que uma delas é, sem dúvida, a que veda o favorecimento pessoal no acesso a cargos públicos e na celebração de contratos, isto é: as práticas de nepotismo. A rigor, esse comando é instrumentalizado pelas técnicas do concurso público e da licitação. Note-se que o fato de a Constituição haver considerado a técnica do concurso inconveniente na hipótese dos cargos em comissão não afasta a incidência da regra que veda o favorecimento pessoal ou familiar nesse contexto.

A demanda teve suas afirmações julgadas procedentes, com eficácia erga omnes e efeito vinculante. Na mesma data do julgamento do mérito da ADC n. 12, dia 20 de agosto de 2008, o STF julgou o RE n. 579.951/RN, que trazia como objeto a nomeação de um parente de agente político para um cargo em comissão. Foi esse julgamento que proporcionou o fim do nepotismo no Poder Executivo.

Entendeu a Suprema Corte que a vedação ao nepotismo é estendida à todos os poderes da Administração, por imposição direta dos princípios constitucionais consagrados no art. 37, cabeça, da Carta Magna, quais sejam, o da moralidade, impessoalidade e eficiência, sendo dispensado, inclusive, qualquer disposição legal para explicitar o que já é "constitucionalmente proibido".

No dia seguinte ao referido julgamento, consagrando o entendimento de que a vedação ao nepotismo se estende a todos os Poderes, o que há muito tempo já poderia ser extraído de outros julgados daquela Corte, foi editada a Súmula Vinculante n. 13, com fundamento no permissivo constitucional do art. 103-A, cabeça, da Lei Maior, contendo o seguinte enunciado:

A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica, investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança, ou, ainda, de função gratificada na Administração Pública direta e indireta, em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios, compreendido o ajuste mediante designações rec procas, viola a Constituição Federal.

Trata-se em um inegável avanço no combate à "privatização" do interesse público, já que foram definidos critérios objetivos para aferição da conduta de nepotismo. Nada obstante certa insegurança jurídica gerada pela imprecisão de alguns termos usados e a ausência de uma robusta controvérsia jurídica submetida a julgamento, o enunciado serviu para externar o ideal a ser buscado.

2. Fundamentos da vedação ao nepotismo.

O entendimento adotado pelo Supremo Tribunal Federal se consubstancia da força normativa inerente ao texto constitucional que, no caso da vedação ao nepotismo, é extraída dos princípios constantes no art. 37, cabeça, da Carta Magna, sendo desnecessária a edição de lei explícita que trate da vedação, consoante ficou consignado no RE n. 579.951-4/RN.

Mesmo consistindo em conceitos jurídicos indeterminados, os princípios da moralidade, impessoalidade e eficiência possuem halo central, um núcleo mínimo, e dele pode se extrair a vedação ao nepotismo. Todo conceito jurídico, por mais abstrato e variante que seja, deve possuir um grau mínimo de certeza com a possibilidade de se retirar, ao menos, o que não é envolvido pelo conceito.

Sobre o tema, pontuou o Min. GILMAR MENDES em seu voto:

A indeterminação semântica dos princípios da moralidade e da impessoalidade não podem ser um obstáculo à determinação da regra da proibição ao nepotismo. Como bem anota GARCIA DE ENTERRIA, na estrutura de todo conceito indeterminado é identificável um "núcleo fixo" (Begriffkern) ou "zona de certeza", que é configurada por dados prévios e seguros, dos quais pode ser extraída uma regra aplicável ao caso. A vedação ao nepotismo é regra constitucional que está na zona de certeza dos princípio da moralidade e da impessoalidade". (grifei)

Tem se entendido que o princípio da moralidade possui primazia sobre os outros princípios constitucionais administrativos, por constituir, em sua essência, substrato interno a fornecer legitimidade e validade do comportamento público. Toda atuação administrativa parte dela e a ela se volta. Os demais princípios administrativos devem ter sua leitura a partir da moralidade.

O Min. Carlos Britto, relator da já mencionada ADC 12-MC/DF, que discutiu a constitucionalidade da resolução do CNJ que vedou a nomeação de parentes por aqueles que detém competência de chefia ou direção no âmbito do Poder Judiciário, ao se referir ao princípio da moralidade e a decorrente vedação ao nepotismo, entendeu naquela oportunidade:

(...) o que já era constitucionalmente proibido permanece com essa tipificação, porém, agora, mais expletivamente positivado. Não se tratando, então, de discriminar o Poder Judiciário perante os outros dois Poderes Orgânicos do Estado, sob a equivocada proposição de que o Poder Executivo e o Poder Legislativo estariam inteiramente liberto de peias jurídicas para prover seus cargos em comissão e funções de confiança, naquelas situações em que os respectivos ocupantes não hajam ingressado na atividade estatal por meio de concurso público (grifou-se)

Os princípio constitucionais, longe de configurarem meras recomendações de caráter moral ou ético, consubstanciam regras jurídicas de caráter impositivo, de hierarquia superior às demais e "positivamente vinculantes", consoante expressão utilizada por GOMES CANOTILHO, de modo que a pena por seu desrespeito é proporcional à sua dimensão no ordenamento.

Os princípios constitucionais, notadamente o da moralidade, são sempre dotados de eficácia imediata, de modo que atos administrativos amorais ou imorais suportarão as consequências jurídicas advindas da carga normativa que essas normas possuem. A materialização da moralidade pode ser exigida judicialmente, sempre que necessária, quando houver violação.

Por oportuna, repisa-se aqui a conhecida e sempre atual lição de CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, segundo a qual

(...) violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma qualquer. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório mas a todo sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra. Isto porque, com ofendê-lo, abatem-se as vigas que o sustêm e alui-se toda estrutura nelas esforçada. (grifou-se)

Sendo desnecessária norma secundária que disponha sobre a vedação ao nepotismo, haja vista a carga normativa e axiológica que carregam os princípios da moralidade e impessoalidade, para expurgo de tal prática, que lamentavelmente resiste incólume, basta contrastar as circunstancias do caso concreto com o dispositivo constitucional.

A Constituição de 1988, em seu art. 37, cabeça, preceitua que a administração Pública rege-se por princípios destinados a resguardar o interesse público na tutela dos bens da coletividade. É necessário que o agente público paute a sua conduta por padrões éticos que permitam o atingimento do bem comum, em todas as esferas da Administração.

Nesse contexto, verifica-se que o legislador originário, bem como o secundário com o advento da EC 19/1998, que trouxe a chamada "Reforma Administrativa", instituiu normas de natureza cogentes para coibir quaisquer práticas, por parte dos administradores públicos que, de alguma forma pudessem se afastar do interesse público primário.

Notadamente a nomeação de parentes para cargos em comissão ou de confiança, segundo interpretação abusiva do art. 37, incisos II e V, da CRFB, não encontra acolhimento nesse sentimento. Convém notar que a EC 19/1998 buscou reduzir ao máximo a discricionariedade do administrador ao preenchimento dos cargos em comissão e das funções de confiança.

De fato, em se tratando de gestão da res publica, a atuação do administrador, nada obstante estar em consonância com o sentido literal da lei, pode ser considerado ilegítimo, impondo-lhe a nulidade, caso se revele ofensiva à moral, aos bons costumes, ao poder-dever de probidade, às ideias de justiça e equidade, estará em evidente confronto com o princípio da moralidade.

Além de ofensiva à moralidade administrativa, a nomeação de parentes para cargos e funções que não exigem concurso público, fere o princípio da impessoalidade e, por extensão, o basilar princípio da isonomia, "porque prevalece nefasto 'QI', o popular 'quem indica', expressão utilizada pelo Min. Marco Aurélio durante o voto na ADI 1.521/RS.

Além disso, a nomeação de parentes, dada a comum inapetência destes para o desempenho das funções a que forma designados, infringem fatalmente o princípio da eficiência, também inserto no art. 37, cabeça, da Carta Magna, por emenda do legislador derivado, num evidente desvio de finalidade, já que permite que o interesse privado-patrimonial prevaleça sobre o coletivo.

Em suma, como afirmou o Ministro Celso de Mello, no julgamento da citada ADI 1.521/RS:

(...) quem tem o poder e a força do Estado em suas mãos, não tem o direito de exercer em seu próprio benefício, a autoridade que lhe é conferida pelas leis da República. O nepotismo, além de refletir um gesto ilegítimo de dominação patrimonial do Estado, desrespeita os postulados republicanos da igualdade, da impessoalidade e da moralidade administrativa. (grifou-se)

Ademais, como já dito, o estrito respeito a esses postulados por parte do administrador, em especial ao da moralidade, em atenção a sua proeminência, configura pressuposto de validade de seus atos, cujo desrespeito lhe confere a pecha de ilegítimo e, assim como a ilegalidade o faria, impõe a nulidade do ato. Assim decidiu o Min. Celso de Mello na ADI 2.661/MA, a saber:

O PRINCÍPIO DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA - ENQUANTO VALOR CONSTITUCIONAL REVESTIDO DE CARÁTER ÉTICO-JURÍDICO - CONDICIONA A LEGITIMIDADE E A VALIDADE DOS ATOS ESTATAIS. - A atividade estatal, qualquer que seja o domínio institucional de sua incidência, está necessariamente subordinada à observância de parâmetros ético-jurídicos que se refletem na consagração constitucional do princípio da moralidade administrativa. Esse postulado fundamental, que rege a atuação do Poder Público, confere substância e dá expressão a uma pauta de valores éticos sobre os quais se funda a ordem positiva do Estado. O princípio constitucional da moralidade administrativa, ao impor limitações ao exercício do poder estatal, legitima o controle jurisdicional de todos os atos do Poder Público que transgridam os valores éticos que devem pautar o comportamento dos agentes e órgãos governamentais. (...)(ADI 2661 MC, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 05/06/2002, DJ 23-08-2002 PP-00070 EMENT VOL-02079-01 PP-00091).

Como se lê, os atos administrativos devem refletir a moral pública presente no texto constitucional – e nunca se afastar dela, sob pena de reclamar "a intervenção da justiça constitucional como força intermediadora e corretiva". A interpretação da Constituição deve se amoldar à realidade em que está imersa, sobe pena de quedar-se ineficaz, nas palavras de KONRAD HESSE.

É relevante considerar que a sociedade padece do mal da descrença em suas instituições, reflexo, sobretudo, dos recorrentes casos de má gestão do dinheiro público, por meio de corrupção, desvios, superfaturamentos, tráfico de influências, utilização dos cargos públicos para favorecimento pessoal, sendo dever de todos, mas em especial do Judiciário, o combate a tais práticas.

É bem verdade que não é recente a reprovabilidade do nepotismo e de todas as condutas que, mesmo travestidas de uma aparência de legalidade, contrariem o direito público subjetivo dos cidadãos ao trato honesto dos bens que a todos pertencem. Tendo referido administrador como ímprobo, não mais aceita contemplá-lo com qualquer condescendência.

Em outra sendo, é igualmente falacioso o argumento que sustentaria que o encargo exercido por esses "servidores-parentes" é feito de forma correta e capacitada. O que está em debate, como acredito que esteja claro, não é a qualidade do serviço prestado, mas a forma do provimento dos cargos que ocupam, que se deu em detrimento do princípio da isonomia.

E aqui surgi um preocupante e comum desdobramento do nepotismo: a ineficiência. Tal como ensina ODETE MEDAUAR, a eficiência "contrapõe-se a lentidão, o descaso, a negligência, a omissão", segundo a professora, "características habituais da Administração Pública brasileira, que assim se manterá enquanto perdurar a confusão entre patrimônio publico e privado.

É abusivo fundamentar a possibilidade de nomear parentes para cargos de livre provimento e exoneração com fundamento na literalidade do disposto nos incisos II e V do art. 37 da CF, contrariando o sentido teleológico do disposto na cabeça do mesmo dispositivo, rompendo com a necessidade de harmonização e unidade que deve alicerçar a hermenêutica constitucional.

A prática do nepotismo traduz a própria antítese da prática de valores cujo substrato constitucional repousa no postulado da moralidade administrativa, que não tolera – porque incompatível com o espírito republicano e com a essência da ordem democrática – o exercício do poder "pro domo sua". A concepção republicana de poder é incompatível com o Estado patrimonial.

O Min. Celso de Melo, em trecho do precioso voto proferido durante o julgamento do RE 579.951-4/RN, cuja profundidade dos conhecimentos da ciência jurídica, externados em seu pronunciamento, é inerente aos anos de atividade que o qualificam como decano da Suprema Corte, traduz de maneira irretocável o fundamento que justifica a vedação ao nepotismo, a saber:

O fato é um só, Senhor Presidente: quem tem o poder e a força do Estado, em suas mãos, não tem o direito de exercer, em seu próprio benefício, a autoridade que lhe é conferida pelas leis da República. O nepotismo, além de refletir um gesto ilegítimo de dominação patrimonial do Estado, desrespeita os postulados republicanos da igualdade, da impessoalidade e da moralidade administrativa. E esta Suprema Corte, Senhor Presidente, não pode permanecer indiferente a tão graves transgressões da ordem constitucional. (grifou-se)

Esses são os fundamentos que justificam a vedação à prática do nepotismo. Frise-se que tal impedimento vincula todos os agentes público, sejam ele de natureza administrativa ou política, haja vista não haver qualquer restrição da incidência cogente das normas decorrentes dos princípios administrativos. O tema será melhor abordado em tópico seguinte.

3. Suposta inexistência de nepotismo na nomeação de agentes políticos.

Após a edição da Súmula n. 13, consubstanciada no julgamento do RE n. 579.951-4/RN, disseminou-se a ideia de que a vedação sumulada não se aplicaria, de forma absoluta, à nomeações para cargos de natureza política, tais como ministros de estado secretários de estado e de município. Em nenhum momento se consignou tal entendimento.

Em leitura atenta, distante da repercussão errada que, quase sempre, os veículos midiáticos promovem dos resultados dos julgamentos, conclui-se que em momento algum os ministros buscaram conceder ao gestor público – no caso, ao Prefeito – prerrogativas absolutas, alheias ao interesse público. Ao contrário, sempre se buscou destacar que o interesse privado não pode ofuscar o público.

Antes de adentrarmos ao julgamento que justificou a edição da Súmula n. 13, o leading case que permitiu que o STF analisasse de forma mais detida e profunda o nepotismo, é pertinente conceituarmos "agente político", uma vez que esse ponto será o diferencial para caracterização dos atos praticados pelo Prefeito do Município de Santa Rita como decorrentes de nepotismo.

Segundo CARVALHO FILHO, "agentes políticos são aqueles aos quais incumbe a execução das diretrizes traçadas pelo Poder Público. São estes agentes que desenham os destinos fundamentais do Estado e que criam as estratégias políticas por eles consideradas necessárias e convenientes para que o Estado atinja os seus fins".

E complementa: "são eles os Chefes do Executivo (Presidente, Governadores e Prefeitos), seus auxiliares (Ministros e Secretários Estaduais e Municipais) e os membros do Poder Legislativo (Senadores, Deputados Federais, Deputados Estaduais e Vereadores)". Segundo o STF, também o são os membros do Poder Judiciário e do Ministério Público.

Com eles não se confundem os servidores públicos (também denominados de agentes administrativos), que são agentes que exercem, em regra, funções relacionadas à administração do ente público, executando diretrizes estabelecidas pelos agentes políticos. Dentre eles, há os que ocupam cargos comissionados, de livre provimento, para exercer direção, chefia etc.

Pontuada esta diferença, passa-se a uma análise do julgada para, ao fim, afastar qualquer entendimento de que a Súmula n. 13 não se aplica aos agentes políticos. O processo trouxe a julgamento um caso de um Município do Rio Grande do Norte em que houve a nomeação, pelo Prefeito, de um irmão do Vice-Prefeito para motorista e do irmão de um Vereador para Secretário de Saúde.

O relator, Min. Ricardo Lewandowski traz uma construção doutrinária e histórica profunda sobre os princípios que regem a Administração Pública, insertos na cabeça do art. 37 da CRFB, afirmando que o nepotismo é uma prática vedada por nossa Carta Magna e que os princípios da moralidade, impessoalidade e eficiência possuem aplicabilidade imediata:

Ora, tendo em conta a expressiva densidade axiológica e a elevada carga normativa que encerram os princípios abrigados no caput do art. 37 da Constituição, não há como deixar de concluir que a proibição do nepotismo independe de norma secundária que obste formalmente essa reprovável conduta. Para o expurgo de tal prática, que lamentavelmente resiste incólume em alguns "bolsões" de atraso institucional que ainda existem no País, basta contrastar as circunstâncias de cada caso concreto com o que se contém no referido dispositivo constitucional.

O ministro relator pauta seu voto na importância e necessidade do respeito aos princípios constitucionais, trazendo o nepotismo como prática nefasta que conduz à administração por caminhos distintos das previsões constitucionais, impondo a ineficiência, como consequência das práticas que vislumbram os interesses particulares dos governantes.

Em nenhum momento o relator excepciona os agentes políticos do respeito aos princípios constitucionais. Apenas não declara nulo o ato de nomeação do irmão do Vereador para o cargo de Secretário de Saúde por não identificar indícios que permitam a conclusão de que houve nepotismo cruzado, já que não havia informações de nomeação de parentes do prefeito.

A nomeação do irmão de um Vereador para o cargo de Secretário de Saúde do Município apenas foi considerado válido por inexistirem indícios que permitissem a conclusão de que houve troca de favores entre os Poderes Legislativo e Executivo do Município, e não porque a vedação ao nepotismo não se aplicaria a cargos de natureza política, como é o de Secretário.

Esse foi o entendimento adotado por TODOS os ministros votantes, tanto que o recurso foi provido em parte, por unanimidade, apenas para declarar a nulidade do ato que nomeou o irmão do vice-prefeito para o cargo de motorista, mantendo incólume a nomeação do irmão do vereador por inexistirem indícios de configuração do nepotismo cruzado.

É verdade que a diferenciação da aplicação da vedação ao nepotismo aos agentes políticos foi, incialmente, levantada pelo Min. Carlos Britto, durante os debates travados após o voto do relator: "aqui faço uma distinção também, porque é membro de Poder", ratificado, preliminarmente pela Min. Carmen Lúcia "É membro de Poder".

Após o destaque inicial, o Min. Marco Aurélio também ratificou a necessidade de se operar essa distinção: "também devêssemos estabelecer apenas a distinção: servidor público e agente político", pontuando que não estenderia "a cabeça do artigo 37, de início, ao agente político e, no caso, o secretário municipal o é". O entendimento foi reafirmado em seu voto.

Ocorre que, de imediato, o Rel. Min. Ricador Lewandowski rebateu o Min. Marco Aurélio, afirmando que ambos não divergiam, que ele também havia assentado em seu voto que haveria uma distinção quanto aos agentes políticos, cujas nomeações de parentes não gozaria da presunção de nepotismo, em razão da natureza do cargo, mas deveriam ser analisadas casuisticamente:

(...) essa questão há de ser apreciada em cada caso concreto, conforme Vossa Excelência está fazendo. Quer dizer, o Ministério Público atuará em cada caso concreto e verificará se houve, ou não, ofensa aos princípios do artigo 37. (grifou-se)

Ou seja: a distinção que há é quanto a presunção. Nos cargos de natureza administrativa, havendo a nomeação de parentes até o 3 graus, há uma presunção absoluta de configuração de nepotismo. Já nos cargos de natureza política, por exercerem função de governo e a nomeação depender da confiança do governante, não há essa presunção, deve ser analisada caso a caso.

Seguindo o julgamento, o voto proferido pelo Min. Carlos Britto pode ser apontado como aquele mais incisivo quanto à inaplicabilidade absoluta aos agentes políticos do que viria a dispor a Súmula n. 13. Ocorre que, alertado de acerca das anomalias que, invariavelmente seria geradas, passou a entender que somente a análise do caso concreto permitiria a conclusão acertada.

Inicialmente, o Min. Carlos Britto pontou em seu voto que os "princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade etc., vêm num contexto não de governo, não de poder político, mas de Administração Pública, ou seja, para o exercício da atividade administrativa" e "o governo é mais que a Administração Pública, porque incorpora ingrediente político".

Partindo-se dessas premissas, e fazendo menção a argumentos debatidos no julgamento da ADC n. 12-6/DF, que no seu entender ratificariam o seu entendimento, o Min. Carlos Britto concluiu pela erroneamente, data vênia, pela inaplicabilidade dos princípios insertos no art. 37, cabeça, da CRFB aos agentes políticos, a saber:

(...) quando o artigo 37 refere-se a cargo em comissão e função de confiança, está tratando de cargos e funções singelamente administrativos, não de cargos políticos. Portanto, os cargos políticos estriam fora do alcance da decisão que tomamos na ADC n. 12, porque o próprio Capítulo VII é Da Administração Pública enquanto segmento do Poder Executivo. E sabemos que os cargos políticos, como, por exemplo, os de Secretário Municipal, são de agentes do Poder, fazem parte do Poder Executivo. O cargo não é em comissão, no sentido do artigo 37. Somente os cargos e funções singelamente administrativos – é como penso – são alcançados pela imperiosidade do artigo 37, com seus lapidares princípios. Então, essa distinção me parece importante para, no caso, excluir do âmbito da nossa decisão anterior os Secretários Municipais (...).

Cabe um crítica às razões usadas pelo Min. Carlos Britto para fundamentar seu entendimento. Com a devida vênia, neste caso, é irrelevante que a Constituição tenha dado ao Capítulo VII a nomenclatura de "Administração Pública". Notadamente não foi o intuito do legislador restringir a incidência das disposições ali constantes aos agentes de natureza administrativa.

A suposta impropriedade do termo "administração" é facilmente superada por meio de uma interpretação teleológica, como se convém fazer pela hermenêutica constitucional, atendo-se aos fins que se buscou com a fixação de princípios que deverão guiar a atividade administrativa, aí incluídas aquelas de natureza governamental e as de natureza administrativa em sentido estrito.

Se assim não fosse se estaria admitindo que aos agentes políticos não seria cogente a atuação segundo a legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Uma verdadeira excrescência jurídica. Estar-se-á admitindo que os agentes políticos, apenas por gozarem dessa condição estariam absolutamente livres para agirem da forma lhes convier, o que não é razoável.

Note-se que, apenas aparentemente, o voto do Min. Carlos Britto diverge do voto do relator. Na verdade, ambos convergem quanto à distinção que cabe ser feita quanto aos agentes políticos, afastando a presunção de nepotismo quando há nomeação de parentes. O Min. Menezes Direito, em seu voto, também concorda com os termos do voto do Min. Carlos Britto:

(...) eu faço as mesmas restrições que já foram feitas pelo eminente Ministro Marco Aurélio e pelo eminente Ministro Carlos Britto. Eu entendo que nessa circunstância, não cabe a aplicação do princípio, não se trata aqui de nepotismo. (grifou-se)

É destacável as ressalvas feitas pelo Min. Menezes Direito: ele ratifica o que anteriormente fora dito quanto às especificidades inerentes às nomeações para cargos políticos, mas destaca que não se configura nepotismo o caso posto em análise e não isenta da pecha de nepotismo toda e qualquer nomeação de agentes políticos, concordando, com outros termos, com o voto do relator.

Em idêntico sentido o voto da Min. Carmén Lúcia, corroborando com a distinção feita aos agentes políticos, afastando a condição de nepotismo do caso analisado quanto à contratação do irmão de um vereador para Secretário de Saúde, mas sem reconhecer a inaplicabilidade absoluta da vedação do nepotismo às nomeações de cargos de natureza política, a saber:

Neste caso específico e nesta situação narrada nos autos, exclusivamente, vou seguir a divergência, pedindo vênia ao Ministro Ricardo Lewandowski.
(...)
Enfim, por essa exclusiva razão [aludindo-se a um possível inexistência no município de profissionais capacitados que não sejam parentes do governante ou de outros agentes políticos, que no caso era um Vereador, circunstância que não foi afastada no caso em julgamento], e sem me comprometer, porque essas contratações cruzadas são fórmulas de nepotismo vedadas constitucionalmente, então não me estou comprometendo, de modo algum, em dizer qualquer cargo de estrutura de Poder, porque se pode criar um exatamente para determinado partido dar apoio a um prefeito e votar uma lei, e, nesse caso, coloca-se alguém, o irmão de um deles para Secretário. Nessa situação, realmente penso que haveria inconstitucionalidade. (grifou-se)

É de se destacar uma clara preocupação da Ministra em não consolidar um entendimento que contenha uma vedação absoluta à configuração de nepotismo nas nomeações de cargos de natureza política, chamando o expediente de "via que se pode abrir uma cunha extremamente perigosa". Por essa razão, frisa, reiteradamente, que a análise é casual:

Como neste caso não há esse dado concreto [de que também houve nomeação de um parente do prefeito a um cargo em comissão no Poder Legislativo, apto a configurar o nepotismo cruzado] – há o dado apenas de que é um vereador e que o irmão dele foi nomeado para o cargo de Secretário da Saúde -, como sei que, em alguns municípios brasileiros, nos município de Minas Gerais, por exemplo, nos quais há um ou dois médicos na cidade, e talvez seja este o único que pode exercer esse cargo, eu não quero avançar aqui por essa falta de dados. (grifou-se).

Da mesma forma que ocorreu no voto do Min. Menezes Direito, a Min. Carmen Lúcia não divergiu do voto do Min. Rel. Ricardo Lewandowski, mas concordou o meio apontado pelo Relator para aferição da configuração ou não do nepotismo, qual seja, uma análise caso a caso, não isentando as nomeações de agentes políticos de respeitarem os princípios administrativos.

Em seguida o Min. Carlos Britto complementa seu voto, corrigindo uma falha em seu primeiro pronunciamento, que permitiria uma conclusão de que ele defendeu a completa inaplicabilidade do princípios administrativos aos agente políticos. Ao final, concorda com o Rel. Min. Ricardo Lewandowski que a impossibilidade de se reconhecer o nepotismo em nomeações políticas poderá gerar uma liberdade excessiva ao gestor, criando situações indesejáveis:

Senhor Presidente, quando introduzi essa discussão, a partir do voto do Ministro Marco Aurélio, sobre a distinção entre cargo em comissão e função de confiança de um lado, e, do outro, cargo de Secretário Municipal, Secretário de Estado, Ministro de Estado, portanto, cargos de natureza política, claro que eu não quis dizer que esses princípios do artigo 37 – legalidade e moralidade – não se aplicam aos dirigentes superiores de toda a administração pública. (...) Os cargos de secretario de Estado, Secretário Municipal têm por êmulo ou paradigma federal os cargos de Ministro de Estado cuja natureza é política e não singelamente administrativa. (...) Aonde eu quero chegar? O Chefe do Poder Executivo é livre para escolher seus quadros de governo, mas não o é para escolher seus quadros administrativos, porque dentre os quadros administrativos estão os cargos em comissão, os cargos em provimento efetivo e as funções de confiança.
(...)
Por isso, o que decidimos no plano da ADC n. 12, e agora servindo de fundamento para a nova decisão, a proibição do nepotismo arranca, decola, deriva diretamente dos princípios do art. 37, que são princípios extensíveis a toda Administração Pública de qualquer dos Poderes, de qualquer das pessoas federadas. Tudo isso na vertente, na perspectiva de cargos em comissão e funções de confiança, que têm caráter administrativo, e não caráter político.

Após fincar seu entendimento, passa-se ao momento principal do julgamento, que vai demonstrar que, desde o princípio, todos os Ministros votantes convergiam quanto a verificação ou não de nepotismo na nomeação de agentes políticos. Quando é admoestado pelo Min. Rel. Ricardo Lewandowski sobre as consequências da consolidação desse entendimento, há um recuo:

Eu estou apenas a imaginar, eminente Ministro Carlos Britto, sem querer discordar de Vossa Excelência, e até trazendo à baila uma situação muito comum nos pequenos municípios: o Prefeito coloca sua esposa como Secretária Municipal, coloca o filho em outra secretaria; coloca o sobrinho em outra. Como ficaríamos. (grifou-se)

Atento à natureza específica dos agentes políticos, que compõem o governo e devem gozar de relação estreita de confiança com o governante, o Min. Rel. apenas afasta a presunção de nepotismo que fora firmada para os agentes administrativos, devendo cada caso ser analisado conforme suas características específicas, podendo concluir ou não pela configuração de nepotismo:

Então, por isso é que eu preferi dizer, eminente Ministro, que cada caso concreto deverá ser avaliado à luz da proibição do nepotismo que emana do artigo 37, caput, um pouco na linha do que colocou a Ministra Carmem Lúcia. Eu fico com certo receio de assentarmos, com todas as letras, que, em se tratando de Secretário Municipal, que é um cargo político de livre nomeação, enfim, de confiança do Prefeito, tal atitude seria lícita. Amanhã, se ele colocar a esposa em um "cargo chave" de Secretaria de Governo, isso seria lícito à luz da proibição do nepotismo, do princípio da moralidade? Isso acontece no cotidiano deste grande Brasil. (grifou-se)

Concordando com o defendido pelo Min. Rel., o Min. Carlos Britto reconhece a possibilidade de se configurar o abuso do poder discricionário do governante ("desgraçadamente acontece isso"), de modo a permitir uma conclusão de que abandonou, ao menos nas entrelinhas, sua posição absoluta não admitindo o nepotismo em cargos políticos.

No mesmo sentido, defende a Min. Cármen Lúcia:

Ministro Carlos Britto, essa liberdade não me parece absoluta. Ministro Ricardo Lewandowski, porque teria de haver limites, não é isso? Não existe liberdade absoluta em espaço algum, senão o governante poderia escolher apenas os seus familiares para todos os cargos. E por ser cargo político, isso seria permitido? De modo algum. (grifou-se)

Nesse momento do julgamento se inicia um rápido debate em que o Min. Rel. Ricardo Lewandowski afirma que não está discordando da especificidades dos agentes políticos, apenas teme em estabelecer uma vedação absoluta, "temendo pelas consequências práticas" que a impossibilidade de caracterização do nepotismo possa causar.

Seguindo o julgamento, o Min. Cezar Peluso afirma não ter substrato jurídico naquele momento para firmar um entendimento acerca da configuração ou não de nepotismo na nomeação de parentes para cargos políticos, apenas se contenta em analisar o caso trazido nos autos, afastando o nepotismo da situação julgada:

Em primeiro lugar – e não quero comprometer-me quanto a isso -, tenho certa dúvida, ainda, se o princípio se aplica, ou não aos chamados agentes políticos. Este é o primeiro ponto. Mas acho sobretudo que o ponto fundamental é ligar o princípio da impessoalidade à relação que se estabelece entre o nomeado e a autoridade nomeante. Em outras palavras, o caso aqui não é de prefeito que nomeou seu irmão, o que poderia ter contorno diferenciado. É de prefeito que nomeou seu irmão, o que poderia ter contorno diferenciado. É de prefeito que nomeou o irmão de um vereados. Então, a menos que – essa era a ressalva que faço – se tratasse do chamado "favor cruzado", isto é, que o prefeito tivesse nomeado, como secretario, o irmão do vereador e este, na Câmara, tivesse, de algum modo, nomeado para a Câmara Municipal um parente do Prefeito, eu veria, aí sim, características típicas do chamado "nepotismo cruzado, que me parece alcançado pela regra da impessoalidade. Mas não é o caso. (grifou-se)

Por fim, chega-se aos dois últimos votos do julgamento. O Min. Celso de Mello, em voto denso e profundo, de valor jurídico e sociológico inestimável, faz uma valorosa defesa dos princípios republicanos, notadamente o da moralidade, em detrimento da Teoria do Estado Patrimonialista, na qual a res publica é submissa e secundária ao interesse privado.

Tamanha é a aversão ao nepotismo que demonstrou em seu voto, que não lhe permitiu sequer mencionar qualquer distinção entre agentes administrativos ou políticos:
Concluo o meu voto. E, ao fazê-lo, reafirmo o meu entendimento de que o nepotismo se mostra incompatível com o sistema constitucional, impondo-se, por isso mesmo, a vedação de sua prática a todos os Poderes da República e a todos os níveis em que se estrutura o Estado Federal brasileiro. (grifou-se)

Já o Min. Gilmar Mendes, em resumido voto, apenas firma uma "ressalva em relação às funções de natureza eminentemente política", afirmando a necessidade de "ter cuidado quanto à fixação" de qualquer entendimento, o que não havia sido possível naquele julgamento, já que a matéria "não foi objeto de maior consideração".

O resultado do julgamento do RE 579.951-4/RN, portanto, limitou-se a declarar que o nepotismo consiste em uma vedação decorrente dos princípios constitucionais insertos no art. 37, cabeça, da CRFB, que possuem aplicabilidade imediata e eficácia normativa inerente ao texto constitucional, de modo que é desnecessária lei secundária que verse sobre o tema.

Da mesma forma, consignou-se que a contratação de parentes para cargos comissionados ou funções de confiança, de natureza administrativa, possui presunção absoluta de ilicitude. O mesmo não ocorre quanto aos cargos de natureza política, em que, em razão de sua natureza, não há presunção de ilicitude, o que não afasta a possibilidade de aferição de nepotismo em dado caso.

O referido julgamento foi assim ementado:

ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. VEDAÇÃO NEPOTISMO. NECESSIDADE DE LEI FORMAL. INEXIGIBILIDADE. PROIBIÇÃO QUE DECORRE DO ART. 37, CAPUT, DA CF. RE PROVIDO EM PARTE. I - Embora restrita ao âmbito do Judiciário, a Resolução 7/2005 do Conselho Nacional da Justiça, a prática do nepotismo nos demais Poderes é ilícita. II - A vedação do nepotismo não exige a edição de lei formal para coibir a prática. III - Proibição que decorre diretamente dos princípios contidos no art. 37, caput, da Constituição Federal. IV - Precedentes. V - RE conhecido e parcialmente provido para anular a nomeação do servidor, aparentado com agente político, ocupante, de cargo em comissão. (RE 579951, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 20/08/2008, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-202 DIVULG 23-10-2008 PUBLIC 24-10-2008 EMENT VOL-02338-10 PP-01876)

A partir do referido julgamento, foi editada a Súmula Vinculante n. 13, cujo enunciado é o seguinte:

A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica, investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança, ou, ainda, de função gratificada na Administração Pública direta e indireta, em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal.

Durante o julgamento, a partir do momento em que a questão da especificidade dos cargos de natureza política foi levantada, iniciou-se uma falsa discussão. Digo falsa, porque não havia divergência entre os Ministros, já que todos concordavam que o ordenamento não poderia proteger situações anômalas que demonstrassem claro abuso do poder discricionário pelo gestor.

Como se viu a conclusão seguiu a direção apontada pelo Min. Rel. Ricardo Lewandowski em que, quando se tratar de nomeação para cargos de natureza política, a legitimidade do ato deve ser analisada conforme as especificidades do caso, não havendo presunção de ilicitude, mas também não afastando de forma absoluta a configuração de nepotismo.

A configuração ou não de nepotismo nas nomeações para agentes políticos não ficou decidido nesse julgado, consonante afirmou o Min. Gilmar Mendes em seu voto, afirmando que a matéria "não foi objeto de maior consideração". A conclusão que resta é apenas de que é possível haver nepotismo nesses casos, a depender da configuração do caso concreto.

Uma profunda análise nessa controvérsia não foi necessária já que, no caso em análise, a nomeação do irmão de um vereador para o cargo de Secretário de Saúde não implica em nepotismo imediatamente, devendo haver provas de que teria acontecido o chamado "nepotismo cruzado", provas estas que não foram identificadas de modo que não houve maior aprofundamento do tema.

Resta claro que não há nenhuma, absolutamente nenhuma, restrição quanto à caracterização de uma nomeação de parente para ocupar o cargo de agente político como nepotismo. O que não há é a presunção de ilegitimidade do ato, devendo ser feita uma análise casuística, tomando-se em consideração as especificidades do caso, para, ao final, emitir conclusão sobre a legalidade do ato.

Como já dito, o precedente aqui estudado foi tido como o leading case para consolidação do entendimento da vedação ao nepotismo na Suprema Corte, tanto que ensejou a edição de súmula vinculante. Ocorre que não há nos votos dos Ministros, na ementa do julgado ou mesmo no enunciado da sumula editada qualquer exceção aos agentes políticos à vedação do nepotismo.

O presente tópico tem apenas esse objetivo: fulminar, por meio de uma análise minuciosa do julgamento do qual se originou a Súmula Vinculante n. 13, qualquer entendimento errôneo de que haveria uma liberdade absoluta na nomeação de parentes para cargos de natureza política. Falácia que aqui foi atacada, irremediavelmente.

4. Evolução jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal

Registra-se que, nos espaços vazios deixados pelo julgamento do RE 579.951-4/RN, a jurisprudência da Suprema Corte vem aprofundando o entendimento de que configura igualmente nepotismo a nomeação de parentes a cargos políticos, quando desvinculados da moralidade e impessoalidade administrativa.

Nesse sentido as seguintes decisões monocráticas:

DECISÃO MEDIDA CAUTELAR EM RECLAMAÇÃO. DESCUMPRIMENTO DA SÚMULA VINCULANTE N. 13 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. CARGO DE NATUREZA POLÍTICA. PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. (...) O texto da Súmula Vinculante n. 13 deste Supremo Tribunal Federal não excepciona a nomeação de parentes para cargos políticos e, conforme ficou assentado na Reclamação n. 6.650-MC-AgR, a caracterização de nepotismo deverá ser feita em cada caso. Isso porque, como salientei no julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade n. 12/DF, o princípio constitucional da moralidade administrativa não autoriza o parentesco como critério de admissão no serviço público, nem mesmo para cargos de confiança, pois confiança se avalia pela qualificação do candidato e não na qualidade do nome por ele ostentado. Entretanto, cargos de natureza política não foram incluídos, de forma linear e proibitiva, no rol dos defesos à nomeação, daí a ressalva nos votos de que o exame de sua legitimidade seria feita em cada situação. (...) (STF, Rcl 16402 MC, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, julgado em 07/10/2013, publicado em PROCESSO ELETRÔNICO DJe-210 DIVULG 22/10/2013 PUBLIC 23/10/2013)

DECISÃO NEPOTISMO – AGENTE POLÍTICO – VERBETE VINCULANTE Nº 13 DA SÚMULA DO SUPREMO – ALCANCE – LIMINAR INDEFERIDA. O teor do Verbete não contém exceção quanto ao cargo de secretário municipal. 3. Indefiro a liminar. 4. Solicitem informações ao reclamado. 5. Vindo a manifestação ao processo, colham o parecer da Procuradoria Geral da República. 6. Publiquem. Brasília – residência –, 24 de maio de 2013, às 20h10. Ministro MARCO AURÉLIO Relator (STF, Rcl 15571 MC, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, julgado em 24/05/2013, publicado em PROCESSO ELETRÔNICO DJe-102 DIVULG 29/05/2013 PUBLIC 31/05/2013)

DECISÃO: Trata-se de reclamação, com pedido de medida liminar, ajuizada pelo Município de Taubaté, na qual se sustenta que o ato judicial ora questionado – emanado de eminente Desembargador do E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Relator do Agravo de Instrumento nº 0057238-94.2011.8.26.0000 – teria desrespeitado a autoridade da Súmula Vinculante nº 13/STF, (…) Bem vistas as coisas, o fato é que a redação do verbete não prevê a exceção mencionada e esta, se vier a ser reconhecida, dependerá da avaliação colegiada da situação concreta descrita nos autos, não cabendo ao relator antecipar-se em conclusão contrária ao previsto na redação da súmula, ainda mais quando baseada em julgamento proferido em medida liminar. Registro, ainda, que a apreciação indiciária dos fatos relatados, própria do juízo cautelar, leva a conclusão desfavorável ao reclamado. É que não há, em passagem alguma das informações prestadas pelo município, qualquer justificativa de natureza profissional, curricular ou técnica para a nomeação do parente ao cargo de secretário municipal de educação. Tudo indica, portanto, que a nomeação impugnada não recaiu sobre reconhecido profissional da área da educação que, por acaso, era parente do prefeito, mas, pelo contrário, incidiu sobre parente do prefeito que, por essa exclusiva razão, foi escolhido para integrar o secretariado municipal." (...) Sendo assim, e sem prejuízo de ulterior reapreciação da matéria, quando do julgamento final da presente reclamação, indefiro o pedido de medida liminar. Publique-se. Brasília, 29 de junho de 2012. Ministro CELSO DE MELLO Relator (STF, Rcl 11605 MC, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, julgado em 29/06/2012, publicado em PROCESSO ELETRÔNICO DJe-151 DIVULG 01/08/2012 PUBLIC 02/08/2012)

Decisão: Trata-se de reclamação constitucional proposta pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro contra nomeação do irmão do prefeito do município de Queimados para o cargo de secretário de educação daquela municipalidade. (…) Assim, em linha com o afirmado pelo reclamante, tenho que os acórdãos proferidos por este Supremo Tribunal Federal no RE 579.951 e na medida cautelar na Rcl 6.650 não podem ser considerados representativos da jurisprudência desta Corte e tampouco podem ser tomados como reconhecimento definitivo da exceção à súmula vinculante 13 pretendida pelo município reclamado. Bem vistas as coisas, o fato é que a redação do verbete não prevê a exceção mencionada e esta, se vier a ser reconhecida, dependerá da avaliação colegiada da situação concreta descrita nos autos, não cabendo ao relator antecipar-se em conclusão contrária ao previsto na redação da súmula, ainda mais quando baseada em julgamento proferido em medida liminar. Registro, ainda, que a apreciação indiciária dos fatos relatados, própria do juízo cautelar, leva a conclusão desfavorável ao reclamado. É que não há, em passagem alguma das informações prestadas pelo município, qualquer justificativa de natureza profissional, curricular ou técnica para a nomeação do parente ao cargo de secretário municipal de educação. Tudo indica, portanto, que a nomeação impugnada não recaiu sobre reconhecido profissional da área da educação que, por acaso, era parente do prefeito, mas, pelo contrário, incidiu sobre parente do prefeito que, por essa exclusiva razão, foi escolhido para integrar o secretariado municipal. Ante o exposto, defiro a cautelar pleiteada pelo reclamante para determinar o afastamento de Lenine Rodrigues Lima do cargo de secretário estadual de educação do município de Queimados, até o julgamento final da presente reclamação. Abra-se vista à Procuradoria Geral da República. Publique-se. Int.. Brasília, 3 de novembro de 2011 Ministro Joaquim Barbosa Relator Documento assinado digitalmente. (STF, Rcl 12478 MC, Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA, julgado em 03/11/2011, publicado em PROCESSO ELETRÔNICO DJe-212 DIVULG 07/11/2011 PUBLIC 08/11/2011)

(grifou-se)

O Min. Joaquim Barbosa enumerou, em desfavor da reclamada, a ausência de "qualquer justificativa de natureza profissional, curricular ou técnica para a nomeação do parente ao cargo de secretário municipal de educação", sendo este fator indiciário de que a nomeação se justificou em razão de exclusiva relação de parentesco com a autoridade nomeante.

Ao que demonstram os julgado, o STF parece caminhar para a consolidação de um entendimento de que deve haver alguma correlação entre o nomeado e o cargo por ele ocupado, afastando definitivamente aquele absurdo e desarrazoado argumento (que, frise-se, nunca foi adotado) de que a vedação ao nepotismo nunca se aplicar aos cargos políticos, apenas em razão de sua natureza.

5. O entendimento do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, tido como um dos tribunais mais qualificados em nosso país, que comumente adota posições de vanguarda que, posteriormente, passam a ser adotas em outros tribunais e nos tribunais superiores, possui entendimento consolidado quando à configuração de nepotismo na nomeação de parentes como agente políticos:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. NEPOTISMO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. SECRETÁRIA MUNICIPAL NOMEADA POR CÔNJUGE. INCIDÊNCIA DO VERBETE Nº 13 DA SÚMULA VINCULANTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. A nomeação de parentes para ocupar cargos políticos reside, igualmente, na obediência ao princípio da moralidade por parte do administrador público, cujo respeito configura pressuposto de validade dos seus atos. Deram provimento. Unânime. (Agravo de Instrumento Nº 70028090496, Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Alexandre Mussoi Moreira, Julgado em 18/03/2009)

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. SÚMULA VINCULANTE Nº 13. NEPOTISMO. CARGO POLÍTICO. OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA MORALIDADE E IMPESSOALIDADE. Não há como interpretar que os cargos políticos não estão abrangidos pela Súmula Vinculante nº 13, na medida em que a nomeação de parente - no caso concreto, do pai do Sr. Prefeito - como Secretário de Agricultura e Meio Ambiente, fere frontalmente os princípios da moralidade e impessoalidade, que, são a razão de existência da referida Súmula. Procedência do pedido para o fim de anular o ato de nomeação. RECURSO PROVIDO. VOTO VENCIDO. (Apelação Cível Nº 70044587194, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Irineu Mariani, Julgado em 25/04/2012)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DECISÃO MONOCRÁTICA. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. NEPOTISMO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA DEFERIDA PARA A IMEDIATA EXONERAÇÃO DE FAMILIARES DE INTEGRANTES DO PODER EXECUTIVO MUNICIPAL, OCUPANTES DE CARGOS DE LIVRE NOMEAÇÃO NA CONDIÇÃO DE AGENTES POLÍTICOS. INAPLICABILIDADE DO VERBETE Nº 13 DA SÚMULA VINCULANTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL QUE NÃO VEIO DESDE LOGO DEMONSTRADA. MANUTENÇÃO DA DECISÃO HOSTILIZADA QUE NÃO IMPLICA À PARTE LESÃO GRAVE E DE DIFÍCIL REPARAÇÃO. APLICAÇÃO DO ARTIGO 527, II, DO CPC, COM REDAÇÃO DADA PELA LEI Nº 11.187, DE 19 DE OUTUBRO DE 2005. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONVERTIDO EM AGRAVO RETIDO. (Agravo de Instrumento Nº 70048742969, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Arno Werlang, Julgado em 07/05/2012)

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. NEPOTISMO. SÚMULA VINCULANTE N. 13 STF. NOMEAÇÃO EM CARGO DE COMISSÃO DE CÔNJUGE ANTERIOR À ASSUNÇÃO AO CARGO DE VICE-PREFEITO DO CÔNJUGE. INCIDÊNCIA DO VERBETE. CARGO POLÍTICO. INCIDÊNCIA DO VERBETE. A proibição de nomeação, bem como manutenção em cargos políticos, de parentes nos graus delimitados na Súmula n. 13 do STF, fere os princípios da moralidade e impessoalidade, o que o verbete busca justamente coibir. APELAÇÃO CÍVEL PROVIDA, POR MAIORIA. (Apelação Cível Nº 70057098170, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: João Barcelos de Souza Junior, Julgado em 20/11/2013)

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO ADMINISTRATIVO. EXONERAÇÃO DE SECRETÁRIO MUNICIPAL EM RAZÃO DE NEPOTISMO. SÚMULA VINCULANTE 13 DO STF. POSSIBILIDADE, NO CASO. Apesar de ainda existir divergência acerca da aplicação da Súmula Vinculante nº 13 do STF, a jurisprudência está pacificando o entendimento de que a vedação contida na referida súmula é aplicável, também, aos dirigentes superiores da Administração Pública. A Súmula Vinculante nº 13 do STF teve como base os princípios da impessoalidade e moralidade, modo pelo qual não há falar no seu afastamento para o caso em comento, eis que evidente o parentesco colateral de 3º grau entre o apelante e outro ocupante de cargo político - Secretário Municipal de Obras APELAÇÃO DESPROVIDA, POR MAIORIA, VENCIDA A VOGAL. (Apelação Cível Nº 70056735103, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: João Barcelos de Souza Junior, Julgado em 20/11/2013)

(grifou-se)

Segundo o TJRS, a observância dos princípios da impessoalidade e da moralidade, previstos no art. 37 da CRFB, aplica-se em toda extensão aos dirigentes superiores da Administração Pública, de modo que a nomeação de parentes, apenas por essa condição, para cargos políticos, fere frontalmente os princípios administrativos que justificaram a edição da Súmula Vinculante n. 13.

Na guisa desse entendimento, o Des. Carlos Roberto, revisor e redator do acórdão proferido nos autos da Apelação Cível nº 70044587194, entendeu que:

Não se há como interpretar, com a devida vênia, que os cargos políticos não estão abrangidos pela Súmula Vinculante nº 13, na medida em que a nomeação de parente – no caso concreto, do pai – como Secretário de Agricultura e Meio Ambiente, fere frontalmente os princípios da moralidade e impessoalidade, que, repito, são a razão de existência da referida Súmula. (grifou-se)

No mesmo sentido, o voto do Des. Arno Werlang, proferido no Agravo de Instrumento Nº 70048742969:

(...) vem se consolidando o entendimento de que a vedação prevista na Súmula Vinculante nº 13 do STF aplica-se em toda a extensão aos dirigentes superiores da Administração Pública e abarcando as nomeações de agentes políticos, justamente em razão da observância dos princípios da legalidade e da moralidade, previstos no artigo 37 da Constituição Federal. (grifou-se)

Com efeito, a Súmula Vinculante n. 13 do Supremo Tribunal Federal não distingue a natureza jurídica do cargo, sendo que a única limitação contida no verbete é de grau de parentesco. Não há como interpretar que os cargos políticos não estão abrangidos pela vinculação. Esse foi o principal argumento utilizado no julgamento na Apelação Cível Nº 70057098170.

Em outro precedente o Desembargador Almir Porto da Rocha Filho, bem analisou questão similar em sua declaração nos autos do julgamento do agravo de instrumento nº 70049530835, cujo trecho peço vênia para transcrever:

(...), o exercício de cargos políticos por pessoas que mantenham laços familiares com autoridades públicas não exclui necessariamente a configuração da prática de nepotismo. Como ressalva o próprio Pretório Excelso, a formação de grupos familiares em meio aos altos cargos que compõem a máquina estatal pode eventualmente violar os preceitos constitucionais que regem a administração pública (artigo 37, caput, da CF), devendo a análise ser realizada caso a caso. O verbete nº 13 de sua Súmula não é necessariamente aplicável, mas tampouco exaure todas as possibilidades de afronta ao texto constitucional através do apadrinhamento de familiares como agentes políticos. (grifou-se)

É com grande acerto e com o pioneirismo é peculiar àquela Corte que o referido entendimento vem sendo adotado. A conclusão a que chegaram os magistrados do TJRS advém do mesmo entendimento adotado para a edição da Súmula Vinculante, de modo que é natural que os haja uma evolução jurisprudencial consolidando este entendimento.

Como demonstram os precedentes acima trazidos, é totalmente incoerente reconhecer como nepotismo nomeações de parentes para cargos administrativos, quando feitas ao arrepio dos princípios da moralidade e da impessoalidade e não o fazê-lo apenas por ter sido a nomeação para um cargo de governo, infringindo os mesmos postulados.

6. Princípio da moralidade e a nomeação dos agentes políticos.

Como visto, o princípio da moralidade é tido como pedra fundamental tanto na atuação do administrador, como na interpretação dos demais princípios administrativos. Trata-se de um vetor informador da administração pública (art. 37, cabeça, CRFB) que justifica o oferecimento de ação popular por qualquer cidadão para anular ato lesivo à moralidade administrativa (art. 5, LXXIII, CRFB).

Duas são as consequências apontadas pela Professora ZANELLA DI PIETRO advindas da importância que a Constituição Federal conferiu ao princípio da moralidade:

A primeira é a de que o ato administrativo que infrinja a moralidade administrativa é tão inválido quanto o ato administrativo ilegal; a segunda é uma consequência da primeira, ou seja, é a de que, sendo inválido, o ato administrativo imoral pode ser apreciado pelo Poder Judiciário, para fins de decretação de sua invalidade.

A Lei n. 9.784/99, que versa sobre o processo administrativo federal, elenca o princípio da moralidade, no art. 2, cabeça, como um dos postulados ao qual está vinculada a administração pública, exigindo-se uma "atuação segundo padrões éticos de probidade, decoro e boa-fé", conforme parágrafo único, inciso IV, do mesmo artigo.

Como decorrência de um maior controle da atuação do agente público, segundo os mecanismos trazidos pela Constituição Federal de 1988, os atos discricionários, em atenção à moralidade que deve lhes conduzir, tendem a dispor de uma carga cada vez mais objetiva, permitindo que a sociedade investigue a finalidade que motivou a o ato administrativo.

Ocorre que, em certos casos, como sói ocorrer com a prática de nepotismo, é irrelevante a intenção do agente, porque do próprio objeto resulta a imoralidade. É o que ocorre com a nomeação de parentes para ocupar cargos na administração. Aqui, consoante previsão da Súmula n. 13, a previsão de ilegitimidade do ato é absoluta, independente da intenção daquele que nomeou.

Nesse sentido:

Não é preciso penetrar na intenção do agente, porque do próprio objeto resulta a imoralidade. Isso ocorre quando o conteúdo de determinado ato contrariar o senso comum de honestidade, retidão, equilíbrio, justiça, respeito à dignidade do ser humano, à boa-fé, ao trabalho, à ética das instituições. A moralidade exige proporcionalidade entre os meios e os fins a atingir; entre os sacrifícios impostos à coletividade e os benefícios por ela auferidos; entre as vantagens usufruídas pelas autoridades públicas e os encargos imposto à maioria dos cidadãos.

Nesse sentido, de forma lamentável e contrária à moralidade administrativa, os gestores têm buscado brechas no entendimento adotado pelo STF, notadamente com a nomeação de inúmeros parentes para os cargos de natureza política do governo, de modo a tentar burlar o nepotismo.

A intenção é tão clara que, quando questionado pelo Ministério Público sobre o fato de algum parente estar ocupando um cargo comissionado de direção, por exemplo, o gestor o exonera e o nomeia para um cargo de secretaria (outras vezes muda apenas o nome), com o intuito de, supostamente, atender ao disposto na Súmula Vinculante n. 13, o que deixaria de ser nepotismo.

Mas não o é. Tal prática, por demonstrar que a clara intenção do gestor é apenas o benefício de seus familiares, não resolve a questão, mas sim a evidencia, já que é um claro e manifesto desrespeito aos princípios que ensejaram a edição da Súmula Vinculante n. 13, de modo que não pode se proteger esse tipo de prático sob a justificativa de ser um cargo de natureza política.

Tal conduta se enquadra no conceito de desvio de poder, na concepção da Professora ZANELLA DI PIETRO, que defende que este consiste no

(…) fato de uma autoridade administrativa que, embora praticando um ato de sua competência, observando as formas, não cometendo qualquer violação da lei, usa de seu poder para um fim e por motivos outros que não aqueles em vista dos quais esse poder lhe foi conferido, quer dizer, outros que não os que pretende a moral administrativa.

Não há escudo protetivo que não possa ser transposto em ocorrendo violação a tais valores, com o que se tem relativizada a noção de que, em se tratando de agentes políticos, não se proíbe a contratação de parentes. Onde houver o comprometimento da moralidade da Administração Pública, há de se corrigir a lesão.

A possibilidade de vedar a nomeação de parentes para ocupar cargos políticos reside, igualmente, na obediência ao princípio da moralidade por parte do administrador público, cujo respeito configura pressuposto de validade de seus atos. O critério para a habilitação no serviço público é a capacitação, mesmo para os cargos de confiança, e não o sobrenome que ostenta.

É importante sempre haver uma nítida distinção entre o patrimônio público e o privado, visando evitar que em ordem a obstar que os indivíduos, mediante ilegítima apropriação, culminem por incorporar, ao âmbito de seus interesses particulares, a esfera de domínio institucional do Estado, marginalizando, o interesse dos demais cidadãos.

Os princípios administrativos impõem que a nomeação de parentes, mesmo para os cargos políticos, guardem alguma relação de pertinência, como a habilitação e a aptidão para o cargo, sob pena de se legalizar, com fundamento em uma súmula vinculante, atos de nomeação que configurem abuso de poder e desvio de finalidade.

De rigor, pois, um "perfeito encadeamento entre a natureza do cargo, o agente que o ocupará e a atividade a ser desenvolvida. Rompido esse elo, ter-se-á o desvio de finalidade e, normalmente, a paralela violação ao princípio da moralidade". Um caminho a se trilhar é, por exemplo, o apontado pela Resolução n. 7/05, do Conselho Nacional de Justiça.

7. A prática de nepotismo na Prefeitura Municipal de Santa Rita


Ao longo dos tópicos anteriores, fincou-se a premissa de que a nomeação de familiares, respeitado o grau de parentesco, mesmo para cargos de natureza política, quando dissociado do critério técnico e da capacidade para exercício da função pública, constitui prática de nepotismo, porque o fundamento para o provimento do cargo é a proximidade familiar, o que fere a moralidade.

Passa-se, então, a analisar as nomeações feitas pelo Prefeito do Município de Santa Rita, o Sr. Reginaldo Pereira da Costa, para identificar a possível prática de nepotismo em sua gestão. Segue abaixo uma tabela com os "GRAUS DE PARENTESCO PARA FINS DE NEPOTISMO", elaborada com base no enunciado da Súmula Vinculante n. 13, editada pelo Supremo Tribunal Federal.

Senão, vejamos:

Conforme PORTARIA 003/2013, publicada no Mensário Oficial do Município edição 001/2013, Ano 46, de 31 de janeiro de 2013, o Sr. Reginaldo Pereira da Costa, Prefeito do Município, nomeou a Sra. VILMA GOMES LIMA DA SILVA como Secretária de Administração e Gestão, cargo de natureza política. A secretária, nada mais é que IRMÃ DA CÔNJUGE, incidindo na vedação da Súmula Vinculante n. 13 por ser um parente por afinidade do nomeante.

Conforme PORTARIA 033/2013, publicada no Mensário Oficial do Município edição 001/2013, Ano 46, de 31 de janeiro de 2013, o Sr. Reginaldo Pereira da Costa, Prefeito do Município, nomeou o Sr. LUCIANO TEIXEIRA DE CARVALHO como Diretor de Departamento de Contabilidade da Secretaria de Ação Social, cargo em comissão de natureza administrativa. O diretor, nada mais é que CÔNJUGE DA FILHA, incidindo na vedação da Súmula Vinculante n. 13 por ser casado com uma filha do nomeante.

Conforme PORTARIA 209/2013, publicada no Mensário Oficial do Município edição 001/2013, Ano 46, de 31 de janeiro de 2013, o Sr. Reginaldo Pereira da Costa, Prefeito do Município, nomeou o Sr. EDIVANDRO PEREIRA DO NASCIMENTO como Assessor Especial III, cargo em comissão de natureza administrativa. O assessor, nada mais é que seu SOBRINHO, incidindo na vedação da Súmula Vinculante n. 13 por ser parente de 3º grau do nomeante.

Conforme PORTARIA 1334/2013, publicada no Diário Oficial Eletrônico do Município n. 100, Ano 01, Pag. 03, de 26 de novembro de 2013, o Sr. Reginaldo Pereira da Costa, Prefeito do Município, nomeou a Sra. VERA LÚCIA GOMES DE LIMA COSTA como Secretária de Assistência Social, cargo de natureza política. A secretária, nada mais é que sua CÔNJUGE.

Conforme PORTARIA 1343/2013, publicada no Diário Oficial Eletrônico do Município n. 100, Ano 01, Pag. 06, de 26 de novembro de 2013, o Sr. Reginaldo Pereira da Costa, Prefeito do Município, nomeou o Sr. EDVALDO AYRES DE SOUZA JÚNIOR como Secretário de Articulação Institucional, cargo de natureza política. O secretário, nada mais é que CÔNJUGE DE SUA SOBRINHA, incidindo na vedação da Súmula Vinculante n. 13 por ser casado com um parente de 3º grau do nomeante.

Conforme PORTARIA 1349/2013, publicada no Diário Oficial Eletrônico do Município n. 100, Ano 01, Pag. 08, de 26 de novembro de 2013, o Sr. Reginaldo Pereira da Costa, Prefeito do Município, nomeou o Sr. LUCIANO TEIXEIRA DE CARVALHO como Secretário de Saúde, cargo de natureza política tendo sido anteriormente Diretor de Departamento de Contabilidade da Secretaria de Ação Social, cargo em comissão de natureza administrativa, conforme relatado acima. O antigo diretor e hoje secretário, nada mais é que CÔNJUGE DA FILHA, incidindo na vedação da Súmula Vinculante n. 13 por ser casado com uma filha do nomeante.

Conforme PORTARIA 1357/2013, publicada no Diário Oficial Eletrônico do Município n. 102, Ano 01, Pag. 01, de 28 de novembro de 2013, o Sr. Reginaldo Pereira da Costa, Prefeito do Município, nomeou o Sr. FLÁVIO FREDERICO DA COSTA SANTOS como Secretário de Infraestrutura, Obras e Serviços Públicos, cargo de natureza política. O secretário, nada mais é que seu SOBRINHO, incidindo na vedação da Súmula Vinculante n. 13 por ser parente de 3º grau do nomeante.

Conforme PORTARIA 1686/2013, publicada no Diário Oficial Eletrônico do Município n. 126, Ano 02, Pag. 02, de 21 de janeiro de 2014, o Sr. Reginaldo Pereira da Costa, Prefeito do Município, nomeou a Sra. VERA LÚCIA GOMES DE LIMA COSTA que já era Secretária de Assistência Social, para ocupar também o cargo de Superintendente da Agência de Desenvolvimento do Programa Municipal de Apoio aos Pequenos Negócios, cargo em comissão de natureza administrativa. Como já dito, a então Secretária e agora também Superintendente, nada mais é que sua CÔNJUGE.

Além dos citados, tem-se notícias que outros familiares são detentores de cargos na administração, tais como: REGINALDO PEREIRA DA COSTA SEGUNDO, seu FILHO, FLÁVIO FREDERICO DA COSTA SANTOS, seu SOBRINHO, e VINÍCIOS GERMANO PEREIRA DA COSTA ARAÚJO, seu SOBRINHO.

7.1 Contratação de "Codificados"


Aqui se abre um sub-tópico para tratar de uma "forma de contratação" no mínimo, inusitada, com nítido espeque de burlar a Constituição Federal. Tratam-se do que se convencionou chamar de "codificados", que são pessoas que recebem verbas do ente público sem ter com este qualquer tipo de vínculo jurídico, com o intuito de não ultrapassar o limite com pessoal prevista na LC federal n. 101/00.

Tal prática, lamentavelmente, tornou-se comum no Estado da Paraíba, muito em razão da inércia (porque não dizer complacência) do Tribunal de Contas do Estado e do Ministério Público Estadual e da insistência dos gestores em transgredir a lei. Nada obstante sua recorrência, isso não diminui a reprovabilidade da conduta.

Os "codificados" não se enquadram na condição de agentes comissionados (art. 37, inciso V, CRFB), muito menos como agentes ocupantes de função temporária (art. 37, inciso IX, CRFB). Recebem unicamente por meio de seu CPF, sem que seja contabilizado como gasto com pessoal. São anomalias jurídicas advindas da incrível criatividade desonesta de nossos gestores.

Não bastasse a irregularidade da "contratação", por si só condenável, o Prefeito do Município de Santa Rita se utiliza do expediente para abrigar parentes. Nada obstante inexistir essa fórmula de vínculo com o Poder Público municipal, não deixa de configurar prática de nepotismo, já que se utiliza de expedientes públicos para favorecer patrimonialmente seus parentes.

Estão nessa condição o Sra. DIANA GONÇALVES DE MELO ARAÚJO (inscrita no CPF sob o n. 854.064.654-49), que é SOBRINHA do Prefeito; DANUSA GONÇALVES DE MELO (inscrita no CPF sob o n. 854.063.764-20), que é irmã da Sra. Diana e, portanto, SOBRINHA do Prefeito; VALDELITO DA SILVA ARAÚJO (inscrito no CPF sob o n. 788.585.854-53), que é CÔNJUGE da Sra. Diana; GERMANA GABRIELA PEREIRA DA COSTA ARAÚJO (inscrita no CPF sob o n. 072.041.434-26), que é SOBRINHA do Prefeito; e a Sra. EDNA MARIA CLAUDINO PEREIRA (inscrita no CPF sob o n. 333.114.394-49), que é SOBRINHA do Prefeito.

7.2 Dispensa de licitação para parente

Conforme Licitação de n. 000672013, foi firmado um Contrato de Locação de imóvel destinado ao funcionamento do Conselho Tutela, com dispensa de licitação, nos termos do art. 24, inciso X, da Lei Federal n. 8.666/93. O imóvel escolhido, coincidência ou não, é do Sr. JOSÉ INÁCIO DA SILVA, que é CÔNJUGE DA IRMÃ do Prefeito.

Diante da recorrência da com que o Prefeito do Município de Santa Rita promove ações para beneficiar seus parentes, é razoável concluir sobre a possibilidade de ter havido, também neste caso, um benefício ao Sr. José, favorecendo-o com a locação de um imóvel por R$ 18.000,00 (dezoito mil reais), gozando de dispensa licitatória.

O Tribunal de Contas da União, no Acórdão nº 607/11-TCU/Plenário traz uma postura rigorosa no combate ao favorecimento de parentes em licitações. Analisando uma Representação interposta pela Câmara Municipal de Marataízes/ES, a Egrégia Corte de Contas federal concluiu que a contratação de empresa pertencente ao sobrinho do prefeito fere os princípios da Moralidade e da Isonomia, observe-se:

Assevero que a irregularidade verificada no item 3.4 acima afronta os princípios constitucionais da moralidade e da impessoalidade que devem orientar a atuação da Administração Pública e, mesmo que a Lei nº 8.666, de 1993, não possua dispositivo vedando expressamente a participação de parentes em licitações em que o servidor público atue na condição de autoridade responsável pela homologação do certame, vê-se que foi essa a intenção axiológica do legislador ao estabelecer o art. 9º dessa Lei, em especial nos §§ 3º e 4º, vedando a prática de conflito de interesse nas licitações públicas, ainda mais em casos como o ora apreciado em que se promoveu a contratação de empresa do sobrinho do prefeito mediante convite em que apenas essa empresa compareceu ao certame. (grifou-se)

No precedente citado, é apontada a ilegitimidade na contratação, mesmo após ter havido procedimento licitatório. Maior gravidade, então, goza a situação ocorrida no Município de Santa Rita, pela licitação acima referida, já que não houve nem sequer a licitação, tendo sido escolhido o imóvel de propriedade do SOBRINHO do prefeito por meio de dispensa do procedimento licitatório.

É razoável se concluir que a dispensa de licitação para parentes afronta, igualmente à nomeação para cargos, os princípios da moralidade e impessoalidade. Tal impedimento também pode ser extraído dos §§ 3º e 4º, do art. 9, da Lei n. 8.666/93, concluindo pela vedação a participação de parentes em licitações em que o servidor público possa influir diretamente.

Da mesma forma, tem-se notícia que idêntica situação ocorre com um imóvel de propriedade da Sra. MARIA DE LOURDES PEREIRA DA COSTA, que é IRMÃ do Prefeito, incorrendo nas mesmas restrições acima relatadas, de modo que a contratação de locação do imóvel de propriedade de sua irmã também configura prática de nepotismo.

GRAUS DE PARENTESCO PARA FINS DE NEPOTISMO
(Autoridade Nomeante e Cônjuge)


FORMAS DE PARENTESCO
GRAUS DE PARENTESCO

1º GRAU
2º GRAU
3º GRAU

Parentes Consanguíneos

Em linha reta

Ascendentes
PAIS (INCLUSIVE MADASTRA E PADASTRO)

AVÓS

BISAVÓS


Descendente
FILHOS
NETOS
BISNETOS

Em linha colateral



IRMÃOS
TIOS E SOBRINHOS
(E SEUS CÔNJUGES)

Parentes por Afinidade

Em linha reta

Ascendentes
SOGROS (INCLUSIVE MADASTRA E PADASTRO DO CÔNJUGE OU COMPANHEIRO)

AVÓS DO CÔNJUGE OU COMPANHEIRO

BISAVÓS DO CÔNJUGE OU COMPANHEIRO



Descendente
ENTEADOS, GENROS, NORAS (INCLUSIVE DO CÔNJUGE OU COMPANHEIRO)
NETOS (EXCLUSIVOS DO CÔNJUGE OU COMPANHEIRO)
BISNETOS (EXCLUSIVOS DO CÔNJUGE OU COMPANHEIRO)


Em linha colateral



CUNHADOS (IRMÃOS DO CÔNJUGE OU COMPANHEIRO)

TIOS E SOBRINHOS DO CÔNJUGE OU COMPANHEIRO (E SEUS CÔNJUGES)

Observação: o cônjuge ou companheiro, embora não seja considerado parente, encontra-se sujeito às vedações contidas na Súmula Vinculante nº 13 do Supremo Tribunal Federal.

7.3 Conclusão

Resta a inafastável a prática reiterada de nepotismo. O Prefeito Constitucional de Santa Rita, o Sr. Reginaldo Pereira da Costa, utiliza-se das atribuições e competências do cargo que ocupa para beneficiar deliberadamente seus parentes, seja nomeando-os para os cargos da administração, contratando como "codificados" ou os beneficiando em licitações, por meio de dispensa.

É lamentável que, passados mais de 20 anos da promulgação da Constituição Cidadã os gestores públicos insistam em manter uma relação perniciosa entre a função pública e os desejos e sentimentos subjetivos, abusando da discricionariedade de que gozam para violar os princípios republicanos e privilegiar anseios privados em detrimento do interesse público.

8. Fundamentos do pedido de cassação. Nepotismo como infração político-administrativa.

O Acusado, na condição de Prefeito Constitucional do Município de Santa Rita, está sujeito à cassação, nos termos do Decreto-Lei de n. 201/1967. Além da imputação da Notícia Crime de n. 999.2013.002.388-3/001, realizada pelo Ministério Público do Estado da Paraíba, nos termos do art. 1º, V, XIII e XIV, do referido decreto-lei, o Acusado está sujeito também às cominações do art. 4º, VI, VII e X, do mesmo decreto-lei.

Há, realmente, na conduta do Acusado, enquanto Prefeito Constitucional do Município de Santa Rita, elementos que evidenciam com clareza solar a prática de infração político-administrativa, considerando a competência desta Casa Legislativa para julgamento do Chefe do Poder Executivo, na forma do art. 59 da Lei Orgânica do Município, combinado com o art. 4º do Decreto-Lei de n. 201/1967.

Sob este aspecto, tem-se que o Acusado incorreu nas infrações político-administrativas previstas nos incisos VII e X do citado art. 4º do Decreto-Lei de n. 201/1967. Especificamente, o Acusado incorreu em: a) prática de ato de sua competência contra expressa disposição de lei; e b) agir de modo incompatível com a dignidade e o decoro do cargo. Observa a demonstração de cada ocorrência:

8.1 Prática de ato de sua competência contra expressa disposição de lei

Uma das imputações da ação penal ajuizada contra o Acusado, pelo Ministério Público do Estado da Paraíba, foi a de nomear, admitir ou designar servidor, contra expressa disposição de lei, segundo o disposto no art. 1º, XIII, do Decreto-Lei de n. 201/1967. Isto porque, ao editar a Medida Provisória de n. 001/2013, para justificar as nomeações ilegais, o Acusado não só exorbitou de sua esfera de poder, como praticou ato contrário à lei.

Trata-se da conduta prevista no art. 4º, VII, do Decreto-Lei de n. 201/1967, portanto, infração político-administrativa. Sobre este dispositivo, FAZZIO JUNIOR disserta que a regra ali prevista trata de duas modalidades de afronta à lei. A primeira, ativa, mediante ato consistente "em usar da competência para afrontar à (sic) lei" (2007: p. 187); a segunda, passiva, "que se traduz pela omissão de ato de ofício" (2007: idem).
Praticar, contra expressa disposição de lei, ato de sua competência ou omitir-se na sua prática, neste sentido, consistirá na atuação ou omissão do Prefeito contra legem, quando em atuação no âmbito do exercício de sua competência. Como ainda especifica FAZZIO JUNIOR, "[p]ara que se verifique a infração político-administrativa (...), é imprescindível que o fato esteja relacionado entre as funções do Prefeito" (2007: p. 188).

Segundo dispõe a cabeça do art. 37 da Constituição Federal, "a administração pública, direta e indireta, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (...)".

Como visto, a nomeação de parentes para ocuparem cargos de confiança, mesmo que de natureza política, quando não há um mínimo de pertinência entre as qualificações do nomeado e a função que será exercida, viola diretamente o princípio da moralidade, de modo que tal conduta se enquadra na hipótese do art. 4º, VII, do Decreto-Lei de n. 201/1967.

Segundo a Constituição do Estado da Paraíba, inciso IIV, §8º, do art. 22, dentre as competências do Prefeito está a de nomear, privativamente, os secretários municipais. A Lei Orgânica do Município de Santa Rita, a partir do fundamento de validade constitucional, atribuiu ao Prefeito, nos termos dos artigos 60, cabeça, a competência nomear secretários municipais.

Fica claro, diante das competências atribuídas ao Acusado, na condição de Prefeito Constitucional, que seu ato de nomear, no âmbito de sua competência executiva, de forma deliberada e desonesta, inúmeros parentes para ocuparem diversos cargos na administração, apenas com o fundamento de beneficiar pessoas que lhe sejam próximas, configura prática de nepotismo, o que é vedado pelos princípios constantes no art. 37 da CF.

Primeiro, porque se tratou de ato comissivo (é preciso ser redundante); segundo, porque se tratou de conduta vinculada à competência privativa do Prefeito, na forma do art. 22, §8º, IIV, da Constituição do Estado da Paraíba, que é fundamento de validade do art. 60, da Lei Orgânica do Município; e terceiro, porque foi ato contra expressa disposição de lei, segundo o dispositivo constitucional já mencionados.

Crê-se, por estas razões, que há motivo suficiente para cassar o mandato do Acusado, determinando-se, desde que cumprido o art. 59, §1º e II, da Lei Orgânica do Município, o seu afastamento imediato, até que seja julgado o mérito do presente processo de cassação. E este afastamento, segundo referenciada disposição da Lei Orgânica, dá-se com fundamento de validade no art. 86 da Constituição Federal-.

8.2 Agir de modo incompatível com a dignidade e o decoro do cargo

Além da incursão no inciso VII do art. 4º, do Decreto-Lei de n. 201/1967, o Acusado também está incurso na conduta do inciso X do referido dispositivo. Com efeito, utilizar-se do cargo para beneficiar deliberadamente parentes próximos ou pessoas que lhe sejam afins, apenas por gozarem dessa característica, revela conduta revela conduta reprovável com a dignidade do cargo.

Mesmo que a definição de dignidade e decoro seja volátil, como acentua FAZZIO JUNIOR, é certo dizer, segundo BERNARDI, que "deve o Prefeito evitar o cometimento de atos escandalosos, que despertem a repulsa da comunidade, ou publicamente insultuosos a outros poderes, autoridades ou cidadãos" (1962: p. 63). Infringir este dever implica em incursão no art. 4º, X, do Decreto-Lei de n. 201/1967.

A conduta imoral, senão escandalosa, do Acusado, de nomear quase que a totalidade de seus parentes para exercerem funções na administração direta configura um escândalo, pois retrata a total falta de pudor e probidade com a coisa pública, demonstrando que a intenção do gestor é tão somente beneficiar as pessoas que lhe sejam caras, ignorando o interesse público.

Resta claro que o gestor usufrui deliberadamente de suas funções com fins particulares. Além disso, o sentimento de "propriedade" sobre o cargo que ocupa é tamanho, de modo que lhe permite, inclusive, externa-lo publicamente. Segundo o Prefeito:

"Tenho que dizer aos jornalistas e radialistas o que é nepotismo. É quando você coloca num quadro de confiança, os parentes que não sabem trabalhar, e pensam apenar em roubar e enricar. No secretariado, pode inserir filho, mulher, cunhado, enfim só não pode roubar" (Reginaldo Pereira, em entrevista a um veículo de comunicação)

A infeliz declaração acima relatada apenas ratifica o desconhecimento do Acusado sobre os deveres inerentes ao cargo que ocupa. Como se viu, a condição de prefeito não lhe permite usufruir, em benefício próprio, das competências institucionais. A visão de que a nomeação de parentes, apenas por essa característica, para cargos políticos é uma visão absolutamente errada e dissociada do ordenamento jurídico administrativo, como se mostrou acima.

A análise do caso concreto permite uma conclusão irrefutável de que houve prática de nepotismo, e sua declaração desinibida apenas ratifica suas reais intenções, já que não se concebe que em um Município com 121.994 (cento e vinte um mil, novecentos e noventa e quatro habitantes) , apenas os parentes do Acusado dispõem de aptidão para exercerem os cargos a que foram nomeados, de modo que esta consumada a conduta tipificada no art. 4º, X, do Decreto-Lei de n. 201/1967, motivo porque deve ter seu mandato cassado!

INDICAÇÃO DAS PROVAS

Em cumprimento ao disposto no Decreto-Lei de n. 201/1967, art. 5º, e no Regimento Interno desta Câmara Legislativa, apresenta-se com esta Denúncia as seguintes provas, a formarem o acervo probatório das acusações contra o Acusado, para o fim de lhe cassar o mandato de Prefeito Constitucional, haja vista a prática de ato de sua competência contra legem, e conduta incompatível com a dignidade e decoro do cargo:

a) cópia de diários oficiais do Município que noticiam as nomeações dos parentes;

b) cópia de documentos que demonstram o grau de parentesco dos nomeados com o Acusado; e

c) cópia das Leis Municipais de n. 997/2001 e de n. 1.324/2008, que regem a estrutura administrativa e dispõe a respeito dos cargos em comissão da Administração do Município de Santa Rita.

Além dessas provas, já colacionadas, outras que a Comissão Processante crer convenientes para o escorreito julgamento do processo, isto é, para o fim de cassação do mandato do Acusado, como Prefeito Constitucional do Município de Santa Rita.

PEDIDO

Diante do exposto, peço a esta Presidência, na forma do art. 5º do Decreto-Lei de n. 201/1967, que:

a presente DENÚNCIA seja lida em sessão;

b) sejam colhidos os votos dos parlamentares presentes, sobre o recebimento da DENUNCIA;

c) uma vez acolhida a DENÚNCIA, constituir comissão processante, na forma do citado decreto e do Regimento Interno desta Casa Legislativa, para iniciar o processo de afastamento do Acusado, e, após o contraditório e a ampla defesa, decidir, no prazo de 90 (noventa) dias, pela CASSAÇÃO DO MANDATO.

Nesses termos, pede deferimento.

Santa Rita, 18 de fevereiro de 2014.


MARCOS JOSÉ FERRAZ CABRAL
Título Eleitoral de n. 6137612/28, Zona Eleitoral de n. 002, Seção 36

































DOCUMENTO 01


















Cópia de diários oficiais do Município que noticiam as nomeações dos parentes





DOCUMENTO 02



















Cópia de documentos que demonstram o grau de parentesco dos nomeados com o Acusado



DOCUMENTO 03



















Cópia das Leis Municipais de n. 997/2001 e de n. 1.324/2008, que regem a estrutura administrativa e dispõe a respeito dos cargos em comissão da Administração do Município de Santa Rita

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