Notas para o ensino do presente do conjuntivo

June 24, 2017 | Autor: Pedro Marques | Categoria: Portuguese as a Foreign Language, Grammar, Portuguese grammar
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Trabalho escrito para a Formação Metodologias e Conhecimento da Língua, dias 18, 19 e 20 de Fevereiro, orientada pelo Professor Doutor João Costa
Notas para o ensino do presente do conjuntivo
Pedro Marques
Uma das coisas, que, a mim, mais me agradam e que eu gostaria de fazer era corromper o mais possível a língua. A primeira condição para escrever bem é saber gramática, a segunda é esquecê-la. Em tudo quanto se ama há o desejo de corromper. Corromper no bom sentido, de estragar descobrindo.
(José Cardoso Pires, entrevista a Ana Sousa Dias in Público-Magazine, 19 / 06 /94, p.32 in VILELA, 1995, p.13)
Um uso ágil e criativo da língua depende em grande medida de uma consciência gramatical, isto é, um conhecimento das possibilidades que a língua oferece ou do seu grau de maleabilidade. Esta consciência gramatical, que se pode traduzir na imersão do falante nos mecanismos de funcionamento da língua, tira proveito de urna tensão permanente entre o uso instituído e a liberdade criativa. É significativo que Mário Vilela inicie a sua Gramática da Língua Portuguesa com uma citação de José Cardoso Pires em que se reconhece num determinado conhecimento gramatical o ponto de partida para uma produção discursiva mais eficaz e sofisticada.
A ausência de uma instrução gramatical explícita favorece a aquisição de uma linguagem fragmentada, agramatical e fossilizada, isto é, favorece a aquisição de uma linguagem excessivamente simplificada e baseada em fórmulas que limita, desde logo, quaisquer perspectivas de desenvolvimento de um nível elevado de proficiência na manipulação da língua e de a dominar na multiplicidade de usos que oferece. Podemos, neste caso, estar a contribuir para que o aluno se veja limitado ao manuseamento de uma linguagem familiar e / ou de uma variedade regional não utilizável em todas as situações sociais.
É clara a validade destas afirmações no contexto do Ensino Português no Estrangeiro mas fazem também sentido em contexto de ensino da língua materna. Muitas vezes, no decurso da minha prática pedagógica enquanto professor de língua materna, verifiquei que os alunos evidenciavam um contacto pouco consistente com a norma do português padrão, apresentando produções textuais em que se notavam interferências (não elaboradas) de outros níveis de língua e variedades. Detectava frequentemente nos textos dos alunos um conhecimento muito frágil da norma padrão e que se revelava a diversos níveis: sintáctico, morfológico ou fonético. Repare-se, por exemplo, nestes excertos de composições dos alunos: "não tem condições nenhumas em estudar", "para ele a escola é nem que um simples passatempo". "inresponsaver ou rasgabam". Nestes casos, a metodologia a adoptar pode passar por um confronto entre a variedade ou nível de língua em questão e o português padrão. A certa altura, nas minhas aulas, pedi aos alunos que indicassem um determinado número de advérbios e que, para cada um, construíssem uma frase. Apareceram bastantes construções do tipo "ele é altamente". Este revelou-se um momento oportuno para abordar este tipo de problemas, já que se precisaram os contextos em que esta construção é admissível ou não.
A que conceito do ensino da gramática podemos chegar? Um que inclua a descoberta por parte do aluno da língua como uma máquina com elementos flexíveis e adaptáveis às nossas intenções - e isto já é conhecimento gramatical. Além disso, a actividade de manipular a língua tem um grande potencial lúdico que pode ser aproveitado nas aulas.
O trabalho feito no decorrer da formação sobre o presente do conjuntivo tentou levar em conta estas reflexões (ver em anexo trabalho apresentado no final da formação). Os referidos elementos flexíveis que os alunos deviam aprender eram as terminações do presente do conjuntivo mas, antes de tudo, pretendia-se que os alunos reconhecessem alguns dos usos do tempo verbal. Tentámos assim partir de situações que exigissem o uso de fórmulas para referir situações hipotéticas e/ou desejáveis.

Situação 1 Situação 2 Situação 3


Situação 4 Situação 5 Sistematização
O primeiro passo é, perante a situação, pedir uma reacção/acção e aceitar todas as produções; o segundo passo é exigir uma fórmula com o infinitivo (é preciso...); o terceiro passo é exigir uma fórmula com o presente do conjuntivo (é preciso que...). Este processo torna-se possível porque a actividade foi pensada para um público de língua materna e/ou língua segunda. Na realidade, o publico com que lidamos apresenta uma variedade de situações:
O aluno não conhece e não produz o presente do conjuntivo.Consciência da existência da forma verbal mas incapacidade de a realizar.Facilidade em realizar as formas mais simples, especialmente verbos regulares. Dificuldade em realizar formas menos recorrentes.Facilidade em realizar o presente do conjuntivo. O aluno não conhece e não produz o presente do conjuntivo.Consciência da existência da forma verbal mas incapacidade de a realizar.Facilidade em realizar as formas mais simples, especialmente verbos regulares. Dificuldade em realizar formas menos recorrentes.Facilidade em realizar o presente do conjuntivo.

O aluno não
conhece e não
produz o
presente do
conjuntivo.
Consciência da
existência da
forma verbal
mas
incapacidade
de a realizar.
Facilidade em
realizar as formas
mais simples,
especialmente
verbos regulares.
Dificuldade em
realizar formas
menos recorrentes.
Facilidade em
realizar o
presente do
conjuntivo.

O aluno não
conhece e não
produz o
presente do
conjuntivo.
Consciência da
existência da
forma verbal
mas
incapacidade
de a realizar.
Facilidade em
realizar as formas
mais simples,
especialmente
verbos regulares.
Dificuldade em
realizar formas
menos recorrentes.
Facilidade em
realizar o
presente do
conjuntivo.
Esta variedade de situações permite-nos tirar partido da consciência linguística dos alunos, o que seria impossível numa situação de aprendizagem da língua estrangeira. O que é interessante verificar é que os alunos começam desde logo a fazer tentativas de formação do presente do conjuntivo (*é necessário que nós ganhamos/ganhimos/ ganhomos, etc). A fase de sistematização é assim um prolongamento destas tentativas dos alunos.
Não se pode esperar que, com esta sequência de actividades, os alunos passem a utilizar o presente do conjuntivo de forma totalmente produtiva. A aquisição de confiança no seu uso activo leva tempo e temos de contar com alguns fenómenos de inércia e resistência - alguns continuarão a ignorar o seu uso ou a fazê-lo de forma incipiente. Outros, num processo semelhante ao da hipercorreção, tentarão usá-lo a todo o custo, mesmo em relação a situações e contextos sintácticos onde o conjuntivo não é necessário. De qualquer forma, actividades deste género são um ponto de partida e um marco a podemos voltar sempre que se torne necessária a utilização do presente do conjuntivo.
ANEXO
Trabalho desenvolvido em conjunto com José Gomes, Ana Figueiredo, Olga Barradas, Helena Ferreira.


Atividade
O quê? Mobilização e estruturação de conhecimento gramatical implícito do uso do infinitivo e do conjuntivo.
Para quem? Alunos de B1/A Level
Descritores
O aluno é capaz de (Nível B1):
se referir a situações hipotéticas/desejáveis usando o infinitivo;
se referir a situações hipotéticas/desejáveis usando o conjuntivo
usar várias expressões que indiquem necessidade/desejo (é preciso, é essencial, faz falta, é necessário, X quer que, é fundamental).
Desafio
O que é preciso fazer nas seguintes situações?
Conhecimento prévio
Conhecimento vocabular relativo a temas explorados nas aulas anteriores;
Conhecimento do infinitivo dos verbos regulares e irregulares;
Conhecimento dos pronomes pessoais.
Dados
Material realista fornecido pelo professor utilizando linguagem informal que vai ao encontro dos conhecimentos dos alunos;
Exemplos de frases e imagens.
Uso do conhecimento implícito dos alunos
Conhecimento do infinitivo dos verbos regulares e irregulares;
Conhecimento dos pronomes pessoais.
Passos da actividade
1ª Fase - Apresentação e discussão de conceitos (vários exemplos seguindo os passos seguintes):
Associação de imagem a texto sumariado;
Discussão breve do contexto;
Apresentação da explicitação verbal escrita do texto sumariado;
Elaboração de texto oral usando exemplo de início de frase e demonstração de frase usando o infinitivo;
Elaboração de texto oral usando exemplo de início de frase e demonstração de frase usando o conjuntivo.
2ª Fase - Reforço e treino do presente do conjuntivo
Exploração de verbo regular da 1ª conjugação (limpar) nas várias pessoas do singular e do plural, através do uso de Imagens e diálogo para completar, usando material criado pelo professor em .ppt (a atividade é apresentada seguindo um modelo de scaffolding das formas verbais a utilizar).
Exploração de verbos regulares da 2ª e 3ª conjugações: Associação de elementos de frases, utilizando os tempos verbais explorados acima. Trabalho em pequeno grupo para reconstrução de frases. A actividade é efetuada seguindo um modelo de peer-support para exploração do conhecimento adquirido/implícito das formas verbais a utilizar.

Coluna A

É necessário que eu
Convém que tu
É essencial que ele
É preciso que nós
Faz falta que vocês
É preciso que eles
O Hipólito quer que ela
É necessário que eu
Convém que tu
É essencial que ele
É preciso que nós
Faz falta que vocês
É preciso que eles
Eles querem que o Hipólito

Coluna B

Varra este chão imundo.
Varras o teu quarto.
Varra o lixo que fez.
Varramos as folhas do quintal!
Varram a cantina.
Varram o lixo para debaixo do tapete.
Varra o tapete.
Parta a louça.
Partas os copos.
Parta a pizza ao meio.
Partamos o bolo.
Partam o pão.
Partam o mealheiro.
Parta as trombas ao Gaspar.
3ª Fase - Treino do conhecimento adquirido do presente do conjuntivo:
Serás capaz de inventar a informação que falta para completar as frases. Usa os verbos Amar, Comer, Subir.

É necessário que eu
Convém que tu
É essencial que ele
É preciso que nós
Faz falta que vocês
É preciso que eles
Eu gosto que tu
É necessário que eu
Convém que tu
É essencial que ele
É preciso que nós
Faz falta que vocês
É preciso que eles
Ela quer que

4ª Fase - Avaliação
Das seguintes frases, identifica as que estiverem corretas. Corrige as que estiverem incorretas. Segue o exemplo.

O João quer que a mãe lhe compre uns 'Nikes'.
O Pedro precisa que o professor ajudar com os trabalhos. X O Pedro precisa que o professor ajude com os trabalhos.
Faz falta que vocês comprar leite.
É necessário que eu faça o jantar?
Ela quer que ele vai para casa.
Nós necessitamos de terminar o trabalho.
Convém que eu vou para casa cedo.
A Rita quer que nós partemos o chouriço.
Precisamos que o professor acabe a aula mais cedo.
Eles querem que nós compramos os bilhetes.
É importante que fazemos exercício físico.

5ª Fase - Auto-avaliação
Sou capaz de:
Usar o infinitivo para me referir a situações hipotéticas e/ou desejáveis
Identificar quando o infinitivo é utilizado incorretamente
Identificar quando tenho de utilizar o conjuntivo
Identificar quando o conjuntivo é conjugado incorretamente
Usar o conjuntivo para me referir a situações hipotéticas e/ou desejáveis
Sinto-me confiante a usar o conjuntivo.
Ainda tenho alguma dificuldade a usar o conjuntivo
Não percebo nada disto.



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