Nuances da experiência narrativa contemporânea: a franquia Tron e a fronteira digital

July 24, 2017 | Autor: M. Aquino Bittenc... | Categoria: Narrative, Cinema, Media Convergence, Movies, Narrativas, Convergência Midiática
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Nuances da Experiência Narrativa Contemporânea: a franquia Tron e a Fronteira Digital Paula Puhl1 Maria Clara Aquino Bittencourt2 Thiago Falcão3 "I started my career at Encom as a programmer. My head down, writing and re-writing code, and figuring out ways to stop people from stealing our games." 4 Alan Bradley, Coletiva da Encom5, SF Wondercon 2010.

Embora Alan Bradley interpretado pelo ator Bruce Boxleitner seja um personagem da franquia Tron, da Walt Disney Pictures, a fala acima não pertence aos filmes - Tron (1982)6; Tron: Legacy (2010)7 - que, até então constituem este universo. Ela também não pertence aos jogos eletrônicos inspirados pela temática, ou às histórias em quadrinhos que derivaram destes. Na animação para TV - Tron: Uprising (2012)8 - o personagem de Bruce Boxleitner sequer figura. A questão principal a se ensejar de antemão - antes de qualquer elaboração teórica acerca do universo do qual nos aproximamos - diz respeito, de forma muito simples, a "onde então, se 1Doutora e Mestre em Comunicação Social pela PUCRS. Professora do Curso de Comunicação Social e no Curso Superior de Tecnologia em Produção Audiovisual na mesma universidade. Pesquisadora da Fapergs. Diretora Regional Sul da Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação e pertence ao GIPTELE Grupo Interinstitucional de Pesquisa em Telejornalismo (UFSC).

2Doutora e Mestre em Comunicação e Informação UFRGS. É pós-doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação na (UNISINOS)

3Doutorando e mestre em Comunicação e Cultura Contemporâneas pela UFBA. Membro do Grupo de Pesquisa em Interações, Tecnologias Digitais e Sociedade (GITS) e do Grupo de Pesquisa em Cibercidades (GPC) na mesma universidade.

4Tradução livre dos autores: "Eu comecei minha carreira na Encom como um programador. Cabeça baixa, escrevendo e reescrevendo código e encontrando maneiras de evitar que as pessoas roubassem nossos jogos."

5 Empresa ficcional produtora de programas e softwares que está presente na história dos filmes da franquia Tron. 6 Ficha técnica do filme disponível em: http://www.imdb.com/title/tt0084827/. Acesso em maio de 2013. 7 Ficha técnica do filme disponível em: http://www.imdb.com/title/tt1104001/. Acesso em maio de 2013. 8 Ficha técnica do filme disponível em: http://www.imdb.com/title/tt1812523/Acesso em maio de 2013.

encontra esta fala?". A resposta, ao mesmo tempo que possui um mecanismo generativo muito rico, apontando para novos meios através dos quais podemos experimentar narrativas, também põe em xeque nosso entendimento dos meios tradicionais - e aqui de pouco adianta se debruçar sobre a premissa de que os novos meios de comunicação apenas ressignificam os meios com os quais já estamos acostumados. Retornando ao questionamento anterior, a fala de Alan Bradley é parte de um Alternate Reality Game - ou, em português, Jogo de Realidade Alternativa - um ARG. Um construto que, ao mesmo tempo em que é um veículo completamente único para o experimento de narrativas, se comunica de forma muito veemente com os demais aspectos da franquia ou do universo em questão. Um produto midiático que está intimamente ligado tanto ao aspecto narrativo mais nuclear de uma obra, quanto ao seu aspecto paratextual: um produto que, ao mesmo tempo em que é central, a partir do princípio em que oferece informações que não estão contidas na mídia mais central - o filme - é periférico e desimportante, uma vez que não passa de estratégia promocional - marketing - da franquia (MCGONIGAL, 2011; MURRAY, 2003). Claro, afirmações como as do parágrafo acima colocam em evidência a fluidez do espectro midiático com a qual produtores e consumidores lidam nos dias de hoje. Não se trata apenas daquilo que podemos chamar de novos meios de experimentação de narrativas - o problema vai além da simples rotulação dessas transformações como inovação. Surgem questões acerca da própria noção de 'obra'. A palavra franquia, usada na Wikipedia, por exemplo, para descrever uma dezena de universos que se espalham pelas mais diversas materialidades (filme, séries de TV, animações, quadrinhos, mangás, jogos eletrônicos e etc.) é um sintoma de que, se já foi, um dia, hoje não é mais possível identificar o núcleo de uma obra. Ao invés disso, somos forçados a nos render ao pensamento de Peter Lunenfeld (1999), para quem a experiência estética contemporânea é, por essência, incompleta. Para o pensador, nenhum texto é central, nenhum texto é periférico. Tudo é paratexto: tudo é veículo e vetor de experiência. E é precisamente sobre esta problemática que este capítulo se debruça. A questão acerca do consumo de uma franquia qualquer enseja outro problema que deve ser introduzido antes que partamos para explicações de ordem mais técnica a respeito dos pontos levantados: além do fato de lidarmos, nos dias de hoje, com esta ideia de incompletude, de falta de centralidade na experiência narrativa, seja esta fruto de uma (est)ética da incompletude ou da infame cultura da convergência, algumas narrativas contemporâneas trabalham precisamente no sentido de desfazer a ilusão de que a diegese é um outro lugar. Este dissolver de fronteiras não é

o simples microfone que vaza em algum plano e lembra à plateia que tudo ao que eles assistem não passa de fumaça e espelhos; que busca a função de "realidade – não é, também, o encarar a lente do personagem Ferris Bueller no filme Curtindo a vida Adoidado9 ou de Woody Allen tributários, ambos, do autor que conversa com seu leitor e apresentam o ponto de vista de uma personagem inserida na diegese. Esta visão da personagem resulta na restrição dos elementos informativos a relatar, em função do conhecimento que ela possui, ou seja, ela passa a ser o sujeito da focalização narrativa, funcionando como um filtro quantitativo e qualitativo que rege a representação narrativa. Não. O rompimento dessas fronteiras vem revestido de um algo mais - algo que pode estar inevitavelmente ligado ao momento em que esses produtos são desenvolvidos, evocando o que Angela Ndalianis (2004) identifica como uma estética neo-barroca que busca estabelecer o movimento inverso do que sempre se sonhou, em se contemplando o cinema voltado para o mainstream: ao invés de transportar o espectador para o dentro dos universos, dos mundos ficcionais - em atrações de parques temáticos, por exemplo, onde estes consumidores podem esquecer, por alguns momentos, de seu dia a dia, se pondo no lugar de seus heróis - essas experiências baseadas em jogos buscam integrar o mundo ficcional ao que pode ser chamado de 'mundo real', trazendo elementos da diegese para o cotidiano, para o urbano, fazendo com que quaisquer indivíduos possam fazer parte da ficção não por assumirem o papel de protagonistas, mas por imprimirem selves reais a histórias em desenvolvimento. O objetivo deste capítulo, portanto, é o de problematizar estas alçadas da experiência narrativa contemporânea, criticando tanto a ideia de centralidade ou marginalidade de uma obra com relação a uma franquia - nos aproveitando, para tanto, da noção de convergência (JENKINS, 2008; POOL, 1993; JENSEN 2010) quanto nos debruçando sobre a noção de diegese (GENETTE, S.d, 1988, 1997; REUTER, 1995), a fim de visualizarmos como esta se mostra, nos dias de hoje, fluida, penetrável; e como as experiências provenientes desta nem sempre se organizam de acordo com a tradicional lógica de uma audiência ativa - mas demandam, daqueles que a consomem ações efetivas para que uma dada narrativa possa se desenrolar. A franquia Tron, portanto, há de servir como objeto para que estas considerações sejam empreendidas, pois no que tange tanto ao seu diálogo para com a noção de convergência quanto para com a tentativa de dissolver a sensação de suspensão de descrença, este universo se apresenta como promissor, 9 Titulo original: Ferris Bueller's Day Off (1986). Ferris Bueller foi interpretado por Matthew Broderick. Informações disponíveis em: http://www.imdb.com/title/tt0091042/ Acesso em maio de 2013.

portador de vários casos nos quais o consumidor não figura passivamente como alguém que meramente interpreta e recebe a obra, mas como alguém que efetivamente age para que a narrativa evolua. Antes que possamos nos ocupar de tal consideração, contudo, há um percurso teórico a ser trilhado - e este diz respeito a elucidar conceitos e as relações que estes guardam entre si. Havemos de empreender, inicialmente, uma breve revisão acerca da noção de convergência, que servirá de preâmbulo para uma discussão crítica a respeito da noção de transmídia - que naturalmente evoca a ideia de paratextualidade. Esta, por sua vez, deve dar vazão à discussão sobre a experiência diegética e sua relação com a ideia de suspensão de descrença - o que, por fim, nos levará a uma análise de um produto da franquia em específico: o ARG Flynn Lives, no qual apesar de distante do que pode ser considerado o centro da obra, podemos identificar algumas das mais interessantes características de sua experiência narrativa. Reflexões sobre convergência: forma e conteúdo no fluxo narrativo As transformações na indústria audiovisual referentes aos processos de produção, circulação e consumo de conteúdos, se desenrolam ao mesmo tempo em que se discute a abrangência do conceito de convergência no campo da Comunicação. A produção teórica sobre a convergência divide-se entre posicionamentos que abordam o fenômeno como a reunião de diversas mídias em um único ambiente ou dispositivo, e argumentações que além desse caráter técnico, consideram aspectos sociais e culturais na constituição do fenômeno (JENKINS, 2008; POOL; 1993; JENSEN, 2010, entre outros). Para pensar a convergência no âmbito do cinema, entende-se que tanto aspectos técnicos, quanto sociais e culturais devem ser analisados a partir de Aquino Bittencourt (2012) para que uma reflexão sobre o tema possa ser tensionada. O atual contexto das produções cinematográficas se apresenta como convergente no sentido de que, assim como desde as primeiras manifestações cinematográficas que já apresentavam influências de outros formatos comunicacionais, como a pintura, o teatro, por exemplo, as produções recentes cada vez mais incorporam uma mistura de linguagens e formatos que impactam não apenas a produção de franquias cinematográficas, mas toda a dinâmica técnica, social e cultural das relações estabelecidas entre produtores e consumidores nos processos de circulação e consumo de filmes. Para Fragoso (2005, online), todas as mídias resultam de formatos híbridos de linguagens e Santaella (2003) lembra que, no início dos anos 80, se percebe uma intensificação das misturas entre linguagens e meios, misturas que ela afirma

terem funcionado como um multiplicador de mídias. Tal multiplicação gerou a produção de mensagens híbridas, bem como de equipamentos e dispositivos que caracterizaram o que ela chamou de cultura do disponível e do transitório, em função de fotocopiadoras, videocassetes, videogames e TV a cabo, entre outras tecnologias. A escolha e o consumo individualizados foram propiciados por equipamentos e linguagens criados para circularem nessas tecnologias, constituindo o que ela chamou de cultura das mídias. A partir daí, Santaella (2003) diz que o comportamento dos indivíduos se alterou em termos de busca de informação e entretenimento; através dessas tecnologias os indivíduos começaram a abandonar a “inércia da recepção”, tornando-se consumidores ativos na busca por conteúdo. Diante desse cenário, ainda encontramos poucos estudos que buscam entender como a convergência vem sendo tomada como estratégia para que a narrativa de um produto cinematográfico seja experenciada em um contexto mais local e menos distante, pessoalizando a relação do consumidor com o produto. Tais esforços buscam trazer a experiência da diegese para o plano do espectador, fazendo com que ele atue de forma mais ativa na experiência de consumo. Nesse sentido, Bulhões (2009) ao tratar da presença das ficções nas mídias, acredita que o uso de novos dispositivos técnicos colabora e pontencializa o atributo mais antigo do discurso ficcional junto aos seus espectadores - a fantasia de estar presente em um mundo imaginário. Morin (1997) relaciona as estruturas das imagens do cinema com a estrutura da magia e afirma o parentesco entre esses dois universos do filme e do sonho. O cinema, segundo Morin (1997,p. 98-99) era nomeado por ideias como "fábrica de sonhos"; na Psicanálise, psicólogos e psicanalistas ouviam de seus pacientes, frases como "É uma representação cinematográfica", "Eu não fazia nada, apenas, via como um filme", ou seja muitos individuos recorriam a palavra filme, para relacionar ao mundo dos sonhos, daquele do qual não se participava ativamente, e sim provocava inércia corporal. Essa analogia entre cinema e ficção como elementos do mundo estático e do sonho, se modifica nesse novo tempo em que a produção, circulação e consumo de conteúdos midiáticos, entre eles de ficção, é pensada a partir da lógica da participação não mais do público, pensado como "uma massa de iguais" e sim como usuário que é único, que quer participar e tornar esse "sonho ficcional" em experiência. De acordo com Corrêa e Lima (2009), o espectro da produção e consumo de informações é ampliado, com o surgimento e o uso crescente do que chamam 'mídias sociais', para qualquer cidadão capaz de interagir com ferramentas na web; e isso não é diferente no caso do cinema. Diante dessa reconfiguração dos processos de produção e consumo, há ainda que se pensar em

termos de circulação, visto que é nesse ambiente de fluxos que tal processo se realiza, através das alterações nos papéis de emissor e receptor. Os dois autores lembram que as bases da estrutura para produção e consumo de informação na sociedade são edificadas junto a geração de lucro, delimitado em um quadro formado por atores e agentes específicos, no qual os grandes conglomerados multimídia de abrangência transnacional predominam, dentro de um processo produtivo com padrões tecnológicos definidos e consolidados e sustentado na especialização de seus produtores, sendo assim capaz de reagir a qualquer tipo de alteração em sua estrutura. O lucro e a viabilidade dos negócios de informação digital passam também pela capacidade de geração de fluxos e trocas entre participantes de redes sociais, e não mais unicamente na concentração de tráfego/audiência num determinado ambiente informativo na rede (CORRÊA E LIMA, 2009). Inserido nesse contexto de fluxos dinâmico e marcado por aspectos de participação, interatividade e compartilhamento, Jenkins, Ford e Green (2013) explicam que é possível perceber o valor e o significado criados em diferentes economias que compõem o cenário midiático emergente. Utilizando a expressão “mídia de espalhamento”, os autores afirmam que hoje, o que não se espalha está morto, e comparam o contexto das audiências de massa com o atual contexto para pensar a circulação. A configuração que identificam hoje é a de um modelo híbrido de circulação, que mistura forças que vem de cima e de baixo e determinam como o material é compartilhado através de diferentes culturas por formas mais participativas. Os consumidores tem um papel mais participativo, criando, compartilhando e remixando conteúdos midiáticos. Dessa forma, a digitalização de processos, e o desenvolvimento da web e das tecnologias digitais de comunicação foram responsáveis por potencializar práticas anteriormente existentes, facilitando atividades e contribuindo para alterações nos comportamentos dos indivíduos, mas não foram pioneiras em reunir elementos e linguagens de comunicação. As interligações entre meios, linguagens e práticas comunicacionais iniciaram antes da configuração desse presente cenário digital, e o que mudou, e vem mudando, são os comportamentos dos indivíduos em torno dos conteúdos midiáticos. É um processo de mudança que se dá de maneira conjunta, num movimento de reciprocidade entre as transformações técnicas, sociais e culturais, já que decorrem das ações e apropriações dos indivíduos em torno de instrumentos técnicos e pelo desempenho de variados tipos de comportamentos a partir de usos diversos.

A diferenciação que Jenkins (2008) faz entre os termos participacao e interatividade é útil para se entender como se deu a evolução de uma postura passiva para outra mais ativa, pois gera um raciocínio sobre as mudanças sociais e culturais ocorridas desde as primeiras conexões entre meios, linguagens, dispositivos e práticas até o contexto atual, dito convergente. Jenkins (2008, p. 182) coloca a interatividade como o “modo como as novas tecnologias foram planejadas para responder ao feedback do consumidor”, assim que podem existir diferentes níveis de interatividade em função de cada tecnologia de comunicação. Já a participação é, segundo Jenkins (2008, p. 183), “moldada pelos protocolos culturais e sociais”, é mais ilimitada que a interatividade e controlada mais pelos consumidores dos produtos midiáticos que por seus produtores. Chagas (2010, online) atribui o anseio do indivíduo por participação à busca de outros meios para atuar de maneira mais ativa e afirma que foi na Internet que “encontrou espaço para 'falar', trocar informações e produzir conteúdo”. Essa integração tem um forte impacto no comportamento dos consumidores. Murray (2003) credita alterações do mesmo aos processos de digitalização da informação, afirmando que o que se percebe é a passagem de atividades sequenciais para atividades simultâneas. Se, no caso da televisão, por exemplo, antes o telespectador assistia ao conteúdo televisivo para depois interagir, hoje realiza as duas ações ao mesmo tempo - no caso do cinema, a recorrência, ainda que não seja simultânea, é verificável. Acompanhar o programa não é suficiente, explica Chagas (2010, online), o telespectador, também internauta, quer compartilhar sua opinião sobre a programação e o registro dessa opinião na web é o que legitima esse público cada vez mais ativo na mídia. A mudança no comportamento dos indivíduos na busca pelo conteúdo acaba tornando a experiência de consumo em algo que vai além de uma simples ida ao cinema. O consumo de um filme, assim como de outros produtos midiáticos não se resume apenas ao assistir, mas circular por outros meios e espaços midiáticos pelos quais se estende a narrativa. A transformação do hábito também influencia na produção da indústria cinematográfica, e vice versa. A multiplicidade de meios e espaços pelos quais a narrativa se desdobra hoje, ressignifica a produção, a circulação e o consumo do filme, que é fragmentado em diversos formatos midiáticos pelos quais circula e é compartilhado por seus consumidores. Essa ideia de narrativa transmidiática é compreendida por Jenkins (2008) como uma prática na qual a narrativa se desenrola por diferentes suportes midiáticos, de modo que cada texto é parte do todo. O autor cita como primeira experiência o filme Bruxa de Blair, de 1999,

que conquistou diversos fãs através da web, antes mesmos de chegar aos cinemas. Um site que foi lançado mais de um ano antes do filme, com informações de que membros do elenco central haviam desaparecido. As documentações disponibilizadas no site, um pseudodocumentário sobre a bruxa, exibido no Sci Fi Channel e o lançamento de quadrinhos - estes após o lançamento do filme - que se baseavam em supostos relatos de alguém que tinha encontrado a bruxa, construíram a atmosfera de realidade que atraiu os consumidores a se envolverem com a produção antes mesmo do que se poderia chamar de produto original fosse finalizado. Jenkins (2008) considera que o universo do filme acabou sendo considerado mais convincente pela reunião de tais elementos. Nesse sentido, entendemos que apenas o esforço em distribuir o conteúdo por múltiplos meios e suportes não concretiza a experiência de convergência, de acordo com o entendimento aqui adotado. Para que aspectos sociais e culturais se façam presentes no processo, é necessário incluir nas estratégias de espalhamento, possibilidades de engajamento e participação, no que tange a preceitos de interatividade, munindo o consumidor de possibilidades de ação ao longo do processo de consumo que se espalha por espaços diversos. Estimulados por essas motivações justificamos a escolha da franquia Tron, que será apresentada no item a seguir, por tentar extrapolar as fronteiras do cinema com a construção do ARG Flynn Lives10 ao longo do tempo de produção do filme Tron Legacy (2010). A narrativa fílmica Tron Pong, um dos primeiros jogos eletrônicos a chegarem ao mercado, ainda na década de 1970, foi o grande motivo pelo qual, em 1976, Steven Lisberger começou a produção de Tron, filme lançado em 1982 que recebeu elogios acerca das atuações nele contido e, naturalmente, aos seus efeitos visuais, mas que, no geral, deixou a desejar, para os críticos, no sentido de sua história: um programador era transportado para dentro de um mundo de software dentro de um computador - um mainframe - e uma vez lá dentro, precisava interagir com vários outros programas para tentar voltar ao "mundo real". A narrativa fílmica de Tron se inicia quando Flynn é demitido da ENCOM por Ed Dillinger (David Warner), que se apossou de vários projetos de video games que foram criados por Kevin Flynn, personagem de Jeff Bridges. Bridges interpreta o programador transportado 10 Site oficial do ARG Flynn Lives em: http://www.flynnlives.com/. Vídeo explicativo sobre o jogo, disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=H9G8Z4ewitQ. Acesso maio de 2013.

para o mundo virtual e que, uma vez dentro do mundo de código, passa a interagir com contrapartes de alguns de seus colegas de trabalho - os personagens de Bruce Boxleitner, Cindy Morgan e do próprio David Warner. Flynn tenta obter provas de ação de Dillinger enviando programas, mas é impedido pelo Master Control Program (MCP), uma inteligência artificial que controla o mainframe da ENCOM e busca o controle sobre outros mainframes também. Em um contexto político claramente mergulhado nas idas e vindas da Guerra Fria, Dillinger tenta parar o MCP após este revelar que suas intenções são invadir e ganhar o controle do Pentágono e do Kremlin, mas, ao mesmo tempo, o personagem de Warner é chantageado pelo MCP, que ameaça revelar à imprensa o plágio de jogos de Flynn - um enorme sucesso. Flynn, em seguida, é visitado por sua ex-namorada, Lora Baines (Cindy Morgan) e seu atual namorado Alan Bradley (Bruce Boxleitner), ambos engenheiros ENCOM, que pretendem avisá-lo que Dillinger sabe sobre suas tentativas de invasão e reforçou a segurança, Flynn convence-os a deixá-lo entrar no edifício da ENCOM. Lá, ele forja uma maior permissão de segurança para o programa de Bradley, "Tron", que iria acompanhar as comunicações entre o MCP e o mundo exterior, após o que o MCP utiliza um laser experimental para transferir Flynn para o mainframe ENCOM. Dentro do mainframe, os programas aparecem como os usuários humanos que os criaram, e utilizam sua arma - os discos de identidade - lançando os contra seus inimigos. Dentro do mundo digital, o MCP e seu segundo em comando - Sark (Warner) - buscam o controle dos sistemas de entrada e saída, e os programas que resistem a este 'reinado' são forçados a participar de jogos nos quais, no melhor estilo dos gladiadores romanos, os perdedores são executados. Preso por Sark, Flynn se encontra com Tron (Boxleitner) e com outro programa chamado Ram. Juntos, eles escapam de sua prisão em uma partida de light cycles - as motocicletas pelas quais a estética de Tron ficou conhecida - na qual Ram é ferido e morre, mas neste ínterim Flynn descobre que, como usuário, ele tem poderes sobre a realidade no mundo digital. Até então, Tron se construía apenas como mais uma narrativa de ficção científica, e uma que nem figura entre o rol de grandes narrativas do gênero. Com a decisão da Disney de produzir a continuação do filme - Tron: Legacy - e contando com o fato de inúmeros jogos eletrônicos terem sido lançados entre um filme e outro, as nuances do contexto de convergência foram imbuídas no universo digital, transformando peças midiáticas relativamente inspiradas - e independentes - entre si em uma franquia que possui coerência e cronologias próprias.

O que transforma a franquia Tron em algo que captura o interesse deste artigo está muito mais vinculado à alçada da produção de significado através de não apenas uma dissociação por outras mídias, mas da inclusão de espectadores e fãs na narrativa do universo. Uma das estratégias utilizadas para promover a sequência lançada em 2010 foi a criação de um ARG - um alternate reality game - que além de expandir o universo narrativamente, se desfaz da barreira entre o que pode ser chamado de realidade e o que pode ser chamado de ficção. O ARG assume um papel de paratexto , no sentido reapropriado por Lunenfeld (1999) da obra de Genette, com relação ao que está sendo desenvolvido no filme - que pode, de certa forma, ser considerado como a mídia "central" da franquia, dada a relação entre investimento e retorno. O ARG Flynn Lives Um Alternate Reality Game possui uma série de definições que, embora se posicionem sobre a natureza de jogo por este portada, estão, aparentemente, mais preocupadas em reafirmar a existência da categoria enquanto uma forma legítima de experimentação narrativa e como mídia, através da qual as nuances de uma história podem ser contadas. É necessário perceber que as duas pontuações, embora recaiam sobre a experiência narrativa, estão posicionadas sobre diferentes aspectos da experiência, e enquanto uma busca simplesmente o status de meio através do qual podem-se experimentar histórias, a outra busca um status muito superior, clamando por uma materialidade própria. Esta discussão a respeito da materialidade de um ARG, contudo, não se enquadra no escopo do presente capítulo, e deve ser apenas considerada para fins de didática. Não pretendemos adentrar as nuances materiais que compõem um jogo, estas são o suficiente, em especial por se manterem no status de mídia, aqui assinalamos uma peculiaridade na experimentação narrativa através de jogos que pode ser sublinhada por toda a literatura acerca do tema (AARSETH, 1997; MURRAY, 2003) , por exemplo. ARGs, para Christy Dena (2012, p. 157-158), são "uma variação do que Jenkins chama de narrativa transmidiática, na qual são oferecidos elementos próprios em uma variedade de plataformas e meios de comunicação" - o que ressalta o fato de que, mais que jogos - onde devem existir regras e perdedores / vencedores os Alternate Reality Games são dispositivos que servem como ponte para que partes de uma narrativa que não podem ser adequadamente mostradas em um filme ou série de TV, ainda assim possam ser experimentadas. Jogos como este funcionam a partir da premissa de uma história que é, na maioria das vezes, verossímil o suficiente para que seu ponto de entrada - o que o jargão chama de rabbit

hole, em alusão a tão famosa história de Lewis Carroll - se conecte com acontecimentos do mundo da vida. Nas palavras de Andrade (2012, p. 200), um "ARG (...) utiliza o potencial dos meios de comunicação, especialmente das mídias pervasivas, para criar uma forte impressão de realidade paralela". O universo diegético (Genette, 1988, p. 17), ou seja, aquele "universo espaço temporal designado pela narrativa", portanto, deixa de estar "através do espelho", para, mais uma vez, evocar o conto de Alice, para simplesmente prostar-se à frente de seus leitores. Uma série de pistas narrativas é espalhada pelas mais diversas mídias - algumas figurando na Internet, outras em lugares geográficos nos quais é necessário ir in loco - e os jogadores têm, como objetivo, no geral, decifrá-las, avançar na experimentação narrativa. Ou seja, se estabelece um complexo processo no qual o jogador / leitor "sabe, o tempo todo, que o jogo não é a realidade mas 'faz de conta' que pensa que é' - e o que, no caso dos ARGs, é representado no jargão subcultural TINAG, o acrônimo cujo significado é a frase, em inglês, this is not a game; que busca reiterar esse sentido de suspensão de descrença (ANDRADE, 2012). O ARG Flynn Lives foi destaque na edição de 2010 da convenção de histórias em quadrinhos e ficção científica WonderCon que abrigou, dentro da experiência que estamos narrando, uma das mais interessantes ações no mundo dos alternate reality games até então. Em ocasião da promoção do filme Tron: Legacy, segundo da franquia. No enredo, o personagem Flynn, após ser nomeado diretor executivo da ENCOM, desapareceu, deixando seu filho, ainda criança, sob os cuidados dos avós e tutela de Alan Bradley. A história do ARG, então, tentava dar conta do paradeiro de Flynn, ao mesmo tempo em que culpava, de certa forma, a ENCOM pelo acontecido. Pistas foram espalhadas por vários locais da rede 11, e algumas ações posicionadas geograficamente foram realizadas com a presença dos atores do filme encenando seus personagens. Nenhuma das ações, contudo, foi tão emblemática quanto o painel da Disney na WonderCon de 2010. Um pouco antes do acontecimento, pequenos pedaços de filme tinham sido encontrados pela rede aos poucos - hoje compilados no curta Tron: The Next Day12 - e que mostravam não só a conspiração em torno do sumiço de Flynn, mas também o trabalho que os interessados no assunto (personagens da história) estavam tendo para encontrá-lo. As ações e 11 https://www.facebook.com/pages/Flynn-Lives/352179445209 ou http://Tron.wikia.com/wiki/Flynn_Lives, por exemplo, são ótimos recursos para saber como se deu o ARG. 12 Ficha técnica do curta disponível em: http://www.imdb.com/title/tt1865543/. Acesso em maio de 2013.

esses curtas contavam, no geral, com a presença dos atores que tinham sido selecionados para o segundo filme, e, além de estratégia de promoção do filme, também aumentavam o universo narrativo da franquia, fazendo com que indivíduos se interessassem pela franquia sem necessariamente usar, como porta de entrada, o longa, que ainda não havia sido lançado. Aquilo que consideramos como ponto alto no ARG foi, precisamente, o fato de este estreitar a fronteira entre ficção e realidade, em especial trazendo os atores caracterizados para situações corriqueiras. Quando, ao invés de realizar um painel genérico com produtores executivos falando do filme, ou atores simplesmente discursando sobre seus papéis, a Disney resolveu produzir uma conferência da ENCOM, não com Bruce Boxleitner o ator, mas com Alan Bradley, os fãs puderam conviver com a história que tanto aguardavam de forma muito mais vívida. Em um momento como estes, a encenação de crença - para evocar o discurso de Fragoso (2013) ou de McGonigal (2011) - atinge seu ápice, uma vez que a experiência não acontece em um meio, mas ali, na frente das pessoas. Ainda nesta ação, Sam Flynn, interpretado por Garrett Hedlund, saltou de pára-quedas de um helicóptero, para ovação completa dos fãs ali presentes, em uma tentativa de "interromper" o momento da ENCOM. Considerações sobre a experiência narrativa e a suspensão de descrença Apesar de diversos estudos feitos a respeito da narrativa ao longo dos séculos, nessa proposta tentamos atualizar esses conceitos para a mídia digital e verificar o comportamento da narrativa quando essa é constituída por um processo em que a materialidade dos suportes estão em segundo plano. Nos importamos como o fio condutor narrativo é executado pelo leitor/jogador, nomeado como responsável em percorrer esses labirintos, e deixar pistas do seu percurso assim como Ariadne fez com Teseu. Genette (apud REIS, 1988) destaca que a narrativa é vista como um conjunto de conteúdos que são representados por intermédio dos enunciados. Ela procura cumprir funções socioculturais ao longo das diversas épocas. Considerar essas funções tensiona a discussão narrativa a partir das lógicas e processos implicados nos discursos bem como os objetivos que estão por trás deles, o que trás inúmeras vantagens quando se pensam os objetos da comunicação como os estudos da convergência entre as mídias. Para assegurar a compreensão da dinâmica da narrativa é preciso considerá-la sob dois planos fundamentais, para fins de análise: o da diegese e do discurso pois é no ato da narração, a qual consiste na produção do texto narrativo, que ocorre a articulação de ambos os planos.

Na ocorrência dos dois planos narrativos, discurso e diegese é que se torna possível reconhecer, descrever e avaliar os elementos da diegese. Genette (s.d), considera que o sistema diegético resulta da interacão de três subsistemas: o subsistema tópico, constituído por lugares e por objetos; o actorial, que se relaciona às personagens; e o sintático-narrativo, integrado pelo conjunto das ações relatadas no texto. Os dois primeiros são relacionados diretamente ao espaco e ao nome; o último é estritamente temporal, e se baseia no verbo. Na prática, e de forma sintética, portanto, a diegese é constituída pelos seguintes elementos, por isso mesmo designados como diegéticos: lugares, objetos, personagens e ações. O subsistema tópico abrange o espaço representado no nível diegético, através dos lugares e dos objetos. A importância desses elementos está relacionada com a compreensão do leitor a respeito do ambiente em que se movimentam as personagens e ao conhecimento dos locais onde se desenrolam os acontecimentos. Uma das funcões primordiais desse subsistema reside no significado que lugares e objetos assumem para definir espacialmente o universo diegético. O subsistema actorial remete à importância da função que as personagens desempenham na diegese. Para Reuter (1995), as personagens têm papel essencial na organização das narrativas, já que elas determinam as ações, vivenciam-nas, religam-nas e dão sentido a elas. O terceiro subsistema da diegese é denominado de sintático narrativo, e remete às ações que são desempenhadas pelas personagens e, por consequencia, ao tempo da diegese, uma vez que as ações - expressas pelo verbo – são concebidas. Já na compreesão de Aumont (1995, p.114) a diegese é um "pseudomundo , como universo fictício, cujo os elementos se combinam para formar uma globalidade". Para o autor a diegese é o significado último da narrativa, é quando é possível fazer com que o espectador construa um universo fictício, um mundo ficcional a partir de dados retirados do filme. A compreensão do universo diegético entra em xeque quando à narrativa são acrescentados elementos que estão considerados extradiegéticos, para Genette (1972) é um nível a partir do qual pode(m) constituir-se outros nível(is) narrativo(s). Para o autor o nível extradiegético conta com um narrador "exterior" à diegese que narra, colocando-se em uma posição de ulterioridade. Nesse sentido, ao tentar problematizar esses conceitos vindos do campo da narratologia, podemos sinalizar que a convergência entre as mídias colabora com a construção desse nível, ao trazer novas informações e novos universos diegéticos que irão juntos possibilitar uma nova

experiência a partir do fio que foi resgatado ou perdido dentro do labirinto de inúmeras possibilidades oferecidas pelas narrativas transmidiáticas. Não é inédito, portanto, que hoje discursemos acerca das muitas formas através das quais a experiência narrativa dobrou-se, transformou-se, rescreveu-se – e reinscreveu-se – no contexto contemporâneo. Hoje, os mais diversos suportes podem ser considerados como vetores desta experiência, e o debate segue sempre se posicionando sobre nuances que às vezes se ensejam através de seu aspecto material, às vezes por desafiarem entendimentos seculares das teorias da narratologia. A evolução tecnológica e o contato das narrativas com as mídias digitais tornaram complexo o processo pelo qual o sentido se forma, na experiência do leitor em contato para com o texto. Não é só a localização material do objeto ‘narrativa’ que conta, mas sim a “relação estabelecida entre o interlocutor e o objeto no acontecimento da história” (COUTINHO, 2008). Coutinho ecoa, na última citação, o pensamento de Leal (2006), que acredita que pensar uma narrativa dessa forma “permite elaborá-la à maneira de formas capazes de articular o estar-nummundo aberto, em fluxo, tecido no entremear de imagens, falares, tradições, saberes” (2006, p. 20). Recorrendo, finalmente, a Barthes (apud CHILDS e FOWLER, 2006, p. 238), na corrente questão, “o texto pede ao leitor que ele colabore ativamente’. Ou seja, Barthes usa a questão da significação para se referir ao texto como algo em produção, algo produzido tanto pelo leitor quanto pela linguagem do texto. Tal idéia serve como um dos alicerces da argumentação do presente capítulo – especialmente no que diz respeito à natureza “incompleta” do texto; à necessidade, segundo o teórico francês, que um texto possui de encontrar um leitor, para que finalmente seja tecido o sentido. Tal incompletude – tributária, uma vez mais, do pensamento de Lunenfeld (1999) deve ser re-invocada à frente, quando da tessitura das considerações pretendidas. Elaborando, então, a partir dessa breve explanação sobre algumas abordagens mais tradicionais do processo de produção de sentido através de narrativas, podemos partir para a explicação do contato evidente entre texto e mídia digital, convergente. É necessário, contudo, para que haja um entendimento mais palpável do dado contato, adentrar um contingente de propriedades que são, segundo Ryan (2005, p. 516), algumas das mais relevantes para os estudos de narrativa e textualidade em sistemas digitais:



Natureza Interativa e Reativa: a habilidade do computador de registrar

entradas voluntárias ou involuntárias de um usuário, e de assim, ajustar seu comportamento de acordo com as necessidades; •

Processamento Volátil e Tela Variável: que faz com que os bits na

memória possam mudar de valor e mudem, assim, a cor dos pixels espalhados pela tela. Esta propriedade explica a fluidez das imagens digitais; •

Canais Sensórios e Semióticos Múltiplos: que fazem com que o

computador passe como síntese de todas as “velhas” mídias; •

Capacidade de Processamento em Rede: que remete à possibilidade de

conectar computadores através do espaço, possibilitando a reunião de seus usuários em ambientes virtuais. Segundo a autora, existe uma necessidade latente, para que se desenvolva a capacidade de se lidar com narrativas que estão em pleno contato com as mídias digitais, de que a essência ficcional dialogue com, pelo menos, alguma das faculdades listadas acima. Para ela, tais textos “pensam junto com seu meio” (Idem) – e esse imbricamento não é simplesmente uma observação objetiva – é também um juízo de valor, no que se refere à eficácia da narrativa: tal julgamento diz respeito “à capacidade do texto de gerar uma experiência que não pode ser duplicada em nenhum outro meio. Uma experiência que faz o meio ser realmente necessário” (RYAN, 2005, p. 516, grifo nosso). É interessante, ainda neste enredo de teorias, perceber que, ecoando sua fala sobre o diálogo entre texto e meio, que não só desloca o processo de produção de sentido mas o torna particular, a autora acredita que o modo pelo qual tais narrativas se apresentam é essencial para dar sentido à sua investigação: ela considera, por exemplo, que além dos modos de apresentação através da pura linguagem, característica das narrativas representacionais, os video games, “um dos mais produtivos domínios da atividade narrativa na mídia digital” (RYAN, 2005, p. 515), funcionam também sob outra alçada, já que clamam por uma interação ativa da parte de seu jogador/leitor. É sobre tal faculdade que devemos nos debruçar: a interação ativa por parte do leitor aliada ao potencial telemático apontado por Ryan (2005, p. 516) é o pivô de mudanças significativas no processo de produção de sentido desencadeado quando do contato do jogador/leitor para com a estrutura de um texto que funciona sob as premissas da noção de

transmídia. Isso acontece porque além do contato entre texto e leitor, se desenha uma estrutura de contato entre leitores. No Alternate Reality Games o contato se dá entre leitor e texto, mas o texto deixa, neste caso, de figurar apenas em um suporte material para ser encenado. A separação entre público e diegese é desintegrada, uma vez que o próprio propósito da ação consiste em convidar os leitores a integrarem a diegese que se configura. Referências AARSETH, Espen. Cybertext. Perspectives on Ergodic Literature. Baltimore: Johns Hopkins University Press, 1997. ALLEN, Grahan. Roland Barthes. New York: Routledge, 2004. ANDRADE, Luiz Adolfo de. Jogos de Realidade Alternativa. Cibercultura, Espaço e (trans)Mídia. Tese defendida no Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura Contemporâneas, Universidade Federal da Bahia. Salvador, 2012. AQUINO BITTENCOURT, Maria Clara. Convergência entre Televisão e Web: proposta de categorização analítica. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Informação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Disponível em: http://www.scribd.com/doc/137240819/Convergencia-entre-Televisao-e-Web-proposta-de-categorizacaoanalitica AUMONT, Jacques et al. A Estética do filme. Campinas, SP: Ed. Papirus, 1995. BULHÕES, Marcelo. A ficção nas mídias: um curso sobre a narrativa nos meios audiovisuais. São Paulo: Ed. Ática, 2009. CHAGAS, Polyana Amorim. Um olho na TV e outro no computador: repercussão de produtos televisivos no Twitter. Revista Científica do Departamento de Comunicação Social da Universidade Federal do Maranhão - UFMA - ISSN 2176 – 5111 São Luís - MA, Janeiro/Dezembro de 2010 - Ano XIX - No 7. Disponível em: http://www.cambiassu.ufma.br/cambi_2011/amorim.pdf CHILDS, Peter e FOWLER, Roger. Text (Verbete). In: The Routledge Dictionary of Literary Terms. New York: Routledge, 2006. CORRÊA, Elizabeth Saad; LIMA, Marcelo Coutinho. O impacto das mídias sociais nas empresas informativas: transformação no processo produtivo. In: BRITTOS, Valério Cruz (Org.). Digitalizacao e práticas sociais. São Leopoldo: Editora Unisinos, 2009. COUTINHO, Pedro Cardoso. O Labirinto e o Novelo. Entrelaçamentos entre Jogo e Narrativa nos Jogos Multiplayer Online. In: Anais do II Simpósio Nacional da Associação Brasileira de Pesquisadores em Cibercultura. São Paulo: PUC-SP, 2008. DENA, Christy. Práticas Emergentes da Cultura Participativa: Uma Análise das Camadas Criadas pelos Jogadores nos Alternate Reality Games. In: Luiz Adolfo de Andrade e Thiago Falcão (Eds.). Realidade Sintética: Jogos Eletrônicos, Comunicação e Experiência Social. São Paulo: Scortecci, 2012. FRAGOSO, Suely. Imersão em Games: Da Suspensão de Descrença à Encenação de Crença. In: Anais do XXII Encontro Anual da Compós. Salvador: Universidade Federal da Bahia, 2013. Disponível em http://compos.org.br. Acesso em 10 de Maio de 2013. FRAGOSO, Suely. Reflexões sobre a convergência midiática. Líbero. Ano VIII, N. 15/16, 2005, online. Disponível em: http://geminisufscar.files.wordpress.com/2009/05/reflexoes_convergencia.pdf GENETTE, Gérard. Narrative Discourse Revisited. New York: Cornell University Press, 1988 GENETTE, Gerard. O discurso da narrativa. Lisboa: Veja, s.d. GENETTE, Gérard. Paratexts. Thresholds of Interpretations. Cambridge: Cambridge University Press, 1997.

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