O Agenciamento Urbano

September 22, 2017 | Autor: Washington Fajardo | Categoria: Urban Planning, Arquitetura e Urbanismo, Urbanismo, Gestão Urbana
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O Globo Seção Opinião - http://oglobo.globo.com/opiniao/o-agenciamentourbano-14916886 27 de dezembro de 2014

O agenciamento urbano O Brasil dedicou-se à modernidade urbana com afinco. Mudamos a cidade símbolo da nação para o Planalto Central e Brasília é até hoje a epifania, eternizada no tempo, do funcionalismo urbano. Localizar funções e usos, através do instrumento do planejamento, tal qual uma planta fabril, era o princípio: aqui mora-se, aqui trabalha-se, aqui desloca-se, aqui diverte-se. Neste novo lugar, deslocado no tempo e no território, poderíamos enfim ser felizes. A crise do petróleo da década de 70 veio demonstrar a ineficiência da cidade do automóvel, espraiada, de baixa densidade, e seu alto custo. Paradoxalmente, ao mesmo tempo, no Rio de Janeiro, a latência do urbanismo modernista ampliou a cidade para a Barra da Tijuca. Mas pior que seus resultados territoriais, visíveis e questionáveis, o urbanismo modernista resultou também em um corpo abstrato, com valor jurídico, legal, político, até hoje reconhecido como positivo e digno de elogio. Saudamos com júbilo as alegorias do “cinquenta anos em cinco”. O território moderno brasileiro, distópico, anti-histórico, tem lugar cativo na mente coletiva, e ainda suscita desejo e, às vezes, catarse. Sabemos ampliar a cidade muito bem, sabemos legislar para fazer novos edifícios, mas pouco sabemos sobre como cuidar da cidade que existe. Por isso clamamos tanto por “planejamento”, como um ato salvador, mas pouca atenção damos a agenciar a cidade que está pronta e que precisa de atenção. O agenciamento urbano é uma prática que precisa ser disseminada para honrar nosso investimento coletivo, historicamente coerente, sustentável, e culturalmente legitimo. Pode também ser a resposta para temas preocupantes: habitação, transporte, espaço público de qualidade e seguro, adaptação da cidades para o aquecimento global.

O AGENCIAMENTO URBANO

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Somente com o Estatuto das Cidades, de 2001, surgiu uma nova abordagem para os desafios urbanos, mas ainda há poucas práticas sistematizadas, e por consequência, pouca nova cultura de administração urbana. É difícil tirar a administração pública da sua inércia mas não daremos conta da complexidade de metrópoles com estruturas administrativas de secretarias e organogramas centrais do passado. No limiar dos seus 450 anos, o Rio de Janeiro, quinze anos já dentro do século XXI, dá alguns sinais de avanços sobre o assunto. O instrumento das Operações Urbanas Consorciadas é um modo eficaz e sustentável de transformação territorial, valendo-se do resgate do solo criado como mecanismo de investimento. As experiências brasileiras anteriores, em São Paulo, lidaram apenas com promoção imobiliária, e pouca atenção deram ao espaço público. Muito mais complexo e inovador, o Porto Maravilha conseguiu articular o desenvolvimento imobiliário à requalificação urbana. É o único caso até hoje de destinação garantida por lei, de 3% dos recursos oriundos da operação para o patrimônio cultural material e imaterial da área e que vem permitindo tantas reabilitações e restaurações. A criação da CDURP (Companhia de Desenvolvimento Urbano da Região Portuária) trouxe a prática do agenciamento urbano, criando um modo eficiente de promover gestão territorial integrada. Ao mesmo tempo que coordena obras de infraestrutura e de mobilidade, cuida da construção de uma nova base comunitária. Há uma série de ações conjuntas com o Sebrae, por exemplo, para promoção do capital humano da região, com qualificação para novas oportunidades e empregos, para fomento ao empreendedorismo local, assim como há compromisso com o resgate das tradições locais e seus saberes. Este é um modelo novo, não é perfeito (nada é): ainda há reminiscências do urbanismo modernista no Porto ao, por exemplo, adotarmos somente parâmetros de edificação e não utilizarmos códigos de forma urbana, mas é um caminho fundamental de mudança, que precisa ser mais bem estudado e ampliado para modelos mais holísticos. Este é o modelo que vigora hoje para cidades asiáticas, para o sucesso da revitalização de Melbourne, assim como funcionam as prefeituras de bairro de Paris, assim como é operada a transformação do South Bank em Londres, do mesmo modo que boa parte do sucesso das intervenções urbanas de Medellin tem na criação de agências, mais flexíveis e autônomas, e capazes de atrair talentos do setor privado para o desafio da gestão urbana. O agenciamento urbano é um modo eficiente de planejamento, comprometido com a cidade que existe como o melhor lugar que existe.

O AGENCIAMENTO URBANO

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Washington Fajardo é Arquiteto e Urbanista http://oglobo.globo.com/opiniao/o-agenciamento-urbano-14916886

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