O Brasil Caminha Mesmo a Passos Largos em Direção ao Common Law? Uma Resposta ao Ministro Zavascki
Mauro Filho1
Todos que começam a graduação em Direito no Brasil -‐-‐ e em grande parte da
América Latina -‐-‐ se deparam com a disciplina mais clichê do primeiro semestre de um calouro em Direito: a confusa matéria Introdução ao Estudo do Direito (ou alguma variação dessa nomenclatura). Confusa não por hermetismo: afinal de contas o que se estuda nela são conceitos introdutórios elementares que todo aspirante deve dominar -‐-‐ fontes do Direito; uma ideia superficial de normas; talvez um panorama da história do Direito. Confusa sim pela sua (não)eficácia e necessidade de ser repensada, tornando-‐a mais como ponte de contato entre alunos novatos com autores pensadores do Direito -‐-‐ mas isso já foi tratado por (várias) outras pessoas e, portanto, não nos interessa aqui. O que sim nos interessa é que nessa matéria somos introduzidos a dois jargões jurídicos que todo mundo usa mas pouca gente entende direito. Refiro-‐me ao Civil Law e ao Common Law. Lá somos ensinados que são (i) dois sistemas jurisdicionais diferentes, que (ii) o Civil Law é o sistema jurisdicional de origem germânico-‐romana, sendo predominantemente exercido em países da Europa continental e da América Latina, que (iii) o Common Law é o sistema jurisdicional anglo-‐americano, que (iv) o Civil Law baseia-‐se em códigos ou em leis positivadas2, e que, finalmente, (v) o Common Law baseia-‐se em decisões judiciais e não em leis codificadas.
E, na grande maioria dos casos, para-‐se por aí. Poucos se atrevem -‐-‐ pelos
menos alunos da graduação -‐-‐ a lerem os autores fundadores da dogmática do Civil Law (Direito Romano: quem tem tempo para isso?), e muito menos se atrevem a ler os autores que sistematizaram o Common Law. Refiro-‐me aqui a um Sir William
1
[email protected] 2 Aqui uso o termo positivado não com o rigor que a filosofia e teoria do Direito exigem. Uso
unicamente por razões didáticas, e o termo aqui quer dizer “escrito”.
Blackstone3 da vida. Blackstone foi o jurista responsável pela sistematização do Common Law: foi o sujeito que sentou para escrever como de fato funcionava esse sistema jurisdicional um tanto atípico, diga-‐se de passagem, que se desenvolvia na Inglaterra durante vários séculos. O estudo do Direito na Inglaterra foi um antes e outros depois de Blackstone. Foi a partir dos livros dele que as faculdades de Direito inglesas, pela primeira vez, criaram a disciplina Common Law em seu catálogo curricular. Estudar Direito na Inglaterra na era pré-‐Blackstoniana era um tanto bizarro: estudos fragmentados da longa e riquíssima história da Inglaterra e de infinitos casos decididos pelas cortes inglesas. Hoje é bem diferente: nenhum aluno de Direito na terra da rainha passa pela graduação sem ler -‐-‐ ou pelo menos estudar -‐-‐ Blackstone.
Longe de mim querer exigir e dizer que alunos de Direito no Brasil sejam
obrigados a lerem Blackstone ou que, sem lê-‐lo, não terão legitimidade para falar sobre o Common Law. Aliás, gente que nos aponte o dedo acusando-‐nos que não prestamos porque não lemos os autores estrangeiros X e Y é que não falta. E, aqui, o que menos quero é prolongar esse discurso tão cheio de ostentação e de autoafirmação. O que quero abordar são dois argumentos de Blackstone ao sistematizar o Common Law e, a partir deles, refletir sobre a declaração quase-‐ retórica do Ministro Teori Zavascki que o Brasil estaria caminhando a passos largos em direção ao Common Law, para ao fim desmontar o pensamento de Zavascki e mostrar que o que ocorre hoje no Brasil não é uma corrida em direção ao Common Law e sim outra coisa -‐-‐ muito mais profunda e complexa que uma mera mudança de sistema de jurisdição.
Antes de adentrar nos argumentos sistematizadores de Blackstone,
precisamos nos entender com algumas palavras em língua inglesa para mais a frente não gerar confusão. O substantivo common é de fácil manejo -‐-‐ quer dizer comum ou comum a todos. O substantivo problemático é law porque tem diversos significados. Law pode querer dizer simplesmente lei no sentido de legislação4. Law pode querer dizer também lei em um sentido mais abstrato: “É a lei!”. E law pode querer dizer o 3 Jurista inglês do século XIX. 4 Sem prejuízo da palavra inglesa para legislação: legislation.
sistema jurídico ao qual damos o nome de Direito (com D maiúsculo). O que se difere da palavra direito (com D minúsculo) -‐-‐ direito à defesa; direito a um advogado; direito à vida -‐-‐ que em inglês é a palavra rights. Sempre que nos referirmos aqui ao Common Law, usaremos o terceiro sentido da palavra: Direito Comum a todos, e não Lei Comum a todos. Isso tudo, claro, em nível de concordância para a leitura do texto. Não tenho nenhuma pretensão de abordar as ideias de direito, de Direito, e as diferenças entre lei e Direito. Se concordarmos que Common Law se traduz por Direito Comum, dou-‐me por satisfeito. Dito isso, aos argumentos de Blackstone.
Blackstone definiu que o Common Law se desenvolveu e se estruturou a
partir de dois argumentos: (i) trata-‐se de um Direito comum a um povo ou a vários povos, logo, não se trata de um Direito imposto pelo Estado de cima para baixo aos cidadãos jurisdicionados; (ii) trata-‐se de um Direito em que o judiciário tem um papel preponderante em sua evolução. Ao primeiro argumento darei o nome de tese do direito não-‐imposto. Ao segundo darei o nome de tese da institucionalização.
A tese do Direito não-‐imposto tem muito a ver com a história da Inglaterra.
Conhecida pelos Romanos como Britannia, a Inglaterra de hoje é, grosso modo, a fusão de dois povos: os Anglos e os Saxões. Sem adentrar em todo o rigor que a historiografia exige -‐-‐ e que eu não tenho -‐-‐, esses povos de onde os ingleses descendem traziam consigo costumes normativos e, sem nenhuma necessidade de uma fonte externa lhes ditar, tinham as suas regras que serviam a seus povos e tornavam a vida possível. É como se ao invés de “o Soberano fazer as regras, as regras que faziam o Soberano5”. Há uma premissa essencial ao Common Law: não se trata do Direito do Estado imposto sobre as pessoas. Ao contrário, trata-‐se do Direito das pessoas -‐-‐ criado por elas -‐-‐ que se impõe ao Estado e faz o Estado. O legislador não é o Poder Legislativo contemporâneo tal como entendemos hoje. O legislador são as pessoas e o poder de seus costumes. Claro que a Inglaterra e o Common Law de hoje são substancialmente diferentes. Estamos falando aqui de uma 5 Frase do professor (…) citada pelo professor Scott J. Shapiro em seu artigo “O Debate Hart-‐Dworkin:
Um Guia Para o Perplexo”.
Inglaterra pré-‐Locke e sem toda aquela questão de governos constitucionais e de separação de poderes.
Diante desse Direito criado pelos costumes das pessoas que se aplica às
comunidades sem a interferência de um Estado que o faça cumprir mediante sanções, entra o papel do judiciário e a tese da institucionalização. Os juízes, então, sempre que diante de conflitos entre pessoas, fariam uma observação ao sistema normativo já existente na comunidade e descobririam (i) o padrão consenso de comportamento [conteúdo empírico] e (ii) a reprovabilidade da comunidade diante de um eventual descumprimento desse comportamento padrão [conteúdo normativo]. Só então o juiz decidiria o caso, e as decisões desses juízes, ao se consolidarem, se tornariam aquilo que hoje chamamos de jurisprudência, e, através da jurisprudência, o Direito comum (Common Law) de todos adquiriria a sua institucionalização. Ressalto que o judiciário era um mecanismo através do qual se institucionalizava o Direito não-‐imposto -‐-‐ e não vice-‐versa. Não se trata de juízes tomando o lugar do legislativo local e impondo as suas decisões verticalmente aos jurisdicionados.
Recentemente o Ministro do Supremo Tribunal Federal, Teori Zavascki, fez
uma afirmação em um congresso de Direito em Brasília que o Brasil estaria caminhando a passos largos em direção ao Common Law. Os argumentos dele se montam da seguinte forma: (i) há uma caminhada para a transição em direção ao Common Law; isso se dá pela (ii)eficácia expansiva das decisões judiciais; essa eficácia existe pela (iii) expansão além-‐controle de constitucionalidade concentrado do efeito erga omnes nas decisões judiciais; e (iv) a legislação recepcionou a valorização do precedente judicial, exemplo disso seriam a repercussão geral no âmbito do STF e o recurso repetitivo no âmbito do STJ. Zavascki ressalta, no entanto, que a “força expansiva do precedente judicial não é vinculante, mas persuasiva” -‐-‐ tese desenvolvida pelo STF na Reclamação 4.335.
Zavascki vai além e diz que essa transição para o Common Law não é um
momento qualquer, mas sim um fenômeno de “grande vigor”. E mais: ocorreria hoje um mudança da definição clássica de jurisdição constitucional, que não mais seria “o controle da constitucionalidade das normas, ou do conflito de leis com a
Constituição”, afirma o Ministro, mas “(…) a relação das coisas, no sentido mais amplo, com a Constituição. Relaciona leis, atos, condutas e até a jurisdição com a Constituição”. E, apesar de descrever essa suposta transição como “de grande vigor”, Zavascki diz que essa transição ainda carece muito de aprofundamento teórico e que a transição é um processo paulatino e não de responsabilidade de uma única pessoa.
Há na tese do Ministro um truísmo que ele quer que todos nós concordemos:
o poder do judiciário está em ascensão. Não me oponho. Aliás, a ascensão do poder do judiciário na América Latina não é objeto de estudo original de nenhum ministro do STF. O assunto já tem sido substancialmente estudado por professores nacionais e internacionais -‐-‐ cito aqui a título de exemplo o trabalho do professor Ran Hirschl6 que publicou uma obra em qual ele desenvolve o conceito de “juristocracia7” -‐-‐ além de outros. A juristocracia seria uma expansão do poder do judiciário em países onde (i) o Estado Democrático de Direito não se realizou plenamente e onde (ii) há um vício de má formação da constitucionalização da população.
Apesar de concordar com esse truísmo que o Ministro defende, creio que há
alguns erros no argumento dele. O primeiro erro é aquilo que chamarei de erro empírico. Se importarmos a tese do Direito não-‐imposto para o cenário exposto pelo Ministro, concluiremos que não há a concretude dessa tese no sistema jurídico brasileiro atual. O que não diminui o sistema jurídico brasileiro em absolutamente nada. Afinal, não somos Inglaterra -‐-‐ e ainda bem que não. Nunca tivemos um desenvolvimento jurídico nacional em que brotasse da população brasileira um Direito não-‐imposto que seria posteriormente institucionalizado pelo judiciário. O Direito brasileiro sempre foi vertical. Não importa quem dê as ordens. Elas sempre virão de um Soberano e serão impostas aos jurisdicionados mediante sanção caso descumpridas. Logo, não estando presente a tese do Direito não-‐imposto, creio que desmorona o argumento de uma suposta transição para o Common Law.
E a tese da institucionalização? Bem, ela não implica, de nenhuma maneira,
uma ascensão do Poder Judiciário, apesar de dizer que o judiciário tem um papel preponderante no Common Law. Mas o papel do judiciário no Common Law não é o 6 Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Toronto. 7 Ver livro Towards Juristocracy do professor Hirschl.
de substituir o Poder Legislativo, tornando-‐se os juízes políticos de toga8. Há aqui um equívoco quanto ao papel do judiciário no desenvolvimento do Common Law. Novamente ressalto que, obviamente, os sistemas jurídicos contemporâneos do Common Law são substancialmente diferentes daquele sobre qual Blackstone se debruçou. Mas o ponto aqui não é esse. O problema está em tentar explicar a ascensão do Poder Judiciário no Brasil a partir dessa suposta transição para o Common Law que não existe. Talvez aqui há, além de um erro empírico do Ministro, algo mais sério: um erro normativo.
O fato de as duas teses de Blackstone não estarem presentes no Brasil pouco
interessa. O que interessa é a má compreensão de um fenômeno ocorrente no país. Pergunto: se a explicação para essa ascensão do poder do judiciário não está nessa pseudo-‐transição de sistema jurisdicional, onde está então? Como explicar esse fenômeno? Aqui tentarei fornecer uma resposta. O conceito de juristocracia pode nos servir bem. Penso que de um lado há sim presentes na vida política do país os dois argumentos trazidos acima, a saber: (i) o Estado Democrático de Direito não se realizou plenamente no Brasil e (ii) há um vício de má formação da constitucionalização da população. De outro, penso que esses dois argumentos não são suficientes para explicar o fenômeno de ascensão do judiciário no Brasil.
Quero introduzir outros dois argumentos que tentarão explicar o que se
passa aqui -‐-‐ e em toda América Latina. O primeiro é a desconfiança que a população desenvolveu em relação ao Poder Legislativo. Sem querer me valer de vocábulos quase-‐cabalísticos, é como que se pairasse no ar uma suspeita -‐-‐ alguns dirão certeza -‐-‐ que o Poder Legislativo seria uma espécie de facção, criminosa ou não, mas uma facção -‐-‐ havendo, portanto, uma substancial não-‐representatividade na figura dos parlamentares. O assunto da não-‐representatividade já foi abordado por professores de Direito, de filosofia e de sociologia no Brasil, e aqui certamente não é o espaço para discorrer sobre o assunto -‐-‐ e nem tenho competência para tanto. Mas esse fenômeno -‐-‐ que aqui chamarei de tese da facção apenas por motivos didáticos -‐ -‐ traz consequências bastante fortes: (i) a falta de credibilidade que a população 8 Expressão criada pelo juiz norte-‐americano Richard Posner em seu livro Como Pensam os Juízes? .
demonstra em relação aos parlamentares; (ii) a falta de confiabilidade que a população tem em relação ao Legislativo; (iii) a inutilidade da razão de ser do Poder Legislativo. As consequências em (i) e em (ii) já foram bastante abordadas pelos professores que estudam a não-‐representatividade do Legislativo, logo, não pretendo me debruçar sobre elas. A consequência em (iii) é a que realmente nos interessa aqui.
Há, ao meu ver, ante a população, uma dúvida do porquê da existência do
Legislativo. O cidadão-‐eleitor, quando vota, o faz não por confiar que a função de escolher um representante seu será o serviço que esse representante lhe prestará. Aqui creio que a concepção de autoridade como serviço9, desenvolvida pelo professor Raz10, não se sustenta ante a população. É como se, quando diante da necessidade de se servir dos benefícios de uma autoridade, a população não visse no Legislativo um fornecedor desse serviço, logo, invalidando-‐se a razão de ser de sua existência. A consequência em (iii) que a tese da facção traz é o que talvez há de mais sério nessa ascensão do Poder Judiciário porque é ela quem lança os fundamentos -‐-‐ ou pelo menos quem prepara o terreno. A inutilidade da razão de ser do Legislativo põe em jogo todo o projeto de um governo constitucional que nasceu em Locke. Mais que isso: põe em jogo todo o trabalho teórico que Locke desenvolveu para defender uma separação dos Poderes. Ou o que é muito pior: põe em jogo o poder constituinte originário -‐-‐ ou quem sabe até a própria Constituição.
O segundo argumento que quero desenvolver é aquilo que chamarei de
decepção com o Poder Executivo. Líderes latino-‐americanos, de um extremo a outro do espectro, gozam todos de uma característica: o messianismo. A velha ideia que descerá um ungido do céu que consertará tudo que há de ruim conosco. O problema é que os “ungidos” se revelam com o tempo que são bem menos celestiais quanto pareciam. E é aí, quando o escapismo messiânico passa, que a população cai em si e descobre que tudo não passou de uma ilusão. Penso que esse seja um problema substancial com o Poder Executivo em todos os âmbitos da federação. Ao contrário do que ocorre com o Poder Legislativo, o componente de inutilidade não está 9 Ver livro Autoridade do Direito do professor Raz. 10 Professor de filosofia do Direito da Escola de Direito da Universidade de Columbia.
presente no Executivo. Mas há um sentimento de decepção, e esse sentimento afasta a população do Executivo. E mais: a decepção com o Executivo faz com que, quando precisarem ou em apuros, a população não tornem os seus olhos para o Poder Executivo. Logo, a liderança do Executivo está sendo questionada -‐-‐ e pouco a pouco desfalece.
Diante desse cenário -‐-‐ a saber: (i) a inutilidade da razão de ser do Legislativo
e (ii) a decepção messiânica do Executivo -‐-‐, parece-‐me que a população caminha para um desespero. Nesse desespero, no entanto, vê uma espécie de luz no fim do túnel. E essa luz tem um nome (muito conhecido de nós): o Poder Judiciário. Caminhamos para um juristocracia. De um lado o judiciário precisa assumir as funções do Legislativo. De outro, o judiciário precisa assumir as funções do Executivo. Os juízes se veem em uma espécie de beco sem saída porque, mesmo que rejeitem o tal do “ativismo”, precisam tomar decisões pensando naquilo que todo político deveria pensar: no bem-‐estar da população. Daí haver hoje no judiciário ações judiciais em que se requer um ordem judicial para reformular a organização da UTI infantil de um hospital municipal (função da Administração Pública). Ou ações judiciais em que se pleiteie uma ordem judicial para impedir que uma câmara de vereadores vote um projeto de lei (função do Poder Legislativo). Aqui dou o braço a torcer e concordo com Posner11: “juízes são políticos de toga12” -‐-‐ ou pelo menos estão se tornando.
Quais consequências que uma juristocracia brasileira traria? Não sei. O que
sei é que, gostem os juízes ou não, há um grande problema em suas mãos. E mesmo que neguem serem “políticos de toga” com frases retóricas de pouco efeito do tipo “não fiz concurso público para isso”, repousa sobre os ombros dos magistrados brasileiros uma responsabilidade social que eles nunca tiveram antes. Nisso concordo com o Ministro Zavascki: o momento é único. Mas quem nos dera estarmos apenas em uma transição para o Common Law. Estamos é diante de uma grave crise entre os Poderes da República. O artigo segundo da Constituição desmoronou: se há algo que não temos hoje na República é independência e 11 Ver nota n. 7. 12 Id.
harmonia entre os Poderes. Claro que, sim, a teoria da divisão dos poderes e os seus muitos teóricos deixaram claro que os Poderes estarão quase sempre em confronto uns com os outros 13 . No entanto, o que temos hoje é algo substancialmente diferente. O que há não é um mero confronto entre os Poderes. O que se criou é uma normatividade inconsciente de hierarquia entre os Poderes. Se nos permitíssemos a fantasiação, a hierarquia normativa inconsciente estaria estruturada assim: I.
Em terceiro lugar, no mais baixo nível da hierarquia, devido a consequência da inutilidade da razão de ser, vem o Poder Legislativo -‐-‐ totalmente deslegitimado e moralmente condenado.
II.
Em segundo lugar vem o Poder Executivo que, mesmo que não totalmente moralmente condenado e deslegitimado -‐-‐ apesar de conter em certo grau menor de deslegitimidade e de condenação moral -‐-‐, tem uma profunda decepção da população.
III.
E no topo da hierarquia o Poder Judiciário.
Aqui poderíamos questionar se o messianismo apenas tomou outra forma e
que, talvez, estaríamos diante de um messianismo judicial. Não sei. O que sei é que a responsabilidade do ofício dos juízes é -‐-‐ ou tornou-‐se -‐-‐ além-‐jurídica. Há todo um argumento moral envolvendo juízes hoje no Brasil. O judiciário hoje goza de algo muito especial ante a população que ele não tem o direito de perder: credibilidade. Há uma atmosfera boa -‐-‐ aqui novamente peço desculpas pelo vocábulo cabalístico -‐ -‐ que oxigena a população em relação ao judiciário. A esperança da população está no ofício dos juízes. Eles não podem decepcioná-‐la.
13 Ver Montesquieu.