O Centro de Cirurgia Cardiotorácica dos HUC

Share Embed


Descrição do Produto

CÍRCULO DE AMIGOS DO CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA HUC



Frederico Teixeira, In Prefácio

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC



É esse caminhar ao longo dos seus agora celebrizados 25 anos que este livro pretende ser: um recordatório de um Querer, de um Sonho, de uma Obra… de dedicação, de responsabilidade, de humanismo… um exemplo de Serviço que a todos nos tocou…

CÍRCULO DE AMIGOS DO CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA HUC

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC [25 ANOS AO SERVIÇO DA SAÚDE]

[25 ANOS AO SERVIÇO DA SAÚDE]

Coimbra – 2013

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC [25 ANOS AO SERVIÇO DA SAÚDE]

FICHA TÉCNICA: TÍTULO:

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC [25 ANOS AO SERVIÇO DA SAÚDE]

João Carlos Santos Pinho EDITOR: Círculo de Amigos do Centro de Cirurgia Cardiotorácica dos HUC DESIGN E PAGINAÇÃO: Jorge Capelo IMPRESSÃO: Tipografia Lousanense TIRAGEM: 1.000 exemplares ISBN: 978-989-20-4342-5 INVESTIGAÇÃO E TEXTOS:

Depósito Legal n.º

© Copyright 2013

Reservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC [25 ANOS AO SERVIÇO DA SAÚDE]

Investigação e Textos

João Carlos Santos Pinho

ÍNDICE

Prefácio ............................................................................................................................

7

Tábua cronológica........................................................................................................

8

Enquadramento ............................................................................................................ 11 1. Os primórdios da cirurgia cardíaca em Coimbra .......................................... 13 2. O ano da mudança – 1988................................................................................... 17 3. A aplicação de um novo conceito e os primeiros resultados ................. 33 4. A consolidação e afirmação de um modelo: a criação do CRI ................ 37 5. O novo edifício e o início do Programa de Transplantes .......................... 49 6. A primeira grande homenagem ao Professor Manuel Antunes e à equipa de cirurgia cardiotorácica dos HUC ............................................ 73 7. A criação do Círculo de Amigos do Centro de Cirurgia Cardiotorácica dos HUC ........................................................................................ 77 8. As Missões Africanas .............................................................................................. 97 9. A última década de actividade ..........................................................................101 10. Manuel Antunes – esboço biográfico ...........................................................113 Créditos fotográficos ...................................................................................................126 Bibliografia ......................................................................................................................127





Penso que posso dizer que fomos tão longe quanto nos deixaram, mas poderíamos ter ido mais longe se nos tivessem deixado.



[Prof. Manuel Antunes, In Tempo Medicina, 17/06/2013]

Espero que este livro, iniciativa do Círculo dos Amigos do Centro de Cirurgia Cardiotorácica dos HUC, seja um marco recordatório daquilo que foi o Centro de Cirurgia durantes estes 25 anos.



[Prof. Frederico Teixeira, Presidente do Círculo de Amigos entrevistado por João Pinho, 21/10/2013]

PREFÁCIO





Deus quer, o Homem sonha, a Obra nasce (Fernando Pessoa – Mar Português)

Dois Homens sonharam um Serviço de Cirurgia Cardiotorácica em Coimbra: Bártholo do Valle Pereira, professor catedrático da Faculdade de Medicina de Coimbra, director do Serviço de Cirurgia III dos HUC e pioneiro da cirurgia de coração aberto em Coimbra, com uma intervenção já realizada em 1977; Manuel dos Ramos Lopes, professor catedrático da Faculdade de Medicina de Coimbra e director do Serviço de Cardiologia dos HUC. Um outro se lhes juntou com o seu proverbial dinamismo e capacidade para abraçar causas certas, Norberto Canha, também professor catedrático da Faculdade de Medicina de Coimbra. E, se estes “sonharam”, melhor começaram a executar o “sonho” - preparar uma equipa capaz de concretizar tal sonho: primeiro, pelo envio para centros internacionais de referência de jovens promissores, desde Marcial de Oliveira até Luís Eugénio e Ferrão de Oliveira; depois, a procura de um líder capaz de encabeçar tal “sonho”. E, se bem o sonharam, Deus “quis” que esse líder viesse a ser encontrado num jovem português – o professor Manuel Antunes -, residente na África do Sul, já aí com prestígio universitário e de cirurgião cardíaco sobejamente reconhecido, e que aceitou o desafio!... Assim, a “Obra” nasceu… cresceu… desenvolveu-se… prestigiou-se… e prestigia Coimbra e Portugal!... Essa “Obra” aí está: é o Centro de Cirurgia Cardiotorácica dos H.U.C.!... É esse caminhar ao longo dos seus agora celebrizados 25 anos que este livro pretende ser: um recordatório de um Querer, de um Sonho, de uma Obra… de dedicação, de responsabilidade, de humanismo… um exemplo de Serviço que a todos nos tocou…

Pelo Círculo de Amigos do Centro de Cirurgia Cardiotorácica dos H.U.C. Frederico Teixeira

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

TÁBUA CRONOLÓGICA DATA

ASSUNTO

28/06/1977

Primeira operação de coração com CEC (Circulação Extra-Corpórea) feita em Coimbra no Serviço de Cirurgia III dos HUC, a Maria de Lurdes Ferreira de Matos, de 17 anos, natural de Serpins, Lousã

18/02/1986

Realiza-se o primeiro transplante de coração em Portugal, no Hospital Santa Cruz, em Carnaxide (Lisboa), à paciente Eva Pinto

21/03/1988

O Prof. Manuel Antunes chega a Coimbra para chefiar o Serviço de Cirurgia Cardiotorácica dos HUC (SCCT)

22/03/1988

Primeira reunião de Manuel Antunes no SCCT dos HUC

28/03/1988

Primeiras intervenções cirúrgicas no SCCT

Finais de 1988

Primeira intervenção cirúrgico-cardíaca a um bebé com circulação extra-corporal: Filipe, com ano e meio, natural de Trancoso.

03/01/1989

A Ministra da Saúde, Leonor Beleza, faz visita-relâmpago aos HUC; visitando o SCCT

05/07/1990

O SCCT efectua a milésima operação com CEC

17/03/1993

Manuel Antunes é condecorado com a Grã Cruz da Ordem de Cristo

28/29/05/1993

O SCCT realiza no auditório dos HUC o Simpósio Internacional de Actualização em Cirurgia Cardíaca

27/06/1994

Visita parlamentar dos deputados do PSD, acompanhados pelo Ministro da Saúde, Paulo Mendo, e Presidente da AR, Barbosa de Melo.

30/06/1995

O SCCT realiza a sessão solene comemorando a intervenção nº 5000

27/12/1996

O serviço SCCT efectua a milésima operação com CEC neste ano

22/12/1998

Despacho da Ministra da Saúde, Dr.ª Maria de Belém Roseira, criando o CRI-CCT

20/03/1999

Homenagem Nacional ao Prof. Manuel Antunes e sua equipa, com a presença de 3.000 pessoas, realizada em Coimbra, no Pavilhão de Feiras da ACIC

24/11/1999

Assinada a escritura de constituição formal da associação Círculo dos Amigos do Centro de Cirurgia Cardiotorácica – Coimbra

31/12/1999

O Ministério da Saúde autoriza a adjudicação das obras para a construção de uma nova sala operatória – Adjudicação do novo edifício

30/09/2002

Inauguração do novo edifício com a presença do Primeiro-Ministro Durão Barroso

—8—

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

13/01/2003

O Círculo dos Amigos do Centro de Cirurgia Cardiotorácica – Coimbra é declarado Instituição Particular de Solidariedade Social e reconhecida como pessoa colectiva de utilidade pública

08/02/2003

O Círculo de Amigos do CCCT dos HUC inaugura a sua sede

26/05/2003

Jorge Sampaio visita o CCCT, no 4º dia de presidência aberta

23/11/2003

Realiza-se o 1.º Transplante Cardíaco

28/05/2006

Visita oficial do Presidente da República Professor Aníbal Cavaco Silva

05/06/2006

A Câmara Municipal de Coimbra, sob proposta do Dr. Carlos Encarnação, delibera atribuir ao Prof. Manuel Antunes a Medalha da Cidade

26/11/2007

O CCCT recebe o prémio Hospital Futuro, na categoria “Gestão & Economia da Saúde” (patrocinado pelo Novartis Oncology)

27/08/2008

Realiza-se a primeira transplantação cardíaca pediátrica

12/05/2009

Transplantação de rim e coração de uma só vez, pelas equipas do Centro de Cirurgia Cardiotorácica e do Serviço de Urologia e Transplantação Renal dos HUC

15/04/2010

Inauguração de vivenda oferecida por Tomás Sanches da Gama sita na Rua António José de Almeida, em Coimbra, no nº 220, para apoio residencial aos doentes e famílias após as cirurgias

Agosto 2012

O Tribunal de Contas anuncia os resultados da auditoria às 4 principais unidades de cirurgia cardiotorácica nacionais - CHUC, Santa Marta e Santa Maria (Lisboa) e S. João (Porto) – destacando o CCCT como tendo a melhor performance entre 2008-2010

23/02/2013

Os eminentes cirurgiões cardíacos Alain Carpentier e Magdi Yacoub recebem o grau de doutor honoris causa pela Universidade de Coimbra, tendo como proponente e padrinho Manuel Antunes

22/03/2013

O Ministro da Saúde, Paulo Macedo, anuncia a atribuição da Medalha de Ouro da Saúde a Manuel Antunes e ao serviço que dirige

—9—

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

ENQUADRAMENTO

E

m meados da década de 70 do séc. XX a sociedade em geral, e a comunidade médica em particular, despertava para uma dura realidade: as doenças cardiovasculares eram a principal causa de morte nos países industrializados ou em vias de industrialização. Era urgente combater este mal social! Em Portugal, e na área da cirurgia cardíaca, os principais serviços e investimentos estavam concentrados nas duas maiores cidades do país: as cirurgias intracardíacas realizavam-se, com regularidade, nos hospitais de Santa Maria e Santa Marta (ambos em Lisboa) e no Hospital S. João (Porto). No Serviço de Cirurgia Torácica do Hospital de S. João registavam-se significativos avanços: correcção cirúrgica de algumas cardiopatias congénitas e substituições de válvulas desde Novembro de 1975 e, desde 1971, operações ao coração que não necessitavam do apoio da «máquina de coração pulmão». Por outro lado, a Fundação Calouste Gulbenkian concedera em 1976 um subsídio de 9 mil contos que iria permitir o diagnóstico preciso de cardiopatias congénitas durante os primeiros 2 anos de vida e da doença coronária. O transplante cardíaco não passava de uma miragem, se bem que Portugal tivesse dado um passo de gigante ao nível da transplantação: a 20/7/1969 a equipa liderada por Linhares Furtado fazia o primeiro transplante renal com dador vivo nos HUC.

— 11 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

1 OS PRIMÓRDIOS DA CIRURGIA CARDÍACA EM COIMBRA



A singela homenagem revestiu-se de grande significado, já que o Prof. Bártolo Pereira foi o fundador do referido Serviço, em 1977, numa altura em que se destacou como pioneiro da cirurgia cárdio-torácica em Portugal. Muitos se recordarão ainda das difíceis e bem sucedidas intervenções cirúrgicas desse foro levadas a cabo por este Mestre da Faculdade de Medicina de Coimbra, num trabalho pioneiro que deu brado nos meios científicos e fora deles, e que muito prestigiou não só os HUC, mas toda a Escola de Medicina coimbrã.



[In Jornal de Coimbra, 31/03/1989]

— 13 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

N

o âmbito do Serviço de Cirurgia III dos HUC, de que era Director o Prof. Bártholo do Valle Pereira criou-se um sector dedicado à Cirurgia Cardiotorácica em meados dos anos 70 do Séc. XX. Aquele professor fora pioneiro da cirurgia cárdio-torácica em Portugal: em 1957 fizera a primeira correcção de uma coartação da aorta, e seria o responsável pelo início da comissurotomia mitral fechada digital como tratamento cirúrgico para a estenose mitral. Foi também da sua iniciativa, o envio do Dr. Marcial de Oliveira para um estágio nos EUA, no Hospital de Monte Sinai, levando às primeiras cirurgias cardíacas em 1976. Podemos mesmo falar de uma revolução da Cirurgia Moderna de Coimbra, designadamente ao nível do pós-operatório e seguimento de doentes, demonstrando propósitos de reforma e modernização: «Já no espirito do Prof. Bártolo havia a intenção de modernizar esta Universidade e introduzir uma disciplina que praticamente não havia em Coimbra: a Cirurgia Cardíaca»1. Este pensamento levaria à constituição de uma equipa, por si dirigida, com a missão de preparar a primeira cirurgia de coração aberto (com circulação extracorporal) de que faziam parte: Luís Eugénio, Ferrão de Oliveira, Baptista Geraldes e Paula Santos, seus antigos alunos, escolhidos com base nas elevadas notas académicas, e que realizaram as cirurgias experimentais em animais (cães). Como recorda o Dr. João Bernardo «havia a preocupação em formar uma equipa multidisciplinar para arrancar com a Cirurgia Cardíaca, extensível à enfermagem, pois a enf.ª Matilde Lopes também aprendeu, nos Estados Unidos, a gerir uma Unidade de Cuidados Intensivos Cardíacos»2. A primeira cirurgia de coração aberto a um humano decorreria nos antigos HUC (Colégio de S. Jerónimo), no Serviço de Cirurgia III, a 28/06/1977, embora fosse, na época, um tipo de operação feita com regularidade em Lisboa e Porto. Com participação dos Professores Bártholo Pereira e Marcial de Oliveira, demorou sete horas de bloco operatório e a circulação extracorpórea fez-se durante 1h 7m (tempo que o coração esteve parado e foi 1 Dr. Luís Eugénio entrevistado por João Pinho, 10/10/2013 2 Dr. João Bernardo entrevistado por João Pinho, 28/10/2013

— 14 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

substituído por uma máquina coração-pulmão). A equipa cirúrgica envolveu um grande número de pessoas (entre as quais 7 cirurgiões e 9 cardiologistas), instrumentistas, enfermeiros, técnicos de circulação extra-corpórea, pessoal de laboratório, e transfusão de sangue3. A intervencionada chamava-se Maria de Lurdes Ferreira de Matos, de 17 anos, e era natural de Serpins, Lousã. Até então retida numa cama, recuperou a mobilidade ao fim de um mês, conseguindo recuperar a qualidade de vida. O segundo paciente operado, a 12/7/1977, foi Aurélio Augusto Correia Marques, de 21 anos. Este sucesso seria, no entanto, ofuscado pela polémica, que veio a público através de declarações à imprensa, sob anonimato, de um médico da equipa: «Veja só – disse – que a Fundação Calouste Gulbenkian deu-nos oito mil contos para construirmos uma unidade de cuidados intensivos e essa construção está a ser dificultada por determinados directores de serviços deste hospital (…) No ano passado, através de doentes que noutros países se foram submeter a intervenções cirúrgicas deste tipo, saíram 72.000 contos em divisas do país, quando nós temos as mesmas condições no aspecto humano para as fazer com as mesmas probabilidades de êxito. O que não temos é equipamento adequado e sobretudo vontade de trabalhar»4. O pequeno sector de Cirurgia Cardiotorácica, sabia que o caminho passava pelo controlo da lista de espera mas, a limitação de espaços e de apoios, condicionava o rumo a seguir. A partir de Setembro de 1977 fixou como meta efectuar uma cirurgia cardíaca por semana: «Este é o máximo possível, já que o Serviço de Cirurgia Cardiotorácica não dispõe de bloco operatório próprio. No entanto, estão a ser feitas diligências para que tal bloco seja construído, tendo a Direcção das Construções Hospitalares prometido que, dentro de pouco tempo, começará a estudar o respectivo projecto»5.

3

«Primeira operação de coração aberto feita ontem em Coimbra» In Diário de Coimbra, (manchete), 29/06/1977

4 Idem. 5 «Coração Aberto – Uma operação por semana a partir de Setembro» In Jornal de Noticias, 25/07/1977

— 15 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

2 O ANO DA MUDANÇA – 1988



Encontrei condições históricas muito más, mas pessoas que queriam libertar-se do passado e construir um futuro. Pude impor o sistema e condições de trabalho.





[Professor Manuel Antunes entrevistado por João Pinho, 01/10/2013]

Em termos de cirurgia cardíaca e de organização de trabalho, a criação do Serviço de Cirurgia Cardiotorácica dos HUC foi uma pedrada no charco em Portugal.



[Dr. José Ferrão de Oliveira, entrevistado por João Pinho, 24/10/2013]

— 17 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

A

chegada do Prof. Manuel Antunes no dia 21 de Março de 1988, para chefiar o Serviço de Cirurgia Cardiotorácica dos HUC, não foi um ponto de partida mas de chegada. De facto, as conversações para a sua vinda haviam começado três anos antes, em 1985, tendo a iniciativa do convite partido do Prof. Bártholo do Valle Pereira, que vinha diligenciando no sentido de encontrar um continuador, pois em 1988 terminaria as suas funções por limite de idade. Na base desta necessidade estavam motivações de índole técnica: «A Cardiologia sentia a falta de um Serviço de Cirurgia Cardíaca a funcionar com qualidade. Estudam os doentes, fazem o diagnóstico, mas tem de haver uma solução. Que na maior parte das vezes é a cirurgia cardíaca»6. Uma necessidade tão ou mais urgente dado que o serviço havia suspendido a sua actividade em 1986, por decisão do Conselho de Administração do Hospital, que aproveitou a mudança das antigas instalações do Colégio de S. Jerónimo para Celas. Na época apontou-se a ineficiência do serviço e, em particular, o desaire de um pequeno programa de cirurgia cardíaca que registava em 9 anos de actividade apenas 183 cirurgias de coração aberto. O então Director do Serviço de Cardiologia, Prof. Ramos Lopes, em face das deficientes condições humanas, materiais e logísticas, chegou a informar o Conselho de Administração dos HUC que não enviaria mais doentes para a cirurgia. A constituição da equipa de trabalho interrelaciona-se, também, com a vinda do Prof. Manuel Antunes. De facto, e dentro do espírito de modernização e reforma da Cirurgia Cardíaca, o Prof. Bártholo do Vale Pereira tomaria uma decisão fundamental, como nos conta o Dr. Luís Eugénio: «Eu e o Dr. Ferrão de Oliveira fomos para o estrangeiro. Eu, para Roterdão, o Dr. Ferrão para Estocolmo. Algum tempo depois acabámos por ficar os dois em Roterdão, partilhando a especialidade (1981-1982). Quando regressámos constatamos que esta unidade não funcionava bem. Por outro lado, no tempo em que estive na Holanda contactei com o Prof. Manuel Antunes fez uma visita à unidade onde trabalhei. O nome ficou-me sempre na cabeça: havia na África do Sul uma pessoa portuguesa, um bom cirurgião e trabalhava num dos maiores centros mundiais de cardiologia e cirurgia cardiotorácica. Quando regressámos a Coimbra, transmitimos aos responsáveis dos HUC que, se queríamos avançar, teríamos de organizar a equipa em moldes diferentes. Nesse sentido, seria bom que os professores Norberto Canha 6 Dr. José Ferrão de Oliveira, entrevistado por João Pinho, 24/10/2013

— 18 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

e Ramos Lopes, juntamente com Bártholo do Valle Pereira, contactassem Manuel Antunes no sentido de saber da sua disponibilidade para vir para Coimbra, uma vez que ia haver um hospital novo, com boas condições para arrancar com a Cirurgia Cardíaca»7. Manuel Antunes confirma e realça o movimento criado em seu redor: «Foram médicos, professores universitários e outras pessoas que se interessaram pelo meu ingresso, e se empenharam para que eu ficasse neste hospital. E sem pretender ferir susceptibilidades, porque a todos me ligam laços de amizade e a todos estou grato, quero destacar o Prof. Norberto Canha na luta que travou para conseguir a minha colocação neste hospital»8. O cardiologista Manuel Ramos Lopes9 e Director do Serviço de Cardiologia dos HUC teria intervenção decisiva na vinda de Manuel Antunes: «Numa carta escrita ao Conselho de Administração de então, em 1985, decidiu quebrar o “statuos quo” que existia e apontar esta situação que veio a entrar em prática»10. No entanto, e após os primeiros contactos, Manuel Antunes não disse que sim, nem que não: «Disse um nim. Vir criar um novo serviço era um projecto tentador, na medida em que de cada visita que fazia a Portugal, os directores dos outros serviços do país, desafiavam-me a ficar onde estava, porque aqui as coisas eram muito difíceis»11. Por outro lado, estava a um passo de atingir o topo da carreira: «No meio de um concurso para Prof. Catedrático e Director de Serviço. Tinha duas posições equivalentes, mas o serviço de lá era mais prestigiado e prestigiante». Neste contexto, seriam razões afectivas a pesarem na sua decisão: «ver crescer os filhos no seu próprio país e criar um Serviço de Cirurgia Cardiotorácica com a qualidade e a intensidade dos que existem lá fora».12 Aceite a missão, avançou-se para o desenho e estratégia de formação da sua equipa, em articulação com a administração hospitalar: dois cirurgiões, Luís Eugénio e Ferrão de Oliveira e perfusionistas passariam 12 meses na África do Sul, trabalhando com o próprio Manuel Antunes para aprenderem novos métodos; o pessoal de enfermagem estagia em outros locais do país para ganhar experiência; o anestesista Dr. Cunha Leal integra a equipa, vindo do Hospital dos Covões. 7 Dr. Luís Eugénio entrevistado por João Pinho, 10/10/2013 8 «É preciso uma revolução na Medicina portuguesa», In O Dia, 21/02/1989, nº 309, p. 16 9 Falecido a 10/11/2008 10

«Morreu o cardiologista Manuel Ramos Lopes» In Diário de Coimbra, 11/11/2008 p. 7

11 Prof. Manuel Antunes entrevistado por João Pinho, 01/10/2013 12 «Manuel Antunes, Perfis» In Jornal de Noticias, 01/04/1992

— 19 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

Manuel Antunes visitaria o novo hospital, já em pleno funcionamento, no mês de Agosto de 1987, aproveitando para falar com elementos do corpo médico e do corpo de enfermagem: «E encontrei um ambiente de pessoas muito ansiosas, à espera que aceitasse o convite»13. Das muitas conversas e reuniões, delineou-se um projecto capaz de desenvolver «as infraestruturas necessárias para fazer um serviço que prestigiasse não só este hospital e esta cidade, mas provavelmente também este país»14. Uma nova liderança e um novo programa que provocaram inevitáveis rupturas. As instalações da Cirurgia dos HUC haviam sido adaptadas da unidade de queimados (que transitara para os pavilhões de Celas). Manuel Antunes, quando chegou, alterou-a de imediato, em função da filosofia e métodos de trabalho que desejava implementar: «…construção de uma segunda sala de operações, o alargamento do corredor que envolvia o serviço e de algumas paredes para aproveitar melhor os espaços. A segunda fase seria a construção de um novo piso no mesmo bloco. Alargaríamos a unidade de cuidados intensivos e transformaríamos a enfermaria numa unidade de cuidados intermédios e de transplantação, construindo, por cimaW, uma enfermaria geral»15. A primeira fase, do alargamento da unidade, ficaria concluída em 1991, provocando impactos positivos no débito cirúrgico. Porém, a segunda parte do projecto, que rondava os 11.000 contos, teria um final infeliz: «…porque, na véspera do lançamento do concurso para a empreitada, a Comissão Médica deste Hospital, com a anuência da Administração, vetou-o, sob o argumento de que ele previa obras a executar numa zona perto do Bloco Operatório Central, o que poderia ter implicações graves no seu funcionamento»16. Manuel Antunes desembarcou a 21 de Março de 1988 (data em que se vem comemorando o aniversário da unidade), realizando a primeira reunião no dia seguinte, iniciando as cirurgias a 28/03, fundando assim o Serviço de Cirurgia Cardiotorácica dos HUC. O professor, então com 39 anos, seria classificado como «o médico português que mais corações opera na África do Sul»17. De facto, os números que trazia da África do Sul faziam espantar: responsável por uma das mais 13 Prof. Manuel Antunes entrevistado por João Pinho, 01/10/2013 14 «Um dos melhores cirurgiões do Mundo começou a trabalhar nos HUC»», In Jornal de Coimbra, 30/03/1988, p. 5 15 «Doença da Saúde deve-se à má gestão dos serviços» In Tecno-hospital, nº 10, 1º Quadrimestre de 2002 p. 16 16 Idem 17 Notícia da Agência Lusa, 10/03/1988.

— 20 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

avançadas unidades de cirurgia cardíaca a nível mundial realizando, anualmente, mais de 1200 intervenções; coordenador de um grupo de 25 médicos e mais de 100 pessoas; e professor na mais prestigiada universidade Sul-Africana: Witwatersrand. Ao iniciar funções, o Serviço estava à beira da ruptura, com mais de 300 doentes em lista de espera. Porém, uma grande confiança era depositada nas suas capacidades de trabalho e dons naturais – a destreza e rapidez: «Nas suas mãos “milagrosas” poderão estar a esperança de vida de muitas dezenas de doentes cardíacos que aguardam, em extensa lista de espera, o momento de serem submetidos a indispensável intervenção cirúrgica»18. Um entusiasmo crescente que contagiava o pessoal da cirurgia: «Nos Serviços de Cirurgia Cardíaca dos Hospitais da Universidade de Coimbra respira-se um ambiente de entusiasmo claramente visível e notório. As razões são já do domínio de algum público: a actuação de um cirurgião do foro cardíaco recentemente chegado da África do Sul está a empolgar os médicos da equipa e o pessoal de enfermagem. Os próprios doentes, normalmente renitentes a intervenções de alto risco, afirmam disponibilidade pouco vulgar»19. Manuel Antunes era, então, um jovem médico-cirurgião, despretensioso, sem falsas modéstias, consciente do seu valor, do longo caminho a percorrer pela cirurgia portuguesa para ficar ao nível da cirurgia cardíaca europeia e mundial». Porém, talvez não imaginasse a resistência interna e externa ao desenvolvimento do seu trabalho: «Quando disse que precisávamos de fazer 400-500 cirurgias anuais, deu a ideia no hospital que vinha aí um doido varrido com ideias impraticáveis e utópicas. As pessoas não estavam habituadas à velocidade de trabalho. Quando no primeiro dia marquei duas cirurgias para fazer, o Director do Hospital chamou-me e disse: “Veja lá o que vai fazer…”. Penso que as pessoas ficaram assustadas com o que isso podia representar»20. Ao tomar posse na qualidade de Chefe dos Serviços de Cirurgia Cardiotorácica do HUC assumiu como objectivo dar resposta às necessidades da Zona Centro, tendo como referência as 1200 intervenções ano na África do Sul, e definiu como prioridades o combate às anginas de peito, doenças valvulares e insuficiências congénitas. O cenário de aposta na transplantação cardíaca seria inicialmente afastado: 18 «Um dos melhores cirurgiões do Mundo começou a trabalhar nos HUC», In Jornal de Coimbra, 30/03/1988, p. 5 19 «Cirurgia Cardíaca nos Hospitais da Universidade de Coimbra: eficácia e competência entusiasmam Serviços» In Diário de Coimbra, 16/05/1988, p. 2 20 Prof. Manuel Antunes entrevistado por João Pinho, 01/10/2013

— 21 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

«…devo dizer que a transplantação cardíaca não está nos nossos planos imediatos. Aliás, quero sublinhar que a transplantação é, tecnicamente, uma das operações mais simples que se fazem em cirurgia cardíaca – e é bom que o público português o saiba, para se desmistificarem certos factos. (…) e de seguimento do doente no pós operatório, mobiliza uma quantidade enorme de pessoal. Portanto, exigem maiores recursos e mais despesas para tratar menos doentes. Claro que não quero dizer com isto que se não devam fazer transplantações. Só que neste momento temos muitos doentes à espera de outros tipos mais simples e menos caros de cirurgia. Portanto, com os meios de que dispomos, vamos poder tratar muitos mais doentes. Só quando a nossa lista de espera estabilizar é que deveremos encarar as transplantações»21. A transplantação cardíaca dava, na época, os primeiros passos em Portugal: a 18/02/1986 seria transplantada a primeira portuguesa, em Carnaxide, no Hospital Santa Cruz, pela equipa do Prof. João Queirós e Melo, quase 20 anos depois do feito de Christiaan Barnard, na África do Sul. Demorara 3 horas e meia e custara 400 contos. Eva Pinto sobreviveu 9 anos e tornou-se um símbolo do sucesso de uma área nova na cirurgia moderna em Portugal. Em Coimbra, um dos primeiros sucessos da nova equipa ocorreu no Outono de 1988; a primeira intervenção cirúrgico-cardíaca a um bebé com circulação extra-corporal. De nome Filipe, tinha ano e meio, sendo natural de Trancoso22. João Bernardo assinala, também, a qualidade da equipa já existente: «A vinda de Manuel Antunes mostrou que nós, ao longo do tempo, tinhamos adquirido alguma preparação, que permitiu avançar com a cirurgia complexa. Tanto assim é que dois dias depois do Prof. Manuel Antunes cá estar houve um acidente de viação em Condeixa e um homem teve uma rotura traumática da aorta. Tratava-se de uma cirurgia muito complexa, que foi feita, o doente sobreviveu e ficou bem. Isto só foi possível porque havia já uma equipa capaz, com preparação razoável»23. Já com a lista de espera controlada, aguardava-se que a qualquer instante Manuel Antunes anunciasse o início dos transplantes, dada a pressão que a sociedade fazia nesse sentido. Pouco tempo depois do início da longa caminhada, Manuel Antunes lançaria na imprensa uma das suas frases emblemáticas: «A medicina por-

21 Id. 22 «Bebé submetido com êxito a intervenção cirúrgico-cardíaca com circulação extra-corporal» In Diário de Coimbra, 10/11/1988 23 Dr. João Bernado entrevistado por João Pinho em 28/10/2013

— 22 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

tuguesa precisa de uma revolução». Tal conclusão traduzia a constatação colhida no terreno de um atraso transversal, do técnico ao científico, da gestão à racionalização: «A medicina portuguesa está atrasada não só em relação à sul-africana como à europeia, para já não falar na norte-americana, que considero a mais avançada. Não são os médicos portugueses que estão atrasados – note-semas sim a Medicina nas suas múltiplas estruturas (…) Médicos e demais pessoal hospitalar necessitam ser mais dedicados e as estruturas melhoradas para que a assistência hospitalar seja, de facto, boa (…) Os Serviços de Cirurgia Cardíaca não funcionavam há três anos. Também não existiam condições para que eles funcionassem. Era uma lacuna grave, um equívoco tremendamente prejudicial ao país (…) «…a distribuição dos médicos pelo País está incorrecta. Há excesso de médicos em hospitais centrais, nas cidades, que faltam na periferia. É consequência da falta de condições no interior para o exercício da medicina »24. O sucesso obtido pelo SCCT dos HUC despertou natural curiosidade a nível governamental, levando a Ministra da Saúde, Leonor Beleza a visitar o serviço a 03/01/1989, momento aproveitado por Manuel Antunes para assinalar o volume de trabalho: «…foram efectuadas 267 operações pela sua equipa nos últimos sete meses (40% das quais em crianças), sendo a taxa de mortalidade de 1,5 %.»25. Ao fim de pouco tempo de actividade, Coimbra estava colocada no mapa da cirurgia cardiotorácica nacional e internacional: «Duma atitude e observação negativa do serviço conseguimos dar o salto qualitativo»26. Uma alteração do status quo que teve o seu preço: tanto nacional, dado que Lisboa e Porto não estavam habituados a uma Coimbra com Cirurgia Cardíaca, assumindo por isso uma atitude paternalista; como interna, difundiu-se a ideia que para o novo serviço vinha tudo e para os antigos nada, algo que se corporizou nas tradicionais “lutas hospitalares” envolvendo a faculdade e a universidade.

24 «É preciso uma revolução na Medicina portuguesa», In O Dia, 21/02/1989, nº 309, pp. 16-17 25 «Leonor Beleza fez visita relâmpago», In Jornal de Coimbra, 04/01/1989, p. 10 26 Luís Eugénio entrevistado por João Pinho, 10/10/2013

— 23 —

Foto 1 – Visita ao Serviço de Cirurgia Cardiotorácica dos HUC de Gordon Danielson, da Mayo Clinic (EUA) durante o I Simpósio Internacional de Actualização em Cirurgia Cardíaca (28 e 29 de Maio de 2003)

Foto 2 – Gordon Danielson e Manuel Antunes no Penedo da Saudade (I Simpósio Internacional de Actualização em Cirurgia Cardíaca, 28 e 29 de Maio de 2003)

Foto 3 – Visita a Conímbriga (I Simpósio Internacional de Actualização em Cirurgia Cardíaca, 28 e 29 de Maio de 2003), com o Prof. Rahimtoola, de Los Angeles (terceiro a contar da esquerda)

Foto 4 – Almoço-convívio (I Simpósio Internacional de Actualização em Cirurgia Cardíaca, 28 e 29 de Maio de 2003)

Foto 5 – Manuel Antunes no SCCT, Fevereiro 1996

Foto 6 – Prof. Vasco Tomás (e doente 5.000), recebendo os cumprimentos do Prof. Manuel Antunes

Foto 7 – Despacho criando o Centro de Responsabilidade de Cirurgia Cadiotorácica dos HUC

Foto 8 – Inauguração novo edificio do CCCT: Dr. Luís Eugénio fazendo a leitura bíblica, ladeado à direita pelo Prof. Manuel Antunes e pelo Primeiro-Ministro Durão Barroso e à esquerda pelo Bispo D. Albino Cleto

Foto 9 – Inauguração do novo edifício do CCCT pelo Primeiro-Ministro Durão Barroso (30/09/2002)

Foto 10 e 11 – Inauguração do novo edifício do CCCT: Prof. Manuel Antunes mostrando as novas instalações

Foto 12 – Centro de Cirurgia Cardiotorácica: acesso principal (Piso 0)

Foto 13 – Centro de Cirurgia Cardiotorácica: Hospital de Dia da Transplantação (Piso 2)

Foto 14 – Centro de Cirurgia Cardiotorácica: Quarto da Enfermaria (Piso 2)

Foto 15 – Centro de Cirurgia Cardiotorácica: Sala de Hemodinâmica da Transplantação Cardíaca (Piso 2)

0

2012

2011

2010

2009

2008

2007

2006

2005

2004

2003

2002

2001

2000

1999

1998

1997

1996

1995

1994

1993

1992

500

1991

600 2012

2011

2010

2009

2008

2007

2006

2005

2004

2003

2002

2001

2000

1999

1998

1997

1996

1995

1994

1993

1992

1991

1990

1989

1600

1990

1988

N.º de Operações 1800

1989

1988

N.º de Operações

GRÁFICO 1 – Actividade Global 1988-2012

2000

Pulmonar Cardíaca Total

1400

1200

1000

800

600

400

200

0

GRÁFICO 2 – Cirurgia Cardíaca 1988-2012

700

Congénitos Valvulares Coronários Outros

400

300

200

100

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

3 A APLICAÇÃO DE UM NOVO CONCEITO E OS PRIMEIROS RESULTADOS



O maior problema que a saúde em Portugal enfrenta não é a falta de equipamentos ou de infra-estruturas; a coisa mais importante em todos os actos médicos é a parte humana. O sucesso ou insucesso da medicina tem mais a ver com o factor humano do que com o equipamento.



[Professor Manuel Antunes In Serras de Ansião, 15/02/1999]

— 33 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

O

serviço dirigido pelo Prof. Manuel Antunes afirmou-se devido à aplicação, com sucesso, de uma fórmula original, envolvendo conceitos diversos, tais como: autonomia de gestão, dedicação exclusiva, rentabilidade do material e elevados índices de produtividade. A dedicação exclusiva seria a pedra angular de todo um sistema absorvido da escola anglo-saxónica: «Treinei-me num sistema de raiz anglo-saxónica, com uma ligação muito grande à metodologia americana, altamente eficiente, de disciplina, de horário, de respeito. Foi isso que transpus para aqui com pequenas adaptações»27. Este sistema seria a melhor opção para praticar um tipo de medicina que fosse ao encontro das necessidades do povo: «Tencionava praticar uma cirurgia mais simples, junto do povo moçambicano. Porém, os vários acontecimentos políticos e sociais impediram o meu regresso àquele país»28. Nos princípios de 1989, a não existência de lista de espera constituía um facto novo e incomum na área hospitalar. Um sucesso assim interpretado: «Somos uma equipa de oito médicos, três dos quais especialistas. Todos trabalham em regime de exclusividade, havendo um médico sempre presente nas 24 horas do dia. Trabalhamos 60 horas por semana, e, em cada sete dias um de nós trabalha 36 horas consecutivas»29. O novo conceito estendeu-se a áreas menos conhecidas do grande público: durante a cirurgia, por exemplo, escuta-se música, dado o «efeito tranquilizante no espírito do cirurgião». O balanço do Serviço, referente a 1989, impressionava os mais céticos: sem lista de espera, dimensionado para 150 intervenções anuais, realizara durante aquele ano 771! Números que o professor atribuía ao «espírito de equipa vivido naquela unidade», dando garantias da sua transformação «numa unidade de ponta, que dê o salto qualitativo para a Europa» (ver gráficos 1 e 2). O cirurgião, a título pessoal, efectuou, o segundo maior número de reconstruções da válvula mitral a nível mundial!30 Na quinta-feira, dia 05/07/1990, a equipa do SCCT dos HUC completava a milésima operação de coração aberto. Não satisfeitos com os resultados obtidos, foi por esta altura revelado um novo projecto: as obras de construção de mais uma sala de operações, avaliada em 80.000 contos, sendo comparticipado a 50% cada - pelo Estado e Fundação Calouste Gulbenkian31. 27 Prof. Manuel Antunes entrevistado por João Pinho, 01/10/2013 28 «Equipa

médica dos HUC revoluciona cirurgia cardio-torácica em Coimbra» In Notícias Médicas, Ano XVIII, nº 1826, 26/05/1989, p. 15

29 «É preciso uma revolução na Medicina portuguesa», In O Dia, 21/02/1989, nº 309, p.17 30 «Cirurgia Cardio-Torácia quer ser unidade de ponta» In Diário de Coimbra, 25/05/1990 31 «Coração aberto: mil operações em apenas dois anos» In Diário de Coimbra, 11/07/1990

— 34 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

MILÉSIMA OPERAÇÃO DE CORAÇÃO ABERTO A milésima operação ao coração aberto realizada em 2 anos, foi um marco na história do SCCT dos HUC, na medida em que nos 12 anos anteriores apenas se haviam realizado 182. Para o responsável da equipa as mil operações tiveram um significado especial: «… a equipa é a mais activa do país, uma vez que sendo a mais pequena de todas é a que tem efectuado mais intervenções». O feito seria comemorado com uma sessão solene, realizada nos auditórios dos HUC numa sexta-feira, dia 12/07/1990, onde o milésimo doente foi homenageado. Naquele momento pretendeu-se assinalar o sucesso da grande maioria das intervenções, que tornavam o serviço no mais produtivo da Península Ibérica. O evento superou as expectativas, contando com a presença de numerosos doentes operados naquele serviço. Usaram da palavra, pela direcção dos HUC, o Dr. Meliço Silvestre e, pelos doentes, José Rabaça, Ex-Secretário de Estado da Indústria. O serviço apresentava indicadores únicos de que se destacava a ausência de lista de espera ou uma mortalidade inferior a 1% «o que poderia até constituir um recorde a nível mundial e não comparável a nível nacional». Por outro lado, cerca de 30% dos doentes eram provenientes do Norte e Sul de Portugal, com doentes intervencionados de todos os concelhos. A capacidade de resposta resultava de uma equipa em dedicação exclusiva, constituída por 10 cirurgiões, anestesistas e cardiologistas, 40 enfermeiros, e outros técnicos. O momento festivo seria aproveitado pelo serviço para revelar uma técnica inovadora, única a nível nacional e de restrita aplicação mundial. Tratava-se da cirurgia coronária a céu fechado, tendo o serviço registado 12 operações do tipo e todas com êxito: «em que a operação é efectuada com o coração a trabalhar e em que o doente não está ligado a qualquer máquina de coração-pulmão, ao contrário da de coração aberto em que o paciente está ligado à máquina». No entanto, o sucesso da milésima operação não revelava outra imensa conquista que Manuel Antunes assinalou: «apenas duas ou três pessoas se recusaram a ser operadas, depois de bem conversadas, mas agora as pessoas procuram-nos prontas para serem operadas. Há uma confiança que se foi construindo pelo trabalho realizado. Não se trata de uma conquista puramente médica, mas envolve as condições de hotelaria, o acompanhamento dos doentes, e o carinho com que o nosso pessoal de enfermagem trata os doentes – o que se tem espalhado muito rapidamente lá fora». [In Diário de Coimbra, 11/07/1990; Jornal de Coimbra, 18/07/1990]

— 35 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

4 A CONSOLIDAÇÃO E AFIRMAÇÃO DE UM MODELO: A CRIAÇÃO DO CRI





Entendo que é no local que as decisões têm que ser tomadas e não num gabinete, a 200 quilómetros de distância. Esta é a filosofia dos CRI. [Professor Manuel Antunes In Campeão das Provincias, 22/06/2000]

— 37 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

O

s anos 90 trouxeram a afirmação do modelo construído pelo Prof. Manuel Antunes, concretizando o objectivo expresso na divisa do Hospital de Joanesburgo, «Ciência e Trabalho», mas que no SCCT foi definida como: «Equipa, Responsabilização e Disciplina». Aos seus médicos exigia exclusividade de funções e não aceitava que fizessem clinica privada: «Para tal ser possível conseguiu negociar um esquema de pagamentos onde o horário normal é de 42 horas semanais, mas o excedente até às 75 horas que por vezes os membros da equipa perfazem, são pagas em horas extraordinárias»32. Quanto a férias, não se tiravam quando se desejavam. «Autorizo duas semanas de férias entre 1 de Julho e 30 de Setembro». Uma forma de trabalhar que muitos apelidavam de «regime espartano», e que merecia de Manuel Antunes o seguinte comentário: «Somos especiais neste País, mas somos normais em relação a serviços congéneres europeus ou dos Estados Unidos»33. Muitas das suas ideias, intencionalmente ou não, seriam trazidas à discussão por diversos titulares das pastas ministeriais da Saúde. Arlindo Carvalho, por exemplo, afirmava em 1992 que esse seria um ano de mudança, e que estava em curso um programa visando o controlo da qualidade. Ao empossar diversos administradores hospitalares chamou atenção para uma melhor gestão dos recursos humanos e «rigoroso cumprimento dos horários de trabalho» por parte dos médicos em serviço hospitalar. E acrescentou: «Não é admissível que um doente que se desloque a uma unidade hospitalar não seja atendido porque o médico que devia estar não está»34. Outros objectivos passavam pela incontornável redução das listas de espera e atendimento mais eficiente. Também por esta altura, e fruto dos resultados obtidos no Serviço, a imprensa sedeada nos grandes centros (Lisboa e Porto), começou a reconhecer a existência de uma unidade de excelência em Coimbra: tanto pelo movimento apresentado em 1991, com 991 intervenções (mais 11% que no ano anterior), 236 na área pulmonar e 755 na cardíaca, com média diária de 4 operações ao coração; como pela taxa de mortalidade baixa – de 0,4% na primeira (uma morte) e 1,6% na segunda; e também pela inexistência de lista de espera, bem como pelo mediatismo trazido pela operação a personalidades da vida pública nacional, como Artur Agostinho, ali operado em Março de 1992 35.

32 «Manuel Antunes opera corações…e fechaduras», In A Capital, 19/07/1996, p. 22 33 Id. 34 «Arlindo quer médicos a cumprir horários» In Mensageiro de Bragança, 27/03/1992, p. 6 35 «Coimbra opera 755 operações por ano» In Jornal de Noticias, 27/03/1992, p. 4

— 38 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

O segredo estava, obviamente, no método de trabalho: não tendo a equipa mais numerosa nem dispondo da aparelhagem mais sofisticada, registava, em 1992, o dobro da produtividade dos outros serviços, para o qual muito contribuíam as 13h de serviço do pessoal. O modelo depressa colocou em causa a ineficiência dos serviços hospitalares e a baixa produtividade dos hospitais do SNS. De facto, os números sequenciais de 1991-1993 chamaram a atenção de toda a comunidade, catapultando o serviço para uma fasquia inimaginável: Em toda a Europa, e no ano de 1991 efectuaram-se 208.000 operações, 1945 das quais em Portugal, perfazendo uma média de apenas 185 operações por cada milhão de habitantes, muito abaixo da média anual europeia que era de 390. Contudo, realizaram-se em Coimbra 653 operações, ou seja; 1/3 do total nacional. Em 1992 fizeram-se 800 intervenções cirúrgicas apontando-se para 1993 as 900. Perante estes números, o SCCT de Coimbra situava-se, claramente, acima da média, ao lado de países de vanguarda. Em 1993, o SCCT realizou no auditório dos HUC o primeiro evento de projecção internacional, o Simpósio Internacional de Actualização em Cirurgia Cardíaca (fotos 1 a 4), durante os dias 28 e 29 de Maio: «Já era tempo de organizarmos uma reunião, uma vez que estamos a funcionar há cinco anos e nunca o tínhamos feito. Por isso pretendemos organizar um encontro que pudesse ser um contributo importante no avanço da cirurgia cardíaca e da cardiologia em Portugal, como é o caso deste»36. Teve a participação de mais de 250 cirurgiões e cardiologistas, a maioria de países europeus. De destacar as lições proferidas pelos mestres de cirurgia cardíaca: Alain Carpentier (Paris), Gordon Danielson (da Mayo Clinic, EUA), Magdi Yacoub (Londres), Marko Turina (Zurique), Adib Jatene (S. Paulo), e Manuel Antunes; e dos cardiologistas Shabudin Rahintoola e Luis Providencia37. Por esta altura, Manuel Antunes (foto 5) faria um ponto da situação sobre a cirurgia cardíaca em Portugal. Assim, o problema da cirurgia cardíaca não se devia a carências de meios técnicos ou financeiros: «não podemos dizer que somos super-abastados, mas também desperdiçamos muito (…) somos um país subdesenvolvido que aprendeu a viver dentro das suas dimensões (…) não significa necessariamente uma diminuição de qualidade (…) Qualquer centro do país estaria habilitado, com o que tem hoje, a cobrir cerca de 98 por cento das necessidades. Não há praticamente intervenções cirúrgicas que não possam ser efectuadas em Portugal»38.

36 «Não somos super-abastados, mas desperdiçamos muito», In Jornal de Coimbra, 26/05/1993, p.5 37 «International Symposium – update in Cardiac Surgery» In Tempo Medicina, 27/09/1993, p. 6 38 «Não somos super-abastados, mas desperdiçamos muito», In Jornal de Coimbra, 26/05/1993, p.5

— 39 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

As questões correlacionadas com a rentabilidade voltavam a emergir, referindo que uma operação de coração aberto, sem próteses, custava em média 1200 contos, enquanto nos HUC ficava por 700: «Conseguimos reduzir o preço de uma forma drástica, com o aproveitamento e rendibilização do equipamento que era “disposable” mas que pode ser reutilizado sem risco para os doentes. Possuímos um quadro médico muito inferior ao da média nacional e fazemos mais do dobro da média do país. Aqui não se aplica a regra dos 80 por cento para pessoal, e 80 por cento para as despesas. Não possuímos equipamento supérfluo, que é outro grande sector de despesa (…) o equipamento deve estar sempre a funcionar e quando não está tem de ser reparado rapidamente»39. O aumento no volume de trabalho, levou o SCCT a avançar para obras no princípio de 1994, numa proposta elaborada por Santos Martins (Sec. Estado da Sáude) tendo em vista a ampliação de instalações: construção de uma nova enfermaria, com 50 camas, alargamento da unidade de cuidados intermédios e criação de uma área para início dos transplantes de coração40. Esta reformulação seria aliás, o principal tema da conversa aquando da visita parlamentar dos deputados do PSD aos HUC a 27/06/1994, acompanhados pelo Ministro da Saúde, Paulo Mendo, e Presidente da AR, Barbosa de Melo. O início das obras seria protelado para 1995, altura em que o Ministro da Saúde, com base em relatório enviado pelos directores de serviços de cirurgia cardíaca (incluindo Manuel Antunes), determinou, por despacho, a criação de condições para um aumento significativo do número de intervenções anuais: «O Ministro e a Comissão concordaram em que o total de intervenções de cirurgia cardíaca com circulação extracorporal deve elevar-se para cerca de 5000, uma estimativa que se baseia no número de intervenções realizadas em 1993 (3200), no número de doentes actualmente em lista de espera e no possível aumento de doentes com a abertura de novas salas de Hemodinâmica»41. Contudo, seria considerado desnecessário e inconveniente a abertura de qualquer novo serviço de cirurgia cardíaca para além dos já existentes (HUC, Santa Marta, Santa Cruz, Santa Maria, CH Gaia e S. João, até que o movimento cirúrgico, em cada um daqueles Serviços, se elevasse para cerca de 800 intervenções anuais.

39 Id. 40 «O coração não pode esperar: resultados obtidos em Coimbra são dos melhores do mundo» In Jornal de Coimbra, 26/01/1994, p. 10 41 «Ministro aposta na cirurgia cardíaca» In Tempo Medicina, Ano XII, nº 582, 20/02/1995, p. 2

— 40 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

AS 5.000 INTERVENÇÕES FEITAS PELO SCCT DOS HUC Em Junho de 1995, o SCCT atingiu as 5.000 operações, facto assinalado em sessão comemorativa realizada no dia 30 do mesmo mês (foto 6). Manuel Antunes usou da palavra para fazer uma retrospectiva sobre o trabalho efectuado pela unidade que dirigia. Na sua prelecção, destacou os resultados animadores obtidos pela equipa, de 1,8% de óbitos em 5.000 doentes: «Mas é preciso dizer que foram cinco mil operações com circulação extracorporal (CEC, de coração aberto), além de outras 2567 cirurgias (sem CEC, 710 cirurgias cardíacas e 1866 pulmonares, com resultados positivos em 99,6% dos casos). Portanto, mais de 7500 cirurgias. O que dá um número de cerca de 1100 por ano, e em 1995, esperamos atingir um número muito próximo das mil e quinhentas intervenções». Na ocasião, também afirmou que não pretendiam ser o único centro de excelência e que o serviço era conhecido internacionalmente pela cirurgia reparadora da válvula mitral. Que em 1130 doentes conseguiram taxa de sucesso de 85,5 %, números que na sua opinião «representam um recorde internacional absoluto». Aproveitou o momento para saudar o então Director de Serviço de Cardiologia dos HUC, Prof. Luís Providencia, e recordar o dinamismo do Prof. Ramos Lopes que «foi um dos grandes motores da reanimação deste serviço de cirurgia cardíaca no período de 1985 a 1988». No entanto, a sua afirmação mais forte e amplamente difundida foi a que dirigiu para o exterior: «Fizemos de Coimbra o centro da cirurgia cardíaca do País. E, perdoem-me a imodéstia, os nossos colegas têm de aceitar este facto». Nesta sessão, e em representação dos doentes, usaria da palavra Vasco Tomás, professor de Filosofia nas Caldas da Rainha. [In Tempo Medicina, 24/07/1995]

— 41 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

Aquela decisão, para Coimbra, era consequência lógica de um intenso trabalho desenvolvido pelos seus profissionais, cuja rentabilidade se situava entre os melhores do mundo e despertava cada vez mais interesse: «quem conhece a realidade da cirurgia cardíaca vem operar-se a Coimbra»42. Porém, a ampliação de instalações seria rodeada de polémica, que estala em meados de 1995. Perante quase um ano de atraso, Manuel Antunes revelava à imprensa os meandros de uma situação pouco clara: existência de verba contemplada no PIDDAC de 750 mil contos (há 3 anos) e projecto de obras pronto há um ano, aliados a «interesses mal explicados» de outros serviços. Manuel Antunes chegaria a aludir ao «embargo interno» no hospital: «Alguns colegas, apoiados na indecisão do Conselho de Administração (CA), vêm argumentando com os possíveis incómodos que as obras poderiam causar nos doentes, para tentarem impedir a sua concretização». A imprensa, citando um médico anónimo acrescentava que estaríamos perante «retaliações contra o feitio do professor Manuel Antunes e as suas posições anteriores, quanto a outros projectos de obras»43. Nesta altura, Manuel Antunes dirigia 70% das operações mas, como os resultados eram iguais aos restantes 30% exultava com o segredo do sucesso: não só o «trabalho da equipa, onde todos – cirurgiões, cardiologistas e enfermeiros – têm responsabilidades», mas também a disciplina rígida: «É impensável que não se cumpram as regras sem uma boa razão. O trabalho de quem falta tem de ser feito pelos colegas». Por vezes podem ver-me a gritar nos corredores, a exigir mais trabalho, porque quero que a equipa evolua». «Porque sou exigente comigo próprio, estou à vontade para o ser com os outros»44. A autonomia do serviço era um caso sério de sucesso que não era replicado. Manuel Antunes chegou a sugerir que a sua unidade pudesse «servir de experiencia piloto», controlando directamente a componente administrativa: «Gastamos um milhão e 200 mil contos por ano, cerca de 8% do orçamento do hospital. Se as operações nos fossem pagas directamente pelas tabelas do SNS receberíamos um milhão e 800 mil contos. Podíamos ter lucro»45. O sucesso chamava sucesso e por alturas do Natal de 1996 o serviço teve uma prenda esperada: a milésima operação com CEC nesse ano, um recorde impensável no início da década e que causou grande impacto:

42 «Manuel Antunes: a vida por um sonho» In As Beiras, 06/04/1994, p. 5 43 «Ampliação da Cirurgia Cardíaca nos HUC sofre de “falta de decisão política» In As Beiras, 20/04/1995, p.11 44 «Manuel Antunes: a vida por um sonho» In As Beiras, 06/04/1994, p. 5 45 «Manuel Antunes opera corações…e fechaduras», In A Capital, 19/07/1996, p. 27

— 42 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

A MILÉSIMA OPERAÇÃO COM CEC A 27/12/1996, da parte da manhã, o SCCT dos HUC efectuou a milésima operação com CEC , a um doente do Fundão (este tipo de operação era considerada «a grande operação cardíaca», cada vez mais efectuada em idosos, sobretudo sexagenários e septuagenários, dos quais 60% pertencentes ao sexo masculino). Foi um momento de rara felicidade, um feito que Manuel Antunes assinalou junto da comunicação social: «É um número raro de atingir, em apenas um ano, por um único serviço. É um marco, quase o topo, que dá a esta unidade uma dimensão fora do vulgar no país e mesmo na Peninsula Ibérica. Por muitos anos, não deverá ser batido nem pela unidade que dirige nem por outros serviços congéneres portugueses ou mesmo espanhóis». O professor realçaria «o número mágico» como consequência dos méritos da equipa que dirigia e que em 1995 havia assegurado cerca de 1/3 (983) das cirurgias de coração aberto realizadas em Portugal (3200): 7 cirurgiões da especialidade e 4 clínicos de outras áreas, trabalhando intensamente e em média 12h dia, conseguindo eliminar a lista de espera. O recorde conseguido no Serviço de Cirurgia Cardiotorácica dos HUC traduziu o cumprimento do objectivo traçado por Manuel Antunes, designadamente a aposta feita há uma década atrás, quando se perspectivava a instalação do Serviço no Hospital Novo. Na altura, Manuel Antunes afirmou que seria possível realizar, nas novas instalações, 450 a 500 intervenções, as suficientes para as necessidades da Zona Centro. E caso o fluxo de doentes de outras regiões para o Hospital Novo se confirmasse, o número de cirurgias, garantia, poderia chegar ao milhar. E assim foi. Passados dez anos sobre o início de actividade, estavam claramente ultrapassadas as expectativas e metas definidas no relatório de 1988: «Há 10 anos foi estabelecido um plano de actividades, metas, e uma delas escrita no relatório que fiz em 88, era transformar o Centro do país no centro da cirurgia cardíaca do país. Perdoem-me a imodéstia, mas penso que conseguimos. Atrever-me-ia a dizer que o serviço é não só uma referência em termos de cirurgia cardíaca mas também em termos de funcionamento, dentro do

— 43 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

próprio hospital e fora dele. Estamos nos parâmetros médios superiores europeus, cumprindo uma frase que utilizei no relatório inicial, em 1988, que era termos uma cirurgia pelo menos tão boa como a média da Europa. Atingimos e ultrapassámos». De facto, a estatística de 10 anos de actividade não deixava margem para dúvidas: serviço com mais de 1.000 cirurgias de CEC anuais, 100 de coração sem CEC, 350 cirurgias pulmonares do tórax, quase 1.500 cirurgias por ano. Em 10 anos operaram mais de 8.000 doentes de coração aberto e mais de 4.000 operações de outro tipo, ultrapassando as 12.000, tendo 98% dos doentes saído do hospital melhorados. Mais do que um em cada mil portugueses haviam sido operados neste serviço, podendo dizer-se que havia doentes de todos os concelhos: «Neste momento fazemos no país 3.000 a 3500 cirurgias, no total dos seis centros de cirurgia cardiotorácica. Em Coimbra faz-se cerca de um terço dessas cirurgias, embora este centro seja o mais pequeno em instalações e em pessoal, mas o mais produtivo em termos de doentes operados». No entanto, como o número total de cirurgias nacionais desejáveis rondava as 6.000, Manuel Antunes lançaria uma bicada ao sistema: «Se nós, que somos o mais pequeno, e o que tem menos pessoal, de todos os serviços de cirurgia cardio-torácica nacionais, realizamos quase metade de todas as cirurgias, porque é que ainda há listas de espera?» O momento foi visto como a conquista de uma equipa, que se construiu a pulso e contornando dificuldade diversas: «Houve gente que se afastou e não foi capaz de assumir que ou não queria ou não conseguia aguentar o ritmo (…) A maior parte dos elementos contudo manteve-se e ao fim de 10 anos temos um corpo médico, de enfermagem e técnico, relativamente estabilizado e integrado na filosofia de trabalho do serviço (…) o sistema é comum nos Estados Unidos, Inglaterra ou Alemanha, nos países mais desenvolvidos, onde as pessoas estão habituadas a trabalhar assim». A partir deste recorde aumentou o número de pedidos de especialistas nacionais e estrangeiros, para estagiarem em Coimbra e aprender as técnicas ali aperfeiçoadas, entre as quais se destacava a cirurgia de reparação valvular, aplaudida pelos melhores cirurgiões internacionais. [Diário de Coimbra, 28/12/1996; As Beiras, 28/12/1996 e 17/08/1998]

— 44 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

Apesar de tanto sucesso e de várias conquistas do Serviço, a questão da autonomia administrativa levantava alguma insatisfação. Temática que, em meados de 1998, o professor destacava como factor negativo do sistema de saúde português: «A falta de autonomia não só das administrações hospitalares, mas e muito especialmente dos directores de serviço», defendendo que as administrações hospitalares, com excepção do director clinico «…deveriam ser nomeadas a partir do exterior da instituição. É essencial responsabilizar os conselhos de administração dos hospitais pela gestão dos recursos» e que importa conferir aos hospitais um estatuto especial de autonomia «modernizando e profissionalizando a respectiva gestão». Para directores de serviço defendia um «estatuto de exclusividade»46. Foi também por esta altura que levantaria a voz contra o excedente de clínicos na função pública, facto contrastante com o serviço que dirigia, e sintoma do fraco aproveitamento dos recursos existentes: «Em 1998, existiam 31 mil médicos no nosso País, isto é, 3,2 médicos por cada mil habitantes (um profissional para 300 pessoas) (…) existem em Portugal mais médicos por habitante do que nos Estados Unidos da América, na Suécia, na Holanda, na Suíça»47. Corolário das lutas que travou, mas também do sucesso atingido, o SCCT dos HUC obteria o estatuto de Centro de Responsabilidade Integrada (CRI), cuja história abordamos em seguida. O CRI dos HUC foi criado ainda tendo como base a antiga legislação, do tempo da Dr.ª Leonor Beleza, segundo decreto de Janeiro de 1988 (18/88) que instituiu a primeira geração de Centros de Responsabilidade (CR). O diploma, em termos funcionais era muito limitativo: não previa mecanismos que pudessem dar corpo à autonomia administrativa e financeira, não tinham orçamento próprio nem eram permitidos os incentivos à produção. Já numa reunião realizada em Lisboa, a 07/12/1988, a ministra Leonor Beleza perguntou a Manuel Antunes ser não queria ter o primeiro CR em Portugal. O professor respondeu que «primeiro começava como qualquer outro serviço e depois trabalharíamos nisso»48. Assim, o primeiro Centro de Responsabilidade veio a ser o da Cirurgia Cardiotorácia do Hospital S. João no Porto. O facto de não ter adoptado, de imediato, essa forma gestionária para o Serviço não o impediu de começar a trabalhar nesse sentido com o admi-

46 «Cirurgia à promiscuidade entre sector público e privado» In As Beiras, 24/04/1998, p. 5 47 «Saúde no nosso País tem má gestão» In O Dia, 29/10/2001, p. 8 48 Prof. Manuel Antunes entrevistado por João Pinho, 01/10/2013

— 45 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

nistrador delegado dos Hospitais da Universidade de Coimbra da altura, o Dr. Lopes Martins49. Nos princípios de 1994 Manuel Antunes fez questão de assinalar publicamente a defesa dos centros de responsabilidade, como modelo a adoptar pelos estabelecimentos hospitalares50. Contudo, o assunto adormeceria, sendo reactivado nos finais de 1998, quando foi anunciado que o Serviço seria o primeiro Centro de Responsabilidade Integrado (CRI) do país. Os CRI pretendiam implementar métodos empresariais na gestão dos hospitais: «Estas unidades irão descentralizar a gestão dos serviços. E constituem a base de uma reforma profunda na administração das unidades hospitalares. Com esta medida, o ministério satisfaz as pretensões salariais dos médicos e responde à necessidade de reforma do sistema. O processo está, no entanto, em marcha lenta»51. Contudo, faltava ainda o necessário enquadramento legal, a apresentação do projecto de decreto-lei regulador, tão aguardado pelos responsáveis hospitalares e que atrasava o programa de implementação dos CRI. Em 1998, e a propósito do problema com as listas de espera nos serviços de Cirurgia Cardíaca, a Ministra da Saúde, Dr.ª Maria de Belém Roseira, reuniu os diversos directores de serviço, lançando o desafio de estes se organizarem em CRI, mais bem definidos do que na anterior legislação, e aproveitando as condições de trabalho da maioria dos cirurgiões torácicos, em especial o facto de estarem em exclusividade. Mercê do trabalho que havia feito, o SCCT apresentou de imediato a sua candidatura. A Lei que criou os CRI data de 18/9/1998 (Decreto-Lei 374/99). O CRI dos HUC foi criado por despacho da Ministra da Saúde Maria de Belém Roseira52 de 22/12/1998 (foto 7). Nele se definiu a implementação desta estrutura, assegurando o cumprimento de uma promessa política – a qual definia que ainda em 1998 seriam criados estes Centros de Responsabilidade: «Um CRI é uma forma intermediária de gestão dentro do hospital, em que o director do serviço e a administração do CRI têm alguma autonomia, administrativa e financeira, permitindo-lhe ter um orçamento próprio e geri-lo de acordo com normas de gestão pública»53.

49 Dr. José Carlos Lopes Martins, Administrador Delegado dos HUC, 1988-1993 50 «O coração não pode esperar: resultados obtidos em Coimbra são dos melhores do mundo» In Jornal de Coimbra, 26/01/1994, p. 11 51 «Métodos empresariais na gestão hospitalar» In Diário de Coimbra, 30/10/1998, p. 7 52 Titular da Pasta do Ministério da Saúde do XIII Governo Constitucional, 1995-1999 53 «Mais duas horas por dia liquidavam as listas de espera» In Jornal de Noticias, 03/01/2000

— 46 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

Tanto Manuel Antunes como a Ministra da Saúde Maria de Belém partilhavam uma mesma visão: o segredo da gestão e da governabilidade dos hospitais estava nas estruturas intermédias, nos serviços e departamentos. O conceito de CRI deveria ser alargado à generalidade dos hospitais portugueses até 2003. O CRI dos HUC seria a primeira experiência nacional, escolhida pelo rendimento e performance, que Manuel Antunes via com agrado pois o seu serviço já detinha «…quase todas as características dos Centros de Responsabilidade Integrada, quase nada tendo que alterar para entrar neste novo esquema». Contudo, do seu sucesso dependeria a viabilidade da aplicação «…da mesma filosofia de trabalho noutros locais, aproveitando todas as mais-valias conseguidas do Centro de Serviço de Cirurgia Cardiotorácia dos HUC»54. Contudo, o CRI dos HUC funcionou, durante anos, aguardando regulamentação que lhe definisse as competências e instrumentos do modelo de gestão. Com a substituição da titular da pasta da Sáude, em 1999, adoptaram-se politicas centralizadoras que inviabilizaram a criação de outros centros integrados.

54 «Centro de Responsabilidade Integrado “nasce” no Serviço de Cirurgia Cardiotorácia» In Noticias Médicas, Ano XXVIII, nº 2545, 26/02/1999, p. 5

— 47 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

5 O NOVO EDIFÍCIO E O INÍCIO DO PROGRAMA DE TRANSPLANTES





O novo edifício representou o sonho que todos nós esperávamos.

[Dr. Luís Eugénio Fernandes entrevistado por João Pinho, 10/10/2013]

— 49 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

A

indefinição quanto à reformulação do SCCT dos HUC estava ao rubro em meados de 1995. A falta de decisão política e os conflitos internos, haviam conduzido o processo para um beco sem saída. Nos corredores dizia-se que o impasse era consequência de «embargo interno» ao Prof. Manuel Antunes, como forma de bloquear o início do programa de transplantes. Nessa altura a imprensa apontou uma possível solução: «Uma das hipóteses alternativas que tem vindo a ser colocada é a concentração de novos serviços num novo edifício, a ser erguido a poente, no espaço da actual lavandaria (que vai ser transferida). Ali poderiam coexistir as futuras unidades de transplantes e ainda uma extensão da urgência»55. A determinada altura equacionou-se uma variável: «Acresce também que o Serviço de Transplantações do professor Linhares Furtado estava à procura de instalações mais adequadas. Primeiro, pensou-se dividir a meias o novo edifício entre o nosso Serviço e o dele, continuando a Cirurgia Cardiototácica a utilizar também as actuais instalações. Depois, pareceu mais sensato que nós ocupássemos a totalidade do novo edifício e o professor Linhares Furtado ficasse com estas instalações, que até eram excessivas, em termos de área, em relação ao que ele tinha pedido»56.

55 «Ampliação da Cirurgia Cardíaca nos HUC sofre de “falta de decisão política» In As Beiras, 20/04/1995, p.11 56 «Doença da Saúde deve-se à má gestão dos serviços» In Tecno-hospital, nº 10, 1º Quadrimestre de 2002, p. 16

— 50 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

O projecto de novo edifício seria anunciado de forma oficial, na sessão comemorativa das 5.000 intervenções em Julho de 1995: edifício de raiz, orçado em 1,2 milhões de contos, a construir nos próximos 9 meses, com concurso público e adjudicação previstos para os 6 meses seguintes57. Neste espaço seria possível, finalmente, iniciar o tão aguardado programa de transplantes de coração: embora não constituíssem na época uma prioridade, pois as necessidades do país não andavam longe dos 50/ano enquanto as de cirurgia cardíaca atingiam as 5.000/ano, o professor relembrava: «embora sejam necessários (…) serão efectuados cerca de 25 a 30 transplantes por ano, o que significa dois por cento dos doentes que são tratados». Em suma, foram 3 as razões fundamentais para a construção do novo bloco: «Em primeiro lugar, dotar o serviço do espaço que já faltava. O antigo serviço tinha sido planeado pela anterior direcção para fazer 250 intervenções por ano. O que já era bom atendendo a que tinha efectuado 180 cirurgias nos nove anos anteriores. Mas já estávamos com 1.500 intervenções por ano, o que significa que nestes 15 anos já tínhamos feito obras, demolido paredes e absorvido corredores para ter mais umas camas». «Em segundo lugar, era necessário espaço para avançar com o programa de transplantação cardíaca». «Finalmente, porque se construiu de raiz, criou-se alguma margem de expansão, para o caso de ser necessário efectuar mais de 1500 cirurgias por ano, o que nunca poderia acontecer no antigo serviço, porque tínhamos atingido a capacidade máxima»58. Em finais de 1999 o processo de construção do novo edifício onde iria funcionar o Serviço de Cirurgia Cardiotorácica entrou na última fase: finalizado o relatório final e o concurso internacional, apontando-se o final do ano para adjudicação das obras, fixando-se o prazo de execução de 18 meses e um custo de 3 milhões de contos. Manuel Antunes apresentou à comunicação social o projecto: «Segundo o especialista, o edifício vai ser construído de raiz, junto aos HUC, exactamente por cima das lavandarias, com ligação ao Bloco Central do hospital (…) Dava para construir um pequeno hospital» A tudo isto se somaria uma mais-valia: «dar início a um novo serviço: os transplantes cardíacos»59.

57 «Manuel Antunes dirige “centro de excelência» In Tempo Medicina, 24/07/1995, p. 6 58 «Não perder nenhum tempo operatório» In As Beiras, 30/09/2003, suplemento Jornal de Saúde, p. 6 59 «Círculo de Amigos auxilia Cirurgia Cardiotorácia dos HUC» In Diário de Coimbra 25/11/1999, p. 3

— 51 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

Contudo, a burocracia faria arrastar o processo mais alguns meses, vindo a ser desbloqueado a 31/12/1999 com a autorização dada pelo Ministério da Saúde à adjudicação das obras, contando com o apoio de notáveis como Arlindo Carvalho e Paulo Mendo, Maria de Belém ou Manuela Arcanjo. Seria adjudicado à empresa espanhola San José SA, com prazo de execução de 600 dias. Era o culminar de 8 anos de espera, onde se bateram recordes dentro de um risco calculado: «Já ultrapassámos largamente e, com risco, (mas calculado), a capacidade de produção para as instalações que temos. Com as actuais instalações a capacidade seria de tratar 600/doentes ano mas nós fizemos mil cirurgias de coração aberto,além de outras. Sempre foi assim e todos os anos fomos aumentando 20 ou 30 o número de intervenções até chegar aos actuais recordes de produção»60. Em Julho de 2000, e enquanto se aguardava o visto do Tribunal de Contas, Manuel Antunes assumia publicamente o objectivo de iniciar quanto antes o programa de transplantes: «Queremos fazer entre 25 a 30 transplantes. A transplantação cardíaca nunca se fez aqui e quando começarmos é a sério». Portugal necessitava de 60 a 70 transplantes por ano e o Presidente da ARS, José Cabeças, declarou entusiasmado que a empreitada era uma das «que na região queremos ver prioritariamente concretizada», ponto de partida para criar a Manuel Antunes e sua equipa «boas condições para que possa expandir e melhorar a sua actividade»61. Na verdade, os números do SCCT continuavam a crescer: 10.000 operações de coração aberto, 690 cirurgias cardíacas, e 3059 cirurgias pulmonares. Em Setembro de 2000 começaram, finalmente, as obras do novo edifício, envolvendo centenas de trabalhadores, não se tendo registado qualquer acidente de trabalho. De modo a obter uma perfeita adequação das novas instalações às necessidades do serviço, o Prof. Manuel Antunes acompanharia a par e passo as obras, em articulação com a equipa liderada pelos Eng.ºs Costa Pereira, da firma construtora e Jorge Sofia, da DGIES. Nesse sentido, seria alargado o espaço total em 10%, que veio a ser distribuído pelos corredores, área de cuidados intensivos e zonas de trabalho. Entre finais de Janeiro e princípios de 2002 seria, finalmente, aprovado pelo Ministério da Saúde, o regulamento interno do CRI, institucionalizando o modelo pelo qual se regia a unidade de Manuel Antunes. Paralelamente, o Secretário de Estado da Saúde, Francisco Ramos, solicitava um relatório

60 «Cirurgia Cardíaca com ordem para ampliar» In Diário de Coimbra, 18/01/2000, p. 3 61

«HUC vão fazer transplantes cardíacos» In Diário de Coimbra, 01/07/2000, p. 3

— 52 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

à ARS-Centro, para ponderar a utilização do modelo, que continuava como único, noutras unidades da saúde62. Aquela peça de legislação implicou novos atributos e responsabilidades ao director e administrador do CRI, até então na posse do Conselho de Administração do hospital: por exemplo a delegação de competências na pessoa do Director do Centro na aquisição de bens ou contratação de pessoal. Momento muito importante, pois veio colocar um ponto final numa polémica com alguns anos: «Ainda em 1999, o Conselho de Administração acedeu a atribuir uma parcela pequena dos lucros do CRI sob a forma de prémios de desempenho aos funcionários. Mas, a partir de determinada altura, muita gente começou a levantar dúvidas se estes prémios eram o equivalente à remuneração variável e estes deixaram de ser pagos»63. A partir de então passou a haver responsabilização por uma determinada produção, isto é: «…há um contrato programa anual em que o Centro se propõe cumprir um determinado número de objectivos – no nosso caso, operar um determinado número de doentes – e ao qual está associado um orçamento. No final do ano, se houver um desvio positivo em relação a esse orçamento haverá lugar à distribuição de uma parte do lucro, a acordar com o Conselho de Administração do Hospital, sob a forma de incentivos individuais para as pessoas que trabalham no Serviço»64.

62 «Ministro institucionaliza unidade de Manuel Antunes» In Público, 01/02/2002, p. 27 63 «Não tenho a ambição de ser Ministro» In Tempo Medicina, 04/03/2002, p. 28 64 «Doença da Saúde deve-se à má gestão dos serviços» In Tecno-hospital, nº 10, 1º Quadrimestre de 2002 p. 16

— 53 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

AS CARACTERISTICAS BASE DO CRI Filosofia de gestão: Pretendeu implementar como filosofia o que era seguido nas maiores empresas do mundo «em que se aproxima a vertente decisória da área de execução e implementação (…) melhorar a produtividade e reduzir os custos (…) não será um hospital dentro do hospital, não sendo uma estrutura independente, uma vez que os orçamentos anuais serão discutidos com a Administração dos HUC – só depois é que o Centro terá possibilidade de “jogar” com o seu próprio orçamento». Uma nova dinâmica: «…têm de fazer todos os anos um contrato-programa. Isto é; negoceia com a administração hospitalar e com a Administração Regional de Saúde o número de intervenções que vai fazer, o número de consultas, o número de doentes internados, a demora média, enfim, todos esses aspectos. Se cumprir esse programa, então terá direito aos tais incentivos» Nova responsabilidade: «Responsabiliza o director do serviço e o administrador pela gestão do pessoal, dos meios técnicos e dos recursos financeiros, e, ao atribuir a todos alguma comparticipação nos eventuais ganhos, toda a gente trabalha com mais vontade e com maior produtividade». Dedicação total e recompensa pela produtividade: a receptividade dos elementos da nova estrutura à dedicação total ou exclusiva foi bastante boa; num total de 106 apenas 2 não teriam a dedicação total. Os prémios seriam pequenos acrescentos aos normais vencimentos: «…irá acontecer de uma forma individualizada, reconhecendo-se, assim, aqueles que produzem mais e que têm maior disponibilidade para este projecto». Inovação: pela primeira vez na Administração Pública, instituiram-se dois esquemas de remuneração inovadores: «um, variável, em função dos objectivos de produção executados pelos profissionais; e outro em que se concedem incentivos no caso de existirem desvios positivos relativamente ao orçamento-programa do CRI. Estão ainda previstos prémios de desempenho, em dinheiro, aos funcionários do CRI que mais se distingam». Os principais beneficiados: combate à lista de espera, mais doentes a serem tratados, melhor qualidade do serviço, nunca se entrando em mecanismos de competição económica desenfreada nos quais as pessoas só se preocupam em produzir muito. Poupança: tomando como exemplo o orçamento do serviço de cirurgia para 1999 que era de 1,5 milhões de contos, produziu-se de acordo com tabelas oficiais, 2 milhões de contos, o que significa que uma cirurgia custava ao Estado menos 30 por cento do que em qualquer outro serviço. [In Noticias Médicas, 26/02/1999; Jornal de Noticias 03/01/2000; Tempo Medicina, 04/03/2002]

— 54 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

Culminando um longo trajecto, feito de dúvidas e dificuldades, a 30/09/2002 e último dia do prazo de construção, seria, oficialmente inaugurado o novo bloco do Centro de Cirurgia Cardiotorácica (CCCT) dos HUC, integrando as comemorações do dia da instituição – evocando S. Jerónimo, com homenagem aos funcionários que cumpriam 25 anos de serviço. O edifício ocupa um total de 6500 m2 de área útil, distribuídos por 3 pisos, e 76 camas. Arrancou com 100 pessoas em trabalho contínuo, sendo estimada a necessidade de aumento de 15 a 20%. Dispunha de 4 blocos operatórios: 2 para a cirurgia cardíaca, outra utilizada ocasionalmente quando operados 5/6 doentes dia; e o 4.º para a cirurgia pulmonar. Foram gastos na obra menos 500 mil contos do que o orçado (um caso único, dado que quando a empreitada foi lançada o orçamento previsto era de 3 milhões de contos, mas acabou por custar 2,5, já com equipamento incluído). Uma situação rara nas obras públicas, quando para mais tinha prazo de construção de 600 dias que foi ultrapassado em 30, numa derrapagem que derivou do Inverno rigoroso de 2000/2001. Quanto às antigas instalações, estas passaram a ser utilizadas pelo Serviço de Transplantação, Prof. Linhares Furtado, sendo o equipamento de cirurgia cardíaca transferido para o novo edifício. A cerimónia de inauguração contou com a bênção do Bispo de Coimbra, D. Albino Cleto, e a presença do Primeiro-ministro Durão Barroso e do Ministro da Saúde, Luís Filipe Pereira, e de Santana Lopes, Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, entre outras figuras (fotos 8 a 11). A qualidade do equipamento e racionalização de meios foram os factores comuns às intervenções de Durão Barroso e Manuel Antunes: «Qualidade não tem nada a ver com desperdício, nem com ostentação. É possível, como este centro demonstra, satisfazer a necessidade técnica e, ao mesmo tempo, conseguir uma sobriedade que só fica bem nas obras do Estado», afirmaria o então Primeiro-ministro. O Prof. Manuel Antunes diria que a poupança fôra conseguida «...porque o edifício foi planeado por pessoas com conhecimento do serviço, racionalizando equipamento, e foi ainda utilizado muito equipamento já existente no antigo serviço. Ao contrário do que acontece com edifícios que são planeados em Lisboa na Direcção Geral de Instalações e Equipamentos de Saúde (DGIES) por pessoas competentes mas que, no entender de Manuel Antunes, não sabem qual será a utilização final, que até é diferente de médico para médico e de serviço para serviço»65.

65 «Centro de Cirurgia Cardiotorácica concluído sem derrapagens» In Diário As Beiras, 01/10/2002, p. 3

— 55 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

A inauguração cirúrgica não coincidiu com a oficial, dado que os primeiros dois doentes foram operados a 29/9/2002, isto é, no dia anterior ao da inauguração oficial.

UMA ESTÓRIA SOBRE O NOVO EDIFÍCIO «Todas as quintas feiras à tarde, Manuel Antunes reunia com os construtores para discutir preços. Quando chegou a altura de escolher as camas, o professor deparou-se com o preço exagerado que lhe pediam: “Queriam 3750 euros por cada cama. Fui a uma fábrica nacional e perguntei em quanto ficava. Eles nunca tinham feito estas camas, de alta tecnologia. Mas aceitaram fazer por 2250 euros. E quando perguntei quantos anos de garantia me davam responderam: os que quiser. Fiquei com uma garantia de 10 anos. E agora a fábrica já exporta este modelo de cama, que baptizei de Coimbra». [In Diário de Noticias, 12/08/2005]

O novo edifício possibilitou um sonho antigo, o avanço para a transplantação: «Com as novas instalações da Cirurgia Cardiotorácica reúnem-se as condições para realizar transplantes de coração, As intervenções deverão começar ainda este ano ou no início do ano que vem e a intenção do serviço é vir a atingir uma média de 30 transplantes por ano» - 1-2% da actividade»66. Como o antigo Serviço tinha nítidas limitações de espaço, foi também possível dar corpo a outros sonhos, como a criação de um Laboratório de Investigação. O novo bloco despertaria natural curiosidade sendo visitado por diversas figuras de primeiro plano a nível nacional. Particularmente significativas seriam as visitas de Jorge Sampaio, a 26/05/2003, no âmbito do 4.º dia de Presidência Aberta, e de Cavaco Silva a 28/05/2006, deixando rasgados elogios à obra. 66 Idem.

— 56 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

Nesta construção destaca-se, em especial, a procura pela humanização do espaço (fotos 12 a 26). A orientação interna é feita através de cores: o amarelo predomina no espaço técnico, consultas externas, Biblioteca e Centro de Formação (núcleo central do novo espaço); o azul na cirurgia pulmonar; o verde para a cirurgia cardíaca; o rosa e vermelho no centro nevrálgico, onde se encontram os blocos operatórios, cuidados intensivos, cuidados intermédios, enfermarias destinadas aos transplantados e um oratório, além da enfermaria destinada a Pediatria. Esta gradação de cores corresponde a uma ideia: «A filosofia da equipa faz todo o sentido: a doença já é suficientemente triste e cinzenta; pintar o hospital com cores pardas só podia servir para aumentar a angústia. (…) O branco ou o cinzento custam o mesmo que as outras cores. Então, se não fica mais caro, porque não dar alegria? Alegria não é sinónimo de falta de empenho profissional. Pelo contrário. Até acho que se trabalha mais e melhor num sítio agradável à vista. Não é? E é bom não esquecer que esta equipa passa aqui a maior parte da sua vida»67. A preocupação com factores de humanização destaca-se, aliás, logo na entrada, no painel de azulejos realizado por três artistas plásticos operados no serviço: Carlos Carreiro, Júlio Resende e Albuquerque Mendes (foto 27). Um momento de grande impacto seria a realização do primeiro transplante cardíaco na madrugada do dia 23/11/2003, a um homem de 49 anos, João Duarte de seu nome, que residia na Lousã e sofria de uma cardiopatia dilatada (músculo do coração dilatado), tendo recebido o coração de uma mulher de 35 anos, vítima de aneurisma cerebral. A Intervenção decorreu entre as 04h e as 07h sem quaisquer problemas de natureza técnica e o doente teria uma recuperação plena, continuando bem 10 anos depois. Esta intervenção – que até então apenas era realizada em três centros do país, no Porto e em Lisboa – iniciou oficialmente o programa de transplantação cardíaca nos HUC68. Pouco tempo depois chegaria uma nova alegria à equipa do CCCT: em Dezembro de 2003 e ao perfazer 15 anos de actividade, o serviço atingia as 20.000 intervenções desde a sua criação em 1988. Um momento de júbilo: «É um número recorde de um serviço que tem a maior actividade cirúrgica nesta área em toda a Península Ibérica. O segredo é trabalho, trabalho, trabalho»69. Um feito alcançado por uma equipa formada por 7 cirurgiões, 1 cardiologista e 4 anestesistas.

67 «Serviço de Cirurgia Cardíaca, Hospitais da Universidade de Coimbra» In Diário de Noticias, 12/08/2005, p. 22 68 «Transplante cardíaco com sucesso nos HUC» In As Beiras, 27/11/2003, p. 7 69 «Equipa de Manuel Antunes chega às 20 mil intervenções» In As Beiras, 03/01/2004, p. 7

— 57 —

A TRANSPLANTAÇÃO CARDÍACA A primeira transplantação experimental tem mais de 100 anos. Em 1905, Carrel e Guthrie realizavam a primeira cirurgia experimental. Mas só a 03/12/1967 Christiaan Barnard efectuou a primeira transplantação humana ao coração, com sucesso, na Cidade do Cabo, África do Sul, tendo o doente sobrevivido 18 dias. A transplantação desenvolveu-se, entretanto, com a introdução de novas drogas imunossupressoras, sobretudo da ciclosporina, em finais da década de 70, princípios da década de 80. Este fármaco ainda hoje é a base dos tratamentos contra a rejeição do transplante. Paralelamente, o desenvolvimento de outros fármacos aumentou a sobrevida. De acordo com os registos internacionais: foram transplantados 61.000 doentes até finais de 2002, cerca de 2500/ano nos EUA. Apesar dos custos elevados atingira-se o pico em meados da década de 90, com 5.000 a nível mundial. A partir de então houve uma diminuição drástica, particularmente notada na Europa. As etiologias da insuficiência cardíaca congestiva que mais contribuem para a transplantação são: a microcardiopatia dilatada, a miocardiopatia isquémica e outras causas como as doenças congénitas. Como afirma Manuel Antunes: «Têm indicações para transplantação cardíaca as pessoas com doença cardíaca terminal, não resolúvel por outra terapêutica médica ou cirúrgica e com uma sobrevivência previsível inferior a 50% a um ano. Este é o primeiro grau de selecção dos doentes, Os doentes deverão estar na classe funcional III ou IV, com episódios recorrentes de insuficiência cardíaca congestiva grave». Doença com elevada mortalidade (chegou a ser de 40% ao ano nas classes III e IV) tendo o número diminuído bastante com a utilização dos IECA e dos beta-bloqueantes». A sobrevida dos doentes transplantados há 20 anos era de 66,5% aos cinco anos, de 47.3% aos 10 anos e cerca de 20% aos 20 anos. Actualmente ronda os 80% aos 5 anos e 60% aos 10 anos. A sobrevivência e qualidade de vida melhoraram muito». Em Portugal funcionam 4 centros de transplantação: para além do CCCT, o Hospital de Santa Cruz (Lisboa), desde 18/02/1986; o Hospital de S. João no Porto e o Hospital de Santa Marta (Lisboa) ambos desde 1987. Os progressos tecnológicos têm-se acentuado nos últimos anos: em 2001 foi implantado um coração artificial autónomo a um doente, no hospital judeu de Louisville, nos EUA. Sobreviveu mais de 30 dias. Actualmente, o transplante de corações artificiais está em fase experimental em todo o mundo, mas com grau de sucesso reduzido e custos muito elevados. [ In Noticias Médicas, 10/03/2004]

 Foto 16 – Centro de Cirurgia Cardiotorácica: Refeitório (Piso 2)

 Foto 17 – Centro de Cirurgia Cardiotorácica: Ginásio (Piso 2)

 Foto 18 – Centro de Cirurgia Cardiotorácica: quarto da enfermaria (Piso 2)

 Foto 19 – Centro de Cirurgia Cardiotorácica: Imagiologia (Piso 2)

 Foto 20 – Centro de Cirurgia Cardiotorácica: recepção (Piso 3)

 Foto 21 – Centro de Cirurgia Cardiotorácica: Unidade Pediátrica de Cuidados Intermédios (Piso 3)

 Fotos 22A e 22B – Centro de Cirurgia Cardiotorácica: Bloco Operatório (Piso 3)

Fotos 23 e 24 – Centro de Cirurgia Cardiotorácica: Unidade de Cuidados Intensivos (Piso 3)

Foto 25 – Centro de Cirurgia Cardiotorácica: Auditório (Piso 4)

 Foto 26 – Centro de Cirurgia Cardiotorácica: Biblioteca (Piso 4)

 Foto 27 – Centro de Cirurgia Cardiotorácica: Painel de azulejos - Carlos Carreiro, Júlio Resende e Albuquerque Mendes (Piso 0)

Fotos 28, 29 e 30 – Visita da Ministra da Saúde, Maria de Belém Roseira, ao SCCT no âmbito da Homenagem Nacional de 20/03/1999

Foto 31 – Homenagem Nacional ao Prof. Manuel Antunes e sua equipa (aspecto do almoço no Pavilhão da ACIC em Relvinha, Coimbra)

Fotos 32 e 33 – Homenagem Nacional-manifestações de apreço ao Dr. Luís Eugénio

Foto 34 – Homenagem Nacional: à esquerda Artur Agostinho e à direita o Dr. Paiva de Carvalho, Presidente do Conselho de Administração dos HUC

Foto 35 – Oferta de um jarrão ao SCCT por um grupo de doentes de Águeda em 20/12/1991

 Foto 36 – Expositor com ofertas dos doentes ao Serviço

 Foto 37 – Alguns quadros oferecidos pelos doentes ao Serviço

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

6 A PRIMEIRA GRANDE HOMENAGEM AO PROFESSOR MANUEL ANTUNES E À EQUIPA DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC



Nós não salvamos todas as vidas. Alguns doentes pensam que estariam mortos se nós não os tivéssemos tratado e isso é discutível. Nalguns casos sim, noutros casos tentamos melhorar a qualidade de vida dos doentes.



[Professor Manuel Antunes, In Noticias Médicas, 02/02/2005]

— 73 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

N

o Sábado dia 20/03/1999 realizou-se uma impressionante homenagem nacional ao Prof. Manuel Antunes e sua equipa, por ocasião das 13.000 intervenções cirúrgicas realizadas no serviço em 10 anos de actividade. Um evento da iniciativa de um grupo de doentes que teve Jorge Loureiro como presidente da comissão organizadora. Luís Eugénio, da equipa do SCCT assinalaria o ineditismo da iniciativa: «Num tempo em que vamos assistindo a comentários, às vezes justos, de que a prática médica não foi bem-feita; que o atendimento não foi o mais conveniente, e outras reclamações neste âmbito, é natural salientar-se que, desta feita, acontece o contrário. São 2500 doentes, operados por um serviço, que tomam a iniciativa de se reunir para homenagear esse mesmo serviço. É extremamente importante e inédito. Porque dizer mal é fácil, dizer mal toda a gente diz. (…) importante, para que os portugueses saibam que nem tudo corre mal na medicina.(…) Julgamos que a iniciativa deste conjunto de doentes se deve a dois factos: por um lado, porque é divisa do nosso serviço prestar aos pacientes cuidados médicos de excelência. Por outro, porque o respeito pela dignidade do doente é para nós palavra de ordem»70. O programa de trabalhos deste dia concretizou-se em dois momentos distintos: da parte da manhã a Ministra da Saúde, Maria de Belém, visitou o serviço (fotos 28 a 30), destacando que «este serviço é o primeiro Centro de Responsabilidade Integrada», uma experiência «pouco repetida noutras 70 «Manuel Antunes: Homenagem de coração aberto» In Jornal de Coimbra, Ano XIII, nº 599, Março 17/03/1999, p. 4

— 74 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

áreas, mas que «é o caminho para termos os serviços de Saúde a responderem às necessidades dos portugueses», saudando Manuel Antunes pela «teimosia e mau feitio». Da parte da tarde realizou-se, com enormíssima adesão, um almoço convívio de cerca de 3.000 pessoas no Pavilhão de Feiras da ACIC, na Relvinha-Coimbra (fotos 31 a 34). O professor das «mãos de ouro» para uns ou «mago da cirurgia» para outros escutaria um emocionante obrigado que lhe foi dirigido por uma plateia diversificada: «O pavilhão de feiras da ACIC estava “à pinha” e, de entre as caras conhecidas, destacavam-se João Pereira Coutinho (presidente da SIVA), os pintores Carlos Carreiro, Júlio Resende e Albuquerque Mendes, Artur Agostinho (um grande nome da Comunicação Social portuguesa), Zaida Martinho (esposa do ex-lider do PRD, Herminio Martinho) e Ferraz Alves (ex-vice presidente da Federação Portuguesa de Futebol). Mas estavam mais…estavam os portugueses anónimos, os “Zés”, e as “Marias” deste “cantinho à beira mar plantado”. Todos disseram “presente” porque têm algo a agradecer à equipa liderada por Manuel Antunes. Vieram de variadas localidades, de Norte a Sul de Portugal, e expressaram o reconhecimento pelo trabalho do professor quando ele entrou na sala. A (demorada) salva de palmas que o acolheu mostrou o apreço que todos sentem»71. O discurso de abertura coube à Ministra da Saúde, Drª Maria de Belém Roseira, tendo o conhecido jornalista Artur Agostinho falado em nome de todos os intervencionados. O homenageado encerrou a cerimónia e preferiu «fazer eco dos sentimentos da equipa» que lidera, encarando o almoço como de «confraternização». Orgulhoso, afirmou que «uma iniciativa deste género é inédita em Coimbra e no País». Divulgou o n.º de intervenções anuais (1400/ano) e destacou o CRI, nomeadamente a descentralização: «isto permite que existam formas inovadoras, que visam libertar o SNS do funcionalismo». Esta forma colectiva e expressiva de homenagem à equipa do Centro de Cirurgia tem sido complementada com ofertas diversificadas pelos doentes que no conjunto constituem a colecção museológica do Serviço (fotos 35 a 37).

71 «Obrigado senhor professor repetido por 3.000 pessoas», In Diário de Coimbra, 21/03/1999, p. 3

— 75 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

7 A CRIAÇÃO DO CÍRCULO DE AMIGOS DO CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC





Os amigos para manterem a chama acesa têm de se juntar.

[Professor Frederico Teixeira, entrevistado por João Pinho, 21/10/2013]

— 77 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

A

ideia da constituição do Círculo de Amigos do SCCT pertence ao Dr. Luís Roseira, clinico no Hospital de Santo António, e um dos operados no Centro de Cirurgia Cardiotorácica de Coimbra. Seria, aliás, o próprio a apresentar as linhas base de um movimento organizado de cidadania, durante o almoço convívio da homenagem nacional a Manuel Antunes e sua equipa, a 20/03/1999. Naquele momento, profundamente significativo, os presentes seriam elucidados sobre os princípios da associação: «Os seus objectivos fundamentais, são, em primeiro lugar, dotar com meios financeiros o Centro, para que os possam gerir de acordo com as suas necessidades reais, sem o recurso sempre moroso, sempre insuficiente de quem está submetido ao orçamento da Administração Pública. O segundo dos objectivos é manter esta cadeia de solidariedade entre os doentes que já passaram pelo serviço e os que dele podem vir a necessitar. Este Círculo de Amigos, estamos certos, vai constituir um elo de ligação permanente e actuante entre os que já foram doentes com os que no amanhã da vida vão ter de recorrer aos serviços da equipa do Prof. Manuel Antunes e assim dar continuidade a esta cadeia de solidariedade»72. Também se apelou à generosidade dos sócios partindo do pressuposto «de que o hospital não é só responsabilidade do Estado mas também da comunidade. Por isso, esta terá de participar de forma humanista e económica por forma a dar aos seus serviços aquilo que o Estado não pode dar»73. Na manhã do dia 24/11/1999 foi assinada a escritura de constituição formal da associação «apolítica e inconfessional, sem fins lucrativos, denominada Círculo dos Amigos do Centro de Cirurgia Cardiotorácica dos HUC»74. Foram sócios fundadores: Luís Eugénio de Castro Fernandes, Rui Vieira dos Santos Correia, António da Rocha Calisto, Dinis Jorge Gouveia da Cunha Leal, Ana Maria Achando do Adro Pires, Manuel Zuzarte Carreira, Elsa Isabel Marques dos Santos, Emília da Conceição Martins Coutinho Mesquita e Sola, Fernanda Maria Cunha Lucas Zacarias, Maria Adelaide Gomes dos Santos Correia, Cláudia Ferreira Mendes Pinheiro, Ana Maria Almeida Monteiro Alves Gonçalves, Inês Margarida de Moura Mendes Freire, David Simões Freire, Albino da Silva Reis, Jorge dos Santos Veiga, Armando Melo Almeida, Jorge Manuel Rafoto Loureiro, Áurea Beatriz Castro Silva Vieira e Jorge Manuel Pinto Moreira da Costa.

72 Idem. 73 «Círculo de Amigos auxilia Cirurgia Cardiotorácia dos HUC» In Diário de Coimbra 25/11/1999, p. 3 74 Notária Maria Dina de Freitas Alves Martins: Livro de Notas nº 62-D, fls. 46-48v.

— 78 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

O objecto da associação (denominação natureza e fins), afinal os seus estatutos, manteve-se, desde então, inalterável: «a) Promover a colaboração da comunidade e das suas instituições no bem-estar do doente e na sua promoção cultural; b) Promover a melhoria das condições de acolhimento, internamento e tratamento dos doentes, incluindo ambulatórios, de forma a garantir a permanência das suas relações familiares e sociais; c) Colaborar activamente com os órgãos de gestão do Centro de Responsabilidade de Cirurgia Cardiotorácica dos Hospitais da Universidade de Coimbra, nas orientações da sua política de saúde, tendo em vista a dignificação da pessoa do doente através da permanente defesa dos seus direitos; d) Colaborar na dignificação das actividades dos trabalhadores do Centro através da colaboração e apoio a todas as iniciativas de carácter cultural, social e profissional que promovam, sempre com objectivo último de contribuir para o bem-estar do doente»75. Arrancou com 1000 associados, a maioria dos quais doentes submetidos a tratamentos, e teve como primeiro presidente o referido Dr. Luís Roseira (ver lista completa das direcções na tabela abaixo), que naquele acto formal reforçou o objectivo principal do círculo: «humanizar ainda mais este serviço acompanhando e apoiando os doentes», no que foi secundado pelo Prof. Manuel Antunes, que realçou a importância da associação para os doentes, os quais «poderão ter uma palavra amiga de outros que já o foram e dos seus familiares». O Círculo de Amigos vem dinamizando vários eventos sociais, revelando grande capacidade de intervenção e mobilização da comunidade. Programa e realiza dois eventos de carácter anual: 1. O almoço convívio da Primavera, entre doentes, profissionais e amigos do Centro, em Maio, tendo em vista a recolha de fundos. Nele se têm juntado entre 800 a 1.000 amigos (ver fotos 38 a 44). 2. A Gala, no Salão Nobre do Casino da Figueira da Foz, em Novembro, assinalando a fundação do Círculo de Amigos e distinguindo as personalidades e instituições que mais se destacaram no apoio e divulgação dos Serviços de Cirurgia Cardiotorácica dos Hospitais da Universidade de Coimbra (ver tabela 1). Reúne, por norma, mais de 400 pessoas (fotos 45 a 47). A primeira Gala realizou-se em 2001, ano em que o Círculo de Amigos instituiu os prémios e troféus de prestígio, que são entregues aos distinguidos no âmbito do programa da Gala Anual. Importa ressalvar, que o

75 Idem.

— 79 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

Centro de Cirurgia tem atribuído os próprios prémios de serviço desde 1995. A lista de contemplados com o Prémio de Dedicação é a seguinte: 1995 – Enfermeira Noémia Tavares de Sousa 1997 – Ana Maria Gonçalves 1999 – Enfermeira Emília Mesquita Sola 2002 – Maria de Lurdes Fernandes Gonçalves 2003 – Dr. Luís Eugénio Fernandes 2006 – Enfermeira Leonilde Ferreira 2008 – Dr. José Ferrão de Oliveira 2012 – David Prieto de La Plaza O Círculo dos Amigos do Centro de Cirurgia Cardiotorácica – Coimbra foi declarado, a 13/01/2003, Instituição Particular de Solidariedade Social e reconhecida como pessoa colectiva de utilidade pública76. A este propósito deve-se destacar, ao nível da legalização o papel desempenhado por Raúl Castro. Quatro anos depois da criação, o Círculo de Amigos inaugurou, oficialmente, a sua sede: uma sala para secretariado, outra para reuniões e instalações sanitárias, permitindo dinamizar o voluntariado (fotos 48 e 49). Foi a 08/02/2003, e caberia a Manuel Antunes discursar na cerimónia, e lançar uma perspectiva sobre o papel da associação: «A equipa do Centro de Cirurgia Cardiotorácica dos HUC está grata ao Círculo de Amigos, uma associação que tem uma acção de grande valor no apoio às actividades do serviço e sobretudo aos utentes. As novas instalações marcam o início de uma fase em que terão mais condições para dedicar algum do vosso tempo a visitar, a aconselhar, a dar todo o tipo de apoio que pode ser prestado aos muitos doentes aqui operados. Apoio que não é necessariamente de ordem financeira, mas moral, porque para os doentes é muito importante uma palavra de conforto de quem passou pela mesma situação, de quem já foi operado»77. O presidente do Círculo de Amigos e empresário, Jorge Loureiro, usou da palavra para destacar a utilidade pública: «O Círculo de Amigos do CCCT foi reconhecido como instituição de solidariedade social de utilidade pública, o que permitirá trabalhar melhor o mecenato, que é apoiado pelo Estado»78. E, quanto à sede, definiu-a como «uma luta de quatro anos, porque era importante dispormos de instalações para recebermos as pessoas opera-

76 Diário da República, IIIª Série, Nº 29, 4 de Fevereiro de 2003 77 «Os amigos são para as ocasiões» In Tempo Medicina, 17/02/2003, p. 4 78 Idem.

— 80 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

das e as suas famílias» e que o «…apoio necessário antes da operação e na fase pós-operatória (…) também passa pela ajuda monetária às pessoas que por vezes não têm dinheiro para regressar a casa». Na cerimónia, foi oferecido um carrinho elétrico (foto 50) que seria adaptado de forma a permitir o transporte de doentes sentados, ou em maca, e de outras cargas – ambulância polivalente, que custou cerca de 10.000 euros, destinada a facilitar as deslocações entre o CCCT e o bloco central dos HUC. O dia terminou com um jantar no Casino da Figueira da Foz, destinado a angariação de fundos, que reuniu sócios, amigos e corpo clinico. As actividades do Círculo de Amigos, sob a direcção do Dr. Raul de Castro, cresceram de forma sustentada, procurando promover a interligação entre a sociedade civil e o serviço de saúde de forma a conseguir melhores condições para os técnicos e utentes: em 2004 adquiriu uma vídeo-câmara para a cirurgia pulmonar; e, em Abril de 2005, foi tornada pública «a maior prenda até hoje dada por um só benemérito: uma carrinha para transporte de órgãos no valor de 40 mil euros. A Volkswagen Sharan foi ontem entregue»79. Tratava-se da oferta do associado João Pereira Coutinho, presidente do grupo SIVA, um dos mais prestigiados empresários em Portugal, que entregou as chaves no decurso do convívio anual. Em 2006 e na 6ª Gala do Círculo de Amigos, o presidente Armando Melo traçaria novos objectivos: «O Círculo está em fase de crescimento, mas felizmente já não são só doentes, agora temos amigos e instituições que participam connosco e que nos dão alento a ir mais longe». Nessa ocasião defenderia também a ideia «…de adquirir uma casa onde possam ficar instalados familiares de doentes mais carenciados»80. Uma sugestão bem acolhida por todos e que seria assegurada no ano seguinte, com a entrega simbólica das chaves de um apartamento sito em Coimbra, no decorrer da VIIª Gala do Círculo de Amigos, comprado por escritura de 28/11/2007, e que entrou em funcionamento no ano de 2008. O imóvel (T1) destinado a apoiar utentes em fase de recuperação e os seus familiares (apoio residencial pós-cirúrgico), localiza-se na R. António José de Almeida n.º 35, próximo ao Largo de Celas. Em 2009 e no nº 220 da mesma rua, o Amigo Tomás Eugénio Sanches da Gama, ofereceu uma vivenda com três apartamentos de tipologia T3 e, por isso, com capacidade para albergar até 3 doentes e acompanhantes. Após obras de reabilitação, foi inaugurada no dia 15/04/2010 (fotos 51 e 52).

79 «O donativo do milionário» In 24 Horas, 01/05/2005, p. 6. 80 «Coração uniu-se na dor na cura e na amizade» In Diário de Coimbra, 20/11/2006, p. 25

— 81 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

De destacar, porém, que a maioria dessas obras, o seu mobiliário, etc, foram dádivas posteriores de outros Amigos. O Círculo tem pago bolsas, apoiado congressos, oferecendo ao serviço bens materiais e dando apoio humano e financeiro aos doentes mais carenciados. Até 2006 chegou a disponibilizar uma Assistente Social que acompanhava os doentes internados e fazia o trabalho administrativo. Em 2012, ofereceu ao serviço um ventilador de pressão positiva não invasiva e um computador. Ao cumprir 25 anos de actividade, a actual direcção do Círculo de Amigos (foto 53 e tabela 2) foi solicitada pelo Director do Centro a colaborar na organização de um programa comemorativo especial: 1.ª actividade: a 21/03/2013: Concerto pela Orquestra Clássica do Centro na Igreja da Rainha Santa Isabel (Convento de Santa Clara); 2.ª actividade: a 22/03/2013 realizou-se no auditório principal dos HUC, o Simpósio Internacional Cardiothoracic Surgery: Past, Presente and Future, reunindo 6 dos mais importantes nomes da cirurgia e cardiologia europeia: Ludwig, Von Segesser, Alain Carpentier, Alec Vahanian, Paul Van Schill, Pascal Vouché, Magdi Yacoub. Alain Carpentier e Magdi Yacoub receberiam o grau honoris causa pela Universidade de Coimbra, a 23/02/2013, tendo como proponente e padrinho Manuel Antunes, evento integrado nas comemorações dos 25 Anos do SCCT (foto 54). Na cerimónia de abertura daquele Simpósio, presidida por Paulo Macedo (Ministro da Saúde), foi por aquele anunciada a atribuição da Medalha de Ouro da Saúde a Manuel Antunes e ao Serviço que dirige. Incluiu uma actuação do guitarrista e compositor António Chainho. 3.ª actividade: a 04/06/2013, a realização de um seminário sobre gestão de unidades de saúde, com a presença de administradores de todo o país 4.ª actividade: a 1 e 2 de Novembro, a realização das primeiras Jornadas de Cardiologia do Centro com todos os serviços de Cardiologia e Cirurgia Cardíaca da região. 5ª actividade: a 24/11/2013, a realização da 13.ª Gala e lançamento deste livro dos 25 anos do Centro de Cirurgia Cardiotorácica dos HUC. Nos últimos anos o número de associados não parou de crescer: em 2004 tinha 1650 associados e em 2006 cerca de 2000 e, na actualidade cerca de 2500. Um número crescente, alicerçado no lançamento de uma campanha de angariação de amigos no dia da X Gala (2010). A participação dos amigos do círculo espelha-se, também, no número de presenças registado nos dois principais eventos públicos anuais: a Gala (em Novembro) e o almoço convívio de Maio. Em 2012, por exemplo, marcaram presença 400 amigos, no primeiro caso, e 870 no segundo. — 82 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

Na Assembleia Geral Extraordinária de 19/03/2007, foi aprovada a revisão estatutária. Em 2010 o Círculo de Amigos aproximou-se ainda mais da comunidade, com a edição do seu primeiro Boletim Informativo (apresentado no dia da X Gala).

TABELA 1 PRÉMIOS ATRIBUÍDOS PELO CÍRCULO DE AMIGOS 2003 – III GALA TROFÉUS DE CRISTAL Prestigio Especial

DISTINGUIDOS Manuel Antunes

Mérito para profissionais do serviço:

José Manuel Ferrão de Oliveira (chefe de equipa), Emília Conceição (enfermeira) e Eduardo Ferreira (um dos mais antigos técnicos de perfusão do país e um dos fundadores da escola de Coimbra

Dedicação

Luís Roseira (principal dinamizador do CA), Jorge Loureiro (VP da comissão instaladora e presidente da direção) e Luis Eugénio Fernandes (chefe de Serviço)

Benemérito

António Luís Serrenho

Comunicação Social

Diário As Beiras e RTP1 pelo melhor trabalho sobre o Centro de Cirurgia 2004 – IV GALA

TROFÉUS DE CRISTAL

DISTINGUIDOS

Benemerência

Álvaro Pereira «pela total dedicação às causas do Circulo de Amigos»

Mérito

Pedro Pires, um jovem membro da equipa do Serviço de Cirurgia Cardiotorácia 2005 – V GALA

TROFÉUS/PRÉMIOS

DISTINGUIDOS Elsa Sousa, do CP, pela reportagem do encontro de Fátima

Prestígio

Empresa SIVA (Sociedade importadora de Veículos Automóveis): oferta de carrinha 2006 – VI GALA

TROFÉUS/PRÉMIOS

DISTINGUIDOS Enf.ª Maria Leonilde Ferreira nos serviços desde 1980

Mérito

Médico anestesista Manuel Zuzarte Carreira. Casino da Figueira da Foz por desde sempre ter disponibilizado as suas instalações e colaborado no que era possível — 83 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

2007 – VII GALA TROFÉUS/PRÉMIOS

DISTINGUIDOS

Comunicação

Oliveira Gião

Solidariedade

Eng.º António Luis Serrenho

Distinção Profissional (Enfermagem)

Enf.ª Noémia Sousa Tavares 2008 – VIII GALA

TROFÉUS/PRÉMIOS Dedicação Solidariedade Distinção Profissional

DISTINGUIDOS António Nunes da Nóbrega Dr. José Gomes Alves Dr. David Prieto de la Plaza, médico espanhol 2009 – IX GALA

TROFÉUS/PRÉMIOS Dedicação Personalidade

DISTINGUIDOS Armando Melo de Almeida (ex-presidente do Círculo de Amigos) Prof. Dr. Jorge dos Santos Veiga Inês Margarida Moura Mendes Freire

Mérito

Enf.º António José dos Santos Ferreira Prof. Pedro Manuel Quelhas Lima Engrácia Antunes 2010 – X GALA

TROFÉUS/PRÉMIOS

DISTINGUIDOS José Carlos (Matobra)

Mérito

António Serrenho (Tintas CIN) e Aurora Vieira Manuel Pablo: anestesista espanhol, Profissional do Ano 2011 - XI GALA

TROFÉUS/PRÉMIOS Dedicação

DISTINGUIDOS Enf.ª Carla Alexandra Baltazar Silva Pinheiro Dr. António Damasceno Albuquerque Ribeiro 2012 – XII GALA

TROFÉUS/PRÉMIOS Dedicação Profissional Personalidade Mérito

DISTINGUIDOS Enf.ª Maria da Graça Sepúlveda Caldeira Alberto Manuel Martins da Cruz Orlando Alves de Sá Dr. João José Eusébio Bernardo

— 84 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

TABELA 2 ÓRGÃOS SOCIAIS DO CÍRCULO DE AMIGOS DO CCCT DOS HUC

DIRECÇÃO Jorge Loureiro (Presidente) Dr. Raúl Castro (Vice-Presidente) Arq. Jorge Moreira da Costa (1.º Secretário) Armando Melo (2.º Secretário) Dr. Luís Eugénio (Tesoureiro) Luis Dutra Fernandes (Vogal) António Calisto (Vogal) Dr. Martinho (Vogal) Áurea Vieira (Vogal)

MANDATO 1999-2002 MESA DA ASSEMBLEIA GERAL

CONSELHO FISCAL

Eng.º António Luis Serrenho Prof. Dr. Jorge Veiga (Presidente) (Presidente) Prof. Dr. Carvalho Araújo Ana Catarina Pereira Coutinho (1.º Secretário) (Secretário) Prof. Dr. Pina Cabral (2.º Secretário) Comendador José da Costa Oliveira (Relator)

MANDATO 2003-2005 DIRECÇÃO MESA DA ASSEMBLEIA GERAL Dr. Raul Miguel de Castro (Presidente) Dr. Álvaro Pereira (Vice-Presidente) Eng.ª Susana Isabel Ventura Batista (Secretário) Prof. Dr. Jorge Veiga Dr. Luís Eugénio C. Fernandes (Presidente) (Tesoureiro) Prof. Dr. José Manuel G. Pina Cabral Armando Melo Almeida (Vogal) (1.º Secretário) João Pinheiro O. Guerra Dr. Manuel Rebanda (Vogal Suplente) (2.º Secretário) José Carlos S. Leirião (Vogal Suplente) Armindo Vieira Jordão (Vogal Suplente) Eduardo da Silva Jordão (Vogal Suplente) MANDATO 2006-2008 DIRECÇÃO MESA DA ASSEMBLEIA GERAL Armando Melo Almeida (Presidente) Ernesto Vieira (Vice-Presidente) Eng.ª Susana Batista (Secretário) Prof. Dr. Jorge Veiga (Presidente) Dr. Luís Eugénio (Tesoureiro) Prof. Fernando Bianchi de Aguiar António Rocha Calisto (Vogal) (Secretário) Manuel Silva Almeida Prof. Ramos Lopes (Relator) (Vogal Suplente) Álvaro Pereira (Vogal Suplente) Fernando Pereira (Vogal Suplente)

— 85 —

CONSELHO FISCAL

Dr. Paulo Pereira Coelho (Presidente) Arq.º Jorge Moreira da Costa (Secretário) António da Silva Calisto (Relator)

CONSELHO FISCAL Dr. Paulo Pereira Coelho (Presidente) Arq.º Jorge Moreira da Costa (Secretário) Adolfo Piedade Carolino (Relator)

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

MANDATO 2009-2012 MESA DA ASSEMBLEIA GERAL

DIRECÇÃO Ernesto Gomes Vieira (Presidente) Eng.º. José da Costa Rasteiro Relvão (Vice-Presidente) Armando Melo Almeida (Secretário) Prof. Doutor Sebastião José Formosinho Sanches Simões (Presidente) Dr. Luís Eugénio (Tesoureiro) Manuel da Silva Almeida Álvaro Mendes Pereira (Vogal) Dr. Gonçalo José Reis Torgal (Vice-Presidente) (1.º Vogal-Suplente) Carlos Zeferino Gomes da Costa Novais (Relator) Arqt.º. Eloi Augusto Pereira Prof. Doutor Jorge Veiga (Suplente) (2.º Vogal Suplente) Eng.º. António Luís Martins Serrenho (3.º Vogal Suplente) Fernando Pereira (4.º Vogal Suplente) MANDATO 2013-2016 DIRECÇÃO MESA DA ASSEMBLEIA GERAL Prof. Doutor Frederico José Teixeira (Presidente) Eng.º. José da Costa Rasteiro Relvão (Vice-Presidente) Armando Melo Almeida (Secretário) Prof. Dr. Sebastião José Formosinho Dr. Luís Eugénio (Tesoureiro) Dr. Carlos António Pinheiro Francisco Sanches Simões (Presidente) e Silva (Vogal) Manuel da Silva Almeida (Vice-Presidente) Armindo Augusto Martins Silva Carlos Zeferino Gomes da Costa Andrade (Vogal) Novais (Secretário) Dr. Gonçalo José dos Reis Torgal Prof. Doutor Jorge Veiga (Suplente) (1.º Suplente) Arqt.º. Eloi Augusto Pereira (2.º Suplente) Eng.º. António Luís Martins Serranho (3.º Suplente) Fernando Pereira (4.º Suplente)

— 86 —

CONSELHO FISCAL

Prof. Doutor Frederico José Teixeira (Presidente) António Rocha Calisto (Secretário) Armando Martins Malho (Relator)

CONSELHO FISCAL

Ernesto Gomes Vieira (Presidente) António Rocha Calisto (Secretário) Armando Malho (Relator)

— 87 —

 Fotos 38, 39 e 40 – Almoço da Primavera - Minde (Fátima), 2013

 Fotos 41, 42A e 42B – Almoço da Primavera - Minde (Fátima), 2013

 Foto 43 – Almoço da Primavera - Minde (Fátima), 2013: Prof. Frederico Teixeira usando da palavra

 Foto 44 – Almoço da Primavera - Minde (Fátima), 2013: Ernesto Vieira (à esquerda) e Prof. Formosinho Sanches (à direita)

 Foto 45 – VI Gala do Círculo de Amigos: ao centro Prof. Manuel Antunes ladeado pelo Dr. Luís Eugénio

 Foto 46 – VI Gala do Círculo de Amigos: da esquerda para a direita, Manuel Antunes, Fernando Regateiro (presidente do Conselho de Administração dos HUC) e Agostinho Almeida Santos

 Fotos 47, 47A e 47B – VII Gala do Círculo de Amigos do CCCT HUC, 25-11-07

 Fotos 48 e 49 – A sede do Círculo de Amigos do CCCT dos HUC: em cima a porta de acesso, em baixo a sala de reuniões

 Foto 50 – Carro maca oferecido pelo Circulo de Amigos

 Foto 51 – Casa da Rua António José de Almeida

 Foto 52 – Inauguração da Casa da Rua António José de Almeida

 Foto 53 – Direcção do Círculo de Amigos do Centro de Cirurgia Cardiotorácica dos HUC (2013/2016)

 Foto 54 – 25.º Aniversário do CCCT dos HUC - Doutoramento Honoris Causa



– Foto 55

As M

(fo fricanas issões A

tomont

agem)

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

8 AS MISSÕES AFRICANAS

— 97 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

A

Cadeia da Esperança foi fundada em Outubro de 2000 e está sedeada no CHUC, tendo como Presidente António Leitão Marques81 e como Presidente da Assembleia Geral, Manuel Antunes. Trata-se de uma ONG de Solidariedade Médica que vem ajudando os países africanos de língua portuguesa no tratamento de doenças cardiovasculares. Ao longo destes anos, tem desenvolvido projectos humanitários na saúde, em especial na área das doenças cardiovasculares em Moçambique e S. Tomé e Príncipe, operando doentes que doutra forma não teriam capacidade de aceder aos cuidados necessários. Entre finais de Outubro de 2001 e princípios de Novembro de 2001, uma equipa médica de Coimbra, constituída por 10 elementos da associação Cadeia de Esperança de Portugal, dirigida por Manuel Antunes, realizou 18 intervenções cirúrgicas de coração aberto no Instituto do Coração de Moçambique (ICOR), a maioria em crianças. Tratou-se da primeira missão a Moçambique e tal deslocação só foi possível com a doação de 20.000 contos pelo Comendador António Almeida Roque, de 82 anos, Industrial da Cerâmica e antigo doente do serviço82.

81 Director do Serviço de Cardiologia do CHUC 82 «Equipa médica de Coimbra termina “com êxito” missão em Maputo» In Diário de Coimbra, 03/11/2001

— 98 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

A deslocação integrou-se num projecto de cooperação europeu que envolveu as organizações Coeur pour Tous (Suíça), Chain de LÉspoir (França) Chain of Hope (Inglaterra) e Cadeia da Esperança (Portugal), ONG promotoras da construção do ICOR moçambicano (criado há 2 anos). Esta foi a primeira de várias missões anuais que ao longo de 12 anos se realizaram, registando no total mais de 250 intervenções cirúrgicas , com uma mortalidade de cerca de 1%, idêntica à obtida pela equipa em Coimbra (foto 55). No âmbito da visita de Estado do Presidente da República a Angola, realizada entre os dias 18 e 22/07/2010, em cuja comitiva esteve integrado o Prof. Manuel Antunes, formalizaram-se acordos de cooperação entre os HUC e o Hospital Pediátrico David Bernardino, e Clínica Sagrada Esperança, de Luanda e o Hospital Central Dr. António Agostinho Neto, no Lubango. Através deste acordo o CCCT tem recebido várias crianças angolanas para tratamento. A 10/07/2012, com a presença do Prof. Manuel Antunes, a Cadeia da Esperança inaugurou uma unidade de Cardiologia no Hospital Ayres Meneses em S. Tomé, que funcionará num pavilhão autónomo e concentrará meios de diagnóstico de cardiologia e gabinetes de consulta. A sustentabilidade da cooperação seria garantida com a formação em cardiologia clínica, em Coimbra, de uma médica santomense que obteve uma bolsa da Cadeia da Esperança. Era o resultado visível da cooperação entre a organização dirigida pelo médico António Leitão Marques e os donativos de António Almeida Roque «o comendador generoso», que apoiou com 200.000 euros a reabilitação do pavilhão e a bolsa da médica santomense.

— 99 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

9 A ÚLTIMA DÉCADA DE ACTIVIDADE



O centro de excelência do professor Manuel Antunes é, claramente, um exemplo em termos de qualidade e em termos de doentes tratados (…) há claramente aqui, uma concentração de recursos, meios e diferenciação que faz com que este centro seja um exemplo.



[Ministro da Saúde Paulo Macedo, na sessão comemorativa dos 25 anos do Serviço de Cirurgia Cardiotorácica dos HUC In As Beiras, 23/24/03/2013]

— 101 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

U

ma das características do serviço, herança feliz, era o combate com sucesso às listas de espera: um dos raros serviços hospitalares portugueses onde os doentes são, em regra, operados dois dias após o diagnóstico. Por esta razão Manuel Antunes decidira candidatar o Serviço, nos finais de 2002, ao Programa Especial de Combate às Listas de Espera Cirúrgicas (PECLEC) «… disponibilizando-se a operar os doentes cardíacos que aguardam por uma cirurgia noutras regiões do país. Contudo, a sua candidatura foi recusada»83. Rebentava assim, uma inevitável polémica, pois a ARS - de Lisboa e Vale do Tejo justificava a recusa com o facto de não existirem listas de espera sobre esta especialidade, dando a impressão de terem impedido Coimbra de travar a lista de espera.

A RESPOSTA ÀS CRITICAS SEVERAS O Centro de Cirurgia Cardiotorácica dos HUC tem sido alvo de imensas críticas positivas. As negativas, pelo poder corrosivo que têm, merecem uma melhor atenção. De facto, o Prof. Manuel Antunes e sua equipa amiúdes vezes são criticados por trabalharem para as estatísticas, serem pequenos ditadores ou escolherem os doentes operados. O principal responsável pelo serviço responde: «É o síndrome do quintal do vizinho. Se um vizinho tiver um quintal muito bem arranjado, com flores bonitas e erva bem tratada, e se o outro vizinho tiver um quintal desprezado, seco e amarelo, este provavelmente explicará o facto dizendo que lá chove mais do que no seu. O mesmo acontece quando alguém aparece mais alto no meio da multidão, dizendo-se que é porque está de saltos altos». Por outro lado, deixar de fumar e perder peso são, muitas vezes, uma obrigatoriedade para quem é seguido no serviço. Nós não recusamos doentes gordos ou em mau estado. Nós preparamo-los para as cirurgias de acordo com regras. É natural alguns doentes entrarem em desacordo, preferindo outros serviços». [Prof. Manuel Antunes entrevistado por João Pinho, 01/10/2013]

83 «Coimbra impedida de travar lista de espera» In A Capital, 30/12/2002, p. 6

— 102 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

A questão da autonomia seria a pedra de toque em termos de liderança do CRI, nomeadamente o pedido para a definição legislativa da autoridade total do Director de Serviço: «Tudo o que é verdadeiramente importante num hospital não se passa no Conselho de Administração, mas sim nos serviços»84, afirmava Manuel Antunes em 2005. Apesar do exemplo de sucesso apresentado por Coimbra (ver gráficos 1 e 2), o Governo não apostou nos CRI, preferindo outras prioridades ao nível da gestão hospitalar: em 2003 apostou-se nos Hospitais SA conduzindo à empresarialização de 31 unidades de saúde, e no Programa de Recuperação das Listas de Espera (PECLEC). Mas nem a empresarialização teria sucesso, nem as listas de espera eliminadas, precisamente o inverso do que vinha acontecendo no CCCT. De facto, em meados de 2005 o Observatório Português de Sistemas de Saúde (OPSS) divulgava o número de doentes em lista de espera cirúrgica: 224.000!!! Foi sempre preocupação do serviço não perder um tempo operatório: Na véspera observamos os doentes que vão ser operados no dia seguinte e se não for possível operar algum deles chamamos logo outro. Em 15 anos e meio de actividade não perdemos, no total, mais do que uma dúzia de tempos operatórios»85. De facto, ao perfazer um ano de actividade o novo centro apresentava números crescentes de sucesso: 800 cirurgias de coração aberto, mais 2 a 3 dezenas do que as do ano anterior até esta altura com «cerca de metade a doentes enviados de outros centros»86. O CCCT dos HUC habituara os portugueses a bater recordes de produtividade. Por isso, recebeu-se sem surpresa, em finais de 2004, o anúncio do que sucedera com os transplantes: Quando começaram o país necessitava de 60-70 ano, fazendo-se nos outros 3 centros 15 por ano. Em menos de um ano o CCCT realizara 25 transplantes cardíacos (18 homens e 17 mulheres, o mais novo com 15 e o mais velho com 67), um número nunca alcançado por nenhum centro em Portugal: «Em Portugal, os três centros que existiam, no Porto e em Lisboa, realizavam no total entre 10 e 15 transplantes por ano. Agora, em 2004, após a criação do centro de Coimbra, este número subiu até aos 40, tendo cerca de 2/3 destes transplantes sido realizados pela equipa de Manuel Antunes»87. Este sucesso resultava de um esquema de funcionamento vertiginoso: «É uma corrida contra o tempo. Destes 25, só sete corações foram colhidos localmente. Os outros foram colhidos em Braga, Matosinhos, Porto,

84 «Muitos gestores que aí estão não conhecem a Saúde», Tempo Medicina, 27/06/2005, p. 18 85 «Não perder nenhum tempo operatório» In As Beiras, 30/09/2003, suplemento Jornal de Saúde, p. 6 86 Idem. 87 «Recorde nos transplantes cardíacos» In As Beiras, 06/11/2004, p. 10

— 103 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

Lisboa, Almada, Viseu e sobretudo em Lisboa. Temos que ir e vir de helicóptero, Por estrada, só o tempo da viagem de Lisboa para aqui anda pela hora e três quartos de hora/duas horas, apesar de que, quando viajamos pela auto-estrada, temos o apoio prestado de uma maneira absolutamente eficiente pela GNR, Cada minuto é fundamental no coração»88. Com estadia média de 23,4 dias, não foi registada mortalidade operatória mas haviam-se perdido 2 doentes por infecções, sendo 92,5% de sobrevivência (média internacional 80-85%). O grupo de transplantados podia subdividir-se em 3: anomalias congénitas do coração, doentes que tiveram angina de peito, enfartes repetidos ou problemas valvulares, e cardiopatias dilatadas. Eram associados do programa de transplantações: Serviço de Cardiologia, Gabinete de Coordenação dos HUC e Centro de Histocompatibilidade e Anatomia Patológica. A 26/11/2004 realizou-se uma sessão solene, comemorativa do 1º aniversário da transplantação cardíaca nos HUC, com presença do Ministro da Saúde Luís Filipe Pereira e uma conferência de Magdi Yacoub médico pioneiro na transplantação cardíaca. Ao terminar o ano, o Serviço apresentava mais um sucesso, desta feita económico: um saldo positivo de 5 milhões de euros, permitindo uma vez mais a distribuição dos prémios de produtividade aos funcionários pelo 5º ano consecutivo: 850.000 euros, cerca de 20% do total do saldo positivo, a repartir por 120 profissionais, referentes a 1634 intervenções89.

A BUSCA CONTÍNUA PELA POUPANÇA «Fomos à procura de todos os pontos de desperdício. Uma vez, no fim de uma operação, vi que as compressas estavam parcialmente ensaguentadas. Ora, uma compressa é para usar bem, para ensopar completamente antes de ir para o lixo. Caso contrário é um desperdício. Chamei a enfermeira e pedi-lhe uma redução de 25% no consumo de compressas. Ela conseguiu uma redução de 33%. Também tenho o costume de andar pelas torneiras a ver se estão bem fechadas, e a apagar as luzes antes de me ir embora. Parece um exagero mas é assim que se poupa». [Manuel Antunes In Diário de Noticias 11/08/2005]

88 «Manuel Antunes: dedicação plena» In Diário de Coimbra, 26/11/2004 (suplemento Jornal de Coimbra), p. 3 89 «Cirurgia Cardiotorácica premeia eficácia» In Diário de Coimbra, 04/03/2005, p. 5

— 104 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

Nos princípios de 2006, colocou-se a possibilidade de corte nas horas extraordinárias. Um momento mal recebido pela equipa, dado que a produção subira ao longo dos anos, traduzindo-se no aumento de receitas. Este crescimento representara, nos primeiros anos, 25% do rendimento dos profissionais, entregues na distribuição de incentivos: «Até que, contou Manuel Antunes, em 2004, os prémios ultrapassaram o milhão de euros, e, na administração do hospital, começou a dizer-se “que tanto dinheiro não pode ser”, ficando acordado com o conselho de administração que seriam entregues aos funcionários do Centro apenas 861 mil euros. Assim, foram redistribuídos 18% e não 25% das receitas, trazendo consequências perversas, como a mensagem de que «não vale a pena aumentar a produtividade, pois a partir de agora entregam-nos o que quiserem». Abria-se pois, um perigoso campo ao descrédito e desmotivação dos seus profissionais90. No princípio de 2007 o CCCT dos HUC atingiu as 25.000 intervenções, com a operação a um menino de 12 anos.

DE OLHOS POSTOS NO FUTURO – O PROJECTO MY-HEART O CCCT tem procurado a actualização de conhecimentos, pioneirismo e inovação, através de várias parcerias internacionais. Uma das mais mediáticas foi tornada pública nos princípios de 2007: em conjunto com investigadores da FCTUC foram desenvolvidos dois sistemas, um de gestão da insuficiência cardíaca e outro de monitorização do estado de próteses valvulares: 1.Uma camisola sem mangas com um bolso à frente, onde se insere um pequeno aparelho que transmite sinais a um PDA (através do sistema de Bluetooth) com algoritmos de diagnóstico que detectam as descompensações do paciente. 2.A outra inovação destina-se a doentes com próteses valvulares, isto é, munidos de um estetoscópio digital que ligam ao PDA, cujo software introduzido neste sofisticado telemóvel permite o diagnóstico automático e personalizado para o doente e para o médico caso haja alguma anomalia. Estas soluções tecnológicas foram desenvolvidas ao abrigo do projecto europeu de Prevenção e Detecção Precoce das Doenças Cardiovasculares – Projecto My-Heart, liderada pela Philips Research Laboratories – Aachen (Alemanha). Teve a participação de 34 parceiros de 11 países (10 europeus

90

«Ministro ganha uma guerra» In Tempo Medicina, nº 1156, Ano XXIII, 20/02/2006, p. 4

— 105 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

e 1 clínica dos EUA), de várias empresas europeias na área da clinica, universidades, unidades de investigação, hospitais e empresas de telecomunicações. Iniciado em Dezembro de 2003 e fim previsto para Dezembro de 2008. A missão principal passava por encontrar soluções tecnológicas que pudessem prevenir a ocorrência de problemas cardiovasculares e detecção atempada destas patologias. Da parte do Departamento de Engenharia Informática da FCTUC participaram dois investigadores (Paulo de Carvalho e Jorge Henriques) enquanto o CCCT foi representado por Manuel Antunes. [In Público, 23/02/2007]

A partir de 2007 começaram a sentir-se os problemas de constrangimentos financeiros. Contudo, os números do serviço continuaram a espantar: em Julho fazia-se a transplantação 100, a um jornalista oriundo de Lisboa. Em menos de 3 anos, com taxa de sucesso imediato de 97% e sobrevivência superior a 89%, o serviço assegurava 2/3 das transplantações cardíacas nacionais e assumia-se como um dos mais produtivos da Europa. Mas o reconhecimento do Serviço não abrandou, antes pelo contrário: a 26/11/2007, o CCCT recebia o prémio Hospital Futuro, na categoria “Gestão & Economia da Saúde” (patrocinado pelo Novartis Oncology). Um prémio que visava: «distinguir o trabalho realizado por pessoas ou entidades que tenham contribuído para o desenvolvimento da Saúde em Portugal, nomeadamente na promoção e dinamização de projectos de utilidade pública, no combate à doença e na aplicação das novas tecnologias de informação na saúde»91. Apesar do sucesso, a verdade é que o CCCT continuava a navegar em águas instáveis. Ao iniciar o ano de 2008, era grande o descontentamento pelos compromissos assumidos entre CRI e administração HUC não estarem a ser cumpridos: ausência de contrato programa aprovado, sem delegação de competências, tendo recebido em 2006 apenas 1/3 do que estava contratualizado para incentivos. Foi também por esta altura que os HUC passaram a EPE, tendo por base o Plano Estratégico. Como a questão da autonomia do director de serviço não ficou resolvida, Manuel Antunes colocou de imediato a hipótese de se demitir. Acto que repetiria em Maio de 2009 quando a administração dos 91 «Prémios “Hospital Futuro” para três serviços da região» In As Beiras, 17/04/2007

— 106 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

HUC, baseada no novo regulamento interno, pretendeu reduzir o número de horas de trabalho da sua equipa, de 42 para 35 horas de semanais, abrindo a porta à necessidade de contratar novos profissionais. Um momento muito difícil, que motivou a reacção de Manuel Antunes e da sua equipa de forma duríssima: «Andei 21 anos a construir um modelo diferente e, enquanto tiver forças, não vou deixar que o destruam. A equipa está em pé de guerra. É como se tivesse entrado um elefante numa loja de loiça de porcelana»92. O próprio presidente do Círculo de Amigos viria a público manifestar solidariedade: «È um crime alterar o que está bem», diria Ernesto Vieira. Vários directores de departamento criticaram publicamente o documento: ao criar um nível intermédio de gestão – as designadas Áreas de Gestão Integrada (AGI) –não previa a existência de departamentos na estrutura organizacional dos HUC. O novo regulamento seria homologado, extinguindo vários departamentos, incluindo o Departamento da Cirurgia Cardiotorácica, passando Manuel Antunes à condição de Director de Serviço. E assim se criaria o Serviço de Cirurgia Cardiotorácica e Transplantação de órgãos Torácicos (CCT), mantendo-se como CRI, à semelhança do Serviço de Oftalmologia (Também CRI desde Maio de 2004). O cirurgião aceitaria a nomeação depois de asseguradas as condições exigidas, que Fernando Regateiro, Presidente do CA dos HUC explicitou publicamente: «Teve em consideração a especificidade do CRI de CC e as manifestas vantagens de uma gestão com o máximo de autonomia», atribuindo-lhe as necessárias competências para um funcionamento conducente ao aprofundamento da autonomia, nomeadamente no que respeita à gestão dos recursos humanos»93. Numa busca permanente por novos desafios, e estando alcançada e consolidada a transplantação cardíaca, o CCCT começou a delinear a transplantação pulmonar. Nos princípios de 2005, e estimadas as necessidades em 20/25 ano (contra as 75/100 do coração), Manuel Antunes colocaria alguma água na fervura, alertando também para a complexidade técnica do processo. A 30/05/2008, na sessão comemorativa dos 20 anos do CCCT foi assumido o desejo: «Nós sabemos fazê-la, nós podemos fazê-la, mas necessitamos de ajuda». Uma ajuda externa pois no caso da pulmonar não poderia ser 92 «Manuel Antunes ameaça demitir-se» In Diário de Coimbra, 25/05/2009; «Cirurgia Cardiotorácica recusa trocar experiência por inexperiência» In Diário de Coimbra, 27/05/2009, p.7 93 «Manuel Antunes mantém-se à frente da Cirurgia Cardiotorácica dos HUC» In Diário de Coimbra, 02/06/2009, p. 28

— 107 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

como no caso da cardíaca em que se utilizaram «absolutamente os meios internos»94. A própria Ministra da Saúde, Ana Jorge, chegou a anunciar naquela sessão o início dos transplantes nos HUC para Setembro. Nessa altura, o tema estava na ordem do dia pois fora amplamente difundido pela imprensa nacional o drama vivido por António Pinto de Sousa, irmão do Primeiro Ministro José Sócrates, que se sujeitara a um transplante pulmonar no Complexo Hospitalar Universitário Juan Canalejo, na Corunha. Nesta sessão, Fernando Regateiro, aproveitaria a ocasião para dissipar as dúvidas que pairavam no ar: «Há de facto excelência, há elevada qualidade, há resultados clínicos de primeira grandeza, há eficiência na sua gestão, há elevação nos seus profissionais. O serviço contribui para o prestígio e sustentação do futuro dos HUC e terá todo o suporte do conselho de administração para fazer do seu centro de responsabilidade integrada – da forma como o encara, assumindo, como assume toda a responsabilidade e toda a autonomia – um exemplo, um modelo, para que muitos centros de responsabilidade se criem no hospital. Não queremos uma prática centralizada, queremos desconcentrar»95. A 27/08/2008, a equipa do CCCT voltaria a fazer história, ao fazer pela primeira vez uma transplantação cardíaca pediátrica na unidade de transplantes cardíacos. A intervenção, a uma criança com dois anos que residia em Peso da Régua, durou 3 horas e decorreu sem incidentes, tornando-se um dos mais jovens de sempre a ser transplantado. A operação traduziria uma nova etapa no programa de transplantação de órgãos torácicos dos HUC e, para Manuel Antunes, poderia ser «o primeiro passo para a criação em Coimbra de um centro de transplantações cardíacas pediátricas de referência»96. A 12/05/2009, assinalar-se-ia outro momento histórico da transplantação em Portugal: um doente, com 60 anos, recebia rim e coração de uma só vez. Uma operação complexa, realizada pelas equipas do Centro de Cirurgia Cardiotorácica e do Serviço de Urologia e Transplantação Renal dos HUC. Demorou pouco mais de 4h e foi concluída com êxito; primeiro o transplante cardíaco e depois o renal97.

94 «Cirurgião

Manuel Antunes quer implementar transplantes pulmonares em Coimbra» In Correio de Coimbra, nº 4227, ano LXXXVII, 05/06/2008

95 «Transplantação pulmonar pode avançar com apoios» In Tempo Medicina, 09/06/2008, p. 12 96 «Transplante inédito de coração em criança» In As Beiras, 30/08/2008, p. 4 97 «Doente recebe rim e coração de uma só vez» In As Beiras, 14/05/2009, p. 13

— 108 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

Pelo decreto-lei nº 30/2011 (DR n.º 43, Série 1ª, de 02/03/2011) foi criado o Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, EPE (CHUC) – por fusão dos Hospitais da Universidade de Coimbra, EPE, do Centro Hospitalar de Coimbra, EPE, e do Centro Hospitalar Psiquiátrico de Coimbra. Esta alteração não trouxe consequências directas ao CCCT. Passados 15 anos sobre a criação do CRI, o modelo de gestão implementado no continua um exemplo a replicar: «O que temos aqui é um orçamento próprio, que segue todas as regras do orçamento do hospital, mas é autónomo e há sempre lugar a alguma capacidade de iniciativa que permita que se possa utilizar o orçamento para o melhor resultado final. E temos tido sempre com saldos positivos significativos, da ordem dos cinco a seis milhões para orçamentos da ordem dos 17 ou 18 milhões. O mesmo se passa em relação à gestão dos recursos humanos. Há mais autoridade do director do centro e há a sua capacidade de decidir se precisa de adquirir mais ou de prescindir de recursos humanos, de acordo com as suas variações de actividade»98. Foi este modelo que o Tribunal de Contas destacou como exemplo a seguir, em Agosto de 2012, nos resultados da auditoria às 4 principais unidades de cirurgia cardiotorácica nacionais - CHUC, Santa Marta e Santa Maria (Lisboa) e S. João (Porto) - como tendo a melhor performance entre 20082010: «Em termos de desempenho a unidade de Coimbra destaca-se na relação doentes operados por números de consultas que quase chega aos 50%». Com mais de 35.000 cirurgias realizadas até então, e uma média anual que ronda as 1850, e 230 transplantes de coração, o centro fora também reconhecido como «o melhor serviço de cirurgia cardiotorácica do país e o mais activo na Peninsula Ibérica». Responsável por mais de metade dos transplantes feitos em Portugal «o único a registar crescimento no número de intervenções cirúrgicas nestes 3 anos, sendo a taxa de ocupação do bloco operatório a mais elevada de todas (92% em 2010, a mesma que em 2008). Regista o crescimento mais acentuado no número de consultas. É o que tem menor número de recursos humanos (85 contra 102 em Santa Maria). Único com todo o pessoal em dedicação exclusiva, listas de espera a zero e valor residual no que respeita a cirurgias. Demora média de internamento (7dias) a mais baixa de todas99. Manuel Antunes destacaria o ânimo à equipa trazido pelo Tribunal de Contas, o modelo de gestão e regime de trabalho dos colaboradores: tra-

98 «Sem reformas na saúde chegaremos ao racionamento» In As Beiras, 19/06/2010, p. 24 99 «Cirurgia cardiotorácia do CHUC é a melhor do país» In As Beiras, 17/08/2012

— 109 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

balha-se para não haver lista de espera, em exclusividade, com médicos entre 75-80h semanais. Um aumento de horas que foi estudado e que custa menos ao hospital do que custaria a contratação de mais profissionais para fazer o mesmo serviço. Temia, no entanto, que a disponibilidade dos colaboradores se alterasse com as horas extraordinárias a serem pagas apenas a 40%: Criticaria, uma vez mais, a não delegação de competências da Administração, que o centro exige, para autonomia nas aquisições e contratações realizadas no cumprimento de um contrato-programa, acrescendo que de há 3 anos para cá não estavam a ser pagos os prémios de desempenho. Actualmente o Departamento é constituído por 2 sectores distintos mas bem interrelacionados: a Cirurgia Cardíaca e a Cirurgia Cardiotorácica. Os três pisos estão afectos a utilizações distintas: no superior a administração e instalações académicas; no intermédio o bloco operatório, unidades de cuidados intensivos e intermédios; e, no inferior, as enfermarias de cirurgia cardíaca e cirurgia pulmonar, o Hospital-de-dia para a transplantação e a consulta externa, para além de um Laboratório de Radiologia. Todos os médicos estão em regime de exclusividade e jornada contínua cumprindo média de 12 horas diárias. Os Internos e Assistentes da equipa cirúrgica cumprem de forma rotativa, períodos nocturnos e fins-de-semana, com o apoio dos 2 Chefes de Serviço e do Director. Todo o trabalho é feito por uma única equipa; todos os médicos têm responsabilidades sobre o total de doentes, dando apoio a todos os sectores do Serviço e, quando solicitados, aos restantes Serviços do Hospital, cabendo ao médico de serviço esse papel durante o período nocturno. O Serviço conta ainda no seu quadro com um cardiologista e um internista. Também 2 dos anestesistas actuam exclusivamente no quadro do Serviço. A Consulta Externa funciona de forma aberta, diariamente. Aqui, os doentes são observados cerca de 2 a 3 semanas após a alta, sendo na grande maioria dos casos orientados para os respectivos médicos assistentes. Realizam-se, ainda, duas consultas semanais para observação de doentes fora da Zona Centro, enviados para avaliação pré-operatória. Outros doentes podem ser observados a pedido do respectivo médico assistente ou cardiologista. A consulta é realizada, em equipa, pelos cirurgiões e pelo cardiologista. Diariamente, realizam-se 4 ou 5 cirurgias cardíacas e, semanalmente, uma média de 10 cirurgias torácicas divididas por 3 sessões operatórias. É frequente, também, o encerramento de canais arteriais em prematuros, na Unidade de Cuidados Intensivos do Hospital Pediátrico e na Unidade de Neonatologia da Maternidade Dr. Daniel de Matos, bem como a realização de cirurgias urgentes ou de emergência no bloco operatório central. — 110 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

O CCT assegura, actualmente, 66% do total da transplantação cardíaca do país, cerca do dobro dos outros três centros juntos. Entre Março de 1988 e Dezembro de 2012, o Serviço prestou assistência a 35276 doentes, muitos dos quais fora da área de referência do Hospital. Em Novembro de 2003, iniciou-se o programa de transplantação cardíaca, tendo sido transplantados, até esta data, 251 doentes. Uma das referências do Serviço é a reparação da válvula mitral. Regularmente são recebidos doentes de todo o país e do estrangeiro para serem submetidos a este tipo de cirurgia. A reparação da válvula mitral representa, contudo, um desafio técnico, exigindo uma curva de aprendizagem mais prolongada. Mais de 80% das válvulas operadas no Serviço, puderam ser reparadas e apenas cerca de 20% necessitaram de ser substituídas, o que não terá sido conseguido por nenhuma outra equipe cirúrgica em todo o mundo. Estes factos fazem atrair doentes de todas as regiões do País e alguns do estrangeiro. Para além desta actividade cirúrgica, o Centro mantém uma actividade habitual no ensino dos alunos da Faculdade de Medicina, na leccionação das disciplinas de Anatomia (1º ano) e de Cirurgia Cardiotorácica (5º ano), bem como na Escola Superior de Tecnologia de Saúde (responsável pela disciplina de Métodos e Técnicas em Cirurgia Cardíaca do Curso de Cardiopneumologia) e na Escola Superior de Enfermagem de Coimbra. Durante a última década, o Serviço foi honrado com as visitas de grandes figuras mundiais da cirurgia cardíaca, entre as quais se destaca Sir Brian Barratt-Boyes, e os Professores Christiaan Barnard, pioneiro na transplantação cardíaca, Floyd Loop, Director da Cleveland Clinic, John Barlow, Craig Miller, Hans Borst, Alain Carpentier, Gordon Danielson, Adib Jatene, Shahbudin Rahimtoola, Marco Turina e Magdi Yacoub. O Serviço tem sido frequentado por inúmeros cirurgiões provenientes de mais de 20 países, para a realização de estágios com duração de vários dias a mais de um ano, especialmente relacionados com a actividade de reconstrução da válvula mitral, de que o Serviço se tornou referência internacional. Com a criação do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra em 2011, Manuel Antunes propôs a criação do Coimbra Heart Center, um grande departamento, que associasse o Serviço de Cardiologia, o Serviço de Cardiologia Pediátrica e o Serviço de Cirurgia Cardiotorácica. Esta ideia não caiu muito bem e, após demoradas conversações, foi criado o Coimbra Heart Alliance, um projecto de cooperação entre os 3 serviços de cardiologia e de cirurgia cardíaca do CHUC, mantendo cada um a sua total independência, automomia de gestão e técnico-cientifica, e a responsabilidade pela definição estratégica. — 111 —

10 MANUEL ANTUNES – ESBOÇO BIOGRÁFICO



Não consigo dormir descansado se souber que a vida de alguém depende de mim e que, pela minha inércia, essa pessoa pode morrer a qualquer instante. É que não se trata de um órgão qualquer. É o coração. E sem coração, como sabemos, não é possível viver.



[Professor Manuel Antunes In Diário de Noticias, 12/08/2005]

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

M

anuel de Jesus Antunes nasceu a 20/07/1948, na pequena aldeia da Memória, sede de freguesia, integrada administrativamente no Concelho de Leiria. Com 5 anos foi para Moçambique onde fez os seus estudos primários, secundários e superiores. Licenciou-se em Medicina e Cirurgia, com 17 valores, pela Universidade de Lourenço Marques em 1971 onde leccionou como assistente da cadeira de Cirurgia até 1975. Neste ano partiu para a África do Sul (Joanesburgo), com bolsa universitária, onde se Doutorou em Cirurgia Cardiotorácica. Previa ficar apenas 3 anos, mas a oportunidade de singrar fizeram-no radicar naquele país integrando-se na carreira universitária e hospitalar e professor da maior universidade Sul-Africana, em Witwatersrand, estabelecimento de prestigio mundial, onde prosseguiu a carreira académica de Mestre e Doutor, sendo escolhido em 1986 e por unanimidade para o lugar de “Full Professor” e Cirurgião-Chefe da Univ. de Witwardsrand e Hospital de Joanesburgo. Manteve-se ali 14 anos, com progressão meteórica até se tornar especialista-chefe e director de um dos mais reputados departamentos mundiais de cirurgia cardiotorácica: foi o primeiro estrangeiro a dirigir, na África do Sul, os Serviços de Cirurgia Cardíaca, entre 1985-1988, nos hospitais universitários de Baragwnath, Coronation, Hillbrow, Striydom e Joanesburgo. — 114 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

Assim, ajudou a formar uma equipa de grande plano, com mais de 25 médicos e 100 outras pessoas «…entre anestesistas, enfermeiras e pessoal auxiliar, o Professor Manuel Antunes foi responsável por milhares de operações (1200 média/ano), sendo mais de 80% de coração aberto»100. Este tempo, longe da pátria, fez de Manuel Antunes um emigrante, que como tantos outros teve de se adaptar a uma dura realidade: «…isto passou-se numa sociedade em que ninguém vence à custa dos seus lindos olhos ou dos laços familiares e em que um imigrante tem de trabalhar mil vezes mais do que os naturais para provar o que vale»101. Em 1980 fez exame de especialidade à Ordem dos Médicos. Em 1987 aceitou o convite do Prof. Norberto Canha para dirigir a Cirurgia Cardíaca dos HUC, função que começou a desempenhar em Março de 1988, ano em que integrou a Fac. de Medicina da Universidade de Coimbra como professor associado-convidado, vindo a apresentar-se a provas de concurso público para agregação e integração nos quadros da UC, título que obteve em Novembro, aprovado por maioria e proferindo a lição síntese: «O dilema da escolha de uma prótese valvular cardíaca». Machado Macedo, presidente da OM foi um dos arguentes na discussão do curriculum e relatório pedagógico. A 18/06/1989 recebeu as insígnias doutorais e, em 1990, foi aprovado para professor catedrático, obtendo no mesmo ano o título de Chefe dos Serviços Hospitalares com a incumbência de modernizar os Serviços de Cirurgia Cardíaca do Hospital da Universidade. Apesar do brilhantismo enquanto cirurgião, Manuel Antunes tem uma afirmação curiosa para explicar a sua opção: «Não tive nenhuma vocação familiar em medicina. Eu tinha contactos com médicos desde muito cedo, até porque em Moçambique havia muitos médicos nos quadros docentes dos liceus e talvez isso tenha sido um incentivo»102. Luís Eugénio, ainda em 1988, destacava as qualidades do Mestre enquanto cirurgião: «O Prof. Manuel Antunes impressionou-me por duas razões fundamentais: primeiro pela segurança com que opera, depois pela destreza e rapidez de execução, que são verdadeiramente surpreendentes. De salientar ainda que é um perito na reparação da válvula mitral – sendo um dos cirurgiões de todo o mundo com maior experiência neste campo»103.

100 «Manuel Antunes – um reconhecimento que tardava» In O Século de Joanesburgo, 03/05/1993 101 Público Magazine, 20/05/1990, p. 20 102 «Vamos prestigiar a Universidade e o país», In A Capital, 04/04/1988, p. 13 103

«Um dos melhores cirurgiões do Mundo começou a trabalhar nos HUC» In Jornal de Coimbra, 30/03/1988, p. 5

— 115 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

Para os seus colaboradores, e enquanto director de serviço, Manuel Antunes é um homem duro e exigente. O seu enormíssimo prestígio, além e aquém fronteiras, contribuíram para que se tornasse conhecido como «o professor», forma afectuosa e respeitadora como é tratado pelos colegas, funcionários e doentes. Desde que regressou a Portugal (fotos 56 a 60) e assumiu o Serviço de Cirurgia Cardiotorácica, aplicou na vida profissional os princípios da sua filosofia pessoal: «A minha filosofia pessoal é que nunca estou satisfeito, se um individuo está satisfeito estagna, portanto quero mais sempre mais. Posso é dizer que não estou arrependido de ter abraçado o projecto, o que é uma maneira diferente de pôr as coisas»104. O professor tem-se destacado ao nível da intervenção pública, diagnosticando vários problemas relacionados com o Serviço Nacional de Saúde, postura que lhe valeu o epíteto de «polémico cirurgião». Ainda em 1989, na posse de dados sobre o funcionamento hospitalar e contando com mais de 5500 corações intervencionados diria aquela que se tornou um dos emblemas do seu pensamento: «É preciso uma revolução na Medicina portuguesa». No seu entender a Eutanásia é uma forma de suicídio. Por outro lado, defendeu que a Faculdade de Medicina deveria ter um organismo para controlo da ética pelo qual se evitasse: «…utilizar formas extraordinárias de manutenção da vida quando o doente não tem já qualquer hipótese de sobrevivência e pode estar a roubar atenção e possibilidades a outros doentes». Seria um organismo de ética experimental «onde os protocolos governamentais deviam ser examinados numa perspectiva de saber se estão de acordo com a ética da sociedade». A técnica desenvolveu-se de tal modo «…que podem acontecer situações gravíssimas, incorrectas ao nível ético»105. Ao longo destes anos, e em especial durante os anos 90, Manuel Antunes denunciou e procurou combater vários males da medicina portuguesa: o atraso técnico e científico em relação à europeia, justificado pela falta de meios técnicos, financeiros e humanos, a estruturação das carreiras médicas e de enfermagem, a falta de um programa de transplantes, a necessidade de adoptar um sistema intensivo de trabalho, a promiscuidade entre sector público e privado, o princípio do utilizador/pagador, a dedicação plena dos médicos a um serviço no horário de 42h semanais, foram temas desenvol-

104

«Não estou arrependido» In Diário As Beiras, 17/08/1998, p. 4

105

«Nos HUC, com mestre de cirurgia cardíaca» In Jornal de Coimbra, 06/12/1989, p. 17

— 116 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

vidos em diversas palestras, por vezes ao jeito de notas e comentários, a maioria dos quais vertidos no seu livro: A Doença da Saúde. Contudo, em momento algum Manuel Antunes propôs modelo alternativo ao SNS, antes o defendeu como «espinha dorsal de todo o sistema público de saúde». Assim, propôs a sua cura: «A maior parte dos médicos compete consigo próprio, as listas de espera no público são lucrativas nos privados, onde os médicos de manhã, nas consultas dos hospitais, “receitam” a visita à clinica privada à tarde. Os médicos que trabalhassem para o Estado deveriam estar em regime de exclusividade mas o Estado deveria garantir “pontes” para o privado. Devia haver dois sistemas, o público e o privado, fortes e independentes, a lutar em competição»106. Nos princípios de 2002, seria, juntamente com Vital Moreira, contestatário do monopólio das farmácias privadas apontando como caminho a redinamização das farmácias hospitalares: «As farmácias têm-se aproveitado de um mercado que é todo dirigido a favor dos seus próprios interesses, É completamente incrível que as farmácias hospitalares não forneçam logo aos doentes que aqui vêm à consulta os medicamentos a preços mais reduzidos»107. Também em 2002 manifestou-se contra o preço único do acto médico, contestando ainda a nova lei de gestão hospitalar, pois atingia as carreiras e os direitos adquiridos dos vários profissionais. Em 2003 assumiria uma postura cautelosa quando o governo decidiu apostar na empresarialização: «Está-se a andar depressa demais. Até à semana passada, os hospitais não tinham, absolutamente, nenhuma autonomia (…) Agora, subitamente, os hospitais passam a ter toda a responsabilidade com gestores que apareceram sabe lá Deus de onde, alguns são amigos, outros são primos, outros são desconhecidos, outros até não sabemos se existem»108. Em 2007 foi mandatário do grupo “Aborto a pedido? Não!”. O professor destaca a adesão à CEE como o acontecimento marcante na História de Portugal, tão relevante como o 25 de Abril: «Permitiu a consolidação da democracia, que naqueles anos estava muito periclitante, sujeita a ameaças e riscos vários»109. A nível internacional, destaca a queda do muro de Berlim: «Tornou este mundo um pouco mais seguro e cooperante».

106 «Manuel Antunes opera corações…e fechaduras», In A Capital, 19/07/1996, p. 27 107

«O Estado é refém das farmácias», O Independente, 01/03/2002, p. 34

108 «Estamos a andar demasiado depressa» In Tempo Medicina, Suplemento Actualidade, 13/01/2003, p. 2 109 «Posso considerar-me uma pessoa realizada» In Correio da Manhã, 19/03/2003, p. 42

— 117 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

Ocupa actualmente 3 lugares de topo: Professor Catedrático da Faculdade de Medicina da UC, Director de Serviço, e Chefe de Serviço (carreira hospitalar). Obteve reconhecimento internacional, publicando mais de 300 artigos na imprensa médica internacional e apresentando outros tantos trabalhos em conferências e congressos, com mais de 700 comunicações em reuniões hospitalares e universitárias. Assina um dos capítulos do Grande Atlas Americano das doenças cardíacas, a maior publicação da especialidade. Em 1989 publicou um atlas sobre reparação da válvula mitral (Mitral Valve Repair), atá há pouco tempo a única monografia sobre o assunto a nível mundial. É Editor associado da Revista Europeia de Cirurgia Cardiotorácica. É Presidente da Academia Portuguesa de Medicina e é membro de várias sociedades internacionais, de que se destaca a Associação Americana de Cirurgia Torácica (único português entre 80 estrangeiros aceites). A 23/06/2005 foi indigitado pelo Conselho de Administração dos HUC como coordenador da recém-criada comissão para a Transplantação de Órgãos Sólidos dos HUC. Constituída pelos 3 coordenadores do programa de transplantes dos HUC: Manuel Antunes (transplantação cardíaca); Alfredo Mota (transplantação renal) e Baptista Geraldes (transplantação hepática). É Presidente da Assembleia Geral da Cadeia de Esperança (ONG), da Academia Nacional de Medicina de Portugal e foi Presidente da Assembleia Municipal de Leiria (2005-2009). Recebeu vários prémios, sendo de destacar: a 17/03/1993, a atribuição da Grã Cruz da Ordem de Cristo, sendo condecorado pelo Presidente da República, Mário Soares, em cerimónia realizada no Palácio da Ajuda, em Lisboa. No parecer favorável então emitido pode ler-se: «Manuel Antunes apresenta-se assim uma pessoa de raro vigor moral e intelectual, a quem Portugal e a África do Sul devem inestimáveis serviços que muito prestigiam a causa da Ciência e da Técnica em Medicina fortalecendo a confiança das populações. Por isso o Conselho das Ordens é de parecer que lhe deve ser atribuída a Grã Cruz da Ordem de Cristo»110. A 30/11/1994, Manuel Antunes recebeu o título de Doctor of Science, pela Universidade de Witwatersrand: «Aquele título, que é o mais raro e prestigioso que as universidades de língua inglesa conferem (…) sequência da apresentação de uma tese, com o título “Cirurgia das doenças valvulares” e de vários trabalhos científicos publicados, reconhecidos internacionalmente como contribuição significativa para o avanço da Ciência, no ramo da cirurgia cardiotorácica»111.

110 «Manuel Antunes – um reconhecimento que tardava» In O Século de Joanesburgo, 03/05/1993 111 «Joanesburgo atribui o “Doctor of Science a cirurgião português» In Jornal de Noticias, 26/11/1994

— 118 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

Recebeu outros prémios também significativos: título de investigador oficial pelo Medical Research Council, da África do Sul; prémios e medalhas de mérito como membro da comunidade portuguesa da Africa do Sul e Secretaria de Estado da Emigração e Comunidades. O Diário As Beiras, e na Gala do 5.º aniversário, realizada no Casino da Figueira a 25/03/1999, atribuiu-lhe a estatueta “D. Dinis de Bronze”, na área da Saúde, reconhecendo a Cirurgia Cardiotorácica dos HUC e o facto de ter sido o primeiro Centro de Responsabilidade Integrada e ter operado 13.000 doentes. Em 20/04/2007 o Campeão das Províncias distinguiu-o na Gala e Homenagem Coimbra Prestígio e Reconhecimento (foto 61). A 02/05/1999, Manuel Antunes seria homenageado na terra natal em Memória-Leiria, com descerramento de placa no Posto de Saúde a que foi atribuído o seu nome, e entrega da Medalha de Ouro da Cidade de Leiria, seguido de almoço convívio que juntou 700 pessoas, entre elas Cavaco Silva e a Presidente da CM Leiria, Isabel Damasceno112. A 05/06/2006 a Câmara Municipal de Coimbra deliberou atribuir-lhe a Medalha de Ouro da Cidade, sob proposta do presidente Dr. Carlos Encarnação: «O incontornável número de intervenções cirúrgicas, a constância e a certeza com que são realizadas e a sua invejável taxa de mortalidade (0,7% no último ano) constituem referências de significado internacional»113. A medalha ser-lhe-ia entregue no dia da Cidade de Coimbra, a 04/7, em cerimónia pública realizada na Quinta da Conraria. A 08/04/2013, Dia Mundial da Saúde, recebeu a Medalha de Ouro da Saúde, título atribuído pelo Ministério da tutela, reconhecendo o seu exemplo e o trabalho desenvolvido no serviço que dirige há 25 anos (foto 62). Foi apontado, em diversas alturas como possível indicação para ministro, algo que nunca se veio a concretizar. Sobre o assunto afirmou: «Para mim a glória é que as pessoas considerem que eu sou ministeriável». A vida pessoal de Manuel Antunes é, segundo o próprio, muito rotineira. Vem todos os dias ao hospital. No gabinete, um dos sofás faz de cama nas noites em que lá dorme, embora durma apenas 1 a 2 horas. Em casa, escreve e, nas horas livres, lê jornais e informa-se pela TV. Tem nos escritores Júlio Verne e Fernando Namora duas referências incontornáveis.

112 «Manuel

Antunes soma homenagens…na Memória» In Diário As Beiras, 03/05/1999, p. 15. Da Comissão Promotora faziam parte: o Juiz Emidio Santos, o cardiologista Brito Câmara, o empresário José Rodrigues, o director de finanças Raul Castro, e o advogado Vitor Monteiro. Da Comissão de Honra: Maria de Belém Roseira (Ministra da Saúde), Barbosa de Melo (deputado PSD) e D. Serafim Ferreira e Silva (Bispo Leiria-Fátima).

113 «Coimbra prepara homenagem a Manuel Antunes» In Correio de Coimbra, 08/06/2006

— 119 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

Gosta de música: é apreciador de fado, tendo como referências Amália, Mariza, Marta Dias, Cristina Branco; e da música clássica, em especial de Beethoven, Vivaldi, Mozart, Chopin, Wagner ou Bruckner. Também gosta de Nana Mouskouri. É um desportista de sofá: aprecia mas não pode praticar. É adepto do SLB e da AAC. Viaja pouco por turismo ou lazer, mas faz 6/7 viagens por ano para reuniões científicas. Frequentemente faz intervenções de demonstração de cirurgia de reparação da válvula mitral, tendo já operado este tipo de doentes em mais de 20 países estrangeiros, em praticamente todos os continentes. Tem especial admiração pelos cirurgiões brasileiros e é Membro Honorário das duas principais sociedades de Cirurgia Cardiovascular daquele país. A principal refeição é o jantar, servido em casa, dado que o almoço é, por norma no serviço. Gosta muito de bacalhau, o molho preferido é o azeite, e a sobremesa de eleição o arroz-doce. Nas horas livres também pratica jardinagem. Define-se como patriótico, politicamente de direita e católico praticante. Esteve na equipa de Fernando Nogueira, líder do PSD e candidato a Primeiro-ministro, onde participou na elaboração das bases do programa de governo, para a área da saúde. Foi mandatário de Cavaco Silva, para o Distrito de Coimbra, aquando da candidatura a Presidente da República em 1999 e em 2006 (e também seu consultor para a Saúde). Em 2005, José Sócrates convidou-o para o projecto Novas Fronteiras. Nutre por Coimbra e Região admiração e respeito, iniciando as suas palestras internacionais com o dístico «Coimbra – Património da Humanidade», com uma guitarrada de Carlos Paredes ou um desfolhar de imagens de património da cidade. Não se considera um duro, mas sim um «disciplinador». Contudo, confessa emocionar-se facilmente: «Sou sensível à perda de doentes, particularmente à perda de crianças». No entanto, a tranquilidade do lar pode ser alterada por uma das suas máximas: permanentemente de serviço «…sempre ao alcance das chamadas imprevistas. Que as coisas do coração são de vida ou de morte». De facto, e sempre que se ausenta de Coimbra leva uma lista com os dados dos pacientes inscritos para receberem coração. Chama-lhe uma cábula, para tomar decisões em curto tempo e de acordo com as características dos doentes. Manuel Antunes tem 3 filhos e sua esposa é licenciada em Economia.

— 120 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

O LIVRO A DOENÇA DA SAÚDE Será a obra mais conhecida do Prof. Manuel Antunes. Lançado nos princípios de 2001, depressa atingiu as 5 edições, com mais de 14.000 exemplares vendidos. Teve prefácios de Leonor Beleza e Manuel Alegre. Nele diagnosticou vários problemas relacionados com o Sistema da Saúde em Portugal, sistematizando um conjunto de pensamentos e ideias para os solucionar: «A minha principal intenção ao escrever o livro foi trazer os problemas para a discussão na praça pública. Uma discussão importante a nível nacional sobre o papel do SNS, que não deve ser feita apenas nos gabinetes e por pessoas, mais ou menos interessadas num ou noutro sistema»114. A obra esteve envolvida em alguma polémica pois nele assumiu várias posições incómodas. «O meu passado e estatuto permitem este tipo de aventuras, de poder dizer verdades que outros não gostam», diria sobre o assunto. O livro trouxe grande agitação, sobretudo dentro da classe médica, sendo bastante criticado e a vários níveis. Esclareceu, a determinada altura que «não usei o livro para atacar os médicos ou qualquer outra classe profissional» nem para «me elevar pessoalmente, ou o meu serviço». Desde que se aventurou pela escrita teve a noção que o assunto seria político e que o livro era político «mas não queria o livro partidarizado». O facto de incluir prefácio de Leonor Beleza logo foi conotado com PSD: «Eu escrevi um livro para lançar um alerta, para dizer que, neste momento, o nosso país não se pode dar ao luxo de desaproveitar as potencialidades de um SNS de cuja filosofia e aplicação generalista nos devemos orgulhar»115. A obra trouxe-lhe pressões imprevistas: «Houve algumas pessoas, até ao mais alto nível, nomeadamente no ministério e Ordem dos Médicos, que tentaram (porque não me podiam pegar de outra maneira) marginalizar-me». «Continuo a pensar que quando o Ministério da Saúde e a Ordem dos Médicos tomaram as suas posições não conheciam o conteúdo do livro. Penso que perderam oportunidades importantes de se associarem a uma discussão que, quer queiram quer não, vai ter lugar». Um ano depois do lançamento da obra, declararia que tudo estava na mesma, reafirmando que o livro é «obviamente político, mas recuso-me a deixar que seja partidarizado. Os que o leram ficaram certamente com a noção de que, no que respeita a políticas de saúde, eu sou muito mais social que liberal»116. Manuel Antunes também colaborou no livro “Reformar Portugal” onde se coligiram 17 reflexões sobre os problemas e soluções para Portugal. Um trabalho coordenado por Francisco Sarsfield Cabral, Abel Mateus e Luís Valadares Tavares. O 8 capítulo, dedicado à Saúde, é da autoria do Professor Manuel Antunes, com o título Eficiência e qualidade. Obra lançada no CCB, em Lisboa, dia 12/12/2002. 114 «Tentaram marginalizar-me» In Diário de Coimbra, 12/03/2001, p. 4 115 «Tentaram marginalizar-me» In Diário de Coimbra, 12/03/2001, p. 4

— 121 —

116 «A doença da saúde um ano depois» In Expresso, 19/01/2002, p. 24

 Fotos 56 e 57 – Manuel Antunes por volta de 1990

 Fotos 58 – Manuel Antunes em finais dos anos 90

 Fotos 59 – Manuel Antunes na actualidade

 Fotos 60 – Manuel Antunes no seu gabinete

 Foto 61 – Gala de homenagem Coimbra, Prestigio e Reconhecimento (Abril 2007)

 Foto 62 – Simpósio Internacional de Cirurgia Cardiotorácica (22/03/2013)

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

CRÉDITOS FOTOGRÁFICOS

Campeão das Províncias: fotos n.ºs 45, 46, 52, 62, 60 Carlos Jorge Monteiro: foto n.º 61 Centro de Cirurgia Cardiotorácica dos HUC: fotos n.ºs 1, 2, 3, 4 e 7 Círculo de Amigos do Centro de Cirurgia Cardiotorácica dos HUC: foto n.º 53 Diário As Beiras: fotos n.ºs 38, 39, 40, 41, 42, 43, 44, 47, 47A e 47B Diário de Coimbra: fotos n.ºs 5, 6, 9, 10, 11, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 56 e 57 Dr. Luís Eugénio: foto n.º 8 Luís Carregã: fotos n.ºs 54, 58 e 59 João Pinho: fotos n.ºs 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 36, 37, 48, 49, 50, 51 e 55

— 126 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

BIBLIOGRAFIA

Boletim Informativo do Círculo de Amigos do Centro de Cirurgia Cardiotorácia HUC: nº 1 (Novembro-Dezembro 2010), nº 2 (Maio-Junho 2011); n.º 3 (Maio-Junho 2012) Notária Maria Dina de Freitas Alves Martins: Livro de Notas nº 62-D, fls. 46-48v Diário da República, IIIª Série, Nº 29, 4 de Fevereiro de 2003

Periódicos A Capital: 04/04/1988; 19/07/1996; 30/12/2002 Campeão das Províncias: 22/06/2000 Correio da Manhã: 30/11/2002; 19/03/2003; 20/02/2005 Correio de Coimbra: 20/08/1998; 08/06/2006; 25/01/2007; 05/06/2008 Diário As Beiras: 06/04/1994; 20/04/1995; 28/12/1996; 24/04/1998; 17/08/1998; 29/03/1999; 01/10/2002; 30/09/2003 (suplemento Jornal de Saúde); 27/11/2003; 06/11/2004; 24/06/2005; 17/04/2007; 30/08/2008; 14/05/2009; 27/08/2009; 19/06/2010; 04/07/2012; 17/08/2012; 22/03/2013; 23/24/03/2013 Diário de Coimbra: 29/06/1977; 16/05/1988, 10/11/1998; 25/05/1990, 11/07/1990; 28/12/1996; 30/10/1998; 25/11/1999; 18/01/2000; 01/07/2000; 12/03/2001; 03/11/2001; 01/10/2002; 26/11/2004 (suplemento Jornal de Coimbra); 04/03/2005; 11/11/2008; 25/05/2009; 27/05/2009; 02/06/2009 Diário de Noticias: 12/08/2005 Expresso: 19/01/2002 — 127 —

O CENTRO DE CIRURGIA CARDIOTORÁCICA DOS HUC

Jornal de Coimbra: 30/03/1988; 04/01/1989; 06/12/1989, 18/07/1990; 26/05/1993; 26/01/1994; 20/01/1999; Ano XIII, nº 599, 17/03/1999 Jornal de Noticias: 25/07/1977; 27/03/1992; 01/04/1992; 26/11/1994; 03/01/2000 Mensageiro de Bragança: 27/03/1992 Notícias Médicas: Ano XVIII, nº 1826, 26/05/1989; Ano XXVIII, nº 2545, 26/02/1999; 10/03/2004; 02/02/2005 O Dia: Ano I, 21/02/1989, nº 309; 29/10/2001 O Independente: 01/03/2002 O Século de Joanesburgo: 03/05/1993 Público: 01/02/2002; 06/06/2002; 13/12/2002; 23/02/2007 Público Magazine: 20/05/1990 Serras de Ansião: Ano IX, Nº 104, 15/02/1999 Tecno-hospital: nº 10, 1º Quadrimestre de 2002 Tempo Medicina: 27/09/1993; Ano XII, nº 582, 20/02/1995; 24/07/1995; 04/03/2002; 12/06/2002; 13/01/2003; 17/02/2003; ano XXI, nº 998; 08/12/2003, 27/06/2005; nº 1156, Ano XXIII, 20/02/2006, 09/06/2008; 17/06/2013 24 Horas: 01/05/2005

Registos áudio (entrevistas gravadas): Prof. Manuel Antunes, 01/10/2013 Dr. Luís Eugénio, 10/10/2013 Prof. Frederico Teixeira, 21/10/13 Dr. José Ferrão de Oliveira, 24/10/2013 Dr. João Bernardo, 28/10/2013

Webgrafia: http://www.uc.pt/cct/apresentacao/HxServico/ — 128 —

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.