O combate ao terrorismo e sua crise contemporânea

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23/01/2016

O combate ao terrorismo e sua crise contemporânea ­ Jus Navigandi

Este texto foi publicado no site Jus Navigandi no endereço https://jus.com.br/artigos/13786 Para  ver  outras  publicações  como  esta,  acesse http://jus.com.br

O combate ao terrorismo e sua crise contemporânea O combate ao terrorismo e sua crise contemporânea José de Ribamar Lima da Fonseca Júnior

Publicado em 10/2009. Elaborado em 06/2009.

INTRODUÇÃO Sobre a crise contemporânea do combate ao terrorismo e a proteção dos Direitos Humanos, Gustavo Pamplona Silva1 diz que aquela "é um desafio da agenda política internacional, e o terrorismo é uma das principais ameaças a tais direitos". Partindo dessa premissa, o trabalho em questão tem por objetivo esboçar alguns problemas que abrangem o tema, tentando responder ou, pelo menos, trazendo luzes para a discussão de questões significativas, como o fato de até o momento não se chegar a um consenso quanto à definição de terrorismo,  assim  como  não  haver  uma  tipificação  conclusiva  do  que  seria  um  crime  de terrorismo. O presente trabalho procura, também, mostrar que terror e terrorismo não têm nada de novo, sendo facilmente observado no registro  da  história  dos  povos.  Tais  ações  podem  ser  promovidas  por  grupos  nacionalistas,  por  grupos  messiânicos  que desejam a reestruturação de um Estado religioso, por Estados contra sua própria população e populações estrangeiras e por tantos outros grupos por motivos os mais diversos. As formas também diferem, mas o objetivo é sempre o mesmo: provocar o medo, em função de interesses diversos. Por  último,  este  trabalho  também  pretende  analisar  os  motivos  do  terrorismo  e  os  fatores  que  levaram  ao  seu recrudescimento  na  última  década,  ressaltando  as  consequências,  para  a  Humanidade,  dos  ataques  terroristas  de  11  de setembro de 2001 ao Pentágono e às torres gêmeas do World Trade Center, em Nova York. Desse  modo,  ao  mesmo  tempo  em  que  a  problemática  sobre  o  terrorismo  é  trazida  ao  foco  das  discussões,  faz­se imprescindível  analisar  a  matéria,  com  maior  profundidade,  pela  ótica  de  vários  autores,  com  o  olhar  no  passado,  no presente e no futuro.

O QUE É TERRORISMO? Ao buscar­se uma definição mais clara para "terror" ou "terrorismo", mister se faz distinguir o terrorismo quanto a vários aspectos.  Nesse  sentido,  a  definição  pode  levar  a  equívocos  em  uma  simplificação  analítica,  devido  a  contornos  ainda obscuros. Segundo  Eugênio  Diniz,  "corre­se  o  risco  de  agregar  sobre  um  mesmo  nome  coisas  muito  diferentes,  impossibilitando  a análise, a identificação de alternativas adequadas para se lidar com o fenômeno e induzindo a erro quando da avaliação da eficácia dessas alternativas"2. Apesar  do  esforço  para  clarificar  os  elementos  constitutivos  da  definição  de  terrorismo,  feito  pela  doutrina  nas  várias formulações, a ausência de definições incontroversas constitui um dos problemas enfrentados na atualidade para o combate ao terror. Nesse sentido, encontramos diversos conceitos de terrorismo com várias interpretações. Para Norberto Bobbio (apud Wellausen, 2002),

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O terrorismo, como recurso comum à violência, distingue situações diversas,  conforme  seu  peso  político.  Tanto  pode  ser  um instrumento  de  governo  para  se  manter  no  poder,  quanto instrumento de libertação  nacional  em  nações  dominadas;  de  uma forma  ou  de  outra,  o  terrorismo  é  sempre  a  quebra  da  ordem imposta pelo poder dominante3. Para o senso comum terrorismo é o ataque indiscriminado a inocentes e a tentativa de introduzir o medo e o terror na vida cotidiana. Uma forma clássica de definir terrorismo foi a adotada pela Rand Corporation. Num texto recente, Brian Jenkins assim expôs o entendimento de terrorismo ali prevalecente: era necessário definir terrorismo de acordo com a qualidade do ato, não a identidade do perpetrador ou a natureza da causa. (...)  Concluímos  que  um  ato  de  terrorismo  era,  antes  de  mais  nada,  um  crime  no  sentido  clássico,  como  homicídio  ou seqüestro, embora por motivos políticos. Mesmo que aceitássemos a alegação de vários terroristas de que eles travavam uma guerra e eram, portanto, soldados — ou seja, combatentes reconhecidos no sentido estritamente legal —, táticas terroristas, na maioria dos casos, violavam as regras que governavam o conflito armado — por exemplo, tomar civis deliberadamente como alvo ou agir contra reféns. Reconhecíamos que o terrorismo continha uma componente psicológica — dirigia­se às pessoas que observavam. As identidades dos alvos ou vítimas concretos do ataque freqüentemente eram secundários ou irrelevantos para o objetivo dos  terroristas  de  disseminar  o  medo  e  o  alarme  ou  garantir  concessões.  Essa  separação  entre  as  vítimas  concretas  da violência e o alvo do efeito psicológico pretendido era a característica definidora do terrorismo4. Para Antonio de Sousa Lara, terrorismo É um ato político, essencialmente instrumental, com o propósito de criar pânico, espalhar medo, e generalizar o sentimento de  incapacidade  nas  massas,  para  que  um  pequeno  grupo  que  nunca  atingiria  o  poder  por  vias  democráticas,  consiga dialogar com o estado e impor­lhe as suas condições, quando não substituir o Estado na sua sede do poder político5. Para Danilo Zollo o terrorismo "é caracterizado pela violência indiscriminada contra civis com a intenção de espalhar pânico e para coagir um governo ou uma política internacional"6. Para Pascal Boniface: O terrorismo é, por vezes, um preâmbulo, na maior parte dos casos um substituto da guerra. Representa uma estratégia de pressão exercida contra determinados Estados. O objetivo não é nem o de os vencer nem o de os conquistar mas o de os levar a adotar este ou aquele comportamento. Antes de mais nada, o terrorismo é a arma dos pobres ou dos fracos. Os que não podem atacar frontalmente uma grande potência vão organizar atentados no seu território ou contra os seus interesses no mundo, a fim de fazer ceder7. Os Estados Unidos utilizam três definições de terrorismo, conforme o interesse das respectivas instituições: Departamento de Estado, Departamento de Defesa e FBI8. Para  o  Departamento  de  Estado "o terrorismo consiste no uso premeditado da violência executada contra alvos não­ combatentes  por  agentes  sub­nacionais  ou  clandestinos,  habitualmente  destinada  a  influenciar  uma  audiência".  Esta definição visa alargar o objetivo dos terroristas a militares que não estejam em combate, tal como aconteceu com o ataque ao USS Cole no Yemen, em 2000. Para  o  Departamento  de  Defesa  Americano "o terrorismo é o uso calculado da violência ou da ameaça da violência contra indivíduos ou propriedades, para infundir o medo, com a intenção de intimidar governos ou sociedades com o fim de perseguir objetivos que geralmente são políticos, religiosos ou ideológicos. Para  o  FBI9  "terrorismo  é  o  uso  ilegal  da  força  ou  violência  contra  pessoas  ou  para  intimidar  ou  coagir  um  governo, população  civil,  com  a  intenção  de  alcançar  objetivos  políticos  ou  sociais.  Esta  definição,  muito  semelhante  à  anterior, introduz uma nova variante dos fins terroristas, que são os objetivos sociais. O Governo Francês, em 1991, entendeu o terrorismo como uma "ação deliberada, tendendo, através da intimidação ou da violência, a derrubar as instituições democráticas ou a subtrair uma parte do território nacional à autoridade do Estado10 ". Portanto, as definições supra citadas não se afastam muito da definição empírica do terrorismo. As interpretações, além de muito semelhantes, quase se tocam nas intenções. No entanto, existem outras com a mesma importância, mas divergentes do pensamento político ocidental em razão da formulação que lhes foi dada. Com efeito, na sessão extraordinária da Conferência Islâmica dos Primeiros Ministros sobre terrorismo, realizada na Malásia em  2002,  o  Primeiro­Ministro  da  Malásia,  Dr.  Mahatir  Mohamad,  em  seu  discurso  na  abertura  do  encontro,  ressaltou  a gravidade do terrorismo, a importância de defini­lo e a necessidade da cooperação para combatê­lo. Ainda em seu discurso,

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rejeitou as ligações do terrorismo com o Islã e Mulçumanos e enfatizou a resistência às ocupações estrangeiras como um ato legítimo. Em busca de uma definição de terrorismo o então secretário­geral da Organização das Nações Unidas, Kofi Annan, pediu urgência  aos  países­membros  na  tomada  de  uma  decisão  há  muito  adiada:  definir  o  termo.  O  atraso  na  resolução  desse assunto, politicamente delicado, por diferentes razões, para os 191 integrantes da entidade, provoca o retardamento de novas ações para combater o terrorismo por parte da comunidade internacional.

A HISTÓRIA DO TERRORISMO A violência, hoje batizada de terrorismo, tem presença registrada na história em suas formas mais extremas. No dizer de João Bessa11, o terrorismo surge antes da era Cristã com a seita sicari, parte militante do movimento zelota, oposto a Roma (66­ 73d.C.), como o primeiro grupo terrorista conhecido, empenhado em ações de intimidação e violência seletivo. Já na era Cristã existiu a chamada seita dos Assassinos, que floresceu no tempo de Genghis Khan e cujas ramificações se estendem até os nossos dias. Segundo o mesmo autor, na segunda metade do Século XIX e princípios do séc. XX, (1879­1910) assistiu­se ao fenômeno do anarquismo,  que  foi  um  desenvolvimento  do  terrorismo.  Sucederam­se  vários  atentados  a  personalidades  políticas,  tais como o Rei Afonso XIII, a Imperatriz da Áustria, o Czar Alexandre II da Rússia. Todavia, é na década de 60/70 do século XX que o terrorismo vai explodir por toda a Europa. Surgem os movimentos Brigadas Vermelhas na Itália, as Baden Meinhof, na Alemanha, a ETA na Espanha e o IRA na Grã­Bretanha. No aspecto tecnológico, vão­se desenvolvendo novos meios, tais como o uso de cartas armadilhas, granadas lançadas de helicóptero (IRA), mísseis terra­ar (aeroporto de Roma), suspeita de posse de componentes para bombas nucleares (como urânio roubado)12. Para Pascal Boniface, entre as duas guerras mundiais, o terrorismo esteve essencialmente ligado às turbulências nos Balcãs. Desde 1966, quando do ataque a um avião da El­Al, no aeroporto de Atenas, por um comando palestino, o terrorismo passou a  estar,  também,  ligado  à  situação  no  Médio  Oriente  (90%  dos  atentados  de  origem  estrangeira,  cometidos  na  Europa, deveram­se a esse motivo)13. No corolário do terrorismo se deu o 11 de setembro, em 2001, atribuído ao grupo Al Qaeda. Jovens suicidas sequestraram quatro aviões e os arremessaram, dois contra as torres do Word Trade Center, outro contra o Pentágono e o último, que tinha como alvo a Casa Branca, caiu sem atingi­la. Este atentado chamou a atenção do mundo e, tendo provocado uma comoção internacional,  mobilizou  as  nações  para  o  combate  ao  terrorismo,  à  exceção  dos  países  que  faziam  parte,  segundo  o Presidente Americano George W. Bush, do "eixo do mal"14. Todavia, apesar da resposta, principalmente dos Estados Unidos, os atentados continuaram. Em agosto de 2003, um carro bomba atingia o Hotel Canal, em Bagdá, ceifando a vida do diplomata brasileiro Sergio Vieira de Melo e mais 14 pessoas, além de fazer dezenas de feridos. Note­se que quinze dias antes um atentado semelhante tinha matado, na Embaixada da Jordânia,  em  Bagdá,  17  pessoas.  Em  março  de  2004  aconteceram  ataques  terroristas  em  Madrid,  cujas  investigações apontaram  o  ETA  como  autor,  ao  mesmo  tempo  em  que  sinalizavam  o  envolvimento  da  Al  Qaeda.  No  ano  seguinte,  em Londres, mais precisamente em julho de 2005, quatro bombas explodiram na cidade, três no metrô e uma num autocarro, deixando 56 mortos, incluindo os terroristas, além de 700 feridos.

TIPOS DE TERRORISMO Antonio Lara, ao classificar os tipos de terrorismo, os distingue da seguinte forma: Terrorismo indiscriminado e Terrorismo seletivo.  Na  primeira  classificação  inclui  todos  os  atentados  e  agressões  que  visam  generalizar  um  dano  de  monta  a  um paciente previamente indefinido, anônimo ou indistinto. É relativamente irrelevante quem morre ou fica ferido, desde que morra  ou  fique  ferida  muita  gente.  Na  segunda  classificação,  ocorre  exatamente  o  contrário,  ou  seja,  visa­se  um  alvo concreto, que se quer pressionar, eliminar ou chantagear, fazer desaparecer de cena ou condicionar de forma definitiva, com vista a alterar o paralelogramo de forças ou o circunstancialismo político de uma determinada correlação vigente15. Segundo  o  mesmo  autor,  a  primeira  fase  contemporânea  do  terrorismo  incluiu  um  conjunto  de  procedimentos  quase uniformes com uma configuração na direção hierárquica das ações terroristas, a qual ele chamou de "terrorismo de primeira geração".  Denominou  de  terrorismo  de  segunda  geração  o  sistema  atual  de  terrorismo,  no  qual  não  se  vislumbra  uma permanência desta lógica hierárquica tradicional. Pelo contrário, as células terroristas são agora suficientemente autocéfalas, estão  apenas  unidas,  numa  primeira  fase  da  formação  doutrinária  e  tática,  para  depois  se  isolarem  no  contexto  de  uma inserção social participante, dentro da vida habitual de uma determinada comunidade. Ou seja, muito mais dificilmente se identificará,  por  exemplo,  uma  estrutura  da  Al­Qaeda,  pela  simples  razão  de  que  não  existe  uma  sociedade  sistêmica, administrativa, hierárquica burocrática e logística em tal organização16. Antônio Lara remete também a outra forma de terrorismo, o super terrorismo17. Este termo refere­se a uma fase avançada do terrorismo, abrangendo meios cada vez mais poderosos e letais, designadamente de natureza biológica, química e nuclear, de concepção e execução transnacional. Os incidentes e ataques terroristas que marcam esta nova era aconteceram no Japão e nos Estados Unidos, assumindo proporções alarmantes com efeitos psicológicos devastadores.

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Desse modo, ressaltem­se os atentados que deram origem à nova fase do Super terrorismo: ­ Os atentados em 1993 ao Word Trade Center, onde um carro bomba foi detonado por terroristas árabes islâmicos no parque de estacionamento subterrâneo por baixo da Torre Um, na cidade de Nova Iorque. Os 680 kg do dispositivo de combustível e nitrato mataram seis e feriram 1,042 pessoas18; ­  O  atentado  ao  edifício  federal  da  cidade  de  Ocklahoma,  em  1995.  Foi  um  ataque  terrorista  perpetrado  pelo  americano Timothy  McVeigh,  em  19  de  abril  de  1995,  que  teve  como  alvo  o  Edifício  Federal  Alfred  P.  Murrah.  O  resultado  foi  168 mortos e mais de 500 feridos. Este atentado era considerado, até os ataques de 11 de Setembro de 2001, o pior ocorrido em solo americano19. ­ O ataque ao metropolitano de Tóquio com gás Sarin, em março de 1995. Foi um ato de terrorismo perpetrados por membros nacionais  da  Aum  Shinrikyo,  cujos  autores  liberaram  o  gás  sarin  em  várias  linhas  de  metrô,  matando  doze  pessoas, intoxicando gravemente cinquenta e causando problemas temporários de visão em quase mil pessoas20 . ­  A  destruição  das  torres  gêmeas  do  Word  Trade  Center,  pela  Al  Qaeda,  em  11  de  setembro  de  2001.  O  resultado  foi  de aproximadamente 3.000 mortos21. Entretanto,  o  super­terrorismo  assume  quatro  tipos  diferentes,  a  saber:  as  ações  suicidas  de  larga  escala;  o  terrorismo biológico; o terrorismo químico e o terrorismo nuclear. Antônio Lara ressalta que todos esses tipos de terrorismo têm origem na guerra formal, e assevera que na guerra de 1914­ 1918, as ações suicidas em larga escala foram materializadas pelo Japão no final da Segunda Grande Guerra Mundial, com o sacrifício humano dos pilotos Kamikhaze. As armas biológicas foram utilizadas nas guerras da Coreia e do Vietnã. As bombas atômicas de Hiroshima e Nagasaki deram origem à fase que ficou conhecida na História como a do "equilíbrio do terror", uma vez que tornaram patente os efeitos que a explosão de uma ogiva nuclear provoca sobre uma cidade22. Por outro lado, diz o autor que é a própria globalização que gera as condições propícias para o desenvolvimento destas novas formas  de  super­terrorismo.  Acusa  os  meios  de  comunicação  de  alimentar  a  avidez  por  notícias  dos  atentados, multiplicando, assim, o efeito perverso da sua eficácia em termos de escala continental, ou seja, o fenômeno atinge uma proporção psicológica e social de dimensões muito maiores à escala da sociedade global. Vaticina que os terroristas têm uma enorme facilidade para o acesso a todo esse arsenal, que pode ser usado no sentido da subversão  política  transnacional.  E  que,  apesar  das  convenções  de  limitação  do  comércio  ilegal  e  do  contrabando  de produtos  outrora  inacessíveis,  as  redes  terroristas  estão  melhor  organizadas  e  infiltradas  para  obterem  o  material  de  que precisam para as suas ações. Para  Saly  da  Silva  Wellausen,  é  comum  a  mídia  falar  de  terrorismo  de  Estado,  e  neste  caso  trata­se  do  processo  de exterminação,  de  matança  extensiva:  durante  a  Guerra  Fria,  é  atribuída  não  só  à  ex­União  Soviética,  como  aos  Estados Unidos, uma profusão de atentados. Irã, Síria, Líbia e Iraque seguiram os mesmos passos. Trata­se, no fundo, de um Estado que pode mandar matar e financiar grupos clandestinos para realizar extermínios em massa. E foi justamente na guerra do Afeganistão contra os soviéticos que os EUA prepararam e financiaram o grupo de Osama Bin Laden (como também foram os EUA que financiaram e contrataram Saddam Hussein para atacar o Irã)23.

ANTITERRORISMO E CONTRA TERRORISMO O  combate  ao  terrorismo,  no  dizer  de  Álvaro  Pinheiro,  é  conduzido  em  duas  grandes  vertentes:  o  antiterrorismo  e  o contraterrorismo.  O  antiterrorismo  compreende  a  condução  das  medidas  de  caráter  eminentemente  defensivo  que objetivam  a  redução  das  vulnerabilidades  aos  atentados  terroristas.  Já  o  contraterrorismo  compreende  a  condução  das medidas  de  caráter  eminentemente  ofensivo,  tendo  como  alvo  as  diversas  organizações  terroristas  em  presença,  a  fim  de prevenir, dissuadir ou retaliar atos terroristas. Nesse  sentido,  as  atividades  desenvolvidas  pelos  órgãos  de  segurança  nos  aeroportos;  as  normas  que  regulam  o relacionamento  entre  passageiros  e  tripulações  nos  vôos  comerciais;  a  fiscalização  exercida  pelos  órgãos  de  controle  de migração e receita nos portos, aeroportos e fronteiras; a segurança instalada na proteção aos serviços públicos essenciais, bem como o patrulhamento das principais vias de transporte e comunicações, todas estão no contexto do antiterrorismo. As operações desencadeadas por elementos especializados visando a captura de integrantes das organizações terroristas, bem como aquelas efetuadas para liberar instalações ou reféns que venham a cair sob o controle dessas organizações, estão no contexto do contraterrorismo24. Ao  tratar  do  assunto,  Antônio  Lara  assevera  que  compreende  o  universo  do  contraterrorismo,  em  primeiro  lugar,  a prevenção. Em segundo, aparece a preparação e a informação da sociedade sobre e para o terrorismo, dando a conhecer o conjunto de medidas difíceis e de popularidade duvidosa. Em terceiro, surge a repressão e punição do próprio terrorismo. Todavia, várias polêmicas tem surgido em torno de um novo contrato social, ou seja, de um novo equilíbrio, que é preciso aceitar  e  determinar,  a  estabelecer  entre  os  direitos  fundamentais  do  cidadão  (direitos,  liberdades  e  garantias  clássicas atribuídas pelas democracias pluralistas e liberais), e, por outro lado, as necessidades da segurança coletiva nas quais fica compreendida a segurança do próprio indivíduo.

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O combate ao terrorismo e sua crise contemporânea ­ Jus Navigandi

Em  síntese,  a  segurança  coletiva  possível  se  sobrepõe  à  esfera  privada  de  cada  indivíduo.  Interfere­se  na  liberdade  dos cidadãos, afeta­se negativamente e, de fato, a uma parte de seus direitos, objetiva a proteção de outra parte.O resultado de toda esta reação acaba por dar um efeito colateral, ou seja, os poderes públicos terão, por força destas necessidades, cada vez maior ingerência e tutela sobre as vidas individuais dos cidadãos25.

OS MOTIVOS DO TERRORISMO Danilo Zollo, em seu texto "Le ragione del terrorismo internazionalle"26, traz questionamentos sobre quais são os motivos do terrorismo internacional. Dentre várias, Zollo se fixa na seguinte questão: Quais são as razões do terrorismo? Só então, depois de  responder  a  essa  pergunta,  é  que  se  poderá  responder  as  outras  questões,  como  a  de  como  combater  e  derrotar  o terrorismo. Segundo Danilo Zollo, atualmente o terrorismo tem conseguido organizar­se de tal forma a ponto de ser considerado uma ameaça para o mundo inteiro e não apenas para o Ocidente. Zollo diz que "se é verdade que o mundo árabe­islâmico é hoje a sede do terrorismo, é fácil provar que não existe uma única organização  terrorista  mundial  ­  Al  Qaeda  ­  e  que  o  terrorismo  não  é  um  problema  exclusivo  para  o  chamado fundamentalismo  islâmico".  Na  realidade,  há  apenas  um  terrorismo,  mas  existem  muitas  pessoas  que  se  expressam  em diferentes formas e em diferentes contextos. Nesse sentido exemplifica que os "Tigres Tamil", no Sri Lanka, estão lutando, recorrendo sistematicamente ao terrorismo para a Libertação do Tamil Eelam e não têm qualquer relação com o mundo islâmico. Segundo Danilo Zollo, apesar das doze convenções internacionais que tentaram ditar regras sobre o terrorismo, a cognição e incerteza regulamentar é generalizada. Na ausência de uma definição compartilhada e vinculativa de terrorismo, a doutrina internacional prevalente em países ocidentais considera um ato terrorista ­ e uma organização terrorista ­ caracterizado pela violência  indiscriminada  contra  civis  com  a  intenção  de  espalhar  pânico  e  para  coagir  um  governo  ou  uma  política internacional.  Dessa  forma,  os  terroristas  são  sempre  e  apenas  os  membros  de  organizações  privadas,  trabalhando ilegalmente, e não os militares colocados nos exércitos nacionais e os seus superiores hierárquicos. Zollo se ressente de que membros do exército e os seus equipamentos militares nunca são tratados como criminosos nem como organizações terroristas. Qualquer medida tomada por eles ­ mesmo as mais violentas, destrutivas e prejudiciais para a vida e bens de civis inocentes ­ não é considerada terrorismo. Mostra que o povo palestino sob ocupação militar é acusado de ser  o  berço  do  terrorismo  islâmico,  especialmente  suicida.  Todavia,  se  esquecem  de  que  os  primeiros  atos  terroristas  na Palestina foram praticadas por organizações judaicas, como a banda Stern, liderados por Yitzhak Shamir. Para  Danilo  Zollo,  por  outro  lado,  os  ataques  contra  a  população  israelita  a  partir  dos  militantes  do  Hamas  e  outras organizações  radicais  são  qualificados  e  universalmente  estigmatizados  como  terroristas.  Ao  mesmo  tempo,  o  exército israelita realiza devastadoras operações, violando inúmeras resoluções do Conselho de Segurança da ONU na ocupação de territórios  palestinos,  cometendo,  inclusive,  violações  do  direito  da  guerra  (ou  do  direito  humanitário).  E  isto  acontece mesmo quando indiscriminadamente afeta civis, como é o caso dos chamados "assassinatos orientados" que, além de ilegais em si, muitas vezes provocam a morte ou mutilação de pessoas inocentes. O  autor  assevera  que  esses  tipos  de  violação  do  direito  internacional  continuam  inteiramente  impunes:  o  Tribunal  Penal Internacional  não  tem  competência  sobre  o  Estado  que  não  tenha  aderido  ao  Tratado  de  Roma,  de  1998.  É  o  caso,  por exemplo,  dos  Estados  Unidos  e  Israel.  Para  Danilo  Zollo,  as  operações  militares  que  inevitavelmente  produziram  o extermínio  de  civis  inocentes  (como  os  "atentados  terroristas  perpetrados"  em  cidades  alemãs,  os  massacres  atômicos  de Hiroshima e Nagasaki, a Guerra do Golfo de 1991, a guerra do Kosovo, os ataques no Afeganistão e no Iraque) devem ser consideradas  como  "terroristas"  e,  portanto,  proibidas  pelo  direito  internacional,  independentemente  da  sua  justificação inicial, uma suposta justa causa. Mesmo que estas guerras contra terroristas sejam "legitimadas" por resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas, tal como aconteceu com a Guerra do Golfo de 1991, tais guerras devem ser consideradas como ações terroristas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS De  início  fica  claro,  no  presente  trabalho,  que  a  ausência  de  uma  definição  de  terrorismo  tem  prejudicado consideravelmente as ações para combatê­lo. E devido a isto, o terrorismo, que não é um fenômeno novo, modernizou­se e tornou­se mais ousado quanto ao seu propósito de criar pânico nas populações mundiais, que não se sentem seguras em lugar algum. Percebe­se  que  o  contraterrorismo  tem  sido  ineficaz  e  que,  ao  invés  de  proteger  as  pessoas,  tem  subtraído  dos  cidadãos direitos antes consagrados. Ressalte­se que o terrorismo é usado na luta do fraco contra o mais forte como ultima alternativa para a solução dos seus problemas, mas não deve ser usado como desculpa para uma reação contra a opressão, qualquer que seja a sua forma, sobretudo porque faz uso da violência contra inocentes, demonstrando profundo desprezo pelas vítimas, negando­lhes a humanidade.

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O combate ao terrorismo e sua crise contemporânea ­ Jus Navigandi

Da mesma forma, é injustificável que Estados usem o terrorismo como estratégia contra seus cidadãos, contra populações civis de outros Estados ou facções. Ponto importante a considerar é que não se podem ter dois pesos e duas medidas quanto ao terrorismo, como ocorre em relação a Israel e à Palestina. Creio  que  a  melhor  forma  de  combater  o  terrorismo  é  substituir  a  confrontação  armada  pelo  diálogo,  dando  ouvidos  às reivindicações  de  grupos  marginalizados  ou  minoritários,  buscando­se  soluções  que  conciliem  os  interesses  em  jogo,  a exemplo do que ocorreu entre o Governo Britânico e o Exército Republicano Irlandês (IRA). Acredito também, plenamente, que o atual estado de coisas pode mudar, quando os homens compreenderem que a vida é o nosso bem maior e que todos somos irmãos diante de Deus. Quando o homem se conscientizar de que o egoísmo é o nosso pior inimigo  e  que  é  preciso  cultivar  o  amor  fraternal  pregado  por  Jesus,  certamente  todos  respeitarão  o  direito  à  vida, independente  de  raça,  credo  ou  condição  social.  Quando  o  homem  verdadeiramente  se  civilizar,  cultivando  os  bons sentimentos no coração, e o progresso moral acompanhar o desenvolvimento tecnológico, o mundo sem dúvida será melhor, sem violência, sem terrorismo, sem guerras. E a tão sonhada paz predominará em todo o nosso planeta.

REFERÊNCIAS BESSA,  João  Manuel  de  Andrade  Pinto,  As  Nações  Unidas  e  o  Terrorismo,  disponível  em:< http://www.revistamilitar.pt/modules/articles/article.php?id=159> Acesso em 15 jun.2009 BONIFACE, Pascal. Guerras do Amanhã. Portugal: Editorial Inquérito, 2003. DINIZ,  Eugenio.  Compreendendo  o  Fenômeno  do  Terrorismo.  Disponível  http://www.scribd.com/doc/7259139/Diniz­do­o­Fenomeno­Do­Terrorismo.> Acesso em 15 jun.2009

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LARA, Antônio de Sousa. O Terrorismo e a Ideologia do Ocidente. Coimbra: Almedina, 2007. PINHEIRO,  Álvaro  de  Souza.  O  COMBATE  AO  TERRORISMO,  http://www.defesanet.com.br/noticia/terrorismo.htm>. Acesso em 15 jun.2009

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SILVA, Gustavo Pamplona.Terrorismo, Crime Político e Extradição – Pensando Globalmente os Direitos Humanos e Analisando  Criticamente  a  Jurisprudência  Local.  Disponível  em  :< http://www.conpedi.org/manaus/arquivos/anais/bh/gustavo_pamplona_silva.pdf> Acesso em 15 jun.2009 ZOLLO,  Danilo.  Le  ragione  del  terrorismo  internazionalle,  http://www.cetede.org/IMG/pdf/Ponencia_DZolo.pdf>. Acesso em 15 jun.2009

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WELLAUSEN,  Saly  da  Silva.  Terrorismo  e  os  atentados  de  11  de  setembro,  disponível  em:< http://www.scielo.br/pdf/ts/v14n2/v14n2a05.pdf> Acesso em 15 jun.2009

NOTAS 1.  Gustavo Pamplona Silva ‫כ‬ Terrorismo, Crime Político e Extradição – Pensando Globalmente os Direitos Humanos e Analisando Criticamente a Jurisprudência Local. Disponível em : http://www.conpedi.org/manaus/arquivos/anais/bh/gustavo_pamplona_silva.pdf 2.  Eugenio Diniz, Compreendendo o Fenômeno do Terrorismo. Disponível em http://www.scribd.com/doc/7259139/Diniz­do­o­Fenomeno­Do­Terrorismo. 3.  Saly da Silva Wellausen, Terrorismo e os atentados de 11 de setembro, disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ts/v14n2/v14n2a05.pdf 4.  Cf. Diniz, op.cit. 5.  Antonio de Sousa Lara, O Terrorismo e a Ideologia do Ocidente, ed. Almedina, Coimbra, 2007, p.43 6.  Danilo Zollo, Le ragione del terrorismo internazionalle, disponível em http://www.cetede.org/IMG/pdf/Ponencia_DZolo.pdf (http://www.cetede.org/IMG/pdf/Ponencia_DZolo.pdf) 7.  Cf. Pascal Boniface* Guerras do Amanhã, editora inquérito,Portugal, 2002, p.17 8.  João Manuel de Andrade Pinto Bessa, As Nações Unidas e o Terrorismo, disponível em http://www.revistamilitar.pt/modules/articles/article.php?id=159 (http://www.revistamilitar.pt/modules/articles/article.php?id=159)

9.  FBI: Federal Bureau of Investigation 10.  Boniface, op.cit., p.18 11.  Bessa, op. cit., p.2 12.  Ibid 13.  Boniface,op.cit. p17 14.  Eixo do mal foi uma designação utilizada pelo presidente dos EUA, George W. Bush, no seu Discurso do Estado da União de 29 de Janeiro de 2002, para se referir a países contrários aos EUA que ele diz terem programas nucleares. 15.  Lara, op. cit., p. 44 16.  Lara, op. cit., p. 45

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O combate ao terrorismo e sua crise contemporânea ­ Jus Navigandi

17.  O super­terrorismo é uma nova designação criada pela obra com o mesmo nome da autoria de Yonah Alexander e Milton Hoenig (edição de Transnacional Publishers, Nova Iorque, primeira edição 2001). 18.  Lara, op. cit., p. 46 19.  Ibid 20.  Ibid 21.  Ibid 22.  Lara, op. cit., p. 47,48 23.  Wellausen, op.cit. 24.  Cf. Alvaro de Souza Pinheiro, O combate ao terrorismo, disponível em : http://www.defesanet.com.br/noticia/terrorismo.htm 25.  Lara, op. cit., p. 57, 59 26.  Zollo, op.cit.

Autor José de Ribamar Lima da Fonseca Júnior Advogado, Investigador do Centro de Investigação Interdisciplinar em Direitos Humanos da Universidade do Minho. Doutorando em Ciência Jurídicas, UMINHO­Portugal, Especialista e  Mestre  em  Direitos  Humanos  pela  Universidade  do  Minho­Portugal  e,  Especialista  em Direito Civil e Processual Civil, UCDB, Bolsista da CAPES. Site(s): ribamarfonsecajunior.wordpress.com/

Informações sobre o texto Como citar este texto (NBR 6023:2002 ABNT) FONSECA  JÚNIOR,  José  de  Ribamar  Lima  da.  O  combate  ao  terrorismo  e  sua  crise  contemporânea.  Revista  Jus Navigandi, Teresina, ano 14, n. 2313, 31 out. 2009. Disponível em: . Acesso em: 23 jan. 2016.

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