O conceito de hiperespaço na composição de \" Estudos Texturais para Quarteto de Cordas Nº 01 \"

May 26, 2017 | Autor: Wander Vieira | Categoria: Musical Composition, Algorithmic Composition, Parametric Modeling
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XXII Congresso da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Música – João Pessoa – 2012

O conceito de hiperespaço na composição de “Estudos Texturais para Quarteto de Cordas Nº 01” Wander Vieira Rodrigues [email protected] Jônatas A. Manzolli UNICAMP - [email protected] Resumo: O presente projeto pretende realizar um estudo sobre heurística e formalização do processo criativo de música textural. Discutem-se os fundamentos metodológicos que enfocam a utilização de um espaço multidimensional ou hiperespaço e a noção de projeção geométrica para a representação de eventos musicais. O artigo apresenta um projeto piloto no qual verificam-se os primeiros passos da pesquisa que contemplará: a) a construção de gestos composicionais relacionados com estruturas matemáticas denominadas de functores e b) a conexão entre o modelo matemático e o processo de composição musical. Palavras-chave: Composição, Formalização, Matemática, Hiperespaço, Geometria espacial.

The concept of hyperspace in the composition of the “Textural Etude for String Quartet No. 1”. Abstract: This project aims to conduct a study on heuristic and formalization of creative process in textural music. We discuss the methodological foundations focusing on a multidimensional space or hyperspace and the notion of geometrical projection for representing musical events. The article presents a pilot project in which there are the first steps of research, they are: a) construction of compositional gestures related to mathematical structures called functors b) connection between the mathematical model and the process of musical composition. Keywords: Composition, Formalization, Mathematic, Hyperspace, 3D Geometry.

1. Introdução. O interesse na aplicação de métodos matemáticos em composição reporta várias abordagens que variam desde o formalismo composicional de Xenakis (1971), a utilização de métodos seriais por Babbitt (2003), a noção de computação musical de Roads (1985), estruturas algébricas de Klouche e Noll (2009) e Manzolli e Maia Jr. (1998). O uso da geometria reporta Xenakis (1971) quando ele afirma que ele representou o som por dois novos métodos: algebricamente, por uma coleção de números, e geometricamente (ou graficamente por esboços). Em particular, a ideia do presente artigo reside na reflexão e no desenvolvimento de uma heurística e procedimento formal para a criação musical utilizando-se da noção espaço multidimensional e de estruturas geométricas para visualização e planejamento de processos de escritura musical. Para tal, determinamos os primeiros parâmetros do método num projeto piloto que parte de uma composição para quarteto de cordas: Estudo Textural para Quarteto de Cordas Nº 1.

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Entendemos que esse projeto piloto será enriquecedor para refletirmos sobre a eficácia do método utilizado. Vislumbramos a possibilidade de criação de Modelos que serão úteis no processo de análise e criação e que têm o potencial de ampliar a linguagem composicional. O foco do presente estudo está nos mecanismos de orquestração, que servirá, também, de referência para leitores que se interessam por composição textural. O estudo aqui reportado, que é a etapa inicial de uma pesquisa de doutorado, tem bases no trabalho de dissertação de mestrado, orientada pelo Prof. Dr. J. Orlando Alves e com co-orientação do Prof. Dr. Antônio Joaquim Rodrigues Feitosa, Coordenador do Curso de Matemática da UFPB, intitulado: Aspectos da Aplicação da Geometria Plana Analítica como Elemento de Formalização na Composição Musical. Nesse trabalho, focou-se a manipulação dos processos texturais e organização do discurso musical no plano bidimensional e na determinação prévia do comportamento do parâmetro “densidade 1” teorizado por Berry (1987). Nas próximas seções faremos uma breve recapitulação do conceito de formalização aplicado à composição e, em seguida, descreveremos os procedimentos do Estudo Texturais para Quartetos de Cordas Nº 1. Assim teremos o Ponto de Partida, a Noção de Hiperespaço, Modelos do Estudo Nº 1, Discussão e Conclusão. 2. Ponto de Partida. Alguns autores como Roads (1985, p. 822-825) apresentam uma breve história da utilização de processos formais a partir do séc. XIV até o séc. XX, desde a criação do método dos cantus firmus por Guido D’Arezzo até os procedimentos musicais utilizados por Babbitt (2003), Xenakis (1971), entre outros. Já do ponto de vista da geometria, Bertrand (1965) relata a ideia de Descartes em formular uma Teoria do Som a partir de modelos geométricos, mas o uso do processo de projeção é aplicado como metáfora de um processo quantitativo que determinará outro qualitativo. Em trabalho recente, Shellard (2010) discute o conceito de processo composicional da Escola de Nova Iorque e destaca compositores como Morton Feldman e Earle Braun que utilizaram processos relacionados às artes plásticas para criar partituras gráficas. Todavia, esses criadores aplicaram procedimentos sob uma abordagem de relação casual baseada na espontaneidade. Ou seja, em um caráter mais improvisatório e não no sentido de estabelecer relações sistêmicas visando à elaboração de um modelo formal. 1

Berry (1987) define a densidade como o aspecto quantitativo da textura e divide-a em compressão e número, respectivamente associados ao número de alturas ocorrendo no evento e a proximidade dessas alturas nesse evento.

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A partir dessas considerações, nossa pesquisa prevê dois procedimentos básicos: 1) dispor estruturas musicais num espaço multidimensional ou hiperespaço e 2) projetá-los no espaço tridimensional de combinações de parâmetros do hiperespaço com o objetivo de visualizar as projeções dessas estruturas que foram arquitetadas em dimensões maiores. Desta forma, o objetivo é trabalhar numa dimensão abstrata e depois criar projeções tridimensionais que auxiliarão a visualização dessas estruturas e que servirão de suporte para a imaginação criativa do compositor. Posteriormente, partindo das projeções, o nosso objetivo principal é estudar e desenvolver procedimentos de evolução temporal dos objetos construídos, ou seja, além da construção geométrica objetiva-se a produção de um modelo de sistema dinâmico, a saber. “Um sistema dinâmico é um sistema formal que possui algum tipo de evolução temporal, isto é, que muda seu estado em relação a um parâmetro que representa a variação do tempo.” Manzolli e Maria Jr. (2010).

Ao vislumbrar a interação entre geometria e sistemas dinâmicos, a proposta de pesquisa aqui reportada tem suas raízes no estudo da Teoria dos Sistemas de Bertalanffy (2008) e ela está também fundamentada na ampliação da capacidade do compositor de visualizar e avaliar melhor a viabilidade dos materiais sonoros que podem ser manipulados através de projeções geométricas. 3. Noção de Hiperespaço. Segundo Kaku (1994), uma possível Teoria sobre o Hiperespaço foi elaborada pelo físico alemão Theodor Kaluza. Nela, as possibilidades do espaço físico não estão dispostas apenas em três dimensões, na realidade nós apenas conseguimos visualizá-lo em três dimensões relacionadas a altura, largura e profundidade e isto é representado no plano cartesiano pelos eixos x, y e z. Kaku (1994) afirma que Albert Einstein vislumbrou a possibilidade da adição de uma quarta dimensão: o tempo onde qualquer fenômeno físico ocorre. Este autor menciona ainda que a possibilidade de visualização de um espaço multidimensional só seria possível com o Computador de Banchoff através da geração de sombras das estruturas produzidas no Hiperespaço. Para tal, vale salientar que a noção de sombra nada mais é que o uso de projeções nas quais a redução de dimensionalidade possibilita a visualização do comportamento de uma estrutura que se encontra em dimensões maiores. E é esta a nossa intenção ao utilizarmos as projeções tridimensionais.

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4. Modelo do Estudo Nº 1. No projeto do Estudo Nº 1, partimos de um espaço tridimensional construído com três parâmetros: número de alturas, a duração e, nesse caso inicial, a intensidade sonora através da dinâmica musical. Com isto podemos construir estruturas para visualizar processos de escritura e análise sobre o ponto de vista geométrico, como vimos acima. Mas, futuramente, quando adicionarmos toda gama de sutilezas e nuances relacionadas à altura, duração, dinâmica, timbre, articulação entre outros, verdadeiramente estaremos tratando com um espaço multidimensional. Sob esse ponto de vista, podemos afirmar que o fenômeno musical acontece num espaço multidimensional e que a concepção de um compositor também é multidimensional. Poderíamos supor que há um hiperespaço no qual os processos mentais do compositor opera. Xenakis (1977) faz uma citação dessa capacidade na introdução de seu livro “Formalized Music”. No caso do estudo aqui reportado, a ideia é iniciar a partir da formulação de Agregados Sonoros 2 usando o espaço multidimensional. Há diversas configurações em função dos parâmetros altura, duração e dinâmica construídos sobre três eixos “x”, “y” e “z”. Visualizamos os agregados como um “corpo” com várias formas diferentes e detentor de uma “plasticidade”. Utilizaremos duas representações geométricas para o planejamento dos primeiros momentos do “Estudo Textural para Quarteto de Cordas Nº 1”. A vista em perspectiva da estrutura tri-dimensional que utilizaremos encontra-se na Figura 1.

Figura 1: representação das alturas e da duração no plano cartesiano em três dimensões. Relação eixos x, y e 3 z: (1, 4, 5); (2, 4, 5); (3, 4, 5); (4, 4, 5); (5, 4, 5)... (11, 4, 5). 2

O conceito de agregados sonoros pode ser observado em Wander (2010) onde ele cita que os agregados são moldados através da defasagem nas entradas instrumentais ou vocais e que, de acordo com Cope (1993), “as massas sonoras minimizam a ênfase em notas individuais enquanto maximizam a importância da textura, do ritmo, da dinâmica, do timbre e de gestos amplos” que se relaciona também com a técnica dos clusters. 3 Mantivemos o eixo “z” constante para uma representação inicial que enfatiza os eixos “x” e “y” da figura 3D.

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Na Figura 1, o “y”, eixo vertical, representa a quantidade de alturas disponíveis para manipulação do compositor dentro de um agregado, e o eixo “x”, horizontal, a duração, que, em nosso ponto inicial tomamos como unidade a semínima. A partir desta representação podemos analisar: 1) o comportamento das alturas no período planejado que trata apenas do aspecto quantitativo. O qualitativo, como seu espaçamento, ou utilizando-se do principio elaborado de Berry (1987), a sua densidade e a sua movimentação na gama sonora musical, ainda não estão presentes no modelo; 2) a duração, onde a multiplicação desses elementos ou seu fracionamento, como em colcheias, semicolcheias etc., e por consequência sua combinação para gerar uma estrutura rítmica, seja ela simples ou complexa, também não estão presentes no espaço acima representado. Isso gera uma multiplicidade de elementos que não estão representadas nesse planejamento e isso enfatiza mais uma vez a ideia de que a construção de estruturas musicais relaciona-se a um espaço multidimensional. Sem ainda parte das respostas para os dois aspectos discutidos no parágrafo anterior, vejamos essa outra projeção na qual planejamos a interação da duração com a dinâmica. Como anteriormente, a duração está associada ao eixo “x”, horizontal, como apresentado na Figura 1. O eixo agora projetado como “z”, é associado à dinâmica.

Figura 2: a representação das dinâmicas e da duração no plano cartesiano em três dimensões gera uma forma em zig zag.

Nessa figura temos os valores do eixo vertical “z” definidos por uma relação de conjunto através da representação das dinâmicas, ou seja:

Figura 3: relação entre as unidades do eixo “z” e os símbolos de representação de dinâmica na música.

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Nesse caso teremos, para x e z: (1, 5); (2, 4); (3, 3); (4, 2); (5, 1); (6, 3); (7, 5); (8, 7); (9, 4); (10, 3) e (11, 2). Há uma indefinição na relação entre os pontos “z” e “x” e a figura 3D, pois temos a equação que gerou a mesma através da disposição dos pontos mas precisamos de mais tempo na pesquisa para poder controlar essa equação. 4 Dessa forma, podemos representar a interação entre as Figura 1 e Figura 2 numa estrutura tridimensional:

Figura 4: gráfico em 3D mostrando o comportamento dos parâmetros musicais tratados nas três dimensões.

Esse objeto tridimensional gerará a estrutura musical disposta na seguinte partitura:

Figura 5: realização musical do planejamento geométrico das alturas, duração e dinâmica.

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O software usado para gerar as figuras foi o Grapher que se encontra entre as ferramentas de trabalho nos computadores iMac e MacBook.

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5. Discussão. Aqui fica bem claro que os elementos altura, duração e dinâmica poderão ser associados a outros parâmetros, diferentes dos que foram inicialmente planejados. Na realidade essas novas possibilidades estão implicitamente associadas aos elementos descritos acima, o que indica o caráter multidimensional no processo de composição. Assim, no intuito de preencher essa lacuna, na tentativa de construção de um procedimento composicional num espaço multidimensional, utilizaremos ferramentas que nos favoreçam a compreensão da multidimensionalidade para um futuro estabelecimento de um Modelo. Para isso vislumbramos a possibilidade da utilização de ferramentas matemáticas como functores, morfismos, categorias entre outros como descrito em Manzolli e Maia Jr. (1998) e Klouche e Noll (2009). Isso implica em um estudo aprofundado para resolução dessas novas possibilidades. Remete-nos a estágios posteriores da pesquisa que no presente artigo torna-se inviável o seu aprofundamento. 6. Conclusão. O presente trabalho demonstrou como ocorreu a concepção inicial do processo de formalização associado ao planejamento composicional partindo do hiperespaço e da representação geométrica em três dimensões, aplicado na peça Estudos Texturais para Quarteto de Cordas Nº1. No referido processo estabeleceu-se três parâmetros de forma consistente e permitiu-se a visualização de que uma série de outros elementos musicais que estão agindo simultaneamente e durante todo processo. Isso demonstrou que há um espaço multidimensional, ou hiperespaço, no qual pode-se projetar o planejamento de agregados sonoros de forma mais eficaz. Desta forma, acreditamos que a presente pesquisa tem elementos suficientes para que se faça um aprofundamento, não só pela sua importância para o estudo da composição de música textural como para a formalização dos métodos de escritura propostos. As projeções futuras da pesquisa direcionam o trabalho para a busca da categorização, morfismo e, finalmente, o estabelecimento de functores para que o procedimento seja plenamente concebido.

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