O jogo como ferramenta no desenvolver cognitivo, psicomotor, afetivo e social de crianças e adolescentes a luz de autores clássicos

May 29, 2017 | Autor: Rodrigo S. Perfeito | Categoria: Jogos, Educação Física Escolar, O Desenvolvimento Cognitivo E Motor
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ARTIGO ORIGINAL

Rodrigo Silva Perfeito1

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O jogo como ferramenta no desenvolver cognitivo, psicomotor, afetivo e social de crianças e adolescentes à luz de autores clássicos The game as a tool in developing the cognitive, psychomotor, affective and social of children and adolescents in the light of classical authors

> RESUMO Objetivo: Sugerir o jogar como alternativa que irá afetar positivamente o desenvolvimento global de crianças e adolescentes, tendo em vista que a estimulação corporal e cognitiva, através de jogos, tem vital importância para o desenvolvimento global de crianças e adolescentes, influenciando em diversos aspectos, como: habilidades psicomotoras, coordenação, relação/espaço temporal, visão periférica, equilíbrio físico e manutenção da saúde. Métodos: Trata-se de uma pesquisa qualitativa analítica, em que são utilizados autores clássicos para discorrer sobre os benefícios do jogo para o grupo em questão. Conclusão: Por fim, é possível concluir que os jogos, quando bem planejados, podem estimular a integração dos aspectos sociais, afetivos e motores destes indivíduos.

> PALAVRAS-CHAVE Jogos e brinquedos, desenvolvimento do adolescente, educação física e treinamento.

> ABSTRACT Objetive:฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ adolescents, having in mind that body and cognitive stimulation, through games, has vital importance for the overall development of children and adolescents, influencing in several aspects, such as: psychomotor skills, coordination, relation/ temporal space, peripheral vision, physical balance and maintenance of health. Methods: This is a qualitative analysis, in ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀Conclusion: Finally, it is ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ of these individuals.

> KEY WORDS Play and playthings, adolescent development, physical education and training.

1 Mestrando em Ciências da Atividade Física pela Universidade Salgado de Oliveira (UNIVERSO). Especialista em Educação Física Escolar (UERJ). Fundador e Diretor do Instituto de Pilates, Fisioterapia e Educação Fisart. Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

Suporte Financeiro: Financiado pelo Instituto de Pilates, Fisioterapia e Educação Fisart -www.fisart.com.br Rodrigo Silva Perfeito ([email protected]) - Estrada Adhemar Bebiano, 4595, casa 91, Engenho da Rainha - Rio de Janeiro, RJ, Brasil. CEP: 20765-171. Recebido em 23/01/2013 – Aprovado em 30/07/2013

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> INTRODUÇÃO A estimulação corporal e cognitiva, através de jogos, tem vital importância para o desenvolvimento global de crianças e adolescentes, influenciando em diversos aspectos, como: habilidades psicomotoras, coordenação, relação/ espaço temporal, visão periférica, equilíbrio físico e manutenção da saúde. Em primeiro lugar, é importante expor o que é autor clássico, já que vários serão utilizados neste trabalho. Segundo Murad1, clássico é tudo aquilo que foi importante para sua época e, após anos, continua sendo relevante e atual aos pensamentos contemporâneos. Para incidir uma aprendizagem significativa, o processo educacional deve advir por meio da progressão pedagógica, evoluindo até alcançar atividades mais complexas. Uma forma de estimular esse desenvolvimento progressivo é por meio da expressão motora, que permite diferentes níveis de complexidade. Assim, desde seus primeiros anos de vida, o indivíduo deve ser excitado a se autorreconhecer e a reconhecer o seu ambiente por movimentos proporcionados pelo jogar. Por exemplo, a utilização da pegada com as mãos em algum material do jogo pode refletir em maior habilidade com a escrita. Portanto, além de estímulos ocorridos em ambiente familiar, é de grande valia que o professor de Educação Física utilize jogos diversificados que introduzam valências psicomotoras, cognitivas, afetivas e sociais, auxiliando no desenvolvimento global do aluno. A atividade bem orientada permite, também, que o mesmo possa ultrapassar e entender suas próprias dificuldades. Porém, a atividade desconstituída de estrutura pedagógica não trará resultados satisfatórios. Deve-se pensar, por exemplo, nas classificações comportamentais típicas de crianças em conflito, que serão abordadas com maior propriedade à frente, desenvolvidas por Reinert2, que são: o comportamento de “acting-out”, comportamento de afastamento, comportamentos defensivos e comportamentos desorganizados, auxiliando Adolesc. Saude, Rio de Janeiro, v. 10, supl. 3, p. 7-15, outubro 2013

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na compreensão de algumas atitudes empregadas pelos adolescentes e crianças. Realizando uma busca simples pelos principais bancos de dados de artigos, é possível observar que um dos assuntos mais discutidos sobre o grupo em questão é a epidemia mundial de obesidade dos jovens adolescentes3,4,5,6,7. São criados diversos programas sociais e educacionais que utilizam o jogo para minimizar seus danos à saúde. Esta abordagem trabalhará, não com os aspectos de promoção da saúde, mesmo sabendo que são fundamentais para o desenvolvimento do adolescente, mas sim com questões pedagógicas e de cunho simbólico, que irão ajudar a contextualizar o indivíduo diante da trama do jogar. Simbólico para Cassirer8 é tudo aquilo que permite pensar na representação do ser humano embasado. não somente na racionalidade, mas também na ideia de que o Homem é condicionado por comportamentos, ideais, emoções, pensamentos e ações moldados pela essência simbólica, que é inerente à vivência de cada um. Relata, ainda, que a evolução do processo cultural humano está diretamente ligada à construção da vida através dos símbolos. Para tanto, o objetivo deste artigo se distingue, pois visa sugerir o jogar como alternativa que irá afetar positivamente o desenvolvimento global de adolescentes e crianças. É importante que o docente compreenda que suas atividades devem impulsionar, também, sentimentos positivos sobre a imagem corporal, tema muito discutido, principalmente em adolescentes que sofrem perturbações emocionais, como o bullying. Diante de pesquisas de Auxter et al.9, foram constatadas influências favoráveis, por meio de atividades físicas bem elaboradas, onde o autoconceito de pessoas cognitivamente atrasadas foi afetado positivamente. Agregando as inserções de Vygotsky10 e pensando em nossa cultura popular, é sugestivo afirmar que o jogo é importante ferramenta de conhecimento de vida e de manifestação da cultura. No momento atual, estamos consumidos pela manifestação de globalidade, na qual crianças Adolescência & Saúde

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e adolescentes permanecem restritas a estímulos tecnológicos, predominantemente estáticos, perspectivados apenas em ambiente residencial. Assim, faz-se de suma importância alertar para a importância de atividades lúdicas e estímulos motores propiciando a experimentação de diferentes esferas da vida pelo palpar do jogo. Tal pesquisa justifica-se por tratar de um tema estudado abundantemente pelo autor, sendo de seu contentamento a continuidade das reflexões já publicadas e por possuir fácil construção do estudo da arte, devido ao acúmulo de livros e de trabalhos salvos em biblioteca pessoal ao longo dos anos. É relevante, pois resultará numa publicação que auxiliará nas discussões em torno do jogo como elemento simbólico que auxilia no desenvolvimento global de indivíduos, decorrendo em mais uma possibilidade de fonte científica, além de sugerir e revelar estudos importantes para solidificar a atuação profissional do professor de Educação Física Escolar, auxiliando no tão sonhado objetivo de formar cidadãos.

> MÉTODOS Trata-se de uma pesquisa qualitativa analítica, aquela que utiliza informações para tentar explicar e sugerir aplicações em fenômenos complexos11, construída com auxílio de artigos científicos e, em maior abundância, livros nacionais e internacionais clássicos sobre a temática, publicados entre os anos de 1941 e 1989, com algumas exceções, com o intuito de retratar como é entendido o desenvolvimento infantil através de jogos e ludicidade. Após seleção, o material foi fichado e selecionado a fim de melhor representar o corpo referencial. Diante de autores clássicos, foram adotadas algumas obras nas línguas francesa e inglesa, respeitando as escrituras originais e evitando transcrições errôneas. Por último, em presença de todo o material, os conteúdos foram conflitados e selecionados para construção do presente estudo.

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Os jogos e o desenvolvimento psicomotor de crianças e adolescentes Ao ser estimulado o corpo, é possível desenvolver o sistema nervoso central (SNC), que, por sua vez, é responsável pela coordenação, comunicação entre os sistemas e suporte às funções cognitivas. Portanto, a imagem corporal de um bebê amadurece aos poucos, na medida em que o mesmo experimenta estímulos do ambiente, como o toque, a exploração do espaço, a manipulação e contato com objetos e suas cores. Inicialmente, a pessoa não consegue separar e distinguir seu corpo dos demais corpos animados ou inanimados. Gradativamente, ao se maturar, crescer e desenvolver, compreende que seus movimentos são diferenciados dos demais objetos12. Assumindo a importância da estimulação corporal para o desenvolvimento global do indivíduo, é necessário explanar também sobre as habilidades psicomotoras, que incluem: a resistência à fadiga, a visão periférica, o equilíbrio físico, a destreza manual e digital, a coordenação mãos e olhos, entre outras. A escrita é, enquanto conjunto dos movimentos coordenados, excelente exemplo destes aspectos. Desta forma, valências psicomotoras do comportamento da criança e, posteriormente, do adolescente podem ser condições para o desenvolvimento de determinados aspectos cognitivos. Somados, ambos os estímulos podem ainda, determinar aspectos positivos ou negativos quanto ao desenvolvimento afetivo e social. Da mesma maneira, em caminho inverso, as condições emocionais desfavoráveis podem prejudicar questões referentes ao escopo psicomotor e cognitivo13. Em complemento, uma das maneiras de estimular tais desenvolvimentos citados seria com o jogo: O jogo põe em função, de maneira extremamente variada, todas as possibilidades da pessoa: força muscular, flexibilidade das articulações, resistência ao cansaço, respiração, precisão de gesto, habilidade, rapidez de execução, agilidade, prontidão de resposta, reflexos, equilíbrio, etc14.

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Portanto, o jogo se torna atividade fundamental no desenvolvimento dos jovens e deve ser trabalhado na escola pelo professor de Educação Física. Bandet e Sarazanas15 fizeram várias obser฀ ฀฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ Há relações entre a atividade intelectual e motora que possibilitam a conversa entre uma e a outra. A primeira pode ser considerada decorrente da segunda e a segunda influenciada pela primeira16. No entanto, a maturação é fundamental para que essa quase homogeneização ocorra, sendo pertinente a estimulação motora primeiramente. Isto ocorre, pois, nos primeiros anos da infância, o cérebro apresenta uma viscosidade mental, que torna impossível o funcionamento intelectual autônomo. “Na criança, sem ação motora ou verbal, a ideia necessita de vigor para se formar ou para se manter”17. Assim, a Educação Infantil deveria “fazer agir antes de fazer falar”16. Com o passar dos anos e com tal pensamento aflorado, foi elaborada grande variedade de atividades e jogos para ajudar crianças e adolescentes a desenvolver suas habilidades motoras e afetivas, facilitando a transição para a vida pós-escola. O método objetiva promover autoconfiança e segurança com o auxílio das atividades jogadas18.

Nem sempre a proposta é facilmente transcursada na prática, visto que em uma turma heterogênea existe uma grande dificuldade de se ajustar atividades para as especificidades e capacidades de cada sujeito. O maior problema do desenvolvimento psicomotor para o docente é o de compreender e ajustar a atividade física às capacidades e proporções corporais, afetivas e intelectuais dos discentes19. Assim sendo, a educação psicomotora deve ser pensada em função das dificuldades apresentadas por cada aluno, e não em função dos métodos de ensino existentes20. Se trabalhadas de modo correto, as atividades se apresentam como uma forma de autoconhecimento e de corpo informativo. É no jogo que se revelam os estados cognitivo, visual, auditivo ou tátil-motor; aprender, interagir e entrar numa relação cognitiva com o mundo, eventos, pessoas e símbolos estão unidos ao jogar 21. No início da adolescência, uma pessoa já deve possuir um maior desejo de aprender e se desenvolver. Algumas competências e comportamentos devem se destacar nessa época, como: a motricidade – correr, agir, sentar, saltar –, a atenção – ver, escutar, observar –, a linguagem – contar, falar, expressar –, e a inteligência – analisar, compreender. Muitos jogos realiza-

Quadro 1. Observações versáteis dos jogos. Observações Observação 1

Descrição O jogo tem poder de integração, ampliando o entender de mundo. Propicia ao sujeito ser mais curioso e pronto para intervir diante de problemas. Permite transformar o mundo à sua maneira. Através das descobertas, o corpo humano se torna o primeiro jogo da criança. É um campo

Observação 2

de novos achados. Após desvendar o corpo da mãe, passa a entender seu próprio corpo através de testes no ambiente.

Observação 3

Observação 4

Observação 5

Existem diversos tipos de jogos. Os de ficção são importantes para trabalhar as representações de vida. Jogos de faz de conta são um exemplo. Os jogos de aquisição são importantes para o aprendizado, existindo diversos que se adequam a cada faixa etária. Alguns simulam a aquisição de bens, como na vida fora da atividade. Os jogos de fabricação também possuem papel fundamental na vida social, pois auxiliam na criatividade e no raciocínio estratégico.

Fonte: adaptação dos estudos de Bandet e Sarazanas15.

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dos espontaneamente na infância permitem o desenvolvimento e o alcance de tais objetivos e competências22. Uma educação psicomotora sustentada em pressupostos da prevenção de dificuldades pedagógicas deve atribuir importância à expressão pelo corpo, buscando o desenvolvimento global do estudante. Se o principal papel da escola é o de preparar seus alunos para a vida ou para a sociedade, é preciso que a educação seja sistematizada, empregando diversos, e não somente um, métodos pedagógicos que campeiem ajudar a criança e o adolescente a se desenvolver da melhor maneira possível, contribuindo, dessa forma, para uma adequada formação da vida social12. O jogo é ferramenta exemplar para o dado objetivo. O jogo e o desenvolvimento afetivo-social Existem diversos aspectos emocionais indesejados e identificados como agressores do processo ensino/aprendizagem, como: autoconceito nulo ou de descrédito, ansiedade e conflitos de identidade afetiva. Estas características, se manifestadas, podem representar obstáculos à aprendizagem. Um indivíduo em conflito é aquele cujo comportamento manifesto tem sintoma deleté-

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rio no seu desenvolvimento pessoal ou educacional. As decorrências não desejáveis podem variar consideravelmente de uma pessoa para outra em termos de gravidade e prognóstico2. O autor classificou e destacou alguns dos comportamentos ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ Tal classificação serve apenas como recurso para ajudar a encontrar soluções para o enfrentamento de problemas apresentados e sua identificação. Os conflitos relatados por Reinert2 podem ser associados a questões de identidades sociais, como se poderá presenciar a seguir. ฀ ฀ ฀ ฀ ฀ através de um sinal ou signo de descrédito, recebe informações negativas a todo o momento na sociedade, moldando sua identidade social e virtual, fazendo com que realmente se sinta uma pessoa incapaz e indesejada23. Uma das possíveis estratégias para se modificar o quadro relatado é a educação pelo jogo e o lúdico, já que estes têm o poder de aproximar atividade e realidade ou vida real, proporcionando, diante do divertido, o adentrar no mundo construído por regras e respeito ao outro24. Em complemento, os recursos existentes para auxiliar na resolução de tais problemas podem advir dos jogos terapêuticos e da ludoterapia. O primeiro é a estruturação de atividades

Quadro 2. Comportamentos típicos de adolescentes em conflito. Conflitos

Descrição

Comportamentos

O adolescente passa a mentir, evitar tarefas que acredita ter probabilidade de errar,

defensivos ou de defesa

entre outros.

Comportamentos

Devido à própria insegurança com sua identidade social e corpo, passa a apresentar

desorganizados

características como: desatenção e afastamento da realidade, similar ao autismo.

Comportamento de

Nesse grupo, o indivíduo passa a adotar comportamentos que visam à desordem,

“acting-out”

agressão e atrito, em estabelecimentos ou com os outros. A pessoa regride em seu desenvolvimento motor e intelectual, apresentando atitudes

Comportamento de

como: chupar o dedo, movimentar somente partes do corpo que não podem ser

afastamento

analisadas pelos outros, evitando movimentos amplos e, por fim, deixa de usar a linguagem corporal e oral.

Fonte: adaptação dos estudos de Reinert 2.

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lúdicas de tal forma que se obtém o máximo de benefícios para melhorar a prontidão da pessoa para outros jogos e atividades escolares. Já a ludoterapia é um tratamento lúdico ou divertido, que também pode ser aplicado na escola2. O jogo é moldador do ambiente. A paz fornecida pela atividade solitária, ou em presença de um adulto simpático, ou de outra criança, irradia por algum tempo, pelo fato dos participantes encontrarem no ambiente uma fonte de reconhecimento e de afeto, fatores necessários para a “cura” psicológica. Portanto, o jogo pode ser considerado recurso autoterapêutico de extrema importância25. Nesse aspecto, os jogos empregados na área educacional objetivam promover um melhor equilíbrio emocional dos alunos. Apesar de existirem há anos, somente depois de algum tempo de sua essência foram estudados na vertente do assunto aqui. Após as pesquisas, foi constatado que o método conhecido como educativo-terapêutico consiste em um modo de “tratar” educativamente crianças “difíceis” inseridas no âmbito normal da educação, por meio de conversação, encorajamento, jogos, etc26. Atividades recreativas e físicas, se bem conduzidas, podem influenciar positivamente vários aspectos afetivos e sociais das crianças e adolescentes. Possibilitam, por exemplo, a alteração da imagem corporal do indivíduo com perturbações emocionais. O autoconceito de pessoas mentalmente atrasadas também pode ser afetado positivamente por atividades físicas9. Pela análise do jogo, foi percebido, há muito tempo, que é possível alcançar ganhos pessoais e intrínsecos de alunos. “[...] filósofos de Platão a Sartre notaram que as pessoas são mais humanas, integradas, livres e criativas quando elas jogam”27. O jogo, por meio da manipulação simbólica do ambiente, contribui para desenvolver um ego mais forte naquele que está realmente jogando, ou seja, inserido totalmente na atividade. É possível, ainda, desenvolver a moralidade autônoma28. Assim, quando bem organizado, é

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uma das mais construtivas e úteis experiências para o ser humano. Nas atividades propostas, dependendo da faixa etária, o lúdico inserido no jogo é fundamental para a vida na sociedade29. Em defesa da construção cognitiva alcançada nos jogos perspectivados pelo professor de Educação Física, podemos entender que a imaginação cognitiva não se constitui somente em uma série de combinações possíveis, a partir de elementos e imagens já existentes anteriormente; ou seja, a construção cognitiva depende de estímulos adequados nas faixas etárias recorrentes e não somente da maturação simplesmente ocorrida; pois, se assim fosse, a imagem seria reduzida a outras funções psíquicas, como a memória, e a atividade de imaginar seria apenas o reproduzir ou recordar o passado10. A imaginação cognitiva tem como base a atividade criadora e se manifesta em todas as esferas da vida cultural, permitindo a criação artística e científica, assim como o espírito criativo nas atividades propostas e na vida, como um todo10,30. O poder de simbolizar é o que diferencia o Homem das demais espécies animais. Sua capacidade de imaginação e simbolização lhe possibilita produzir sentidos que articulam sua vivência social e cultural, compondo sistemas de normas, valores e crenças de diferentes sociedades. A imaginação foi por muito tempo relegada pela ciência, que creditava unicamente à razão a primazia da verdade, provocando, assim, a fragmentação constitucional do Homem8,31. Ao observar as formas de imaginação relacionadas com a criatividade, orientadas para a realidade, vemos que a fronteira entre o pensamento realista e a imaginação se apaga, que a imaginação é um momento necessário, inseparável do pensamento realista10. Ao se sustentar o discurso de que os jogos estimulam, além da motricidade, a cognição e a emoção, os mesmos podem ser considerados uma importante fonte de promoção do desenvolvimento. Em etapas da infância, não há limite estruturado entre a realidade e a imaginação.

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Embora relatados com maior abundância os jogos de faz de conta, é sabido que. mesmo naqueles que possuem regras rígidas, a imaginação também é trabalhada, como na criação de estratégias para vencer. A representação, para o jogo ou para vida, possui como base, a atividade de criar e reproduzir seus efeitos de forma cultural, estimulando a criação artística e científica10. Pelo jogo, o discente aprende a operar sua realidade, com significados e sentidos culturais. Por meio de uma situação imaginária, encontra a forma de satisfazer seus desejos imediatos não realizáveis, criando, então, uma área de desenvolvimento proximal, zona essa, responsável por novos aprendizados que ficam subentendidos. Pela atividade, o participante se lança para além de suas capacidades, pois a situação imaginária, fundamento do jogar, impulsiona processos de desenvolvimento31. Num jogo em que é o ator principal ou protagonizador, a criança - ou o adolescente -constrói, por meio de uma situação real/imaginária, seu contexto de vida, e não apenas reproduz a realidade sociocultural na qual está inserida. Isso ocorre, pois manipula simbolicamente seu contexto, expressando e transformando o ambiente em prol da atribuição de sentidos e significados. Portanto, o jogo trabalha a imaginação, criatividade, fantasia, emoções e motivação10. Por fim, estabelecendo que a imaginação possua estreita ligação com as emoções, é importante que o professor entenda o jogo como atividade que constrói por meio da imaginação, cognição, afetividade, cultura, consciência de mundo, entre outros, um imaginário social que o representará como aquele indivíduo, e não como o outro, tornando-o único32.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS A utilização de jogos é vastamente debatida por diversos autores, como os citados neste trabalho, geralmente traçando relações

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entre o emocional, motor e social de indivíduos de diversas faixas etárias. Apesar da temática exaustivamente já debatida, este trabalho se justifica na facilidade em alcançar as referências bibliográficas, e tem sua relevância diante da importância aqui atribuída pelo autor, na possibilidade e necessidade de manipular a atividade, conforme as carências específicas do aluno ou do grupo inseridos nas aulas de Educação Física Escolar, propiciando um melhor desenvolvimento e inserção na sociedade pós-escola. Além disso, quando o docente entende a importância do jogo, pode auxiliar crianças, adolescentes, e até adultos, que possuem distúrbios motores, mentais, emocionais e/ou estresses familiares. Em diferentes regiões do Brasil, foi utilizado o mesmo jogo, ainda que de modo característico, para trabalhar movimentos variados e, com isso, estimular a progressão motora. Além do pensamento motor, muito recorrente nos trabalhos científicos, o professor deve estimular seu aluno através de atividades imaginárias também. Os jogos cantados, por exemplo, podem instigar a integração, aguçando, assim, a afetividade, a imaginação e o simbolismo, fundamentais para uma vida em sociedade. Organizar as atividades por parte do professor de Educação Física não é algo simples. Deve-se ter em mente que toda conquista não é tida em apenas uma aula, mas sim em uma progressão, a ser planejada por periodizações previamente estipuladas e embasadas cientificamente. Para resultados relevantes em educação, o docente necessita realizar um acompanhamento coletivo e individual do seu grupo trabalhado, estimulando resultados apontados para o desenvolvimento e agregação de valores. Os jogos podem ser uma ferramenta para alcançar tal objetivo. Finalizando este trabalho, o autor deixa claro que, como limitação de estudo, há um texto redigido em linhas gerais. É importante que ocorram pesquisas que se preocupem em, por exemplo, comparar considerações de autores

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NOTA

das décadas de 60, 70 e 80 com as publicadas na atualidade, além do conflito de outras ferramentas educacionais e desenvolvimentistas com os jogos, para assim averiguar outras possibilidades que, talvez, se apresentem melhores ou piores no aprimoramento das valências psicofisicossociais nas diversas faixas etárias.

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Este trabalho recebeu suporte do Instituto de Pilates, Fisioterapia e Educação Fisart para a compra de livros, cedendo local de estudos e proporcionando alimentação adequada e transporte ao pesquisador.

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