O juiz da percepção extrapolada - Carlos Heitor Cony e as crônicas contra o golpe militar de 1964

July 21, 2017 | Autor: M. Silva Júnior | Categoria: Literatura, Jornalismo, Crônica, Carlos Heitor Cony
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O juiz da percepção "extrapolada": Carlos Heitor Cony
e as crônicas contra o golpe militar de 1964


Maurício Guilherme Silva Júnior[1]


Resumo: No referido artigo, pretende-se realizar rápida discussão em torno
da relação entre arte, sociedade e política, no Brasil, após a eclosão do
golpe militar de 1964. Em seguida, e particularmente, segue-se à
investigação dos "modos" como, por meio da crônica diária, o escritor e
jornalista Carlos Heitor Cony construiu discurso singular de resistência à
"revolução dos caranguejos", segundo definição do próprio autor. Logo após
a instauração do regime militar no País, o autor, então funcionário do
jornal Correio da Manhã, será uma das poucas vozes a se rebelar
publicamente – com o auxílio dos recursos e possibilidades da arte do
"cronismo" – contra o novo governo autoritário.

Palavras-chave: Crônica; Jornalismo e literatura; Carlos Heitor Cony; Golpe
Militar de 1964.



1. Introdução

No início de 1964, eclodia no Brasil o movimento que, décadas mais
tarde, o escritor e jornalista carioca Carlos Heitor Cony definiria, em
suas memórias sobre um dos mais terríveis períodos de exceção política e
social vividos pelo País, como "a revolução dos caranguejos"[2] (CONY,
2004). Naquele melancólico 31 de março, tropas do Exército, saídas de Minas
Gerais e São Paulo, ganham as ruas com o intuito de dar fim ao "perigo
comunista", protagonizado, no julgamento de parte significativa da
população brasileira, pelo governo do presidente João Goulart, o Jango, que
assumira o comando da nação em 1961, após renúncia de Jânio Quadros.
Em 1964, as antigas demandas de empresários e integrantes do alto
escalão das Forças Armadas voltam à tona, alinhando-se, principalmente a
partir da posse de João Goulart, às expectativas de parte significativa da
opinião pública brasileira. Da instauração dos planos de base ao
fortalecimento da reforma agrária, as iniciativas de Jango revelam-se
contrárias não só aos interesses políticos e econômicos da elite – que
deseja, a todo custo, "garantir o capital e o continente contra o
socialismo" (SCHWARZ, 2001, p.7) –, mas também aos princípios conservadores
– por vezes, comezinhos – da sociedade de então.
Neste sentido, pois, o golpe militar de 1964 pode ser compreendido
como a "gigantesca volta do que a modernização havia relegado; a revanche
da província, dos pequenos proprietários, dos ratos de missa, das
pudibundas, dos bacharéis em leis etc." (SCHWARZ, 2001, p.22). Assaz
mobilizada pelas novas técnicas de difusão de informações e valores
coletivos – as ferramentas da emergente indústria cultural –, tal parcela
da população, que há muito se sentia alijada dos processos de decisão sócio-
política e comportamental do País, enxerga na "revolução" a alternativa
para, enfim, "virar o jogo", principalmente contra Jango e seu "comunismo à
brasileira"[3]. Tal processo, no ver de Schwarz, expõe a dimensão do
retrocesso instaurado pelo novo regime:

Para conceber o tamanho desta regressão, lembre-se que no
tempo de Goulart o debate público estivera centrado em reforma
agrária, imperialismo, salário mínimo ou voto do analfabeto, e
mal ou bem resumira, não a experiência média do cidadão, mas a
experiência organizada dos sindicatos, operários e rurais, das
associações patronais ou estudantis, da pequena burguesia
mobilizada etc. Por confuso e turvado que fosse, referia-se a
questões reais e fazia-se nos termos que o processo nacional
sugeria, de momento a momento, aos principais contendores.
Depois de 64 o quadro é outro. Ressurgem as velhas fórmulas
rituais, anteriores ao populismo, em que os setores
marginalizados e mais antiquados da burguesia escondem a sua
falta de contato com o que se passa no mundo: a célula da
nação é a família, o Brasil é altivo, nossas tradições
cristãs, frases que não refletem realidade alguma, embora
sirvam de passe-partout para a afetividade e de caução
policial-ideológica a quem fala (SCHWARZ, 2001, p.22-23).


A substituição do debate de questões "reais"[4] por expressões nulas
de realidade será responsável, no Brasil pós-1964, por estimular a
disseminação do clima ufanista que, aos olhos do cronista Carlos Heitor
Cony, nada significará de positivo ao País. Desde os primeiros instantes da
"quartelada" que levaria a nação a 21 anos de repressão e censura, assim
como ao esfacelamento dos princípios de "cidadania" da sociedade brasileira
– termo aqui compreendido como o tripé social formado por direitos civis,
políticos e sociais (CARVALHO, 2003) –, um surpreso Cony, então jornalista
do Correio da Manhã, transforma-se na voz, irônica por excelência, capaz de
estimular o "exercício vital de oxigenação para muita gente" (VERÍSSIMO,
2004, p.9).
Autor, até então, de seis romances e um livro de crônicas, o escritor
e jornalista carioca passa a exercitar, como cronista, a "arte" de
interpretar criticamente os rumos da nau política, econômica, social e
comportamental brasileira em meio ao inusitado e tormentoso mar que então
se afigurava. Já no dia 2 de abril de 1964, nas páginas do Correio da
Manhã, Cony publica Da Salvação da Pátria[5], texto em que revela sua
perplexidade diante da novidade política: "Posto em sossego por uma
cirurgia e suas complicações, eis que o sossego subitamente se transforma
em desassossego: minha filha surge esbaforida dizendo que há revolução na
rua" (CONY, 2004, p.11).
Na referida crônica, um surpreso, mas não esbaforido, Cony – que, diga-
se de passagem, jamais se dedicara a projetos político-partidários ou a
narrativas ideológicas – passa a utilizar-se das palavras, em papel jornal,
como modo de interpretação do "cenário" brasileiro do pós-golpe, cujos
alicerces remontavam, conforme define o próprio autor no relato
memorialístico A revolução dos caranguejos, escrito 40 anos após o início
do regime militar, à "mesma divisão esquemática que cindira a Convenção
Francesa, quase dois séculos antes" (CONY, 2004, p.7). Na essência, a
analogia busca ilustrar a arcaica e maniqueísta natureza das alternativas
apresentadas à sociedade brasileira no período:

Fora da dicotomia esquerda-direita – que transformava o debate
político e cultural numa espécie de partida de futebol em que
a maioria torce e alguns poucos jogam, qualquer outro tipo de
assunto era tido como conversa para boi dormir – hipérbole
rural, gostosamente bucólica, que caía em desuso, substituída
pela divisão mais atualizada entre alienados e engajados – por
sinal, outro galicismo que tardiamente se incorporava na
linguagem da época (CONY, 2004, p.7).

Em Da salvação da pátria, Cony revela parte importante dos recursos e
temas que, a partir dali, e até 1974, ano em que publica o livro Pilatos –
obra preferida do autor e marco de seu "recesso" de 21 anos como
romancista, ofício para o qual se volta novamente apenas em 1995, quando
publica Quase memória –, marcarão seu ofício de jornalista e escritor
profissional, segundo Hohlfeldt (2001): a ironia; o ceticismo; a narrativa
memorialística em primeira pessoa; a falência da família; a classe média
urbana brasileira; a busca de identidade; o sentimento de vazio do "eu"
narrativo; a erotização; a fragmentação, realçada em personagens que "não
alcançam compreender o que ocorre a sua volta e com elas mesmas"
(HOHLFELDT, 2001, p.91), e a escrita com forte unidade e homogeneidade.
Carlos Heitor Cony, portanto, revela, logo na primeira crônica acerca
do anuviado regime antidemocrático que se instala no Brasil, um estado de
espírito prioritariamente crítico e cético, além de vasta capacidade
técnica – que o diga o uso integrado de recursos jornalísticos e literários
– para, da linguagem amoral às corajosas pautas de discussão, interpretar
as nuances sociopolíticas daquele intrincado País do pós-golpe. A ironia,
neste ponto, apresenta-se como base para o discurso do cronista:


Vejo um heróico general, à paisana, comandar alguns rapazes
naquilo que mais tarde o repórter da TV-Rio chamou de
"gloriosa barricada". Os rapazes arrancam bancos e árvores.
Impedem o cruzamento da avenida Atlântica com a rua Joaquim
Nabuco. Mas o general destina-se à missão mais importante e
gloriosa: apanha dois paralelepípedos e concentra-se na brava
façanha de colocar um em cima do outro (CONY, 2004, p.7).

Naquele instante, pois, a indecifrável engenharia dos paralelepípedos
surpreende o flânneur e escritor carioca, que, também jornalista
profissional, não poderia se furtar à busca de "compreensão para o
incompreensível". Em meio à árdua tarefa, o cronista, amiúde, recorrerá ao
recurso da ironia, justamente, para que consiga dar vazão à perplexidade
diante das situações que se lhe anunciam. O conceito de ironia na obra de
Cony – das crônicas aos romances – vai ao encontro das idéias de Linda
Hutcheon (2000), que compreende o exercício do "ironismo" como um tópico
político no sentido mais amplo da palavra. Segundo a autora, a "cena" da
ironia, que não se realiza apenas atrelada ao humor, é social e política.
Mais ampla do que se possa imaginar, pois, a expressão irônica ocorre em
diversos tipos de discurso – verbal, visual, auditivo –, na fala comum, na
chamada "arte superior" e também na cultura popular.
Além disso, uma das principais características da ironia centra-se no
que Hutcheton (2000) chama de "arestas": ausências de sentido provindas,
por vezes, da carga emocional evocada nos cidadãos. Conforme a autora,
"diferentemente da metáfora e da alegoria, que necessitam de uma
suplementação similar de sentido, a ironia possui tal aresta avaliadora e
consegue provocar respostas emocionais dos que a 'pegam' e dos que a não
pegam, assim como dos seus alvos e daqueles que algumas pessoas chamam de
suas 'vítimas'" (HUTCHEON, 2000, p.16). Em Carlos Heitor Cony, a referida
"carga emocional" diz respeito a sua memória íntima – e crítica – da
influência exercida pela máquina capitalista – e repressiva, no caso
específico de 1964 – sobre o "ser" e o "fazer" dos cidadãos ocidentais.
Nas crônicas de Cony sobre o golpe militar de 1964[6],
simultaneamente, a ironia busca parodiar e/ou satirizar um Brasil regido
por "inteligências" e narrativas ideológicas diversas, da ordem militar que
se avizinha, a partir da "revolução dos caranguejos", aos antigos
representantes do interesse nacional: a classe média – familiar e cristã –
e seu permanente desejo de inserção nas relações internacionais de consumo;
a burguesia, ansiosa por integrar-se ao vasto capital circulante no mundo,
e a intelligentzia, ideologicamente cindida em três diferenciadas, mas
restritas, direções: "esquerda", "direita" e "centro". Na contramaré dos
maniqueísmos da sociedade, o autor carioca concede à crônica – espaço
híbrido por natureza – o ofício de tornar permanente a inquirição em torno
das práticas e princípios – políticos, sociais, comportamentais etc. – dos
brasileiros, assim como de servir, ao próprio autor, como instância de auto-
análise. Nos textos do Correio da manhã, publicados no periódico a cada
dois dias, Cony não só ironiza os militares e suas táticas, como se dedica
à auto-ironia, à apresentação de informações em primeira mão e, com base na
típica leveza da crônica, à sátira do que há de mais conversador nos
discursos sociais.
Importante ressaltar, neste sentido, que a "pena" resistente de Cony
revela-se solitária logo após o golpe. Na verdade, nos meses subseqüentes à
"revolução" militar, o movimento é saudado, por parte significativa da
imprensa nacional – inclusive pelo depois combativo Correio da manhã –,
como via necessária à organização do País. Que o diga a edição especial da
revista mensal Manchete, publicada em abril de 1964, que, na capa, estampa
um sorridente Carlos Lacerda, feliz com a instauração, pelas Forças
Armadas, do "processo moralizador da nação". Já na primeira reportagem da
série, sob o título Deus, família e liberdade, a publicação consagra a hoje
histórica passeata pela ordem civilizatória:

A "Marcha da Família com Deus pela Liberdade" transformou-se,
no Rio, numa verdadeira homenagem às fôrças armadas, ao ser
anunciada a presença do General Olímpio Mourão Filho, de
destacada atuação nos recentes acontecimentos. Também
compareceram os Marechais Dutra, Magessi, Mendes de Morais e
Segadas Viana. A incalculável multidão concentrou-se ao lado
da Candelária, com imagens, terços, bandeiras e cartazes
anticomunistas. E dali deslocou-se para a Esplanada do
Castelo, onde renovou a impressionante demonstração de fé
católica e de confiança no Brasil (MANCHETE, 1964, p.4).

A partir do golpe militar, e diante de tais manifestações sociais de
anticomunismo, "fé católica" e "confiança no Brasil", Cony não conseguira
calar-se. Daí os textos solitários do cronista no Correio da manhã, os
quais, curiosamente, surpreenderão centenas de leitores, críticos
especializados e partidários da esquerda, que, até então, insistiam em
ressaltar apenas, como inatos à escrita do autor carioca, o deboche, a
rudeza de termos e, com ênfase, a alienação política. Para Rui Castro
(2009), o escritor,

já considerado "negativista" e "rude" por seus romances, ficou
famoso como o cronista cético e debochado de "Da arte de falar
mal", a coluna que publicava três vezes por semana no Correio.
[...] Pior que cético e debochado: um alienado político, pelo
menos aos olhos das esquerdas pré-1964, que exigiam
definições. Elas não sabiam o que pensar de um sujeito tão
hidrofobamente individualista numa época em que, com Jango
Goulart na presidência, urgiam as mobilizações coletivas: o
Brasil ia fazer as reformas, expulsar os americanos, instaurar
a ditadura do proletariado, pintar os canecos. [...] Pois, em
meio a essa balbúrdia, o cronista Cony só parecia se preocupar
com ciclistas búlgaros, com o Grande e verdadeiro livro de São
Cipriano e com um estranho apêndice do corpo chamado piloro.
Pois, no dia 1° de abril de 1964, instaurado o golpe, todos –
à direita e à esquerda – tiveram uma surpresa. [...] Cony,
alérgico a política e ideologias, viu seus amigos sendo presos
e perseguidos pelo novo regime e indignou-se. [...] Tornou-se
de repente uma voz isolada e sonante da oposição (CASTRO,
2009, p.116-117).

A partir daquele momento, pois, o cronista transmuta-se na voz
solitária e indignada em meio ao "deserto da nação", visto que, nos
primeiros instantes após o golpe, muitos dos propalados falastrões da
imprensa – das artes e das academias – calam-se temporária ou
definitivamente. Importante ressaltar, contudo, que já na obra de Cony pré-
1964, das crônicas aos romances, o homem e as relações culturais, sociais e
políticas circundantes, assim como as dores do(s) múltiplos vazio(s) da
existência, afirmam-se como matéria-prima fundamental.
Desde a estréia do escritor, em 1958, com O ventre[7], sua narrativa
caracteriza-se por certo olhar descentralizado, dissidente, amoral, nada
partidário de causas específicas. Será justamente tal posicionamento – uma
espécie de "não-lugar", em função da falta de apreço do autor por tudo o
que carece de paixão exacerbada e/ou empenho dogmático – o que tornará sua
escrita literária e jornalística peculiar em períodos específicos da vida
cultural brasileira, particularmente ao longo da década compreendida entre
os anos de 1964 e 1974.


2. O profissional da escrita: do silêncio à multidão

Em sua teoria social para compreensão da "sistemática mudança
cultural" da humanidade ao longo dos séculos, J. B. Thompson (1998), no
livro Mídia e modernidade, ressalta a importância de se privilegiar a
interpretação de transformações culturais a partir, justamente, da evolução
dos mecanismos de produção de bens simbólicos[8]. Afinal, mais do que a
mutação de crenças e valores, "o uso dos meios de comunicação transforma a
organização espacial e temporal da vida social, criando novas formas de
ação e interação, e novas maneiras de exercer o poder, que não está mais
ligado ao compartilhamento local comum" (THOMPSON, 1998, p.15)
Para Thompson, seria impossível, ainda, negar as condições sociais que
subjazem o mecanismo de produção e circulação de mensagens nas sociedades
modernas, visto que, para compreensão das mudanças culturais, não interessa
apenas o conteúdo veiculado pelos media. Em sua análise interdisciplinar, o
autor contrapõe noções dos teóricos da Escola de Frankfurt, para quem a
indústria cultural[9] seria responsável por manipular conteúdos e
estandardizar o processo de recepção dos bens simbólicos, além de ampliar o
conceito de "esfera pública" de Jürgen Habermas.
Ao lidar com tal arcabouço teórico para compreensão das mudanças
culturais da sociedade moderna, resultantes do desenvolvimento dos media,
Thompson constrói princípios conceituais vitais à análise que aqui se
pretende. Afinal, seria impossível discutir a trajetória de um escritor
como Carlos Heitor Cony sem referência ao crescimento das potencialidades
técnicas e da influência da indústria cultural no País, ainda mais no
panorama cultural que se delineia após o golpe militar de 1964. Haja vista
que os próprios militares irão alimentar, com investimentos diversos, da
infra-estrutura à cooptação de artistas, a chamada "estética do espetáculo"
(SÜSSEKIND, 2004), como parte da estratégia de integração nacional. Afinal,
em grande medida, a "utopia do 'Brasil grande' dos governos militares é
construída via televisão, via linguagem do espetáculo" (SÜSSEKIND, 2004,
p.24).
Escritor profissional, que vive da própria pena desde os primeiros
trabalhos como jornalista, na década de 1940, Cony sempre se manteve atento
às possibilidades de exercício do poder através da disseminação de idéias e
informações em meios técnicos os mais diversos, do livro ao jornal, das
revistas aos veículos audiovisuais. Tal "espírito" propício ao ofício
diário do "uso público da razão"[10] – alimentado pelo contato ininterrupto
com os acontecimentos e por olhos constantemente abertos às dinâmicas
sociais – tornará Cony onipresente no que se refere ao debate sobre os
rumos do País.
Por um lado, se tal atitude não lhe diminui a intensidade da escrita,
por outro, leva-o a criar modos bastante particulares – mas não
experimentais – de discurso literário e jornalístico acerca dos homens e
seu tempo. Capaz de escrever tão rapidamente quanto o pródigo romancista
inglês Edgar Wallace (CASTRO, 2009, p.123), Cony consegue, no Brasil, o que
poucos alcançam, talvez porque não definam – ou não dominem – as formas do
próprio estilo. Nos termos de Antônio Hohlfeldt:

Um escritor verdadeiramente profissional. Eis o mínimo que se
pode dizer de Carlos Heitor Cony, independentemente da
apreciação que se possa fazer de sua obra. E dizer isto, no
Brasil, é dizer muito. [...] Mais que isso: é dizer que se
trata de um escritor que, sem pretender experimentar
estilisticamente, domina o idioma como instrumento básico de
sua expressão e, valendo-se da língua comum a todos nós, como
bem registrou Otto Maria Carpeaux, entre tantos críticos, é
capaz de escrever aquilo que pretende realmente dizer. Ou
seja, deve-se ler Carlos Heitor Cony enquanto um escritor
absolutamente cônscio de que o estilo é uma opção, de que sua
escrita é uma dentre muitas alternativas disponíveis para um
autor e que tal opção tem uma determinada significação pessoal
e social (HOHLFELDT, 2001, p.88-89).

Deste escritor plenamente consciente das próprias opções estéticas –
assim como ideológicas, filosóficas etc. –, a própria trajetória
intelectual e artística fala por si: Carlos Heitor Cony pôde planejar,
inclusive com o uso das ferramentas da indústria cultural, os rumos de sua
própria obra. Em síntese – e ciente de todos os prejuízos resultantes da
audácia de sintetizar tão rapidamente uma trajetória estética e intelectual
–, pode-se dizer que o percurso literário e jornalístico de Cony divide-se
em duas grandes fases: a) de 1958 a 1974 e b) de 1995 aos dias de hoje.


3. O cronista e a voz contra o vento


Seda pura sobre um colchão de pregos. Eis a imagem capaz de descrever, em
síntese metafórica, a escrita de Carlos Heitor Cony. Compreenda-se o
garboso tecido como ilustração do estilo clássico do autor, influenciado,
na forma, por autores como Manuel Antonio de Almeida, Machado de Assis,
Gustave Flaubert e Jean Paul Sartre[11]. Tal convidativa "seda literária",
contudo, não se sustenta sobre a maciez de molas ou penas de ganso. Sob
ela, ao contrário, esconde-se uma série de desafios.
O autor busca revelar, parágrafo a parágrafo, a vida por detrás dos
"lençóis" da realidade aparente. Para o autor carioca, não há fato sem
"contra-fato"; verdade sem ironia; literatura sem tempestade. Do mesmo
modo, o cronista Cony busca a expressão do desconforto como ação literária
e jornalística. Pode-se dizer, pois, que a idéia de "tempestade", aqui
revelada, apresenta-se ao leitor a partir das objetivas e rascantes
descrições do escritor quanto à(s) angústia(s) da vida: em sua escrita, não
há quem se revele imune ao assédio do tempo, do frio, do tédio, do corte,
do escombro.
No que diz respeito ao ofício do cronista em meio "aos escombros"
resultantes do golpe militar de 1964, o declarado desprezo de Cony em
definir – ou particularizar – posicionamentos estéticos e/ou ideológicos
acerca da sociedade é revelador, paradoxalmente, de sua opção – também
dogmática, contudo – por manter-se distanciado dos dogmas. Neste sentido,
especialmente nas crônicas após a "quartelada"[12], a escrita de Cony – sua
voz estética – busca permanecer, propositadamente, na luta contra o(s)
vento(s) do pensamento único; das iniciativas e postulados fáceis da
esquerda, da direita ou do centro; das propostas de engajamento artístico
nacional-popular ou vanguardista-cosmopolita; da resistência cultural
engendrada por senhas pré-determinadas etc. Ao contrário, e conforme já
ressaltado, o autor estimula a "tempestade" como meio – único – de
interpretação dos tempos, como se não houvesse graça ou significado na
bonança. Afinal, de que modo interpretar a vida, na essência, se não a
lançando, regularmente, contra os rochedos?
A expressão que dá título a este tópico – O cronista e a voz contra o
vento – foi especialmente cunhada como forma de condensar, em linhas
gerais, o que aqui se convencionou chamar de "o não-lugar" ocupado por
Carlos Heitor Cony no palco das discussões culturais brasileiras, com
ênfase nos anos 1960 e 1970. Como já ressaltado, trata-se do escritor que,
conscientemente, insiste em desdenhar dos dogmas, como que, paradoxalmente,
para dizer: "Minha única regra é não ter regras".
Até o advento do golpe de 1964, Cony realmente parecia reafirmar, em
prosa e conduta, tais princípios pessoais e profissionais. Afinal, já na
década de 1950, período de sua estréia literária, o autor escandaliza a
muitos com a linguagem rascante de O ventre, romance que nega e renega
princípios fundamentais da família e do convívio entre os indivíduos,
justamente no momento em que o Brasil acreditava-se forte e altaneiro, das
curvas majestosas das construções de Oscar Niemeyer à sofisticação do samba
na Bossa Nova; do surgimento da TV brasileira à exaltação dos heróis da
seleção de 1958; da quase Miss Universo Martha Rocha à nação que se abre,
como jamais, ao capital internacional.
Cony, pois, já se revelava, como escritor, uma voz antípoda à euforia
generalizada. Como ressalta a crítica acerca do jubileu de ouro do
lançamento de O ventre, publicada no Jornal Rascunho, em 2008, o livro faz
com que o leitor entre em contato com uma personagem,

o misantropo José Severo, que narra as suas primeiras
desventuras sem afetação, com realismo absolutamente
verossímil, a ponto de mostrar sua condição de rejeitado, ao
mesmo tempo em que o outro, o irmão, era sobremaneira incluído
e incensado na sua família. Como se lê na história, o afeto se
encerrara havia muito para a vida de José Severo. E antes de
ser um conto cheio de som e fúria, a vida, na perspectiva
deste protagonista da obra de Cony, era uma porcaria. A
jornada de José Severo é propositadamente dura, cheia de
percalços, sem espaço para crer em um futuro redentor.
Representava o outro lado de um País que poderia dar certo.
Aliás, se é verdade que a década de 1950, em especial o ano de
1958, foi um período, na visão de alguns cronistas, que não
deveria acabar, em O ventre estão as fissuras não-visíveis
desse suposto paraíso. Nesse caso em especial, havia como que
uma espécie de predestinação para que José Severo fosse um
autêntico perdedor, à margem do triunfo burguês, mas inserido
na tortura existencial de seu tempo. É o próprio romancista
quem acusa a influência oriunda de pensadores dessa linhagem
filosófica, como Jean Paul Sartre (JORNAL RASCUNHO, 2008)[13].

Tal crítica capta, de modo conciso, não só os elementos centrais da
obra inicial do romancista Cony. Trata-se, afinal, do jornalista e escritor
que, ao longo das décadas de 1960 e 1970, permanecerá fiel ao objetivo de
revelar, justamente, as tais "fissuras não-visíveis desse suposto paraíso",
ou, em outros termos, desse Brasil "que poderia dar certo". Após o golpe
militar de 1964, o cronista dos textos de resistência não medirá palavras
para se contrapor à barbárie instaurada no País. Apesar disso, jamais irá
se conformar aos princípios dogmáticos dos grupos artísticos que, como ele,
revelam-se resistentes aos militares e seu projeto repressor.
Ao longo de toda a "temporada" de exceção política vivida no Brasil,
Carlos Heitor Cony não coaduna com os princípios de nenhum dos dois
principais "grupos" de elaboração estética surgidos com o pós-golpe (a
vertente formalista ou vanguardista e a linha nacional e popular). Após a
instauração do regime militar no Brasil, o compromisso do autor carioca,
como cronista diário do Correio da Manhã, passa a ser o desnudamento dos
absurdos cometidos pela ordem governamental, assim como o debate sobre os
rumos da nau política, econômica, cultural e social brasileira. Nas
crônicas escritas por Cony a partir do dia 2 de abril de 1964, não haverá
espaço para nada além da análise, por vezes ferina e irônica, da
mediocridade da vida humana numa nação periférica regida pela repressão.
Tal visão do escritor acerca dos homens, aliás, não se modificou com o
tempo. Em entrevista a Luis Henrique Pellanda, publicada no Jornal
Rascunho, em setembro de 2009, Cony ressalta:

Considero o ser humano um projeto falido. O ser humano não me
parece digno de respeito. Lá, no relato bíblico, você lê o
seguinte: Deus criou o céu e viu que era bom; criou as
estrelas e viu que eram boas; separou a terra e a água e viu
que aquilo estava bom. Enfim, tudo que Ele criava estava bom.
O homem, Ele não viu que estava bom. E tanto é assim que
tentou exterminá-lo diversas vezes e de várias maneiras. E não
conseguiu. O homem sobreviveu. Sobrepujou a Deus, sobrepujou
ao dilúvio, sobrepujou a todas as catástrofes. Nínive, Sodoma
e Gomorra foram destroçadas, mas sempre sobrou alguém. Então,
o homem, realmente resiste. É impávido. Resiste, e resiste
contra quem? Resiste geralmente contra o ser supremo que o
criou. Então, o homem, já por natureza, já na sua essência
ontológica, é mau. Agora, se a gente for olhar a história da
humanidade – não vou dizer a história de nós todos, que somos
pobres seres humanos, feitos de barro, e todos sabemos
perfeitamente que não valemos nada, que vamos terminar no pó,
e... Enfim, não quero me prolongar nisso. Já basta o que falei
aqui de bobagem. Mas, para mim, é o seguinte: o ser humano não
me inspira respeito. Eu respeito o ser humano, a mim e aos
outros, só por causa da polícia.[14]

Neste sarcástico depoimento, eis alguns dos elementos centrais à obra
e ao pensamento político-ideológico do autor carioca. Tal posicionamento
"declaradamente anti-tudo", tornará sua escrita, literária e jornalística,
bastante peculiar em períodos específicos da vida cultural brasileira,
particularmente ao longo da década compreendida entre os anos de 1964 e
1974. No período, como não poderia deixar de ser, a "ironia" permanecerá a
demonstrar propriedades alquímicas na escrita de Cony.
Ao dizer do mundo "ao contrário", o escritor "esfola" a realidade, até
que, assombrado e exausto, o leitor questione seu próprio – e, obviamente,
insignificante – "estar no mundo". Em sua escrita, o autor estimula,
categoricamente, as tais arestas previstas por Linda Hutcheon (2000), de
modo a que suas "vítimas" – sejam os leitores dos romances; sejam os
consumidores do "cronismo" diário e da realidade construída pelos jornais –
não encontrem mais do que duas saídas: responder emocionalmente às
provocações ou correr sem noção de destino. A "carga emocional" estimulada
por Cony nos leitores diz respeito à sua própria memória íntima – e crítica
– acerca da influência exercida pela máquina capitalista – e repressiva, no
caso específico do golpe militar de 1964 – sobre o "ser" e o "fazer" dos
cidadãos ocidentais.
Interessante ressaltar, neste sentido, a permanente auto-ironia de
Cony, principalmente ao tratar de seu posicionamento político. Em crônica
escrita em resposta ao questionamento de uma leitora – "Você é de esquerda
ou de direita?", o escritor recorre à ironia para, com divertida
argumentação, tangenciar a resposta à questão central:

Até aqui não respondi se sou da direita ou da esquerda. Pois
lá vai a resposta. Sou que nem aquele relógio do português que
às vezes era de ouro e às vezes não era. Uma coisa nunca fui
nem serei: do centro. Detesto os centros, tantos os centros
espíritas como os cívicos. De uma forma geral, pendo às vezes
para a esquerda, mas isso não significa que seja realmente um
esquerdista. Considero a esquerda, principalmente a esquerda
brasileira, um aglomerado de imbecis que se escoram uns aos
outros em defesa de teses – essas, sim – certas e necessárias.
Quando um camarada não consegue ter um pensamento sequer, um
juízo a respeito de si mesmo e do mundo, procura o seio
acolhedor das esquerdas. E ali, no calor de um ideal, de uma
pujança, de um laboratório de idas e vindas que sempre levam a
um rumo certo, sentem-se compensados, firmes e [...] sólidos
(CONY, 2010, p.203).

O jornalista/escritor, pois, encarrega-se de exprimir, dissecar,
divulgar e/ou ultrapassar os limites das "novas percepções" do cidadão
diante dos movimentos da política convencional: Cony não é de centro, não
de esquerda, nem de direita. Ao mesmo tempo, parece partidário de toda a
tríade de possibilidades. Ao explicitar, nos próprios textos, tal aparente
onisciência com relação às questões do mundo, o cronista busca, na verdade,
decifrar os contornos do homem moderno numa nação periférica como o Brasil
do pós-golpe.
Em outra medida, nas crônicas do pós-golpe, Carlos Heitor Cony mostra-
se juiz da percepção "extrapolada", por parte de setores diversos da
sociedade, com relação ao mundo. Tal extrapolação acentua-se, justamente,
no que diz respeito aos primeiros momentos do golpe militar de 1964. No
texto O sangue e a palhaçada, presente em O ato e o fato, Cony revela que
os que lêem suas crônicas devem ser lembrados


do que sempre pensei do sr. João Goulart e de seu governo. Em
crônica publicada no ano passado [1963], às vésperas do
plebiscito, crônica mais tarde incluída em livro editado pela
Civilização Brasileira, deixei bem claro o meu pensamento a
respeito de certa esquerda oportunista e desonesta que cercava
o sr. João Goulart. À página 25 do livro Da arte de falar mal,
lá está: "Considero esta esquerda um aglomerado de imbecis que
se escoram uns aos outros em defesa de teses – essas sim –
necessárias". E lembro de um personagem de A idade da razão:
"Lembram aquele Gómez do romance de Sartre? Pois o camarada
era comunista só porque era muito difícil ser Gómez" (CONY,
2004, p.42).

Neste pequeno trecho de uma de suas crônicas, Cony demonstra algo
importante para a compreensão de seu posicionamento político pouco
convencional: se, anteriormente ao golpe, o cronista declarava-se anti-
Jango – pois que o Presidente da República também parecia escorar-se "aos
outros em defesa de teses – essas sim – necessárias", logo após a
"revolução dos caranguejos, o autor carioca não economiza em petardos
contra o outro lado da moeda: os militares e a direita católica brasileira.

Em depoimento ao Instituto Moreira Salles, como participante da série
O escritor por ele mesmo, Carlos Heitor Cony recorda-se, justamente, da
forma como sua posição de "maldito" – fruto do não-engajamento político –,
é alterada com a eclosão do golpe militar de 1964, pois que, dois dias após
a "quartelada", o escritor passaria a condensar, em suas crônicas no
Correio da Manhã, boa parte das indignações sociais mobilizadas no período,
principalmente, nos meios artísticos e intelectuais. Na referida
declaração, Cony confesso que sempre tivera receio dos autores ditos
"engajados". Afinal, para ele, o escritor e jornalista


não deve se sentir muito obrigado. Eu tenho muito medo, muito
receio, quando vejo um escritor dizer que é engajado, que é
comprometido. Eu me lembro, por exemplo, de 64, quando havia
muitos autores engajados. Quem não era engajado, era maldito.
Esses engajados todos, no dia primeiro de abril de 64, foram
para debaixo do armário, foram para debaixo da cama, se
esconderam, fugiram. E eu, porque não era engajado, não tinha
que fugir. E paguei um preço muito alto. Muitas vezes, os
militares me perguntavam: "Mas você não é disso..." Não sou,
realmente. Não sou comunista. Não tenho nada a ver com isso.
"Mas por que você faz isso?" Não sei. Eu estava fazendo uma
coisa que não sabia exatamente o porquê. Eu estava fazendo por
quê? Porque achei sacanagem, por exemplo, um oficial da
Marinha dar um pontapé num operário. Eu e [Carlos] Drummond
[de Andrade] vimos um oficial da Marinha, com uma arma na mão,
dando um chute em um operário que tinha gritado "Viva,
Brizola"! Não tenho nada a ver com aquilo. Eu detestava o
Brizola, detestava a Marinha, detestava todo mundo. Detestava,
sobretudo, aquilo que estava vendo. Mas aquilo lá, achei que
não devia. E escrevi contra aquilo. Eu me lembro que em uma
das minhas prisões, um coronel disse: "Eu não podia esperar
isso do senhor, pois o senhor não tem nada a ver com isso". É,
eu também não sei. "E o que o senhor está fazendo na prisão?"
Também não sei. Vocês é que devem saber.[15]




Referências

CADERNOS DE LITERATURA. São Paulo: Instituto Moreira Salles, nº12 – Carlos
Heitor Cony, dez/2001. 159p.

CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil: o longo caminho. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.

CASTRO, Rui. A literatura como uma unha encravada. In: O leitor apaixonado:
prazeres à luz do abajur. São Paulo: Cia. das Letras, 2009.

CONY, Carlos Heitor. O Ato e o Fato. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 1964.

_________________. O Ventre. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1958.
10. ª ed., São Paulo: Cia. das Letras, 2002.

_________________. Pilatos. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1974.
5.a ed., São Paulo: Cia. das Letras, 2001.

_________________. O Suor e a Lágrima. Belo Horizonte: Dimensão, 2002.

_________________. O escritor por ele mesmo. São Paulo: 26 jun. 2003.
Palestra ministrada e registrada em vídeo nas dependências do Instituto
Moreira Salles.

_________________. A revolução dos caranguejos. São Paulo: Cia. das Letras,
2004.

HABERT, Nadine. A década de 70 – Apogeu e crise da ditadura militar
brasileira. São Paulo: Ática, 2006.

HOHLFELDT, Antonio. O caso Cony. In: CADERNOS DE LITERATURA. São Paulo:
Instituto Moreira Salles, nº12 – Carlos Heitor Cony, dez/2001. 159p.

HORKHEIMER, M.; e ADORNO, T. W. Dialética do esclarecimento: fragmentos
filosóficos. Trad. Guido Antonio de Almeida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,
1997.

HUTCHEON, Linda. Teoria e política da ironia. Belo Horizonte: Editora UFMG,
2000.

JORNAL RASCUNHO. Disponível em:
. Acesso
em 20 abr. 2011.

MACHADO, Josué. O medo como arma. Revista Língua Portuguesa, São Paulo,
abr. 2007. Figura da linguagem, p.10-16.

MANCHETE. Rio de Janeiro, abr. 1994. Ano 11. Edição histórica, p.4.

SCHWARZ, Roberto. Cultura e política. São Paulo: Paz e Terra, 2001.

SUSSEKIND, Flora. Literatura e vida literária: polêmicas, diários e
retratos. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2004.

THOMPSON, John b. A mídia e a modernidade: uma teoria social da mídia.
Petrópolis: Vozes, 1998.
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[1] Graduado em Jornalismo (1999) pela UFMG, é mestre em Estudos Literários
(UFMG/2004). Atualmente, além de doutorando em Literatura Brasileira
(UFMG), é docente do curso de jornalismo do Centro Universitário de Belo
Horizonte (UNI/BH).
[2] A revolução dos caranguejos é o título de obra publicada por Carlos
Heitor Cony, em 2004, quando se completavam 40 anos do golpe militar de
1964, pela Companhia das Letras. No livro, o autor rememora, tendo por base
os textos de O ato e o fato (1964), suas experiências durante os "anos de
chumbo".
[3] Afora tais forças anticomunistas – tanto sociais, quanto institucionais
– que se fortaleciam no Brasil desde agosto de 1954, quando da morte do
presidente Getúlio Vargas, uma série de fatores colaborará com a
instauração do regime de exceção no Brasil. Em primeiro lugar, é importante
citar o financiamento e estímulo, por parte dos Estados Unidos, de golpes
ditatoriais em diversos países latino-americanos. No auge da chamada Guerra
Fria, tal investimento militarista, por parte do mais importante império do
Ocidente, revelava-se estratégia interessante aos planos econômicos e
ideológicos do Tio Sam.
[4] Em outras abordagens metodológicas, o termo "reais" poderia revelar-se
de difícil acepção, resultado de sua polissemia. Nesta pesquisa, contudo,
nada se pretende dizer além do sentido que lhe atribui Roberto Schwarz
(2001), para quem o debate político, no governo de João Goulart, tratava de
questões "concretas" [reais] da situação brasileira.
[5] Reunida no livro O ato e o fato (1964), principal objeto de estudo
deste artigo, a crônica é o primeiro texto contra o golpe militar publicado
na imprensa brasileira.
[6] Neste caso, faz-se referência, exclusivamente, às crônicas escritas
logo após a eclosão do golpe e reunidas no livro O ato e o fato.
[7] No referido romance, o protagonista José vive, cotidiana e
rotineiramente – como tantos outros personagens do escritor carioca –,
sobre os escombros: bastardo, jamais lhe foi apresentada a face do afeto.
Restam-lhe, para lidar com o mundo, a resignação e a ironia.
[8] Neste ponto, importante frisar apenas que, para compreender a
importância dos processos de comunicação nas sociedades modernas, revela-se
necessário o desenvolvimento de uma "teoria social substantiva da ação e
dos tipos de poder, recursos e instituições em que ele se baseia"
(THOMPSON, 1998, p.20).
[9] O termo foi cunhado, pela primeira vez, por Theodor Adorno e Max
Horkheimmer, no texto A dialética do esclarecimento, publicada em 1947.
[10] Referência direta a Thompson (1998), para quem uma das demandas da
burguesia européia, responsável pelo desenvolvimento dos primeiros jornais
– "esfera pública" propícia ao debate das questões da polis – seria,
justamente, o direito à explicitação dos pensamentos, ou em outras
palavras, ao "uso público da razão".
[11] Em depoimento à revista Língua Portuguesa, Cony diz o seguinte acerca
de tais influências literárias: "[Tive] As [influências] obrigatórias, como
Machado de Assis, Eça de Queirós. Também Balzac, Flaubert, Zola, Manuel
Antônio de Almeida, Lima Barreto. Mas o autor que mais me influenciou o
pensamento foi não o Sartre filósofo, mas o de A náusea e Os Caminhos da
Liberdade. No estilo, Machado. Era muito bom em piadas, em 'cacos'".
(Entrevista concedida a Josué Machado. In: MACHADO, Josué. O medo como
arma. Revista Língua Portuguesa, São Paulo, abr. 2007. Figura da linguagem,
p.10-16).
[12] Em certos momentos, particularmente em suas memórias acerca do golpe –
A revolução dos caranguejos (2004) –, o autor assim se refere ao golpe
militar de 1964.
[13] http://www.carlosheitorcony.com.br/imprensa.aspx?nNOT_Codigo=37.
[14] http://www.carlosheitorcony.com.br/noticia.aspx?nNOT_Codigo=84.
[15] CONY, Carlos Heitor. O escritor por ele mesmo. São Paulo: 26 jun.
2003. Palestra ministrada, e registrada em vídeo, nas dependências do
Instituto Moreira Salles.
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