O PAPEL DO PROJETO E DA COORDENAÇÃO DE PROJETOS NA REABILITAÇÃO DE EDIFÍCIOS: O CASO DA REABILITAÇÃO DE CONDOMÍNIOS DE EDIFÍCIOS RESIDENCIAIS

June 26, 2017 | Autor: S. Burattino Melhado | Categoria: Design Management
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O PAPEL DO PROJETO E DA COORDENAÇÃO DE PROJETOS NA REABILITAÇÃO DE EDIFÍCIOS: O CASO DA REABILITAÇÃO DE CONDOMÍNIOS DE EDIFÍCIOS RESIDENCIAIS

MELHADO, Silvio B. (1); CROITOR, Eduardo P. N. (2) (1) Professor Associado da Escola Politécnica da USP – e-mail: [email protected] (2) Mestrando da Escola Politécnica da USP – e-mail: [email protected] Av. Prof Almeida Prado, trav. 2, nº 271 - Cidade Universitária “Armando de Salles de Oliveira” Cep 05508-900 Fones: (011) 3091-5468 / 3091-5164 - Fax: (011) 3091-5715 / 3091-5544

RESUMO A reabilitação de edifícios se apresenta como uma oportunidade real de negócios para o mercado imobiliário, entretanto, a gestão desses empreendimentos requer cuidados específicos. Atualmente, esse mercado é compartilhado por empresas especializadas e por aquelas que simplesmente atendem as demandas de mercado, mas não têm interesse nesse nicho de mercado. O presente artigo discute a importância dos empreendimentos de reabilitação receberem cuidados específicos desde a etapa de concepção do projeto à etapa de execução da obra; apresenta as peculiaridades desse tipo de empreendimento; e identifica o papel que o projeto e a coordenação de projetos desempenha nesse contexto. Os conceitos são ilustrados a partir de dois estudos de caso de empreendimentos de reabilitação de edifícios residenciais de alto padrão, realizados entre os anos 2004 e 2005, na cidade de São Paulo. Nos dois casos, embora os escopos dos serviços fossem semelhantes, as estratégias definidas para a reabilitação foram distintas. Essas estratégias incorreram em impactos ao longo do empreendimento do ponto de vista técnico-comercial, atendimento ao planejamento, relacionamento entre os agentes envolvidos, qualidade final do produto e satisfação do cliente.

ABSTRACT During this years, the financial investments on rehabilitation of degradated buildings and urban areas have shown as real oportunity of business mostly in the inner city metropolitan areas. This paper discusses the need for develop a design and construction culture in rehabilitation projects. There is presented two cases of residencial buildings rehabilitations, located in the city of São Paulo, it´s dificults founded in the project and some improvement proposals.

1. INTRODUÇÃO Os investimentos financeiros aplicados em reabilitação de edificações têm crescido muito nos últimos anos, principalmente nos grandes centros urbanos do país. As cidades brasileiras que tiveram suas regiões centrais imersas durante décadas em processos de degradação, tais como São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, hoje possuem um grande parque de edifícios degradados. Em Belo Horizonte, segundo FERREIRA (2006) existem atualmente 56 edifícios degradados e desocupados apenas no centro antigo da cidade.

BARRIENTOS e QUALHARINI (2002) definem reabilitação de edifícios como sendo uma “reforma gerenciada do partido, adaptando a construção às novas necessidades, ou até mesmo para a otimização das atividades desempenhadas”. Além de prolongar a vida útil da edificação e proporcionar a modernização de suas funcionalidades, a reabilitação deve promover a possibilidade de redução do custo de utilização da edificação, através da implantação das tecnologias disponíveis. Edifícios comerciais comumente passam por intervenções de requalificação com o objetivo de gerar redução no custo de operação. O desafio da reabilitação nesses casos é tornar o edifício mais eficiente e por conseqüência melhorar sua valorização de mercado. Em edifícios residenciais o raciocínio é similar. Embora muitas vezes as intervenções sejam realizadas de maneira fragmentada (devido às restrições orçamentárias do condomínio, pelo fato do edifício estar ocupado pelos moradores durante a execução das obras, etc.) a reabilitação de edifícios pode proporcionar reduções significativas de custo na operação das edificações. O estado de degradação das edificações é agravado pela falta de manutenção preventiva. Particularmente em edifícios residenciais, a manutenção não é rigorosamente atendida e em muitos casos está relacionada ao perfil do síndico. Em condomínios que dispõem de administração profissional ou nos casos onde a pessoa do síndico tem experiência e/ou conhecimento técnico nessa área, a manutenção é feita de maneira adequada. Entretanto, na grande maioria dos casos, o que se percebe é que as patologias construtivas se desenvolvem sem o conhecimento ou percepção pelos moradores e as medidas corretivas são tomadas quando a situação encontra-se em estágio bastante avançado. Naturalmente, as intervenções se tornam mais complexas e de custos mais elevados. A prática da manutenção corretiva tem, sem dúvida, um componente cultural importante, mas por outro lado reflete o contexto atual que o mercado imobiliário nacional está inserido. Por esse motivo, os investimentos em reabilitação ainda são pontuais. Ao analisarmos a relação entre o volume de recursos aplicados em projetos de reabilitação e manutenção e os projetos de obras novas no país veremos que no primeiro a parcela é praticamente insignificante. Trata-se de uma tendência que ainda dá os seus primeiros passos. Se por um lado, no Brasil esses investimentos não são significativos, em alguns paises europeus a realidade é bem diferente. Em alguns casos o cenário de investimentos é o inverso, ou seja, o mercado da construção civil predial investe mais em projetos de reabilitação do que em construções novas com a mesma funcionalidade. Países como França, Itália, Grã-Bretanha e Dinamarca destinam mais de 40% do total de investimentos da construção civil em projetos de reabilitação. Já Portugal, que possui aproximadamente 25% de seu parque habitacional construído há mais de 60 anos e por volta de 50% das edificações com idades entre 25 e 60 anos, despertam o interesse desse nicho de mercado (LANZINHA; FREITAS; GOMES, 2001).

2. REABILITAÇÃO DE EDIFÍCIOS: PROJETO E COORDENAÇÃO

2.1 O projeto de reabilitação MELHADO e VAHAN (1995) definem projeto como “atividade ou serviço integrante do processo de construção, responsável pelo desenvolvimento, organização, registro e transmissão das características físicas e tecnológicas especificadas para uma obra, a serem consideradas na fase de execução”. Entretanto, para que se iniciem os processos de projeto de empreendimento de reabilitação, estudos de viabilidade detalhados precisam ser desenvolvidos. A análise técnica das condições da edificação será determinante para a viabilidade do empreendimento. Segundo FREITAS e SOUZA (2003), “quando um edifício apresenta um conjunto significativo de patologias não é possível partir diretamente para os trabalhos de recuperação sem um estudo de diagnóstico, que será a primeira fase do processo de

reabilitação”. Os mesmos autores propõem que o estudo diagnóstico seja realizado de forma detalhada e contemple medições e sondagens em campo das patologias apresentadas pelo edifício. Segundo BARROS (2001), “o destino dos edifícios obsoletos e vagos, deve ser a sua reforma e modernização (...); e quando a reforma não for viável, a demolição é a alternativa para criação de novo desenho”. Para auxiliar a elaboração do estudo de diagnóstico de patologias, foram desenvolvidas algumas metodologias de diagnóstico e intervenção, dentre as quais podemos citar: EPIQR, MER HBITAT, TEST HABITATGE e MATTEC (BARRIENTOS; QUALHARINI 2002). Através dessas metodologias obtém-se um panorama detalhado do estado de conservação da edificação. Esses resultados irão subsidiar o estudo de viabilidade financeira além de se tornarem instrumentos de grande importância para a elaboração de projetos. Projetos de requalificação de edifícios sempre geram impactos no meio em que estão inseridos. ARANTES (2001) afirma “quanto maior esse impacto, melhor o poder de repercussão da idéia de reabilitar. Operações com planejamento e execução de forma global tendem a causar impacto mais forte”. Uma edificação que por anos foi abandonada e descuidada, ao passar por processo de reabilitação ganha novos olhares para si e para o seu entorno. O contraste que uma edificação reabilitada provoca em um meio de edificações degradadas, invariavelmente convida a vizinhança para uma auto-análise. A valorização econômica do imóvel, o conforto e bem-estar proporcionado pelas obras de reabilitação se tornam evidentes. Mas projetar a reabilitação de edifícios não é tarefa simples. A característica mais evidente desse tipo de projeto é apresentada por ARANTES (2001): “trabalhar com reabilitação implica em trabalhar sobre um projeto de outro autor”. Quando o projeto implica em mudança ou readequação de uso, o desafio se torna ainda maior, pois as limitações impostas pelo partido arquitetônico da edificação serão elementos condicionantes no projeto. Segundo BONANNI (2000), “o edifício é ainda o que inspira os limites e regulamenta as intenções de uma reutilização acertada”. Um dos grandes desafios para os projetistas é adequação às exigências legais e necessidades modernas de automação, sistemas prediais e flexibilidade de uso dos ambientes às limitações físicas dos edifícios antigos. Todo o processo de projeto deverá ser conduzido de forma particularizada, desde a elaboração de um programa de necessidades até o detalhamento dos projetos. Os projetos de reabilitação, ao contrário dos projetos de novas construções, permitem que os projetistas explorem - durante a elaboração dos projetos - a estrutura sobre a qual o novo projeto será aplicado, através de visitas, medições, registros fotográficos, prospecções, etc.. Mesmo assim, com todas as ferramentas disponíveis, as “surpresas” fazem parte da rotina do canteiro de obras de reabilitação. A estrutura da edificação existente reserva segredos da época de sua concepção que só serão descobertos quando da execução da reabilitação. Dificilmente, durante as etapas de estudos de viabilidade, são investidos todos os esforços necessários para a eliminação completa das possíveis interferências com a estrutura existente. Os arquivos de projetos detalhados geralmente são perdidos ao longo dos anos e, portanto, edifícios com mais de 40 anos de idade dificilmente possuem elementos gráficos originais. Os poucos elementos que se consegue resgatar são projetos utilizados para aprovação na prefeitura, entretanto nem sempre o construído está de acordo com o desenho. Além disso, ao longo do tempo são feitas intervenções na edificação que descaracterizam os projetos originais e essas informações não são registradas em desenhos. As lacunas de informação na fase de elaboração de projetos de reabilitação criam um ambiente de incerteza maior do que nos projetos de obras novas. Por esses motivos, o detalhamento de projetos, assim como em obras novas, é de fundamental importância para a redução dos índices de retrabalho, de custo e de risco do empreendimento. Quanto melhor for o detalhamento dos projetos melhor será o desempenho das obras e por conseqüência o resultado final do empreendimento. O risco poderá ser dimensionado com mais precisão quando o detalhamento dos projetos demandar um maior conhecimento da edificação existente sobre a qual será lançado esse novo projeto. Entretanto, como a existência de imprevistos é uma das características mais marcantes dos projetos de reabilitação, a rapidez na tomada de decisão na etapa de obra é igualmente

importante. A presença de um profissional responsável pelo diligenciamento com a visão sistêmica do empreendimento, que tenha autonomia e relacionamento próximo com o cliente trará um ambiente de estabilidade para o empreendimento na etapa de execução das obras.

2.2 A coordenação de projetos e a obra FABRICIO; MELHADO; GRILO (2003) definem coordenação de projetos como sendo “uma atividade de suporte ao desenvolvimento dos projetos, cujo objetivo é garantir que as decisões tomadas nas diversas especialidades de projetos sejam compatíveis e levem em conta os requisitos globais do empreendimento, ampliando a qualidade e a construtibilidade dos projetos de edifícios.” Como lembra MELHADO (2002) “o projeto não pode ser entendido como uma simples entrega de desenhos e memoriais; muito mais do que isso, espera-se que esse projetista esteja, antes de mais nada, comprometido com a busca de soluções para os problemas dos seus clientes”. No caso de empreendimentos de reabilitação de edifícios, dada a sua complexidade, essa busca de soluções se estenderá desde a etapa de projeto até a execução das obras. LANA e ANDERY (2001) destacam que as etapas do empreendimento são segmentadas e as soluções “vão trocando de mãos, de maneira seqüencial” e que a sinergia e a interação entre os agentes envolvidos deve ser promovida de modo a estabelecer uma visão holística do empreendimento. No decorrer do desenvolvimento dos projetos, os pontos críticos das etapas podem ser percebidos pelos projetistas das diversas especialidades. Entretanto, cada projetista está concentrado e se dedica a desenvolver a sua especialidade e para isso, busca informações que subsidiem o desenvolvimento de seu projeto. Quando não há o coordenador de projetos em um empreendimento, é comum haver conflitos de interesse entre as partes e as informações não percorrem um fluxo orientado. Nesse tipo de empreendimento, o papel do coordenador de projetos é importante para catalisar as informações e desenvolver analise sistêmica das demandas do empreendimento. Essa visão sistêmica do empreendimento resultará em ganhos no decorrer da execução da obra em termos de prazo e custo. Por ter domínio dos processos e ser o agente catalisador das informações e das tomadas de decisão, o coordenador de projetos poderá fazer a gestão de riscos do empreendimento, além da interface com os demais agentes envolvidos (empreendedor, construtor, projetistas, consultores, gerenciador, fiscalizador, etc.). MELHADO (2004) ao apresentar as principais tarefas a serem cumpridas pela coordenação de projetos afirma que parte delas está relacionada à organização e ao planejamento do processo de projeto, o que ele chama de “planejamento do processo de projeto” e a outra parte à gestão e coordenação de soluções de projeto desenvolvidas, chamada de “gestão do processo de projeto”. Na etapa de planejamento do processo de projeto o coordenador, que preferencialmente não seja o responsável por nenhuma disciplina de projeto para o empreendimento, tem condições de antever os gargalos do processo e coordenar as ações entre os projetistas envolvidos. Usualmente esse papel é desenvolvido pelo projetista de arquitetura por ser o profissional que se envolve diretamente com o cliente desde o início da concepção do empreendimento e será o responsável por alimentar os projetistas das demais disciplinas com os desenhos preliminares. Esse modelo será ilustrado através do estudo de caso apresentado a seguir. Entretanto, em alguns casos os projetistas de arquitetura desenvolvem apenas parte das funções de coordenação. A atividade de compatibilizar os projetos, ou seja, fazer a superposição dos elementos gráficos e solucionar as interferências é apenas uma das atividades da coordenação de projetos. Os projetistas das diversas especialidades se dedicam a detalhar seus projetos e dificilmente têm condições de atuar como coordenadores simultaneamente. É necessário que um profissional seja dedicado exclusivamente à atividade de coordenação, principalmente em projetos de reabilitação de edificações.

Se por um lado a etapa de projeto enfrenta os mais diferentes desafios e deve ser conduzida de forma específica, a execução da obra não é diferente. Em obras de reabilitação o enfoque da construção é a reconstrução, recuperação e reforma. Ao contrário de obras novas, a reabilitação apresenta índices de produtividade, logística, instalações de canteiro, etc. bastante diferentes. É comum que as empresas construtoras tenham receio de executar obras de reabilitação. Além da carência de detalhamento dos projetos que muitas vezes ocorre, o fator mais importante é que o conhecimento para a execução de obras dessa natureza ainda não está consolidado entre as empresas construtoras. Essas empresas que procuram especializar-se nesse tipo de empreendimento costumam utilizar-se do primeiro empreendimento de requalificação como “laboratório” para medir índices de produtividades, estudar logísticas de canteiro, selecionar e capacitar mão-de-obra própria e de subcontratados, etc. e dessa forma procuram estruturar-se para desempenhar melhor os próximos empreendimentos. A carência de índices de referência específicos para obras de reabilitação leva as empresas construtoras a estabelecer coeficientes de majoração dos índices utilizados em obras novas. A partir dessa metodologia que não estaria baseada nas condições reais, os riscos de desequilíbrio do contrato no momento da execução são maiores. O coordenador de projetos quando envolvido no empreendimento desde a sua concepção se torna um elo importante para a empresa construtora desde a etapa de orçamentação até a etapa de execução das obras, pois detêm o conhecimento do empreendimento como um todo.

3. ESTUDO DE CASO: REABILITAÇÃO DE CONDOMÍNIOS DE EDIFÍCIOS RESIDENCIAIS Edifícios residenciais constantemente estão sujeitos a processos de degradação devido a falta de manutenção sistemática e adequada. As ocorrências de patologia nas edificações encontram liberdade para se desenvolverem e normalmente ações corretivas são aplicadas quando o quadro geral está crítico. Determinadas patologias são descobertas apenas em decorrência da execução outros reparos ou serviços de melhoria. Ou seja, o objeto de reabilitação inicial cresce conforme vai se descobrindo outras patologias até então desconhecidas pelo empreendedor. Os casos que iremos estudar são empreendimento de reabilitação de edifícios de alto padrão localizados no bairro Jardins, a cidade de São Paulo – SP. Os edifícios, construídos durante a década de 70 receberam pouca manutenção nos últimos anos. As obras de reabilitação se iniciaram em 2004 e se estenderam ao longo do ano de 2005.

3.1 Modelo de gestão “caseiro” – empreendimento A O empreendimento, Caso A, é um edifício com 18 apartamentos, sendo um apartamento por andar. Os aspectos motivadores da decisão de reabilitar a edificação foram: restauração de fachadas revestidas de pastilhas cerâmicas; mudança do sistema de aquecimento de água à gás; execução de nova entrada de energia, modernização do centro de medição, execução de novas instalações no subsolo e térreo; refazimento da impermeabilização do andar térreo (problemas de infiltração de água em estágio avançado); substituição do revestimento do piso da garagem; criação de depósitos individuais e otimização da distribuição de vagas de automóveis no subsolo; troca do paisagismo do andar térreo; construção de guarita na entrada do prédio; automação dos portões de entrada; reforma no salão de festas e hall de entrada social; e modernização dos elevadores. Por decisão em assembléia do condomínio, foi contratada empresa de projetos de arquitetura para elaboração do projeto básico de modernização dos pavimentos subsolo e térreo. Não foram desenvolvidos estudos de viabilidade técnica ou prospecções detalhadas nas patologias apresentadas pela edificação para o desenvolvimento dessa etapa. Após entrega desses desenhos, o contrato com a projetista foi encerrado. De posse dos desenhos, o condomínio foi ao mercado fazer coleta de preços para saber quanto custaria a solução arquitetônica definida.

O condomínio estava decidido a realizar uma contratação a “Preço de Custo” ou “Contratação por Administração” e algumas empresas indicadas pelos condôminos foram consultadas e apresentaram seus orçamentos com base nos elementos disponíveis. Nessa etapa, o risco de haver distorções nos orçamentos foi grande, dada a precariedade dos elementos de projeto somada à vulnerabilidade da modalidade de contratação definida. A coordenação do empreendimento foi conduzida pelo síndico, apoiado pela comissão de obras do condomínio. As principais disciplinas de projetos que estariam diretamente envolvida no escopo dos serviços eram: arquitetura; restauração de fachadas; instalações elétricas; instalações hidráulicas; instalações de aquecimento à gás; piso de concreto; impermeabilização; paisagismo; elevadores; sinalização de demarcação de vagas de garagem; automação de portões; e sistemas de segurança. Entretanto, os elementos disponíveis quando do início da execução da obra eram dois projetos básicos de arquitetura (pavimento térreo e subsolo) e nenhuma empresa projetista com contrato em andamento. As evidências que seria uma execução problemática eram evidentes para os construtores e até mesmo para o síndico que, em outras situações já havia participado de empreendimentos de construção civil. Ficou à cargo da empresa construtora identificar as demandas de projetos e apresentar ao condomínio as justificativas para sua eventual contratação. A gestão do empreendimento passou a ser divida entre o síndico e o engenheiro de obra da construtora. Esse último foi induzido a exercer determinadas atividades que não eram de sua competência. Dentre essas atividades, estava a de identificar as demandas de contratação de projetos e conseqüentemente apresentar as justificativas para o síndico e comissão de obras. Além disso, quando eram aprovadas tais contratações, ele desenvolvia o programa de necessidades em conjunto com os projetistas e promovia a compatibilização de projetos. Sob essas condições, foram contratados projetistas de instalações hidráulicas, instalações elétricas e para o piso de concreto. Com exceção das instalações elétricas, o escopo de contratação dos projetistas não contemplava o acompanhamento da execução da obra. As disciplinas estavam fragmentadas e a dinâmica da obra não tinha o acompanhamento sistemático dos projetistas. As obras foram iniciadas e pouco tempo se passou quando, durante as primeiras intervenções no piso do subsolo, descobriu-se que haviam erosões nas bases das fundações do edifício. Essas erosões no solo teriam sido agravadas por fraturas nas tubulações de esgoto enterradas. A irregularidade acentuada do piso com que os condôminos conviviam diariamente indicava problemas na fundação. Toda rede de esgoto precisou ser removida e substituída. Grande parte das soluções de projeto foi desenvolvida no campo, durante a execução dos serviços. Os escopos de contratação dos projetos foram sistematicamente alterados. Os profissionais de campo tomavam decisões que, embora tivessem as melhores intenções, muitas vezes eram soluções superdimensionadas e, portanto gerava desperdício de recursos. Após o início da execução dos serviços, percebeu-se a necessidade do atendimento às legislações e normas vigentes, como adaptação do centro de medição e entrada de energia, construção de reservatório de retardamento para águas pluviais, regularização das instalações do sistema de aquecimento de água à gás, etc. A mudança das instalações de aquecimento de água à gás localizadas nos fundos do subsolo, sem a ventilação adequada, para a cobertura do edifício foi uma solução dada pela empresa construtora. Embora o condomínio desconhecesse o risco que estaria envolvido nas precárias instalações existentes concordou com a solução, uma vez que além de melhorar as condições de segurança traria economia na operação do sistema. A falta de projetos para restauração de fachadas foi outro fator gerador de desgaste entre as partes. Da parte da empresa especializada subcontratada para a execução dos serviços houve a alegação de prejuízos no contrato. Devido a falta de elementos para elaboração de seu orçamento e pela incidência elevada de serviços de recuperação e reposição de revestimento, houve atraso no cronograma e por conseqüência prejuízos financeiros, além do desgaste com os condôminos que tiveram sua privacidade comprometida por um período maior do que o planejado.

A ausência de uma coordenação de projetos adequada, acarretou em complicações mais sérias. O condômino não tomou ciência de que determinadas ações junto aos órgãos públicos deveriam ser tomadas de maneira a não comprometer o cronograma do empreendimento. A reforma no paisagismo do andar térreo necessária para a execução de novo sistema de impermeabilização da laje devido infiltrações crônicas de água no subsolo, por exemplo, estava condicionada à aprovação do poder público municipal para remoção das árvores. Esse cuidado não foi tomado a tempo e se tornou gargalo. Após longa tramitação na Prefeitura Municipal, o processo foi indeferido e toda reforma no andar térreo foi suspensa por tempo indeterminado. O resultado mais evidente da reabilitação aos olhos dos condôminos não pode ser executado. E a vulnerabilidade à infiltrações colocaria em risco toda o resultado obtido nas obras realizadas no subsolo. Essa foi parte do alto preço pago pelo condomínio pela falta de visão sistêmica do empreendimento. Os itens de serviços do escopo geral não foram atendidos plenamente quando a reserva de do fundo de obras se esgotou. A imagem do síndico e da empresa construtora foi comprometida devido as expectativas dos condôminos terem sido parcialmente atendidas. O empreendimento foi encerrado com prazo e custo previstos estourados e apenas parte do escopo original executada. Percebe-se nesse caso que a ausência de coordenação especializada, com delimitação de responsabilidades definida pode prejudicar demasiadamente o andamento de um empreendimento de reabilitação. Além disso, a carência de projetos e a forma de contratação das empresas projetistas podem influenciar diretamente nos resultados do empreendimento. A poucas quadras do empreendimento A, a reabilitação do empreendimento B estava sendo executada. Nesse caso, entretanto, empregou-se um modelo de gestão diferente que veremos a seguir.

3.2 Modelo de gestão profissional – empreendimento B As obras realizadas no empreendimento B tiveram como principal objetivo a valorização do imóvel. A reabilitação das áreas comuns desse edifício de alto padrão de 20 pavimentos, sendo 1 apartamento por andar, era apenas parte do empreendimento. O condomínio, após adquirir o terreno vizinho, contratou uma empresa de projetos de arquitetura para fossem desenvolvidos os projetos para construção de uma nova garagem e da reabilitação das áreas comuns existentes. Juntamente com os projetos, essa empresa foi contratada para realizar o gerenciamento das obras. Embora não tivesse sido formalizado pelo cliente, ficou a cargo dessa empresa a coordenação de projetos. Por motivos legais o início da construção da garagem no terreno anexo foi atrasado e o condomínio decidiu dar início às obras de reabilitação da edificação. Durante o período de aprovação dos projetos e obtenção da licença para execução das obras, foram contratados e desenvolvidos os projetos complementares sob a coordenação da projetista de arquitetura. Foi concedida autonomia a essa empresa tomar decisões em nome do condomínio. O escopo do projeto previa a incorporação de área externa ao salão de festas, criação de copa e cozinha de apoio e reforma dos sanitários; reforma no centro de medição e entrada de energia; execução de refeitórios, sanitários e salas de descanso para funcionários no subsolo; construção de guarita; troca completa de todos os portões e grades de cercamento do terreno; automação de portões; e reforma do hall social. Essa postura do condomínio de entregar o empreendimento a um profissional qualificado trouxe benefícios financeiros. Dado o nível de desenvolvimento dos projetos e da documentação técnica, foi possível contratar empresa construtora na modalidade “Preço Global”. O prazo para execução da obra foi definido contratualmente com as penalidades estabelecidas. A coordenação de projetos desenvolvida pela empresa de arquitetura trouxe ao empreendimento uma estabilidade que garantia à empresa construtora e aos subcontratados um ambiente favorável para a execução das obras.

As surpresas comuns em empreendimentos de reabilitação ocorreram, mas devido o conhecimento do projeto e das suas vulnerabilidades por parte do “coordenador” e o “clima estável” do canteiro a tomada de decisão era feita com certa naturalidade. Além do mais, sua presença periódica no canteiro de obras e sua autonomia de decisão tornou fluido o andamento dos serviços.

4. CONCLUSÃO A gestão de empreendimentos de reabilitação requer cuidados específicos. É muito comum ocorrer desequilíbrio nos contratos quando a concepção desses empreendimentos é encarada de forma inadequada e as investigações preliminares, quando realizadas, não possuem confiabilidade satisfatória. Empreendimentos de reabilitação demandam um planejamento adequado e um acompanhamento de todos os agentes envolvidos ao longo da execução. Além disso, a agilidade na tomada de decisão é fator de extrema importância para o andamento dos serviços, uma vez que as interferências são encontradas freqüentemente e suas causas não são originadas apenas pelos projetos entre si, mas também entre os projetos e a estrutura edificada existente. O projeto cumpre papel importante quando fornece elementos suficientes para a sua completa execução e principalmente quando não delega a criação de soluções ao canteiro de obras. As decisões tomadas no campo tradicionalmente não são as mais econômicas e seguras. O projeto deve chamar para si essa responsabilidade e fornecer condições para que a execução atenda os interesses dos clientes em todas as esferas. O coordenador de projetos aparece como agente principal nesse tipo empreendimento, uma vez que detém todas as informações pertinentes ao projeto e é capaz de fornecer elementos que subsidiem o desenvolvimento dos trabalhos de todos os agentes envolvidos. Além disso, a visão sistêmica e o clima de estabilidade que pode proporcionar ao canteiro de obras certamente refletirá em bons resultados para o empreendimento. Os estudos de caso apresentados retratam dois condomínios de edifícios residenciais de alto padrão na cidade de São Paulo que se utilizaram de modelos de gestão diferentes para executar suas obras de reabilitação. No primeiro caso, pouco foi investido no desenvolvimento de projetos e ainda assim de forma fragmentada. A coordenação foi precária e a atuação do preposto do cliente, embora tenha sido direta e objetiva, foi puramente intuitiva. Os resultados apresentados denotam que empreendimentos de reabilitação precisam receber cuidados de profissionais especializados. O segundo caso apresentou resultados próximos aos esperados pelo cliente. O desenvolvimento dos projetos com a antecedência adequada e sob coordenação efetiva (embora informal) proporcionou ambiente favorável para execução das obras e conseqüentemente a melhoria na qualidade dos serviços.

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