O Pesado Custo da Governabilidade: PMDB por todos os lados (Magazine)

Share Embed


Descrição do Produto

O pesado custo da governabilidade: PMDB por todos os lados Márcio Fernandes Artigo encomendado pela revista eletrônica “Publikador” e publicado em 30 de março de 2015

Ao longo das semanas anteriores, havíamos destacado a correta (ainda que parcial) percepção do Planalto quanto à necessidade de empreender uma estratégia de recomposição de sua base no Congresso. A base de apoio ao Governo Dilma já se encontrava, em princípios de fevereiro, claramente enfraquecida após o desgaste derivado da campanha à Presidência da Câmara dos Deputados (vencida por Eduardo Cunha). Caberia à cúpula do Governo empreender um movimento de aproximação junto ao PMDB. Acenando com a “bandeira branca”, a recomposição de sua coalizão e o compartilhamento de poderes e responsabilidades com o seu maior aliado seriam fundamentais para que o Governo recuperasse capacidade de enfrentamento das dificuldades econômicas e para a aprovação do pacote de ajustes fiscais no Congresso Nacional. No entanto, nas semanas imediatamente posteriores ao Carnaval, as estratégias efetivamente implementadas pelo Governo não refletiram aquele lampejo de sobrevivência política. Acumulando erros surpreendentes no tabuleiro de Brasília, Dilma isolou-se ainda mais e fez do Congresso o espaço por excelência para a afirmação do PMDB frente à Presidência da República. Consolidada a tensão entre aliados, ficou inflacionado o preço cobrado pelo partido de Eduardo Cunha para garantir a governabilidade: o PMDB cerca o Governo por todos os lados.

O Governo: paralisação e falta de comunicação diante do isolamento O Planalto insistiu em dar continuidade às ações de isolamento do PMDB ao mesmo tempo em que buscava uma afirmação direta de Dilma junto a grupos organizados na sociedade. A velocidade das derrotas no Congresso, a rápida reorganização do PMDB em torno de Eduardo Cunha e Renan Calheiros (auxiliada pelo protagonismo discreto de Michel Temer) e a forte reação negativa das manifestações de 15 de março deram ao Governo a amarga lição de que sua estratégia havia falhado em todas as frentes. Como reflexo desta consciência, a Secretaria de Comunicação Social (umas das artífices do arriscado plano de comunicação direta da Presidenta) foi atingida com a queda de Thomas Traumann, chefe da pasta até a semana passada. Entre aqueles que acompanham o dia a dia da política pelos corredores de Brasília, é sintomática a ausência de novas informações quanto àquilo que a Presidência da República pretende fazer como estratégia de reação. O silêncio tem sido interpretado de forma simples (e preocupante): não há sinalizações porque ainda não existe um plano claramente definido. Alimenta-se, assim, a ideia de um ambiente de paralisação política. Por outro lado, o Gabinete da Presidenta da República (moralmente abalado pelas sucessivas derrotas) tem dificuldades em

aceitar a constatação de que a manutenção da governabilidade (que ainda não foi totalmente perdida) dependerá de uma ampla e aberta concertação com o PMDB. No entanto, no atual estágio dos acontecimentos, não poderá haver ilusões: a relação é assimétrica e o PMDB encontra-se em ampla vantagem. A estabilização do quadro de governabilidade com o apoio do PMDB dependeria de um notório compartilhamento de poder com aquele partido. Na hipótese de que este cenário não se concretize, o PMDB poderia manterse confortável em sua estratégia de afastamento do Governo Dilma. Seria um cenário amplamente prejudicial para o PT e para a sua manutenção no Palácio do Planalto.

O Congresso Nacional: reflexos de protagonismo do PMDB em uma semana encurtada As perspectivas de agenda do Congresso Nacional para a próxima semana refletem parte desta dinâmica de ascendência do PMDB sobre o Governo. Encurtada em virtude do feriado da Páscoa, a agenda da Câmara dos Deputados continuará concentrada na votação de projetos relativos ao “pacote de Segurança”. A temática reflete a ampla disposição da atual Mesa da Casa em aumentar o rigor na punição de determinados crimes, fortalecendo prerrogativas de agentes da segurança pública (o que contraria a posição de determinados setores do PT no Congresso, mais próximos às pautas dos chamados movimentos sociais). Eduardo Cunha também manifestou sua intenção de votar em 2º turno a PEC n.º 457/2005 (que estende de 70 para 75 anos de idade a aposentadoria compulsória de ministros de tribunais superiores). A promulgação da PEC poderia impedir o Governo Dilma de indicar novos ministros do STF até 2018, motivo pelo qual a Presidência da República se opõe à aprovação da matéria. No Senado Federal, as atenções estarão voltadas para a visita do Ministro da Fazenda, Joaquim Levy, à Comissão de Assuntos Econômicos e para a votação em Plenário do PLC n.º 2/2015, que trata do “Marco Legal da Biodiversidade”. Por estabelecer as regras para a repartição de benefícios financeiros derivados da exploração de patrimônio genético, o projeto tem dividido parlamentares alinhados a movimentos ambientalistas e a populações tradicionais, de um lado, e a grupos empresariais e de pesquisa científica, de outro. Ainda que marginalmente, as discussões também têm dividido PT e PMDB no Congresso, que se apoiam em distintos grupos de pressão. A votação está prevista para a próxima 3ª feira e seu resultado poderá servir de termômetro para avaliar o grau de contaminação do Senado diante do ambiente de enorme indisposição para a votação uníssona do PT e do PMDB. Por isso, a liderança do Governo no Senado trabalha para o adiamento da votação para a semana seguinte. De qualquer modo, na perspectiva do Planalto, uma incômoda necessidade permanece: é preciso interagir com o PMDB em todas as frentes.

Márcio Fernandes é cientista político formado pela Universidade de Brasília (UnB) e mestre em História Econômica pela Universidade de Coimbra. Exerceu funções como pesquisador-visitante na Universidade de Salamanca, na Espanha, e hoje trabalha acompanhando o Congresso Nacional em Brasília, de onde envia suas percepções sobre os bastidores da política e do poder na capital da República.

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.