O Politicamente Correto e a Publicidade: O caso Brasileiro no ano de 2012

July 27, 2017 | Autor: Priscila Souza | Categoria: Social Movements, Publicidade E Propaganda, Political Correctness
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ PRISCILA DO ROCIO OLIVEIRA DE SOUZA

O POLITICAMENTE CORRETO E A PUBLICIDADE: O CASO BRASILEIRO NO ANO DE 2012

CURITIBA 2014

PRISCILA DO ROCIO OLIVEIRA DE SOUZA

O POLITICAMENTE CORRETO E A PUBLICIDADE: O CASO BRASILEIRO NO ANO DE 2012

Monografia apresentada ao curso de Bacharelado em Ciências Sociais do Setor de Ciências Humanas da Universidade Federal do Paraná, como requisito parcial à obtenção do título de bacharel em Ciências Sociais. Orientadora: Prof.ª Drª. Maria Tarcisa Silva Bega.

CURITIBA 2014

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 - Propaganda DM9 19 Figura 2 – Propaganda Azeite Gallo 25 Figura 3 – Propaganda Duloren 29 Figura 4 – Propaganda Prudence 33 Figura 5 – Propaganda Volkswagen 39 Figura 6 – Propaganda VW anos 60 43 Figura 7 – Propaganda VW anos 60 (2) 44

LISTA DE TABELA

TABELA 1 – Ranking De Venda De Automóveis Na Europa 2014 38

RESUMO

O presente trabalho analisa como o discurso do politicamente correto foi construído ao longo dos tempos e a maneira como os movimentos sociais, principalmente, o têm usado para combater as discriminações que são visualizadas nas peças publicitárias de diversas empresas de publicidade e propaganda, partindo da hipótese de que o mesmo tem influenciado de alguma forma as mesmas. São analisadas algumas peças que sofreram, de alguma forma, críticas quanto ao conteúdo que apresentavam, tentando identificar quais são os grupos e quais os espaços que utilizaram para fazer suas denúncias e como a lógica do discurso foi construída para legitimar suas críticas. Para esta verificação veremos como os movimentos sociais têm através de pesquisas de cunho acadêmico e da sua luta em prol dos seus direitos, denunciado os diversos tipos de preconceito que podemos encontrar nas mais diversas camadas da sociedade e que encontra raízes numa ordem hegemônica brasileira e como elas se empoderam da liberdade de expressão para se justificar e se perpetuar.

Palavras-chave: politicamente correto, movimentos sociais, propaganda.

ABSTRACT

This study aims to examine how the discourse of political correctness was built over time, and how social movements mainly has used it in order to combat discrimination. In this work were visualized advertisements from several agencies, on the assumption that it has influenced them in some way. Therefore, I intend to analyze the parts that had been criticized because of the content presented, trying to identify who these groups are and what areas they used to make their complains and how the logic of the speech were constructed to legitimate the criticism. For this check I will seek to demonstrate how social movements have, through academic-based studies, and their struggle for their rights, denounced several kinds of prejudice that can be found in plenty of these actions of society and which finds its roots in a hegemonic Brazilian order, and empowers itself of the freedom of expression to justify and perpetuate prejudice.

Keywords: political correctness, social movements, propaganda.

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO............................................................................................................07 1. DO SURGIMENTO DO POLITICAMENTE CORRETO ...................................... 10 1.2 O MULTICULTURALISMO E AS IDENTIDADES ............................................... 11 1.2 LINGUAGEM E SOCIEDADE ............................................................................. 13 1.3 O POLITICAMENTE CORRETO HOJE .............................................................. 15 2. PUBLICIDADE E SOCIEDADE: O PAPEL DA PUBLICIDADE ........................ 18 2.1 MARCOS LEGAIS .............................................................................................. 20 3. ANÁLISE DE CASOS ........................................................................................ 23 3.1 AZEITE GALLO ................................................................................................... 23 3.2 DULOREN .......................................................................................................... 26 3.3 PRUDENCE ........................................................................................................ 30 3.4 VOLKSWAGEN ................................................................................................... 36 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 44 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................... 51 ANEXOS ................................................................................................................... 53

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INTRODUÇÃO

Esta pesquisa teve início no ano de 2012, devido a uma percepção pessoal de que as redes sociais vêm sendo usadas cada vez mais como forma de denúncia. Observamos que esse meio é propício para apreender as mais diversas opiniões, e como estas têm sido expostas com argumentos que vão desde o senso comum aos baseados no conhecimento acadêmico. As redes sociais e a internet como um todo, têm hoje, além de um grande alcance, uma velocidade de transmissão de todo tipo de mensagem e alcança de um continente ao outro em segundos. Durante nossa trajetória diária somos bombardeados com as mais diversas imagens que vão das mais variadas formas de arte às mais simples formas visuais. Estas imagens carregam em si mensagens implícitas ou explicitas, conforme a intenção de quem a produz, e estas mensagens serão lidas ou entendidas de maneira diferente por quem as recebe. Dentre os assuntos atuais que geram grande polêmica, visto a tamanha discordância de opiniões que sugere, encontramos o politicamente correto. Esta categoria analítica tem sido abrangida em diversas áreas das ciências humanas como: social, cultural e linguística.E têm como intuito demonstrar uma atitude política que visa fazer com que o uso da linguagem – seja ela escrita, oral ou publicitária – seja isenta de pressupostos, implícitos ou explícitos, de preconceito racial, de gênero ou referente a qualquer outro grupo social que historicamente tenha sido subjugado na sociedade. Quando se busca agir de forma politicamente correta, censurando certos comportamentos,

usos

da

linguagem

e

também

certas

representações

culturais,opera-se segundo certos valores e não conforme um único valor, ou seja, consideram-se os diferentes sujeitos que compõem a sociedade, sobretudo no momento em que esses novos sujeitos emergem nas esferas sociais, a partir da segunda metade do século XX, como os negros, as mulheres, e os homossexuais. Assim, o politicamente correto não é simplesmente uma atitude caprichosa de pessoas que se ofendem com qualquer palavra ou ação, senão faz parte da luta de

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minorias que exigem o respeito às suas identidades, sejam elas referentes à etnia, à orientação sexual, classe social, etc. Verificaremos o porquê desta categoria analítica causar polêmica e quais são as pessoas ou grupos que a defendem e em que meios estes grupos sociais emergem para legitimar as possíveis críticas a respeito de um determinado objeto que apresente algum tipo de preconceito. Veremos, assim, no decorrer do trabalho, como no ano de 2012, algumas peças publicitárias sofreram fortes críticas dos mais diversos movimentos e nos mais variados meios de comunicação. Examinaremos quais peças foram estas e quais os motivos destas críticas, qual foi a posição da empresa responsável pela veiculação delas e os desdobramentos que houve no decorrer dos processos. Ao longo do trabalho, demonstraremos, por um lado, quem são as pessoas que têm percepção do politicamente correto, quem o define, e como se dá a produção e a recepção. Por outro lado, como as empresas se posicionaram diante das críticas, e o processo de negociação que é feito quando uma peça é apontada como politicamente incorreta. Apartir destas duas abordagens, tentaremos compreender como este discurso tem influenciado as grandes mídias, em particular a mídia impressa que é o foco deste trabalho. A escolha deste tema justifica-se no sentido de contribuir pelas vias das Ciências Sociais a uma temática que comumente se debate, mas que fica muitas vezes atribuído à Linguística os diversos trabalhos a respeito do assunto. Na área da Linguística vemos que o debate se desenvolve com relação à uma transformação no léxico que se daria pelo politicamente correto, as discussões no entanto que se desenvolvem no campo da Linguística acaba por não trazer como um todo, uma discussão mais sociológica sobre o que de fato estas mudanças propostas pretendem. Nas Ciências Sociais grande parte dos trabalhos na área foram desenvolvidos fora do país e por pesquisadores estrangeiros. Meu interesse na pesquisa se dá pelos anos de desenvolvimento de pesquisas junto ao Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros – NEAB com a temática das relações raciais, que têm justamente proximidade com o tema, assim, a falta de trabalhos na área sobre tema bastante atual, me levou à investigação da temática.

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No primeiro capítulo é apresentado um histórico do surgimento do politicamente correto, buscando localizar o momento em que ele começa a ser difundido na sociedade e as suas implicações até os dias atuais pensando desde as questões relativas às identidades dos sujeitos, até sua presença nas falas cotidianas. Na área da linguística podemos pensar o desenvolvimento do politicamente correto como uma transformação da linguagem, mas será que haveria uma forma de se comunicar de maneira neutra, ou que não fosse discriminadora? Tentaremos responder a essas questões. O segundo capítulo se investiga como a publicidade tem importância na sociedade e de que forma e qual linguagem ela utiliza para transmitir as mensagens que produz, sendo não apenas um difusor de publicidade mas também cultural, visto que, a propaganda pode ser utilizada por diversas esferas da sociedade para difundir não apenas bens e produtos mas também ideologias e formas de viver. O capítulo final apresenta a análise das peças publicitárias escolhidas que sofreram com crítica sem relação ao seu conteúdo, procurando demonstrar como foi acionado o politicamente correto e por quais vias. Analisamos como as agências de publicidade e propaganda poderiam fazer quanto a essas críticas e processos, assim como se o politicamente correto pode ter algum tipo de influência na sociedade e como esta influencia-se desenvolve e porquê. A pesquisa procura esclarecer quais as mudanças que podem ter ocorrido num campo sócio-histórico que dá embasamento ao politicamente correto.

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1. DO SURGIMENTO DO POLITICAMENTE CORRETO

Quanto à investigação da origem do politicamente correto, nos deparamos com fontes que remetem à informação que seu surgimento se deu nos Estados Unidos. O conceito de politicamente correto surge nos Estados Unidos como uma forma combater discriminações em áreas que vão da cultura à da linguagem.

“O chamado comportamento 'politicamente correto' surgiu no final dos anos 80, mas se popularizou mesmo na década seguinte, no primeiro mandato do ex-presidente Bill Clinton. Tinha a intenção de instaurar na indústria cultural um clima em que ninguém ofendia ninguém. A intenção é boa, claro, mas muita gente temia que isso fosse tirar o humor da face da Terra”. (HALLKACK, Revista Época 2011)

Wilson (1995, p. 03) nos remete mais distante quanto ao surgimento da palavra, data sua primeira aparição em 1793, na Suprema Corte Americana, no caso Chisholm v. Georgia1, em que dois cidadãos da Carolina do Sul entraram com uma ação contra aquele estado.O autor expõe ainda que foi na década de1990 que o politicamente correto se difundiu nos Estados Unidos, segundo ele os críticos conservadores viam o politicamente correto como uma espécie de conspiração liderada por estudantes e professores de esquerda e, segundo as descrições de artigos de revistas e diversos editoriais eram tidos como um reino de terror nas universidades americanas: Within the span of a few months, the media produced a barrage of articles each a variation on a single theme: that leftists totalitarians had taken control of universities and were intimidating professors, censoring conservatives, politicizing curricula, and imposing a new „McCarthysm of Left‟ on higher 2 education. (WILSON, JOHN K, 1995, p. 01)

Wilson demonstra ao longo de sua obra como os conservadores procuram criar mitos a respeito do politicamente correto, uma vez que seu livro está falando sobre o espaço da universidade, um espaço que fora antes ocupado por uma determinada elite intelectual conservadora que com o advento das ações afirmativas passa a se 1

A integra do caso pode ser acessada em: 2 “No espaço de poucos meses, a mídia produziu uma enxurrada de artigos de uma variação cada sobre um único tema: a de que esquerdistas totalitários tinham tomado o controle de universidades e estavam intimidando professores, censurando conservadores, politizando currículos, e impondo um novo „Macarthismo de Esquerda‟ no ensino superior”.

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incomodar com estes novos agregados. Os conservadores americanos travaram assim,

uma

espécie

de

guerra

cultural,

fazendo

com

que

temas

como

multiculturalismo, os códigos de fala e ação afirmativa fossem distorcidos e apresentados fora de proporção. Sendo assim, estes se esforçavam para apresentar um quadro no qual, os professores estavam sendo silenciados por verdadeiros radicais do sistema universitário, sem falar no fato de se colocarem como vítimas de uma ideologia esquerdista que estaria ameaçando suas liberdades civis. Estas alegações vistas nos Estados Unidos no início da década de 1990 puderam ser visualizadas aqui no Brasil quando se debatia a implementação das ações afirmativas nas universidades do país, do mesmo modo que os conservadores americanos afirmavam que tais políticas arruinariam o ensino superior, o grupo hegemônico que sempre ocupou o espaço acadêmico e demais esferas de poder na sociedade brasileira, se posicionou com iguais argumentos. Wilson então se propõe a provar que cada mito difundido a respeito do politicamente correto é totalmente errado e de criação conservadora.

1.2

O MULTICULTURALISMO E AS IDENTIDADES

Como vimos acima, os conservadores passaram a atacar entre outras coisas, o multiculturalismo. Entenderemos a seguir o porquê deste tema servir de alvo no que diz respeito ao politicamente correto. Stuart Hall (2003), então vai definir uma diferença entre os termos “multicultural” e “multiculturalismo”, sendo o primeiro para ele, um termo qualificativo que tem como intuito descrever como: Características sociais e os problemas de governabilidade apresentados por qualquer sociedade na qual diferentes comunidades culturais convivem e tentam construir uma vida em comum, ao mesmo tempo em que retêm algo de sua identidade „original‟ (pg.52).

Já o termo multiculturalismo, que é o que mais nos interessa no momento, é definido como um substantivo, servindo como finalidade de “estratégias e políticas adotadas para governar ou administrar problemas de diversidade e multiplicidade gerados pelas sociedades multiculturais” (pg.52).

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Desta forma, então, podemos dizer que o multiculturalismo que é atacado nos Estados Unidos, é aquele que tem como principal preocupação o uso político o chamado “direito das minorias”, sejam elas étnicas, de gênero ou classe, entre outras, ganhando não apenas adeptos mas visibilizando-os e assim criando desconforto no status quo. Stuart Hall ainda nos expõe que o multiculturalismo, é um termo mais complexo do que a descrição acima, visto as diferenças multiculturais encontradas nos diversos países em que é invocado. Stuart Hall (2006) nos traz a discussão a respeito das identidades culturais e as mudanças que estas estariam sofrendo na modernidade tardia. As identidades antes tidas como fixas, passam a sofrer um descentramento, forçando assim, uma mudança em todo o sistema social uma vez que as estruturas estariam passando por um processo de pluralização, isso graças à globalização. É neste momento de descentramento que vemos surgir novas variações ou modalidades de movimentos dentro dos próprios movimentos que já existiam, ou seja, dentro do movimento das mulheres surge o movimento das mulheres negras que reivindicam direitos a partir das suas especificidades, no movimento dos homossexuais este se divide entre as reivindicações das lésbicas e das/dos transexuais. Isto ocorre porque tais grupos que antes pareciam unificados diante de uma única bandeira de luta, trazem à tona as discriminações que sofriam tanto em relação à sociedade quanto em relação à partilha de poder e de visibilidade no interior do movimento, devido ao pertencimento de sua identidade cultural, e são estas diferenças que vão dar bases para a difusão do multiculturalismo trazendo à tona as reivindicações específicas de cada grupo. As mudanças que ocorreram na sociedade se refletem também na academia, nas ciências humanas vemos Margareth Rago (1999), por exemplo, demonstrar que o surgimento de novos atores sociais, modificam a escrita da historiografia brasileira que antes era feita por um determinado grupo hegemônico, passa então a ser contada por aqueles que antes eram pesquisados ou até invisibilizado na História. Sendo que isto somente foi possível devido a entrada atores destes grupos nos cursos de pós-graduação nas décadas de 1960 e 1970. “novos grupos sociais, étnicos e sexuais passaram a participar da vida pública trazendo suas questões e reivindicações e, ao mesmo tempo, ampliando formas estética e de consumo. As mulheres principalmente,

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entraram agressivamente no mercado, participando dos cursos nas universidades, nas escolas e em outras instituições, enquanto o movimento feminista levou grande número às praças públicas, exigindo novos direitos sociais e sexuais, os negros colocaram suas demandas na agenda pública, enquanto o movimento operário se organizava nos grandes centros industriais e propunha a criação de um importante partido político de massas; os jovens entre os quais muitos estudantes, passaram a compor um contingente político expressivo”. (STEPAN, 1988 apud RAGO, 1999)

Na visão de HALL (2006), o sujeito pós-moderno possui como principal característica

uma

constantemente,

identidade

sendo

que

móvel esta

não

que

seria

seria

formada

definida

e

transformada

biologicamente,

mas

historicamente a partir dos processos culturais que nos rodeiam, sendo então acionada.

1.2 LINGUAGEM E SOCIEDADE

Michael Denning expõe que o politicamente correto nasce de uma vontade por um “tipo de etiqueta ou protocolo comum que regulem as relações entre as comunidades que não possuam laços fortes. Um código impessoal que administra certa diplomacia entre elementos dispares da esquerda. ” (1990, apud, SHOHAT e STAM, 2006et al., p. 443). Para AVELAR, o que está em questão não é somente o fato de haver ou não uma neutralidade dos sujeitos que usam a linguagem. Mas do fato de que “os próprios vocábulos, estruturas e entonações da língua trazem consigo uma história carregada de sentidos culturais e políticos [e], não é do interesse dos que lutam ao lado dos mais fracos ignorar ou minimizar essa história.” (AVELAR, 2011, p. 02). Dito de outra forma, nada é dito por acaso porque a língua não é neutra. As brincadeiras, charges, publicidades com fundo humorístico, têm em si uma carga de valores culturais ou políticos, depreciativos ou não, de todo e qualquer grupo. Mesmo porque, o humor é um dos recursos usados para prender a atenção de seu interlocutor. A questão é: quem vai decidir o que dizer ou não, ou se o que se diz é certo ou não. O Estado? O

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mercado? A Mídia? Os movimentos sociais? As organizações não governamentais? A sociedade civil em comum acordo? E essa ação se manifesta no humor, na linguagem ou na publicidade acaba por vezes não tendo o cuidado em observar se se está sendo racista, machista, homofóbico ou se está desmerecendo algum grupo social.Por vezes, é possível dizer que essa falta de cuidado pode ser advinda de grupos que defendem a liberdade de expressão3 ou o ainda chamado “politicamente incorreto”. Temos que ter em mente o fato que “tudo que é expresso em palavras, carrega, consigo, mensagens implícitas” (ROSSONI, 2009, pág. 07), sendo assim, certas palavras sozinhas ou acompanhadas por outras expõem uma carga cultural na sua exposição, desta forma, “muito mais é comunicado do que simplesmente o dito explicitamente pelo falante”(pág. 08). A fala humana é algo natural no que diz respeito à capacidade de emitir sons, mas é somente a partir da linguagem que estes sons ganham aspectos voltados para a comunicação. Esta, é estruturada para informar ideias, significados e pensamentos, e toda a construção desta linguagem passa por conteúdos e interesses culturais, sociais e históricos. Desta forma, a linguagem pode ser utilizada das mais diversas maneiras e fins, BAGNO expõe que a linguagem é “de todos os instrumentos de controle e coerção social, talvez o mais complexo e sutil” (2003, apud ROSSONI, 2009et al., pág.11), assim determinados grupos que detêm certo conhecimento a respeito da linguagem pode utilizá-la para manipular interesses pessoais ou de um grupo. A linguagem tem a possibilidade e poder de exprimir não só desejos, vontades, preferências, como também ideologias e crenças. É evitando que essa expressão possa transmitir alguma idéia errônea do que o falante pretende ao comunicar-se que se percebeu o cuidado em “lapidar” as palavras e expressões lingüísticas a serem usadas. (ROSSONI, 2009, pág.13)

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Estes grupos são formados geralmente por indivíduos do humor, como podemos ver no documentário “O riso dos outros”, e ainda publicitários, e intelectuais dos estudos da linguagem, que veem no politicamente correto uma forma de ditadura da linguagem.

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Podemos pensar a partir desta perspectiva o que realmente as mudanças nos significados das palavras nos informam? A comunicação é hoje a ferramenta mais eficaz para o intercâmbio dos mais variados tipos. A linguagem e suas modificações propostas demonstram que os novos atores emergidos nas décadas de 1960 e 1970 buscaram demonstrar suas identidades na sociedade de modo a reivindicar direitos específicos para o grupo a que pertenciam, porém a partir dos anos 1980 esses atores emergidos que antes afirmavam sua identidade, trazem diversas questões que passam a redefinir o que diz respeito às suas identidades e sua relação na sociedade, assim o politicamente correto surge nesta configuração sociocultural sendo apoiada por estes atores pós-modernos que são caracterizados pela sua pluralidade, flexibilidade, fragmentação e mobilidade. Os atores passam por um processo que os permite que os permite assumir várias identidades convenientes a diferentes contextos. Este processo ao qual os atores passam segundo HALL (2003) seria a globalização “A globalização tem, sim, o efeito de contestar e deslocar as identidades centradas e „fechadas‟ de uma cultura nacional. Ela tem um efeito pluralizante sobre as identidades, produzindo uma variedade de possibilidades e novas posições de identificação [...]. Em toda parte, estão emergindo identidades culturais que não são fixas, mas que estão suspensas, em transição, entre diferentes posições; que retiram seus recursos, ao mesmo tempo, de diferentes tradições culturais: e que são o produto desses complicados cruzamentos e misturas culturais que são cada vez mais comuns num mundo globalizado” (HALL, 2003, p. 87-88).

Sendo assim, pode-se observar que as identidades se deslocam e se cruzam constantemente, as identidades que antes se caracterizavam como algo automático agora figuram mais politizadas, podem ser ganhadas ou perdidas. Este processo é visto como uma mudança de uma política de identidade de classes para uma política de diferença, sendo esta que sustenta todo o processo. (HALL, 2003).

1.3 O POLITICAMENTE CORRETO HOJE

O politicamente correto tem tanta importância nos dias de hoje que o governo federal via Secretaria Especial de Direitos Humanos, lançou em 2004 no primeiro

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mandato do governo Lula, uma cartilha chamada: Politicamente Correto e Direitos Humanos. A cartilha pode ser encontrada online ainda e teve uma tiragem de 5 mil exemplares de distribuição gratuita. Em formato de glossário, traz não apenas palavras, mas expressões que são acompanhadas de uma explicação da mesma e a conotação que carrega na sua expressão. A cartilha é uma espécie de manual que traz ainda a maneira correta de se utilizar determinados termos ou expressões. No documentário lançado em 2012 chamado: “O riso dos outros”, o cineasta Pedro Arantes tratou da questão do politicamente correto pela via do humor e abordou o fato de muitos humoristas do gênero stand up se utilizarem deste meio para destilarem piadas contra alguns grupos sociais. O documentário trouxe para o seu debate, pessoas a favor e contra o politicamente correto, no caso dos humoristas havia uma divisão dos favoráveis e dos contrários. Entre os favoráveis a argumentação era de que não havia necessidade de se fazer humor com determinados grupos, tendo a possibilidade de outras formas de humor, sendo então o ataque a esses grupos discriminados nada mais que um humor muito raso, podendo ainda se fazer um humor voltado para o lado do opressor ao invés dos oprimidos. Os humoristas contrários ao politicamente correto diziam que no campo do humor sempre se tem um alvo e se as pessoas riem destas piadas é porque existe um público pra ela, e por esta razão os humoristas ainda a utilizam. No Brasil a discussão a respeito do politicamente correto tem se expandido, mas ficado ainda nas áreas da Linguística e Comunicação em geral, o governo tem um interesse a respeito, ou no mínimo demonstrou não estar totalmente avesso à discussão, mas o tema é muito polêmico e de difícil resolução. A cartilha do Politicamente Correto lançada, creio ter tido boas intenções, mas de certa forma tinha propósitos muito grandes que não podem ser resolvidos apenas com a impressão de um manual linguístico, sendo um trabalho de longo prazo pelas vias da educação e cultura do país. Atualmente o politicamente correto, no Brasil tem sua discussão voltada mais para as áreas da Linguística, ficando o debate voltado às questões relacionadas aos usos da língua, e em alguns casos para a Comunicação e Jornalismo aqui vinculado à discussão sobre a defesa da liberdade de expressão. Sírio Possenti é um dos pesquisadores da área de Linguística que hoje discute o politicamente correto, pesquisa piadas e dentro destas pesquisas está sua

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discussão sobre o politicamente correto. Possenti tem sua importância e reconhecimento na Linguística, porém suas análises não levam em consideração os aspectos socioculturais e históricos que a linguagem carrega em si. Em palestra realizada em 2013 na semana de Letras da UFPR, ele chegou a defender que haveria um lugar onde certas piadas politicamente incorretas pudessem ser feitas, sendo este espaço, por exemplo, as casas que apresentam os chamados Stand up‟s. O que não pode ser deixado de lado nesta discussão é que o politicamente correto na visão pós-moderna de HALL (2003) ressalta a política da diferença como forma de representação. No que diz respeito a linguagem, esta também sofre um descentramento uma vez que “A língua é um sistema social e não um sistema individual. Ela preexiste a nós. Não podemos, em qualquer sentido simples, ser seus autores. Falar uma língua não significa apenas expressar nossos pensamentos mais interiores e originais; significa também ativar a gama de significados que já estão embutidos em nossos sistemas culturais.” (HALL, 2003, pág.40)

Desta forma, não são apenas as identidades que passam por um processo de descentramento, mas toda a estrutura social, não há como frear as demandas advindas destes novos sujeitos que emergem com suas especificidades, também não há como uniformizar a língua para que preconceitos sejam diminuídos no uso diário da fala e da comunicação, tendo em vista não somente a grande heterogeneidade social que nos informa que aquilo que é mal visto para uns pode não ser para outros e por esta razão as liberdades não podem sofrer igual opressão, como as que são impostas quando se nega determinadas especificidades nas identidades.

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2.

PUBLICIDADE E SOCIEDADE: O PAPEL DA PUBLICIDADE

A publicidade surgiu da necessidade não apenas de empresas, mas de governos de persuadir as pessoas quanto aos seus propósitos. No meio político ela foi utilizada por Stálin intensamente para propagar a visão de que este representava o pai do povo. Na Alemanha da década de 1930 e 1940, vemos como a propaganda foi essencial para o desenvolvimento dos ideais do Partido Nazista. Sob a responsabilidade de Joseph Goebbels no Ministério da Propaganda do Reich, foi possível influenciar a sociedade alemã a partir do controle da mídia em geral, o governo tendo o controle da imprensa, rádio, teatro, cinema, etc., difundiu não só na sua visão de orgulho da raça ariana, como também a devoção, obediência e fidelidade ao Führer. A propaganda ao longo das décadas seguintes continuou a ser utilizada como uma forma de persuadir quem tivesse acesso a ela, tanto no nível de mercado como no nível institucional. O reconhecimento da força que a propaganda nos diferentes meios em que é utilizada foi lembrada em 1994, na campanha da APP (Associação Paulista de Propaganda) desenvolvida pela agência DM9, conforme nos lembra BELLELI (2005), sendo que esta faz alusão à história do Partido Nazista.

FIGURA 1- PROPAGANDA DM9

FONTE: BELELLI (2005)

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Na sociedade de consumo a publicidade é fundamental para a influência de atitudes, se utiliza de artifícios argumentativos, humor, e simbolismo para convencer as pessoas de que elas devem utilizar um bem ou produto.A publicidade e a propaganda podem ser caracterizadas então como o braço simbólico do consumo, como condição essencial para a sociedade industrial e de consumo. Vende tanto sabonete, como ilusões até posições políticas. A publicidade e propaganda se mostram assim, essenciais para a política, pois nas campanhas eleitorais elas são uma das principais bases do partido, uma vez que a partir da maneira como ela é feita, quais argumentos aciona para persuadir o eleitor é que pode-se ver sua eficácia. Há hoje em dia uma preocupação por parte da publicidade com relação ao seu conteúdo, sendo que este não pode apresentar algo enganoso e antiético ao consumidor. Segundo ARBACH (2005), a preocupação das agências publicitárias com o politicamente correto, ou com uma forma de representação dos diversos grupos sociais se dá de fato com as campanhas do espaço público, pois este já apresenta uma preocupação em representar os diversos grupos étnicos, de geração, gênero e deficientes da sociedade brasileira. Para ele “A preocupação com o politicamente correto nas campanhas educativas tem sido constante no cotidiano dos publicitários que atendem Governos, terceiro setor e outras instituições que trabalham com a divulgação de idéias e conceitos referentes ao comportamento social.” (ARBACH, 2005, pg. 07)

As agências que prestam serviços publicitários para o setor público podem apenas estar preocupados com estas questões devido a um pedido do governo no formato de suas peças, uma pesquisa mais aprofundada a respeito das agências publicitárias poderia responder a esta questão sendo deixada de fora deste trabalho por enquanto. Arbach nos informa que as peças do governo são desenvolvidas, “com base em briefings4 e apresentadas a um conselho executivo responsável por avaliar a

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Palavra inglesa que significa resumo em português. É um documento contendo a descrição da situação de uma marca ou empresa, seus problemas, oportunidades, objetivos e recursos para atingi-los. O briefing é umprocessoutilizado na áreaadministrativa, porprofissionais da comunicação, relaçõespúblicas e publicitários, sendo a base de umprocesso de planejamento. Numa agência de propaganda o briefing é umadasetapasfundamentais deprocessopublicitário. É umprocessocontínuo e cumulativoatravés de todos os estágios do planejamento de propaganda. Significa a passagem de informação de umapessoa para outra, especialmente do anunciante para o executivo de

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qualidade e aprovar, ou não, a veiculação das campanhas”. (2005, pg.22). Este grupo de briefing foi criado justamente para que os membros pudessem dar as suas impressões a respeito das peças para que se evitasse possíveis mal-entendidos, pois sendo o governo responsável por sua veiculação tem mais responsabilidades quanto a qualquer tipo de discriminação com relação à população, tendo assim a preocupação de representar/incluir todos os grupos sociais possíveis em suas campanhas. A propaganda, portanto, pode influenciar inclusive no preço dos produtos, um produto mais procurado pode ter seu preço elevado visto o poder da marca. Sendo assim a propaganda bem desenvolvida pode influenciar não apenas de formas ideológicas mas principalmente econômicas, sua atuação está nos mais diversos espaços da sociedade.

2.1 MARCOS LEGAIS No Brasil, desde 1980 existe uma regulamentação da publicidade que é feita pelo Conselho Nacional de Auto-regulamentação Publicitária (CONAR). Trata-se de uma Organização não governamental que, segundo informações encontradas no site do próprio conselho, encarrega-se de fazer valer o Código Brasileiro de Autoregulamentação Publicitária e tem como missão impedir que a publicidade enganosa ou abusiva cause constrangimento ao consumidor ou a empresas e defender a liberdade de expressão comercial.

“O Código Brasileiro de Auto-regulamentação Publicitária nasceu de uma ameaça ao setor: no final dos anos 70, o governo federal pensava em sancionar uma lei criando uma espécie de censura prévia à propaganda. Se a lei fosse implantada, nenhum anúncio poderia ser veiculado sem que antes recebesse um carimbo “De Acordo” ou algo parecido. A criação do departamento para controle da publicidade exigiria a contratação de algumas centenas de funcionários. As implicações burocráticas seriam inimagináveis ainda assim desprezíveis diante do retrocesso que tal controle representaria para um país que reconquistava a duras penas seu direito à liberdade de expressão. Diante dessa ameaça, uma resposta inspirada: autoregulamentação, sintetizada num Código, que teria a função de zelar pela liberdade de expressão comercial e defender os interesses das partes atendimento e deste para os demaisprofissionaisenvolvidos no processo.Informações disponíveis em : . Acessoem: 06 de junho de 2014.

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envolvidas no mercado publicitário, inclusive os do consumidor. A ideia brotou naturalmente a partir do modelo inglês e ganhou força pelas mãos de alguns dos maiores nomes da publicidade brasileira.” (website do CONAR)

Antes da fundação do CONAR, foi redigido em 1970, O Código Brasileiro de Auto-regulamentação Publicitária. Em 1978 ele foi aprovado durante o 3º Congresso Brasileiro de Propaganda, realizado em São Paulo, que fora convocado pelo presidente da Associação Paulista de Propaganda, Luiz Celso de Piratininga, hoje vice-presidente do CONAR. Em 1979 é fundada a Comissão Nacional de Autoregulamentação Publicitária, a CONAR, que promoveu as primeiras conciliações e julgamentos. A Comissão é presidida por Geraldo Alonso, tendo Salles como relator apoiado por Saulo Ramos e Fábio Monteiro. E, em 05 de maio de 1980 o CONAR é fundado, ficando a sua sede em São Paulo (Página do CONAR). Desde sua fundação o CONAR já instaurou mais de 7 mil processos éticos e promoveu um sem-número de conciliações entre associados em conflito. Nunca foi desrespeitado pelos veículos de comunicação e, nas raras vezes em que foi questionado na Justiça, saiu-se vitorioso. (Página do CONAR) O conselho procura atender principalmente denúncias de consumidores, autoridades, associados ou as formuladas pelos integrantes da própria diretoria. As denúncias são julgadas pelo Conselho de Ética, com total e plena garantia de direito de defesa aos responsáveis pelo anúncio. Quando comprovada a procedência de uma denúncia, é sua responsabilidade recomendar alteração ou suspender a veiculação do anúncio. Atualmente o CONAR conta com 109 agências associadas, além de rádios, redes de TV e jornais. O órgão é bastante respeitado tendo em vista a quantidade de associados e levando em consideração ainda o fato de que, sendo uma organização não-governamental suas decisões são acolhidas, mesmo que a empresa julgada não tenha esta obrigatoriedade de cumprimento. Em abril de 2014 o CONAR lançou uma campanha composta por dois vídeos 5 no qual criticava em certa medida o politicamente correto, a campanha dizia respeito às reclamações excessivas que recebe, porém, acabou sendo vítima de sua própria campanha recebendo críticas por ridicularizar as queixas dos consumidores, na 5

Disponíveis em: Acesso em: 02 de junho de 2014.

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propaganda criada pela agência AlmapBBDO, ao final da propaganda é dito que o CONAR é “responsável por regular a publicidade no Brasil e todos os dias recebe dezenas de reclamações. „Muitas são justas; outras, nem tanto. Confie em quem entende. Confie no CONAR” (UOL Economia). Dada a repercussão o CONAR optou por se autojulgará respeito da propaganda. No Brasil a propaganda passa a ser regulada então como medida para garantir não somente a liberdade de expressão, mas também, que a publicidade que chegue ao consumidor não seja de alguma forma antiética, desrespeitosa ou enganadora. A propaganda, sua veiculação, ou até mesmo as agências, devem estar cientes da composição heterogênea da sociedade e quando utilizarem dos diversos grupos que compõem a sociedade nas suas peças publicitárias, o fazerem tendo a noção mínima de podem ser cobradas quanto ao conteúdo ali reproduzido, não somente por movimentos organizados ou individuais, mas pelo próprio CONAR que muitas das agências brasileiras fazem parte atualmente. As agências devem acompanhar assim como o CONAR as diversas mudanças que ocorrem na sociedade para não esbarrarem em preconceitos que outrora naturalizados podiam ser considerados brincadeiras.

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3. ANÁLISE DE CASOS

Neste capítulo será feita a análise das peças escolhidas que foram de certa forma, alvo de críticas nos meios da internet e sofreram processo por meio do CONAR no ano de 2012. As imagens seguem juntamente com a reprodução da decisão do processo pelo Conselho, conforme encontrado no site e sem quaisquer alterações.

3.1 AZEITE GALLO A marca Gallo foi fundada em Portugal em 1919, e tem se mantido no mercado português desde então, a marca está presente em mais de 40 países, sendo líder de vendas em Portugal, Brasil, Venezuela e Angola, e ainda a 3ª marca mais vendida de azeite do mundo6. A primeira campanha brasileira da empresa foi realizada em 2006 e visava propagar a marca no país. Em 2011, já com alguma expansão e conhecimento por parte dos consumidores brasileiros, a empresa, seguindo a tendência que outras marcas de azeite já haviam aderido, lança a versão da embalagem em vidro escuro, pois assim o produto chegaria à mesa do consumidor com suas características organolépticas preservadas, uma vez que o vidro escuro protegeria o azeite da luz, evitando assim sua oxidação e alteração de sabor. Para divulgar a inovação a qual a marca estava inserindo no mercado, propagandas foram criadas buscando evidenciar a característica do vidro escuro. Em Portugal e no Brasil as propagandas tiveram um design parecido porém com texto diferente. Abaixo podemos visualizar a propaganda que causou polêmica, seguida da decisão do processo pelo CONAR.

6

Segundo informações coletadas no site da marca. Disponível em: http://www.gallooliveoil.com/pt/gallolegado/historia.aspx

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FIGURA 2 – PROPAGANDA AZEITE GALLO

FONTE: Internet

Decisão do caso no Conar conforme publicado no site do próprio Conselho: “NOSSO AZEITE É RICO. O VIDRO ESCURO É O SEGURANÇA” Mês/Ano MARÇO/2012 Julgamento: Representação nº: 279/11 Autor(a): Conar, mediante queixa de consumidor Anunciante: Anunciante e agência: Gallo Brasil e AlmapBBDO Relator(a): Conselheiro André Luiz Costa Câmara: Segunda Câmara Decisão: Alteração Fundamentos: Artigos 1º, 3º, 6º, 19, 20 e 50, letra "b" do Código Resumo: Por maioria de votos, o Conselho de Ética do Conar deliberou por recomendar a alteração do anúncio em mídia impressa do Azeite Gallo, com o título "Nosso azeite é rico. O vidro escuro é o segurança". Os conselheiros seguiram o voto do relator, que julgou não haver no anúncio intenção racista, mas ponderou que ele permite tal interpretação e que a comunicação não deve dar margem a associações equivocadas, pela responsabilidade social que tem. Por isso, sugeriu uma alteração, de modo a dirimir a possibilidade de interpretações discriminatórias. A representação foi aberta por denúncia de consumidor de Campinas (SP).

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Fonte: http://www.conar.org.br/

A propaganda esteve em veiculação no ano de 2011 mas somente no início de 2012 foi denunciada ao CONAR.Primeiramente a agência de publicidade responsável pela criação da publicidade, a AlmapBBDO, informou que só se pronunciaria após o julgamento do Conselho, e em março de 2012 (período em que a peça foi julgada) a agência informou que estava aguardando a notificação do Conselho para decidir a respeito da modificação que aplicaria à campanha. Após a decisão à época, a agência divulgou em nota que não recorreria da decisão, pois o anúncio já havia sido veiculado no ano anterior e não seria veiculado novamente não havendo assim necessidade de tal ato. Como dito anteriormente, propaganda semelhante foi veiculada em Portugal, porém, o anúncio de Portugal foi feito inspirado em um dito popular português que diz: “o sol quando nasce é para todos”, desta forma o texto do anúncio dizia: “O sol nasce para todos os azeites, mas é só o nosso que ele não estraga” (ver imagem 1 em anexo). Podemos imaginar que a mesma propaganda feita em Portugal poderia ter sido utilizada no Brasil, e ainda que no slogan da campanha poderia ter sido evitado problemas deste tipo de conotação se no desenvolvimento da campanha tivesse sido utilizado um “a” no lugar do “o”, ficando então: “nosso vidro escuro é „a‟ segurança”, conforme sugere um portal de notícias na internet7. A peça foi retirada do site oficial da Gallo no Brasil na área que traz o histórico da empresa, sendo substituída pela peça da campanha portuguesa, enquanto no histórico do endereço do site em Portugal, contém um vídeo da campanha portuguesa.

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Portal Ucho.Info, matéria disponível em:< http://ucho.info/?p=53151>. Acesso em 02 de maio de 2014.

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3.2 DULOREN A Duloren8 atua no mercado brasileiro há 38 anos e produz cerca de 1.500.000 de peças por mês, produzindo atualmente as marcas Duloren e Femmina. A marca pertencente atualmente a Roni Argalji, filho do fundador, que adquiriu a marca após a morte do pai e resolveu mudar o estilo das campanhas, mas sem deixar de lado a polêmica que já é um fator que está associado às propagandas da marca. As peças de propaganda da empresa passaram a apresentar modelos com padrão diferente das usualmente contratadas, se anteriormente as modelos atendiam ao estereótipo do mercado de moda, sendo estas modelos magras, as novas apresentavam modelos de manequim e idades diferentes. A Duloren ao longo dos anos 1990 já era conhecida por suas propagandas polêmicas. Em suas campanhas temas como aborto, religião e orientação sexual foram abordados na composição de suas peças publicitárias. As campanhas da marca foram realizadas ao longo de sua existência por diversas agências dentre elas a Doctor Propaganda, responsável por grande parte da publicidade da época, sendo que algumas destas tiveram a veiculação proibida dada a polêmica que geraram. Outras agências assumiram a marca depois da Doctor Propaganda, entre elas: W/Brasil, a MG Comunicação em 2004 com campanhas insinuado sexo e sadomasoquismo, a DM9 em 2006 montou a campanha mostrando homens nus servindo de sofá e passarela para uma modelo, e atualmente a X-Tudo Comunicação Completa é quem atende a marca, sendo a responsável pela peça a ser analisada. Vemos que mesmo com a mudança de agência, a comunicação da marca seguiu o mesmo padrão que mistura provocação e insinuações sexuais por figuras femininas sensuais e independentes. Em 2011 a marca já havia lançado campanha que trazia como diferencial do mercado a modelo Mayara Russi no natal, visando o público plussize 9, a estratégia de lançar coleções com numeração maior teve efeito positivo para a Duloren que durante o mesmo ano havia registrado um aumento de 40% nas vendas de lingerie voltadas 8

Informações coletadas no website da empresa, disponível em: Acesso em 03 de maio de 2014. 9 A numeração do vestuário é considerada plus size a partir do 46 no caso das mulheres e ainda pode ser referida como GGG ou XG.

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para este segmento, a marca investiu nos modelos e cores que antes não fugiam do tradicional preto, branco ou bege, e nos tecidos utilizados na confecção também, que agora incluíam rendas. O investimento da empresa neste segmento pode se dar também pelo fato de que, segundo dados do Ministério da Saúde de 2013 10, a população brasileira adulta está acima do peso ideal, sendo que a obesidade seria um fator em crescimento também, atingindo 17% da população, atingindo a população tanto feminina (18%) quanto masculina (16%). No ano seguinte, visando as mudanças propostas pelo presidente da empresa, surge o projeto “New People” que pretendia substituir as modelos por mulheres normais do dia-a-dia. O projeto que teve durante o ano campanhas veiculadas com mulheres mais velhas como a secretária executiva aposentada Vera Juppa da Silva de 77 anos, que aparecia em roupas íntimas em uma cama com um homem mais novo dormindo, juntamente com a frase de slogan: “A única coisa que eu faço com prazer é passar o rodo”, e ainda contou com modelos plussize em outras. A primeira peça a ser realizada deste projeto foi justamente a que foi denunciada ao CONAR no início do ano de 2012. A peça contava com a presença da depiladora Ana Paula Conceição Soares, de 29 anos e moradora da Rocinha e foi descoberta pela própria marca na comunidade. A campanha denunciada obteve críticas não somente quanto ao racismo, mas também de desrespeito à polícia. Os comentários na página oficial da marca no Facebook chegaram a citar Gilberto Freire, lembrando dos estereótipos da mulher negra e que estariam, na opinião dos seguidores da página, sendo reforçados e a marca dando um passo atrás fazendo uma apelação neste tom em sua campanha. Os conselheiros do CONAR demonstraram opinião semelhante no julgamento do caso, o relator em seu voto se referiu à Duloren como campeã absoluta da apelação publicitária no país, lembrando que havia outras formas de se anunciar o produto, e que no caso em julgamento a campanha despeitava todas as partes envolvidas na peça (mulher e polícia). Assim o Conselho votou pela suspensão da campanha, a empresa recorreu mas a decisão do Conselho foi mantida.

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Dados disponíveis em: Acesso em: 15/06/2013.

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FIGURA 2 – PROPAPAGANDA DULOREN

FONTE: Internet

Decisão do caso no Conar conforme publicado no site do próprio Conselho: "PACIFICAR FOI FÁCIL, QUERO VER DOMINAR". Mês/Ano JULHO/2012 Julgamento: Representação nº: 75/12, em recurso ordinário Autor(a): Grupo de consumidores Anunciante: Duloren Relator(a): Conselheiros Clementino Fraga Neto e Renata Garrido Câmara: Terceira Câmara e Câmara Especial de Recursos Decisão: Sustação Fundamentos: Artigos 1º, 3º, 6º, 19, 20 e 50, letra "c" do Código Resumo: Numerosos consumidores questionaram anúncio em internet de marca de lingerie que mostra foto de uma jovem negra trajando roupas íntimas e segurando um quepe militar com ar desafiador. Ao fundo, aparece um homem ressonando, com uniforme

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desabotoado que lembra a farda dos policiais cariocas, tudo ambientado no que sugere ser a laje de uma casa em uma favela carioca. O anúncio foi veiculado nos dias seguintes à operação de pacificação pela polícia da favela da Rocinha, no Rio de Janeiro. Para os consumidores, a imagem sugere desrespeito ao trabalho da polícia e também à imagem feminina, além de expressar racismo e machismo. Em sua defesa, a Duloren discorda de tal interpretação, vendo na peça publicitária reconhecimento da posição de destaque que a mulher conquistou na sociedade. Em primeira instância, o Conselho de Ética votou por unanimidade pela sustação, atendendo sugestão do relator. "O anúncio em tela é apenas mais uma incursão midiática da Duloren, dessa vez sem o brilho polêmico de algumas de suas peças de outros tempos, que a fizeram merecer o título irrefutável de campeã absoluta da apelação publicitária no Brasil", escreveu ele em seu voto, sugerindo também a divulgação pública da posição do Conar, levando em conta a reincidência do comportamento do anunciante. A Duloren recorreu da decisão, alegando que é inerente à publicidade atrair a atenção dos consumidores sem desrespeitá-los. É o que ela acredita ter conseguido com esse anúncio. Considera que a mensagem da peça deva ser entendida como: "Pode-se pacificar um morro, mas nem homem nem soldado nenhum é capaz de dominar uma mulher com lingerie Duloren". Tais argumentos não convenceram a relatora do recurso. "Existem muitas formas criativas de anunciar lingerie sem ferir as normas da boa propaganda. O anúncio aqui discutido tentou inovar e foi infeliz, pois vulgariza a mulher e banaliza o programa de pacificação das favelas, desrespeitando todas as partes envolvidas", escreveu ela em seu voto, ratificando a recomendação de sustação, aprovada por unanimidade. Fonte: http://www.conar.org.br/

A peça acima foi retirada pela empresa de suas redes sociais e do site da empresa, sendo encontrada na página do Facebook apenas duas imagens que dizem respeito à campanha, uma delas anterior à polêmica ter tomado grandes proporções e outra da modelo da peça sendo maquiada. Na primeira11 a empresa traz uma reprodução do jornal O Globo em que cita a nova campanha polêmica da marca, sendo esta a primeira do seu projeto “New People”. Nesta postagem há apenas quatro comentários sendo que apenas um deles é uma crítica quanto ao teor da peça, mas que data de um mês depois que esta imagem foi publicada na página. A segunda imagem que seria um making-off12obteve 51 comentários sendo na sua maioria críticas contra a campanha, tendo inclusive consumidoras expondo que não usarão mais as roupas da marca devido à propaganda.Apesar das propagandas retiradas do ar, a Duloren obteve vantagem

11

Disponível em: Acesso em 03 de maio de 2014. 12 Disponível em: Acesso em 05 de maio de 2014.

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uma vez que seus lucros aumentaram na década de 1990, saltando de 80 milhões de dólares de faturamento em 1993 para 140 milhões em 199713.

3.3 PRUDENCE A Prudence é uma empresa subsidiária da DKT Internacional, sendo esta uma organização sem fins lucrativos, cuja missão é não apenas a prevenção de DST/AIDS, mas de oferecer opções seguras para planejamento familiar. A DKT Internacional foi fundada em 1984, e tem sua sede em Washington D.C, NO Brasil a DKT está presente desde 1990.

A empresa desenvolve ainda programas de Marketing Social em 19 países, e somente em 201114 vendeu a nível mundial, mais de meio bilhão de preservativos além de quase 70 milhões de pílulas anticoncepcionais, 12 milhões de contraceptivos injetáveis, 800.000 DIUs, bem como pílulas de contracepção de emergência e implantes hormonais. No Brasil a empresa possui a maior linha de preservativos, géis lubrificantes e brinquedos eróticos, sendo a primeira a comercializar preservativos femininos no país. No Brasil a empresa tem parceria com as ONG‟sBarong e Equipe Voluntária Brasil, que recebem os produtos da DKT podendo vendê-los em pontos de venda não convencionais, podendo a ONG ficar com o valor de venda para o desenvolvimento de seus projetos de prevenção de DST/AIDS e planejamento familiar, que são geralmente em comunidades carentes. Quando uma empresa escolhe utilizar o marketing social como parte de sua missão, ela está priorizando vender um comportamento desejado, diferente do marketing comercial no qual o processo gira em torno da venda de produtos e serviços. O marketing social não deixa de ter em vista o lucro, mas está muito mais voltado para o desenvolvimento dos projetos sociais que a empresa tem ligação. No caso da DKT os proprietários dos estabelecimentos que fazem as vendas dos produtos passam a ser considerados multiplicadores na promoção do comportamento da comunidade, pois facilitaria o acesso ao preservativo a preços acessíveis. Segundo a DKT do Brasil:

13

Revista Veja de 21/01/98. Disponível em: Acesso em 05 de maio de 2014. 14 Dados disponíveis em: . Acesso em 22 de junho de 2014.

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“As ONGs vendem os produtos na periferia, em pequenos comércios que muitas vezes não conseguem efetuar compras nos grandes atacadistas. Com isso, consegue-se disponibilizar os produtos Prudence nos mais diversos tipos de PDVs, a um preço justo. Essa também é uma característica do marketing social: usar a rede comercial já existente para a promoção de um produto de cunho social.Por conta disso, é necessário que os produtos sejam vendidos, pois o valor que o consumidor atribui ao produto aumenta quando ele precisa ser adquirido. O importante é que esse produto seja acessível.Além da venda, as ONGs trabalham nessas comunidades com a parte educacional. O trabalho de conscientização para a prevenção das DSTs/AIDS

e

planejamento

familiar

se

inicia

pelo

proprietário

do

estabelecimento. É ele quem precisa se envolver com a causa e comprar a ideia, precisa entender que o produto tem que estar bem exposto e a um custo acessível para a população, se tornando, assim, um multiplicador que promove a mudança de comportamento da comunidade" (site DKT Brasil)

Segundo a ONG Equipe Voluntária Brasil15, até agosto de 2011, em 8 anos de projeto de marketing social haviam sido disponibilizados 3.558.181 preservativos através de venda e distribuição gratuita. Abaixo vemos a imagem compartilhada via Facebook da Prudence que gerou denúncias e discussões via internet.

15

Dados disponíveis em: . Acesso em 23 de junho de 2014.

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FIGURA 3 – PROPAGANDA PRUDENCE

FONTE: Internet

Decisão do caso no Conar conforme publicado no site do próprio Conselho: DKT – DIETA DO SEXO Mês/Ano SETEMBRO/2012 Julgamento: Representação nº: 184/12 Autor(a): Conar, mediante queixa de consumidor Anunciante: DKT do Brasil Relator(a): Conselheira Mônica Gegrori

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Câmara: Sexta Câmara Decisão: Sustação e advertência Fundamentos: Artigos 1º, 3º, 6º, 19, 21, 22 e 50, letras "a" e "c" do Código Resumo: Fabricante de preservativos apôs a sua marca a uma piada que circulava havia tempos na internet e a veiculou em mídias sociais. Cerca de 1.200 pessoas enviaram e-mail ao Conar considerando a peça abusiva, desrespeitosa e que poderia incentivar violência sexual contra a mulher. O anunciante informa em sua defesa que suspendeu a exibição da peça logo que as primeiras reclamações chegaram, tendo publicado no mesmo espaço um pedido de desculpas. No mérito, alega tratar-se de uma brincadeira originada em um livro da década de 1970, que foi veiculada durante anos na internet. A relatora não aceitou esses e outros argumentos da defesa e propôs a sustação, agravada por advertência à DKT. "É de conhecimento notório que na internet é possível encontrar textos, depoimentos e conteúdos que não só são de extremo mau gosto, mas que também constituem verdadeiras aberrações, abuso da liberdade de expressão e atos ilícitos", escreveu ela em seu voto. "Este fato não exime de responsabilidade uma marca ao veicular um anúncio nesse meio, pois entende-se que o anunciante tem responsabilidade pelo conteúdo disseminado." Seu voto foi aceito por unanimidade. Fonte: http://www.conar.org.br/

A peça data do primeiro semestre de 2012, tendo gerado grande polêmica nas redes sociais por ser interpretada como apologia ao estupro, uma vez que na segunda linha informa a quantidade de calorias que alguém gastaria tirando a roupa de uma mulher sem o consentimento da mesma. Esta publicação sofreu processo via CONAR, apesar da peça ter sido retirada do ar antes da decisão do conselho que ocorreu somente em setembro. A imagem foi lançada no dia 16 de julho e retirada do ar da página do Facebook da empresa no dia 30 do mesmo mês devido a repercussão que gerou. Após tal fato, a empresa lançou duas notas ainda dizendo que o texto era apenas uma reprodução que já ocorria na internet e que apenas usou o texto em sua campanha lamentando o ocorrido, podemos verificar o printscreen da nota da empresa a seguir sendo a primeira do início da tarde do dia 30 de julho:

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Fonte: https://www.facebook.com/preservativos.prudence/posts/351623448245189 A segunda nota reiterando o pedido de desculpas foi lançada no final da tarde às 17hrs, reproduzida logo abaixo:

Fonte:https://www.facebook.com/preservativos.prudence/posts/351704694903731?stream_re f=10

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As duas publicações juntas, obtiveram um total de 638 comentários e 169 compartilhamentos. Algumas das reações do público após a retratação da empresa podem ser vistas abaixo:

Lucas Gurgel Sociedade hipócrita..hoje em dia qualquer comentário já vem 500 pessoas ofendidas fazendo barulho.. não tinha nada de desrespeitoso e nenhum tipo de incitação a violência no referido post.. o problema está na cabeça dessas pessoas que vêem violência e discriminação em tudo! 30 de julho de 2012 às 13:02 · Curtir · 4 Caio Phox Agora melhorou... E Lucas Gurgel, espero que mantenha esse pensamento caso algum dia um homem tente enfiar o pênis dele no seu ânus sem o seu consentimento. Se o problema estiver só em nossas cabeças, então tudo o que vai acontecer com você é que você vai perder umas calorias a mais. 30 de julho de 2012 às 13:11 · Curtir · Julio Capucho qundovc olha uma imagem e ve algo de errado nela ´sinal de qe a maudadeesta na sua mente 31 de julho de 2012 às 19:28 · Curtir · 2 Carlos Eduardo Vilas Boas Covardes 'politicamente corretos'.... amarelaramprá um bando de hipócritas.. 9 de agosto de 2012 às 02:31 · Curtir Roberto Rizzo Saccamano NOSSA, QUE FRESCURA!! Mulherada cheia de não-me-toque... 31 de julho de 2012 às 22:21 · Curtir · 2 Elisa Gargiulo Porque vocês não fazem uma campanha interna, pra educar os funcionários da empresa? 1 de agosto de 2012 às 09:43 · Curtir · 4 Thaís Nunes Boicote total... não existem desculpas pra uma campanha tao ridícula totalmente ofensiva...só falta a marcar se unir ao Maluf "estupra mas não mata...e use camisinha prudence" 30 de julho de 2012 às 21:03 · Curtir · 7 Lorena Alves Errou publicamente, fez a retratação - com todas as letras - finalmente, e esse é o mínimo que merecemos da publicidade. Aguardo a campanha que, se ética e coerente, contará com o apoio de muit@s de nós.31 de julho de 2012 às 01:43 · Curtir · 5

Estes são apenas algumas das reações que podemos encontrar, blogs e sites reiteraram a denúncia informando endereços eletrônicos em que se poderia fazer a denúncia, além do site nacional e internacional oficiais da empresa outros como: CONAR, Safernet e Polícia Federal. No site “Vi o Mundo”16 e no blog “Escreva Lola Escreva”17, a matéria a respeito da propaganda ensinava como fazer a denúncia sendo que no site mencionado havia ainda a sugestão de texto para denúncia, sendo este: “a propaganda faz apologia clara ao estupro e reforça estereótipos machistas”. 16

Matéria disponível em:Acesso em 11 de maio de 2014. 17 Matéria disponível em: Acesso em 11 de maio de 2014.

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3.4 VOLKSWAGEN A Volkswagen18opera inicialmente na década de 1930 com o projeto de construção do Fusca, a montadora surge oficialmente em 28 de maio de 1937 na Alemanha com o nome Gesellschaftzur Vobereitungdes Deutchen Volkswagens GmbH (Companhia para a Preparação dos Carros do Povo Alemão). Em 1933, Adolf Hitler visita o Salão Internacional do Automóvel de Berlim e vê no Volkswagen, uma forma eficiente de propaganda nazista, e passa a defender a ideia de “carro do povo” como se fosse sua. O carro da marca que mais obteve sucesso em sua história, o fusca, foi uma tentativa de uniformização automotora da raça ariana. O nome da montadora foi revisto no mesmo ano de sua fundação sendo reduzido apenas para Volkswagen, “carro do povo”, traduzindo então a ideia de produzir um veículo barato, possibilitando transportar dois adultos e três crianças, podendo ser adquirido por um sistema de poupança voltado especialmente para sua aquisição. O carro idealizado pelo engenheiro Ferdinand Porsche vendeu na época cerca de 336 mil unidades sendo inicialmente batizado de KDF-Wagen, a tradução de KDF(Kraft Durch Freude) significa “força através da alegria”, sendo este um dos lemas do Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães, o conhecido Partido Nazista. Desta forma, o governo investiu subsídios para que a empresa fosse criada, tendo sua sede na cidade Wolfsburg, e sendo operada pela Frente Trabalhadora Alemã. Em 1939 quando deu início a Segunda Guerra Mundial a fábrica passou a produzir veículos voltados para a mesma, como jipes e carros anfíbios. Em 1949 o Fusca foi lançado nos Estados Unidos, mas não obteve sucesso, por ser considerado feio ainda o “carro de Hitler”. Bill Bernbach responsável pela propaganda da empresa no país, mudou o ponto de vista que se tinha a respeito do carro, com o slogan “Think Small” (pense pequeno) as vendas aumentaram e outras propagandas criativas passaram a fazer sucesso tendo resultados impressionantes. No Brasil a marca chegou em 1953 após uma pesquisa no mercado latino americano indicar o Brasil para receber a primeira fábrica da montadora fora da Alemanha. A empresa obteve sucesso na venda do Fusca e da Kombi, e a empresa ganhou um novo impulso em 1956 quando o governo brasileiro criou condições para 18

Dados obtidos em: e . Acesso em 22 de junho de 2014.

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instalar no Brasil a indústria automobilística, fixando bases para o desenvolvimento do setor. No mesmo ano a empresa começa a construção de sua fábrica em São Bernardo do Campo, sendo oficialmente inaugurada em novembro de 1959, contando com a presença do então presidente Juscelino Kubistescheck. Em 1970 a fábrica marca os primeiros recordes de produção chegando ao seu primeiro milhão de veículos vendidos no país. A fábrica procurou satisfazer o gosto do consumidor brasileiro e em 1974lançou o Passat, que diferente dos modelos anteriores possuía motor de quatro cilindros, de porte médio, tração dianteira e refrigerado à água. O sucesso do modelo deu-se não somente no Brasil, mas no exterior, sendo que 200 mil unidades foram exportadas para o Iraque. Atualmente a montadora é a segunda maior da Europa ficando atrás apenas da japonesa Toyota, no mercado mundial ocupa o primeiro lugar segundo dados de janeiro deste ano conforme podemos ver abaixo: TABELA 1 – RANKING DE VENDAS DE AUTOMÓVEIS NA EUROPA 2014

Ranking

Marca

jan/13

jan/14

1

Volkswagen

510805

526299

3,03%

2

Toyota

459194

490795

6,88%

3

Ford

364952

375327

2,84%

Fonte: JATO Dynamics / Brasil

Evolução [%]

19

Atualmente a montadora se denomina Grupo Volkswagen, sendo composto de doze marcas de sete países europeus: VolkswagenPassengerCars , Audi, Seat, Skoda , Bentley, Bugatti, Lamborghini , Porsche, Ducati , Volkswagen Veículos Comerciais , Scania e MAN. Sendo que cada marca opera independentemente, tendo suas próprias originalidades, variando de carros pequenos a veículos de luxo, de pickups a caminhões e ônibus. O grupo ainda fabrica motores de grande porte para áreas marítimas, compressores e reatores químicos, turbinas eólicas, e ainda serviços financeiros a clientes, atividades bancárias e de seguro. A montadora está presente

19

Disponível em:Acesso em: 20 maio de 2014.

38

em 153 países, com um total de 106 fábricas em 19 países da Europa e em mais oito países das Américas, Ásia e África20. Abaixo veremos a peça que foi denunciada no Conselho, e quais foram as acusações contra esta, e mais adiante uma breve discussão sobre as propagandas já feitas pela montadora. FIGURA 4 – PROPAGANDA VOLKSWAGEN

FONTE: Blog “Escreva Lola Escreva” (04/05/2012)

20

Informações compiladas disponível em: Acesso em 20 de maio de 2014.

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Decisão do caso no Conar conforme publicado no site do próprio Conselho: VW – CUIDADO: ELA TAMBÉM DIRIGE Mês/Ano JULHO/2012 Julgamento: Representação nº: 114/12 Autor(a): Conar, mediante queixa de consumidor Anunciante: VW Agência: Almap/BBDO Relator(a): Conselheiro Antônio Jesus Cosenza Câmara: Terceira Câmara Decisão: Arquivamento Fundamentos: Artigo 27, nº 1, letra "a" do Rice Resumo: Anúncio em jornal com o título acima mostra foto de mulher tentando consertar uma torradeira elétrica com uma faca. A peça atraiu reclamação de consumidoras de Florianópolis (SC) e Niterói (RJ). Elas consideraram o anúncio discriminatório. Anunciante e agência se defenderam, discorrendo sobre os objetivos da campanha divulgar itens de segurança veicular - e juntando outros anúncios, nos quais homens e mulheres também incorrem em atitudes de risco extremo. O relator aceitou esse ponto de vista e sugeriu o arquivamento, voto aceito por unanimidade.

A imagem da campanha, segundo pesquisa realizada teve suas primeiras denúncias no blog “Escreva Lola Escreva” que é de autoria da professora da UFSC Lola Aronovich, doutora em Literatura em Língua Inglesa, seu blog feminista sempre atualizado recebe cerca de nove mil visitas por dia sendo assim bastante reconhecido. A blogueira recebeu a imagem acima de uma estudante e então uma matéria de maio de 2012, intitulada: “Neandertais ainda acham que mulheres não sabem dirigir”, foi postada no seu blog e teve 133 comentários a respeito da mesma. Uma espécie de campanha foi desencadeada nas redes sociais da VolksWagem conforme informa o blog, ao que uma leitora recebeu uma resposta por email da empresa e encaminhou ao blog, sendo a mesma divulgada posteriormente. O conteúdo segue conforme reprodução online:

“Sra. Ana, Agradecemos o seu contato.

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Em atenção a sua mensagem, lamentamos sinceramente o fato de que a nossa comunicação publicitária tenha sido percebida por V.Sa. como ofensiva ou mesmo discriminatória. Obviamente, não foi nossa intenção causar qualquer tipo de desconforto a quem quer que seja, porque sabemos que conquistar a simpatia das pessoas é um fator essencial para nosso êxito. A VW é uma empresa de abrangência mundial que faz questão de respeitar crenças, hábitos e procedimentos de todas a sociedade, em qualquer parte onde ela tenha sua base de operação. Contando com sua compreensão, colocamo-nos a disposição. Atenciosamente, Renata Moreira 21 Central de Relacionamento com Clientes Volkswagen”

Como vimos no processo, a denúncia foi feita por consumidoras de Florianópolis e do Rio de Janeiro, é muito provável que as denúncias de Santa Catarina tenham sido impulsionadas por pessoas que acompanham o blog da professora da UFSC, sendo que foi ela a primeira a divulgar a imagem na internet, a denúncia de moradoras do Rio de Janeiro também pode ter sido feita por pessoas que acompanham o blog, tendo em vista a média de público que o acessa diariamente. No blog da Lola após o resultado do processo não foi relatado mais nada, apenas uma matéria em outro blog chamado “A Terceira Margem da Academia”, de Gabi Azevedo, estudante de Letras da USP, demonstra seu ponto de vista a respeito do processo como um todo e a autora ainda cita o blog da Lola. Para a autora do texto, o fato de haver outras imagens da mesma campanha com o mesmo slogan não muda o fato da propaganda ainda assim ter um tom machista, tendo em vista o contexto da foto. A autora alerta ainda para o fato de que as imagens apresentam o estereótipo de uma divisão de trabalho por gênero, uma mulher na cozinha e não um homem, um homem trocando uma lâmpada, etc. Além dos estereótipos de gênero a autora ainda argumenta a respeito das imagens apresentarem na verdade um “American Way Of Life”, tendo em vista as torradeiras que não são comuns no Brasil, e nas outras propagandas que mostram uma escada com corrimão de madeira, balaústre de beijinho, chão de carpete, paredes beges e um homem num pijama azul, que configurariam na visão da autora

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Disponível em: Acesso em 22 de maio de 2014.

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casas iguais às dos filmes hollywoodianos. A autora finaliza seu texto dizendo que não escolheria um carro da desta marca devido suas propagandas22. A denúncia parece não ter afetado tanto a Volkswagen, pois, no mesmo ano a mesma campanha ganhou em segundo lugar da categoria “Produtos e Serviços Automotivos” de mídia impressa do Prêmio Colunistas Propaganda São Paulo 2012. (Ver imagem 5 em anexo). No ano de 2013 a Volkswagen voltou a ser denunciada no CONAR e teve mais de mil reclamações devido a sua propaganda intitulada “Superstição”. A propaganda que foi veiculada na televisão no mês de fevereiro demonstrava um condutor que espantava um gato preto do capô de seu carro com a água do limpador do para-brisa. Segundo consumidores protetores de animais, isso reforçava uma superstição popular e incentivava maus-tratos contra os gatos pretos. A empresa já havia retirado do ar o comercial quando o CONAR decidiu por sua alteração, e afirmou ainda que "em nenhum momento, no comercial, a Volkswagen quis estimular/sugerir qualquer tipo de desrespeito aos animais" (Economia UOL, 05/02/2013), tendo utilizado como argumentos em sua defesa que já havia inclusive utilizado animais em suas campanhas anteriores. A Volkswagen procurou ao longo de sua existência fabricar não somente o carro do povo, como era designado em seu início, mas o carro da família. O público feminino foi focado em suas campanhas desde a década de 1960,como vemos nas imagens abaixo, porém as propagandas feitas naquela década demonstravam a mulher no papel da dona-de-casa, mãe, etc., ou seja, o lugar da mulher é demarcado socialmente nas propagandas, não deixando de ocorrer o mesmo, como vimos na peça publicitária de 2012.

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Informações disponível em: Acesso em: 21 de maio de 2014.

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Ao longo dos anos a montadora alemã inclui a mulher nas suas publicidades, mas a tentativa de criatividade dos responsáveis pelo desenvolvimento das peças acabou esbarrando em estereótipos não apenas de gênero (a empresa parece não ter deixado para trás a imagem tradicional da mulher em suas propagandas que exibia o carro da família), e mais tarde os movimentos em prol dos animais também lembraram dos estigmas com relação a estes.Caberia a Volkswagen repensar juntamente com as agências responsáveis pela produção publicitária da empresa a recorrência de tais estereótipos que se reproduzem desde a década de 1960, e que já estão por demais ultrapassados.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Atualmente quem se dedica ao estudo das relações de gênero, classe, racial, entre outros, apontam as mais variadas formas de preconceito que estes grupos sociais estão submetidos. Pode-se dizer que o politicamente correto é uma consequência das reivindicações dos movimentos sociais e o desenvolvimento de pesquisas nas diversas áreas de conhecimento, que buscam demonstrar através de pesquisas acadêmicas as diversas formas que o preconceito pode atuar socialmente, sendo de forma velada até as mais explícitas. A somatória disso será a vigilância constante que diversos ativistas no combate as discriminações e o apontamento das mesmas nas propagandas publicitárias tendo em vista que o consumidor de hoje está mais do que atento à linguagem que a publicidade está usando, qualquer deslize pode ser entendido e interpretado de diversas formas, uma interpretação negativa pode vir despertar o ressentimento no consumidor que pode se posicionar contra inclusive boicotando o consumo de uma determinada marca ou produto. Podemos visualizar entre as peças selecionadas que há um grupo de pessoas que acompanha tudo que é produzido, e cobra de seus responsáveis da marca uma posição mediante a produção publicitária que em uma forma de interpretação apresenta algum tipo de discriminação, seja na imagem, no texto, ou o contexto como um todo. Pode-se dizer que o politicamente correto é hoje uma espécie de vigilante que atua pelos indivíduos que estão principalmente ligados aos movimentos sociais. As denúncias que o Conar recebe nem sempre são apresentadas por um movimento organizado, por vezes, como é o caso do Azeite Gallo, a denúncia foi feita por um morador de Campinas, outras vezes é o próprio conselho que instaura o processo a respeito de uma determinada peça publicitária. Se pensarmos o processo que as peças percorreram desde sua concepção ao público, podemos elencar da segunda forma: PRODUÇÃO DA PEÇA → RECEPÇÃO DO PÚBLICO → PROCESSO DE NEGOCIAÇÃO

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Nas peças apresentadas pudemos verificar a peça já pronta e não como se deu seu processo de produção, em seguida a recepção pode ser visualizada mediante as críticas que muitas tiveram após a publicação da mesma pelas empresas responsáveis. É possível afirmar mediante as peças apresentadas, que na atualidade o politicamente correto tem grande peso nos diversos setores da sociedade. A sociedade está repleta de pessoas que, individualmente ou em conjunto participando de movimentos, parecem estar dispostas a lutar contra os mais diversos tipos de opressão que são apresentadas nas várias esferas da sociedade, vide por exemplo, a Marcha das Vadias que nasceu como resposta à criminalização de uma vítima de estupro por parte do policial Michael Sanguinetti no Canadá23, que declarou que: “women should avoid dressing like sluts in order not to be victimized”24, o movimento então teve início em janeiro de 2011 quando ocorreu tal declaração, se internacionalizou e hoje ocorre anualmente para reivindicar os direitos das mulheres frente aos abusos e discriminação que ainda ocorrem em diversos países incluindo o Brasil. Quando um grupo sente que seus direitos são violados buscam por uma resposta daqueles que lhes impôs tal violação. Comumente podemos visualizar nas redes sociais, campanhas de confronto a certas opressões, sendo elas televisivas (com seus personagens estereotipados nas novelas, seriados e demais programas de humor), nas propagandas televisivas/impressas, e ainda nos discursos de grupos ou indivíduos que ocupam cargos de poder na sociedade ou na mídia em geral. Atualmente os processos de participação social que o sistema democrático permite, oferece autoridade para que os movimentos sociais têm para apontar aquilo que lhes parece errado, e estes vão se reforçando e se reformulando ao longo dos tempos. Os grupos sociais vêm lutando pelos seus direitos há anos e informando para a sociedade aquilo que não aceitam mais, como por exemplo, termos que outrora eram utilizados e hoje são vistos como discriminatórios e/ou estereótipos que continuam a 23

Demais informações podem ser acessadas no site oficial da organização canadense. Disponível em: Acesso em 20 de junho de 2014. 24 “A mulheres devem evitar se vestir como vadias para não serem vítimas. ”

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se reproduzir, etc. Isto de certa forma, é fruto principalmente do desenvolvimento de trabalhos acadêmicos que, como vimos no primeiro capítulo segundo Rago (1999), se deu pela entrada dos novos sujeitos nos cursos de pós-graduação, e ainda da luta diária ao longo das décadas destes sujeitos.Por esta razão os movimentos sociais acabam por ter grande legitimidade para informar à sociedade aquilo que não pode mais ser tolerado. Podemos afirmar que o politicamente correto tem atuado diariamente no combate às opressões e discriminações e tem sido de certa forma, se podemos dizer assim, utilizado pelo próprio CONAR que quando percebe algo que possa ser entendido como discriminatório, instaura ele próprio processo para verificação do conteúdo publicado, isso demonstra que o órgão está absorvendo em certa medida as reivindicações que os movimentos sociais estão pautando. É visível que o politicamente correto tem sim influência nas imagens publicitárias, se não na sua produção, ao menos na sua recepção. Como pode-se verificar, as imagens que sofreram críticas quanto ao seu conteúdo em redes sociais e blogs, foram denunciadas diretamente ao conselho e tiveram que se adequar à decisão daquele e ainda outras foram suspensas segundo decisão do mesmo, como é o caso da propaganda da Duloren. Empresas como a Prudence, por exemplo, retirou sua peça do ar devido à quantidade de críticas que sofreu e ainda se retratou ao seu público. Os movimentos sociais têm apresentado tanta força quanto o CONAR nos últimos anos, sendo que, como vimos, as empresas tentam manter um relacionamento com seus clientes e buscam ouvir não apenas seus elogios e sugestões, mas também as críticas que estes apresentam quanto ao seu produto ou prestação de serviço, uma vez que estas necessitam seguir a lógica do mercado e produzir de acordo com as demandas dos seus clientes, sendo estas também alteradas com o tempo dada a dinâmica cultural, histórica ou social. Dada a abrangência de interpretações de imagens e palavras, as agências publicitárias deveriam tomar certo cuidado na confecção de suas peças, uma vez que todo o processo de montagem da propaganda pode causar a perda não apenas tempo e dinheiro, mas também acarretar uma má impressão no público e deixar a marca de certa forma associada a um determinado episódio tido como discriminatório.

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Podemos citar um exemplo da denúncia de racismo recebido pelo CONAR do Azeite Gallo, que segundo decisão do conselho de ética do mesmo, o relator que julgou não haver no anúncio intenção racista, mas ponderou que ele permite tal interpretação e que a comunicação não deve dar margem a associações equivocadas, pela responsabilidade social que tem. Entre as empresas analisadas, vemos que a Prudence é mantenedora de projetos sociais, e que antes mesmo do processo já havia apagado de sua página oficial a postagem que causou polêmica. Pela característica da empresa, que trabalha com marketing social, um processo via CONAR no qual a campanha é acusada de fazer apologia ao estupro é prejudicial para uma empresa que tem responsabilidades sociais não somente no país mas nos demais países que atua ao redor do mundo. Pensar que as agências não se dão conta que um determinado conteúdo pode ser interpretado de maneira errônea à inicial pensada pelos seus idealizadores seria muita ingenuidade. Uma peça publicitária quando está em processo de montagem e mesmo depois de pronta, passa pela mão de várias pessoas entre6 setores na agência: direção de criação, redação, direção de arte (responsável pela parte visual), produção gráfica, atendimento (responsável pela comunicação entre agência e cliente) e aprovação. Na empresa que contrata o serviço da agência o responsável de marketing é quem aprova a peça. Se pensarmos nas peças analisadas que ao passar por todas as etapas de sua produção há muitas pessoas envolvidas e com experiência em comunicação com o público,não é possível imaginar que ninguém se deu conta e procurou em algum momento alertar quanto ao conteúdo dúbio ou preconceituoso, tanto em determinadas frases ou imagens como podendo gerar tamanha polêmica dada às interpretações possíveis. Também, em algumas situações como no caso da DuLoren, a estratégia era realmente a de criar polêmica. Já no caso da Prudence, parece ser mais um deslize da equipe, apesar do óbvio que estava ali exposto. O politicamente correto acaba então por operar não no fato explícito como tal somente, mas na sua potencialidade visto a diversidade de interpretação e compreensão de uma mesma estrutura de linguagem em uma sociedade como a brasileira que possui uma cultura tão plural.

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Uma breve busca via internet sobre o assunto do politicamente correto, nos revelam matérias e artigos nos quais não apenas autores mas boa parte do públicoem seus comentários demonstram ser contrário a ele, e se utilizam da liberdade de expressão como principal argumento para se posicionar neste assunto. A publicidade e propaganda hoje em dia ocupam um espaço grande na sociedade e é importante não somente para o mercado de venda de produtos e serviços, mas também para o Estado, ONG‟s, e demais organizações que necessitem de alguma visibilidade na sociedade. Exatamente por trabalhar num espaço social onde padrões de identidade podem existir mas estes operam juntamente com tantos outros, é que deveria se levar em consideração esta diversidade quando da produção não somente publicitária mas de produção visual em geral que visa um grande público. A ideia não é de impedir ou podar a criatividade dos que trabalham nestas áreas, mas lembrar que a atual sociedade busca expressar suas especificidades e reivindica sua positividade, ou reclamar de sua negatividade de representação quando assim lhe parece. Desta forma, a propaganda e seus idealizadores devem estar atentos quanto a reprodução de estereótipos, pois, as minorias sociais demonstram não aceitar mais determinadas reproduções que se escondem atrás da liberdade de expressão como argumento de defesa para a reprodução da sua visão estereotipada. Se a máxima publicitária que diz que “a propaganda é alma do negócio”, então esta precisa se adequar ao seu público que muda frequentemente visto que a cultura é dinâmica e não homogênea. Existem reclamações excessivas sim, mas é difícil encontrar um ponto de consenso visto a heterogeneidade social, o que pode ser visto como normal ou engraçado para alguns pode ser extremamente ofensivo para outros. No documentário “O Riso dos Outros” vemos um consenso entre os humoristas quando dizem que uma das bases do humor/piada é o estereótipo e o preconceito. Jean Wyllys em depoimento no documentário lembra que geralmente este tipo de piada é feita por alguém que não pertence a um determinado grupo discriminado, diz ainda “que há a possibilidade de trazer as minorias para o humor, mas não

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necessariamente humilhando-os”. Obviamente há diversas formas de se fazer humor e propaganda, porém, a primeira a ser utilizada é aquela que se demonstra mais fácil, quando são utilizadas especificidades de determinadas pessoas e grupos para seu fim cômico ou de venda. Da mesma forma em que se utilizavam pessoas negras nos zoológicos humanos o humor utiliza da exposição de determinados grupos para se fazer rir. Ainda no documentário vemos a seguinte declaração do ator e palhaço Hugo Possolo “o humorista não é responsável pelas mazelas da sociedade ele está apenas expressando e retratando à sua maneira [...], então não culpem o humorista de fazer piada por coisas que acontece na sua sociedade”. (O Riso dos Outros, 13‟). Pondé (2011) ainda chega a classificar como imoral a posição do politicamente correto.

“o politicamente correto acabou se transformando numa espécie de censura. Na vida acadêmica acabou se transformando numa espécie de lobby para eliminar pessoas que não concordam com quem tem poder institucional. No fundo se transformou numa espécie de patrulha. E, nesse sentido, me [parece] bastante imoral.” (Folha Ilustrada, 2011)

O politicamente correto hoje está calcado na nossa sociedade e cada vez mais demonstra sair em defesa dos diversos grupos da sociedade, vemos no caso da Volkswagen a reclamação feita pelos defensores dos direitos dos animais. Quem não acompanha estes movimentos de defesa talvez tenham visto o comercial do gato preto e não tenham feito a leitura que outras pessoas fizeram. Realmente há uma grande dificuldade em acompanhar as reivindicações e leituras sociais, dos diversos grupos reivindicatórios. Para a percepção das formas de preconceitos, é necessária uma base material ou simbólica, mas ainda assim a percepção depende do sujeito e toda sua subjetividade, sua visão de mundo. E o refinamento dessa percepção das diversas formas discriminatórias leva tempo, não somente de estudo, mas para poder fazer uma leitura e constatar de imediato a ocorrência de algo dentro de um padrão discriminatório. O uso de estereótipos não serve para nada além de reforçar visões que são conservadoras/tradicionais no mínimo, além de naturalizar o preconceito. O politicamente correto vem expor não apenas as formas discriminatórias da sociedade, mas também um problema da pós-modernidade, que diz respeito a essas

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várias identidades que não conseguem sempre ser atendidas na sua totalidade, ou na tentativa de não se expressar de forma discriminatório, acaba por tomar medidas que acabam sendo vistas como exageradas, como foi o caso da cartilha do politicamente correto desenvolvida pela Secretaria Especial de Direitos Humanos, em 2004, ou ainda o caso dos livros de Monteiro Lobato, que sendo considerados com teor racista tiveram grande debate sendo por fim, recomendado a utilização da obra pela Secretaria de Alfabetização e Diversidade, quando os professores tivessem a compreensão dos processos históricos que geraram o racismo no Brasil. Talvez uma pouca compreensão a respeito da quantidade de identidades que formam hoje a sociedade ou uma vontade de combater discriminações diversas, façam com que medidas sejam tomadas imediatamente como forma de impedir a promulgação de preconceitos, porém, muitas pessoas que buscam combater preconceitos, tem entendimento mais acadêmico a respeito das demandas sociais e ainda assim cometem excessos. O politicamente correto hoje age numa sociedade que de um lado luta contra as opressões, mas também tenta se equilibrar para não oprimir.

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eurocêntrica.

Ucho,Info, Conardecide que campanha do azeite Gallo, supostamenteracista, terá de seralterada. Disponível em :Acessoem 02 de maio de 2014. UOL Economia. VW decide tirar do ar comercial polêmico com gato preto. Disponível em: Acesso em 06 de junho de 2014. WILSON, JonhK. The Myth of Political Correctness: The Conservative Attack on Higher Education. Duke University Press, 1995

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ANEXOS Figura 1

Propaganda do Azeite Gallo veiculada em Portugal.

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Figura 2

Propaganda Volkswagen veiculada em jornal de Santa Catarina.

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Figura 3

Propaganda da Volkswagen veiculada em jornal de Santa Catarina.

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Figura 4

Propaganda da Volkswagen veiculada em jornal de Santa Catarina.

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Figura 5

Prêmio ganho pela Volkswagen em 2012

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Figura 6

Processo via CONAR contra propaganda da Volkswagen em 2013.

VOLKSWAGEN - GATO PRETO Mês/Ano MARÇO/2013 Julgamento: Representação nº: 036/13 Autor(a): Grupo de consumidores Anunciante: VW Agência: AlmapBBDO Relator(a): Conselheiro Licínio Motta Neto Câmara: Sétima Câmara Decisão: Alteração Fundamentos: Artigos 1º, 3º, 6º, 25, 36 e 50, letra "b" do Código Resumo: Perto de mil consumidores de todo o país escreveram ao Conar, protestando contra campanha da VW em que um gato preto seria associado ao azar. Os consumidores temem que o filme reforce um mito popular e que justifique maus-tratos contra o animal, inclusive pela impressão de que foi esguichada água sobre o gato quando ele pulou sobre o capô do carro. A defesa enviada por anunciante e agência nega tal interpretação, procurando esclarecer que toda estruturação do filme visa ilustrar como seria um motorista supersticioso e como isso se torna inútil diante dos itens presentes no modelo anunciado. O relator votou pela alteração, por considerar que o filme desrespeita mandamentos do Código, em particular quanto à exploração da superstição e maus-tratos contra animais. Seu voto foi acolhido por maioria.

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