O QUE O CINEMA TAILANDÊS CONTEMPORÂNEO NOS DIZ SOBRE AS PREOCUPAÇÕES E ANSIEDADES CULTURAIS TAILANDESAS CONTEMPORÂNEAS

May 31, 2017 | Autor: Jess Boyd | Categoria: Thailand, Thai Cinema, Thai Culture, Pan-Asian Cinema, Thai Cinema, Korean Cinema
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CINEMA TAILANDÊS

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CINEMA TAILANDÊS

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ÍNDICE ÍNDICE

11 A P R E S E N T A Ç Ã O

55 O A B S U R D O C O R R I Q U E I R O DE APICHATPONG WEERASETHAKUL RUY GARDNIER

14 F I C H A T É C N I C A E A G R A D E C I M E N T O S 58 M O V I M E N T O C I N E M A T A I L A N D Ê S L I V R E 18 U M A B R E V E H I S T Ó R I A D O C I N E M A T A I L A N D Ê S ANCHALEE CHAIWORAPORN

26 O H O M E M Q U E M O R R E U P O R S U A A R T E

UMA CARTA DO MOVIMENTO CINEMA TAILANDÊS LIVRE

60 “M A D E I N T H A I L A N D”: O I D Í L I C O R U R A L E O T E M A DA IDENTIDADE TAILANDESA EM TRANSISTOR NATALIE BOEHLER

ANCHALEE CHAIWORAPORN

30 MELHOR É IMPOSSÍVEL: FILMES TAILANDESES EM 2015 ANCHALEE CHAIWORAPORN

72 D E S L O C A N D O “I N D E P E N D Ê N C I A” - O D I S C U R S O DO CINEMA INDEPENDENTE DO SUDESTE ASIÁTICO E SUAS TRAJETÓRIAS NATALIE BOEHLER

35 Ó C I O - M E D I T A Ç Ã O, N A R R A Ç Ã O E S U B V E R S Ã O FELIPPE MORAES

40 K A T H O E Y S E A D I V E R S I D A D E N O RECENTE CINEMA TAILANDÊS BERNARDO DE BRITTO RIBEIRO

44 O QUE O CINEMA TAILANDÊS CONTEMPORÂNEO NOS DIZ SOBRE AS PREOCUPAÇÕES E ANSIEDADES CULTURAIS TAILANDESAS CONTEMPORÂNEAS JÉSSICA BOYD

53 H E Y J O E LUIZ CARLOS OLIVEIRA JR.

87 E N T R E V I S T A S 88 91

APICHATPONG WEERASETHAKUL P E N-E K R A T A N A R U A N G

107 P R O G R A M A Ç Ã O 108 109 110 111 112 113 114 115 116 117

P A R A S E M P R E S E U (1955) S E D A N E G R A (1961) O C I D A D Ã O (1977) T O N G P A N (1977) P E R I G O E M B A N G K O K (2000) A S D A M A S D E F E R R O (2000) T R A N S I S T O R M O N R A K (2002) S Í N D R O M E S E U M S É C U L O (2006) H I S T Ó R I A M U N D A N A (2009)

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P O N T O D E F U G A (2015)

TIO BOONMEE, QUE PODE RECORDAR SUAS VIDAS PASSADAS (2010) F R E E L A N C E: A T A Q U E D O C O R A Ç Ã O (2015)

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A CAIXA é uma das empresas que mais investem em cultura no Brasil. Através de seleção pública, torna democrática a participação de produtores e artistas de todo o país no processo. Dessa forma, garante a transparência e a possibilidade que um grande público tenha acesso à exposições, teatro, shows, dança e cinema. A vida pede mais que um banco. Pede mais cultura, lazer e arte.

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CAIXA ECONÔMICA FEDERAL

A CAIXA Cultural apresenta ao público a mostra CINEMA TAILANDÊS. A mostra vai exibir, através da seleção de 12 filmes, um panorama histórico do que há de mais significativo na produção cinematográfica tailandesa, em um recorte inédito no Brasil. O patrocínio a esse projeto é um meio de proporcionar aos seus visitantes o contato com essa cultura aparentemente tão distante.

O QUE O CINEMA TAILANDÊS

do século”. No pós-1997, a Tailândia produziu inúmeros filmes reacionários, repletos de diferentes percepções e respostas à instabilidade social.

CONTEMPORÂNEO NOS DIZ

CONTATO COM O OCIDENTE February, de Yuthlert Sippapak, e Transistor Monrak, de Pen-ek Ratanaruang, são dois exemplos de filmes que dão vida a preocupações e ansiedades contemporâneas. Giram em torno do contato com o Ocidente. Harrison descreve essa exposição ao ambiente ocidental como tendo um “impacto emocionalmente debilitante e desestabilizador”.

CULTURAIS TAILANDESAS C O N T E M P O R Â N E A S? JESSICA BOYD Para responder a esta pergunta, vou citar alguns filmes contemporâneos, February, Transistor Monrak, Rahtree – Flower of the Night e Síndromes e um Século (Sang Sattawat), para discutir as principais fontes do medo retratado pelo cinema tailandês. Então concluirei que o cinema tailandês contemporâneo funciona como uma janela para a realidade tailandesa, no qual o traço mais interessante parece ser a reflexão, relembrar para inspirar como melhor proceder em um ambiente influenciado pelo ocidentalismo, pela crise e pelos “outros”.

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Começarei falando da crise econômica e depois me voltarei para os contatos com o Ocidente e as distopias, o resultado visível do anteriormente mencionado ocidentalismo. Em seguida, mencionarei as formas de nostalgia que surgiram das ansiedades contemporâneas, antes de argumentar que talvez esta nostalgia não seja uma volta ao passado, mas um “reenraizamento” — se inspirar no passado. Terminarei discutindo as preocupações que cercam o fraturamento da sociedade e a censura estatal. CRISE ECONÔMICA Primeiramente, é importante situar o cinema tailandês contemporâneo na crise econômica de 1997-98. Tejapira a descreve como “a pior crise econômica tailandesa desde 1929” e Knee cita as subsequentes “revoltas culturais e econômicas da virada

A debilitação literal e metafórica está mais visível em February, que se torna o local visual onde conceitos de nacional (tailandês) e estrangeiro (“outro”) colidem de forma dramática. Essa colisão não é apenas cultural, mas uma realidade dramática quando Tailândia e Nova York se encontram pela primeira vez quando ocorre o sequestro de Kaweta por um taxista. Kaewta representa o corpo-geográfico tailandês, um corpo que é quase destruído ao colidir com um carro, ao colidir com a ocidentalização. Yuthlert joga com espaço e luz para retratar o perigo da situação dos dois protagonistas. Cenas noturnas, iluminação escura e opressora e espaços claustrofóbicos transformam a escuridão metafórica e o perigo do Ocidente em uma escuridão literal.

February não apenas apresenta a questão do lar e do estrangeiro para o espectador, mas também o convida a se engajar ativamente nos questionamentos desesperados do protagonista em relação a lar, identidade e o eu, para que os dois talvez encontrem o caminho de casa, a Tailândia, juntos. DISTOPIA Em February, Kaewta pode ter feito da Tailândia um lar, mas em My Girl, Killer Tattoo, 6ixty 9ine e Transistor Monrak as imagens cinematográficas são concebidas para mostrar o que acontece quando o “lar” (Tailândia) é maculado por forças modernizadoras. A distopia que esses filmes retratam é uma alusão ao medo contemporâneo tanto da ocidentalização quanto da globalização. A ideia da distopia urbana adverte os espectadores para que se afastem de existência tão banal e sigam na direção da extremamente diferente (imaginada) utopia do interior. No início de My Girl, o personagem principal, Jaeb, está em Bangkok. Sua vida na cidade é retratada como uma existência distópica e solitária, com pouco contato humano. Sua vida urbana tem falta de intimidade. Essa existência artificial é contrastada de forma incisiva com suas memórias de infância, que o invadem em meio a uma onda de músicas pop grudentas.

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E ANSIEDADES

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SOBRE AS PREOCUPAÇÕES

Conforme o filme avança, Pan fica cada vez mais distante de suas raízes do interior. Quanto mais distante, mais as coisas se deterioram. Pen-ek joga com este conceito de espaço; a localização de Pan se torna representativa do vazio que se forma entre os valores verdadeiramente tailandeses e a corrupção urbana. Em uma cena comovente, vemos Pan, que é relegado a fazer guirlandas nos bastidores, cantar para seu reflexo no espelho. O espelho, no entanto, está rachado e quebrado, exatamente como os sonhos que Pan tinha da cidade. O filme nos ensina que a vida na cidade não é a existência dos sonhos a que muitos aspiram, mas, em vez disso, uma estranha bolha onde nada é o que parece: Pan é um faxineiro; o coreógrafo é uma travesti; e Dao, a cantora de folk, teve de dormir com alguns homens para chegar a um “estrelato” que está longe de ser brilhante.

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É seguro dizer que o filme apresenta uma desilusão tão lúgubre que chega a ser cômica: Pan veio para a cidade virar cantor, mas acaba virando faxineiro, um assassino, e escapa por pouco de se tornar vítima de um estupro. O senso de humor sombrio de Pen-ek entra mais uma vez em ação quando Pan e seu amigo estão em uma festa beneficente para arrecadar dinheiro para os pobres. Os moradores ricos de Bangkok estão todos presentes pela nobre causa, que envolve uma maravilhosamente satirizada competição de quem se veste com a roupa de pobre mais convincente. Pan e seu amigo são os mais desgrenhados da festa, até que percebem que são pobres de verdade, momento em que são agredidos e jogados na sarjeta. O humor da cena é uma importante alusão à distorção da sociedade e às estruturas de classe em jogo. Através da tumultuada jornada de Pan de volta ao interior e das lições que ele aprende ao longo do caminho, Pen-ek delineia lições que a Tailândia também precisa aprender face à modernização, ocidentalização e internacionalização. Vemos Pan deixar de ser o caipira metido a machão, o duvidoso empresário de luk-tung, para se tornar o homem que volta para o interior para cumprir com seus deveres familiares.

NOSTALGIA E NOSTALGIA ESTATAL Filmes nostálgicos são a reação mais comum do cinema tailandês contemporâneo às preocupações e ansiedades culturais do país. Por meio da popularidade dos filmes nostálgicos e, claro, da exploração pelo Estado desse sentimento para criar “a nostalgia estatal”, o cinema tailandês demonstra que, no pós-1997, a sociedade contemporânea estava ávida por escapar das realidades sociais.

My Girl foi um enorme sucesso de bilheteria na Tailândia. Na verdade, fez tanto sucesso que foi o nono filme tailandês que mais arrecadou entre 2000-10. Essa popularidade reflete o fato de que no rastro da crise econômica, e de uma onda de filmes pós-modernos como Tears of the Black Tiger e 6ixty 9ine, o público tailandês começou a receber bem filmes f áceis de assimilar. My girl criou um espaço nostálgico que tinha uma distância segura da crise tailandesa. Em essência, os seis diretores do filme convidaram os tailandeses a deixar a vida adulta e aproveitar a reflexão nostálgica por meio do veículo da infância. Embora Tears of the Black Tiger seja um filme nostálgico, sua falta de sucesso nacional demonstra que não era acessível às massas tailandesas. My Girl, no entanto, é situado com segurança na infância. Conforme diz Kong Rithdee, cinema é uma “ferramenta efetiva em nos ajudar a lembrar, e o fofo My Girl é um banquete romântico de lembranças”. Embora o filme esteja na memória de Jaeb, o final traz o público de volta ao presente. Nós, espectadores, junto com Jaeb, testemunhamos o quanto sua cidade rural se transformou com o tempo. A loja de esquina da família foi substituída por uma franquia da 7/11, pistas poeirentas se tornaram estradas movimentadas e Noi Nah vai se casar. Certamente já não estamos mais no reino infantil de Nárnia. Quando o filme se aproxima do fim, Jaeb diz, “a viagem de volta para casa me fez perceber como as coisas mudaram”. Apesar dessas mudanças físicas, as memórias de Jaeb permanecem intocadas pelo tempo, assim como sua imagem congelada de Noi Nah e a ideia concebida do que é ser tailandês. As duas estão preservadas na memória do público, pronto para ser carregado para o futuro incerto.

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As provações por que passam o casal apresentam ao espectador importantes alusões à gradual degradação da cultura tailandesa. O personagem de Pan nos adverte sobre os perigos urbanos de Bangkok, enquanto Sadao, sua contraparte literal (esposa) e metafórica (interior), nos lembra da moralidade “tailandesa”.

O personagem de Sadao também carrega com ela uma importante alusão ao estado emocional da sociedade. Knee argumenta que ela representa “uma preocupação pelas necessidades e emoções humanas básicas que estão, por implicação, sob ameaça na Bangkok e na Tailândia modernas”.

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Embora My Girl nos leve da cidade para o interior, o Transistor Monrak, de Pen-ek Ratanaruang, começa com Pan e Sadao levando uma vida idílica, até mesmo clichê, no interior.

NOSTALGIA ESTATAL Nostalgia estatal mexe com emoções similares, embora de uma forma mais calculada e que encontra suas raízes na propaganda.

Wisit usa atores tailandeses famosos dos anos 1970, pegando o velho e transformando-o em novo mais uma vez. Outro exemplo disso é Wisit buscar inspiração no diretor tailandês Ratana Pestonji

The Legend of Suriyothai e The Legend of King Naresuan, ambos de Chatrichalerm Yukol, nos apresentam um tipo diferente de nostalgia e tipos diferentes de preocupações e ansiedades. Esses dois filmes exemplificam a transformação da nostalgia em uma commodity e a criação da nostalgia estatal. McCormick fala sobre “o potencial político da nostalgia”, algo que foi muito explorado por esses dois blockbusters nacionais.

SOCIEDADE FRATURADA Ao considerar o que o cinema contemporâneo tailandês nos diz sobre as preocupações e ansiedades culturais tailandesas, é interessante observar o terror tailandês e a maneira como esse gênero manipula ideias de morte, abandono e engano para representar a sociedade fraturada tailandesa. Usarei os exemplos de Nang Nak, de Nonzee Nimibutr, e o Rahtree: Flower of the Night, de Yuthlert Sippapak, para demonstrar isso.

REENRAIZAMENTO McCormick argumenta que a nostalgia “lembra o passado, um tempo utópico ao qual o presente deveria aspirar e se esforçar para recriar”. Também argumentaria, em vez disso, que, mais que recriar o passado, filmes nostálgicos tailandeses como o Tears of the Black Tiger prega que a vida contemporânea seja inspirada por um passado relembrado de forma afetuosa, em vez de ser baseado nele.

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O Tears of the Black Tiger, de Wisit Sasanatieng, é uma fantástica ilustração do reenraizamento nostálgico, que pega a nostalgia e a transforma num casaco de sonhos tecnicolor. No rastro do crash econômico de 1997 e do influxo de produções de filmes nostálgicos, o filme cria um tipo novo e importante de nostalgia. O set de filmagem falso, a brilhante atuação exagerada e as cores gritantes sugerem de forma poderosa que Wisit não está sendo nostálgico porque deseja que o espectador volte para o passado, mas porque quer prestar homenagem a um tempo passado, na esperança de que possamos nos inspirar no passado e no estrangeiro para transformar o presente. Isso é fortemente comunicado pelo fato de Wisit ter pegado o clássico filme de caubói e transformado um ocidental em um tailandês.

Rahtree: Flower of the Night é classificado como terror, com a maior fonte de terror sendo Buppha: uma garota que sangra até a morte depois de um aborto. No entanto, eu argumentaria que o verdadeiro terror reside dentro da sociedade e de seu tratamento em relação a essa jovem, que é estuprada, enganada, engravidada, forçada a abortar, abandonada e assassinada pela apatia da sociedade. O filme também fez uma alusão cômica e agressiva aos “Outros”. No início, parece que Buppha é o “Outro”, o monstro mortífero feminino que deve ser exterminado. De fato, todos os personagens do filme estão desesperados para tirá-la não só do apartamento, como da face da terra. No entanto, os personagens que tanto temem Buppha porque ela é diferente (o.k, morta) são eles próprios um grupo de desajustados: corrompidos, questionáveis, estrangeiros ou tudo isso junto. São os fantasmas vivos do mundo urbano. Talvez então possamos entender seu medo absoluto de Buppha como um medo simbólico de sua própria “qualidade de ser outro”. Temos duas cabeleireiras gordas transexuais que nunca têm clientes, um lojista preguiçoso e inepto e seu assistente incapacitado; a esposa corrupta, sem vaidade e desagradável, proprietária da loja; seu marido que nada faz além de rezar; o funcionário também incapacitado da proprietária; o padrasto pedófilo e sexualmente abusivo de Buppha; e, finalmente, Ake, um jovem rico de Bangkok que destrói a vida de Buppha para ganhar uma garrafa de bebida,

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Essa “nostalgia nacional” sugere um aumento da influência ocidental na Tailândia e a subsequente reação do Estado a ela. Seria possível argumentar que o investimento de tanto dinheiro e de tempo de transmissão para a monarquia na verdade implica a influência de seu declínio e, subsequentemente, uma tentativa um tanto desesperada de reacender algum simulacro do orgulho real e do nacionalismo.

Em Nang Nak, há a fugaz possibilidade de que a morta Nak e seu marido Mak possam viver em algum tipo de harmonia. Da mesma forma, em Rahtree: Flower of the Night, Buppha começa uma relação post-mortem similar com Ake. Isso acontece antes de percebermos que Ake também está morto e que assistimos ao relacionamento de dois fantasmas, vivos, e, no entanto, mortos. Esse cruzamento estranho entre vida e morte reflete os conflitos sociais dentro da sociedade tailandesa. De acordo com Komg Rithdee, “a possibilidade de uma existência harmoniosa entre pessoas de diferentes aprendizados e naturezas está exatamente no coração do nosso atual conflito social. Os ‘fantasmas’ estão entre nós”.

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Tal exploração extensiva da nostalgia parece demonstrar que o governo tailandês gostaria que o público esquecesse que tem a capacidade de forjar um novo futuro, um futuro que tem influência tanto do passado quanto do presente. Por meio das cenas épicas de batalha, guerreiros e salvadores reais admiráveis fomentam (criam) um orgulho nacional em um esforço de reprimir a ameaça do estrangeiro.

Eu argumentaria que a obra de Apichatpong é o retrato mais preciso e verdadeiro da vida tailandesa contemporânea e de todas as suas preocupações e ansiedades, no qual ele não atribuiu um ideal tailandês e se livra das algemas do que é ser tailandês. Numa entrevista, Apichatpong disse sobre Síndromes e um século: “Meu filme vai olhar para o passado para enxergar o futuro. Simplesmente pessoas vivendo, inspirando e expirando, encontrando-se umas com as outras — isso já é um milagre”. Os filmes de Apichatpong são normalmente difíceis de entender, mas é essa transitoriedade que é tão forte em seu trabalho, que transforma seus filmes em uma experiência. Em vez de explicitamente se revoltar contra as amarras políticas e sociais, Apichatpong cria com habilidade uma sensação que transmite a realidade tailandesa. Em Síndromes e um século, a maior parte do filme se passa dentro das paredes de um hospital. Um lugar de cura, doença, nascimento, vida e morte. Para não mencionar os médicos que escondem bebida alcoólica em pernas artificiais, dentistas cantores de folk e monges que oferecem chá. Uma cena particularmente notável nos coloca nas vísceras do hospital, observando um tubo de metal extrair fumaça. Interpreto isso como a representação visual de Apichatpong da falta de sabor da vida, que perdeu sua espiritualidade e uniformidade concreta.

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Schager declara que Síndromes e um século “não é apenas um adorável tributo ao passado, mas (uma) tentativa de preservação experimental”. Discordo disso e defendo que, apesar ter um aspecto de passado e presente, um dos traços marcantes de Síndromes e um século é que o passado se funde com o presente, as memórias se misturam com a realidade e o tempo se torna atemporal. Em vez de entender o trabalho de Apichatpong como uma ode ao passado, eu o entendo como uma inflexível ode à realidade, na qual todas as peças fragmentadas de vida e a sociedade fraturada se juntam para formar o que percebemos ser nossa própria realidade.

SEGUNDO RITHDEE: A palavra tailandesa para natureza… é dharma-chart, cuja raiz linguística é baseada na palavra dharma. Nos ensinamentos do dharma budista somos ensinados que tudo é impermanente. É apenas ilusão, ou sonho, ou memória. O cinema de Apichatpong é dharma-chart — o cinema da impermanência. Como ele mesmo está aprendendo como deixar as coisas fluírem, não se sentir preso, talvez devamos fazer o mesmo quando assistimos aos seus filmes. CONCLUSÃO Para concluir, a grande diversidade do cinema tailandês contemporâneo retrata um grande número de preocupações e ansiedades culturais tailandesas. Particularmente no cinema do pós-1997, assim como em filmes mais contemporâneos, como os de Apichatpong, há um claro desconforto em torno do reconhecimento dos tempos de mudança, e uma busca subsequente sobre como prosseguir. A busca predominante por e o retorno à identidade tailandesa através da nostalgia é a resposta mais comum. Apesar disso, a mensagem predominante do cinema contemporâneo tailandês parece ser a que não há identidade tailandesa singular para recuperar, e, que, em vez disso, a sociedade tailandesa deveria buscar inspiração no passado para permear seu presente.

JESS BOYD Jess Boyd é teórica do cinema e pesquisadora. Especializada em Língua e Cultura Vietnamita e em Estudos de Desenvolvimento no Vietnam pela SOAS - School of Oriental and African Studies, na Universidade de Londres. Entre suas publicações está “The Thai Time Machine”, na Our Magazine entre outros estudos asiáticos. Contato: [email protected]

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CENSURA Filmes como Síndromes e um século transmitem de forma poderosa as realidades políticas e sociais da Tailândia de hoje. Estar preso e amordaçado pelas leis de censura talvez seja o que torna esses filmes alusões tão importantes para as preocupações e ansiedades tailandesas contemporâneas. A mordaça força diretores a encontrar novos meios de expressão e, assim, abre portas para uma forma diferente de contar história.

Enquanto Transistor Monrak, 6ixty 9ine, Killer Tattoo, Hotel Angel, February (e a lista continua) fazem alusão explícita ao medo da ocidentalização e retratam batalhas individuais contra o mal urbano, Síndromes e um século aceita, incorpora e consome a nostalgia, a distopia, o medo e produz uma representação da vida tailandesa drogada embora lúcida, clara embora confusa, concisa embora intricada. Todas as contradições e confusões agem como tijolos que transmitem uma mensagem importante sobre a identidade tailandesa: não há uma identidade. O fato de o filme ser difícil de entender talvez seja a alusão mais importante de Apichatpong às preocupações e ansiedades culturais tailandesas contemporâneas. Em vez de constantemente tentar entender os inexplicáveis altos e baixos sociais, políticos e econômicos da sociedade tailandesa, talvez seja melhor aceitar a transitoriedade política e prosseguir com o sentimento com o qual somos deixados depois de assistir um dos filmes de Apichatpong.

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para não mencionar um desfile de exorcistas ineptos. Não parece muito promissor para a sociedade tailandesa.

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ภาพยนตร์ไทย ESTE LIVRO FOI IMPRESSO PELA GRÁFICA STAMPPA LTDA NO FORMATO 180 x 250 mm. MIOLO PB: 104 PÁG. EM OFFSET 120g/m2 | 1/1 CORES. MIOLO CORES: 16 PÁG. EM COUCHÊ MATTE 120 g/m2 |4/4 CORES. CAPA A CORES EM DUODESIGN 300/m2 | 4/4 CORES.

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