4.º COLÓQUIO DE ARQUEOLOGIA DO ALQUEVA O Plano de Rega (2002-2010)
MEMÓRIAS d’ODIANA 2.ª Série Estudos Arqueológicos do Alqueva
FICHA TÉCNICA MEMÓRIAS d’ODIANA - 2.ª Série TÍTULO
4.º COLÓQUIO DE ARQUEOLOGIA DO ALQUEVA O Plano de Rega (2002 – 2010) EDIÇÃO
EDIA - Empresa de desenvolvimento e infra-estruturas do Alqueva DRCALEN - Direcção Regional de Cultura do Alentejo COORDENAÇÃO EDITORIAL
António Carlos Silva Frederico Tátá Regala Miguel Martinho DESIGN GRÁFICO
Luisa Castelo dos Reis / VMCdesign PRODUÇÃO GRÁFICA, IMPRESSÃO E ACABAMENTO
VMCdesign / Ligação Visual TIRAGEM
500 exemplares ISBN
978-989-98805-7-3 DEPÓSITO LEGAL
356 090/13
Memórias d’Odiana • 2ª série
FINANCIAMENTO
EDIA - Empresa de desenvolvimento e infra-estruturas do Alqueva INALENTEJO QREN - Quadro de Referência Estratégico Nacional FEDER - Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional Évora, 2014
ÍNDICE 9
INTRODUÇÃO
11
PROGRAMA
15
LISTAGEM DOS PÓSTERES APRESENTADOS
17
CONFERÊNCIAS
19
“Alqueva – Quatro Encontros de Arqueologia depois...”. António Carlos Silva
34
“O património cultural no Empreendimento de Fins Múltiplos de Alqueva: caracterizar, avaliar, minimizar, valorizar …”. Miguel Martinho
45
“O Acompanhamento no terreno do Projecto EFMA na área da Extensão de Castro Verde do IGESPAR”. Samuel Melro, Manuela de Deus
53
COMUNICAÇÕES
55
“Um mundo em negativo: fossos, fossas e hipogeus entre o Neolítico Final e a Idade do Bronze na margem esquerda do Guadiana (Brinches, Serpa)”. António Carlos Valera, Ricardo Godinho, Ever Calvo, F. Javier Moro Berraquero, Victor Filipe e Helena Santos
74
“Intervenção arqueológica em Porto Torrão, Ferreira do Alentejo (2008-2010): resultados preliminares e programa de estudos”. Raquel Santos, Paulo Rebelo, Nuno Neto, Ana Vieira, João Rebuje, Filipa Rodrigues, António Faustino Carvalho
83
“Contextos funerários na periferia do Porto Torrão: Cardim 6 e Carrascal 2”. António Carlos Valera, Helena Santos, Margarida Figueiredo e Raquel Granja
96
“Intervenção Arqueológica no sítio de Alto de Brinches 3 (Reservatório Serpa – Norte): Resultados Preliminares”. Catarina Alves, Susana Estrela, Eduardo Porfírio, Miguel Serra
103
“Caracterização preliminar da ocupação pré-histórica da Torre Velha 3 (Barragem da Laje, Serpa)”. Catarina Alves, Catarina Costeira, Susana Estrela, Eduardo Porfírio, Miguel Serra, António M. Monge Soares, Marta Moreno-Garcia
112
“Questões e problemas suscitados pela intervenção no Casarão da Mesquita 4 (S. Manços, Évora): da análise intra-sítio à integração e comparação regional”. Susana Nunes, Miguel Almeida, Maria Teresa Ferreira, Lília Basílio
119
“Um habitat em fossas da Idade do Ferro em Casa Branca 11, na freguesia de Santa Maria, concelho de Serpa”. Susana Rodrigues Cosme
125
“Poço da Gontinha 1 (Ferreira do Alentejo): resultados preliminares”. Margarida Figueiredo
132
“Currais 5 (S. Manços, Évora): diacronia e diversidade no registo arqueoestratigráfico”. Susana Nunes,; Mónica Corga, Miguel Almeida, Lília Basílio ÍNDICE
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5
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6
137
“A villa romana do Monte da Salsa (Brinches, Serpa): uma aproximação à sua sequência ocupacional”. Javier Larrazabal Galarza
145
“Dados para a compreensão da diacronia e diversidade do registo arqueológico na villa romana de Santa Maria”. Mónica Corga, Maria João Neves, Gina Dias, Catarina Mendes
155
“A pars rústica da villa da Insuínha 2, freguesia de Pedrógão, concelho da Vidigueira”. Susana Rodrigues Cosme
162
“A villa da Herdade dos Alfares (São Matias, Beja) no contexto do povoamento romano rural do interior Alentejano”. Mónica Corga, Miguel Almeida, Gina Dias, Catarina Mendes
171
“A necrópole de incineração romana da Herdade do Vale 6, freguesia e concelho de Cuba”. Susana Rodrigues Cosme
178
“Necrópole romana do Monte do Outeiro (Cuba)”. Helena Barranhão
185
“O conjunto sepulcral do Monte da Loja (Serpa, Beja)”. Sónia Cravo e Marina Lourenço
191
“O sítio de São Faraústo na transição da Época Romana para o Período Alto-Medieval, freguesia de Oriola, concelho de Portel”. Susana Rodrigues Cosme
197
“O sítio romano da Torre Velha 1. Trabalhos de 2008-09 (Barragem da Laje, Serpa)”. Adriaan De Man, Eduardo Porfírio, Miguel Serra
203
“Análise preliminar dos contextos da Antiguidade Tardia do sitio Torre Velha 3 (Barragem da Laje - Serpa)”. Catarina Alves, Catarina Costeira, Susana Estrela, Eduardo Porfírio, Miguel Serra
212
“A Necrópole de São Matias, freguesia de São Matias, concelho de Beja”. Susana Rodrigues Cosme
219
“Xancra II (Cuba, Beja): resultados preliminares da necrópole islâmica”. Sandra Brazuna, Ricardo Godinho
225
“Funchais 6 (Beringel, Beja) – resultados preliminares”. Manuela Dias Coelho, Sandra Brazuna
231
PÓSTERES
233
“Primeiros resultados da intervenção arqueológica no sítio Torre Velha 7 (Barragem da Laje - Serpa)”. Adriaan De Man, André Gregório, Eduardo Porfírio, Miguel Serra
237
“A Torre Velha 3 (Serpa) no espaço geográfico. Uma abordagem morfológica de um “sítio” arqueológico”. Miguel Costa, Eduardo Porfírio, Miguel Serra
242
“O contributo da Antropologia para o conhecimento das práticas funerárias pré e proto -históricas do sítio de Monte da Cabida 3 (São Manços, Évora)”. Maria Teresa Ferreira
246
“Villa Romana da Mesquita do Morgado (S. Manços, Évora): considerações acerca das práticas funerárias”. Maria Teresa Ferreira
ÍNDICE
“Monte da Palheta (Cuba, Beja): dados para a caracterização arqueológica e integração do sítio à escala regional”. Mónica Corga, Gina Dias
256
“Aldeia do Grilo (Serpa): contributos para o estudo do povoamento romano na margem esquerda do Guadiana”. Carlos Ferreira, Mónica Corga, Gina Dias, Catarina Mendes
261
“Resultados preliminares de uma intervenção realizada no sítio Parreirinha 4 (Serpa)”. Carlos Ferreira, Susana Nunes, Lília Basílio
267
“Depósitos cinerários em Alpendres de Lagares 3”. Maria Teresa Ferreira, Mónica Corga, Marta Furtado
271
“Workshop Dryas’09: Estruturas negativas da Pré e Proto-história peninsulares – estado actual dos nossos conhecimentos... e interrogações”. Miguel Almeida, Susana Nunes, Maria João Neves, Maria Teresa Ferreira
276
“Intervenção arqueológica na Horta dos Quarteirões 1, Brinches, Serpa”. Helena Santos
280
“A Intervenção Arqueológica no Monte das Covas 3 (S. Matias, Beja): Os contextos romanos de época republicana”. Lúcia Miguel
284
“O Sítio do Neolítico antigo da Malhada da Orada 2 (Serpa): resultados preliminares”. Ângela Guilherme Ferreira
289
“Intervenção arqueológica nas necrópoles do Monte da Pecena 1 e Cabida da Raposa 2”. Andrea Martins, Gonçalo Lopes, Marisa Cardoso
7
ÍNDICE
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“O SÍTIO ROMANO DA TORRE VELHA 1.TRABALHOS DE 2008-09 (BARRAGEM DA LAJE, SERPA)”.103 ADRIAAN DE MAN104, EDUARDO PORFÍRIO105, MIGUEL SERRA106 Resumo O sítio de Torre Velha 1 foi intervencionado pela Palimpsesto – Estudo e Preservação do Património Cultural Lda. no âmbito do projecto de Minimização de Impactes sobre o Património Cultural decorrentes da Construção da Barragem da Laje (Serpa), da responsabilidade da EDIA S. A. Torre Velha 1 corresponde a um sítio de cronologia romana e tardo-antiga, localizado numa elevação junto da ribeira da Laje, nas proximidades de Serpa. Alguns indicadores resultantes de uma escavação recente obrigam a conjugar os dados com os de outros dois núcleos identificados na mesma área (Torre Velha 3 e 7).
Abstract The archaeological excavation of Torre Velha 1 was recently carried out by Palimpsesto – Estudo e Preservação do Património Cultural Lda. under the project Minimização de Impactes sobre o Património Cultural decorrentes da Construção da Barragem da Laje (Serpa), responsibility of EDIA S.A. Torre Velha 1 corresponds to a roman and late antique site, located on a hilltop along the Laje stream, near Serpa. Some indicators resulting from a recent excavation require a combination of data with those of other two sites identified in the same area (Torre Velha 3 and 7).
1. Contexto Dos vários sítios arqueológicos identificados no Vale da Laje, o da Torre Velha 1 (TV1) era o único que era conhecido há muito (Moita, 1965), tendo sido intervencionado na década de oitenta, embora de forma muito superficial, provavelmente no projecto “A margem esquerda do Guadiana da Romanização ao Domínio Árabe”, de acordo com o sumário disponível na “Informação Arqueológica” de 1985, e acabou depois referido no livro “Arqueologia do Concelho de Serpa” (Lopes, Carvalho, Gomes, 1998). Um recente estudo, encomendado pela EDIA, tinha feito sugerir uma série de pontos para escavação ao longo do vale, na área que virá a ser afectada pela construção e funcionamento de uma barragem. Neste âmbito, a empresa Palimpsesto – Estudo e Preservação do Património Cultural Lda. levou a cabo uma série de sondagens, que culminaram na validação de dois outros sítios, TV3 e TV7, ambos divulgados noutros textos desta mesma publicação (fig. 1). Os trabalhos de 2008 em TV1 centraram-se em duas estruturas que, num alinhamento paralelo mas a cotas distintas, se encontravam parcialmente expostas, embora carecessem de definição (fig. 2).
2. Sondagem 1 A mais elevada destas estruturas estava visível no seu lado ocidental, nomeadamente o sector do muro que se destacava mais, e que veio a revelar-se uma sobreposição ligeiramente divergente de um troço anterior. É a este muro que correspondem os prolongamentos para Norte e Sul que se deixam identificar nos sectores adjacentes ainda não escavados. Tais muros assentam, por seu turno, num terceiro, formando uma sequência em escada que termina, neste sector ocidental, sobre uma concentração de telha e pedra que formaria um alinhamento imediatamente abaixo do nível de circulação original. Estas sobreposições são interpretáveis num espaço de tempo relativamente reduzido, isto é, o que de início parecia um reaproveitamento com eventual amplitude cronológica pode afinal fazer parte de uma construção integrada (fig. 3).
Este artigo foi preparado para publicação em Fevereiro de 2010. Entretanto foram realizados outros trabalhos no vale da Laje e elaborados outros estudos para determinados aspectos da ocupação humana neste local. Os dados e as leituras aqui reproduzidos deverão, por estas razões, ser lidos à luz da sua data de elaboração. 104 Universidade Nova de Lisboa,
[email protected] 105 Palimpsesto, Estudo e Preservação do Património Cultural, Lda. Apartado 4078, 3031 – 901 Coimbra, Portugal.
[email protected] 106 Palimpsesto, Estudo e Preservação do Património Cultural, Lda.
COMUNICAÇÕES
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)LJXUD²/RFDOL]DomRGDiUHDGHLQWHUYHQomRFRPUHIHUrQFLDjLQIUDHVWUXWXUD da Barragem da Lage, na Carta Militar 1:25 000, folha número 523 (Fonte EDIA).
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Figura 2 – Planta geral das sondagens.
Esta área foi intervencionada numa extensão de 50 m², e permitiu colocar a descoberto uma divisão, bem como sugerir algumas continuidades arquitectónicas. No tocante à configuração deste compartimento interno delimitado pela construção em escada, o seu último muro envolvente assenta directamente sobre todas as construções prévias. É preciso indicar desde logo que as únicas camadas com concentração aparentemente selada de elementos romanos Figura 3 – Planta da sondagem 1, ao nível do segundo pavimento. (metais, TS Hispânica Tardia e Clara) surgem em posições limítrofes das sondagens, na medida em que se optou por não danificar o pavimento pós-romano. A Norte, o compartimento é encostado por dois muros perpendiculares, e as camadas mais antigas são já imperiais, num contexto cronológico bastante amplo (Dragendorff 27 e Ritterling 8, lucerna Ponsich 7), associado a uma grande concentração de metais e de vidro incolor, azul esverdeado e azul petróleo, o que, tudo conjugado, define um leque muito amplo mas em todo
COMUNICAÇÕES
o caso não anterior a uma fase avançada do Alto Império. O horizonte que se lhe sobrepõe, e que já envolve e cobre os referidos dois muros (indicando que o espaço a Norte estaria já inutilizado) revelou presença de materiais de importação africana já mais tardios (p.ex. Hayes 80b e imitação de Drag. 37 tardia), apontando para os séculos V e VI. Um alargamento da sondagem poderia comprovar a eventual tardo-romanidade dos próprios muros, cujo adossamento a M2 (isto é, à construção do próprio compartimento na sua forma original) implicaria, por arrasto, uma cronologia pelo menos pouco anterior para a construção deste último muro, que não parece ter sofrido reconstruções na sua parte superior. Portanto, a sequência arquitectónica mais provável parte de uma estrutura Figura 4 – Vista para Oeste da estruturas da sondagem 1. inicial, adaptada para funcionar como suporte do compartimento, e ao primeiro piso de opus signinum, ao qual se acrescentou posteriormente um compartimento externo a Norte, ao que tudo indica, de grandes dimensões. É de focar uma insistência específica naquele espaço, apesar das sucessivas alterações arquitectónicas (fig 4). A sequência deposicional, na sua relação com a compartimentação, começa a diferenciar-se abaixo das unidades de superfície, nomeadamente a camada superior de revolvimento, a primeira camada selada e um pavimento muito destruído que cobre a quase totalidade do espaço. Assim, a mais complexa das evoluções (a par da que existia sobre os muros em escada e sobre os adossados) desenvolveu-se no interior do próprio compartimento. Entre o primeiro e um segundo pavimento, que ocupa apenas o espaço interno, existe uma camada de enchimento que não é homogénea, e por vezes inexistente, na medida em que nalguns pontos há sobreposição directa de ambos os nivelamentos. Este segundo piso é perfurado em três locais distintos, tendo ficado por definir uma quarta alteração do piso, na extremidade oriental da sondagem. Os dois primeiros casos são análogos, e consistem em covas cilíndricas de reduzida profundidade. Ambas as estruturas negativas atingem cotas praticamente semelhantes, e ambas revelaram estratigrafias de enchimento lineares, sem outra explicação que o da sua inutilização. É de realçar que não existe qualquer vestígio de reboco das paredes, invalidando por inerência uma hipótese de identificação de silos. Quanto à terceira perfuração, cujo enchimento final foi posteriormente afectado por uma pequena camada argilosa quase estéril com concentração de cinza, ela apresenta uma interessante sucessão de escavação e depósito, sendo também de maiores dimensões. De resto, a definição desta estrutura pôs a descoberto um terceiro pavimento em opus signinum que intersecta com um muro, precisamente sob a estrutura negativa em questão. Depreende-se que o espaço original, sob o piso mais tardio, estaria compartimentado. A sequência deposicional da terceita estrutura negativa revelou uma maior concentração de fragmentos do pavimento e de talha, o que, em associação à sua própria forma subcónica, indicia o negativo de um grande dolium, hipótese que resolveria o problema destas perfurações, cujo escasso material antrópico no enchimento afasta a interpretação de lixeira. O conjunto dá a entender que os recipientes terão sido removidos com sucesso das primeiras duas estruturas negativas, mas que no terceiro caso a tentativa terá falhado, com fragmentação da peça.
3. Sondagem 2
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Os 30m² escavados nesta sondagem, localizada a uma cota mais baixa e num alinhamento com a estrutura identificada em S1, permitiram a definição de uma sequência com poucas alterações repentinas. Uma primeira camada cobria uma outra unidade muito revolvida, que terá sido criada aquando de um recente nivelamento do terreno entre as duas sondagens, alterando muito a topografia, cujo declive original seria de certeza mais inclinado. Como ficou mencionado mais acima, o local da sondagem tinha já sido afectado por uma escavação antiga, não registada e em todo o caso pouco incisiva, que colocou à vista o início de uma estrutura quadrangular, numa ligação directa com o interior do muro que se identifica a Oeste, numa vaga orientação Norte-Sul, e que serve até hoje de contenção à plataforma artificial. O enquadramento arquitectónico é dominado por este compartimento quadrangular, e pela sua continuidade em direcção ao edifício da sondagem 1, articulação que, de resto, seria interessante clarificar no futuro. A inteira estrutura, que se eleva até uma cota que corresponde aproximadamente ao futuro nível de água da barragem, encontra-se construída sobre uma outra, de orientação semelhante, que é não apenas sobreposta por fiadas de uma fase mais recente, mas
Figura 5 – Planta da sondagem 2.
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Figura 6 – Estrutura na sondagem 2, com sobreposição de paramento.
também envolvida, no seu lado ocidental externo, pelo grande muro de contenção. Do ponto de vista deposicional, após as camadas superficiais, a estratigrafia desenvolve-se em quatro direcções. Duas dessas sequências apresentam uma reduzida importância para o entendimento da estrutura; trata-se de um derrube sobre uma bolsa de terra estéril e, ainda, das camadas superiores de um possível segundo compartimento, por escavar devido ao reduzido espaço deixado livre pela actual sondagem (figs. 5 e 6). Por seu turno, as restantes duas sequências, no interior e exterior do compartimento, permitem identificar sucessivas ocupações desde o momento de construção. O espaço interno evidenciou uma sequência quase linear. Um primeiro nivelamento, bem como um pequeno depósito associado, são talvez correspondentes à cota atingida por aquela intervenção prévia não registada, na medida em que o nível seguinte se encontra muito mais compactado, embora praticamente estéril, o que pode indiciar que também ele já tivesse sido escavado e reposicionado. A camada seguinte correponde de certeza a um depósito selado, apoiado no substrato argiloso. No lado norte do compartimento desenvolveu-se uma sequência paralela, que também atinge os níveis geológicos. Por baixo das primeiras camadas de superfície existem bolsas que cobrem um único e grande depósito de terra acastanhada clara. Este sobrepõe-se a um outro, contendo uma concentração de carvões, associado a um derrube, que do ponto de vista topográfico se articula directamente com a construção do compartimento. Sobre este edifício, é de apontar acima de tudo a sua dupla fase construtiva, assentando numa estrutura prévia, com concentração de reboco interno na transição, ou seja, no piso normalizado aquando da reconstrução. Apenas numa segunda fase, coincidente na topografia com a transição da primeira das unidades estratigráficas seladas para as sobrepostas, houve integração com o muro exterior. Em suma, as primeiras camadas claramente seladas no interior do compartimento demonstraram ligações com uma primeira fase que se presume imperial, e que corresponde à cota da construção original, implantada directamente sobre o subsolo argiloso. O referido nível de transição no aparelho encontra-se associado a uma transição na estratigrafia, que revelou uma primeira ocupação antoniniana, pelo menos a fazer fé no cruzamento de dados (p. ex. Drag. 36 com Hayes 9A). Define-se ainda uma segunda ocupação, articulada à reconstrução do compartimento, por extensão, ao muro que, no mesmo alinhamento, delimita a plataforma. No compartimento a Este, apesar do reduzido espaço escavado, destacam-se dois fragmentos de TSC C (um deles não orientável, sendo o outro uma forma Hayes 50, datáveis de 300 a 360). Esta camada cobria uma camada composta quase exclusivamente por fauna malacológica, em particular conchas de ostras e de berbigão. Dentro do compartimento verificou-se uma sequência análoga, do ponto de vista topográfico e sequencial, com uma forma Hayes 61 A, datável de 325 a 400-420. O depósito externo, que se adossa, portanto, já à reconstrução do compartimento, continha formas TSH tardias Drag. 15/17, mas principalmente três fragmentos de produções africanas Hayes 105, datáveis entre 580 e 660. Ou seja, o enchimento do espaço externo só se terá dado em época tardo-antiga.
4. Notas Um dos problemas do complexo prendeu-se, logo numa fase inicial dos trabalhos, com o próprio significa-
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do funcional daquelas estruturas. Na verdade, a interpretação que tem vindo a ser dada ao sítio da Torre Velha 1, tomando-o como villa, não surge claramente confirmada através dos trabalhos realizados. Se por um lado é inegável a existência de um importante núcleo de povoamento imperial, essa realidade apenas pôde ser atestada através de materiais presentes em unidades deposicionais mais tardias, ou em áreas muito limitadas da sondagem, impedindo uma visão de conjunto. O material exumado encontra-se tratado e sumariamente inventariado, sendo possível avançar com três ou quatro horizontes de ocupação. Uma primeira observação prende-se com o facto de as unidades mais antigas parecerem bastante tardias num contexto romano, ainda por cima no Sul da Lusitânia, dada a elevada presença de importações norte-africanas em camadas de fundação. No entanto, tratar-se-ia sempre de uma fase anterior ao século IV, não se ligando portanto ainda àquelas villae lusitanas que costumam servir de indicador para a ruralidade pós-tetrárquica. De resto, numa considerável área de dispersão de materiais e de escavação, nem uma única tessela faz sugerir a existência de um sector residencial com valências aristocráticas ou ostentativas que, a confirmar-se, teria de estar completamente intacto. O que é interessante neste vale é precisamente a transição para uma cronologia visigótica, e mesmo emiral, a partir de um núcleo tardo-romano que, como se acaba de indicar, não pode ser considerado uma villa tardia com aquelas características típicas que geralmente lhe associamos. As ocupações coerentes pós-romanas atingem mas não ultrapassam o período califal. Destacam-se peças como um prato de bordo arredondado e decoração incisa, com um fundo em disco, da sondagem 2, assim como várias outras peças da sondagem 1 (jarrinhos de colo alto e canelado, cordões digitados aplicados e os alguidares de fundo em disco, vidrados melados), análogas a outras zonas peninsulares (a título comparativo, vide C.E.V.P.P. 1991). Recuperou-se uma certa depuração das pastas, e o uso exclusivo de torno rápido, mas as cozeduras, embora oxidantes, não atingiram as temperaturas dos fornos romanos e no leque de cores passa a dominar o beige. Há também vários casos de cozedura redutora mas arrefecimento oxidante, o que, de novo, aponta para estruturas de combustão menos sofisticadas. Estes dados em particular levantam algumas questões sobre a evolução de núcleos rurais entre o Baixo Império e os inícios da Idade Média. Vários indicadores levam a crer que a estrutura produtiva visigótica na Lusitânia central (Correia, De Man, Pereira 2008), em regra, não subdividiu o sistema agrário imperial, e que a figura de tertia Romanorum integrava um sistema fiscal, não tendo havido um retalho do fundus romano (De Man 2009). Mais: não há hoje corroboração substantiva para manter o panorama tradicional dos campos romanos, em que se opunha em termos exclusivos a imagem de um vicus com camponeses livres e proprietários, por um lado, e uma villa com o respectivo fundus, sob as ordens de um terratenente. Haverá muitas formas híbridas, das quais o vale da Laje poderá ser um exemplo. Sobre a continuidade, eventualmente familiar, dos proprietários da Torre Velha em época tardo-antiga, ela até é bem possível. Na Itália bizantina, o dono do fundus sobrevive sem problemas, e mesmo em zonas de ocupação germânica, como na Gália, ocorreu idêntico fenómeno (Wickham 2005). Sobre esta dinâmica, é preciso manter presente que as aldeias alto-medievais quase nunca surgem das villae romanas e visigóticas, e que foram aquelas, e não os núcleos de herança romana, que deram origem às “villas” do século IX (Alarcão 2004). Por fim, o trabalho de Conceição Lopes (1997 e 2003) nesta zona em torno de Beja demonstrou uma convivência de sítios mais modestos a par das villae, parecendo não haver determinação pela geomorfologia, o que equivale a reconhecer a ausência de uma regra abstracta na escolha de cada tipo de sítio. Apontando em particular a Torre Velha, o terreno acabou por ser completamente dominante no povoamento deste micro-espaço. Muitas sondagens de diagnóstico não revelaram absolutamente nada de interessante, mas ao longo deste pequeno vale existem pelo menos outros dois núcleos importantes. Na colina adjacente a Norte encontra-se um outro sítio (TV3), com uma diacronia muito mais ampla, mas com um fortíssimo horizonte tardo-antigo, que é portanto coevo das últimas fases de TV1 e TV7, situado na direcção oposta e numa posição topográfica mais baixa, é um outro núcleo tardo-romano, parcialmente escavado e por enquanto balizável entre os séculos III e V. Apesar das diferentes evoluções, existe pois um intervalo romano tardio e tardo-antigo comum a estes três sítios. Tal coexistência, tendo em conta a importação de cerâmica bastante tardia (incluindo focense em TV3) e a circulação de moeda visigótica (de novo em TV3) representa um complemento de um padrão já registado em torno de Mérida, bem como em cidades no resto da Lusitânia, mas cuja expressão em ambiente rural português é ainda extremamente mal conhecido. Por exemplo, qual o grau de ligação a centros de poder, fiscais e de distribuição? Haverá controlo estatal firme nestes núcleos visigóticos (vide p. ex. Wickham 2005, Francovich 2007, De Man 2009b)? Até que ponto aquilo que já não pode ser considerado um centro produtor imperial continuaria a determinar a ordem agrícola local (Brogiolo, Chavarría Arnau, 2008), ainda por cima tendo em conta a forte persistência aristocrática hispano-romana na Lusitânia visigótica (Collins 1983)? É nestas perspectivas que o vale da Laje poderia representar um objecto de estudo diacrónico, integrado e interdisciplinar, que resultasse numa análise de conjunto sobre o povoamento tardo-antigo.
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