Observatório de violências de gênero: análise de homicídios envolvendo travestis e transexuais em Minas Gerais

May 24, 2017 | Autor: Júlia Silva Vidal | Categoria: Violencia De Género, Transexualidade, Segurança Pública
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CADERNO DE RESUMOS DO II CONGRESSO DE DIVERSIDADE SEXUAL E DE GÊNERO: I EDIÇÃO INTERNACIONAL

OBSERVATÓRIO DE VIOLÊNCIAS DE GÊNERO: ANÁLISE DE HOMICÍDIOS ENVOLVENDO TRAVESTIS E TRANSEXUAIS EM MINAS GERAIS470

A população de, lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais (LGBT) são, diariamente, alvo de violências psicológicas, físicas, institucionais e familiares que recrudescem a situação de vulnerabilidade na qual a população se encontra. A violência letal que incide sobre os corpos de pessoas LGBT no país, apesar de sua considerável invisibilidade, assume números cada vez mais alarmantes474. Soma-se a esse quadro de silêncio a lacuna legal nos instrumentos de notificação de delitos, fase primeira para início da ação penal que, até recentemente no estado de Minas Gerais, careciam de campos imprescindíveis para a caracterização dessa violência, como o de “identidade de gênero” e “orientação sexual”. Dessa forma, impulsionados pela inoperância dos órgãos públicos na construção de mecanismos capazes de receber e visibilizar as denúncias de crimes contra referida população, os movimentos sociais apostaram na prática de levantamento midiático (notícias de 470

Proposta de comunicação para o II Congresso de Diversidade Sexual e de Gênero, no Grupo de Trabalho número 22: Direitos Trans. Cumpre ressaltar que referida proposta contou, para além das co-autoras dispostas, com a escrita e participação da doutoranda Rafaela Vasconcelos, também integrante do Núcleo de Direitos Humanos e Cidadania LGBT da Universidade Federal de Minas Gerais. 471 Mestranda em Psicologia Social pela Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal de Minas Gerais. Integrante do Núcleo de Direitos Humanos e Cidadania LGBT da Universidade Federal de Minas Gerais (NUH/UFMG). Brasil. E-mail: [email protected] 472 Graduanda em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Integrante do Núcleo de Direitos Humanos e Cidadania LGBT da Universidade Federal de Minas Gerais (NUH/UFMG). Brasil. E-mail: [email protected] 473 Mestranda em Psicologia Social pela Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal de Minas Gerais. Integrante do Núcleo de Direitos Humanos e Cidadania LGBT da Universidade Federal de Minas Gerais (NUH/UFMG). Brasil. E-mail: [email protected] 474 Segundo Bahia (2015) e Silva (2015), os dados de homofobia no Brasil foram tema, pela primeira vez em 2012, ano em que o Poder público “apresentou um relatório com dados referentes a 2011: foram registradas 6.809 denúncias de violações aos direitos humanos da população LGBT, dentre as quais 278 foram homicídios, merecendo destaque o fato de que a maioria dos casos de violência contra LGBTs é praticada por pessoas conhecidas da vítima (61,9%), o que mostra o sentimento de impunidade do ofensor. Em 2013, com os dados referentes ao ano de 2012, a violência homofóbica cresceu 166% em relação a 2011, tendo sido registradas 9.982 violações relacionadas à população LGBT, das quais 310 foram homicídios.” Disponível em: http://www.conjur.com.br/2015-jan-05/stfreconhecer-demora-congresso-criminalizar-homofobia. Acesso jul/16.

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jornais e revistas, reportagens, dentre outros) relacionado a violências de cunho homofóbico e transfóbico em todo o território nacional. Apesar da imprecisão dos dados oriundos de levantamentos midiáticos, por exemplo, contabilizam-se números preocupantes: apenas em 2014, segundo o Grupo Gay da Bahia, foram documentados 326 mortes de gays, travestis e lésbicas no Brasil, em números absolutos, sendo que Minas Gerais figura em segundo lugar no número de mortes daquele ano. No que concerne os instrumentos até então existentes no âmbito do poder público, destaca-se o Disque 100 cujo modulo LGBT foi instaurado em 2011. Referido instrumento responde não somente pelo registro de denúncias de violações e crimes nos quais a população LGBT é submetida, como igualmente pela proteção das vítimas. Todavia, a partir da análise dos Relatórios sobre violência homofóbica no Brasil elaborados pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República,

infere-se que o Disque 100 não obteve êxito na notificação de tais

denúncias. Para dar um exemplo, em 2014 foram reportadas ao Disque 100 (SDH/PR) 35 denúncias de homicídio contra a população LGBT no Brasil, das quais 10 se referiam ao estado de Minas Gerais. Em 2015 há uma queda significativa no registro desse tipo de crime, foram reportadas apenas 18 denúncias de homicídios, das quais 4 ocorreram no estado de Minas Gerais. No que se refere a homicídios tentados, foram reportadas 15 denúncias no ano de 2014 sendo que nenhuma delas ocorreu em Minas Gerais. Em 2015 foram reportadas 12 denúncias de tentativas de homicídio, das quais uma teria ocorrido em Minas Gerais475. Referida precariedade de dados e estatísticas, parece assumir contornos ainda mais emergenciais quando analisadas as violências letais que incidem, especificamente, sob os corpos de travestis e transexuais. É nessa esteira de preocupações que, desde 2015, o Núcleo de Direitos Humanos e Cidadania LGBT (NUH) da Universidade Federal de Minas Gerais e o Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Defesa dos Direitos Humanos (CAO-DH) do Ministério Público de Minas Gerais iniciaram um projeto de pesquisa com a finalidade de investigar e produzir um relatório sobre as interfaces entre o sistema de Segurança Pública e a violência contra a população LGBT. Para realização do projeto, foram instituídas duas frentes de ação distintas, o “Observatório de violências de gênero: análise de homicídios envolvendo travestis e

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Dados disponibilizados pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República após solicitação por e-mail.

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transexuais em MG” e a frente sobre o “Encarceramento de travestis e homossexuais em MG: interface entre o sistema de justiça e os dispositivos de gênero”. A que nos interessa, o presente trabalho visa apresentar e analisar os dados preliminarmente obtidos na frente “Observatório de violências de gênero: análise de homicídios envolvendo travestis e transexuais em MG”. Tais elementos circunscrevem os casos de homicídios motivados, em tese, por transfobia no estado de Minas Gerais no período de janeiro de 2014 a dezembro de 2015. Para a obtenção dos dados preliminares no período em questão, foi realizado um levantamento em mídias (jornais e revistas eletrônicos, do interior e da capital do estado) dos casos de homicídios que tiveram como vítimas pessoas LGBT. Para a complementação dos dados, utilizou-se as informações reunidas pelo Centro Integrado de Informações de Defesa Social (CINDS/SEDS), instrumento oficial do Estado para a organização e produção de estatísticas e relatórios analíticos sobre a criminalidade. Identificados os casos de homicídios, foram elencadas informações necessárias para localizar o delito ao respectivo Registo de Ocorrência da Defesa Social (REDS). O corpus de análise se estabeleceu, portanto, a partir da junção das duas amostras, obtendo o total de 50 casos de violência letal envolvendo pessoas LGBT. Assim, o presente trabalho visa desvendar como as leituras de gênero normatizantes e, muitas vezes, criminalizantes, são produzidas e apreendidas na ocorrência de tais homicídios e por parte das instituições de Segurança Pública. Visibilizando como esses marcadores têm atuado como potencializadores de vulnerabilidades em contextos já precários. A perspectiva conceitual adotada para tais análises considera os direitos humanos um campo de disputas e alcances no qual direitos sexuais, reprodutivos e o gênero tencionam fronteiras, conceitos e interpelam experiências e sociabilidades plurais e heterogêneas. Tem-se como horizonte que esses questionamentos são imprescindíveis uma vez que articulam questões relativas ao campo da sexualidade, com análises raciais, econômicas, sociais e criminais, tão caras ao debate crítico acerca da segurança pública contemporânea. A partir dessas leituras pretende-se indicar direções para o desenvolvimento de políticas e dispositivos eficazes para a visibilidade de tais delitos e também contribuir para o fortalecimento de abordagens que se guiem pelos direitos humanos fundamentais com fins de mitigar as vulnerabilidades experienciadas por travestis e transexuais.

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Referências bibliográficas BRASIL. Relatório sobre violência homofóbica no Brasil: ano de 2012. Brasília: Secretaria Direitos Humanos da Presidência da República. _______. Relatório sobre violência homofóbica no Brasil: ano de 2013. Brasília: Secretaria Direitos Humanos da Presidência da República. GRUPO GAY DA BAHIA. Relatório 2014: assassinato de homossexuais (LGBT) no Brasil.

Bahia,

2015.

Disponível

em:

. PRADO, M. A. M. et al. Segurança Pública e População LGBT: Formação, Representações e Homofobia. In: LIMA, C. S. L.; BAPTISTA, G. C.; FIGUEREDO, I. S. (Org.). Segurança Pública e Direitos Humanos: Temas Transversais. 1ª ed. Brasília, 2014, p. 57–80.

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