Olhares sobre o ensino do projeto em Design: gêneros e interações em espaços de ensino e aprendizagem

June 7, 2017 | Autor: R. Carvalho | Categoria: Design, Genre studies, Space and Place, Learning and Teaching
Share Embed


Descrição do Produto

Ricardo Artur Pereira Carvalho

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Olhares sobre o ensino do projeto em Design: gêneros e interações em espaços de ensino e aprendizagem

Tese de Doutorado Tese apresentada ao Programa Pós-Graduação em Design da PUC-Rio como requisito parcial para obtenção do título de Doutor em Design pelo Programa de Pós-Graduação em Design do Departamento de Artes & Design da PUC-Rio.

Orientadora: Jackeline Lima Farbiarz

Rio de Janeiro, março de 2012

Ricardo Artur Pereira de Carvalho

Olhares sobre o ensino do projeto em Design:

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

gêneros e interações em espaços de ensino e aprendizagem

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Design da PUC-Rio como requisito parcial para obtenção do grau de Doutor em Design. Aprovada pela Comissão Examinadora abaixo assinada. Profa. Jackeline Lima Farbiarz Orientador Departamento de Artes & Design - PUC-Rio Profa. Rita Maria de Souza Couto Departamento de Artes & Design - PUC-Rio Profa. Tania Dauster Magalhães e Silva Departamento de Educação - PUC-Rio Profa. Julie de Araujo Pires Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ Profa. Eliane Bettocchi Godinho Universidade Federal de Juiz de Fora - UFJF Profa. Denise Berruezo Portinari Coordenadora Setorial do Centro de Teologia e Ciências Humanas - PUC-Rio Rio de Janeiro, 29 de Março de 2012

Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução total ou parcial do trabalho sem autorização da universidade, do autor e do orientador.

Ricardo Artur Pereira Carvalho Mestre em Design pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Atua como designer gráfico, web designer e professor, além de participar como pesquisador do Design e Formação de Leitores em contextos pedagógicos e culturais e do Núcleo de Estudos do Design do Livro da PUC-Rio.

Ficha Catalográfica

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Carvalho, Ricardo Artur Pereira Olhares sobre o ensino do projeto em design : gêneros e interações em espaços de ensino e aprendizagem / Ricardo Artur Pereira Carvalho ; orientadora: Jackeline Lima Farbiarz. – 2012. 276 f. : il. (color.) ; 29,7 cm Tese (doutorado)–Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Departamento de Artes e Design, 2012. Inclui bibliografia CDD: 700 1. Artes e design – Teses. 2. Design. 3. Ensino. 4. Espaço. 5. Representação. 6. Gêneros discursivos. I. Farbiarz, Jackeline Lima. II. Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Departamento de Artes & Design. III. Título.

Agradecimentos

À minha orientadora, Jackeline, pelo diálogo, pela parceria, pela confiança e, principalmente, pelo exemplo como profissional e como pessoa. Ao CNPq e à PUC-Rio pelo auxílio concedido mediante a bolsa de doutorado e de

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

isenção que possibilitou minha dedicação à pesquisa. Aos alunos e professores que gentilmente se disponibilizaram a participar e cuja colaboração foi imprescindível. Aos membros da banca, por aceitarem o convite e somarem suas vozes a essa pesquisa, contribuindo para o diálogo. Aos amigos do grupo de pesquisa que como uma família participaram, incentivaram e auxiliaram no processo: Alexandre, Barbara, Daniela, Cynthia, Gabriel, Guilherme, Maíra, Romulo e Tatiana. Aos alunos de iniciação científica que participaram do grupo de pesquisa e que inspiraram e motivaram acerca do assunto: Alice, Aline, Bruna, Camila, Daniel, Fernanda, Natalia, Palatnik, Pedro e Rafael. Aos professores e colegas do Programa de Pós-Graduação em Design, pela inestimável contribuição na construção dessa tese. À minha família pelo suporte, incentivo, fé e paciência que me ajudaram a chegar aqui. Carol, Marina, Milton e Regina.

Resumo

Carvalho, Ricardo Artur Pereira; Farbiarz, Jackeline Lima. Olhares sobre o ensino do projeto em Design: gêneros e interações em espaços de ensino e aprendizagem. Rio de Janeiro, 2012. 276p. Tese de Doutorado- Departamento de Artes & Design, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.

Esta pesquisa trata das formas características assumidas nas aulas de projeto dentro do curso de Design da PUC-Rio. Considerando que o design é uma atividade projetiva e interdisciplinar que pressupõe uma prática reflexiva sobre os objetos de usos e sistemas de informação, a questão que norteia a pesquisa busca entender como os espaços e recursos materiais influenciam as práticas de ensino e aprendizagem e como seriam percebidos pelos alunos de design. Visa-se a observar as práticas de ensino e

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

aprendizagem e o emprego de recursos materiais e espaços nas aulas das disciplinas de projeto. A opção pelas disciplinas de projeto deve-se a sua importância pedagógica na formação dos designers, justificada também pelo espaço que ocupam no currículo a partir de sua reformulação em 2007. A coleta de dados combina a observação participante em duas disciplinas com a realização de uma tarefa de representação gráfica em quatro disciplinas. Os desenhos são analisados em duas instâncias: segundo a ocorrência dos conteúdos na amostra geral e segundo as interações a partir de uma amostra reduzida. A interpretação dos dados é influenciada e contrastada com os conhecimentos e registros da observação participante. A partir das análises, estabelece-se uma relação com o conceito de gêneros em Bakhtin, considerando as formas específicas de interação, o propósito comunicacional, arranjos espaciais e materiais. Destaca-se que as aulas assumem formas espaciais, materiais e interativas específicas e características que podem ser compreendidas a partir de uma ampliação do conceito de gênero. Todavia, a consciência do papel do espaço e dos recursos materiais, embora apareça presente na observação de campo, aparece com menor destaque nas representações dos alunos, sugerindo um predomínio da atividade intelectual de maneira independente às condições materiais do ambiente. Reflete-se sobre a separação entre mente, corpo e o espaço na sociedade e as tendências disciplinares típica da modernidade e que dificultam a integração dos saberes e limita outras possibilidades de conhecimento.

Palavras-chave Design; ensino; espaço; representação; gêneros discursivos.

Abstract

Carvalho, Ricardo Artur Pereira; Farbiarz, Jackeline Lima (Advisor). Views on the teaching of design: genres and interactions in teaching and learning spaces. Rio de Janeiro, 2012. 276p. Doctoral Thesis - Departamento de Artes & Design, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.

This research concerns the “Project” subject classes and their characteristics forms in a design course of a private university in Rio de Janeiro. Considering design as a projective and interdisciplinary activity, which implies a reflective practice upon usable objects and information systems, the research objective is to understand how spaces and material resources influence teaching and learning practices. Another goal is to know how design students perceive this subject. The aim is to observe teaching and

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

learning practices and the usage of material resources and classroom spaces in that course. The choice regarding the project subject is due to its pedagogical importance training designers and the role assumed in a curricular reformulation, in 2007. The data collection combines participant observation in two classes and the accomplishment of a graphic representation task in four classes. The drawings are analyzed in two ways: according to content’s occurrence in a general sample and according to forms of interaction in a reduced sample. The data interpretation is influenced by and contrasted with the findings of the participant observation. Based on the analysis, a relation with Bakhtin’s genre concept is established, considering specific forms of interaction, communication purposes, spatial and material arrangements. It is emphasized that the classes assume specific spatial, material and interactive forms that can be understood through an expanded notion of genre. Nevertheless, the awareness of spatial and material resources appears with low prominence, although it is observed during the field research. There is a reflection concerning the separation between mind, body and space in society and the typical disciplinary tendencies of modernity that hinder the integration of knowledge and limit other possibilities of knowing.

Keywords Design; teaching; space; representation; discursive genres.

Sumário Preâmbulo O percurso anterior

15 18

1.

21 23 26 27

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

2

3

Introdução 1.1 Das práticas de leitura às mediações das interações 1.2 Mudanças no objeto de pesquisa 1.3 (Re)visitando referenciais Visitando espaços de ensino-aprendizagem de projeto no Departamento de Artes & Design da PUC-Rio 2.1 Departamento de Artes & Design 2.1.1 Projeto Pedagógico-Design em Parceria 2.1.2 Disciplinas de Projeto: espinha dorsal do curso 2.1.3 Reforma Curricular em Design 2.1.4 Ocupação dos espaços no campus 2.1.5 Salas de projeto: espaço, equipamentos e recursos materiais 2.2 Referencial Teórico Associado 2.3 Conclusões do capítulo Desenho de observação: ambientação e interações no espaço de sala de aula 3.1 Escolhas e informações acerca das observações 3.2 As etapas de um projeto 3.2.1 Planejamento 3.2.2 Conceituação (levantamento e análise) 3.2.3 Geração de alternativas (síntese e criatividade) 3.2.4 Detalhamento (síntese) 3.3 A atuação dos professores 3.4 Observando DSG1002 – Projeto Básico “ Planejamento” 3.4.1 Ambientação do Projeto básico DSG1002: Planejamento 3.4.2 As aulas de DSG1002 – Projeto Básico Planejamento 3.4.3 As etapas de desenvolvimento dos projetos 3.4.4 Interações na sala de aula 3.5 Observando DSG1005 – Projeto Avançado Produção e Distribuição 3.5.1 Ambientação do Projeto avançado DSG1005: Produção e distribuição 3.5.2 As aulas de DSG1005 – Projeto “ Produção e Distribuição” 3.5.3 As etapas de desenvolvimento dos projetos 3.5.4 Interações na sala de aula 3.6 Atividades paralelas em DSG1002 e DSG1005 3.6.1 Conversas 3.6.2 Desenhos 3.6.3 Construção de modelos físicos 3.6.4 Leituras 3.6.5 Jogos 3.6.6 3.6.6 Atividades fora da sala 3.7 Conclusões do capítulo

35 36 38 40 41 49 55 64 75 78 79 84 85 86 87 88 88 89 89 93 95 99 106 106 108 109 112 118 119 120 121 123 124 125 125

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

4

O projeto a partir da visão dos alunos: planejamento, coleta, tratamento dos dados e a análise preliminar 4.1 Observações metodológicas gerais. 4.2 Expectativas e considerações 4.3 Representações das aulas de projeto: formas e conteúdos 4.4 Método de registro, tratamento e análise 4.5 Seleção da amostra para a análise 4.6 Identificação dos momentos, pessoas e atividades 4.6.1 Momento de palestras/ aulas expositivas 4.6.2 Momento de atendimento 4.6.3 Momento de apresentação 4.6.4 Outros momentos 4.7 Conclusões do capítulo

133 133 137 144 149 152 159 163 164 165 166 168

5

Os gêneros discursivos e as aulas de projeto 5.1 Os gêneros discursivos na teoria de Bakhtin 5.2 Os gêneros das aulas de projeto 5.2.1 Palestras e aulas expositivas 5.2.2 Atendimentos 5.2.3 Apresentações 5.3 Conclusões do capítulo

171 171 177 179 189 200 214

6

Considerações finais e desdobramentos 6.1 Considerações sobre os achados da pesquisa 6.2 Considerações acerca dos gêneros de aula 6.3 Desdobramentos

220 224 230 233

7

Referências

237

ANEXO I Tabelas com a distribuição dos conteúdos de projeto

241

ANEXO II Desenhos selecionados para a análise

244

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Lista de tabelas

Tabela 2‑1 – Comparação entre a carga horária de projeto nos currículos.

42

Tabela 2‑2 – Diferentes temas das disciplinas de projeto.

43

Tabela 2‑3 – Especificidades das ementas dos projetos básicos e avançados

45

Tabela 2‑4 – Referencias bibliográficas das ementas dos proj. básicos e avançados

46

Tabela 2‑5 – Quadro comparativo das salas de projeto

60

Tabela 2‑6 – Recursos presentes nas salas de projeto

63

Tabela 3‑1 – Quadro com a distribuição das aulas

94

Tabela 3‑2 – Quadro com o resumo do processo de projeto

96

Tabela 3‑3 – Quadro com a distribuição das aulas

108

Tabela 3‑4 – Quadro com os aspectos listados nas técnicas de briefing

110

Tabela 4‑1 – Percentuais do sexo dos alunos

149

Tabela 4‑2 – Percentuais das habilitações cursadas

149

Tabela 4‑3 – Percentuais das disciplinas em curso

149

Tabela 4‑4 – Sistema de identificação e codificação dos desenhos

150

Tabela 4‑5 – Elementos mais recorrentes relativos à primeira tarefa

153

Tabela 4‑6 – Listagem dos desenhos e a ocorrência dos elementos

154

Tabela 4‑7 – Ocorrências dos elementos nas amostras de projeto DSG1002

155

Tabela 4‑8 – Ocorrências dos elementos nas amostras de projeto DSG1003

155

Tabela 4‑9 – Ocorrências dos elementos nas amostras de projeto DSG1005

156

Tabela 4‑10 – Ocorrências dos elementos nas amostras de projeto DSG1032

157

Tabela 4‑11 – Comparação entre a lista de seleção das amostras gerais e por sala

158

Tabela 4‑12 – Ocorrências nas representações dos momentos de aula

159

Tabela 4‑13 – Ocorrências dos momentos, pessoas e ações nas amostras

162

Tabela 5‑1 – Comparação entre Tipos e Gêneros Textuais

175

Lista de Figuras Figura 2 1 - Edifícios e arborização do campus da PUC-Rio

36

Figura 2 2 – Identificação dos Edifícios da PUC-Rio

49

Figura 2 3 - Esquema da distribuição dos laboratórios de ensino

51

Figura 2 4 - Esquema da distribuição dos laboratórios de pesquisa

52

Figura 2 5 – Comparação dos percursos dos alunos de Design no campus aos outros

53

cursos. Figura 2 6 – Comentários sobre o esquema do percurso dos alunos de Design

54

Figura 2 7 – Sala de aula nas Tendas (ART 5), com sua estrutura no formato circular e

55

teto de lona Figura 2 8 – Entrada da sala ART 4, que emprega uma barreira sonora feita com

56

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

sacos com barro cru. Figura 2 9 – Sala de aula Barraca vista pelo lado de fora

56

Figura 2 10 – Sala ART3

57

Figura 2 11 – Sala IMA01

57

Figura 2 12 Sala de aula K014

58

Figura 2 13 – Sala L532

62

Figura 2 14 – Interior da Barraca ao fim da professora Ana Branco

62

Figura 2 15 – A renovação de Paris no século XIX previa a setorização através dos

68

arrondissements e o alargamento das ruas na forma de boulevards para maior controle das revoltas populares. Figura 2 16 - Planta baixa do edifício e setores da Bauhaus em Dessau, 1926, mostra

68

a divisão da escola projetada especialmente para o ensino de Design e Arquitetura. Figura 2 17 - Planejamento da cozinha eficiente, 1920, por Christine Fredericks,

68

busca a organização racional e funcional para tornar as atividades mais eficientes. Figura 2 18 - Bancos de Ulm, 1954, servem como estante e mesa de centro, projeto de Max Bill

69

Figura 2 19 – Os sistemas de grid (em vermelho), por Josef Müller-Brockmann, 1961,

70

auxiliam a controlar a tipografia e impor uma ordem na composição da

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

informação. Figura 3 1 – Registros verbais e visuais no caderno de anotações

83

Figura 3 2 - Planta baixa da sala L532

90

Figura 3 3 – Dispositivo de velcro e clip de papel para fixar cartazes

90

Figura 3 4 – Arrumação padrão da sala L532

91

Figura 3 5 – Mesa com rodas e cadeiras

92

Figura 3 6 – Escala de cores predominantes na sala de aula

92

Figura 3 7 – Desenhos e marcas de corte feitas por alunos sobre as mesas

93

Figura 3 8 – Planta-baixa da sala L260

107

Figura 3 9 - Arrumação padrão da sala L260

107

Figura 3 10 - Conversa entre alunos enquanto aguardam o atendimento no projeto

119

DSG1002 Figura 3 11 - Aluno desenhando durante a aula de DSG1002

121

Figura 3 12 - Dupla de alunos construindo o modelo durante a aula de DSG1002

122

Figura 3 13 – Alunas lendo durante aula de DSG1005

124

Figura 3 14 - Aluna lendo as anotações do caderno durante a aula DSG1002

124

Figura 4 1 – Disposição das salas durante a proposta das atividades

136

Figura 4 2 - Diferentes níveis de detalhamento na representação de pessoas

139

Figura 4 3 – Níveis de detalhamento na representação das salas e dos objetos

140

Figura 4 4 – Desenho com apenas um momento retratado

141

Figura 4 5 - Desenho retratando momentos simultâneos

142

Figura 4 6 – Desenho retratando os momentos separados em etapas

143

Figura 4 7 – Desenho retratando os momentos como as diferentes etapas de um

143

projeto Figura 4 8 – Desenho retratando os momentos como as diferentes dinâmicas de aula

143

Figura 4 9 – Representação do processo de projeto por meio da analogia à escalada.

145

Figura 4 10 – Desenho que emprega o enquadramento normal (ângulo na altura dos

146

olhos)

Figura 4 11 – Desenho que emprega o enquadramento plongée (ângulo alto)

146

Figura 4 12 – Desenho que emprega o enquadramento de vista aérea (ângulo

147

superior) Figura 4 13 – Formas geométricas em 4 desenhos diferentes representando os

148

produtos finais Figura 4 14 – Detalhes da diferenciação entre as pessoas de acordo com o chapéu

148

Figura 4 15 – Exemplo da contagem dos objetos e espaços nos desenhos

152

Figura 4 16 – Desenho 022MD28F01 (fragmento) da aula expositiva mostrando as

163

ações dos alunos Figura 4 17 – Desenho mostrando o atendimento e atividades simultâneas

165

Figura 4 18 – Desenho 055MO24F01 (fragmento) que mostra a disposição da

166

apresentação

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Figura 4 19 – Desenho 055CV07F01 (fragmento) mostrando a construção do objeto

167

a partir de diferentes ideias Figura 4 20 – Desenho 329CV11F01 (fragmento) mostra aluno pesquisando

168

individualmente Figura 5 1 – Professor ministrando uma aula expositiva sobre cor à frente da sala

180

Figura 5 2 – Professora de conteúdo de texto usando o projetor durante aula

181

expositiva Figura 5 3 – Fotografia do quadro com avisos dos professores sobre a G2

182

Figura 5 4 – Alunos ao redor da mesa enquanto o palestrante fala a respeito dos

182

materiais plásticos Figura 5 5 – Desenho 033MD14F01 apresentado na íntegra

183

Figura 5 6 – Desenho 033MD14F01 (fragmento) com professor palestrando

184

Figura 5 7 – Desenho 022MD28F01 apresentado na íntegra

185

Figura 5 8 – Desenho 022MD28F01 (fragmento) da aula expositiva mostrando as

186

ações dos alunos Figura 5 9 – Professora atendendo o aluno durante a fase de experimentação

190

Figura 5 10 – A professora anota e desenha no caderno da aluna as informações

191

sobre processos gráficos

Figura 5 11 – O professor (de vermelho) mostra aplicativo no celular durante o

192

atendimento Figura 5 12 – Desenho 022MD11M01 mostra a turma durante o atendimento

194

Figura 5 13 – Desenho 022MD11M01 (fragmento) com os alunos e professores

195

durante o atendimento Figura 5 14 – Desenho 329CV11F01 mostra os momentos da aula e diferentes

196

professores atendendo os alunos Figura 5 15 – Desenho 329CV11F01 (fragmento) destacando o momento de

197

atendimento Figura 5 16 – Apresentação dos projetos dos alunos utilizando cartazes

201

Figura 5 17 – Alunos com suas pranchas e objetos durante a apresentação

203

Figura 5 18 – Conjunto de objetos e experimentos desenvolvidos por alunos no

203

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

projeto 1002 Figura 5 19 – Modelo em escala (maquete) desenvolvido por alunos no projeto 1005

204

Figura 5 20 – Professores (de costas) acompanham a apresentação durante a G2 no

204

fundo da sala Figura 5 21 – Sala vazia durante a apresentação da dupla na G2

206

Figura 5 22 – Desenho 033MO16F01 na íntegra

207

Figura 5 23 – Desenho 033MO16F01 (fragmento) retratando a apresentação dos

208

alunos Figura 5 24 – Desenho 055CV15F01 na íntegra

210

Figura 5 25 – Desenho 055CV15F01 (fragmento) do professor comentando o projeto

211

Figura 6 1 – A barraca representada como sala ideal, em detalhes, mas sem as

228

pessoas interagindo.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Quando me chamam de distinto intelectual eu digo: não! Eu não sou um intelectual! Os intelectuais são os que divorciam a cabeça do corpo. Eu não quero ser uma cabeça que rola por aí! Eu sou uma pessoa! Sou cabeça, corpo, sexo, barriga, tudo! Mas não um intelectual, esse personagem abominável! Como dizia Goya: "A razão cria monstros". Eduardo Galeano, 2011

Preâmbulo

Esta é uma pesquisa que trata do papel dos contextos (com ênfase nos aspectos espaciais e materiais) no ensino de Design. Por isso mesmo, começarei ambientando os leitores sobre o lugar de onde estou falando. Isso porque acredito que o entendimento de como esta pesquisa foi formulada, organizada e escrita passa por uma série de fatores que incluem a minha própria trajetória como pesquisador. Foi um longo percurso desde o momento em que decidi cursar o doutorado até o momento da conclusão e depois deste tempo, ao me aproximar do objeto construído aqui, torna-se cada vez mais difícil relembrar os passos que ficaram para trás no início do percurso. Contudo, sei que houve ideias e escolhas logo naque-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

le início que germinaram, por vezes, até sem que eu tivesse percebido, e que floresceram e deram frutos ainda nos últimos instantes da conclusão desta pesquisa. Como seria possível falar de contextos sem com isso implicar minha própria pessoa, como sujeito, pesquisador e intérprete desde o início desta pesquisa? Considero impossível, pois dentre as experiências e ideias que me influenciaram está a noção de que nas ciências humanas e sociais, sujeito e objeto de pesquisa não estão separados. Eles se influenciam mutuamente e, por vezes se confundem. Antes mesmo de entrar no doutorado já possuía esta noção que foi logo depois retomada nas discussões das aulas de metodologia. Portanto, a opção pela pessoa do discurso deveria funcionar como estratégia, para lembrar aos leitores de que os dados não são neutros, isentos e verificáveis como pregam as premissas positivistas. Os dados dessa pesquisa passam por escolhas, seleções, crenças e interpretações, implicando com isso minha presença como pesquisador. Portanto, se eu usasse um discurso impessoal, me omitiria desse processo. Assumir minha interferência sobre o objeto de pesquisa não significou tornála menos científica por isso. Trata-se de uma outra noção de ciência, conforme apregoada por alguns setores das Ciências Humanas e Sociais, que reconhecem o papel do pesquisador que determina e é determinado pelo objeto de pesquisa. As noções aqui não se tratam de serem objetivas, neutras, isentas e verificáveis, mas de serem construídas segundo dadas condições em determinado momento histórico e social. A questão de contextualização é fundamental para fornecer algumas pistas que ajudem a compreender como essa pesquisa se desenvolveu, a interpretar o que me levou a optar por uma ou outra forma de olhar, escolher, inferir e escrever.

16

Ao assumir essa perspectiva, deveria empregar a primeira pessoa do singular, como uma forma de me responsabilizar sobre as coisas que escrevi. No entanto, ao fazer tal escolha, cairia numa contradição em relação ao meu referencial teórico. Isso porque o emprego da primeira pessoa do singular contradiz as ideias de Bakhtin acerca do ato da enunciação como “elo numa cadeia complexa de enunciados”, a partir da qual há sempre um diálogo, ainda que imaginário, com outros textos e interlocutores aos quais o discurso se endereça. O livro Marxismo e Filosofia da Linguagem, por exemplo, é escrito na primeira pessoa do plural, por Bakhtin reconhecer que a autoria é, dessa maneira, coletiva, como fruto das interações sociais. Inclusive a própria questão da autoria é algo complexo ao se tratar de Bakhtin, pois não há certeza se os livros foram realmente escritos por ele ou seus discípulos. Das obras conhecidas, poucas foram publicadas com a assinatura do próprio Bakhtin e muitas foram publicadas postumamente, dificultando a atribuição autoral. Muitas obras atribuídas a ele trazem assinaturas de colegas e discípu-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

los (Voloshinov e Medvedev, por exemplo), membros do que se convencionou chamar de “Círculo de Bakhtin”. A contradição estaria relacionada ao fato de eu concordar com Bakhtin sobre a autoria coletiva. Reconheço o quanto esse trabalho possui de coletivo pelas contribuições de minha orientadora, meus professores, meus colegas, “meus autores” (pois quando eu me identifico, viram meus), minhas experiências, meus colegas que possibilitaram a pesquisa e meus “informantes”, os alunos sem os quais essa pesquisa não existiria. Assumo que pela própria interação, quando escrevo “eu”, deveria escrever “nós”. Ainda assim, em alguns casos o uso do “nós” faria esconder-me dentro de uma coletividade desconhecida para os leitores e, com isso, me isentar das minhas posições e escolhas. Nas situações que vivenciei, nas opções que fiz, nas cenas que observei, nas impressões que tive, ficaria impossível me referir empregando o plural. Há, portanto um conflito, em que em dados momentos há necessidade do “eu” e em outros “nós”. Mesmo a opção pela forma discursiva foi uma questão de debate entre minha orientadora e eu. Por um lado, eu com um certo purismo com a língua (contrariando também Bakhtin, que rejeita uma língua normativa e prescritiva), considerei mais coerente manter uma única pessoa no discurso. Por outro lado, minha orientadora argumentou que há escolhas individuais e coletivas e que mesmo algumas posições que parecem individuais são sustentadas pela orientação, pelas aulas, pelas leituras, pelas experiências vivenciadas, etc., e que portanto deveria empregar ora o “eu” e ora “nós”.

17

Ela apontou que o emprego do plural deveria ser usado em respeito aos alunos que ao desenharem, leram os contextos comigo, à banca de qualificação que apontou caminhos, em respeito a ela, por “perseguir espaços e gêneros desde sempre”. De fato, seria inconcebível para mim pensar esta pesquisa sem essas pessoas e outras mais que participaram de toda minha trajetória. Ao reconhecer esse argumento, senti que deveria usar apenas o plural e abandonar o singular. Mas além do conflito, havia também uma necessidade para tal, pois somente assim seria possível olhar e falar de lugares diferentes. Quando olho do lugar do “eu” contemplo as coisas de uma maneira diferente do lugar do “nós”, e vice-versa. O lugar de onde se vê permitem ver coisas inacessíveis a outros

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

lugares. Ou como apresenta Bakhtin: Quando contemplo no todo um homem situado fora e diante de mim, nossos horizontes concretos efetivamente vivenciáveis não coincidem. Porque em qualquer situação, ou proximidade que esse outro que contemplo possa estar em relação a mim, sempre verei e saberei algo que ele, da sua posição fora e diante de mim, não pode ver: as partes de seu corpo inacessíveis ao seu próprio olhar – a cabeça, o rosto, e sua expressão - , o mundo atrás dele, toda uma série de objetos e relações que, em função dessa ou daquela relação de reciprocidade entre nós, são acessíveis a mim e inacessíveis a ele. Quando nos olhamos, dois diferentes mundos se refletem na pupila dos nossos olhos. Assumindo a devida posição, é possível reduzir ao mínimo essa diferença de horizontes, mas para eliminá-la inteiramente urge fundir-se em um todo único e tornar-se uma só pessoa. (BAKHTIN, 2003 p.21)

Assim, há momentos da pesquisa em que há mundos diferentes sendo percebidos e que preciso assumir o meu lugar. Mas há também momentos da pesquisa em que precisamos “reduzir as diferenças de horizontes” e nos tornar uma só pessoa, assumindo o “nós”. Atento para o próprio Bakhtin empregar a primeira pessoa no singular e no plural de modo a diferenciar os lugares de onde se vê. Outra escolha que realizei durante a redação diz respeito às diferentes formas grafias do termo “Design”. A palavra tem origem na língua inglesa e possui diferentes conotações, sendo empregada tanto como verbo quanto como substantivo e adjetivo em situações diferentes. Adotei o padrão seguido por alguns manuais de redação que identifica os campos de conhecimento, nomes de curso e subáreas com a letra inicial em maiúscula (Arquitetura, Antropologia, Letras, Educação etc.). Já quando o termo faz referência a uma ideia, noção, abordagem, processo ou prática, a recomendação é pelo uso da letra inicial em minúsculo: “aquela não era uma noção de antropologia conhecida”, “o projeto pedagógico não problematizou a educação informal dos alunos” etc. Há também os casos em que se trata dos re-

18

sultado e efeitos, grafando-se também em minúscula, como por exemplo “a arquitetura da sala favorecia a iluminação natural”. Nesse sentido, quando emprego o termo “Design” iniciado com letra maiúscula, refiro-me ao campo de conhecimento, subárea (Design Gráfico), abordagem metodológica quando possui um nome próprio (Design em Parceria) ou aos cursos. Nos demais casos, refiro-me com letras minúsculas ao “Design” com os sentidos de projeto (“o processo de design daquele site”), noção ou ideia (“a noção do bom design, segue uma noção da boa forma”), ou resultado, propriedade ou qualidade formal de um produto (“aquela cadeira possuía um bom design”).Quanto ao profissional, trato sempre com letras minúsculas: “o professor palestrante atuava como designer em um escritório”. Resolvi esclarecer sobre o padrão adotado por identificar que não há um consenso nas teses e dissertações pesquisadas quanto ao uso dos termos. Minha opção deveu-se principalmente a necessidade de diferenciar o que é o campo de conheci-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

mento, subáreas, curso, daquilo que é processo, qualidade e produto. Neste caso, sigo como referência o padrão apresentado na tese de doutorado de Rita Couto (1997). O percurso anterior Minha trajetória como pesquisador foi alavancada pelo meu entusiasmo em meu projeto de pesquisa de conclusão, quando aluno de Design. Era o ano de 2003 e eu estava concluindo minha graduação em Desenho Industrial, habilitado em Comunicação Visual na PUC-Rio. O projeto em questão propunha uma interpretação sobre os padrões indígenas abstratos da tribo Asuriní do Xingu, a partir da qual trabalhei na relação entre desenho e os animais que davam nome aos padrões. Fiquei muito satisfeito por vários motivos. Um deles era por acreditar que, mediante a pesquisa em Design, seria possível contribuir para situações sociais importantes, como o preconceito e desconhecimento da herança cultural indígena. Outro motivo de satisfação não foi devido somente ao resultado do trabalho, mas principalmente ao processo de pesquisa. Apesar de cansado pelas leituras e atividades ligadas ao projeto, a verdade é que foi um cotidiano que me pareceu mais atraente do que a prática de designer num escritório. Naquele momento, nem pensava em me tornar professor, comecei a fazer planos para o mestrado por que achei que a pesquisa seria a “minha praia”. No ano de 2005, comecei o mestrado na mesma instituição e, simultaneamente, ingressei também no NEL, Núcleo de Estudos do Design na Leitura. A vivencia na pós-graduação foi tudo que eu esperava, ou mais. A dedicação às disciplinas, as leituras, os artigos e congressos, tudo que fazia parte daquele mundo me

19

entusiasmava. Junto a isso, descobria autores e ideias que sequer imaginava e foram mudando, ora rapidamente e ora lentamente, minha maneira de pensar. Algo que foi fundamental naquela época diz respeito à minha participação no NEL. O grupo de pessoas presentes ali, de diferentes origens acadêmicas (designers, ilustradores, comunicadores, linguistas, biólogos, advogados) somado às diferentes ideias e objetos de estudo promoveram em mim uma revolução de ideias. No NEL, discutíamos não apenas o livro, mas o que é leitura, como ocorre na sociedade e como os designers participam desses processos. Foi no grupo de estudos, coordenado pelo meu então orientador de mestrado, professor Luiz Antonio Coelho que conheci minha orientadora de doutorado Jackeline Farbiarz. Jackeline e eu ficamos mais próximos durante o colóquio “Roger Chartier: apropriações de um pensamento no Brasil” pois o nosso núcleo de pesquisas estava encarregado da organização de algumas atividades no evento. Houve uma situação, durante os grupos de trabalho em que precisávamos transformar as discussões rea-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

lizadas em textos e, para isso, nos ocupamos de dividir a tarefa da transcrição das fitas. A partir daí nossa parceria foi amadurecendo e culminou na contribuição essencial no momento de conclusão da dissertação, assumindo a co-orientação. O colóquio também foi um momento importante, pois nele eu estava descobrindo as ideias de Chartier sobre as práticas de leitura e sua abordagem pela história social. Dentre as várias noções, o autor sinalizava que os livros não eram apenas textos pensados pelos autores, mas objetos criados e consumidos social e culturalmente. Essas e outras ideias me influenciaram de tal forma, que o autor se tornou uma das minhas principais referências na dissertação. Por fim, minha pesquisa de mestrado, defendida em 2007, discutia o papel do designer na produção e recepção dos livros para grupos indígenas, neste caso os Mbya Guarani do estado do Rio de Janeiro. Parte da pesquisa discutia, a partir de Chartier, o papel que tinham as escolhas editoriais e gráficas (estas sob influência dos designers) nas práticas de leituras e apropriações dos leitores. Assim, me foi possível questionar algumas noções comuns do design, como a neutralidade da tipografia para não se sobrepor ao texto ou a abordagem dos designers sobre seus públicos. Com a pesquisa, passei a duvidar da neutralidade por entender que durante as ações sociais, entendidas como ato de leitura, não são apenas os elementos textuais são interpretados, mas tudo que envolve aquele ato também influencia na interpretação, como contextos, gestos, falas, sons.... Os conhecimentos da Antropologia também me influenciaram bastante, tanto no mestrado como no doutorado. Por tratar do tema indígena e realizar uma pesquisa de campo, me senti compelido a estudar o tema, e, por consequência en-

20

contrei a professora Tania Dauster. Com ela aprendi a importância de questionar meu lugar como pesquisador e intérprete, e as diferentes maneiras de observar o grupo pesquisado. Associando os conhecimentos da Antropologia a minha experiência no curso de Design da PUC-Rio, em especial o enfoque do design em parceria (a ser detalhado no próximo capítulo), minha dissertação discutiu também como os designers abordam a construção do livro. Critiquei as abordagens que muitas vezes aborda o seu público de maneira imaginária, assumindo pressupostos descritos em leis e regras, mas sem o contato com a situação. Por esse motivo, defendi que as abordagens deveriam incluir pesquisas e o desenvolvimento em conjunto, de modo a orientar e fundamentar as escolhas dos designers por situações reais. Durante a banca, um dos professores me perguntou se eu conhecia Bakhtin no meu referencial teórico, pois as ideias que defendia estavam de acordo com alguns pressupostos. Na época afirmei que não, embora soubesse que minha co-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

orientadora era bastante influenciada pelo pensamento do filósofo. Bakhtin, portanto, se tornou uma das pendências que deixaria para conhecer no doutorado, quando viesse a fazê-lo. Após o mestrado e pelo estímulo da Jackeline, participei de dois cursos de especialização como professor, um em Design e outro em Letras. A partir dessas experiências, descobri meu interesse pela docência, ao perceber que a pesquisa e o estudo também fazem parte do cotidiano dos professores. Além disso, o contato com os alunos, as trocas e interações estabeleciam uma nova relação com os conhecimentos que eu havia adquirido. Em 2008, quando fui admitido no curso de doutorado em Design na PUCRio, estava interessado em discutir o ensino no campo. Na época, eu pretendia investigar as maneiras como os alunos aprendiam a ler imagens no curso de Design. Por esse motivo planejei que deveria entrar nas aulas de projeto para observar as turmas em interação. A partir daquele momento, percebi a necessidade de compreender melhor meu objeto de pesquisa, de contextualizar as informações e, dessa maneira, a pesquisa que havia pensado inicialmente foi se transformando, aos poucos, na presente pesquisa.

1

Introdução

Desde o início do doutorado, havia assumido algumas ideias que influenciariam o meu percurso. Tomei como pressuposto a ideia de que o contexto influenciava os tipos de relação interpessoais, por isso não poderia deixar de lado informações e descrições sobre os lugares, objetos, pessoas e interações. Trazia comigo também as noções aprendidas com a Antropologia de que deveria estranhar situações e objetos familiares, ao mesmo tempo que deveria naturalizar as situações muito exóticas. Por fim, deveria entender a sala de aula não de maneira estática, mas intera-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

tiva e dinâmica. Minha experiência com a tribo indígena me mostrou que em dados momentos as funções mestre e aprendiz, por exemplo, se invertiam, quando se tratava de um assunto com que um ou outro era mais familiarizado. Minha questão inicial era compreender quais práticas visuais eram importantes na formação dos designers, cujas práticas profissionais dependem de competências para lidar com a imagem. Para abordar o tema empregaria o conceito de apropriação da imagem, a partir da noção das práticas leitura de Chartier (1990), considerando os aspectos sociais, históricos e materiais no qual as práticas se inserem. Essa perspectiva me levou a propor uma aproximação do objeto de estudo empregando uma abordagem antropológica, considerando a observação participante. Todavia, ao longo da pesquisa e, em especial após a qualificação, notamos que os dados da pesquisa necessitavam de informações relativas a contextualização das aulas de projeto. Na medida em que tentava suprir essa lacuna, percebemos que a descrição das aulas, seus espaços, recursos e suas dinâmicas constituíam em si um objeto de pesquisa. Naquele momento, decidimos reformular o projeto, sem com isso descartar o que já havia observado. Tratei, portanto de um novo enquadramento da pesquisa determinado pelo caminho percorrido e pelos dados encontrados. A discussão sobre a materialidade do livro e as mediações da leitura permitiram que transpuséssemos essas noções para repensar a sala de aula. O raciocínio inicial, a partir das ideias de Chartier considerou que se as escolhas editoriais, a composição tipográfica, o suporte e diversos outros elementos participam das práticas de leitura, então as condições espaciais, os recursos materiais e as maneiras como se dão as interações também afetam as práticas de ensino e aprendizagem. Esse raciocínio parte de uma perspectiva que considera a inserção sociocul-

22

tural, histórica, espacial e material das práticas, e não o seu tratamento de maneira desvinculada e abstrata. A discussão sobre os espaços e recursos materiais pareceu relevante devido ao obscurecimento do tema em função de outros aspectos ligados a educação como currículo, pedagogia, psicologia, filosofia, sociologia entre outros. A partir do referencial teórico empregado, penso que as práticas de ensino e aprendizagem não podem estar desvinculadas desses aspectos espaciais e materiais. Entendo que se o assunto não é abordado, corre-se o risco de uma naturalização, um processo de ocultamento de elementos influentes que deixam de ser percebidos. No campo do Design Gráfico, por exemplo, há uma noção comum de que a tipografia deve ser “transparente”, ou seja, imperceptível para se ler o texto. Acredito que o mesmo ocorre em relação à sala de aula: os espaços e recursos se tornam transparentes porque os sujeitos deixam de percebê-los. Contudo, a concepção das salas de aula também materializam e reforçam as concepções de ensino e

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

ideologias vigentes. Portanto, entendo que investigar esses aspectos espaciais e materiais nas interações das práticas de ensino e aprendizagem contribui para não naturalizá-los e para não desvinculá-los do processo de educação. Como o campo de conhecimento de onde falo é o Design, dois aspectos ligados ao campo foram determinantes na definição da situação problema de pesquisa. O primeiro aspecto diz respeito ao ensino dentro do campo, e aponta para a maneira como os aspectos espaciais e materiais mediam as interações nas práticas de ensino e aprendizagem no Design. O segundo aspecto contempla a atividade de projeto no campo do Design, que envolve a reflexão e o questionamento acerca dos objetos de uso e sistemas de informação, e implica como os alunos, na qualidade de designers aprendizes, perceberiam o papel dos objetos e espaços no processo de formação. Assim, a questão central da pesquisa passou a ser como os espaços e recursos materiais influenciam as práticas de ensino e aprendizagem e como seriam percebidos pelos alunos de Design.

23

1.1

Das práticas de leitura às mediações das interações

O espaço e os recursos não estão desvinculados das ações, por isso cabe compreender as atividades que ocorrem nas aulas e os usos conferidos ao ambiente de ensino. Assim, como metodologia da pesquisa, busquei observar as práticas de ensino e aprendizagem e o emprego de recursos materiais e espaços nas aulas das disciplinas de projeto na PUC-Rio. Optei por realizar o trabalho na PUC-Rio devido às facilidades e oportunidades de pesquisa tanto em relação ao acesso às informações acadêmicas, como à possibilidade de frequentar as aulas. A opção pelo projeto se deu por diversos motivos, entre eles por ser uma disciplina que se aproxima da prática profissional e, portanto possui sua importância pedagógica na formação dos designers. As disciplinas de projeto também possui uma importância destacada na reformulação curricular da graduação em Design da PUC-Rio, feita em 2007 e ainda vigente. A escolha pela observação da sala de aula esteve presente desde o início do

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

projeto, Na pesquisa de mestrado já havia me aproximado do campo da Antropologia por meio da etnografia da sala de aula, problematizando-a enquanto espaço de interações socioculturais, em que se articulam costumes, valores, concepções e práticas (DAUSTER: 2007). Assim, ao formular o projeto de pesquisa, considerei que para tratar de práticas e apropriações da imagem não bastaria ater-me a uma pesquisa de caráter bibliográfico ou documental, mas ir a campo observar como ocorreriam em situações cotidianas. Neste sentido, os estudos de Antropologia ligados à Educação serviram como influência na escolha dos métodos. A etnografia da sala de aula é uma forma de pesquisa que emprega a Antropologia no contexto da Educação. Essa modalidade de estudo tem sido incentivada e praticada pela antropóloga e professora Tania Dauster, que busca, por meio da etnografia, problematizar conceitos socialmente construídos como fenômenos de socialização ou de educação (DAUSTER: 2007). Segundo a autora, uma das contribuições da Antropologia para o campo da Educação está na prática reflexiva e na problematização do campo por meio de outra perspectiva. Além disso, Dauster justifica o uso da Antropologia no campo da Educação pela tradição interdisciplinar do campo, que caracterizar-se pela apropriação de outros saberes, como a Filosofia, a Psicologia e a História. Seguindo esta linha de raciocínio, o uso da Antropologia também é, a meu ver, adequado aos estudos em Design uma vez que este também se caracteriza pela apropriação de outros campos de saber tanto em relação às suas teorias como em relação às práticas (BOMFIM: 1997 e COUTO: 1997). As afinidades com os estudos de Dauster não se resumem apenas aos usos de um ferramental para observação da sala de aula, como também por uma postu-

24

ra teórica diante do objeto de estudo. Como afirma a autora, a etnografia não se reduz a uma técnica, mas “uma opção teórico-metodológica” (2007, p.20). Esta postura teórica é, portanto, fruto da interação entre teoria e a prática antropológica, ou seja, da literatura da área e da observação participante. O conceito de representações sociais é fundamental nos estudos de Dauster, que o emprega em suas investigações sobre a leitura. No estudo (DAUSTER:2004), ela parte do conceito de práticas e representações (CHARTIER: 1990) como objeto de observação a ser contemplado pela abordagem antropológica. Por meio da investigação e da análise, a autora emprega as noções de Chartier para compreender como a sala de aula revela uma série de disputas entre diferentes identidades, como o professor e o aluno, entre outras, e que numa investigação sobre as representações, deve-se considerá-las numa dinâmica de concorrências e competições, uma luta de representações. O entendimento da obra de Chartier, que configura as leituras como práticas

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

sociais, também auxiliou na definição das opções metodológicas da pesquisa. Para Chartier (1990) a leitura é uma forma de apropriação de textos que concilia as práticas e representações, que por sua vez são constituídas histórica e socialmente. As representações dão conta das disposições mentais, dos conceitos e preconceitos, enfim, da maneira pela qual as coisas ganham significados para determinado indivíduo, grupo ou sociedade. Já o conceito de práticas está intimamente ligado ao das representações, uma vez que tais representações se encarnam em gestos e práticas. Ambas se influenciam mutuamente e podem, até mesmo, ser contraditórias entre si. Ao pensar nos usos e apropriações da imagem em sala de aula, partimos da noção de leitura de Chartier que aborda a leitura não pelos textos em si, mas pelas práticas e representações empregadas como formas de apropriação. Ora, se pretendo observar as relações estabelecidas por professores e alunos em interação com imagens, espaço e tempo na formação de designers, uma das formas de fazê-lo é compreender a sala de aula como espaço sociocultural (DAYREL: 1996) e, consequentemente, como um palco de disputas entre práticas e representações sociais (CHARTIER, 1990). Assim, acompanhamos a escolha de Dauster (2004) ao conciliar os conceitos de práticas e representações de Chartier com os de observação participante. Outra noção da Antropologia da qual nos apropriamos com vista à observação da sala de aula é o conceito de cultura. Para Dauster (2007) este é um termo polissêmico, e que admite uma pluralidade de concepções, mesmo no campo da Antropologia, que tradicionalmente está vinculada a artefato criado pela humanidade, em oposição ao natural. Considerando que o ofício do antropólogo, confor-

25

me afirma Clifford Geertz (2008) diz respeito à interpretação das culturas e à busca pelos seus significados, seguirei a definição do antropólogo americano que parte do modelo semiótico para delimitar o conceito. Para Geertz (2008, p.4), o homem é um animal amarrado a teias de significados que ele próprio teceu, vendo a cultura como essas teias. A analogia proposta por Geertz ajuda na compreensão da cultura como algo dinâmico constituído pelos indivíduos e constituinte deles, e também no entendimento dos processos de naturalização e estranhamento dos fenômenos sociais. A naturalização ocorreria quando os indivíduos, tão presos à estas teias, não seriam capazes de perceber os fenômenos como construções sociais, achando-os de naturais. Já o estranhamento estaria ligado a uma atitude de tomada de consciência, ou seja, de buscar enxergar estas teias e depreender seus significados. O trabalho do antropólogo está intrinsecamente ligado aos conceitos de cultura, naturalização e estranhamento, uma vez que, para Geertz (2008), a etnografia

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

deve ser uma “descrição densa”, que busque depreender os significados nas relações sociais. Isso significa desnaturalizar os fenômenos, ou seja, “mostrar que, entre outros fatores, as atitudes, os comportamentos e os gostos são socialmente construídos e não naturais” (DAUSTER, 2007, p.18). A etnografia para Geertz (2008) é de natureza interpretativa e está ligada à capacidade de estranhamento do antropólogo. Mas a atuação da pesquisa antropológica não se resume apenas aos contextos exóticos, pois devido à complexidade das sociedades contemporâneas e a diversidade cultural também é possível trabalhar em contextos familiares, considerando as diferenças de etnias, classes ou geração, entre outros. Nesse sentido, se inscrevem as pesquisas do antropólogo Gilberto Velho , que problematiza a observação de contextos familiares (VELHO: 1978), a partir da necessidade de estranhamento perante o objeto de estudo. Já o antropólogo Roberto Da Matta coloca os problemas decorrentes da naturalização e do estranhamento do objeto de estudo. Ele afirma que que tanto para o antropólogo que estuda o exótico, quanto para aquele que pesquisa em contextos que lhe são familiares, fazem-se necessários os movimentos de transformar o exótico em familiar e de transformar o familiar em exótico (DA MATTA: 1978), mas que é preciso cuidado para não fazer esse familiar parecer simplesmente estranho e desconexo, e tampouco para não aproximar o exótico, tornando-o familiar a ponto de “naturalizá-lo” e deixar, consequentemente, de captar as “regras do jogo”. Ao colocar as noções de cultura, naturalização e estranhamento, faço-o lembrando que minha incursão a uma sala de aula de Design caracteriza-se pela observação de um contexto familiar. Portanto, ressalto a importância de uma atitude de

26

estranhamento perante o objeto de estudo e dos questionamentos provenientes da teoria antropológica, da pesquisa etnográfica e da prática da observação participante. Ao abordar a sala de aula de projeto trataria de um ambiente familiar para mim, o que teria suas vantagens e desvantagens. Se por um lado a opção pelo Design me facilitou o acesso às informações, devido às relações institucionais e minha própria vivência dentro do campo, por outro lado, me impôs a dificuldade de observar um contexto familiar. Isso porque, tendo sido aluno de graduação, mestrado e professor, minha familiaridade com o campo e, mais especificamente, com a instituição dificultaria o estabelecimento do distanciamento crítico esperado de uma pesquisa de doutorado. Retomo a afirmação do antropólogo Gilberto Velho: “o que sempre vemos e encontramos pode ser familiar, mas não é necessariamente conhecido, e o que não vemos e encontramos pode ser exótico, mas até certo ponto, conhecido” (VELHO: 1978, p.39). O autor sintetiza nessa frase a relevância da pesquisa antropológica

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

em situações cotidianas, reconhecendo a contribuição de se observar o familiar na medida em que se apresenta uma “realidade bem mais complexa do que aquela apresentada pelos mapas e códigos básicos nacionais e de classe através dos quais fomos socializados” (VELHO: 1978, p.45). 1.2

Mudanças no objeto de pesquisa

Iniciei a observação participante em uma disciplina de projeto no primeiro semestre letivo de 2009 (de março a julho). Frequentei a maioria das aulas, durante as aulas de professores da disciplina e de conteúdo (a ser detalhado no próximo capítulo). Durante as aulas observei as atividades, conversei com professores, alunos e monitores e, vez ou outra, participei das atividades propostas junto aos alunos. Mantive registros a partir de um caderno de anotações, no qual anotava observações, listava as atividades realizadas em aula e realizava alguns desenhos de maneira a descrever algumas cenas. Ao final da disciplina, nas apresentações dos projetos, também fotografei as atividades de maneira a registrar alguns aspectos, posturas e recursos materiais empregados. No segundo semestre letivo de 2009 (agosto a dezembro), acompanhei outra turma de projeto. A partir da experiência anterior, reproduzi algumas formas de registro, como o uso do caderno, listando atividades em sala de aula, atitudes que me chamaram a atenção e a dinâmica geral. Na segunda observação, já mais familiarizado com as dinâmicas, me concentrei mais na observação dos recursos materiais empregados e realizei mais registros fotográficos. A observação serviu-me de base para a descrição e detalhamento da dinâmica das aulas de projeto. A partir dos diários e observações, preparei o documento

27

de qualificação concentrado na primeira experiência de observação e relacionandoa ao espaço e ao departamento. Com isso, valorizei as condições de materiais e espaciais e as interações que forneceriam o contexto para, posteriormente compreender como se daria a leitura de imagens na sala de aula. Pouco antes de qualificar, em agosto de 2010, enquanto ainda redigia o documento, percebemos que até então estava valorizando a contextualização das atividades, os espaços e recursos presentes, as interações, mas pouco me aproximava da questão da leitura. Naquele momento, constatei junto com minha orientadora que o trabalho estava mudando de foco pois na tentativa de descrever as aulas, percebi que elas se organizavam em diferentes formas e modalidades. Os comentários tecidos pela banca me confirmaram a necessidade de algumas mudanças no rumo da pesquisa. A professora Tania Dauster, por exemplo, chamou a atenção para o fato de que até aquele momento a pesquisa possuía mais um caráter exploratório e descri-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

tivo do que etnográfico, pois não se aprofundava na interpretação daquele contexto e não relativizava a minha visão. Os dados apresentados eram muito centrados nas minhas próprias impressões, sem trazer outras vozes para a compreensão daquela sala de aula. Esse comentário chamou a atenção para a importância de trazer outros olhares para dentro da pesquisa. A professora Rita Couto ressaltou a compreensão diferenciada dos alunos sobre as aulas de projeto ao notar a fragmentação das aulas, decorrentes de um projeto pedagógico que divide os dez créditos destinados a disciplina de projeto entre professores regentes e professores de conteúdos distintos. Chamou-lhe a atenção que cabia aos alunos a capacidade de juntar esses diferentes momentos. Nas frases da professora “a unidade da fragmentação é dada pelo aluno”. A observação nos fez atentar para a importância dos alunos como informantes privilegiados, pois vivenciavam diferentes momentos de aulas que os professores da disciplina e dos conteúdos não presenciavam por ocuparem o espaço de sala de aula predominantemente em momentos diferentes. 1.3

(Re)visitando referenciais Embora tenhamos, a partir da observação de campo e dos apontamentos da

banca de qualificação alterado o objeto de nosso estudo, consideramos que o seu eixo norteador, ou as referências que o sustentaram permaneceram estáveis. Ao entendermos práticas de ensino como práticas sociais que ocorrem dentro de um espaço, tempo e condições determinadas, continuamos fazendo uso de Chartier (1990) em sua abordagem cultural da leitura. O autor chama atenção para diferentes níveis de mediações, tanto em relação aos aspectos materiais do livro,

28

dos gestos e das posturas, quanto para as condições sociais, os grupos de leitores, as formas de leitura. Para Chartier (1990) a leitura é uma forma de apropriação de textos que concilia as práticas e representações, que por sua vez são constituídas histórica e socialmente. As representações dão conta das disposições mentais, dos conceitos e preconceitos, enfim, da maneira pela qual as coisas ganham significados para determinado indivíduo, grupo ou sociedade. Já o conceito de práticas está intimamente ligado ao das representações, uma vez que tais representações se encarnam em gestos e práticas. Ambas se influenciam mutuamente e podem até mesmo chegar a serem contraditórias entre si. Embora Chartier afirme a leitura como um conjunto de práticas “complexas, múltiplas e diferenciadas” (1990:28) e que possuem suas determinações sociais, ele não estabelece uma relação exclusiva de determinação, mas uma relação de interação, pois sua investigação da história da leitura propõe a relação dinâmica en-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

tre representação, prática e apropriação. Assim, Chartier afirma que “as estruturas do mundo social não são um dado objetivo, tal como não são as categoriais intelectuais e psicológicas: todas elas são produzidas por práticas articuladas que constroem as suas figuras” (1990:27). Para o autor, as representações (disposições mentais, conceitos) interferem nas práticas (técnicas, gestos) enquanto estas também interferem naquelas e ambas definem as formas de apropriação. Nesse sentido, há uma relação dinâmica entre práticas e representações mediante uma lógica de interação. Chartier (1990) afirma que as diferentes práticas de leituras se constituem como disputas de representações, que buscam estabelecer a legitimidade tanto das formas de ler quanto do controle dos significados. São essas disputas que estabeleceram, por exemplo, que a prática leitura em voz alta deveria ser substituída pela silenciosa em determinado momento, qualificando a última como mais intelectualizada e reflexiva. Entretanto, o autor mostra que a leitura em voz alta foi predominante durante muito tempo e nada tinha haver com a competência de leitura. Tal mudança estipula uma forma de distinção cultural que perpassa as práticas de leituras e a relação com os livros e bibliotecas. Chartier também destaca que, por tratar-se de um conjunto de práticas sociais, a “leitura é sempre uma prática encarnada em gestos, em espaços, em hábitos” (CHARTIER, 1994:13). Com isso, o autor chama a atenção para a inscrição da leitura dentro de aspectos fisiológicos, espaciais, históricos, sociais, econômicos, políticos, psicológicos, etc. Portanto, a abordagem de Chartier para o que ele chama de história cultural da leitura marca uma perspectiva que engloba os contextos em que ocorrem as leituras.

29

Para desenvolver uma história cultural da leitura, Chartier (1994) critica uma abordagem abstrata da leitura e propõe três deslocamentos a fim de superála. O primeiro deslocamento diz respeito ao uso de materiais partilhados, que compreende diferentes apropriações sobre os mesmos textos, criando leituras diferentes. O segundo deslocamento trata da reconstrução das redes de práticas de leitura, que determinam socialmente práticas mais ou menos legítimas de ler. O terceiro deslocamento abrange a materialidade do livro, que relaciona o texto ao seu suporte e com isso implica a mediação de outros agentes (editor, tipógrafo, livreiro) e a maneira como o texto é apresentado ao leitor. A abordagem de Chartier traz algumas ideias fundamentais para o entendimento das relações de sala aula: as noções de prática, representação e apropriação. Essas relações, entendidas como práticas de ensino e aprendizagem, também são encarnadas em gestos, posturas, espaços e hábitos. Ou seja, as aulas não ocorrem desvinculadas da situação social, histórica, espacial e material em que se insere.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

A noção de representação também auxilia na compreensão das salas de aula, uma vez que estabelece a relação entre as disposições e ideias e as práticas. No contexto de sala de aula há as expectativas de alunos e professores, a proposta curricular, os objetivos da disciplina e há a maneira como essas ideias se concretizam. Desse modo, há uma dinâmica e um processo de negociação entre práticas e representações. Outra noção instrumental, no âmbito desta pesquisa, na obra de Chartier para tratar a sala de aula está relacionada à apropriação. Penso ser possível também tratar as aulas como forma de apropriação da mesma maneira como a leitura como forma de apropriação de textos que concilia práticas e representações. Todavia, para além dos textos verbais, as aulas envolvem formas de comunicação variadas, incluindo oralidade e gestual, por exemplo, decorrentes da situação de interação face a face que seriam apropriadas por professores e alunos. Em uma perspectiva semelhante, Jean Marie Goulemot (1996) situa o leitor em relação ao texto pelos aspectos fisiológicos, históricos e intertextuais. Para Goulemot (1996:107), “a leitura é sempre produção de sentido” na qual o leitor e o texto sofrem o impacto do corpo, da postura, da história pessoal e coletiva, e finalmente, da biblioteca, ou seja, dos demais textos que dialogam com o leitor e o texto. Para o autor, a intertextualidade é um elemento constituinte da leitura e por isso permeia a construção de sentidos do texto. A argumentação de Goulemot parte de sua opção por deixar de lado o discurso crítico sobre a obra para discutir “a prática de uma leitura cultural, lugar de produção de sentido, de compreensão e de gozo” (GOULEMOT,1996:107). Porém, esta compreensão não se trata de encontrar o sentido desejado pelo autor e, por-

30

tanto, o prazer do texto não está em fazer coincidir o sentido desejado e o percebido. Para o autor, a leitura consiste em articular sequências diversas e dar um sentido global, portanto ele argumenta que “ler é constituir e não reconstituir um sentido” (GOULEMOT,1996:108). Sua argumentação também se baseia na ideia de que “leitura é uma revelação pontual de uma polissemia do texto literário” (GOULEMOT,1996:108 – itálicos do autor). Esta afirmação não atribui ao texto um sentido único, mas um conjunto de potencialidades de sentido, no qual a uma leitura revela uma destas potencialidades. Nos termos do autor, uma determinada leitura atualiza uma das virtualidades significantes do texto. Assim, ao assumir a leitura como produção de sentido e o caráter polissêmico dos textos, Goulemot afirma a relevância de se realizar uma análise do leitor, por acreditar que a situação de leitura constitui um dos fatores participantes desta produção de sentido. Isto o leva a investigar a relação entre o leitor, o texto e o que cha-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

ma de “fora-do-texto” e a afirmar que “o leitor em sua relação com o texto define-se por uma fisiologia, uma história e uma biblioteca” (GOULEMOT, 1996:108). A fisiologia trata da relação do corpo com a leitura, por meio da qual Goulemot observa a influência das atitudes corporais sobre as maneiras de ler. Sobre este aspecto o autor lembra que determinados textos admitem determinadas posturas, enquanto outras pode ser consideradas socialmente inadequadas. Também em relação à fisiologia, Goulemot chama atenção para os espaços ocupados para a leitura, sejam públicos ou privados, e sua adequação aos tipos de textos. Goulemot considera que as possibilidades de constituir sentido dependem da atitude do leitor, de suas escolhas perante atitudes-modelo ou tipos de determinismo biológico e as singularidades que caracterizam sua liberdade. A história define o impacto da história coletiva e pessoal na leitura. Goulemot destaca que há certa determinação da história coletiva na constituição de uma história pessoal, o que ele chama de história cultural, pois defende que assimilamos culturalmente determinadas formas narrativas que nos são contemporâneas. Além disso, Goulemot chama atenção para uma história mítica, que diz respeito à determinados acontecimentos distantes, mas culturalmente valorizados, como por exemplo o impacto da revolução francesa sobre uma maneira de ler à francesa. Nesse sentido, afirma que a história constitui um discurso comum que participa tanto da escrita como da leitura. A biblioteca diz respeito à intertextualidade da leitura, o que leva Goulemot a afirmar que “qualquer leitura é uma leitura comparativa, contato do livro com outros livros” (1996:113). Sobre esse aspecto, Goulemot se reporta às noções de di-

31

alogismo e intertextualidade de Bakhtin, que abrange o conjunto de nossos conhecimentos e suas articulações durante o ato de leitura. Goulemot também se reporta à noção de Jauss de horizonte de expectativas, ao destacar a maneira como a cultura institucional predispõe nossas formas de recepção. A biblioteca nos fornece o conhecimento dos códigos históricos e narrativos para compreender o texto, o que faz com que a produção de sentido parta de sentidos já existentes. Por fim, Goulemot aborda a leitura como um processo dinâmico ao reconhecer que o sentido muda a cada leitura. Para ele a leitura ocorre por meio de uma série de relações que se colocam o tempo todo entre o que é dado e o que é adquirido, entre a imposição do social e a liberdade individual. Por este viés, Goulemot descreve uma relação entre determinação e indeterminação, que permite enxergar a leitura por meio de uma perspectiva dialógica na qual ela é vista como produção de sentidos e de caráter intertextual. As ideias de Goulemot evidenciam a determinação dos sentidos da leitura

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

pelas condições que ela se dá. Esse raciocínio dá margem para pensar também nas condições em que o ensino e aprendizagem se dão, destacando assim os aspectos históricos, culturais, materiais, espaciais e intertextuais. Todos estes aspectos dialogam e influenciam o ensino e a aprendizagem da mesma maneira como influenciam a leitura. Se as abordagens de Chartier e Goulemot sobre a leitura lançam luz sobre a questão das práticas em sala de aula, assim também ocorre com a perspectiva de Mikhail Bakhtin sobre a linguagem. Enquanto Chartier e Goulemot se opõem à desvinculação da leitura às condições sociais em que se inscrevem, Bakhtin faz o mesmo em relação à linguagem. A filosofia bakhtiniana entende a linguagem como algo construído a partir das relações entre interlocutores, cultura, sociedade e momento histórico. Assim, a perspectiva de Bakhtin também lança luz para compreender as práticas de sala de aula. Bakhtin (2006) parte da oralidade para conceber sua teoria da linguagem. Ao fazê-lo, considera que todo ato de comunicação pressupõe um interlocutor (ainda que imaginário), um propósito e um contexto social em que esse ato se inscreve. Dessa forma, desenvolve o conceito de enunciado, que diz respeito tanto ao ato de produção do discurso como para a sua materialização, ambos dependentes do contexto em que se inscrevem (BAKHTIN: 2003). Outra noção de Bakhtin compreende os gêneros discursivos, que diz respeito aos “tipos relativamente estáveis de enunciados” (BAKHTIN 2003, p.262). Os gêneros estabelecem uma relação direta com o enunciado, surgem de ações concretas, mas interagem também a algumas formas típicas. Ao tratar dos gêneros,

32

Bakhtin entende que há formas social e historicamente construídas que determinam a maneira de se comunicar em determinadas situações. Bakhtin defende também a característica intertextual dos enunciados, por reconhecer que estes sempre se relacionam com outros anteriores: Ademais, todo falante é por si mesmo um respondente em maior ou menor grau: porque ele não é o primeiro falante, o primeiro a ter violado o eterno silêncio do universo, e pressupõe não só a existência do sistema da língua que usa mas também de alguns enunciados antecedentes – dos seus e alheios – com os quais o seu enunciado entra nessas ou naquelas relações (baseia-se neles, polemiza com eles, simplesmente os pressupõe já conhecidos do ouvinte). Cada enunciado é um elo corrente complexamente organizada de outros significados. (BAKTHIN, 2003 p.272)

Embora desenvolvidos com propósitos e contextos distintos, há aspectos semelhantes entre as abordagens de Chartier, Goulemot e Bakhtin. Ambas enfatizam, cada uma à sua maneira, a importância do contexto social, histórico e cultural em

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

que as práticas se inserem, a pluralidade de significados (polissemia) e o papel da interações com outros discursos (intertextualidade) nas situações de comunicação. Diante disso, não considero possível tratar signos, textos, escolhas tipográficas, objetos, espaços e outros tantos produtos culturais como neutros, pois são concebidos e realizados numa relação social e histórica dinâmica com propósitos específicos. Tampouco, não há como entender que os produtos encerrem um único significado, pois na medida em que se muda o propósito comunicacional ou o contexto histórico, social, cultural, mudarão também os sentidos atribuídos a estes produtos. Além disso, há uma questão relativa a intertextualidade também presente nos objetos e práticas. Se Goulemot fala que os livros se referem às outras leituras e Bakhtin afirma que os enunciados se remetem a outros enunciados, compreendo que os objetos e as práticas de ensino e aprendizagem também se referem-se a outros objetos e práticas anteriores. Isso porque, embora possam se manifestar de maneira singular, pressupõem o conhecimento de outras formas que o antecederam. Dessa maneira, se estabelece um vínculo histórico. Portanto, a partir do percurso de pesquisa, do referencial teórico e das contribuições da banca de qualificação identificamos como lacuna o papel atribuído ao ambiente de ensino na formação dos alunos de Design. Tratamos como questões de trabalho as maneiras como as aulas ocorrem e como os alunos compreendem o papel dos espaços e recursos materiais como mediadores das práticas de ensino e aprendizagem nas disciplinas de projeto da PUC-Rio. Como objetivo de pesquisa, buscamos compreender as práticas de ensino e aprendizagem com

33

foco principal nas interações dos sujeitos com os espaços e recursos materiais nas salas de aula de projeto. O objetivo da pesquisa desdobrou-se em observar as práticas de ensino e aprendizagem em suas relações com os espaços das aulas de projeto; investigar a partir dos alunos as maneiras como compreendem as relações entre forma e conteúdo das aulas e verificar os arranjos da sala de aula e a maneira como atuam sobre as práticas de ensino e aprendizagem. A pesquisa dividiu-se em três fases metodológicas: na primeira, em que realizei a observação participante nas disciplinas de projeto; na segunda, em que propusemos uma atividade de representação gráfica aos alunos; na terceira, em que os dados foram analisados e tratados em relação ao referencial teórico. Como valorizamos a contextualização, optamos por não aprofundar o referencial teórico e metodológico na introdução, tratando-a como uma apresentação de algumas premissas. A escolha deveu-se à intenção de intercalar as informações con-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

textuais em diálogo com o referencial teórico e metodológico, de maneira a justificar as opções. Assim, a divisão da tese segue essa opção, disposta em cinco capítulos. No segundo capítulo, me concentro na instituição em que a pesquisa foi realizada. Trato da PUC-Rio e seu campus, do Departamento de Artes & Design, e da constituição do curso de Design. Apresento o espaço físico ocupado pelo curso, as salas e espaços e recursos presentes no espaço. Também apresento os aspectos referentes à constituição do curso: o papel do projeto no currículo e a influência do Design em Parceria como abordagem característica. Trago ainda um referencial teórico acerca dos espaços de ensino-aprendizagem como sustentação para minhas reflexões. No terceiro capítulo descrevo as aulas de duas disciplinas de projeto a partir dos dados da observação participante. Discorro sobre as opções teóricometodológicas que guiaram a observação, as formas de registro das aulas e as atividades desenvolvidas. Discuto também os dados observados e as opções que direcionaram a sequência da pesquisa. No quarto capítulo contemplo a atividade de representação gráfica proposta em quatro turmas diferentes. Discorro sobre a formulação da atividade, as opções metodológicas que guiaram a formulação e a análise. Apresento os dados e faço uma análise preliminar dos desenhos criados pelos alunos identificando as situações de interação e suas formas, considerando também os resultados da observação. No quinto capítulo estabeleço o diálogo entre o referencial teórico e os resultados da análise preliminar. Discuto a noção de gênero na filosofia da linguagem de Bakhtin e defendo o emprego do conceito para o entendimento das formas que

34

as interações assumem. Entendo que a relação entre gênero e enunciado é instrumental para pensar as formas típicas nas aulas e a maneira como dialogam com o contexto histórico, institucional e os propósitos comunicacionais. Por fim, teço minhas considerações finais e discuto os possíveis desdobra-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

mentos da pesquisa.

2 Visitando espaços de ensino-aprendizagem de projeto no Departamento de Artes & Design da PUC-Rio

Este capítulo busca situar os espaços de ensino em Design na PUC-Rio, apresentando a universidade, o departamento, o curso e suas características. O capítulo aborda o projeto pedagógico, reformulado em 2007 e discute a ênfase conferida aos projetos. Em seguida, são apresentados os espaços dedicados as aulas de projeto. Depois,

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

é exposto referencial teórico que auxiliou na compreensão do capítulo. Por fim é realizada uma síntese e uma reflexão sobre os espaços de ensino e aprendizagem. Essa pesquisa ocorreu numa universidade particular na cidade do Rio de Janeiro, a Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) no campus da Gávea, Zona Sul da cidade. A Gávea é um bairro predominantemente residencial de classes alta e média alta, que se estende das margens da lagoa Rodrigues de Freitas subindo em direção ao morro, fazendo divisa com os bairros do Leblon e Jardim Botânico na parte baixa e com as comunidades da Rocinha e da Vila Parque da Cidade na parte alta. A universidade é localizada na parte baixa do bairro, próxima à autoestrada Lagoa-Barra, ao lado do túnel Zuzu Angel, uma das principais vias de acesso à Barra da Tijuca, na Zona Oeste da cidade. O fluxo de veículos nos arredores é constante, devido a ligação entre Zona Oeste e Zona Sul, mas graças ao posicionamento do campus e sua estrutura arquitetônica e paisagística é propiciado certo isolamento da vida universitária do trânsito do lado de fora da universidade. Uma das características do campus é o presente contraste entre os edifícios e a natureza, caracterizada pelo rio Rainha, que atravessa o campus, a arborização que envolve os espaços e a fauna, composta por aves, pequenos mamíferos e insetos. O campus dispõe de diferentes espaços voltados para aulas, estudos, pesquisas, práticas de esportes, solenidades, convivência, refeição, entre outros, concentrados em diferentes áreas. Portanto, a circulação pelo espaço é constante, seja para troca de aulas, seja para outros propósitos.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

36

Figura 2-1 - Edifícios e arborização do campus da PUC-Rio

A PUC-Rio é uma instituição de direito privado sem fins lucrativos, com atividades de ensino, pesquisa e extensão. Como universidade católica, valoriza a transmissão dos valores humanos e a ética cristã, que em relação aos cursos de graduação são manifestados por disciplinas optativas e obrigatórias ligados às questões éticas e religiosas. Na qualidade de instituição filantrópica, concede diversas bolsas estudos tanto por mérito, desempenho acadêmico e empenho nas atividades extracurriculares, assim como bolsas para alunos de baixa renda ingressos na universidade. Ao mesmo tempo, tanto pelo fato de ser uma instituição privada, como pela reconhecida excelência acadêmica, a universidade é frequentada por alunos de classe alta e média, na medida em que o valor da mensalidade se torna proibitivo para outras classes. O programa de bolsas permite o ingresso de alunos de classes mais baixas, na qualidade de bolsistas, constituindo um corpo discente heterogêneo em relação às condições socioeconômicas. 2.1

Departamento de Artes & Design

Conforme apresentado no site da instituição, o Departamento de Artes & Design (DAD) da PUC-Rio constituiu-se a partir do Departamento de Letras, por meio de um núcleo de disciplinas teóricas de Arte, Manifestações Artísticas e História da

37

Arte. Posteriormente, em 1978, com a consolidação dos cursos de graduação de Projeto de Produto, Comunicação Visual e Licenciatura em Educação Artística, conquistou autonomia ao tornar-se uma nova unidade constitutiva na universidade. Tempos depois, o curso de licenciatura foi descontinuado e foram mantidas apenas as habilitações dos cursos de Design. O departamento foi pioneiro na área do Design ao constituir os primeiros cursos brasileiros de mestrado (1994) e doutorado (2003). Atualmente o DAD atua nas áreas de ensino, pesquisa e extensão. A concepção de design presente no departamento, expressa tanto pelo currículo como pela abordagem teórico e metodológica das disciplinas, é bastante influenciada pelo lugar de onde o curso surgiu. Diferente de outros cursos no país mais próximos das áreas de exatas e engenharias, o curso de Design da PUC-Rio foi concebido mediante a valorização dos aspectos sociais relativos ao design. Essa PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

tendência se manifestou mediante o desenvolvimento dos projetos segundo a abordagem conhecida como Design em Parceria, desenvolvido pelos professores José Luís Mendes Ripper e Ana Maria Branco, na década de 1980 (COUTO, 1991). Cabe destacar que não há, necessariamente, uma homogeneidade em relação à concepção de design, seja especificamente no curso, como no campo como um todo. Os professores do quadro principal, de dedicação exclusiva, atuam tanto no ensino como na pesquisa e abordam o design por diferentes perspectivas, o que fica claro pelos diferentes aspectos contemplados nas pesquisas: Ergonomia, Artes, Comunicação, Sociologia, Administração, História, Pedagogia, Psicologia, Filosofia, Linguística entre outros campos do saber estão presentes nas diferentes pesquisas do departamento. Contudo, a área de concentração que abrange todas as pesquisas e os cursos de mestrado e doutorado: Design e Sociedade, confirma os aspectos sociais como eixo sobre qual se estrutura as diferentes abordagens no departamento. Conforme apresentado nas informações sobre os cursos mestrado e doutorado, tanto no site como no edital (DAD, 2008), o curso A área de concentração ‘Design e Sociedade’ engloba estudos sobre os múltiplos aspectos e as várias interfaces do Design com a Tecnologia, a Arte, as Ciências Humanas e Sociais, com destaque para as influências recebidas e as conseqüências da prática do designer para a cultura, a sociedade e o meio ambiente, tendo por fio condutor a investigação de suas relações com os usuários e com o processo produtivo. A área de concentração Design e Sociedade, forma um campo específico de conhecimento que constitui a referência central dos estudos e pesquisas em desenvolvimento. (PUC-Rio et al, 2008 p. 13)

38

As diferentes abordagens e campos de conhecimento que fundamentam as pesquisas em Design refletem a característica interdisciplinar do departamento. A constituição do quadro principal de professores também confirma as diferentes trajetórias acadêmicas dos docentes e pesquisadores, possuindo pessoas graduadas dentro ou fora do campo e pós-graduadas majoritariamente em outras áreas. Há, portanto, uma perspectiva manifesta da constituição do Design como campo interdisciplinar. A interdisciplinaridade no curso de pós-graduação não apenas compreende a pluralidade de formações do quadro, como também se manifesta listada entre os objetivos do programa de pós graduação, no qual pretende “Proporcionar ao aluno uma experiência interdisciplinar e abrangente, de acordo com as necessidades específicas de sua pesquisa.” (PUC-Rio et al, 2008 p. 13). PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

A concepção interdisciplinar também se manifesta em relação aos curso de graduação. No website do departamento, a apresentação do curso de graduação afirma a formação interdisciplinar: O Departamento de Artes & Design da PUC-RIO prepara os seus alunos para profissionalizarem-se na área de Desenho Industrial, oferecendo as habilitações de Comunicação Visual, Projeto de Produto, Moda e Mídia Digital proporcionando uma formação interdisciplinar e humanista voltada para a realidade da nossa sociedade. (DAD PUC-Rio, “Graduação” s/d )

Também no que tange à graduação o quadro complementar, formado por professores horistas, é diversificado. Há professores com diferentes níveis de formação (de bacharéis a doutores), com diferentes formações de origem (Engenharia, Arquitetura, Artes, Design, Comunicação etc.), embora prevaleçam aqueles formados em Design. Em relação à atuação, muitos desempenham outras atividades profissionais em paralelo à atividade docente. O perfil dos professores do quadro principal e complementar admite a pluralidade de formação e, consequentemente de visões diferentes sobre o Design. A heterogeneidade portanto se vê presente no discurso e na composição dos quadros de professores, e se manifesta através da proposta curricular. Nesse sentido os aspectos sociais e interdisciplinares estabelecem uma relação com a abordagem do Design em Parceria. 2.1.1

Projeto Pedagógico-Design em Parceria

Uma das características que distingue o curso de Design da PUC-Rio está na prática do Design em Parceria. A prática, inicialmente identificada pelo nome “Design Social”, é empregada no Departamento, desde 1982, por meio de trabalhos voltados para o universo social, rompendo com a prática anterior em que a situação de proje-

39

to era imaginada e as necessidades do público alvo simuladas em sala de aula (COUTO, 1991). A partir daí, a prática começou a ser incorporada em algumas disciplinas de projeto do curso, à medida que os métodos e teorias que a fundamentavam eram desenvolvidos, discutidos e investigados por professores e pesquisadores. O emprego do Design em Parceria nas disciplinas de projeto foi tema da dissertação de mestrado da professora e pesquisadora Rita Couto (1991), na qual ela buscou avaliar a utilização da abordagem dentro da disciplina (na época referiuse ao termo Design Social). Um dos recursos empregados pela pesquisadora foi entrevistar alguns pioneiros da prática dentro da universidade, como os professores pesquisadores José Luís Mendes Ripper e Ana Maria Branco, de modo a explicar o que caracteriza a abordagem e como ela surgiu. Outro procedimento adotado, foi consultar a bibliografia especializada de modo à conceituar aquilo que PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

define o Design em Parceria diante de outras concepções de Design. Couto (1991) verifica a existência de diversas concepções de Design, entre as quais ela identifica diferentes tendências. Em algumas das abordagens, a atividade de design está associada às técnicas envolvidas na produção em série e industrial. Em outras, enfatiza-se a importância de dados sobre a inserção do produto na sociedade. Além disso, há abordagens onde são levantadas as questões pertinentes às necessidades de uso de determinado produto. Conforme a pesquisadora identifica, não há consenso entre as definições, e seu estudo não busca esgotá-las. Embora no Design em Parceria não haja a preocupação com a produção em série, Couto ressalta que a abordagem não se situa em oposição à produção industrial. Isso porque, como afirma Ripper (1990 apud COUTO: 1991, p.15), nada impede que o objeto produzido pelo enfoque do Design Social seja produzido industrialmente. A diferença se dá porque o sistema convencional prioriza “a lógica dos meios de produção industrial”, enquanto no Design em Parceria a atenção do designer é deslocada da produção do objeto para priorizar “a lógica do usuário”. (COUTO: 1991, p.63) A diferença de abordagem do Design em Parceria se dá pela incorporação “lógica do usuário”, ou seja, da participação do usuário no processo de design. Segundo Ripper (1990 apud COUTO: 1991, p.13) “a inovação consiste em introduzir em praticamente todas as etapas do processo de projeto, que objetiva produtos práticos, a participação efetiva de elementos da população alvo, ou seja, dos futuros usuários do produto”. Couto (1991, p.19) entende que o Design em Parceria é uma “atitude de projeto” que envolve a participação do grupo social ou do indivíduo para quem se projeta em todas as etapas do processo. Outro aspecto desta prática é a interação do designer com o grupo social, que o leva a busca pela compreensão do contexto em

40

que atua, identificando os valores, anseios e necessidades da população envolvida (COUTO: 1991). Nesse sentido, a interação do designer com o contexto o leva a uma intervenção naquele meio, a partir da identificação de um problema. Os parâmetros para a construção do objeto surgem da observação, participação e interação do designer com o grupo social, identificando seus desejos e necessidades e não mais dos meios de produção industrial. Da mesma forma, a validação das escolhas e os padrões de eficiências não são medidos por parâmetros abstratos, mas são dados pela interação com o outro. O papel atribuído à população alvo no projeto distingue-se de outras abordagens em Design, e privilegia a interação entre designer e usuário. Por esse caráter participativo, aquilo que se convencionou chamar de “Design Social” no início, PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

passou depois a ser identificado pelo termo “Design em Parceria”. A prática tornou-se uma das características do curso de Design da PUC-Rio, influenciando não apenas as disciplinas de projeto, como também a constituição do novo currículo em vigência, uma vez que incorporou os métodos e teorias que o fundamentam no ensino das disciplinas de projeto. Contudo, apesar de ser uma das características do curso, não é a única abordagem vigente, conforme será visto adiante na descrição do novo currículo. Entretanto, vale ressaltar que embora não seja abordado em todos os projetos, o fato do Design em Parceria ser a abordagem comum da primeira disciplina de projeto, estabelece um forte ponto de referência para os alunos de Design. Seja rejeitando ou adotando esse tipo de abordagem, trata-se de uma experiência marcante que constitui parte significativa da identidade do curso como um todo. 2.1.2

Disciplinas de Projeto: espinha dorsal do curso

As disciplinas de projeto assumem uma grande importância no curso do Departamento de Artes & Design da PUC-Rio, não apenas por aliarem o ensino e a prática, mas também por seu papel curricular, constituindo uma espécie “espinha dorsal” (OLIVEIRA: 2009) . Contudo, não é apenas no currículo da PUC-Rio que se verifica a importância da disciplina de projeto, uma vez que o modelo foi influenciado pela primeira escola de Design do país, a ESDI (Escola Superior de Desenho Industrial), que por sua vez foi influenciada pelos modelos das escolas alemãs da HfG de Ulm (Hochschule für Gestaltung) e da Bauhaus (OLIVEIRA: 2009). Segundo Izabel Maria de Oliveira (2009), o modelo pedagógico adotado pela ESDI tornou-se um padrão para o ensino de Design no Brasil, conferindo às disciplinas de projeto o status de “espinha dorsal” ou “eixo curricular”. De acordo com a pesquisadora e professora da disciplina, a importância assumida pelo projeto foi

41

tal que adquiriu uma posição central na instituição do primeiro currículo mínimo para os cursos de bacharelados em Desenho Industrial do país, em 1968. Com isso, as disciplinas de projeto tornaram-se um “paradigma” do ensino de Design, estabelecendo-se “de forma canônica nos currículos dos bacharelados em Desenho Industrial principalmente como parâmetro para a estruturação curricular formal” (OLIVEIRA: 2009, p.11). Assim como os demais cursos do país, o curso de Desenho Industrial da PUC-Rio também foi influenciado pelo modelo de ensino de Design que adota a disciplina de projeto como eixo curricular. A diferença deste curso para os demais não estava na adoção do projeto como “espinha dorsal”, mas na abordagem, conforme colocado por Rita Couto (1991). Segundo a autora, pelo fato de encontrar-se filiado ao Centro de Teologia e Ciências Humanas, aulas de projeto em Design da PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

PUC-Rio, especialmente em seus dois primeiros projetos (Projeto Básico I e II), foram influenciadas pela prática do Design em Parceria por valorizar o aspecto humano e social. 2.1.3

Reforma Curricular em Design

Em 2007, houve a reformulação do projeto pedagógico do curso de Design da PUC-Rio e consequentemente de seu currículo. Ela resultou em mudanças gerais, incluindo o acréscimo de duas novas habilitações: Design de Mídia Digital e Design de Moda. Esta reformulação modificou a estrutura do curso ao enfatizar como eixo curricular das quatro habilitações o ensino das disciplinas de projeto. As mudanças promovidas na reforma curricular permitem ter uma noção, a partir da observação dos dados referentes às disciplinas, da importância que os projetos assumem nos novos currículos destinados as habilitações. A constituição do currículo de Design de 2007 manteve em seu projeto pedagógico a ênfase no Design em Parceria, com uma forte presença das disciplinas de projeto, que se mantiveram como eixo curricular. No currículo anterior, datado de 1990, os alunos cursavam seis disciplinas de projeto, de 4 créditos cada (60 horas), sendo duas disciplinas de projeto básico e quatro de projeto específico da habilitação, sendo a última o projeto final. Com a mudança curricular, tanto a carga horária, quanto a quantidade de disciplinas aumentaram. Os projetos passaram a oito disciplinas de 10 créditos (150 horas), sendo três básicos, três avançados, dois 1

projetos específicos, sendo o último específico o projeto final.

1

Sobre os projetos finais há duas exceções: o projeto final de Design de Moda (DSG 1052)

possui menos créditos (8 créditos) que os demais (10 créditos) e o projeto final de Comunicação Visual é precedido por uma disciplina de 2 créditos intitulada “Anteprojeto de Comunicação Visual”

42

Da mesma maneira como o número total de créditos das habilitações, a proporção da disciplina de projeto dentro do currículo também aumentou. Considerando que o currículo de 1990 possuía uma carga total de 2865 horas, as disciplinas de projeto representavam 12% do curso. No novo currículo, com carga total de 3570 horas, os projetos representam 33% do curso, ou seja, cerca de um terço. Comunicação Visual (antes de 2007)

Comunicação Visual (depois de 2007)

6 projetos

8 projetos

4 créditos (60 horas) cada

10 créditos (150 horas) cada

2 projetos básicos

3 projetos básicos

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

3 projetos avançados 4 projetos específicos (1 final)

2 projetos específicos (1 final)

Total de créditos de projeto: 24 (360 horas)

Total de créditos de projeto: 80 (1200 horas)

Total de créditos do curso: 191 (2865 horas)

Total de créditos do curso: 238 (3570 horas)

Tabela 2-1 – Comparação entre a carga horária de projeto nos currículos.

A importância atribuída aos projetos está presente tanto no aumento da carga total de disciplinas no curso, como também pela diferenciação de carga horária em relação às demais disciplinas do curso. Enquanto outras disciplinas possuem de duas a quatro horas semanais, os projetos possuem carga horária de dez horas semanais. Isso não se reflete apenas no tempo que o aluno permanece envolvido com a aula de projeto, como também no impacto das notas de projeto no histórico escolar do aluno, uma vez que a quantidade de créditos de uma disciplina está ligada à sua carga horária. No sistema de créditos empregado pela universidade, o CR (coeficiente de rendimento) é uma média das notas estabelecida por meio de um cálculo que atribui peso de acordo com a quantidade de créditos cursados. Assim, uma nota possuirá um peso maior numa disciplina de projeto, que possui 10 créditos, do que numa disciplina de 2 créditos. Uma vez que o CR determina a prioridade na matrícula e, consequentemente, a organização dos horários, a uma nota baixa em uma disciplina de projeto pode causar dificuldades na organização do horário do aluno para o semestre seguinte. Outra mudança significante da reforma foi o aumento de projetos comuns às habilitações. Enquanto o currículo antigo possuía duas disciplinas de projeto básico partilhadas entre as duas habilitações, o currículo atual possui três projetos

(DSG 1030), que visa à formulação da proposta, problematização, conceituação e planejamento do projeto final.

43

básicos e três projetos avançados partilhados entre as quatro habilitações. Se, por um lado, houve um aumento de projetos comuns das habilitações, por outro lado houve uma redução de projetos específicos das habilitações (de quatro para dois). Contudo, embora o número de disciplinas específicas tenha reduzido, vale ressaltar que a carga-horária não diminui, pelo contrário, aumentou de 240 horas distribuídas em quatro disciplinas, para 300 horas em duas disciplinas. Considerando a nova disposição curricular das disciplinas de projeto, o departamento enfatizou os aspectos comuns da formação dos designers. Os seis primeiros projetos (Conceito e Contexto; Planejamento; Desenvolvimento; Estratégia e Gestão; Produção e Distribuição; Uso e Impactos Socioambientais) dão conta de diferentes aspectos relativas ao processo de design, compreendendo habilidades e competências comuns, independentemente das habilitações. Este núcleo PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

comum de disciplinas constitui um pré-requisito para que os alunos possam cursar as duas disciplinas de projeto específico, quando serão abordados aspectos característicos de suas habilitações. Abaixo se encontram os temas dos projetos: Nível

Código da disciplina

Descrição

Básico

DSG1001

Projeto Básico – Contexto e Conceito

DSG1002

Projeto Básico – Planejamento

DSG1003

Projeto Básico – Desenvolvimento

DSG1004

Projeto Avançado – Estratégia e Gestão

DSG1005

Projeto Avançado – Produção e Distribuição

DSG1006

Projeto Avançado – Uso e Impactos Socioambientais

DSG1031

Projeto de Comunicação Visual

DSG1041

Projeto de Design de Mídia Digital

DSG1051

Projeto de Design de Moda

DSG1061

Projeto de Design de Produto

DSG 1032

Projeto Final de Comunicação Visual

DSG 1042

Projeto Final em Design de Mídia Digital

DSG 1052

Projeto Final de Design de Moda

DSG1062

Projeto Final de Design de Produto

Avançado

Específicos

Tabela 2-2 – Diferentes temas das disciplinas de projeto.

Os diferentes níveis dos projetos afetam também a ordem em que são cursados. Um aluno calouro é automaticamente inscrito em DSG1001 (Projeto Básico – Conceito e Contexto), e a partir daí deve cursar DSG1002 e DSG1003 nesta ordem. Concluído o nível básico, o aluno pode optar entre DSG1004, DSG1005 e DSG1006, e seguir, independentemente da ordem, até que complete as disciplinas de projeto avançado. Somente então poderá cursar os projetos específicos da habi-

44

litação de sua escolha, também seguindo a ordem (primeiro o projeto específico, depois o projeto final). O núcleo comum entre as diferentes disciplinas está refletido nas ementas das seis primeiras disciplinas, que possuem parte das descrições semelhantes. Tanto os projetos básicos quanto os avançados partilham de descrições similares, variando apenas a ênfase:

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Projeto Relações pessoa, meio, objeto usuário como interator; planejamento, projeto e desenvolvimento; conceito do objeto/sistema; processos, métodos e técnicas; referências de metodologia de projeto; entendimento da representação do objeto; prescrições funcionais. Comunicação e expressão do processo de projeto. Desenvolvimento de modelos experimentais. A disciplina é exercida por grupos de trabalho que se reúnem em torno de propostas que enfatizam fases do projeto, partindo de questionamentos avalizados que norteiam o desenvolvimento do trabalho. Participam dos grupos de trabalho: os alunos, os professores de projeto que atuam na coordenação e supervisão, os professores das áreas de conteúdo básico que interferem segundo suas especialidades, e técnicos de laboratório que asseguram assistência tecnológica.(...) (Departamento de Artes & Design da PUC-Rio, ementa de disciplina)

A parte comum das ementas caracteriza um processo marcado por etapas semelhantes, que contemplam momentos de contextualização, quando se percebem as relações com pessoas, meios e objetos. Em seguida, há momentos de conceituação, quando se formula uma proposta de ação. Depois, momentos de planejamento e desenvolvimento de modelos e especificações, em que se concretiza a proposta por meio de um sistema, serviço ou objeto. Todo o processo é documentado e apresentado, envolvendo, portanto, as competências referentes aos métodos, técnicas e teorias que auxiliem aos processos de análise, planejamento, desenvolvimento e comunicação ao longo destes projetos. O que difere em relação às ementas das disciplinas reside, especificamente, no que tange às ênfases de cada projeto, organizadas no quadro abaixo:

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

45

Disciplina

Ênfase da ementa

DSG 1001

(...)No Projeto Básico Contexto e Conceito são enfatizados conhecimentos sobre modelos de pesquisa antropológica: fundamentos, conceitos e ética; observação participante. Design participativo. Fundamentos da Teoria da Recepção; forma e sentido do objeto; relações de uso. Usabilidade. Criatividade.

DSG 1002

(...)No Projeto Básico Planejamento são enfatizados conhecimentos de pesquisa antropológica: técnicas e métodos; o trabalho de campo; métodos de transcrição e interpretação de dados. Design e Sociedade. Equacionamento de aspectos de criação, produção, circulação, consumo e desuso do produto.

DSG 1003

(...)No Projeto Básico Desenvolvimento são enfatizados atributos do objeto e/ou sistema. Configuração, detalhamento, experimentação. Materiais e processos. Organização, documentação e apresentação de projeto

DSG 1004

(...)No Projeto Avançado Estratégia e Gestão são enfatizados o conceito do objeto/sistema; potencial de uso e de valor simbólico do objeto. Relação do produto com o contexto de uso. Tendências do mercado. Racionalização do processo de fabricação. Organização, documentação e apresentação de projeto.

DSG 1005

(...)No Projeto Avançado Produção e Distribuição são enfatizados conhecimentos sobre materiais e técnicas de produção. Detalhamento do processo produtivo; técnicas de representação para produção. Conhecimentos de gerenciamento e administração. Organização, documentação e apresentação de projeto.

DSG 1006

(...)No Projeto Avançado Uso e Impactos Sócio-ambientais são enfatizados aspectos de sustentabilidade. Pós-uso e sobrevida do produto. Aspectos éticos e legais. Cadeia criativa, produtiva, de uso e descarte; variáveis do projeto. Design Inclusivo e universal. Organização, documentação e apresentação de projeto.

Tabela 2-3 – Especificidades das ementas dos projetos básicos e avançados

Na parte específica das ementas das disciplinas é possível observar aspectos que passam desde a análise das relações, até os aspectos da conceituação, planejamento, detalhamento, produção, distribuição, uso e impactos socioambientais. Em outras palavras, cada projeto enfatiza determinadas etapas, representado pela parte que difere nas ementas, de um processo abrangente de design, representado pelas partes comuns das ementas. Além de cada disciplina, os projetos também são diferenciados entre básicos e avançados. Nos projetos básicos as ênfases se concentram na parte de análise de situações de projeto, privilegiando o trabalho de campo, coletas de dados e a conceituação. Já nos projetos avançados, a ênfase parece residir na concepção de objetos, privilegiando aspectos do desenvolvimento, produção e descarte dos objetos. As tendências sugeridas pelas ênfases dos projetos também se refletem na bibliografia utilizada, em que apenas as disciplinas DSG1003 e DSG1006, diferem da tendência das demais.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

46

Disciplpina

Bibliografia

DSG1001

BRANDÃO, Carlos Rodrigues. Pesquisa participante; São Paulo: Brasiliense, 1981. FRASCARA, Jorge. Diseño Gráfico para la gente. Comunicaciones de masa y cambio social; Buenos Aires: Ediciones Infinito, 2000.

DSG1002

BAUDRILLAND, Jean. O sistema dos objetos; São Paulo: Perspectiva, 1993. LUIZ, Fernando M. Contribuiciones para uma antropologia del diseno.; Barcelona: Gediasa, 2002.

DSG1003

BURDEK, Bernhard E. História, teoria e prática do design de produtos; São Paulo: Edgard Blucher, 2008.F FLUSSER, VIlém. O mundo codificado: por uma filosofia do design e da comunicação. org. Rafael Cardoso; São Paulo: Casac Naif, 2007.

DSG1004

MAGALHÃES, Cláudio de Freitas. Design estratégico : integração e ação do design industrial dentro das empresas; Rio de Janeiro: Senai, 1997. CAGAN, Jonathan; VOGEL, Craig M. Creating breakthrough products - innovation fron product planning to program approval; Upper Saddle River: Prentice Hall, 2002.

DSG1005

BAER, Lorenzo. Produção Gráfica; São Paulo: SENAC, 1999. FUENTES, Rodolfo. A Prática do design gráfico. Uma metodologia criativa; São Paulo: Rosari, 2006.

DSG1006

MANZINI, Ezio; VELOZZIM Carlo. O desenvolvimento de produtos sustentáveis: os requisitos ambientais dos produtos industriais.; São Paulo: Edusp, 2002. PAPANECK, Victor. Design for the real world. Human ecology and social change; New York: Pantheon Books, 1971.

Tabela 2-4 – Referencias bibliográficas das ementas dos projetos básicos e avançados

A partir da bibliografia utilizada, verifica-se uma tendência de referências das ciências humanas (Baudrillard) e sociais (Frascara, Luiz, Brandão) nos projetos básicos DSG1001 e DSG1002, enquanto o DSG1003 foca em aspectos históricos, práticos (Burdek) e simbólicos (Flusser). Já os projetos avançados DSG1004 e DSG1005 enfatizam aspectos práticos (Magalhães, Fuentes, Cagan & Vogel) e produtivos (Baer), enquanto o DSG1006 enfatiza aspectos sociais (Papanek) e ambientais (Manzini). Estas diferenças entre projetos básicos e avançados poderiam também ser compreendidas nas diferenças entre concepções de Design: uma voltada para objetos que mediam relações sociais, e outra voltada para objetos como produção industrial e os problemas decorrentes deste sistema. Nos termos de Jorge Frascara (2002), essas diferenças podem ser entendidas na relação entre duas abordagens. Na primeira, o design como “solução de problemas” diz respeito ao fato de o design ser uma atividade interdisciplinar orientada a resolver problemas oriundos dos produtos, métodos e técnicas industriais. Na segunda, o autor sugere uma ampliação da primeira noção, atribuindo ao design a responsabilidade de “identificação de problemas”, situando o designer como profissional que busca

47

descobrir e definir problemas físicos e culturais e a partir daí definir os métodos e teorias utilizados. Como os projetos básicos enfatizam os aspectos relativos à análise de contexto de atuação, por meio da identificação do grupo social, definição do problema e objetivo do trabalho, identifico nessas características o privilégio da “lógica do usuário”, característico do Design em Parceria. De fato, as abordagens obrigatória no projeto DSG1001 é a do Design em Parceria com um parceiro específico, enquanto no projeto DSG1002 o Design em Parceria é opcional, de acordo com os professores, mas influente.. Se os projetos básicos enfatizam a “lógica do usuário”, os projetos avançados DSG1004 e DSG1005 enfatizam a “lógica dos meios de produção industrial”. Tanto as ênfases das disciplinas quanto as bibliografias ressaltam os conhecimentos PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

sobre os meios de produção, gestão e distribuição, minimizando a importância do contexto na maneira como é abordada nos projetos básicos. Portanto, os aspectos abordados nos projetos avançados, DSG1004 e DSG1005, tratam dos aspectos práticos e técnicos da produção de objetos, afastando-se, assim, do enfoque do Design em Parceria. Já o projeto avançado DSG1006 retoma a possibilidade do Design em Parceria, não com foco no intercessor ou no grupo social, mas com foco na sociedade, propondo a relação com os meios de produção, gestão e distribuição. Outro aspecto relevante da mudança curricular, que também diz respeito ao projeto como espinha dorsal, foi a exclusão de algumas disciplinas e o surgimento das aulas de conteúdo e oficinas dentro da disciplina de projeto. Na carga horária dos projetos, os professores responsáveis pela disciplina ministram 55 das 150 horas (36%), sendo as outras 95 horas (64%) dedicadas aos professores de conteúdos específicos. As aulas ministradas por professores de conteúdo consistem em palestras, dinâmicas e orientações que visam a auxiliar na teoria e na prática os projetos dos alunos. Cada aula de conteúdo varia entre 4 a 20 horas, perfazendo um total de 8 à 12 colaborações ao longo de uma disciplina. Os tópicos ministrados são variados, tais como técnicas de pesquisa, representação, criação e expressão, laboratórios, oficina de texto, anatomia, ergonomia, processos de fabricação, questões sociais e ambientais, logística e distribuição, produção, marketing etc. Cada disciplina possui sua própria distribuição de professores de conteúdo, segundo a ênfase de cada projeto e o planejamento de seus respectivos supervisores. No que tange a participação dos professores de conteúdo, eles atuam juntamente com os professores e supervisores de determinadas disci-

48

plinas no sentido de planejarem os conteúdos e o cronograma para as aulas diante das etapas dos projetos.

2

A iniciativa das aulas de professores de conteúdo dentro das aulas de projeto é inovadora, e sua implantação demandou a ampliação do quadro docente tanto com a contratação de novos professores quanto com a participação de profissionais convidados em função das demandas das disciplinas. Contudo, o sistema administrativo da universidade inviabilizava a inserção de professores contratados e de profissionais convidados dentro de uma mesma disciplina. Assim, para implementar as aulas de conteúdo, foi necessário realizar ajustes junto a Coordenação Central de Graduação e ao sistema administrativo da PUC-Rio para contornar a rigidez disciplinar do sistema vigente na universidade. Sendo assim, as aulas de conteúdo independem de vínculo empregatício, posPUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

sibilitando que outros profissionais fossem incorporados além daqueles já pertencentes aos quadros docente principal e complementar. Dessa maneira, criou-se mais opções, do ponto de vista administrativo, para a presença de profissionais atuantes dentro ou fora da academia, que dominem os assuntos necessários nas turmas. A dinâmica proposta pela inserção de conteúdos ao longo dos projetos afirma um caráter interdisciplinar ligado à uma concepção de Design vigente. Isso porque, na medida em que algumas disciplinas foram excluídas para dar lugar a outras, vinculadas ao fazer do projeto, entendemos que o os conteúdos fiquem menos estanques. Na nova dinâmica, os conteúdos devem, a princípio, estar relacionadas aquilo que os alunos estão desenvolvendo, tornando o processo mais integrado. Isso fez com que, a carga horária dos projetos aumentasse e também destacou a relevância dos projetos ao submeter certas práticas e conhecimentos a eles. Portanto, os aspectos selecionados e mostrados aqui visam a indicar, a importância do projeto como “eixo curricular” do curso de Design da PUC-Rio. Dentre esses aspectos, destaco a obrigatoriedade das disciplinas, a carga horária diferenciada, a interdependência das disciplinas e o sistema de créditos. Esse conjunto leva os alunos que pretendem completar os cursos no tempo mínimo (8 semestres) cursem, obrigatoriamente, um projeto a cada semestre. A partir dessa constante presença no cotidiano e seu respectivo impacto no currículo dos alunos, compreendi que o projeto ocupava um lugar ainda mais destacado no currículo 2007 do que naquele em que havia cursado (1990), estruturando o curso e, consequentemente, a vida acadêmica dos alunos.

2

A carga horária das aulas de conteúdo em projetos básicos e avançados encontra-se de-

talhada nos documentos anexados, conferir Anexos I. e II.

49

2.1.4

Ocupação dos espaços no campus

As estruturas do DAD, salas de aulas e instalações, ficam dispersas pelo campus da universidade. Devido ao crescimento progressivo do curso, novos espaços foram incorporados ao conjuntos de salas disponíveis, oriundos de edifícios diferentes. Embora haja certos pontos de concentração, especialmente em torno das secretarias do departamento (Casa das Artes), dos laboratórios de pesquisa (Ala Frings), e dos laboratórios de ensino (Ala Kennedy), cada um destes núcleos encontra-se em determinado ponto do campus (cf. Figura 2-2). Além disso, as salas de aulas também ficam situadas em diferentes edifícios, fazendo com que o aluno de Design se habitue aos deslocamentos ao longo de todo o curso. Os espaços partilhados pelos alunos e professores são bastante diversifica-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

dos, conforme apresentado anteriormente, há salas distribuídas em diferentes locais e edifícios. Se a afirmação refere-se às diferentes disciplinas do Departamento de Artes & Design, é igualmente válida para as disciplinas de projeto. Algumas salas utilizadas em projeto são exclusivas do Departamento de Artes & Design, como a barraca, as tendas, as salas do subsolo da Ala Kennedy. Outras se localizam em institutos, edifícios, e andares compartilhados com outros departamentos, como no caso do Edifício Cardeal Leme, onde se concentram os cursos das Engenharias, Teologia e Psicologia, no caso do IAG, onde se concentra o curso de Administração, a casa de Artes, onde se concentram os cursos de Design e Administração e o IMA, espaço partilhado pelos cursos de Arquitetura e Design.

Figura 2-2 – Identificação dos Edifícios da PUC-Rio

50

A Casa das Artes é o edifício onde se encontram três salas de aula e as secretarias e coordenações do departamento (Graduação, Pós-Graduação e Extensão), assim como a diretoria. Além disso, também abriga uma área de convivência, sala de reunião e sala de supervisores. A Casa das Artes é constituída pela fusão de dois edifícios, em um concentram-se as salas de aulas, em outro as demais instalações. As salas de aula são frequentadas por professores e alunos de graduação e pós, para as atividades acadêmicas, e as demais instalações são frequentadas especialmente para o empréstimo de equipamentos para aula (computadores, projetores, caixas de som, etc.) e para desempenho de funções burocráticas e administrativas, como assinar ponto, pegar pautas de frequência, etc. Os laboratórios de ensino são frequentados majoritariamente por professores e pelos alunos de graduação, seja para o ensino de disciplinas específicas, seja para o PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

desenvolvimento dos projetos. As instalações se concentram no subsolo do Edifício da Amizade (Ala Kennedy), exceto por duas das salas de computação gráfica que se situam no RDC. Os laboratórios contam com professores, técnicos responsáveis, estagiários e monitores que auxiliam os alunos a se familiarizarem com equipamentos especializados para assistir às diferentes habilitações, sendo que muitos deles são inviáveis para os alunos possuírem em casa, por motivos de custo e manutenção. Eles são empregados na criação de modelos, protótipos, impressos, vestuários, estampas, fotografias, vídeos, animações etc. Os laboratórios de ensino são: •

Laboratório de computação gráfica



Laboratório de representação gráfica



Laboratório de fotografia e estúdio



Laboratório de vídeo



Laboratório de volume e prototipagem



Laboratório de volume têxtil



Laboratório de stop motion / N.A.D.A. – Núcleo de Arte Digital e Animação

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

51

Figura 2-3 - Esquema da distribuição dos laboratórios de ensino

Os laboratórios de pesquisa concentram-se no sétimo andar do Edifício da Amizade (Ala Frings), à exceção do LILD (Laboratório de Investigação em Living Design), que se situa no pátio do campus da universidade (em frente ao IMA, sinalizado na Figura 2-2). Cada laboratório conta com um ou mais professores pesquisadores que desenvolvem atividades de pesquisa, extensão, além de prestação de serviços e projetos patrocinados. O espaço é frequentado majoritariamente por professores e alunos de pós-graduação, mas também pelos alunos de graduação envolvidos com as atividades descritas, principalmente os bolsistas de iniciação científica. Além das salas destinadas aos professores, o espaço possui uma secretaria (Pesquisa), e locais equipados com computadores e salas de reunião. Os laboratórios de pesquisa são: •

LAE – Laboratório de Arte Eletrônica



LabCom/Design – Laboratório de Comunicação em Design



LABDME – Laboratório Design, Memória e Emoção



LED – Laboratório de Eco Design



LEUI – Laboratório de Ergonomia, Usabilidade e Interfaces



LGD – Laboratório de Gestão em Design



LAC – Laboratório de Arquitetura e Cidade



LILD – Laboratório de Investigação em Living Design



LIDE – Laboratório Interdisciplinar de Design/Educação



LaRS – Laboratório de Representação Sensível



LaDeH – Laboratório de Design de Histórias

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

52

Figura 2-4 - Esquema da distribuição dos laboratórios de pesquisa

Além das atividades de prestação de serviços e pesquisa, outro aspecto de interesse para o acesso ao espaço diz respeito ao NRP, Núcleo de Pesquisa e Referência em Design, vinculado ao LIDE. O núcleo armazena e disponibiliza para consulta os registros de projetos realizados no departamento ao longo dos anos, na forma institucionalizada das “Fichas-resumo”. A ficha-resumo é um documento exigido aos alunos, ao fim de cada disciplina de projeto pelos professores para registro e armazenamento das informações relevantes do projeto desenvolvido pelo aluno no departamento. Diferentemente de outros departamentos que concentram suas salas de aula em edifícios específicos, o DAD conta com salas de aula em diferentes lugares do campus. Há salas em diferentes edifícios e institutos da universidade, tais como Edifício Cardeal Leme, Edifício da Amizade, Instituto de Administração e Gerência (IAG), IMA (Espaço Imaginário), Rio Data-Centro (RDC) além de salas próprias do departamento, como as salas da Casa das Artes (ART 1, 2 e 3); as tendas (ART 4 e 5), próximas à Casa das Artes; e as salas do subsolo da Ala Kennedy, próximas aos laboratórios de ensino. Há salas de aula exclusivas do departamento, como também salas partilhadas com outros cursos. As salas são frequentadas por professores e alunos, tanto de graduação, quanto de extensão e pós-graduação. A dispersão pelo campus é tal que chega a ser reconhecida por parte dos alunos como característica distintiva do curso de Design. Enquanto os outros cursos de graduação se concentram em locais específicos, os graduandos de Design tendem a se deslocar para os diferentes edifícios. Isso é visto de maneira positiva ou negativa pelos alunos, a exemplo das reações ao gráfico abaixo (Figura 2-5) pu-

53

blicado pelo aluno Afonso Ferrão em outubro de 2001 na rede social Facebook e foi

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

compartilhado por mais de 80 pessoas acompanhados por diferentes comentários.

Figura 2-5 – Comparação dos percursos dos alunos de Design no campus aos outros cursos.

Os comentários envolvem uma ampla gama de observações e ilustram as diferentes reações de alguns alunos sobre a dispersão das salas do curso. Abaixo, selecionei alguns comentários a título de ilustração, apenas para mostrar a diversidade de opiniões (Figura 2-6). Eles vão desde a relação com a interdisciplinaridade até os aspectos relativos ao esforço físico de se caminhar para tantos lugares distintos.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

54

Figura 2-6 – Comentários sobre o esquema do percurso dos alunos de Design (Figura 2-5)

Considero essas informações sobre a ocupação de salas no campus um dado importante, pois, conforme mostram os comentários, trata-se de um aspecto característico do curso. A dispersão entre os diferentes edifícios faz com que as salas possuam também características diferentes, determinadas pelo posicionamento e estrutura dos edifícios. As salas do edifício Cardeal Leme, por exemplo, tendem a possuir janelas amplas apenas de um lado da sala, pois o outro é voltado para o corredor que dá aceso a todas as salas.

55

Portanto, além da diversidade de localidades, há uma diversidade arquitetônica entre as salas, com características distintas entre si, de formatos de salas de aula, com características e propriedades diferenciadas. Não há uma uniformidade padrão nas salas: há salas circulares e retangulares, com e sem paredes, com mais ou menos iluminação natural etc. 2.1.5

Salas de projeto: espaço, equipamentos e recursos materiais

As salas dedicadas ao ensino de projeto exigem algumas condições específicas. Embora possam variar em relação à localização, possuem alguns elementos em comum. Uma questão elementar diz respeito às dimensões. As turmas de projeto costumam possuir cerca de 40 alunos, portanto há uma demanda espacial para acomodá-los. Dessa maneira, as salas mais amplas do departamento são destinaPUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

das às disciplinas de projeto. Todavia, em relação à forma e às características das salas há bastante variação. De acordo com o edifício em que se localizam as salas possuem formatos, condições de iluminação, nível do pavimento, condições de acesso entre outras características diferentes entre si. As tendas (ART 4 e 5) e a Barraca, por exemplo, possuem formato circular com tetos de lona esticada. Essas salas não possuem paredes de alvenaria e no caso específico da Barraca, o chão é constituído pelo próprio solo de terra do local.

Figura 2-7 – Sala de aula nas Tendas (ART 5), com sua estrutura no formato circular e teto de lona

Tanto no caso das Tendas (Figura 2-7) como no caso da Barraca (Figura 2-9), a vegetação do campus envolve as salas de aula. Ambas estruturas favorecem a iluminação natural e a circulação do ar. Todavia, diferentemente da Barraca, as Tendas contam com ventiladores e refrigeradores de ar. Para que a refrigeração

56

funcione de maneira adequada as salas necessitaram de um revestimento de vidro ao redor da sala. Para resolver a questão da acústica há uma barreira constituída sacos cheios

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

de barro cru, para absorver o som na entrada da sala ART4.

Figura 2-8 – Entrada da sala ART 4, que emprega uma barreira sonora feita com sacos com barro cru.

Figura 2-9 – Sala de aula Barraca vista pelo lado de fora

As demais salas possuem formato retangular, mesmo assim apresentam disposições diferentes entre si. As salas da Cada das Artes (ART 1, 2 e 3) possuem a largura próxima do comprimento, fazendo com que distância entre o quadro de giz e o fundo não seja muito diferente da distância entre as extremidades laterais.

57

Já no caso da sala IMA 1 a diferença entre largura e comprimento é maior, o que torna a distância entre o quadro de giz e o fundo da sala bem maior do que a distância entre as laterais. Embora ambas possuam formato retangular, as proporções são diferentes, podendo afetar o funcionamento das aulas de formas diferentes. Enquanto os alunos habituados a sentarem-se ao fundo da sala, ficaram próximos dos professores nas salas ART1, 2 ou 3, os mesmos alunos ficam mais distantes

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

dos professores na sala IMA1.

Figura 2-10 – Sala ART3

Figura 2-11 – Sala IMA01

58

A sala K014 é menor no comprimento do que na largura, aproximando os alunos da última fila dos professores, mas afastando as extremidades laterais. Por ficar situada no subsolo, suas janelas são na forma de basculantes e fornecem

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

pouca iluminação natural para a sala e nenhuma vista para o campus.

Figura 2-12 Sala de aula K014

Já as salas do Edifício Cardeal Leme (L232, 260 e 532) possuem amplas janelas voltadas para a mata e uma ampla fonte de iluminação natural. As salas neste edifício possuem estruturas semelhantes, todas com uma parede separando o corredor de acesso e outra com janelas voltadas para a mata. No caso, as salas destinadas as disciplinas de projeto situam-se entre as maiores desse edifício, resultantes da fusão de duas ou mais salas.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

59

Figura 2-13 – Sala L532

Em relação ao acesso, também há diferenças entre as salas. As salas no nível térreo (Casa das Artes, Tendas, Barraca) são mais acessíveis por não possuírem escadarias. Já as salas que se encontram em outros pavimentos, seja subsolo ou superior, carecem de acesso por escadas ou elevadores, como nos casos das salas do Edifício Cardeal Leme e Ala Kennedy. Especificamente no caso do IMA o acesso se dá somente por escadas, o que dificulta o acesso, especialmente para portadores de necessidades especiais. Abaixo apresento uma tabela sintetizando alguns aspectos sobre a localização das salas, o formato e características relativas às janelas, paredes, nível de pavimento e forma de acesso.

60

Edifício

Sala

Formato

ART 1

Retangular

ART 2

Retangular

ART 3

Retangular

ART 4

Circular

ART 5

Circular

IMA

IMA1

Retangular

Subsolo Kennedy

K014

Retangular

L232

Retangular

L260

Retangular

L532

Retangular

Barraca

Circular

Casa das Artes

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Tendas

Cardeal Leme

Barraca

Características Janela voltadas para o campus. Paredes e teto de alvenaria. Nível térreo. Janela voltada para área de convivência do departamento (mantém-se fechada). Paredes e teto de alvenaria. Nível térreo. Janela voltadas para o campus. Paredes e teto de alvenaria. Nível térreo. Sem janelas (tenda). Envolvida pelos jardins ao redor. Revestimento de vidro ao redor para separar acústica e termicamente o espaço. Teto de lona. Nível térreo Sem janelas (tenda). Envolvida pelos jardins ao redor. Revestimento de vidro ao redor para separar acústica e termicamente o espaço. Teto de lona. Nível térreo Basculantes de vidro amplos em ambos ao longo das paredes laterais. Vista para o campus. Duas paredes e o teto de alvenaria. Divisória retrátil divide a sala em duas. Segundo andar com acesso somente por escadas. Janelas basculantes. Paredes e teto de alvenaria. Nível subsolo com acesso por elevador e escadas. Janelas amplas voltadas para a mata. Paredes de alvenaria. Segundo andar com acesso por elevador e escadas. Janelas amplas voltadas para a mata. Paredes e teto de alvenaria. Segundo andar com acesso por elevador e escadas. Janelas amplas voltadas para a mata. Paredes e teto de alvenaria. Quinto andar com acesso por elevador e escadas. Sem janelas (tenda). Envolvida pelos jardins ao redor. Separação do espaço por parede de treliças. Teto de lona. Chão de terra. Nível térreo.

Tabela 2-5 – Quadro comparativo das salas de projeto

Além da diferença entre os formatos de sala e características específicas, há também pequenas diferenças acerca da maneira como são mobiliadas e equipadas. Quase todas as salas possuem refrigerador de ar (exceto ART5 e Barraca), quadro de giz e tela de projeção. Algumas apresentam também caixas de som e projetor digital (Datashow) instalado nas salas. Quase todas também possuem mesas de dois ou três lugares equipadas com rodas e cadeiras de plástico, destinadas aos alunos. A Barraca é a exceção e possui recursos materiais diferenciados e exclusivos. Conforme mencionado, essa sala apresenta uma estrutura circular de tenda. Em seu interior ao invés de mesas e cadeiras há tablados de madeira que servem de bancos e cujo interior, ao levantar o tampo, são guardados objetos como pranchetas de madeira e almofadas de folhas. Não há quadro de giz, ar condicionado, tela e aparelho

61

de projeção, em seu lugar há varais onde são pendurados os desenhos com pregadores. Ao invés de mesas, os alunos empregam pranchetas de madeira para produzir seus desenhos. Há também uma pia, para lavar os objetos e material empregado. A Barraca é uma sala de aula à parte, empregada pela professora Ana Maria Branco como sala de aula de projeto e laboratório de pesquisas (Laboratório de Pesquisa e Aprendizagem de Projeto de Design). A professora é uma das idealizadoras do Projeto em Parceria na PUC-Rio que emprega em sua própria abordagem de ensino e desenvolvimento de projetos que influencia outros professores e alunos no departamento, conhecida como a “metodologia da barraca”. A construção da sala buscou uma integração entre forma e a visão de mundo que passa tanto pelo método de projeto como pela abordagem pedagógica. Conforme é apresentado

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

no site da professora, o próprio espaço é visto como um projeto: O projeto realiza experimentos sobre a influência das intercessões e variações cíclicas ambientais no processo de aprendizagem. Seu espaço físico, com um mínimo de obstáculos entre o interior e o exterior, é baseado em teorias proxemicas e está instalado no Campus da Universidade PUC-Rio. Construído com paredes de treliça, onde a permeabilidade com o entorno é refletida nos projetos desenvolvidos com métodos de observação participativa. A cobertura de lona sintética, tensionada por duas jaqueiras (Tenda), guarda os professores e os alunos sem isolá-los dos movimentos que atravessam e giram ao seu redor. (BRANCO, s/d)

A Barraca difere das demais salas dedicadas ao projeto, tanto pelo formato, estrutura e recursos materiais. Reflete um tipo de abordagem de projeto acompanhada por uma visão de mundo e de espaço, refletida nas paredes de treliça no chão de terra e na ausência de uma estrutura comum às outras salas de aulas. Porém, o uso da Barraca não é abrangente nos diversos segmentos do curso, fica associado principalmente à atuação da professora Ana Branco (Figura 2-14) e alguns professores que trabalham com ela.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

62

Figura 2-14 – Interior da Barraca ao fim da professora Ana Branco

As demais salas seguem um certo padrão quanto aos recursos, mas possuem variações. As tendas, por exemplo, não possuem projetores digitais instalados na própria sala. Há recursos que só algumas salas possuem, como murais, quadro auxiliar e acesso à internet pela rede wi-fi. A quantidade e a disposição das tomadas também varia, mas em geral há apenas um ponto de tomada próximo ao quadro para uso de projetor, o que limita o uso pelos alunos para a recarga de celulares, notebooks etc. Em algumas salas há mesas sem rodas, o que reduz a mobilidade. Sintetizo a baixo o quadro das salas e seus respectivos recursos:

63

Sala

Quadro de giz

Tela de projeção

Datashow

Caixas de som

Mesas

Cadeiras

ART 1

Sim

Sim

Sim

Sim

Com rodas

Sim

ART 2

Sim

Sim

Sim

Sim

Com rodas

Sim

ART 3

Sim

Sim

Sim

Sim

Com rodas

Sim

ART 4

Sim

Sim

Não

Não

Sem rodas

Sim

ART 5

Sim

Sim

Não

Não

Sem rodas

Sim

IMA

IMA1

Sim

Sim

Sim

Sim

Com rodas

Sim

Subsolo Kennedy

K014

Sim

Sim

Sim

Sim

Com rodas

Sim

L232

Sim

Sim

Sim

Não

Com rodas

Sim Sim

Edifício

Casa das Artes

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Tendas

Cardeal Leme

Barraca

L260

Sim

Sim

Sim

Não

Com rodas

L532

Sim

Sim

Sim

Sim

Com rodas

Sim

Barraca

Não

Não

Não

Não

Não

Não

Tabela 2-6 – Recursos presentes nas salas de projeto

Em suma, observamos que a reforma curricular do curso de graduação em Design da PUC-Rio não parece ter sido acompanhada por um projeto pedagógico que incluísse uma reflexão acerca de seus espaços de ensino-aprendizagem. As variações de formato das salas bem como a diversidade de recursos materiais parece mais estar submetida as ofertas da instituição, adequando-se a uma realidade préestabelecida do que a uma reflexão acerca do que diferentes espaços potencializariam em termos de práticas de ensino diferenciadas e de estímulos de recepção . Em linhas básicas parece ter sido desconsiderado, por exemplo, que diferentes arranjos potencializam ou limitam ações. Uma sala circular, por exemplo, é menos propícia para a disposição das mesas e cadeiras em fileiras retas. Uma sala longa e estreita favorece o enfileiramento das mesas e cadeiras, mas limita o arranjo em

Extras Parede revestida de carpete (mural) Parede revestida de carpete (mural) Parede revestida de carpete (mural) Mural Pia Acesso wi-fi Tomadas Mural Pia Acesso wi-fi Tomadas Acesso wi-fi Divisória Tomadas Tomadas

Acesso wi-fi Parede revestida de carpete (mural) Parede revestida de carpete (mural) Tablado Pranchetas Varal Almofadas Pia

64

círculo. A ausência de quadro de giz demanda outras práticas para substituir a exposição, assim como potencializa outros tipos de relação. 2.2

Referencial Teórico Associado

A Arquitetura e o Design tem abordado o projeto dos ambientes de ensino a partir de uma perspectiva funcional. A partir dessa perspectiva, Doris Kowaltowski (2011) destaca que há certos parâmetros básicos a serem considerados nos projetos de espaços para escolas. Esses parâmetros referem-se à iluminação e ventilação natural, do posicionamento da escola em um local seguro, do uso de materiais atóxicos e não inflamáveis nas salas de aula, do desenvolvimento de mobiliários ergonômico etc. Embora tratem de um nível elementar, também são importantes para o bom desempenho das atividades educacionais. PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

O livro intitulado “The Third Teacher” (CANNON DESIGN et al, 2010) explora o conceito apresentado pela professora e psicóloga Loris Malaguzzi de que o ambiente é o terceiro professor (sendo o primeiro professor os adultos e o segundo os colegas). O livro aborda 79 formas de modificar o ensino e aprendizagem a partir do Design e Arquitetura. Além de apresentar situações em que houve mudanças devido ao espaço construído, os autores também apresentam dados que justificam as ações projetivas. Alguns dos dados apresentados situam, por exemplo, o papel que um ambiente saudável desempenha na atenção dos alunos. Um dos casos diz respeito a má condições do ar em países frios o que aumenta o índice de alergia e asma e contribuem para a dispersão e evasão de alguns alunos por motivos de saúde. Nesse sentido, os autores afirmam a importância de projetos que contemplem a ventilação natural. Além dos aspectos básicos relativos à segurança, saúde e conforto, Cannon Design et al também apresentam recomendações sobre como incentivar a criatividade, a atividade física, a sustentabilidade, as relações com a comunidade entre outros aspectos possíveis de modificar as relações com a escola. Com essa abordagem o livro mostra iniciativas criativas de designers e arquitetos para estimular o ambiente de ensino. Kowatolski (2011) concorda que os projetos escolares devem ir além dos aspectos funcionais e estimular o ensino e aprendizagem mediante a orientação às propostas pedagógicas e às metodologias de ensino. Todavia, a autora destaca que os arquitetos não costumam se aproximar de estudos sobre como o ensino e a aprendizagem se dá, desvinculando, portanto, os projetos arquitetônicos das propostas pedagógicas. Embora não seja do escopo da atividade do projetista estudar estes processos a fundo, Kowatolski defende a interação entre Arquitetura e Edu-

65

cação, listando parâmetros e métodos de avaliação para aprimorar os projetos de espaços para escolas. Certo é que as instituições de ensino nem sempre possuíram a mesma forma espacial e organizacional. O historiador Philippe Ariès (1978) mostra que a vida escolástica se modificou bastante da Idade Média para a Idade Moderna. O autor destaca que num auditório medieval seria possível encontrar alunos de diferentes idades e diferentes graus de aprendizado. Posteriormente, na era moderna, são realizadas mudanças gradativas, separando primeiro os alunos em grupos de acordo com o grau de aprendizado, depois em salas específicas e, por fim, segundo as diferentes faixas etárias. Segundo Ariès, a própria noção de infância e adolescência se constitui juntamente com a diferenciação das diferentes etapas de ensino. Na escola moderna o enPUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

sino se torna mais extenso e subdivido, diferentemente da escola medieval, que reunia em um único curso os equivalentes dos ensinos primário, secundário e superior. Aliás, se a escola moderna separava os alunos em classes e em salas diferentes, as escolas medievais encontravam-se em condições diferentes, sem acomodações específicas dedicadas a ela: (…) A escola não dispunha então de acomodações amplas. O mestre instalava-se no claustro após livrá-los dos comércios parasitas, ou então dentro ou na porta da igreja. Mais tarde, porém, com a multiplicação das escolas autorizadas, quando não tinha recursos suficientes, ele às vezes se contentava com uma esquina de rua (…) Em geral, o mestre alugava uma sala, uma schola, por um preço que era regulamentado nas cidades universitárias. (…) Forrava-se o chão com palha e os alunos aí se sentavam. Mais tarde, a partir do século XIV, passou-se a usar bancos, embora esse novo hábito de início parecesse suspeito. (Ariès, 1978, p.166-167)

Outra mudança importante da transição da escola medieval para a escola moderna diz respeito à disciplina. Segundo Ariès (1978), há uma mudança da organização corporativa – gerida pelos próprios alunos e professores em confrarias e fraternidades, nas quais socializavam – que refletia o modelo medieval, para uma organização autoritária – gerida por uma hierarquia escolar – que refletia o absolutismo dos séculos XVI e XVII. O autor ressalta que uma das principais mudanças da escola medieval para a escola moderna se encontra na introdução da disciplina que no caso da Era Moderna institui uma a autoridade hierárquica e estabelece a vigilância interna e impõe às famílias “o respeito das pelo ciclo escolar integral” (idem p.191). O filósofo Michel Foucault (2007) também constata a importância da disciplina na constituição das escolas modernas, a partir dos séc. XVII e XVIII. No caso de Foucault, a disciplina constitui um de seus objetos de estudo e, segundo ele, um dos elementos que caracterizam as mudanças sociais naquele período. Na aná-

66

lise do filósofo, são apresentadas semelhanças disciplinares entre escolas, quarteis, hospitais e oficinas na constituição de uma sociedade disciplinar que se vê refletida numa nova instituição, as prisões modernas. Foucault reconhece que a disciplina não surge nos séculos XVII e XVIII, mas destaca que nesse período houve um aprimoramento minucioso nas técnicas disciplinares. Para o autor, tais técnicas fizeram que o poder disciplinar operasse de maneira tão difusa através de múltiplos sistemas que se tornaram imperceptíveis. Essa diferença é fundamental na análise do filósofo pois modifica um exercício explícito do poder para uma forma desapercebida e insidiosa, que ele compara com o nível subatômico, aquilo que chama de microfísica do poder. O regime disciplinar também passa controlar os corpos, como forma de torna-los dóceis e mais produtivos, contrariado uma tendência anterior caracterizada PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

pelos castigos físicos (Foucault, 2007). Com o zelo pela integridade física surge uma nova forma de regulação que se consolida pelos regimes disciplinares e que influencia a concepção e divisão dos espaços, dos tempos, das atividades e da composição dos grupos de pessoas. Como forma de apropriação dos corpos, a disciplina se utiliza destes elementos para separar, ordenar, organizar de modo a tornar os indivíduos mais dóceis e eficientes. Portanto, é a partir da perspectiva da disciplina que surgem as divisões do espaço escolar, os agrupamentos por idade, a classificação e separação dos indivíduos segundo diferentes critérios, o ensino por etapas e níveis de complexidade crescente, o estabelecimento de hierarquias, o isolamento físico das instituições, o controle e o ritmo das atividades etc. Foucault destaca que mediante uma regulação minuciosa, voltada aos detalhes, eram definidos os gestos, posturas, tempos e locais mais adequados para a execução mais rápida e econômica das atividades. Foucault fala das técnicas de controle dos corpos, dos gestos, das ações, do tempo, dos espaços, entre outros elementos, como forma de tornar os indivíduos mais dóceis e eficientes. Porém, é interessante mencionar que tais técnicas também levaram a um processo de individualização, desenvolvendo tecnologias como o exame e o quadriculamento que favoreceram o desenvolvimento das ciências humanas no século XIX e XX. Se, por um lado, a disciplina estabeleceu uma forma socialmente opressiva de controle, por outro lado ela introduziu uma série de questões referentes à singularidade, empregando técnicas de minúcia e individuação decisivos para o desenvolvimento da psicologia, pedagogia, psiquiatria e outras ciências. Nesse sentido, Foucault estabelece uma relação íntima entre poder e saber, pois argumenta que as formas de poder estabelecem novas possibilidades de conhecimento que, por sua vez, acabam reafirmando tais estruturas de poder.

67

A relação entre poder e saber é dinâmica e interdependente, sendo tratada por Foucault como um binômio “saber-poder”. Ele exemplifica essa relação com o papel das técnicas inquisitoriais nos séculos XII e XIII para o desenvolvimento das ciências da natureza:

Ora, o que o inquérito político-jurídico, administrativo e criminal, religioso e leigo foi para as ciências da natureza, a análise disciplinar foi para as ciências do homem. Essas ciências com que nossa ‘humanidade’ se encanta há mais de um século têm sua matriz técnica na minúcia tateante e maldosa das disciplinas e de suas investigações. Estas são talvez para a psicologia, a pedagogia, a psiquiatria, a criminologia, e para tantos outros estranhos conhecimentos, o que foi o terrível poder do inquérito para o saber calmo dos animais, das plantas ou da terra. Outro poder, outro saber. (Foucault: 2007, p.186)

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

É interessante observar que paralelamente ao processo de formação dessa sociedade disciplinar, há um processo de separação e especialização dos saberes que utilizam uma estratégia semelhante: separar, dividir e ordenar para controlar. De tal maneira, como afirma Sommerman (2006), as ciências passaram a se separar e especializar ao longo dos séculos XIX e XX chegando a um nível de hiperespecialização e fragmentação cada vez maior. Da visita as reflexões de Phillippe Ariès e Michel Foucault, vemos que Os reflexos do pensamento disciplinar vão além da epistemologia e das práticas institucionais e influenciam também as práticas profissionais na concepção dos espaços modernos. O planejamento urbano nos séculos XIX e XX busca disciplinar a cidade e torna-la mais eficiente como no caso de Paris por Haussmann (Figura 2-15), o Rio por Pereira Passos etc.. A Arquitetura moderna também planeja os ambientes de acordo com as funções (Figura 2-16 e Figura 2-17), seguindo a máxima “a forma segue a função”, formulada pelo arquiteto americano Louis Sullivan, em 1896 e que se tornou uma espécie de “mantra” funcionalista. O Design moderno, por sua vez, também segue esta tendência (Figura 2-18), seja na Hfg de Ulm onde o funcionalismo era a tônica, seja no discurso sobre o bom design de Dieter Rams. Os objetos pensados segundo essa abordagem devem se tornar eficientes, tanto em relação ao uso como em relação ao seu processo de produção. Mesmo o Design Gráfico foi profundamente influenciado ao tentar disciplinar a composição tipográfica mediante o uso da grid conforme advoga Josef Müller-Brockmann (Figura 2-19).

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

68

Figura 2-15 – A renovação de Paris no século XIX previa a setorização através dos arrondissements e o alargamento das ruas na forma de boulevards para maior controle das revoltas populares.

Figura 2-16 - Planta baixa do edifício e setores da Bauhaus em Dessau, 1926, mostra a divisão da escola projetada especialmente para o ensino de Design e Arquitetura.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

69

Figura 2-17 - Planejamento da cozinha eficiente, 1920, por Christine Fredericks, busca a organização racional e funcional para tornar as atividades mais eficientes.

Figura 2-18 - Bancos de Ulm, 1954, servem como estante e mesa de centro, projeto de Max Bill

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

70

Figura 2-19 – Os sistemas de grid (em vermelho), por Josef Müller-Brockmann, 1961, auxiliam a controlar a tipografia e impor uma ordem na composição da informação.

De acordo com Foucault, o poder disciplinar se manifesta de maneira insidiosa na sociedade. Os exemplos acima mostram como as técnicas de controle e a busca por eficiência das atividades permeou tanto os saberes como a sociedade e também seus espaços e objetos. A eficiência, nesse sentido, diz respeito a uma maneira específica de se cumprir as metas desejáveis, no melhor tempo possível, segundo os parâmetros de normalidade. O controle é realizado mediante um complexo sistema de exames, classificações, organizações, distribuições, punições e incentivos. A partir da disciplina, escola se constitui como um espaço à parte, uma instituição autônoma separada de outras atividades cotidianas. As atividades escolares se encerram dentro de uma lógica própria de maneira dissociada da sociedade, não que não possuas relações, mas estabelecem formas próprias. A análise das instituições é um dos temas trabalhados por Goffman (1961), em especial aquelas que se separam da sociedade. Em sua análise, Goffman (1961) argumenta que toda instituição traz para dentro de si um pedaço do mundo e ao mesmo tempo separa esse espaço da relação social através de barreira físicas como paredes, muros e portas. O autor faz uma crítica a esse modelo dizendo que toda instituição tem uma tendência ao "fechamento", pontuando-as como barreiras ao mundo externo, e encadeia seu raciocínio para assim chamá-las de instituições totais quando se refere a presídios, ma-

71

nicômios, internatos...enfim, instituições de isolamento social. O que salta aos olhos na argumentação do autor é o fato que ao se pensar o caso das escolas tratase da constituição de um espaço que tem como função a educação para vida segregar através de barreiras físicas ao invés de agregar os indivíduos e a sociedade. Juarez Dayrell (1996) confirma a maneira como o espaço da escola reflete a segregação da escola do cotidiano. Ao compreender a escola como espaço sóciocultural, ele afirma: O espaço é claramente delimitado, como que a evidenciara passagem para um cenário, onde vão desempenhar papéis específicos, próprios do "mundo da escola”, bem diferentes daqueles que desempenham no cotidiano do "mundo da rua". (Dayrell, 1996 p. 138)

Além da delimitação do espaço escolar e sua separação da sociedade, o autor PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

também relaciona a concepção do espaço a uma função pré-definida, às expectativas que guiaram o planejamento do espaço e a concepção educativa que se pretende expressar. Nas palavras de Dayrell: A arquitetura e a ocupação do espaço físico não são neutras. Desde a forma da construção até a localização dos espaços, tudo é delimitado formalmente, segundo princípios racionais, que expressam uma expectativa de comportamento de seus usuários. Nesse sentido, a arquitetura escolar interfere na forma da circulação das pessoas, na definição das funções de cada local. Salas, corredores, cantina, pátio, sala dos professores, cada um destes locais tema função definida a priori. O espaço arquitetônico da escola expressa uma determinada concepção educativa. (Dayrell, 1996: 147)

Em reação as determinações impostas pelo espaço e pela disciplina escolar, Dayrell argumenta que os alunos tendem a criar estratégias próprias para lidar com as aulas. Nesse sentido, “tendem a criar um mundo próprio, mais ou menos permeável, dependendo de cada professor e da relação que ele cria com a turma” (Dayrell, 1996: 157). A partir destas estratégias o autor entende que o comportamento dos alunos disciplinados e indisciplinados depende das relações inscritas na cultura escolar. Verónica Edwards (2003, p.31) sinaliza que o espaço e o tempo de aula são estruturantes, pois são definidos externamente, quer pelas disposições curriculares, quer pela arquitetura, impostos por alguém superior. Ainda que o espaço ganhe vida por meio das relações, usos e apropriações que lá ocorrem, há determinados elementos que escapam aos professores e alunos. Desse modo problematizar os aspectos materiais da sala de aula pode significar potencializar ou restringir as possibilidades de ação nas aulas. Apesar de alguns elementos estruturais do espaço de aula estarem fora do alcance do professor, ainda assim sua autoridade não se constitui apenas pelos conte-

72

údos que possui, mas por ser quem organiza a situação (Edwards: 2003, p.36). Com isso, o professor detém o poder de organizar e reorganizar o espaço e o tempo das atividades em sala de aula. Porém, este poder nem sempre é concedido aos alunos. Se o professor não pode definir as dimensões e características da sala de aula, assim como especificações da mobília e dos recursos disponíveis, ele pode, contudo, propor a organização e disposição dos elementos, estabelecer determinadas regras e usos. Dependendo da turma e do professor, será permitido ou não que os alunos troquem de lugar ao longo da aula, que se agrupem ou disponham as mesas em círculo etc. A definição do que é lícito ou não dependerá da autoridade do professor. Ao contrário de Foucault e Ariès, os trabalhos de Dayrell e Edwards tratam das escolas contemporâneas, e identifica neles a ação disciplinar. A autoridade e hierarquia se fazem presentes nas escolas mediante a disposição física: a escola esPUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

tabelece o espaço, o professor controla os usos e os alunos possuem suas ações restringidas. Qualquer alteração nessas disposições é considerada como uma atitude indisciplinada passível de sanções. A identificação com o espaço pode ser determinante nas relações de ensino e aprendizagem. Se um aluno não se sente pertencente a um determinado espaço, se não se vê representado nele e se não percebe que o espaço também lhe pertence, como pensar que tem a permissão para construir o “seu” espaço de aprendizagem? Ao contrário, as interferências no espaço costumam se dar de forma subversiva por meio de pichações ou depredação, como maneira de os alunos chamarem atenção para si por meio da indisciplina. Se, por um lado, aqueles considerados indisciplinados deixam sua marca na sala de aula por meio das pichações, por outro lado, uma das características dos alunos disciplinados é a de não deixar marcas naquele espaço. Contudo, se o ideal é não deixar marcas, vemos que o a sala de aula manifesta uma identidade imposta por uma autoridade e não pelo próprio aluno. Mesmo quando a interferência no espaço é admitida ou quando não existam instruções ou normas que a contrariem, existe uma dificuldade de se intervir nos espaços institucionais. Conforme apresenta a pesquisa conduzida por Guiford (1976), os alunos tendem a evitar mesmo pequenas mudanças no posicionamento do mobiliário ainda que para torná-lo mais confortável. Em um experimento, Guiford observou o comportamento de alunos universitários sujeitados a um espaço arrumado de maneira intencionalmente desconfortável. A pesquisa mostra que os alunos tendiam a preservar os arranjos pré-estabelecidos, ainda que bastante desconfortáveis, considerando que a havia um propósito para a sala estar arrumada daquela maneira. Como conclusão, o autor entende que havia uma tendência por parte dos alunos em se adequarem aos arranjos pré-determinados.

73

Guiford se refere ao fenômeno como a um “torpor ambiental” (environmental nubmness – que também serve de nome ao artigo), e argumenta que mesmo o incômodo, quando questionado posteriormente, passava despercebido pelos alunos. O autor também argumenta que, embora as pessoas tenham uma tendência a personalizar seus espaços privados, quando se trata de um espaço público ou institucional as pessoas tendem a manter a ordem presente. Portanto, Guiford argumenta que em espaços de uso partilhado e pré-determinado, as pessoas tendem a evitar a modificação dos arranjos e a ignorar o próprio desconforto. O espaço físico da PUC-Rio foi configurado nos anos 50, quando a universidade foi transferida para a Gávea, com a inauguração em 1955. O campus traz consigo a herança de um sistema político fundamentado pela autoridade e pela hierarquia. Vale lembrar que a PUC-Rio surgiu na década de 40 durante o Estado PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Novo, e o novo campus foi aprovado durante o segundo mandato de Getúlio Vargas, falecido um ano antes da inauguração. A ditadura da era Vargas ainda era uma lembrança recente. Além disso, como instituição católica e pontifícia, devemos considerar os diferentes níveis de autoridades presentes na igreja como o papa, os cardeais, arcebispos, bispos, padres entre outros. Nesse sentido, há, uma sujeição à organização hierárquica que se vê refletida na estrutura administrativa da universidade, submetida por um lado às normas nacionais e, por outro lado, à igreja católica. O estatuto da universidade (PUC-Rio, 2001) esclarece que o Arcebispo da região é também Grão-Chanceler da universidade que, dentre as atribuições está a indicação do Reitor da universidade. O Reitor, por sua vez nomeia o Vice-Reitor e os ViceReitores setoriais e assim sucessivamente. À época da constituição do campus, o modernismo arquitetônico se manifestava como tendência nas novas edificações. Conforme descreve Sudsilowsky (2003 p.72), o modernismo na década de 40 assume uma presença pronunciada, principalmente nas edificações públicas, passando a ser associado com a noção de brasilidade. Também segundo o autor o modernismo brasileiro continua em ascensão até a década de 60, com seu ápice na concepção de Brasília, seguido pelo declínio. No modernismo arquitetônico, conforme apresentado anteriormente, há uma predominância da racionalidade como força organizadora que rege a concepção dos espaços. Essa organização alia-se ao funcionalismo, ou seja, a valorização das função que o espaço se destina. Portanto o modernismo rejeita os ornamentos de uma arquitetura orientada à estética e à distinção para assumir formas mais simples e adequadas aos propósitos de uso. Conforme nos lembra Sudsilowsky, a arquitetura moderna não intencionava à reprodução das hierarquias. Segundo o autor, a abordagem da função objetiva privi-

74

legiava a organização dos espaços como forma superação das hierarquias de classes (SUDSILOWSKY: 2003 p.66). Não por acaso, a maioria dos regimes totalitários, como o nazismo, tentaram banir a arquitetura moderna. Além disso, diversos arquitetos modernistas tinham orientação comunista, e associavam a proposta moderna a um projeto de sociedade, como exemplo no país temos Oscar Niemeyer. Todavia, devemos considerar pensar quais funções eram essas imaginadas para uma universidade. As maneiras como se pensava o ensino eram ainda bastante influenciadas pela perspectiva da autoridade. Portanto, ainda que se privilegiasse a função e se aspirasse à redução das hierarquias sociais, o momento histórico definia uma concepção de ensino específica. Os dois maiores edifícios da PUC-Rio, o edifício Cardeal Leme (inaugurado em 1955) e o Edifício da Amizade (Ala Kennedy inaugurada em 1965 e a Ala PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Frings em 1967) foram concebidos segundo parâmetros modernos. A presença dos Pilotis, estrutura tipicamente moderna, revelam o caráter moderno dos edifícios. Defendidos pelo arquiteto modernista Le Corbusier, a estrutura de Pilotis separa os edifícios do solo, e abre um espaço semi-público e de convivência (Lúcio Costa, apud Sudsilowsky, 2003, p.68). Porém, não é o piso térreo que devemos observar para inferirmos às concepções de ensino. As salas de aula da PUC-Rio naqueles edifícios, até a década de 80 apresentavam tablado de madeiras na sala que colocavam os professores num patamar mais alto, enfatizando sua autoridade. As carteiras (cadeiras com prancheta acoplada) individuais eram organizadas em fileiras voltadas para o quadro. A sala, isolada térmica e acusticamente do redor, separava as salas de aula dos acontecimentos ao redor. Ou seja, apesar de uma proposta arquitetônica com aspirações à mudanças sociais, a organização racional e funcional dos espaços de aula reforçam o controle disciplinar e a manutenção da autoridade dos professores. Se, não atende aos ideais modernos, atendia ao menos à concepção de ensino e à estrutura hierarquizada presente na igreja e na administração da universidade. Vale lembrar que não apenas de edifícios modernos se constitui o campus da PUC-Rio. Há a convivência de diferentes estilos arquitetônicos e concebidos em diferentes momentos históricos, como o Neoclássico (Solar Grandjean de Montigny) e contemporâneos (Tendas, IMA). A convivência de espaços com características múltiplas é uma condição estruturante do espaço da universidade e que ao longo dos anos vem sendo alterado, seja mediante reformas ou novas edificações. Felizmente, os tablados de madeira foram recolhidos, e hoje alguns deles foram incorporados como bancos coletivos na Barraca. Porém, ainda hoje notamos alguns resquícios desse legado disciplinar na constituição de diversas salas de aula

75

no campus. As carteiras de madeira estão presentes e enfileiradas em algumas salas do edifício Cardeal Leme, duras, desconfortáveis e limitadoras da mobilidade, como pude presenciar durante algumas aulas do doutorado. O espaço e os recursos materiais de que a universidade dispõe são limitados por diversas questões, dentre elas destaca-se as de ordem financeira. Se trocar todo o mobiliário das salas já envolve custos, quanto mais construir um novo edifício. Além disso existem restrições impostas pelo município quanto a construção de novos edifícios no campus, o que inviabiliza sua expansão e limita o uso do espaço físico. É certo que, embora o projeto pedagógico do curso não tenha se detido na questão do espaço físico, na comparação com outros campos de conhecimento que se alojam na universidade, podemos observar uma grande diferença entre os espaços ocupados por alunos de Design e de outros cursos. Os laboratórios construídos PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

em espaço próprio possuem configurações diferentes das salas de aula convencionais, as tendas e a barraca também. Contudo, as limitações de espaço inerentes a universidade acabam por inviabilizar a manutenção do pensamento de que o espaço participa das interações, pois muitas das aulas de projeto precisam ser alocadas em salas com estruturas diversificadas, porém não pensadas para o favorecimento e a potencialidade da disciplina de projeto, disciplina esta que se constitui como disciplina espinha dorsal do curso. Com isso, ao se abordar a construção do ambiente apenas por parâmetros, projetos, métodos e teorias pedagógicas definidas pela instituição e não pelos projetos pedagógicos dos cursos, corre-se o risco de se abstrair as formas de ocupação e usos destes ambientes. Isso implica em tratar a função do edifício apenas pelos aspectos mais elementares, desconsiderando as interações que ocorrem nos espaços. Como consequência, pode-se reforçar a perspectiva disciplinar mediante os princípios de ordenação, organização, quadriculamento e exame característicos do poder disciplinar, estimulando uma prática que afirma a separação entre os saberes. Em síntese, entendemos que a saída para esta situação está relacionada ao trabalho, observação e avaliação dos projetos junto ao público (professores, alunos e comunidade). Seja a incorporação de dados e necessidades do público dentro do escopo do projeto antes da execução, seja mediante avaliações sistemáticas e consultas ao públicos após a execução. Em ambos os casos, as experiências e práticas dos agentes é fundamental, pois como aponta Kowatolski (2011, p.211), as dinâmicas sociais definem novos parâmetros curriculares e necessidades de projeto. 2.3

Conclusões do capítulo

A PUC-Rio é uma instituição de ensino privada e filantrópica de valores humanistas. Ela se destaca tanto nos campos do ensino, como na pesquisa e extensão e admite

76

alunos de diferentes classes sociais mediante seu programa de bolsas. Em acordo com essa perspectiva humanista, o Departamento de Artes e Design orienta-se pelas relações com a sociedade e tem como orientação a abordagem do Design em Parceria. Esta prática, desenvolvida por alguns professores do DAD contribui para a concepção de design que guia a organização do curso e sua definição curricular. O currículo vigente do curso de Design é fruto de uma reformulação feita em 2007, que não apenas reafirmou a importância da disciplina de projeto como espinha dorsal do curso, como também expandiu a carga horaria das disciplinas e alterou os seus formatos, acrescentando os conteúdos às aulas de projeto. A nova proposta valoriza a interdisciplinaridade, pois admite diferentes conteúdos de diferentes áreas, como Antropologia, Redação, Técnicas de Pesquisa, Desenho, Logística entre outros (ver tabela) como conteúdos vinculados às disciPUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

plinas. Além disso, a proposta oferece aos alunos o contato com diferentes professores de formações diferentes para o ensino destes conteúdos. Do mesmo modo que o departamento como um todo, as salas de aula destinadas a projeto encontram-se em locais distintos do campus da universidade com características e recursos materiais diferentes. A localização das salas dispersas pelo campus aproximam fisicamente os alunos de outros departamentos e os leva a frequentar diferentes locais. Todavia, o deslocamento não é visto, necessariamente como algo bom, as opiniões quanto a isso divergem. Não considerei aqui os aspectos estéticos dos edifícios, nem questões à aparência e seu impacto na empatia dos alunos. Entretanto, no que tange à infraestrutura é possível notar que as condições espaciais e materiais referentes à localização, formato, acesso, qualidade de iluminação, do ar, de temperatura, sonora e os recursos de cada sala potencializam práticas diferentes. Como referencial teórico Foucault (2007) e Ariès (1978), foram fundamentais para o entendimento da disciplina dos corpos e a constituição dos espaços e Dayrell (1996),Edwards (2003) Kowatolski (2011) contribuiram para o entendimento da relação entre arquitetura, práticas de ensino e aprendizagem e projeto pedagógico. A partir deste referencial, observamos que a relação entre os espaços de ensino e as instituições sociais refletem aspectos ideológicos que determinam sua configuração. Vimos também que a arquitetura e o design moderno valorizam a função e a racionalidade, na concepção dos espaços e objetos e que, aplicados aos espaços de ensino, reforçam a lógica disciplinar de separação, organização funcional e hierárquica. Dessa maneira, a herança arquitetônica da PUC-Rio reflete sua forma de organização administrativa que segue um sistema hierarquizado como o da Igreja. Assim, o espaço da universidade estrutura as relações de ensino e aprendizagem

77

em determinados espaços do campus, seguindo uma orientação racional, funcional que valoriza a autoridade e hierarquia. Todavia, em meio às diferentes salas, equipamentos, recursos materiais e arranjos possíveis, ocorrem aulas de projeto, com suas dinâmicas específicas. O espaço e os recursos não estão desvinculados das ações, por isso cabe compreender as atividades que ocorrem nas aulas e os usos conferidos ao ambiente de ensino. Portanto, reconhecendo a importância de se investigar as práticas de ensino e aprendizagem em relação aos ambientes de ensino, propomos com essa pesquisa conhecer as interações dos sujeitos com os espaços e recursos materiais. Para isso consideramos as relações na sala de aula de projeto e a perspectiva dos alunos em relação ao assunto. Nesse sentido, o próximo capítulo apresenta a descrição de duas disciplinas PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

de projeto, enfatizando os aspectos espaciais e materiais presentes nas salas. A partir da observação participante, a descrição pretende ilustrar a diversidade de práticas em sala de aula e a maneira como participam do processo de projeto.

3 Desenho de observação: ambientação e interações no espaço de sala de aula

Neste capítulo buscarei expor aspectos relativos a observação de campo, realizada em duas salas de aula de projeto do curso de graduação em Design da PUC-Rio, ocupadas por turmas das disciplinas DSG1002- Projeto Básico Planejamento e DSG1005 Projeto Avançado Produção e Distribuição. Enfatizo, na observação, as atividades de-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

senvolvidas, as interações entre os sujeitos e os usos tanto do espaço físico quanto dos objetos e dos recursos durante as aulas de projeto das disciplinas. Parto, inicialmente, da descrição das salas de aula e dos processos de projeto desenvolvidos nas disciplinas, Descrevo algumas atividades desenvolvidas a partir de uma aula padrão de cada disciplina. Faço uma breve análise sobre as relações entre os sujeitos ocorridas durante as aulas padrão. Listo alguns aspectos relativos as atividades paralelas que ocorrem nas salas de aula, de maneira a entender como se dão as relações para, finalmente, trazer algumas reflexões e uma síntese do capítulo. Antes de proceder à descrição, apresento alguns aspectos acerca das escolhas efetuadas que orientaram a observação de campo. Conforme apresentado no capítulo anterior, resolvi investigar disciplinas de projeto do currículo de 2007 do curso de Design da PUC-Rio mediante a observação participante. Levantei então o ementário das disciplinas de projeto, disponíveis no site da universidade, pois como pretendia consolidar uma observação que me viabilizasse um panorama geral dos sujeitos na relação com o espaço físico, as atividades, interações e os usos de materiais e recursos, entendi ser prioritário não focar a observação em uma única habilitação (Comunicação Visual, Projeto de Produto, Moda ou Mídia Digital) do curso de graduação em Design da PUC-Rio. Descartei, por isso, a possibilidade de acompanhar qualquer projeto específico, pois o currículo de 2007 apresentava seis disciplinas de projeto que contemplam alunos das quatro habilitações e duas disciplinas de projeto restritas a habilitações específicas Essa escolha me abriu a possibilidade de examinar os projetos comuns entre as diferentes habilitações, o que me beneficiaria ao tentar compreender as questões do estudo não em relação à um campo específico, mas a práticas comuns em diferentes subáreas de atuação. A opção pelo projeto DSG1002 (Planejamento) ocorreu pelo fato dele se encontrar em um momento intermediário do nível básico do curso e por considerar que se,

79

por um lado, não quis observar alunos mais familiarizados com o campo do Design, por outro lado, não quis que estes alunos não possuíssem familiaridade alguma. Imaginei que, na disciplina intermediária, me precaveria dos excessos ou da escassez de dúvidas por parte dos alunos sobre a metodologia projetual enfatizada nos projetos básicos (com ênfase no Design em Parceria), em relação à explicitação das etapas. Também pesou na decisão saber que uma das professoras do projeto DSG1002 seria a pesquisadora Rita Couto, cujas pesquisas tratam do ensino da disciplina de projeto, da prática e conceituação do Design, das relações entre Design e interdisciplinaridade e de outros aspectos relativos à pedagogia do Design. A oportunidade de poder ver a prática docente de uma pesquisadora sobre o tema influenciou na escolha da disciplina e da turma a ser observada. A opção pelo projeto DSG1002 acabou influenciando na escolha também PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

por um projeto avançado 1005 (Produção e Distribuição intermediário. Embora os projetos avançados do curso (DSG1004, DSG1005 e DSG1006 ) possam ser cursados em qualquer ordem a partir do quarto período letivo, os alunos tendem a optarem pela ordenação sequencial, levando o projeto DSG1005 a ser cursado prioritariamente entre o DSG1004 e o DSG1006, tornando-se também um projeto intermediário, contudo de nível avançado. Influenciou também na decisão pela escolha do projeto DSG1005, o fato de o professor Marcelo Fernandes Pereira ser, naquele momento, um dos professores mais experientes dos projetos avançados no currículo de 2007. Enquanto outros professores começavam na disciplina naquele momento, em virtude de o currículo estar em implantação, o professor Marcelo já estava em seu terceiro semestre letivo como professor de turma da disciplina. Além disso, a professora Roberta Portas, sua dupla na disciplina, era a supervisora daquele projeto, o que poderia facilitar na compreensão da ênfase específica do projeto DSG1005. A partir das escolhas apresentadas, fui à campo acompanhar as aulas de projeto vinculadas as disciplina-turmas. Assim, entre março e julho de 2009, observei uma turma do projeto DSG1002 e, entre agosto e dezembro do mesmo ano, observei uma turma do projeto DSG1005. O resultado das observações é discutido nesse capítulo e posteriormente retomado no quinto capítulo. 3.1

Escolhas e informações acerca das observações

Cada uma das disciplinas dura um semestre letivo e possui de 6 a 8 turmas de 20 alunos cada. Além dos professores regentes da disciplina, há outra modalidade de professores que compõem a carga horária semanal de 10 horas das turmas. Eles são denominados professores de conteúdo e são responsáveis por ministrar conteúdos teóricos, práticos e teórico-práticos em períodos de tempo menores, atenden-

80

do a briefings . desenvolvidos pelos supervisores das disciplinas. A estrutura das disciplinas faz com que os professores regentes e os de conteúdo distribuam-se entre as 10 horas semanais destinadas as aulas da disciplina, o que traz a situação peculiar de nenhum professor ter participar integralmente das dez horas destinadas a disciplina, sendo esta uma realidade limitada aos alunos e monitores.Com isso, professores regentes e de conteúdo vivenciam parte das práticas de ensino e aprendizagem enquanto alunos e monitores vivenciam o todo das práticas. Esclareço que quando me refiro a uma turma observada na sala de aula, há uma imprecisão do ponto de vista administrativo no emprego do termo, pois cada sala de aula é ocupada por duas turmas, cada uma com seu respectivo professor e com pautas de notas e frequências separadas. Contudo, insistirei em me referir a uma turma, não a duas, pois na prática das relações de sala de aula essa distinção PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

não foi perceptível. Primeiro, porque não houve distinção dos alunos entre si tanto nas interações, quanto na formação dos grupos de trabalho. Segundo, porque também não houve distinção por parte dos professores, que atenderam, orientaram e avaliaram os alunos, independentemente de constarem ou não em sua pauta específica. Da mesma forma, considerei irrelevante distinguir à qual pauta determinado aluno pertencia e quem era seu professor, optando por me referir à turma como o grupo de alunos que interagiam naquele espaço, considerando as relações tanto entre alunos como entre aa dupla de professores e entre alunos-dupla de professores. As disciplinas possuem uma carga horária total de 150 horas semestrais, dentre as quais 55 horas (cerca de 36%) cabem aos professores regentes das disciplinas e as demais (cerca de 64%) são distribuídas entre os diversos professores de conteúdo. Embora a maior carga horária seja a dos conteúdos (quase o dobro da carga dos professores regentes), vale lembrar que a carga total é dividida entre diversos professores ao longo do semestre. Portanto, cada professor de conteúdo, individualmente, permanece com a turma em um número inferior a 20 horas (13%) semestrais. Como os professores de conteúdo alternam-se entre si ao longo do período, cabe aos professores regentes acompanharem o processo de conceituação, desenvolvimento, finalização e experimentação dos projetos do início ao fim. Por esse motivo, optei por me concentrar nas relações entre os professores regentes da disciplina e os alunos, embora também tenha observado as aulas ministradas pelos professores de conteúdo. Além disso, foi importante para a escolha a consideração de que os professores regentes da disciplina são responsáveis pelo peso maior de pontuação na avaliação dos projetos dos alunos e por assumirem o papel de orientadores dos alunos no desenvolvimento dos projetos ao longo da disciplina. Penso que a avaliação constitui um aspecto importante a ser observado, uma vez que

81

possui o potencial de gerar conflitos entre as cobranças dos professores e o empenho e as expectativas dos alunos. As observações de campo ocorreram mediante o acompanhamento regular das aulas. Ao longo das observações assistia às ações (falas, atividades) dos professores e dos alunos; observava a dinâmica das aulas ; comentava ou opinava sobre determinado tópico e também sobre as apresentações desenvolvidas pelos alunos de seus projetos quando convidado; assistia às apresentações e avaliações. As observações de campo foram registradas em um caderno, que foi inspirado no caderno de projeto que era utilizado pelos alunos nas disciplinas em observação. Nele anotava situações na sala de aula, desenhava determinadas cenas e atividades, copiava certas informações escritas nos quadros e registrava algumas opiniões, chamando atenção para alguns eventos ocorridos na aula. Os registros mais coPUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

muns descreviam as atividades ocorridas na aula dos professores regentes e nas aulas dos professores dos conteúdos, os tipos de recursos utilizados e algumas impressões pessoais sobre os eventos. Estes registros foram revisados e digitados posteriormente, organizados de acordo com a ordem cronológica em que ocorreram.. Em alguns momentos, também utilizei uma câmera fotográfica para registrar atividades e comportamentos. Privilegiei o uso do caderno como meio de registros de maneira a facilitar minha interação com os alunos. Sabendo de antemão que já estariam familiarizados com a prática do estudo de campo e do uso do caderno, supus que, ao possuírem um objeto em comum, ele agiria como um facilitador para a observação participante. Considerei também que minha interferência seria mais discreta, no sentido de menos invasiva, do que, se por acaso optasse pelo registro constante através de fotografia ou vídeo. As anotações ocuparam dois cadernos de 96 folhas e trouxeram as notas mais pontuais sobre as atividades transcorridas. A finalidade destes registros foi a de obter descrições sucintas para que me lembrasse das aulas, porém elas não me ofereciam uma documentação específica acerca dos discursos e depoimentos dos alunos e professores, devido à impossibilidade de fazer o registro no caderno durante a dinâmica das aulas. Como o fato de estar presente nas aulas foi um dos aspectos fundamentais da coleta de dados, boa parte das informações provenientes das interações não foram anotadas no momento, mas recuperadas posteriormente. Nesse sentido, o registro de imagens também auxiliou a lembrar dos eventos. Como opção metodológica, a observação participante envolve registros feitos no local, como também anotações feitas posteriormente no diário, uma vez que a participação em determinadas situações impede o pesquisador de registrá-las imediatamente. Conforme ressaltam Christian Laville e Jean Dionne (1999), a observação

82

participante deve ser metódica apesar de muitas vezes não ser possível ao pesquisador tomar notas durante a observação. Neste caso, o pesquisador “fia-se sobretudo em sua memória e em seu senso da disciplina que o impelem a redigir uma exposição detalhada uma vez concluída a observação” (LAVILLE & DIONNE: 1999, p.180). Além da memória, o antropólogo Roberto Cardoso de Oliveira (1998) também destaca a importância da vivência como um dos valores epistemológicos da observação participante. Segundo ele, os registros de campo servem como forma de rememorar a vivência do pesquisador, durante o exercício interpretativo da escrita, quando este já não está mais imerso no cotidiano observado. Além disso, o autor afirma que sem a vivência, os dados em diários e cadernetas não se tornariam inteligíveis para o pesquisador. No caderno de anotações, além das observações registradas via texto verbal, PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

também utilizei o texto visual. Os registros, por meio de desenhos, foram feitos de modo a complementar as informações anotadas verbalmente no caderno. Empreguei os desenhos quando pretendia recuperar a disposição dos alunos e professores no espaço físico, suas posturas corporais, o espaço físico da sala de aula em si e também como uma maneira de descrever objetos singulares criados pelos alunos para o desenvolvimento de seus projetos. Diferentemente dos registros fotográficos, os desenhos tomam algum tempo para sua confecção, portanto ocorreram em momentos pontuais da aula, especificamente nas situações que considerei extraordinárias ou representativas do cotidiano. Por esse motivo, entendo que o uso dos desenhos foi descritivo, mas ao mesmo tempo interpretativo, uma vez que o ato de desenhar implica uma evidente atitude seletiva diante do objeto observado. Não quero dizer com isso que as anotações verbais sejam mais descritivas e objetivas por essência, pois tenho claro que o uso da língua também envolve escolhas relativas ao uso dos termos e à maneira de narrar, mas que tendo a perceber as operações seletivas com mais nitidez no ato do desenho, talvez por sua relação de semelhança com a cena observada e suas especificidades, em comparação à abstração das palavras que às vezes permitem menos especificidade.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

83

Figura 3-1 – Registros verbais e visuais no caderno de anotações

Os registros fotográficos foram feitos em momentos mais específicos, como por exemplo, em datas de avaliações, especialmente pela intenção de manter uma coerência com os métodos também empregados pelos alunos, especialmente como verificaria no projeto básico DSG1002, que privilegia o desenho em uma primeira etapa da disciplina, mas que, em uma segunda etapa, passa a admitir o uso de fotografias. Já durante a observação do projeto avançado DSG1005, senti-me mais à vontade para fotografar as aulas desde o início do semestre letivo, pois percebi que o próprio professor também tirava fotos com seu celular ao longo das aulas e os alunos se mostravam mais afeitos ao uso de diferentes tecnologias, como laptops, ipods e smartphones. Isso me permitiu fotografar situações fora dos momentos de avaliação, e conduziu a uma diferença entre a quantidade de desenhos e fotografias entre os dois projetos observados. Ao total, foram registradas 120 imagens, sendo 64 da disciplina DSG-1005 (3 desenhos e 61 fotografias) e 56 da disciplina DSG1002 (13 desenhos e 43 fotografias). A variação da quantidade de fotografias e desenhos entre uma disciplina e outra se deve às diferenças de receptividade das disciplinas ao uso da máquina fotográfica ou do desenho. Portanto, no projeto básico a quantidade de desenhos realizados foi superior ao do projeto avançado, enquanto em relação às fotografias ocorreu o inverso.

84

3.2

As etapas de um projeto

O processo de projeto durante as aulas são extensos, complexos e variados de acordo com a situação e com a especificidade da disciplina. A experiência observando duas disciplinas distintas mostrou que há abordagens diferentes na maneira de conduzi-las, como há também aspectos variáveis que interferem nas práticas de ensino aprendizagem, pelo elenco de professores e alunos, tema ou métodos empregados, dificuldades e facilidades da turma, rigidez dos professores entre outros fatores. Portanto, ao descrever o processo geral das aulas de projeto incorro em generalizações, ciente de que alguns aspectos poderão variar de acordo com a disciplina ou mesmo dentro de uma mesma disciplina quando considerando as especificidades de suas turmas.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Além disso, devo considerar que as disciplina também podem ser reformuladas quanto às dinâmicas, métodos e propostas, pois o currículo define apenas as diretrizes. As mudanças podem ser conduzidas por professores e supervisores de disciplina mediante as experiências em que houve mais ou menos êxito. É o que ocorreu, por exemplo, com a disciplina DSG1002, que no semestre posterior à minha observação teve sua proposta modificada, a ponto de desde 2010 funcionar numa dinâmica bastante diversa daquela observada em 2009. Contudo, conforme argumentei ao tratar do currículo, no capítulo anterior, existem aspectos, etapas e dinâmicas que são comuns às diferentes turmas e disciplinas e que servem para proporcionar um panorama sobre o que consiste as aulas de projeto. Portanto, ciente desses pontos de convergência, mas também das limitação quanto as generalizações, pretendo, a seguir, apresentar algumas etapas comuns do processo de projeto das disciplinas do curso de Design da PUC-Rio. As etapas listadas abaixo foram nomeadas segundo alguns termos comumente empregados ao longo das aulas. Devo enfatizar que os termos foram observados em uso nas salas de aula e sua definição compreendida mediante a atuação dos alunos e minha própria experiência, sem, contudo, ancorar-se dentro de uma ou outra proposta metodológica formalizada. Devo ressaltar, ainda, que os termos utilizados são abrangentes e não encerram uma metodologia de design específica. A esse respeito, a tese de doutorado de Ana Verónica Pazmino (2010) explicita que não há um único modelo metodológico para projeto de produtos e tampouco há um único modelo que seja mais adequado ao ensino do Design. A autora defende que os alunos devem ser apresentados aos diferentes métodos para que suas opções metodológicas sejam realizadas de forma mais consciente.

85

Pazmino lista diferentes modelos metodológicos que variam em complexidade e em números de fases. A autora observa (2010, p.174) que não há um consenso acerca do número de fases nem dos termos empregados para denominá-las. Todavia, ela percebe que existem fases comuns que compreendem o planejamento, análise, síntese e criatividade e síntese: Dessa forma é importante que o aluno inicie o processo com o planejamento do projeto (planejamento); e depois continue com as outras fases como: projeto informacional (análise); projeto conceitual (síntese e criatividade); projeto detalhado (síntese). Cabe também ao docente diferenciar entre metodologia de projeto e metodologia do ensino. (PAZMINO, 2010, p.175)

Consideramos pertinente destacar que algumas abordagens de projeto partem da avaliação dos produtos e análise dos usos, com o intuito de promover o aperfeiçoamento ou mesmo um novo projeto considerando a partir de situações de PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

interaçào. Ainda assim, é possível enquadrar essas abordagens nas etapas de planejamento e conceituação. A síntese de Pazmino sobre as fases de projeto me permitiram traçar um paralelo aos termos empregados em sala e compreender as etapas do desenvolvimento das disciplinas na maneira a seguir: 3.2.1

Planejamento

Nas primeiras aulas os professores regentes se apresentam e apresentam o curso. Nesse momento falam sobre os objetivos da disciplina, apresentam sua ementa, explicam as avaliações e discorrem sobre conteúdos da disciplina e suas etapas. Também delimitam as normas específicas do funcionamento da disciplina, apresentando o cronograma-calendário das aulas com os conteúdos distribuídos entre os professores regentes e os professores de conteúdo e com os momentos-chave do projeto e de avaliação enfatizados. As normas englobam à maneira como os alunos irão se agrupar: se em duplas ou grupos maiores; se poderá haver trabalho individual ou não; e quais as funções, se houver, os integrantes assumirão no grupo de trabalho. Algumas restrições quanto ao agrupamento também podem ser sugeridas, como por exemplo, de grupos de pessoas do mesmo sexo ou de pessoas já conhecidas. O trabalho em grupo predomina na maioria das disciplinas de projeto, desencorajando-se o trabalho individual durante todos os projetos básicos e avançados. Algumas disciplinas definem um tema como eixo do projeto, o que consiste em outra norma. Antes de iniciar o semestre, o grupo de professores regentes interage com o supervisor da disciplina para definirem um tema amplo ou uma situação horizonte para ser desenvolvido na disciplina pelos alunos através de seus projetos de diferentes manei-

86

ras. Alguns temas já apresentados foram: saúde, poluição, obesidade, Fashion Rio, médicos sem fronteira, transporte público. A partir do conhecimento das normas, os alunos passam a formar seus grupos, que tendem a seguir juntos até o fim da disciplina. Normalmente é a partir da formação dos grupos que o trabalho de projeto se inicia. 3.2.2

Conceituação (levantamento e análise)

Nas disciplinas em que há um tema proposto, os grupos de aluno costumam se mobilizar inicialmente para pensar que aspecto do tema irão tratar. Os temas admitem uma série de abordagens e possíveis produtos, portanto os alunos tendem a direcionar os temas segundo seus próprios interesses. Um aspecto que varia de acordo com a disciplina diz respeito à coleta de daPUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

dos para o projeto. Em algumas disciplinas os alunos devem ir à campo realizar observações, em outras podem empregar pesquisa bibliográfica, e há disciplinas em que a coleta admite a combinação de técnicas. O levantamento de dados é empregado de forma a reunir informações acerca do problema de projeto ou da oportunidade de projeto. As informações são analisadas por alunos e professores e a partir dela são elaboradas algumas hipóteses de ação contemplando determinados aspectos acerca do problema. Após o levantamento, os alunos definem o objetivo de projeto, às vezes manifestado mediante o briefing (resumo das informações contendo a proposta e os objetivos do projeto). Normalmente, a abordagem das disciplinas leva os alunos a não conhecerem de antemão os produtos que irão desenvolver. Sejam eles objetos bi ou tridimensionais, digitais, peças de vestuário, sistemas de informação, ou serviços, os produtos dos projetos costumam ser definidos ao longo do processo. Nesse sentido, os alunos costumam ser incentivados a não pensar a partir do objeto (“vou fazer um site”) , mas do problema (“como comunicar algo a um público”). Nas abordagens que consideram a observação, em especial o design em parceria, o produto será pensado somente após uma série de procedimentos e técnicas de maneira a levar o aluno a contextualizar o grupo social e, na interação com ele, conceituar um objeto que atenda ao grupo. As técnicas e procedimentos são desenvolvidos ao longo de etapas bem delimitadas que guiam o planejamento e o desenvolvimento dos projetos. Nas abordagens que não empregam a observação, há uma variedade de maneiras de coletar dados empregada: textos e livros, levantamento de imagens, análise de projetos similares, entrevistas e questionários, entre outras, que permitem aos alunos se aproximarem da situação. As técnicas e procedimentos não

87

são desenvolvidos em etapas pré-estabelecidas e os alunos possuem maior autonomia para conduzi-las. Depois que os alunos definem o conceito do projeto, isto é, a ideia central, o problema que abordarão, eles passam a construir suas hipóteses de solução para o problema elaborado. 3.2.3

Geração de alternativas (síntese e criatividade)

A geração de alternativas corresponde à fase onde já se tem um objetivo claro, mas em que ainda não há uma definição para o produto. A indefinição do produto nessa fase vai depender de como foi elaborada e direcionada a etapa de conceituação. Em alguns casos, o aluno pode não se saber se a solução será um objeto ou serviço. Em outros casos, a indefinição pode ser apenas à respeito da forma final do PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

produto, como a forma e as cores de uma marca. Uma das técnicas desenvolvidas na geração de alternativas é o brainstorming, uma técnica de livre associação de palavras, desenhos ou propostas sem que haja qualquer tipo de censura ou restrição. Após o brainstorming é que se avalia a pertinência e viabilidade das propostas. Outra técnica na geração de alternativas, em especial no design em parceria é a experimentação a partir de experimentos. A técnica consiste em elaborar objetos e propostas distintas, sem um acabamento refinado, com o objetivo de levar ao grupo social e observar os usos dos objetos. Após os experimentos, avalia-se o sucesso de cada isca, de maneira a compará-las e definir melhor a hipótese de trabalho. Após as primeiras alternativas, os alunos passam por um processo de análise e seleção que delimita melhor o caminho percorrido. A etapa de geração de alternativas pode variar quanto à duração e as técnicas e procedimentos podem ser repetidos várias vezes até que se defina um partido. O partido é uma hipótese de projeto mais elaborada, que concilia as alternativas com o conceito e possui algumas definições formais mais delimitadas. Na etapa de adoção do partido, os alunos definem seus produtos a partir de características gerais. O rumo do projeto torna-se mais claro e a partir de então os alunos concentram-se nos aspectos técnicos, produtivos e relativos ao acabamento dos produtos. O desenvolvimento do partido consiste numa forma de geração de hipóteses variando aspectos específicos do produto como por exemplo as combinações de cores, o posicionamento dos elementos, as formas etc. O processo de variação dentro do partido orienta as escolhas dos alunos por determinados aspectos em função de outros.

88

3.2.4

Detalhamento (síntese)

A etapa de detalhamento corresponde a um momento final no desenvolvimento do partido, quando as características técnicas e de produção passam a ser definidas. Nesse momento, são concebidos os protótipos, ou seja, os modelos funcionais, produzidos com os materiais e funcionalidades que o objeto final deverá possuir, sem necessariamente o mesmo processo produtivo. No detalhamento as formas finais dos produtos, cores, processos são definidas e o produto é detalhado de modo que possa viabilizar sua produção. No caso de projetos de serviços, os procedimentos, etapas, custos, protocolos de comunicação entre outros aspectos são especificados. Normalmente é na etapa de detalhamento que os alunos realizam a docu-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

mentação do projeto. A documentação ou especificação corresponde ao registro dos aspectos técnicos do produto, normalmente incorporada ao relatório. Nem todos as disciplinas demandam testes de uso no processo de projeto, mas nas abordagens que utilizam o design em parceria esta etapa torna-se obrigatória. Os testes, ou experimentação final consistem em levar o protótipo e observar e avaliar o seu uso junto a um intercessor, um grupo social ou um usuário. Neste caso, considera-se tanto o parecer do representante em questão, como dos alunos que desenvolveram o projeto 3.3

A atuação dos professores

As diferentes etapas do projeto costumam ser conduzidas pelos professores regentes. Nesse sentido, mediante explicações voltadas à turma ou orientações aos grupos, os professores regentes da disciplina acompanham o processo percorrido pelos alunos e o desenvolvimento das etapas. O acompanhamento dos professores regentes é sistemático e a avaliação costuma contemplar não o resultado do produto desenvolvido, mas o desempenho no processo como um todo. Os professores de conteúdo, por sua vez, atuam de acordo com as demandas dos briefings desenvolvidos para a disciplina. Assim os conteúdos, por eles elaborados são apresentados em etapas específicas, ou , ao longo de diferentes etapas do desenvolvimento da disciplina. Atuações em etapas específicas dizem respeito à conteúdos ligados à certas ferramentas e métodos. A pesquisa antropológica, por exemplo, auxilia na etapa de conceituação enquanto as aulas de logística contribuem mais para a etapa de desenvolvimento. Mas há aqueles conteúdos que perpassam as diferentes etapas, pois o objetivo abrange o projeto. É o caso, por exemplo, das oficinas de texto, cujo objetivo é ampliar a potência de comunicação dos proje-

89

tos quer seja no âmbito das apresentações orais que percorrem a disciplina quer seja nos momentos de elaboração dos relatórios de projeto. O acompanhamento dos alunos por parte dos professores de conteúdo é pontual e os critérios de avaliação, quando há são variados, contemplando frequência, empenho e os resultados específicos ligados ao conteúdo ministrado. 3.4 3.4.1

Observando DSG1002 – Projeto Básico “ Planejamento” Ambientação do Projeto básico DSG1002: Planejamento

A sala de aula onde foram realizadas as observações do Projeto Planejamento (DSG1002) está situada no edifício Cardeal Leme. A sala L532, situada no quin2

to andar, é uma sala ampla (90m ),com cerca de 13 metros de largura por 7 me2

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

tros de comprimento. Em relação às outras salas do andar, na média de 50m , a sala 532 é maior, causando a impressão de que ela é o resultado da fusão de duas salas menores. Deduzi isso pela presença de duas portas, uma em cada extremo da sala, e pelo fato das demais salas possuírem cerca de metade do tamanho, com uma porta apenas. A sala em observação era bem iluminada, possuindo três janelas com cerca de 4 x 2,2m ao longo da parede oposta à porta (largura), todas equipadas com cortinas blackout. As janelas davam para o morro arborizado, por onde passa o túnel da estrada Lagoa-Barra, a cerca de cinquenta metros do edifício. O posicionamento e o tamanho das janelas garantiam que na parte da tarde, com as cortinas abertas, a sala ficasse iluminada com a luz natural, apesar de ser frequentemente complementada pelo uso das lâmpadas dentro da sala. Normalmente as janelas ficavam fechadas, as cortinas abertas e dois grandes aparelhos de ar-condicionado ficavam em funcionamento, tornando o ambiente da sala mais frio do que do lado de fora no corredor. O quadro de giz, com cerca de 5,3 x 1,3m, ocupava quase toda a parede do lado perpendicular à porta (comprimento), à direita de quem entra na sala . Sobre ele encontrava-se fixados na parede duas caixas de áudio e uma tela retrátil de lona para projeção. Quando aberta, a tela possuía cerca de 1,6 x 1,7m e a cerca de 2,5 metros de distância de um projetor digital (datashow), fixado no teto. Ao lado esquerdo do quadro havia um pequeno armário que abrigava uma torre de computador, teclado, mouse, vídeo e os controles dos dispositivos.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

90

Figura 3-2 - Planta baixa da sala L532

As paredes opostas ao quadro e à janela eram revestidas do chão até uma altura de 2 metros por um carpete. Creio que uma das funções deste revestimento seja para auxiliar o isolamento acústico da sala, uma vez que o carpete ajuda a abafar o som e a sala já reverbera naturalmente por causa do comprimento e dos vidros das janelas. O carpete não é uma exclusividade desta sala, o revestimento também se encontra presente nas demais salas daquele e de outros edifícios no campus. Entretanto, além de melhorar a acústica outro uso dado ao carpete ao longo das aulas de projeto foi o de mural, pois ele servia como suporte de fixação , empregando de pequenos dispositivos feitos com velcro e clipes de papel, para fixar cartazes durante as apresentações.

Figura 3-3 – Dispositivo de velcro e clip de papel para fixar cartazes

As mesas e cadeiras da sala também se diferenciavam das demais salas do andar. À exceção das salas de laboratório de computadores, que também possuem um mobiliário característico, as demais salas não costumam dispor de mesas para os alunos com cadeiras separadas, elas dispõem apenas de carteiras escolares, que integram os dois objetos. Essa diferença proporciona outra disposição na ocupação

91

dos espaços, pois enquanto as carteiras delimitam espaços individuais, as mesas da sala de projeto permitem o agrupamento dos alunos, dividindo o mesmo espaço. A sala L532, ao longo do período de observação, dispunha de 12 mesas, de cerca de 2,5 x 0,7m cada, que normalmente ficavam dispostas ao longo de duas fileiras de seis mesas. Cada mesa comportava três cadeiras numa disposição convencional e possuía rodas sob seus quatro pés, o que facilitava o deslocamento. Além disso, por serem simétricas, as mesas podiam ser utilizadas de ambos os lados, permitindo, por exemplo, que a atenção se voltasse para os fundos da sala apenas virando as cadeiras, o que ocorria com frequência nas apresentações dos

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

projetos pelos alunos, quando eles fixavam os cartazes no carpete da parede.

Figura 3-4 – Arrumação padrão da sala L532

As cadeiras eram de plástico rígido, montadas sobre estruturas metálicas e não possuíam braços. Diferenciavam-se das carteiras escolares por serem mais leves e, assim, facilitarem os deslocamentos e reorganizações. Por não possuírem braços, eram empilháveis e também restringiam menos os movimentos, permitindo que os alunos se sentassem com diferentes posturas, virados para diferentes lados enquanto interagiam uns com os outros.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

92

Figura 3-5 – Mesa com rodas e cadeiras

As cores utilizadas eram majoritariamente frias, privilegiando-se os tons pouco saturados como tons de bege, cinza escuro (mesas), branco (paredes), marrom (carpete), verde (quadro) e grafite (cadeiras). A sala de aula normalmente permanecia organizada com as mesas dispostas em fileira, conforme a organização padrão e, caso houvesse alguma mudança nessa disposição, ao fim da aula, os móveis voltavam a ser dispostos na maneira como se encontravam. A sensação pela composição do espaço e do mobiliário era de sobriedade, limpeza e organização.

Figura 3-6 – Escala de cores predominantes na sala de aula

Considerando uma observação superficial sobre o espaço da sala de aula, nota-se a predominância da organização e limpeza, mostrando uma tendência ou aspiração à “neutralidade”, ou seja, a configuração de um ambiente isento de características que denunciassem que tipos de atividades ocorreriam ali. Apesar do mobiliário distinto, cabe ressaltar que o espaço e a aparência da sala eram semelhantes ao das demais salas do andar. Essa organização e disposição indicam certa ordem disciplinar, que dialoga com uma maneira de se conceber as relações de ensino e aprendizado, privilegiando a expressão da instituição sobre a expressão de professores e alunos. Conforme ressalta Juarez Dayrelll, “o espaço arquitetônico da escola expressa uma determinada concepção educativa" (DAYRELL: 1996, p.147).

93

Porém, pequenos detalhes demonstravam alguns índices de subversão da disciplina e ordem em algumas mesas, onde se encontravam alguns desenhos, arranhões e anotações feitas pelos alunos. Apesar do imperativo de limpeza a fim de se manter a sala em “condições de uso” pelos demais professores, era possível notar marcas da presença dos alunos deixadas sobre as mesas. Estas marcas contrari-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

am algumas normas de organização e limpeza exigida por alguns professores.

Figura 3-7 – Desenhos e marcas de corte feitas por alunos sobre as mesas

Além de demonstrar certo grau de subversão da organização e limpeza das salas, estas marcas também denunciam o perfil de aluno que frequenta o lugar, uma vez que os desenhos e arranhões são indícios de algumas atividades dos alunos de Design. Isso porque, dentre as atividades desempenhadas pelos alunos no curso, são comuns o desenho e o corte de papéis e outros materiais utilizando réguas e estiletes (também conhecidos como faca Olfa). Portanto, as marcas na mesa admitem a possibilidade de insubordinação tanto por meio do vandalismo, quanto pela falta de cuidado durante a realização das atividades. No caso dos desenhos, sejam por esboço ou passatempo, podem ter sido feitos na mesa pela falta do material adequado, seja o bloco ou caderno. O mesmo vale para os arranhões, feitos sem a devida proteção de uma superfície rígida ou mesa de corte. O espaço e os objetos da sala constituem o cenário em que os atores se relacionam. Pareceu-nos que descrevê-los apenas pela maneira como se apresentam, desconsiderando as ações que ali acontecem, comprometeria o objetivo desta pesquisa. Incorporamos então a descrição das ações e das interações com o cenário aqui descrito. 3.4.2

As aulas de DSG1002 – Projeto Básico Planejamento

Observei duas turmas que dividiam o mesmo espaço físico da disciplina ministrada no primeiro semestre de 2009, em que presenciei a participação de dois professores regentes, cinco professores de conteúdo (desenho de observação, oficina de texto, técnicas de criatividade, materiais flexíveis e anatomia do movimento) e três palestrantes (webdesign, produção gráfica, apresentação em Powerpoint).

94

Além disso havia uma aluna de doutorado na qualidade de estagiária em docência e dois monitores, alunos de períodos mais avançados que acompanhavam e auxiliavam na disciplina. O corpo discente era formado por 38 alunos, sendo 22 do sexo masculino e 16 do sexo feminino. Os alunos eram jovens, aparentando uma média etária de 18 anos, a maioria cursando o segundo período do curso, mas com a presença de alunos de outros períodos que cursavam a disciplina novamente. Em relação às opções de curso, havia alunos provenientes de todas as habilitações (Comunicação Visual, Mídia Digital, Moda e Projeto de Produto). As aulas ocorriam às terças e quintas-feiras em horários diferenciados. Às terças era uma aula de três tempos, de 13 às 19 horas. Às quintas a aula era dividida em dois tempos, de 13 às 17 horas. Os professores regentes atuavam terças e PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

quintas-feiras no segundo tempo de aula, ao longo de todo o período. Os professores de conteúdo se revezavam nos demais horários das disciplinas, segundo um cronograma de aulas pré-estabelecido junto a supervisão da disciplina. A tabela abaixo sintetiza a distribuição dos tempos de aula:

Terça-feira

Quinta-feira

13-15h

Professores de conteúdo

Professores de conteúdo

15-17h

Professores regentes

Professores regentes

17-19h

Professores de conteúdo



Tabela 3-1 – Quadro com a distribuição das aulas

Apenas nos momentos de avaliação, os professores regentes utilizavam todos os tempos de aula, para que todos os alunos pudessem apresentar seus trabalhos e serem avaliados. As aulas de conteúdo, diferentemente das aulas dos professores regentes, não ocorriam necessariamente em sequência regular e com horários fixos. Alguns professores de conteúdo atuaram em diferentes dias e em horários diversos (ora no primeiro, ora terceiro tempo). Em alguns casos, havia um intervalo de um mês entre uma aula ministrada por um professor de conteúdo e outra. Os palestrantes eram professores ou alunos de pós-graduação que vieram a convite dos professores regentes da disciplina no horário de aula deles (segundo tempo de aula) para falar sobre um assunto ligado às suas áreas de atuação. Os professores regentes convidaram os palestrantes segundo a demanda identificada em relação aos projetos. Nesse sentido, as palestras foram participações em

95

ocasiões únicas que tinham por objetivo suprir alguns aspectos não contemplados nas aulas de conteúdo. Os dois monitores se revezavam nos dias da semana, mas permaneciam durante todos os tempos. O monitor frequentava as aulas nas terças-feiras e a monitora nas quintas-feiras. A divisão favorecia os horários de estudo e trabalho, uma vez que a monitoria é realizada por alunos do curso. Os alunos da turma deviam frequentar todas os tempos de aula, sendo que havia o controle de frequência realizado pelos monitores. Apesar da obrigatoriedade da presença, os alunos administravam sua frequência de acordo com diferentes situações demandadas pelos seus projetos como visita ao local para o qual seus projetos estavam sendo desenvolvidos, trabalho nos laboratórios de ensino, visita a lojas para compra de materiais entre outros. Em alguns casos as ausências eram PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

admitidas, desde que justificadas. 3.4.3

As etapas de desenvolvimento dos projetos

O projeto básico “Planejamento” (DSG1002) foi apresentado pelos professores regentes que propunham uma abordagem semelhante ao projeto “Contexto e Conceito” (DSG1001) que os alunos cursaram anteriormente, no qual empregara-se a metodologia Design em Parceria. No entanto, os professores afirmaram que naquela disciplina seriam enfatizados os aspectos relativos ao planejamento enquanto a disciplina anterior havia enfatizado aspectos relativos a conceito e contexto. Dado que os alunos já conheciam o funcionamento da disciplina anterior, caberia a eles planejar suas próprias atividades, estabelecendo cronogramas de trabalho e entregas. 3.4.3.1

Do início da disciplina ao Planejamento

Embora a ênfase fosse dada ao planejamento por parte dos alunos, já havia um planejamento previamente determinado pelos professores a partir do qual os alunos deveriam se orientar. O cronograma apresentado não detalhava os prazos definidos para cada etapa, mas estabelecia que determinados grupos de etapas deveriam ser completados para serem incluídos na avaliação parcial (G1) e final (G2). O cronograma detalhava o processo de projeto, evidenciando as etapas, mas os próprios alunos deveriam definir os prazos dedicados à cada etapa, personalizando seus próprios cronogramas. Nesse sentido, os professores de disciplina cobraram que os alunos possuíssem o cronograma aula a aula marcado em suas pastas de projetos (que neste caso substituía o caderno). Reproduzo abaixo o quadro apresentado no dia 12 de março de 2009 que resumia o processo, listando as diferentes etapas em função das avaliações:

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

96

Etapas

Avaliação

1. Apresentação 2. identificação do local 3. formação das duplas 4. escolha do local 5. visitação / observação / registro 6. registro das palavras 7. jogo de palavras 8. formação da(s) frase(s) 9. experimentos 10. apresentação do processo (desenhos e o projeto) 11. confecção do cartaz para apresentação 12. apresentação dos experimentos

G1

13. experimentação 14. quente/frio (adoção do partido) 15. experimentação com o partido adotado 16. detalhamento do partido adotado 17. desenvolvimento do objeto 18. experimentação final 19. ajustes no objeto 20. apresentação 21. relatório 22. ficha-resumo 23. entrega do objeto ao grupo social – parceiro.

G2

Tabela 3-2 – Quadro com o resumo do processo de projeto

O projeto a ser desenvolvido pelos alunos ao longo da disciplina deveria ser desenvolvido em duplas, sem restrição quanto ao sexo dos integrantes. Contudo, as duplas só seriam definidas após a identificação de um local para desenvolvimento do projeto em que houvesse um grupo social em atividade frequente. Uma restrição quanto ao local era que não houvesse atividade de cunho comercial, restringindo assim a disciplina para o desenvolvimento de projetos junto a locais com serviços públicos e/ou gratuitos. Os alunos deveriam observar locais possíveis individualmente e narrar as atividades aos professores de maneira que pudessem ser selecionados possíveis locais de trabalho. Na terceira semana de aula a maioria dos alunos já havia definido o local de projeto e formavam suas parcerias. O critério de agrupamento era diversificado: afinidade, moradia próxima, interesse pela atividade do local, entre outros. Houve poucos casos em que alguns alunos trabalharam sozinhos ou que os grupos se desfizeram ao longo do processo.

97

3.4.3.2

Da definição do local à conceituação

Uma vez definidos os locais de interesse, os grupos passaram a visitar cada local escolhido com frequência. Nele, deveriam escolher uma pessoa que exercesse uma atividade frequente e admitisse a observação e participação dos alunos. Definido o parceiro de projeto, os alunos observavam, tomavam notas e realizavam desenhos sobre as atividades que ocorriam e narravam para os professores. Além disso, parte da técnica de observação envolvia o registro das palavras faladas pelo parceiro. O acompanhamento sistemático permitiu aos alunos levantarem cerca de cem ou mais palavras empregadas no dia-dia da atividade. A técnica do jogo de palavras consistia em anotar as palavras registradas em pedaços de papeis individuais, como o mesmo tamanho, sem dar destaque a qualquer pala-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

vras. As palavras anotadas eram entregues ao parceiro, que deveria ser solicitado a organizá-las da maneira que achasse melhor. As organizações podiam variar, agrupando, descartando palavras, compondo frases ou montes etc. A partir da organização feita pelos parceiros, os alunos observavam a maneira como foi feita e perguntavam ao parceiro porque fizeram as escolhas, ou porque escolheram organizar as palavras da forma determinada A resposta do parceiro e suas escolhas na permitiram que os alunos e os professores regentes da disciplina criassem frases empregando as palavras organizadas no jogo. As frases organizadas foram levadas de volta para a aprovação do parceiro que, poderia modificá-las ou agrupá-las de maneira a definir uma frase ou sentença que melhor caracterizasse sua atividade. Através da técnica do jogo de palavras A frase criada compreendia o objetivo do projeto a ser desenvolvido pelos alunos . A etapa de conceituação, desde o processo de observação, registro, jogo de palavras e formação da frase levou cerca de quatro semanas. Depois disso, os alunos começaram a fase de geração de alternativas, propondo hipóteses de produtos a serem testados junto ao grupo social. 3.4.3.3

Da conceituação à geração de alternativas

Uma vez com a frase definida, os alunos começaram a propor possibilidades de objetos que atendessem aos objetivos do parceiro e se adequassem ao grupo social. As primeiras ideias deveriam ser pouco elaboradas e empregadas a título de teste. Naquele momento, o objetivo era verificar se as hipóteses eram aplicáveis ao contexto de uso, portanto os objetos não precisavam ser inovadores ou possuírem um bom acabamento. Alguns objetos levados na experimentação eram produtos existentes, outros eram resultado da combinação entre dois ou mais produtos, enquanto outros eram adaptações de produtos existentes.

98

Os primeiros objetos eram chamados de iscas (objetos levados em caráter experimental, para observar as reações e usos) e após os primeiros experimentos foram categorizados segundo o interesse e o uso dado pelo parceiro. Além da observação do uso das iscas, os alunos também avaliaram os motivos pelo qual determinados objetos tiveram mais ou menos êxito. Esta etapa priorizava a técnica do quente e frio, auxiliando na identificação de propostas promissoras (quente) e propostas pouco promissoras (frio). A proposta mais promissora do projeto de cada grupo de alunos tornou-se o partido adotado em cada projeto e definiu os principais aspectos do produto, como características funcionais, necessidades e situações de uso. Entretanto ainda não se tratava de um produto propriamente dito, pois até aquele momento os experimentos não exigiam acabamento e cuidado com os aspectos técnicos e funcionais. NesPUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

se sentido, o partido adotado estava mais ligado a ideia do produto, do que a sua forma propriamente dita. Depois que os alunos adotaram um partido de projeto, passaram a variar os diferentes aspectos do produto: forma, materiais, acabamentos, processos de produção entre outros. As variações deveriam ser testadas junto ao parceiro e as observações seriam incorporadas ao longo dos testes. A etapa de geração de alternativas durou cerca de quatro semanas e envolveu diferentes testes. Em alguns casos os alunos repetiram os testes quando percebiam que o parceiro se interessou mas não conseguiu utilizar o objeto por algum impedimento como falta de tempo para experimentação, má qualidade do material, aparência etc. O processo de experimentação do partido também envolvia diversos testes que em alguns casos levaram, inclusive, a alteração do partido adotado por revelarem aspectos não contemplados inicialmente. 3.4.3.4

Da geração de alternativas ao Detalhamento

A etapa de detalhamento ocorreu mediante a identificação dos aspectos mais bem sucedidos em relação a experimentação do partido definido após experimentação das múltiplas alternativas. A partir deste momento, os alunos passaram a construir o modelo final ou protótipo considerando as formas, os materiais e os processos mais adequados à atividade do grupo social e do parceiro. Durante o detalhamento os alunos aprimoraram seus produtos, dedicandose a especificar os aspectos construtivos e a construir o protótipo com um bom acabamento, do ponto de vista técnico (bem lixado, pintado, costurado, legível, dependendo da natureza do objeto e seu processo produtivo). O rigor técnico foi enfatizado neste momento e os professores se mostravam insatisfeitos com produtos com problemas de acabamentos.

99

Neste projeto também foi realizada a experimentação do protótipo, a partir do qual os alunos avaliaram o uso e, quando necessário, realizaram ajustes no produto. Ao fim do processo, os aspectos do detalhamento técnico, a experimentação e todo o processo eram documentados no relatório final da disciplina entregue por cada grupo de alunos e apresentados para os professores e para as turmas que dividiam o mesmo espaço físico. 3.4.4

Interações na sala de aula

O processo de projeto transcorreu ao longo de diversas aulas, envolvendo diferentes momentos e formas de interação. Conforme apresentei, haviam professores regentes de disciplina e conteúdo que se alternavam nos tempos de aula. As aulas desses dois grupos possuíam propósitos e dinâmicas de atividades diferentes, relaPUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

cionando-se de formas diversificadas com o processo de projeto. As diferenças entre as aulas dos professores regentes da disciplina e de conteúdo estão relacionadas aos objetivos específicos de cada aula e sua função no processo. As aulas dos professores de conteúdo apresentavam conhecimentos gerais que deveriam ser empregados pelos alunos, considerados úteis para o desenvolvimento dos projetos, mas sem necessariamente possuírem um vínculo direto ao trabalho que os alunos estão desenvolvendo. As aulas dos professores regentes se voltavam diretamente para os trabalhos em desenvolvimento pelos grupos, os conhecimentos eram voltados para os problemas específicos dos projetos, sendo inclusive repetidos para os diferentes grupos. Os professores de conteúdos enfatizavam conhecimentos que os alunos deveriam empregar em diferentes momentos do projeto: •

Oficina de texto: propunha o desenvolvimento do relatório, enfatizando as técnicas de descrição. Relacionou-se à etapa de detalhamento.



Desenho de observação: propunha a documentação das atividades desenvolvidas no local de projeto, enfatizando as posturas e o movimento dos participantes. Relacionou-se à etapa de conceituação.



Técnicas de criatividade: propunha o desenvolvimento de diferentes ideias e soluções de projeto, enfatizando as técnicas de brainstorming e solução de problemas. Relacionou-se às etapas de conceituação e de geração de alternativas.



Materiais flexíveis: propunha o conhecimento e desenvolvimento de produtos, enfatizando materiais flexíveis. Relacionou-se às etapas de geração de alternativas e detalhamento.

100



Anatomia do Movimento: propunha o conhecimento do funcionamento anatômico, enfatizando as estruturas ósseas durante os movimentos. Relacionou-se às etapas de geração de alternativas e detalhamento. Apesar de se relacionarem às diferentes etapas, a forma como eram minis-

tradas diferia das aulas dos professores regentes de disciplina. No caso das aulas de conteúdo, os professores não acompanhavam o desenvolvimento de cada projeto, mas direcionavam os conteúdos para toda a turma. Já as aulas como os professores regentes era essencialmente focada no desenvolvimento de cada grupo, diretamente relacionada aos processos específicos. Além disso, partes de algumas etapas do processo de projeto eram realizadas fora da sala de aula. As fases de observação do local de projeto, as experimentações junto ao parceiro, a redação do relatório, o desenvolvimento do produto em laboraPUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

tório, entre outras, ocorriam fora da sala de aula. Estas fases apareciam na sala mediante os planejamentos, os relatos descritivos e os questionamentos dos alunos junto aos professores regentes. Os diferentes formatos de aula interferiam na forma como professores e alunos interagiam entre si e com o espaço de sala de aula. A partir da narração de uma aula típica, penso ser possível elucidar algumas características desta interação. Às 13 horas a sala encontrava-se ainda vazia. Poucos alunos estavam na sala quando entrei. As mesas estavam dispostas em fila e alguns alunos conversam sentados em torno de uma das mesas, há aqueles que desenham e há outros lendo jornais e revistas aguardando a chegada do professor de conteúdo. Naquele momento os alunos já sabiam que as aulas dos professores regentes ocorria no segundo tempo da aula. Porém, um dos professores regentes chegou inesperadamente na sala. Ao notarem sua presença, alguns alunos aproveitaram a oportunidade e rapidamente foram se consultar com ele. O professor conversou com alguns alunos sobre seus respectivos projetos, enquanto a professora de conteúdo ainda estava por chegar. Os alunos ocupavam os lugares segundo diferentes critérios. O critério mais evidente era as duplas de trabalho de projeto. Porém nem todas as duplas agrupavam-se juntas ao início da aula, indicando que os alunos também se posicionavam segundo a amizade com os colegas. As mesas comportavam três pessoas sentadas de um lado, assim era comum que duas duplas se sentassem ao redor de uma mesa, de modo que o quarto aluno ficasse posicionado na lateral da mesa. Os demais alunos chegavam aos poucos, em grupos ou sozinhos e ocuparam os lugares. Eles interagiam entre si, cumprimentando-se, comentando algo ou participando das conversas iniciadas. Quando a professora de conteúdo chegou para aula, o professor da disciplina a cumprimentou e depois se retirou da

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

101

sala. Os alunos que estavam com ele voltaram a seus lugares para assistirem a primeira aula do conteúdo de anatomia do movimento. A professora chamou a atenção dos alunos para começar sua aula, mas as conversas e as atividades persistiam. Alguns alunos, especialmente os sentados na parte da frente, cessaram as conversas e passaram a prestar atenção e a anotar. Os alunos do fundo não deram muita atenção e continuaram a conversa. Ela tentou retomar o assunto da aula anterior, mas desistiu por considerar que o barulho estava excessivo e que seria impossível continuar a expor os conteúdos daquela maneira. Naquele instante ela chamou a atenção de todos os alunos e pediu que reorganizassem a sala, dispondo as mesas em um grande retângulo. Contudo, apesar de romper com a ordem pré-estabelecida das fileiras, a professora ainda considerou que a turma estava muito “agitada” e “barulhenta”. Como estratégia para acalmá-los, propôs um exercício de concentração e conscientização corporal, por meio de alongamentos e respirações. Durante o exercício, ela chamou atenção para as partes do corpo humano que estavam sendo trabalhadas e sobre o papel que exercem nos movimentos. A proposta de atividade acabou se relacionando com o conteúdo, que no caso era de anatomia do movimento. Feitos os exercícios, a professora retomou o assunto da aula anterior, distribuindo folhas de papel com desenhos dos ossos do corpo humano. Ela solicitou que os alunos colorissem os diferentes grupos de ossos da coluna, identificando os segmentos de vértebras da cervical, dorsal e lombar. Enquanto alguns alunos realizavam a atividade proposta, a professora retirou de dentro da mala que havia trazido uma série de modelos que simulavam a pele, ossos e vísceras do corpo humano. Ela buscou demonstrar por meio destes modelos, construídos por ela mesma, a maneira como o corpo e, em especial a coluna, se comportavam. No caso, ela chamava atenção para a deficiência dos modelos de corpo humano que apresentavam a coluna como algo rígido e estático, mostrando que na realidade o seu comportamento era flexível e dinâmico, e que bons projetos anatômicos deveriam considerar este fato. Alguns alunos não participaram da atividade proposta, enquanto outros alternam sua atenção ora para a aula, ora para outras atividades, como conversas, leituras ou desenhos. Houve também aqueles que acabaram se levantando e saindo da sala, uns para ir ao banheiro outros para matar aula. A aula seguiu , por meio de explicações e depois por orientações sobre a atividade proposta. Ao fim da aula, os professores regentes voltaram a sala. A dupla de professores cumprimentou a professora, que reuniu seus modelos e os colocou de volta na mala. Nesse momento, a primeira etapa da aula se encerrava a professora se despediu e saiu da sala, enquanto os professores regentes assumiram a aula. Às 15 horas, quando os professores regentes chegaram, a turma estava cheia, mas alguns alunos estavam fora da sala, pois saíram para lanchar ou fazer um pequeno intervalo. No momento em que a aula começou, os alunos que estavam fora da sala voltaram e aqueles mais ansiosos se dirigiram imediatamente aos professores pedindo conselhos e orientações sobre seus projetos. Antes

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

102

de proceder aos atendimentos, os professores passaram avisos aos alunos, comunicando prazos, etapas e anotaram no quadro um cronograma, que foi copiado pela maioria dos alunos em seus cadernos. A dupla de professores se separou e cada um passou a atender um grupo diferente de alunos, indo de mesa em mesa. Na medida em que começaram as orientações, a disposição da sala mudou e pequenos núcleos de alunos começaram a se constituir. Reunidos ao redor das mesas, os alunos que não estavam sendo atendidos desempenhavam diferentes atividades: trabalhavam em seus projetos, conversavam, desenhavam, faziam tarefas da aula de conteúdo anterior ou de outras aulas, ouviam música, liam, jogavam jogos eletrônicos etc. Naquele momento, tratava-se de uma fase inicial do projeto, em que os alunos deveriam definir as duplas e escolher o local de projeto. Os alunos que estavam em atendimento apresentavam suas escolhas de parceria, relatavam suas visitas aos locais, descreviam as atividades junto ao grupo escolhido, mostravam seus cadernos, tiravam dúvidas sobre o processo da aula e as avaliações, entre outras atividades. Os professores, por sua vez, procuravam se informar sobre os projetos dos alunos e comentar e sugerir atividades e leituras que os auxiliassem a trabalhar as situações apresentadas, orientavam ainda sobre as próximas ações, entre outras coisas. O tempo dos atendimentos era bastante variado, dependendo da demanda dos alunos ou das informações dos professores sobre determinado projeto. Em alguns casos os alunos chegavam a manifestar que não tinham nada a relatar, ou que procurariam os professores na próxima aula, cedendo a vez a outros grupos. Até o fim da aula nem todos os grupos foram atendidos, e ficaram agendados para a aula seguinte. Com o término da aula, os professores aproveitaram para reforçar os avisos sobre prazos e cronograma, chamando atenção para as anotações realizadas no quadro. Nem todos os alunos estavam presentes, pois alguns foram embora depois que foram atendidos. Antes de partirem, os professores solicitaram que os alunos restantes ajudassem a reordenar as mesas em fileiras, para deixá-las prontas para o uso da aula seguinte. Somente então, os alunos e professores saíram da sala. (DSG1002 - quinta-feira, 19 de março de 2009) A situação acima apresenta um dia em que havia dois tempos de aula e as diferenças entre as características de uma aula dos professores de conteúdo e dos professores regentes da disciplina . No primeiro tempo, dedicado à aula de conteúdo, a aula transcorreu de maneira independente dos projetos dos alunos: houve conteúdos e atividades comuns para todos os alunos, independentemente do seus projetos. No segundo tempo de aula, os professores regentes se concentram nos trabalhos específicos de cada grupo. No caso exemplificado, a aula de anatomia do movimento visava à fundamentação dos projetos no que se refere à adequação anatômica. Portanto, os fundamentos apresentados deveriam servir como base para a geração de alternativas e para o detalhamento dos projetos de produtos que previam o uso em movimento.

103

Todavia, a aplicação dos fundamentos era limitada e mais pertinente aos trabalhos associados à habilitação de projeto de produto, embora a disciplina comportasse alunos das quatro habilitações do curso. A aula dos professores regentes da disciplina, por sua vez, visavam à orientação e ao acompanhamento dos alunos, ligada diretamente à etapa de desenvolvimento de projeto em que se encontravam. Os alunos descreviam o que haviam feito e apresentavam dúvidas, enquanto os professores ouviam, comentavam, sugeriam ações e esclareciam as dúvidas. De certa forma, uma das diferenças entre as duas formas de aulas também diz respeito à maneira como elas se associam ao processo do projeto. De uma maneira geral, as aulas dos professores de conteúdo abrangem aspectos de fundamentação, voltados para aplicação a médio e longo prazo. Enquanto isso, as aulas PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

dos professores regentes abrangem aspectos relativos ao processo dos projetos, de aplicação mais imediata. Os diferentes tipos de aula conferem conotações diferentes a uma mesma ação desempenhada pelos alunos. Tomo como exemplo as conversas paralelas entre os alunos nos dois tempos de aula. Na aula da professora de conteúdo a atividade foi considerada inadequada, enquanto na aula dos professores regentes a atividade foi considerada normal. No caso relatado, a professora de conteúdo havia se programado para dar uma aula expositiva seguida por uma atividade prática (reconhecer e colorir os segmentos da coluna vertebral). Contudo, a atitude dos alunos não correspondia à suas expectativas. Diante da situação, ela interveio na disposição do espaço e propôs outra atividade, a fim de “acalmá-los”, para criar as condições desejadas para enfim, dar sua aula. A partir do acontecido, suponho ter havido um conflito entre a expectativa da professora, a partir de um ideal de como deve ser uma aula expositiva, e o que lá havia concretamente. Creio que a atitude apresentada pelos alunos não condizia com aquela esperada pela professora de conteúdo. Provavelmente, sua concepção de ensino não admitia as atividades identificadas na sala de aula, como conversa, leituras, desenhos, etc. Em relação aos alunos, devo considerar que as expectativas acerca da aula também divergiam. Além de serem coibidos pelo controle de presença na sala, os alunos pareciam mais preocupados com o desenvolvimento de seus projetos do que com a aula do conteúdo. Enquanto o professor regentes da disciplina estava presente, os alunos foram procurá-lo, evidenciando interesse pela atividade. Não devo desconsiderar o fato de serem os professores regentes da disciplina que atribuem as notas, ou seja, que têm a autoridade para aprovar ou reprovar

104

os alunos. Os alunos sabem disso, e usavam isso ao seu favor, sabendo que não serão reprovados pelos professores de conteúdo. A prioridade dada aos professores regentes é perceptível pela maior frequência de alunos no segundo tempo de aula do que nos demais tempos. Outro fato a ser considerado é a sala de aula como situação de socialização. Os alunos desenvolvem entre si relações de amizade, romance, inimizade, competição entre outras e a sala de aula é mais uma situação em que se encontram e às praticam. Portanto considero esperado que os alunos não fiquem focados durante todo o tempo de aula, devido a expectativa de interação com os outros alunos além das questões de aula. A expectativa de aplicação do conteúdo também afeta a maneira como os alunos encaram a aula, quer seja útil para o projeto, quer na atuação profissional. PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

A esse respeito recordo a diversidade de habilitações dos alunos na qual o conteúdo em questão seria mais ou menos adequado. No caso, a anatomia do movimento pode ser algo relevância mais óbvia para alunos de projeto de produto do que para alunos de mídia digital, apesar da experiência dar conta de ser um conteúdo importante para ambas as habilitações. A questão da utilidade do conteúdo também pode ser pensada segundo os parâmetros de aplicação a curto, médio e longo prazo. Os alunos que não viam uma aplicação imediata do conteúdo, por mais que se tornasse útil posteriormente, tendiam a subestimá-lo. Isso também porque naquele momento ainda estavam definindo as duplas e o local de projeto e, assim, ainda não tinham ideia do que iriam produzir. Os motivos listados acima explicam em parte a desatenção dos alunos durante a aula do conteúdo de anatomia do movimento. Todavia, há fatores que dizem respeito também ao grupo de alunos e a relação com o professor. Há uma questão de empatia do professor e as estratégias empregadas para mobilizá-los que também afetam os comportamentos dos alunos. Nas oficinas de técnicas de criatividade, por exemplo, o professor sempre propunha desafios para os alunos. Vendo-se desafiados e em situações de disputa com os demais alunos, eles achavam-se motivados a participar das aulas, que contava com a adesão de quase toda a turma. Nesse caso, há uma questão em relação à forma como as atividades são conduzidas e a motivação dos alunos. Creio que os fatores apresentados e outros não listados servem para compreender a questão das conversas paralelas. No entanto, há ainda uma questão que considero importante na constituição das conversas paralelas: a configuração espacial da sala e os recursos materiais presentes na sala. As mesas, nesse caso, não serviam apenas como suporte de trabalho, mas também favoreciam as interações

105

entre alunos devido às suas dimensões. Ainda que dispostas em fileiras, elas permitiam o compartilhamento do espaço entre dois, três ou mais alunos, como nos casos em que eles adicionavam uma cadeira à direita ou à esquerda da mesa. Sentados juntos na mesma mesa, era mais fácil para os alunos conversarem entre si, mostrarem diferentes coisas como revistas, jornais, desenhos e comentarem sobre esses objetos. A mesa para três pessoas favorece interações que a carteira individual limita e vice-versa. Se o mobiliário favoreceu o tipo de aula, ou melhor, as estratégias de ensino-aprendizagem dos professores regentes da disciplina, pois permitiam que os alunos mostrassem seus produtos e desenhos sobre as mesas, de certa forma limitou a atenção individual dos alunos, por oferecer mais possibilidades de distração na interação entre alunos, comprometendo assim a primeira estratégia eleita para a aula de conteúdo de anatomia. PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Nesse sentido, identifico uma relação entre o tipo de aula, as estratégias de ensino-aprendizagem que participam da maneira como os professores e alunos interagem e os recursos materiais e espaciais que a sala oferecia. De acordo com a dinâmica de aula que se propunha, havia uma configuração espacial que a acompanhava. Ao perceber que a turma estava muito agitada, a professora de conteúdo alterou a organização da sala, esperando afetar a atitude dos alunos. Como apenas a mudança na disposição espacial não causou o efeito esperado, ela propôs uma outra dinâmica de maneira a mobilizar os alunos. Se, por um lado uma concepção de aula da professora de conteúdo demandava certa postura e atitude da turma, por outro lado as aulas dos professores regentes da disciplina admitiam outras possibilidades. Conforme o relato, identifico que não apenas as atividades paralelas são admitidas, como também são esperadas. Não houve, por parte dos professores regentes da disciplina a repreensão às conversas e outras atividades. Pelo contrário, suponho que estas atividades sejam até mesmo esperadas, uma vez que os alunos devam aproveitar o tempo em que aguardam o atendimento realizando outras tarefas. Portanto, a atenção não era demandada de forma exclusiva, de modo que apenas os alunos em atendimento atraiam a atenção dos professores, e vice-versa. Arriscaria afirmar que durante o atendimento a relação de atenção se inverte, pois são os próprios alunos que passam a demandar a atenção dos professores, uma vez que pretendem resolver os problemas de seus projetos. O caso apresentado mostra um pouco da diversidade de atividades presentes em uma aula comum do projeto “Planejamento”, contudo há situações que apresentam outras atividades. Até o momento, listei aqui a ocorrência de uma atividade expositiva (explicação sobre a flexibilidade da coluna vertebral) junto com uma dinâmica (respiração e concentração) e uma oficina (identificar os grupos vertebrais), propostas

106

pela professora de conteúdo. Também listei as dinâmica de atendimento proposta pelos professores regentes e as atividades paralelas ligadas ou não ao projeto. Algumas práticas, como a aula expositiva, empregaram recursos materiais trazidos pela própria professora de conteúdo. A explicação do conteúdo contou, portanto com um recurso material que facilitou a compreensão do funcionamento da coluna vertebral de maneira flexível. O emprego do material foi empregado de maneira a potencializar o objetivo e a forma de aula, no caso expositiva. Além das formas de aula que apresentei aqui, também há outras dinâmicas menos cotidianas, como as apresentações de grupo. As apresentações ocorrem nos momentos de avaliação, quando os grupos de alunos expõem os projetos para toda a turma. Essa forma que a aula assume atende a um propósito duplo de avaliação para os professores e divulgação dos trabalhos para os alunos. PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Entendo, portanto, que o processo de projeto ao longo da disciplina DSG1002 Projeto Básico Planejamento resultou da interação entre os alunos, professores (da disciplina e de conteúdo) e monitores. Mas o processo também é influenciado pelas dinâmicas de aula e pelos os recursos materiais e espaciais que facilitam, viabilizam ou limitam certas dinâmicas. Também notei que o processo de projetos não depende apenas da interação entre professores e alunos. Em diversas etapas e ao longo das dinâmicas de atendimento, as atividades desempenhadas pelos alunos foram fundamentais para o resultado dos projetos. Identifico portanto, que outras atividades, paralelas, também participam do processo como um todo. 3.5 3.5.1

Observando DSG1005 – Projeto Avançado Produção e Distribuição Ambientação do Projeto avançado DSG1005: Produção e distribuição

Assim como a sala do projeto Planejamento (DSG1002) a sala de aula do Projeto Produção e Distribuição (DSG1005) também se localizava no edifício Cardeal Leme. As dimensões e estrutura da sala, mobiliário e equipamentos eram bem semelhan2

tes. A sala L260, situada no segundo andar, era uma sala ampla (90m ), com cerca de 13 metros de largura por 7 metros de comprimento. Devido as semelhanças entre a sala L260 com a sala L535, já descrita aqui, assinalarei apenas as diferenças. A sala L260 também possuía duas portas, mas posicionadas de maneira diferente. Uma ficava ao lado da outra e aquela mais à direita ficava bloqueada. A vista da sala também diferia, pois ao invés da mata, via-se o laboratório Van Der Graaf. A diferença de vista em relação a sala L532 deve-se a altura do pavimento (segundo andar), pois o laboratório é um prédio baixo e ao posicionamento da sala dentro edifício.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

107

Figura 3-8 – Planta-baixa da sala L260

Em relação aos recursos da sala, o mobiliário e equipamentos eram quase os mesmos na sala L260, a não ser por não possuir caixas de som. Outra diferença em relação aos recursos da sala era a presença de sinal de acesso à rede wi-fi da universidade, permitindo a conexão com a internet. A organização da sala L260 também se assemelhava à da sala L532, apresentando uma mesa dos professores e duas fileiras com seis mesas destinadas aos alunos. O arranjo da sala está representado na figura abaixo:

Figura 3-9 - Arrumação padrão da sala L260

108

3.5.2

As aulas de DSG1005 – Projeto “ Produção e Distribuição”

Observei a disciplina ministrada no segundo semestre de 2009, em que presenciei a participação de dois professores regentes, sete professores de conteúdo (logística, branding, inovação, representação 3d, responsabilidade socioambiental, design gráfico e design de produto) e cinco palestrantes (marca Fashion Rio, evento Fashion Rio, produção gráfica, laboratório de moda, materiais plásticos). Além disso a turma foi acompanhada por duas monitoras. O corpo discente era formado por 39 alunos, sendo 13 do sexo masculino e 26 do sexo feminino. Os alunos eram jovens de faixa etária entre 18 a 23 anos e cursavam períodos distintos, variando entre o quarto e o sexto período. Em relação às opções de curso, predominavam os alunos da habilitação de

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Comunicação Visual e Mídia Digital, seguindo assim as áreas dos professores regentes, embora também houvesse alunos da habilitação de Moda e Projeto de Produto. As aulas ocorriam às segundas e quartas-feiras em horários diferenciados. Às segundas era uma aula de três tempos, de 7 às 13 horas. Às quartas a aula era dividida em dois tempos, de 7 às 11 horas. Os professores regentes atuavam segundas e quartas-feiras normalmente no segundo tempo de aula, mas em algumas aulas trocaram de horário com os professores de conteúdo. Os professores de conteúdo se revezavam nos demais horários das disciplinas segundo um cronograma de aulas pré-estabelecido. A tabela abaixo sintetiza a distribuição dos tempos de aula:

Segunda-feira

Quarta-feira

7-9h

Professores de conteúdo

Professores de conteúdo

9-11h

Professores regentes

Professores regentes

11-13h

Professores de conteúdo



Tabela 3-3 – Quadro com a distribuição das aulas

As aulas dos professores regentes eram constantes e com horário quase fixo, isto é, ocorreram ao longo de todo o semestre mas em alguns casos ocorriam no primeiro ou no terceiro tempo de aula. Nos momentos de avaliação, os professores regentes utilizavam todos os tempos de aula para que todos os alunos pudessem apresentar seus trabalhos e serem avaliados. As aulas de conteúdo, diferentemente das aulas dos professores regentes, não ocorriam necessariamente em sequência regular e com horários fixos. Alguns professores de conteúdo vieram em diferentes dias e em horários diversos (ora no primeiro, ora terceiro tempo). Em alguns casos, havia um intervalo de um mês entre uma aula e outra.

109

Os palestrantes eram profissionais do mercado ou professores que vieram a convite dos professores regentes no horário de aula deles (segundo tempo de aula) para falar sobre um assunto ligado às suas áreas de atuação. Os professores regentes convidaram os palestrantes segundo a demanda identificada em relação aos projetos. Nesse sentido, as palestras foram participações em ocasiões únicas que tinham por objetivo suprir alguns aspectos não contemplados nas aulas de conteúdo. As duas monitoras frequentavam a maioria das aulas, mas a participação era pouco expressiva pois um dos professores regentess estava acompanhando a maioria das aulas de conteúdo. A presença da professora da disciplina diminui a necessidade das monitoras em controlar a presença. Além disso, como os projetos avançados podiam ser cursados, ocorreu das monitoras estarem alguns períodos atrás em relação a alguns alunos. Isso porque elas cursaram aquele projeto antes PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

dos demais projetos avançados, enquanto os alunos veteranos só precisavam cursar a disciplina para concluir o ciclo dos projetos avançados. Os alunos deviam frequentar todas os tempos de aula, mas era comum haver um certo rodízio dos componentes dos grupos durante as aulas. Os alunos administravam sua frequência de acordo com diferentes situações, de acordo com as necessidades de estágio, ou demanda de projeto. Diferente dos alunos de DSG1002, os alunos do DSG1005 entravam e saiam da aula, faziam intervalos e administravam mais a presença, por estarem mais familiarizados com o funcionamento dos projetos. 3.5.3

As etapas de desenvolvimento dos projetos

O projeto avançado “Produção e Distribuição” (DSG1005) foi apresentado pelos professores regentes que propunham uma abordagem diferente daquilo que os alunos cursaram anteriormente, empregando menos tempo nos processos de planejamento e conceituação para se dedicar mais às outras etapas. Logo de início, os professores enfatizaram que os alunos já deveriam ter seus projetos prontos na primeira avaliação para que a segunda metade da disciplina fosse dedicada ao detalhamento sobre os aspectos do planejamento da produção e distribuição dos produtos. Assim, caberia os alunos formarem grupos, nomear um líder a cada semana e definir suas estratégias para abordarem o tema proposto. 3.5.3.1

Do início da aula ao Planejamento

Os professores, ao apresentarem a disciplina, alertaram de início a forma de trabalho seria diferente das outras disciplinas já cursadas. Os alunos deveriam formar grupos com cerca de 4 alunos e eleger um gerente de grupo a cada semana. O gerente do grupo assumiria a responsabilidade de coordenar as atividades do grupo e relatar o de-

110

senvolvimento do projeto. Ao longo da disciplina os alunos deveriam se revezar no papel de gerente e assumir as responsabilidades de planejamento e liderança. Os professores também informaram o tema a partir do qual todos os projetos deveriam ser desenvolvidos: o Fashion Rio. Todos os trabalhos deveriam se relacionar, de alguma forma ao tema, mesmo que os alunos não se interessassem pelo assunto, pois não haveria substituição do tema. A primeira tarefa a ser cumprida logo na primeira aula era a formação dos grupos e definição das propostas de projeto ligada aos temas. Os alunos deveriam se reunir e discutir suas opiniões, chegando a um consenso sobre o que gostariam de trabalhar. Neste caso, não houve limitações quanto à definição de possíveis produtos: alguns alunos já esboçavam seus interesses em trabalhar sites, exposições, catálogos etc. PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Na primeira semana os grupos foram formados e o calendário com as datas de avaliação informados. Entretanto o planejamento do projeto não se limitou aos aspectos definidos pelos professores, pois cada grupo teve autonomia para definir a maneira como abordaria os temas, desde que respeitassem os prazos. Na segunda semana, os professores de disciplina apresentaram um Powerpoint detalhando a disciplina e apresentaram também um roteiro com as técnicas de briefing. Reproduzo abaixo o roteiro mostrado na aula do dia 24 de agosto de 2009:

Levantar

histórico/ história problema/ lacuna estratégia público alvo campo geográfico

considerações relevantes

mercado cultura de consumo empresas competitivas ameaças oportunidades

produção/ distri-

triagem formato/ dimensões métodos de produção distribuição (abrangência / mé-

buição

todo) aproveitamento de material menor tempo de leitura e compreensão data limite/ prazo do fornecedor arquivos Tabela 3-4 –Quadro com os aspectos listados nas técnicas de briefing

111

Os professores também definiram que a cada semana os grupos deveriam entregar um relatório semanal sobre as atividades realizadas. Além disso, os professores destacaram que na primeira avaliação (G1) os alunos já deveriam ter os projetos “finalizados” para o planejamento da distribuição. 3.5.3.2

Conceituação

A conceituação não seguiu uma lista de técnicas pré-definidas. Os grupos de alunos empregaram diferentes abordagens para lidar com o levantamento de dados e delimitação do objetivo de projeto. Entre as técnicas empregadas os alunos realizaram pesquisas na web e em livros, levantaram imagens e produtos similares aos que pretendiam desenvolver, se informaram sobre o evento Fashion Rio, debateram propostas de trabalho entre si etc. PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

As pesquisas de similares foram amplamente utilizadas por alunos em diferentes etapas, além da conceituação. Elas consistem no levantamento de produtos ou serviços que se assemelham ao que os alunos desejam desenvolver ou, ainda, possuem algum aspecto que se relacione ao tema de interesse. Uma vez levantadas e analisadas, as referências serviram como ponto de partida dos projetos, seja como parâmetro do que se pretendia fazer ou evitar. Contudo, os alunos procuravam não imitar o que já havia sido feito e buscavam desenvolver aspectos que diferenciassem os produtos ou serviços da fonte de referência. Os conceitos dos projetos, nesse caso, foram a partir das escolhas dos próprios alunos segundo seus interesses, mas deveriam ser relevantes em relação ao tema. Isso fez com que o empenho dos alunos se voltasse para o levantamento de dados que justificassem as propostas de trabalho. Em função do tema, os professores convidaram alguns palestrantes para falar especificamente sobre o Fashion Rio. As palestras contemplaram diferentes aspectos do evento, como a organização, os participantes, as atividades, o público, o mercado de moda entre outros. A etapa de conceituação durou cerca de três semanas, contudo esse é um prazo estimado pois cada proposta demandava diferentes níveis de conceituação. Um dos projetos, por exemplo, que tratava de uma proposta de serviço online para identificar tendências, foi um caso que prorrogou a etapa de conceituação. 3.5.3.3

Geração de alternativas

Uma vez definidas as propostas, os alunos passaram à experimentação de diferentes possibilidades direcionadas aos produtos ou serviços que desenvolviam. Nessa fase empregaram as técnicas de brainstorming para gerar variações de produtos possíveis, avaliando junto ao grupo e aos professores as hipóteses de solução.

112

Devido à demanda da disciplina que foca na produção e distribuição, as hipóteses foram avaliadas e rapidamente se chegou à adoção dos partidos. A partir daí, os aspectos mais detalhados acerca da forma, materiais e técnicas de produção passaram a ser explorados pelos alunos. Se, por um lado a criação de hipóteses de produto foi rapidamente definida, por outro lado, a etapa de variações no partido foi prolongada e detalhada. Os alunos testaram diversas possibilidades formais, materiais, funcionais e produtivas. Um dos grupos que realizava um catálogo, experimentou diferentes formatos, estilo de ilustração, famílias tipográficas e possibilidades de diagramação. A geração de alternativas durou cerca de cinco semanas, sendo que a maior parte desse tempo foi dedicada ao desenvolvimento do partido adotado.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

3.5.3.4

Detalhamento

Após os vários estudos a respeito das possibilidades dos produtos, os grupos passaram à fase de detalhamento, em que analisaram e reformularam seus projetos de maneira a melhor adequá-los aos processos técnicos e produtivos. Foi o caso, por exemplo de um grupo que desenvolvia uma nova marca para o evento e que, ao elaborar o manual e especificações da marca, reajustou o desenho para se adequar às proporções geométricas da malha construtiva. Durante a etapa de detalhamento os alunos aprofundaram seus projetos à respeito dos parâmetros técnicos relacionados à construção das formas, especificações de cores e materiais, processos produtivos etc. Além disso, também refinaram seus projetos, desenvolvendo protótipos seguindo os parâmetros especificados. Em alguns casos, como nos grupos que trataram de exposições paralelas ao Fashion Rio, a inviabilidade de construir um modelo real e funcional os levou à construção de maquetes, ou seja, modelos em escala reduzida. Uma das exigências da disciplina foi o manual de produção que previa o detalhamento dos produtos desenvolvidos segundo uma série de parâmetros técnicos e produtivos adequados a cada caso. A lista de requerimentos era ampla e contemplava aspectos variados desde os desenhos técnicos até os fornecedores de determinada matéria prima. Em alguns casos os alunos também avaliaram os custos e apresentaram os orçamentos para a execução dos projetos. A etapa de detalhamento durou cerca de quatro semanas e o manual de produção era um dos itens a ser entregues aos professores junto do relatório. 3.5.4

Interações na sala de aula

Assim como no projeto “Planejamento” (DSG1002) o processo de projeto “Produção e Distribuição” (DSG1005) também se desenvolveu ao longo de diferentes au-

113

las, com dinâmicas diferentes. As semelhanças também se estenderam às maneiras de aula empregadas pelos professores regentes e os professores de conteúdo. Ou seja, durante as aulas dos professores regentes da disciplina normalmente ocorria o atendimento aos grupos, enquanto nas aulas de conteúdos privilegiavamse as aulas expositivas e palestras. Os conteúdos também se relacionavam à disciplina, no entanto havia uma relação explícita entre os conteúdos e o briefing definido pelos professores. •

Logística e distribuição: propunha o conhecimento sobre armazenamento, transporte e distribuição, enfatizando as técnicas planejamento. Relacionou-se às etapas de conceituação e detalhamento.



Branding: propunha apresentar o tema da construção da marca junto ao

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

mercado. Relacionou-se à etapa de conceituação. •

Inovação: propunha o desenvolvimento de ideias e soluções diferentes e inusitadas em um projeto, enfatizando estudos de caso e uso de novas tecnologias. Relacionou-se às etapas de conceituação e de geração de alternativas.



Representação 3D: propunha uma introdução às ferramentas de representação tridimensionais, para projeto e maquete eletrônica, enfatizando as possibilidades de uso do software. Relacionou-se às etapas de geração de alternativas e detalhamento.



Responsabilidade socioambiental: propunha o conhecimento sobre os impactos da cadeia produtiva na sociedade e no meio-ambiente, enfatizando estudos de caso de empresas e o debate sobre a sustentabilidade. Relacionou-se às etapas de conceituação, planejamento, geração de alternativas e detalhamento.



Design Gráfico: propunha os conhecimentos sobre produção gráfica, enfatizando o detalhamento técnico e especificações para produção. Relacionou-se à etapa de detalhamento.



Design de Produto: propunha os conhecimentos sobre produção industrial, enfatizando o detalhamento técnico e especificações para produção. Relacionou-se à etapa de detalhamento. Assim como em DSG1002, no projeto “Produção e distribuição” as aulas de

conteúdos não eram focadas nos projetos dos grupos, mas na apresentação dos conteúdos. As aulas eram direcionadas a todos os alunos, independente dos projetos, embora possuíssem o Fashion Rio como um tema comum. Já as aulas dos professores de projeto eram mais focadas nos desenvolvimentos dos projetos dos grupos, enfatizando aspectos singulares e menos gerais.

114

Porém próximo ao final da disciplina, os professores dos conteúdos de Design Gráfico e Design de Produto passaram a orientar os projetos que necessitavam de detalhamento ligado a essas áreas.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Apresento a seguir um exemplo do que seria uma aula típica nesse projeto: Eu havia chegado na sala às 7 horas da manhã, o horário que a aula deveria iniciar, não havia ainda alunos. A sala estava arrumada de maneira incomum com uma grande mesa montada no centro, formada pelas mesas. Sentei-me em um lugar próximo à mesa do professor, fora do “mesão” e aguardei. Uma primeira aluna chegou e sentou-se em seu lugar na mesa. Ela estava usando um aparelho de mp3 e permaneceu ouvindo música enquanto aguardava a aula. O professor do conteúdo de logística chegou pouco depois, notou que não havia quase alunos para começar e resolveu esperar. Cerca de dez minutos depois decidiu iniciar a aula, que contava com cerca de seis alunos espalhados ao redor da mesa. O professor encontrava-se à frente da sala, havia conectado seu próprio laptop ao projetor digital e estava com a apresentação de slides projetada sobre a tela quando começou a aula. Aquela era a quarta aula e o professor dava continuidade ao tema, falando sobre empresas da cadeia de suprimentos. Os alunos chegavam aos poucos, ocupando seus lugares na mesa. Enquanto o professor falava na frente da sala alguns alunos acompanhavam, enquanto outros desenhavam, conversavam entre si, ou interagiam com seus laptops. As interações com os laptops eram variadas, havia alunos desenvolvendo seus produtos no computador, outros aproveitavam o acesso a internet para pesquisar imagens e referências para trabalhar no projeto, enquanto outros poderiam estar apenas se distraindo com algo sem relação direta ao projeto. Eu havia trazido alguns livros que havia adquirido durante um congresso na semana anterior. Um dos livros tratava de catálogos (100 ideas para diseño de catálogos) e resolvi mostrar para duas alunas cujo projeto tratava de um catálogo para o Fashion Rio (havia dois grupos com esse tema na turma). As alunas ao verem o livro se entusiasmaram e começaram a folheá-lo durante a aula, olhando as diferentes soluções apresentadas no livro e comentando entre si o que haviam gostado. Os alunos pareciam um pouco dispersos, até que o professor direcionou uma pergunta para os alunos e retomou a atenção. Perguntou se as pessoas conheciam o funcionamento da empresa “Amazon”. Alguns tentaram responder e o professor complementou as informações, e aproveitou a atenção para exemplificar como funcionava a logística da empresa de vendas de livros online. Depois o professor apresentou outro caso, dessa vez sobre a ong “Médicos sem fronteiras” e explicou a importância da organização e planejamento para que o serviço funcionasse de maneira eficaz. Ao término do primeiro tempo de aula ainda havia alunos chegando, mas a turma já estava praticamente completa. O professor de conteúdo avisou que na aula seguinte haveria o “jogo de negócios”, uma dinâmica para que os alunos simulassem algumas situações apresentadas nas aulas. Para realizar o

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

115

jogo, pediu que os alunos se lembrassem e chegassem cedo. Ele também lembrou aos alunos que as apresentações de slides estavam disponíveis no site e solicitou que os alunos estudassem antes de vir para próxima aula. Quando o primeiro tempo de aula terminou, a professora da disciplina já havia chegado e ocupado um lugar na mesa ao meu lado e ficou trabalhando em seu laptop aguardando a aula terminar. O professor de conteúdo saiu e logo depois o professor da disciplina também chegou. Alguns alunos saíram da sala ao término da aula de conteúdo, para retornar mais tarde com lanches nas mãos. Os professores passaram visitar os alunos, de grupo em grupo perguntando sobre o andamento dos projetos. Os alunos, que eram atendidos expunham suas dúvidas para os professores e pediam aconselhamento. Naquela aula, ao invés de seguir os professores resolvi observar o que os alunos faziam. Me aproximei de um grupo que estava com livros sobre com a mesa repleta de objetos: livros, fotografias, uma dissertação de mestrado e amostras de rendados. O tema do grupo era uma exposição sobre a renda de bilro e os alunos decidiram pesquisar mais sobre o assunto. Naquele momento estavam fazendo um levantamento bibliográfico e iconográfico como parte da pesquisa para fundamentar o projeto. Na outra mesa, uma das alunas para quem eu havia emprestado o livro estava desenhando em seu caderno enquanto sobre sua mesa repousavam livros, papeis com desenhos e marcas de tintas diferentes. A aluna estava pesquisando estilos e técnicas diferentes de ilustração para empregar no catálogo. Aquela aula dos professores regentes não foi seguida por uma aula de conteúdo. Ao invés disso os professores permaneceram na sala, atendendo às dúvidas dos alunos. Próximo do término, os professores pediram que os grupos apresentassem os projetos. A apresentação foi informal, diferente dos momentos de avaliação em que os alunos preparam o material e se posicionam na frente da sala. Naquela apresentação os alunos falaram dos lugares onde se encontravam, apresentando esboços e cadernos para os professores. Um grupo que também fazia projeto de catálogos abriu o programa de diagramação no laptop e ligou ao projetor, expondo para os professores o que haviam feito. A professora comentou alguns aspectos gráficos e deu algumas sugestões ao grupo. Outro grupo trabalhava uma exposição que tinha por tema a África por antecipar o evento da copa do mundo de futebol, em 2010. Na hora de apresentarem, os alunos foram à frente da sala e mostraram duas folhas com colagens de imagens diferentes sobre o tema. A colagem estava sendo empregada por eles para identificarem tendências de traços, formas e cores para o desenvolvimento de ilustrações que seriam utilizadas no espaço. Algumas os alunos mostraram algumas das ilustrações em processo de desenvolvimento. Enquanto parte do grupo falava, os outros alunos desenhavam no quadro a estrutura do espaço em que pretendiam realizar a exposição. A fala dos alunos constantemente se referia aos elementos visuais, ora aos recortes de imagens, ora às próprias ilustrações e ora aos desenhos no quadro.

116

Ao fim do terceiro tempo de aula relembraram os alunos sobre os prazos e comentaram que na semana seguinte iriam realizar a G0, que funcionaria como uma apresentação prévia, antes da avaliação. (DSG1005 - segunda-feira, 21 de setembro de 2009) A situação acima apresenta um dia de aula de três tempos, em que o primeiro tempo o professor de conteúdo esteve presente e no segundo e terceiro tempo foi a vez dos professores de projeto. Alguma situações presentes no caso acima não eram típicas: a organização da mesa como uma grande mesa não era um formato comum. Por sua vez, o emprego de dois tempos de aula pelos professores de projeto era uma prática ocasional, rara mais não incomum. A ênfase dada à produção e distribuição, conforme apresentado no processo de projeto, antecipou e prolongou as etapas de geração de alternativas e detalhamento. Os PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

próprios professores regentes destacaram que os produtos deveriam estar planejados na G1 para desenvolver os aspectos de produção e distribuição. Nesse sentido houve uma ênfase maior aos aspectos técnicos e produtivos, que de acordo com o currículo é uma das características que diferencia os projetos básicos dos avançados. A aula de conteúdo de logística e distribuição apresentada liga-se diretamente aos elementos apresentados no briefing apresentado pelos professores. Nesse caso a relação era explícita e o conteúdo seria cobrado como parte do manual de produção. Ainda assim, as aulas dos professores regentes ainda eram privilegiadas sobre as aulas dos professores de conteúdo. O exemplo acima mostra uma das situações em que alguns alunos chegam mais tarde, mas a tempo da aula dos professores regentes. Um outro motivo para os atrasos também estava ligado ao horário. Durante as aulas era comum ouvir alguns alunos se queixarem pelo fato da aula começar às sete horas da manhã. De fato, alguns alunos aparentavam estar com sono quando chegavam na sala para o primeiro tempo. Entretanto, não era apenas devido à pontualidade que considero o favorecimento das aulas dos professores regentes. As atividades desempenhadas em sala de aula, como as pesquisas e o trabalho no desenvolvimento dos produtos mostrava que a atenção de parte dos alunos estava voltada para o trabalho que iriam mostrar no próximo tempo de aula, quando os professores chegassem. Apesar de não contar com a atenção integral dos alunos, o professor de logística seguiu sua aula, apresentando os conteúdos relativos ao tema. Ao invés de chamar a atenção dos alunos, reprovando a dispersão, ele continuou apresentando e demandando que os conteúdos seriam empregados na dinâmica da aula seguinte. Com isso ele estabeleceu uma forma de cobrar os conteúdos das aulas, demandando que os alunos consultassem o material disponibilizado no site.

117

Como os alunos do projeto DSG1005 não conceituam seus projetos a partir da observação participante, o uso de referências bibliográficas e iconográficas é frequente. No caso apresentado tantos livros e dissertações como fotografias e amostras de material fazem parte dos procedimentos de pesquisa. Ao longo das aulas, percebi que os alunos aproveitavam o tempo de aula para trabalhar os projetos em sala. Liam suas referencias de pesquisa, desenhavam alternativas dos produtos, empregavam os laptops para pesquisa, diagramação, modelagem e outras atividades ligadas ao projeto. Apesar de os alunos do projeto básico também trabalharem os projetos em sala, fiquei com a impressão que os alunos do projeto avançado se dedicavam mais ao trabalho em sala. Essa dedicação pode ser atribuída a vários motivos, entre eles a maneira como a disciplina DSG1005 foi conduzida, exigindo um alto grau de detalhamento PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

dos produtos. Enquanto o projeto “Planejamento” favorecia a observação e experimentação junto ao grupo social, o projeto “Produção e Distribuição” favorecia a criação e o detalhamento dos produtos. As exigências de projeto demandavam uma maior elaboração sobre os aspectos dos produtos. Outro aspecto a ser considerado é a experiência dos alunos. Por se tratarem de alunos de quarto, quinto e sexto períodos, já possuíam mais vivência nas disciplinas de projeto, diferente daquela dos alunos do projeto DSG1002, em que a maioria estava no segundo período. Assim, estariam mais aptos a gerenciar o tempo de sala de aula por saberem o tempo gasto para desempenhar tarefas simples ou complexas, desde redigir e imprimir o relatório, como conceber e detalhar uma marca empresarial. Além disso, muitos alunos da turma estagiavam em escritórios de design ou empresas ligadas à área, o que demandava tanto um melhor aproveitamento do tempo, como também uma experiência prática em certas atividades que facilitavam o desenvolvimento dos projetos. Sobre o arranjo da sala, chamou-me a atenção o fato de nem o professor de conteúdo e nem os professores regentes alterarem a disposição das mesas para suas aulas. Da maneira como estava arrumada, a sala permaneceu e as aulas, ainda que com dinâmicas e propósitos diferentes, foi mantida. Da maneira como estavam dispostas a mesas, era mais fácil para os alunos dos diferentes grupos observarem os materiais e objetos repousados sobre as mesas. Alguns alunos de grupos diferentes emprestaram os livros entre si, já outros pediam para ver um desenho ou outro objeto sobre a mesa. Os recursos presentes na sala, como o quadro e o projetor foram empregados espontaneamente pelos alunos de forma a auxiliar na explicação de seus proje-

118

tos. Mais de um grupo utilizou o quadro para desenhar as estruturas e um grupo empregou o Datashow para projetar a tela do trabalho ainda em desenvolvimento. A partir do exemplo apresentado, busquei evidenciar que o processo de projeto na disciplina DSG1005 não se desenvolveu de maneira independente das dinâmicas de aula e das apropriações do espaço e dos recursos materiais. Pelo contrário, as apropriações dos espaços e recursos viabilizaram as atividades de exposição, argumentação, orientação, projeto, pesquisa entre outras. As aulas também assumiram dinâmicas diferentes de acordo com os objetivos das aulas. No exemplo, fica claro que a aula do professor de conteúdo assume o formato de aula expositiva, enquanto os professores regentes trabalham no formato de atendimento. Ao fim da aula, também houve o formato de apresentação, em que os alunos expuseram seus trabalhos para a turma. PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

A diversidade de dinâmicas e formas de apropriação do ambiente de sala de aula contribuíram para que os projetos se desenvolvessem da maneira como foram desenvolvidos. Mudando-se alguns recursos, como por exemplo o acesso a internet na sala, os alunos teriam que realizar as pesquisas de referências bibliográficas e iconográficas em casa ou em livros, portanto algumas práticas foram viabilizadas pelas condições oferecidas. 3.6

Atividades paralelas em DSG1002 e DSG1005

Conforme apresentado nas descrições das aulas, ambos os processos de projeto “Planejamento” e “Produção e Distribuição” não se desenvolveram apenas mediante as interações professores-alunos. Boa parte das atividades em sala de aula são protagonizadas pelos alunos, quer estejam relacionadas ou não ao desenvolvimento de projetos e constituem parte da ambientação das salas de aula. São atividades paralelas do ponto de vista dos professores, pois significa que os alunos não estão engajados diretamente na mesmas atividades que eles. Diversas atividades paralelas ocorreram durante as aulas, independentemente de serem expositivas, oficinas, dinâmicas, apresentações ou mesmo atendimento. Alguns alunos conversam, seja sobre o projeto ou não, alguns se retiram da sala para retornarem no momento de atendimento, alguns aproveitam para projetar ou construir seus objetos na sala ou no laboratório, alguns desenham, fazem trabalhos de outras disciplinas, leem livros, jornais, revistas ou quadrinhos, ouvem música, jogam jogos eletrônicos em aparelhos portáteis, entre outros. Embora muitas atividades não tenham relação direta com o projeto, tais atividades são constantes e, por vezes, geram indisposições com professores regentes e de conteúdo. Especialmente nas aulas expositivas, tais atividades são menos toleradas por professores de disciplina e professores de conteúdo, que acabam demandando a

119

atenção coletiva dos alunos, especialmente em relação às conversas. Durante as aulas dos professores regentes as atividades paralelas são toleradas, uma vez que não interfere nas orientações e no funcionamento da aula. 3.6.1

Conversas

O teor das conversas admite diferentes temas, como o cotidiano universitário, profissional, pessoal ou assuntos mais gerais, como notícias, filmes e músicas. Os assuntos ligados à universidade podem tratar de questões relativas aos seus respectivos cursos, explicações, comentários e discussões sobre os projetos ou trabalhos de outras disciplinas, comentários sobre professores e alunos, discussão sobre eventos e atividades, escolha de disciplinas e planejamento da matrícula, entre outros. Os assuntos referentes ao cotidiano profissional envolvem discussões sobre PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

trabalhos próprios ou de terceiros, comentários sobre diferentes mídias relacionadas à área profissional ou áreas afins, discussões sobre práticas, teorias e ética da profissão, explicações de técnicas e macetes de diversos teores ligados à atividade profissional, conversas sobre oportunidades de trabalho, estágios, concursos e “freelas” (trabalhos freelance), comentários e discussões sobre eventos de design e áreas afins, etc. Assuntos de ordem pessoal também constituem temas de conversa tais como discussões sobre relações com colegas, amigos, família e namorados, comentários e planejamento de atividades de lazer e consumo, discussões sobre opiniões e gostos pessoais, entre outros. Além disso, há conversas sobre assuntos de outras ordens como fatos cotidianos, situações urbanas, filmes, músicas, livros, quadrinhos, notícias de jornais e revistas, quadrinhos, etc.

Figura 3-10 - Conversa entre alunos enquanto aguardam o atendimento no projeto DSG1002

120

3.6.2

Desenhos

Seja por obrigação ou espontaneidade, diversos alunos desenham durante as aulas. Os desenhos são de diferentes naturezas, objetivos e temas. Há estudos geométricos, anatômicos, de perspectiva, de objetos, de marcas, de personagens, de vestuário, de estruturas bi e tridimensionais, de movimentos, de filmes e animações, de padrões e grafismos, entre outros. Os estudos (raffs, sketchs, esboços, rascunhos, concept art, storyboard) são normalmente desenhos feitos sem grandes preocupações com acabamento, pois têm como objetivo estudar as possibilidades de forma antes de uma arte final. Por esse motivo, costumam ser feitos rapidamente, com pouca precisão ou concisão de linhas, uma vez que podem usar linhas que auxiliPUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

em na estruturação do desenho. Há ilustrações de personagens, de cenas, de vestuário, de objetos, de natureza, abstratos, entre outros. As ilustrações (arte, desenhos) são desenhos feitos com maior cuidado no acabamento, cujo objetivo é mostrar, descrever algo ou simplesmente criar uma ambientação. Por ter um comprometimento com algum objetivo, as ilustrações devem ser claras quanto ao seu conteúdo, por isso os traços tendem a ser mais precisos e concisos. Os objetivos podem ser os mais diversos, como a aplicações em trabalhos de faculdade, apresentações, produtos, projetos pessoais ou mesmo sem aplicação específica. Há desenhos de natureza técnica de objetos (desenho técnico), arquitetura (planta-baixa), vestuário (modelagem), marcas e projetos gráficos (grid, malha gráfica), interfaces eletrônicas (estrutura, wireframe), estampas, padrões e grafismos (padronagem), entre outros. Tais desenhos têm por objetivo a especificação e detalhamento da construção ou reprodução de determinado produto. Por seus objetivos, os desenhos técnicos possuem convenções específicas e exigem alto grau de precisão quanto ao uso de medidas e linhas. Há também os desenhos sem propósitos específicos, de natureza livre, que muitas vezes constituem formas de passar o tempo (rabiscos, “desenho burro”, descomprometido, “desenho de telefone”, desenho automático). Tais desenhos podem se relacionar aos estudos ou ilustrações, podem possuir naturezas híbridas, ou mesmo compreender os casos que não enquadram nas classificações anteriores. Formalmente, não possuem uma característica distintiva, por não possuírem propósitos específicos.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

121

Figura 3-11 - Aluno desenhando durante a aula de DSG1002

3.6.3

Construção de modelos físicos

Ao longo das aulas, especialmente nos momentos próximos da conclusão, os alunos aproveitam o espaço e o tempo das aulas para construção de modelos e protótipos de seus projetos. Os modelos físicos têm como objetivo comum a representação física e tridimensional do objeto, mas variam bastante em relação à escala, acabamento, materiais e processos. Os modelos físicos são desenvolvidos empregando papéis, madeiras, tecidos, plásticos, metais, entre outros. Servem a diferentes propósitos como a exploração de possibilidades da forma, estudo das dimensões e proporções, testes de uso, entre outros. De acordo com os propósitos são definidos os materiais e os níveis de detalhamento, passando de representações mais rudimentares a modelos funcionais, com tamanho, materiais e funções que o objeto final terá. Cabe ressaltar que nas disciplinas de projeto os alunos, muitas vezes, não chegam a gerar o produto, pois este seria resultado de um processo industrial de fabricação, envolvendo custos e estruturas indisponíveis. Ocorre que na maioria dos casos, os alunos desenvolvem modelos tridimensionais tais como mock-ups, modelos volumétricos, modelos funcionais, modelos de apresentação e maquetes ou protótipos.

122

Há modelos que funcionam como croquis 3d, ou sketchs que são modelos menos detalhados e com materiais diferentes apenas para um estudo preliminar da forma. Há modelos de nível intermediário, como os mock-ups, os modelos volumétricos e os funcionais, que não possuem grande nível de detalhamento, podem ser feitos em escala ou não, em materiais diversos e atendem ao desenvolvimento do produto. Os modelos de apresentação, por sua vez, são modelos detalhados, suas medidas e proporções devem ser precisas, normalmente na mesma escala do produto (a maquete é uma exceção), e já simulam acabamentos e superfícies. Por fim, os protótipos são modelos que buscam simular todos os aspectos do produto, exceto o seu processo de produção. Por isso os protótipos são detalhados, possuem a mesma escala do produto e, se não são feitos no mesmo material, tendem a simular os materiais do produto final. PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Os modelos físicos são desenvolvidos na sala de aula ou no laboratório de volume e prototipagem, que conta com maquinário especializado para determinadas funções, como serras, lixadeiras, furadeiras etc. Dependendo das necessidades dos projetos, os alunos podem desenvolver seus modelos na sala, no laboratório ou mesmo contratando uma empresa especializada.

Figura 3-12 - Dupla de alunos construindo o modelo durante a aula de DSG1002

123

3.6.4

Leituras As leituras são as mais variadas, com objetivos e temas diferentes. Há leituras

ligadas ou não ao projeto, leituras como passatempo, leituras como tarefas de outras disciplinas, ligadas ou não à área de design, etc. Os meios também são variados como jornais, revistas e livros, além de materiais oriundos de páginas da internet. Muitas leituras em sala de aula assumem o propósito de passar o tempo, seja para aguardar o atendimento, ou como forma de distração da aula expositiva ou oficinas e dinâmicas. Independentemente do conteúdo, vários materiais podem atender a essa necessidade, que normalmente se caracteriza, devido ao movimentado ambiente de sala de aula, por leituras que exigem menos concentração, como jornais (Destak, O Globo) , revistas especializadas (Computer Arts, Zupi, Design

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Gráfico, Digital Designer), revistas de notícias (Veja, Época), revistas em quadrinhos (americanos e japoneses) ou mesmo livros técnicos e especializados . Nos materiais ligados ao design, circulam livros e revistas especializadas nas diferentes áreas afins: ilustração, fotografia e artes (Zupi), softwares e técnicas de computação (Digital Designer, Computer Arts), aspectos da profissão e portfolios (Design Gráfico e Zupi) entre outras. Os livros também abordam diversos aspectos relacionados ao design, como história, técnicas e processos (ABC do Rendering), fundamentos e projetos em design (Novos Fundamentos do Design Gráfico, Pensar com Tipos) uso de programas e recursos computacionais, catálogos e compêndios sobre objetos e estilos (+100 ideas de diseño de catálogos, Essential William Morris, Catálogo SIB, Logo Design) etc. Os materiais ligados ao design são fartamente ilustrados, com fotografias e desenhos de diferentes naturezas, que são vistos, comentados enquanto circulam entre os alunos. Quando consideram algo interessante, os alunos mostram para os outros, chamando a atenção de determinado aspecto a ser observado. A partir das imagens os alunos deduzem os conteúdos e tentam compreender do que se trata. Quando há dúvidas, ou querem se aprofundar no assunto eles leem o texto associado às imagens. Leituras de textos teóricos, pertinentes ou não à área de design, mas vinculados ao tema dos projetos são lidos fora da sala de aula. Os professores regentes recomendam ou emprestam livros que possam auxiliar a compreender o assunto abordado, mas não é um tipo de leitura que ocorre em sala de aula.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

124

Figura 3-13 – Alunas lendo durante aula de DSG1005

Figura 3-14 - Aluna lendo as anotações do caderno durante a aula DSG1002

3.6.5

Jogos

Outra forma de distração durante as aulas são os jogos eletrônicos devido a presença de celulares e outros dispositivos de jogos eletrônicos portáteis (Ipod, Nintendo DS e PSP etc.). No caso, observei apenas dois alunos jogarem durante as aulas de DSG1002. Como assunto, os jogos eletrônicos também constituem um tópico de conversa, especialmente entre os homens da habilitação de Mídia Digital.

125

3.6.6

3.6.6 Atividades fora da sala

Embora a observação tenha se concentrado na sala de aula, foi possível verificar algumas das atividades desempenhadas fora da sala, seja pela menção delas ou pelo fato de ter encontrado os alunos do lado de fora. Dentro do período de aula, os alunos desempenham diversas atividades fora de sala, que se relacionam ou não com o projeto e apresentam os propósitos mais variados: conversar com alunos de outras disciplinas, atender o telefone celular, se alimentar, comprar algum material, buscar algo no departamento para os professores, fazer trabalhos acadêmicos ou profissionais, entregar trabalhos de outra disciplina, imprimir algum material ou trabalho, trabalhar nos laboratórios, fazer uma pausa ou mesmo matar aula. Fora do período de aula existem diversas atividades relacionadas ao projeto,

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

como visitar e observar o local de projeto, comprar materiais, redigir o relatório, desenhar, modelar, ler, entre diversas outras. O trabalho fora do período de aula é fundamental para o desenvolvimento dos projetos, pois dentro do tempo de aula é inviável realizar todas as tarefas exigidas. No caso do projeto DSG1002 e dos projetos que empregam o Design em Parceria, a atividade fora de sala é obrigatória. Os espaços fora da sala de projeto compreendem espaços dentro e fora da universidade, tais como os corredores das salas de aula; áreas de convivência; lanchonetes, restaurantes, lojas, papelarias e livrarias dentro e fora do campus; laboratórios de computação, ensino e pesquisa; outras salas de aula; biblioteca; secretaria do departamento e órgãos administrativos da universidade; lojas de materiais nos arredores ou distantes do campus, locais de projeto, etc. O envolvimento com as atividades fora de sala faz com que nem todos os alunos estejam presentes na sala. Quando as atividades são relacionadas aos projetos, como compra de materiais, trabalhos nos laboratórios, pesquisas, trabalho de campo, entre outros, as ausências são empregadas pelos alunos como justificativas, mais a título de satisfação aos professores, considerando que a política da universidade não permite abono de faltas. 3.7

Conclusões do capítulo

Neste capítulo apresentamos a observação participante nas aulas de projeto DSG1002 e DSG1005. Ao longo do capítulo abordamos os espaços físicos, o processo de projeto, a atuação dos professores e as interações em sala de aula, considerando o uso do espaço físico e dos recursos durante as aulas. Conforme constatamos, o processo de projeto é complexo e não se conforma a uma única prática. Ao contrário, envolve múltiplas estratégias e maneiras específicas mediante as quais é encarnado em práticas de ensino e aprendizagem nas aulas de duas disci-

126

plinas. Nesse sentido, as práticas de sala de aula se afastam de concepções idealizadas presentes no projeto pedagógico e no currículo, conforme exposto no capítulo anterior, para ganhar concretude nas interações entre alunos e professores. No plano das práticas que emergem os conflitos, causados pelas diferentes visões confrontadas e negociadas na interação social. No capítulo anterior, também observamos as constituições dos espaços de ensino mediante a lógica da hierarquia, e destacamos a maneira como a constituição do espaço físico da PUC-Rio estabelece, mediante seus recursos materiais e espaciais, parâmetros estruturantes para as a dinâmica das aulas. Ambas as aulas observadas neste capítulo ocorreram em salas localizadas no primeiro edifício da universidade, o Cardeal Leme, e trazem consigo uma herança modernista. Todavia, conforme ressaltam Edwards (2003, p.31) e Dayrell (1996, p.17), PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

apesar de estruturante, o espaço é apropriado, manipulado e transformado mediante as práticas da sala de aula. Nesse sentido, temos um espaço físico pensado a partir de uma racionalidade e funcionalidade modernista, concebido anos 50, com um mobiliário um pouco mais contemporâneo, com mesas amplas dotadas de rodas e equipamentos da era digital, como o projetor. Além dos recursos físicos distintos, temos também a variação nas dinâmicas de aula, em que ora é proibido conversar para se prestar atenção e ora conversar é essencial para desenvolver os projetos enquanto outros grupos são orientados. Portanto, como as observações indicam, não há uma única disposição física, uma única dinâmica e uma única abordagem, mas sempre múltiplas e, por vezes, vistas tanto como complementares quanto como contraditórias entre si. Nesse sentido, a ideia de hibridização é fundamental para que possamos compreender o ambiente de aula de projeto, Segundo Canclini (2003) a hibridização, se constitui de processos socioculturais nos quais estruturas ou práticas discretas, que existiam de forma separada, passam a gerar novas estruturas, objetos e práticas. Canclini contraria uma concepção moderna de cultura como fruto de um processo íntegro e contínuo, para compreendê-la como fruto de um processo fragmentário e descontínuo, no qual convivem diferentes concepções, práticas e temporalidades. Para Canclini, as culturas, em especial aquelas da América Latina, são caracteristicamente híbridas. Para o autor, mesmo durante certos períodos históricos em que se imaginava uma cultura dominante, sempre há a coexistência de múltiplas formas culturais referentes a outros momentos históricos. Trata-se, portanto, da convivência de múltiplas temporalidades no mesmo espaço e tempo. A aula de projeto pode ser compreendida como processo híbrido, na medida em que ela admite a convivência de diferentes concepções de ensino, práticas e temporalidades. Creio que tanto a ocupação do espaço, as formas de aula, as

127

atividades simultâneas e as expectativas de professores e alunos dão indícios deste ambiente híbrido. No que tange ao espaço há a convivência de formas modernas e prémodernas. A organização da sala de aula, por exemplo, revela diversos aspectos do modernismo arquitetônico, ao privilegiar a organização e distribuição racional dos espaços, separando-os e hierarquizando-os segundo suas funções. Neste sentido, a divisão do espaço da própria universidade apresenta espaços separados e organizados segundo sua função, como os espaços de ensino, de convivência, de estudo etc. Seguindo as correntes funcionalistas do modernismo arquitetônico, a sala de aula torna-se um dos lugares privilegiados para o ensino e a aprendizagem. Como mostra Dayrell (1996) a arquitetura das escolas tende a privilegiar a sala de aula como espaço que desempenha esta função, excluindo a possibilidade de se PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

considerar outros espaços de ensino e aprendizagem. Por esse motivo, o autor questiona a maneira como todo o resto do espaço é organizado de modo a tornar a função da sala de aula ainda mais eficiente: os corredores, por exemplo, devem garantir acesso rápido às salas, para que não se perca tempo com outras coisas. O espaço arquitetônico da sala, ampla e bem equipada, isola os alunos dos demais espaços da universidade, separando o espaço de aula do espaço de convivência. O isolamento se dá por diferentes sentidos: audição, visão e tato, uma vez que as paredes impedem os alunos de ver, ouvir ou tocar aquilo que fica do lado fora da sala. Com essa divisão, parece haver a tentativa de se criar um ambiente isolado que propicie e favoreça o ensino e aprendizagem (DAYRELL, 1996 p.147). Mas cabe questionar que tipo de entendimento de ensino é este, que demanda um lugar especial, destacado das relações e atividades cotidianas, concebido especialmente para a função reflexiva. A princípio, a concepção modernista do espaço (racional e funcional), uma concepção moderna de ensino, de caráter objetivo, central nas teorias tradicionais e dominantes da Educação (OLIVEIRA, 2009), que organiza e hierarquiza os conhecimentos, desvinculando-os das práticas cotidianas. Nesta concepção, acompanhando a separação não apenas dos espaços, como também do tempo, dividido entre os diferentes conteúdos em horários compartimentados destinados ao exercício de uma função específica. A divisão do tempo e dos saberes opõe-se à integração e à mistura a que estes são sujeitados nas práticas cotidianas. Esse tipo de organização de tempo e espaço é caracteristicamente moderna e, como discutido na introdução, está ligado a formação de uma sociedade disciplinar (FOUCAULT:2007). Considerando os aspectos da organização administrativa da universidade e os espaços físicos que disponibiliza, a organização do tempo e do espaço se mantêm dentro de um parâmetro disciplinar: as aulas ocorrem segundo espaços e ho-

128

rários previamente definidos, organizados e adequados para o que se supõe ser as funções de ensino. Os currículos, de maneira geral também acompanham essa tendência, propondo disciplinas separadas que permitiriam, individualmente, ensinar aspectos ligados às diferentes práticas profissionais. Cada disciplina com um horário separado, em uma sala separada com avaliações autônomas e separadas. Simultaneamente, a proposta da disciplina de projeto rompe com alguns aspectos dessa concepção disciplinar. Para começar, há dois professores regentes que, independentemente das pautas, atuam em conjunto avaliando os grupos de alunos das duas turmas, que passam a funcionar como uma única turma. Este aspecto já afeta as relações na medida em que divide a autoridade entre duas pessoas com opiniões distintas. Outro aspecto diz respeito à integração das aulas de conteúdos dentro da PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

disciplina. A aula deixa focar apenas no planejamento e desenvolvimento de projetos, em seus aspectos práticos e metodológicos, mas passa a incorporar também conteúdos específicos e direcionados aos projetos. A inserção das aulas de conteúdos estabelecem as trocas de professores na sala e a redução do controle dos professores das disciplinas, que já não acompanham as aulas integralmente. Conforme apresentado no capítulo anterior, a própria inserção da proposta dos professores de conteúdo implica negociações com o sistema de contratações. Afinal, dentro de um sistema administrativo que pressupõe uma organização disciplinar, torna-se um problema remunerar um professor que não esteja associado diretamente a uma turma e uma sala. Assim, a convivência de concepções de ensino e propostas distintas também se refletem nos aspectos administrativos. Além disso, a diversidade de professores com diferentes formações e alunos, de diferentes habilitações interagindo nas mesmas salas estabelecem dinâmicas múltiplas de abordagem e concepções de ensinos distintas. Não há uma única abordagem nos projetos e nem um único ponto de vista estabelecido e, dessa maneira, o processo de projeto só pode se realizar mediante a negociação entre as partes envolvidas. Em contraste às concepções tradicionais e dominantes, situam-se as concepções críticas da educação, que compreendem “o conhecimento escolar como resultantes de um processo que envolve debates, divergências, competição e negociação na escolha do que irá conduzir ou fazer parte dessas experiências educacionais” (OLIVEIRA, 2009, p.18). As abordagens críticas favorecem a formação e o questionamento, contemplando o conhecimento não como um produto, mas como o resultado de um processo. Como vimos anteriormente, o processo de projeto como proposta pedagógica está previsto e planejado no currículo. As aulas de professores regentes e de

129

conteúdo, a fusão das turmas, os olhares múltiplos sobre os temas estão no plano das ideias que guiaram o projeto pedagógico. Mas é mediante as práticas e interações, realizadas dentro de um espaço em dadas condições materiais que o processo de fato se realiza. Os hibridismos nas práticas de salas de aula, se encarados dentro de uma perspectiva pedagógica, é o que possibilita uma formação crítica. Em relação às apropriações do espaço, constatamos que apesar de uma arquitetura que privilegie o isolamento, a hierarquia e a compartimentação de saberes (DAYRELL, 1996), há situações em que esta ordem é subvertida. Quando os alunos saem da sala, quando trazem outras atividades para dentro da sala, quando transformam a sala em espaço de convivência ou lazer, subvertem o uso do espaço segundo sua função objetiva. O espaço da sala também é subvertido pelos professores regentes da disciPUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

plina e de conteúdo, quando intervém na disposição tradicional das mesas. Quando eles saem da frente do quadro, seu palco tradicional, e passam a circular em outros lugares da sala, a reposicionar os alunos e a sentar-se juntamente com os alunos, desconstroem algumas hierarquias reforçadas por uma disposição tradicional. Além disso, eles ressignificam o espaço ao criarem outros usos, como quando utilizam o carpete que reveste as paredes como suporte para os cartazes. Embora a arquitetura da sala sirva ao isolamento e favoreça a disciplina do ambiente de sala, as mesas da sala, pelo contrário, tendem a agrupar os alunos, a incentivar as relações e facilitar a reocupação criativa do espaço. Contrariando uma concepção tradicional em que os alunos devem assimilar os conteúdos apresentados pelos professores, as mesas potencializam as interações, as conversas, os debates e os atendimentos. Elas possibilitam as trocas entre os alunos, que sentam em grupos para atividades relacionadas ou não à aula ministrada e entre eles e os professores. Além disso, a própria proposta do projeto de Design em Parceria obriga que o trabalho também se desenvolva num contexto extramuros. Esta proposta permite rever a sala de aula que, embora ainda seja um espaço privilegiado, já não é mais um espaço exclusivo de aprendizagem. Com as visitas ao local de projeto, ao laboratório e a outros locais, o aprendizado do projeto articula diferentes espaços, aproxima o universo acadêmico do cotidiano e favorece um “fazer reflexivo” (OLIVEIRA: 2009). Dayrell (1996, p.150) chama atenção para a maneira como a vivência dos tempos na escola é específica em cada momento e espaço. O autor compreende a constituição da escola por seus espaços e tempos ritualizados, em que as divisões dos momentos de convivência e estudo são segmentados. Também destaca os rituais ligados a datas específicas, como as semanas de avaliação. As aulas de projeto também se atêm a segmentação, desvinculadas de outras disciplinas do curso, com horários específicos , assim como também ritualizam certos

130

momentos, como as apresentações, nas quais os alunos são avaliados. Os diferentes momentos da aula, como as aulas dos professores de conteúdo e as aulas dos professores regentes da disciplina, implicam significados e posturas característicos. Enquanto nas aulas expositivas os professores de conteúdo tentam conquistar a atenção dos alunos, no atendimento são os alunos que disputam a atenção dos professores. As apresentações também são momentos significativamente diferenciados, pois por estarem atreladas à avaliação, acabam gerando apreensão por parte dos alunos. As posturas, atitudes e expectativas distinguem os momentos de apresentação dos outros momentos do curso. As relações com o tempo também se alteram, devido à simultaneidade de atividades. O tempo de aula deixa de ser exclusivamente tempo de ensino, alternando-se com tempos de trabalho, convivência e lazer. Enquanto estão em sala de PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

aula, os alunos realizam outras atividades relacionadas ou não com o projeto, como leituras, conversas, desenhos, modelos, entre outros. Portanto, a formação deixa de depender exclusivamente da relação professor/aluno, e passa a se estabelecer também por meio das trocas entre alunos na sala de aula. Se por um lado o tempo de aula é transformado em tempo de outras atividades, por outro lado, o tempo de outras atividades também é dedicado ao projeto. Tanto pela demanda do Design em Parceria de frequentar determinado contexto, quanto pelo uso dos laboratórios, biblioteca, entre outros, para o desenvolvimento dos projetos. As etapas relativas à visita ao campo, pesquisa e levantamento de dados, criação do modelo e redação do relatório ocorrem dentro e fora do espaço de sala de aula projeto. A apropriação do espaço e do tempo por professores e alunos admite, além da pluralidade de práticas, a convivência de diferentes posturas e concepções de ensino. A perspectiva tradicional se faz presente por meio de algumas atitudes e posturas, como a professora de conteúdo que espera uma sala disciplinada e quieta para que o aluno possa assimilar o conteúdo de sua aula. Ao mesmo tempo, esta concepção convive com o formato dos atendimentos, em que os professores admitem certa dispersão da turma, trabalhando as singularidades dos projetos, e incentivando que os alunos aprendam a partir de suas próprias experiências. Por esse viés, alternam-se na sala de aula os saberes hierarquizados e compartimentados, protagonizados pela figura do professor, com os saberes construídos a partir da experiência, em que os alunos assumem o papel principal. Esta segunda postura reforça o papel da escola como transformadora do indivíduo, na qual o saber pressupõe a experiência (Dewey apud OLIVEIRA, 2009, p.51). Assim, as aulas de projeto buscam, ou deveriam buscar uma prática reflexiva, como defende Izabel Oliveira (2009).

131

Embora ainda possua um papel privilegiado no ensino, a sala de aula de projeto tem uma estrutura prioritariamente modernista, mas assume características contemporâneas ao admitir a convivência de diferentes espaços e temporalidades, por meio de atividades e posturas simultâneas e, por vezes, concorrentes. Sua hibridação permite revisar sua importância como lugar exclusivo de ensino e aprendizagem, na medida em que outros espaços e outros tempos assumem papéis importantes no processo de construção de conhecimentos e da formação dos alunos. Estas características também admitem a revisão do papel dos alunos, ao assumir as interações entre eles, descentrando-se o papel do professor, ao colocá-lo como orientador ou mediador deste processo. Retomando as ideias de Bakhtin(2006) e Goulemot (1996), entendo que o ambiente da sala de aula de projeto participa das condições de enunciação e de PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

produção de discursos e sentidos. Se as interações entre professores e alunos constituem um espaço de disputas e negociações, me parece relevante ressaltar o papel que o espaço físico e a divisão do tempo exerce nesse processo. Vale lembrar que a sala de aula é apropriada, modificada pelas pessoas, ainda que limitada por uma disposição pré-determinada. Mesmo assim, é importante problematizar este espaço no sentido de trata-la como mais uma mediação a ser considerada, capaz de facilitar ou dificultar determinadas práticas na sala de aula. As apropriações levam a sobreposição de múltiplas identidades. Uma delas é a identidade da PUC-Rio, a partir de seus objetivos como instituição de ensino, sua missão, visão e proposta de ensino, que se desdobra na constituição de seu espaço arquitetônico, no sistema de créditos e na divisão dos horários, entre outros. Outra identidade envolvida corresponde ao Departamento de Artes & Design por meio de uma concepção particular de Design, a maneira como deve ser ensinado, que privilegia o enfoque do Design em Parceria, influenciando na constituição do curso, habilitações e currículo, além das orientações e diretrizes aos professores e alunos. Há também a identidade dos professores regentes de disciplina e de conteúdo, com suas ideologias, visões particulares de ensino, métodos e técnicas empregados, posturas e formas de apropriação do tempo e do espaço. Por último, mas não menos importante, há as identidades dos alunos, suas trajetórias pessoais, posturas, atitudes e visões de mundo, que se manifestam na maneira de se apropriar do tempo e espaço durante as aulas de projeto. A confluência destas identidades múltiplas e das diferentes formas de apropriação do tempo e do espaço caracteriza o hibridismo e os múltiplos sentidos (polissemia) na sala de aula. Outro aspecto que qualifica a hibridação na sala de aula é a convivência de saberes, técnicas e métodos artesanais e industriais. Embora diversos projetos contemplem os meios de produção industriais, os modelos, protótipos e produtos desenvolvidos

132

são, em sua maioria, provenientes de processos artesanais, ou semi-artesanais, conjugando técnicas industriais e artesanais. As oficinas de desenho, storyboard, argila, encadernação são algumas das aulas que incentivam a produção artesanal. O hibridismo presente nas aulas de projeto nos levou a pensar os projetos a partir de suas singularidades e a relação com a coletividade. Identificamos práticas recorrentes relativas as formas de interação, uso do espaço e dos recursos materiais. Essas recorrências nos permitiram pensá-las nas relações entre o singular e o coletivo e entre eventos isolados e as condições históricas que os determinam. Com isso, esboçamos um entendimento da noção bakhtiniana de gêneros para compreender tais relações. Porém, o reconhecimento e a identificação das práticas estava fundamentado apenas na minha observação. Conforme apontado pela banca de qualificação, a pesPUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

quisa carecia de outras vozes que pudessem também situar como se dá o projeto. Portanto, o próximo capítulo apresenta as representações das disciplinas de projeto do curso de graduação em Design da PUC-Rio segundo os pontos de vista dos alunos.

4 O projeto a partir da visão dos alunos: planejamento, coleta, tratamento dos dados e a análise preliminar

Este capítulo apresenta a atividade de representação realizada em quatro turmas de projeto. Primeiramente, descrevo as intenções, as justificativas que levaram as escolhas pela atividade de desenho. Em seguida, apresento minhas expectativas, o que imaginava que encontraria nos desenhos, face ao que foi apresentado. Posteriormente, discorro sobre os procedimentos de registro e organização dos desenhos e as maneiras como foram contabilizadas as ocorrências e selecionada as amostras para a análise. Finalmente, apresento os achados de pesquisa, contras-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

tando os elementos observados nos desenhos sobre as aulas de projeto com minhas observações de campo e tecendo observações e conclusões. Embora a atividade de representação que apresento aqui tenha proposto duas tarefas, focalizamos a presente pesquisa na análise da primeira atividade, por tratar da representação dos alunos sobre as aulas de projeto. A segunda tarefa tratava da representação do ambiente ideal de sala de aula para os alunos e será considerada para ilustrar algumas visões de sala de aula, a serem tratadas no capítulo seguinte. 4.1

Observações metodológicas gerais.

A proposta de uma atividade de representação gráfica (desenho) que evidenciasse as atividades, os momentos, os agentes e os espaços de sala de aula como fonte dos dados surgiu da premissa de que o desenho se constitui como uma atividade já praticada desde o início do curso pelo corpo discente, sendo utilizado, ainda no primeiro período letivo, como forma de relato dos locais e das atividades realizadas nas instituições ou grupos que os alunos frequentam durante as aulas de Projeto Básico Contexto e Conceito (DSG1001). A opção, portanto, considerou a relativa familiaridade dos alunos com a técnica proposta, além das próprias caraterísticas da técnica como viabilizadoras do encontro com as atividades, os momentos, os agentes e os espaços que me propunha a observar. A formulação da proposta contou com a orientação do professor Carlos Eduardo Félix da Costa, professor de desenho do curso e que trabalha o conteúdo de representação no projeto básico DSG1001. Segundo as orientações do professor, a tarefa de desenho deveria ser detalhada no enunciado e a proposta deveria

134

demandar aos alunos que se concentrassem nos detalhes e aproveitassem o tempo de execução da tarefa. Segundo o professor, caso não definisse as exigências do desenho, correria o risco dos alunos realizar desenhos muito simplificados e esquemáticos. Dessa maneira, o enunciado detalhado favoreceria a observação dos elementos espaciais e materiais das salas de aula. Além disso, o professor também me auxiliou a estabelecer o tempo para a atividade. Após a orientação do professor, trabalhamos na formulação do enunciado, apurando os termos e a maneira como abordar a proposta. Nossa intenção era que os alunos realizassem dois desenhos, um primeiro que narrasse como são as aulas e um segundo no qual apresentariam uma proposta de um espaço de ensino ideal. O primeiro desenho serviria como base para a análise de maneira que, a partir da descrição do funcionamento das aulas, pudéssemos identificar os aspectos espaciais e materiais das salas de aula. Porém, para não influenciar os alunos dire-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

tamente para a representação do espaço, a formulação da primeira tarefa enfatizou os aspectos das aulas, como os momentos, as pessoas e as ações. Já o segundo desenho serviria como uma espécie de controle, pois caso os espaços não estivessem evidentes no primeiro desenho, eles poderiam ser conferidos no segundo. Além disso, o segundo desenho permitiria identificar as expectativas dos alunos em relação as aulas de projeto. Portanto, o enunciado do segundo desenho deveria enfatizar os aspectos materiais e espaciais. A intenção inicial era realizar a atividade de representação gráfica em uma turma de cada disciplina de projeto. Porém, as especificidades do plano de aula de cada disciplina em comparação com o tempo de desenvolvimento da pesquisa, levou-me a restringir a amostragem a quatro dentre as oito disciplinas que compõem a grade de projetos do curso de graduação do Departamento de Artes & Design da PUC-Rio. Um dos critérios para a seleção das turmas foi a disponibilidade. As turmas em que os supervisores de disciplina e os professores se dispuseram a ceder uma aula para a realização da atividade foram selecionadas, com isso esperávamos encontrar alunos predispostos a atividade. Outro critério para a seleção foi a representatividade dentro dos três segmentos de projeto (básico, avançado e específico). Dessa maneira, houve duas turmas de projeto básico (DSG1002 e DSG1003), uma de projeto avançado (DSG1005) e uma de projeto específico (no caso, projeto de conclusão em Comunicação Visual - DSG1032). Realizei a atividade com as turmas entre a última semana de Setembro e as primeiras semanas de Outubro de 2011, de acordo com a disponibilidade das aulas. As turmas eram compostas por uma média de 18 alunos e cada espaço físico

135

contemplava duas turmas (média de 36 alunos), havendo em uma mesma sala de aula 2 professores de disciplina. Nas pautas das disciplinas constavam 38 alunos em DSG 1002, 38 em DSG1003, 40 em DSG 1005 e 28 em DSG1032. Apesar disso, nem todos estavam presentes ou participaram da atividade, sendo que a atividade envolveu 33 alunos de DSG1002 (86%), 26 alunos de DSG1003 (68%), 25 alunos de DSG1005 (62%) e 15 alunos de DSG1032 (53%). A atividade consistia em duas tarefas, que apresentavam os seguintes enunciados: Tarefa 1: Desenho de descrição (sem observação) Represente graficamente uma aula de projeto, situando os diferentes momentos considerando as pessoas, as relações entre elas e suas atividades naquele espaço. Tarefa 2: Desenho de idealização Represente graficamente o ambiente ideal para uma aula de projeto., situando os diferentes momentos considerando as pessoas, as relações entre elas e suas atividades naquele espaço

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Os alunos foram informados que deveriam executar duas tarefas, porém os enunciados só foram revelados pouco antes de cada tarefa. No caso da primeira tarefa, privilegiamos a descrição das aulas de projeto, os momentos e as interações, para que pudéssemos observar o espaço nessas circunstâncias. Na segunda tarefa ficava evidente a ênfase sobre o espaço e os recursos materiais presentes nas salas de aula, o que poderia comprometer a intenção da primeira tarefa. A apresentação dos enunciados foi lida por mim para as turmas e, em seguida, escrita no quadro, de modo que os alunos pudessem consultar durante a atividade. Cada aluno recebeu duas folhas de papel no formato A3 (29,7 x 42cm), uma para cada tarefa. Caso desejassem mais alguma folha, avisei a eles que seria concedida, bastando que solicitassem. O desenho foi realizado com as próprio material de desenho dos alunos, prevalecendo o uso de lápis, lapiseiras e canetas. Ambas as tarefas foram acompanhadas de instruções sobre a execução que deveriam ser seguidas pelos alunos, listadas a seguir: 1.

Desenhe da melhor maneira que puder de forma que se possa entender o que você está retratando, baseado em fatos e na sua experiência de curso.

2. A forma é livre: pode ser um desenho único ou a combinação de vários desenhos. 3. É proibido utilizar a escrita. Em casos de extrema necessidade, será admitida a escrita na forma de rótulos. 4. O tempo para a execução é de 40 minutos, e deve ser monitorado. A execução do desenho deverá ocorrer gerenciando o tempo. As instruções foram lidas após o primeiro e o segundo enunciado e serviram como orientação aos alunos sobre o aproveitamento do tempo e o detalha-

136

mento dos desenhos, de modo que pudessem explicar visualmente como ocorrem as aulas de projeto. Além das instruções, também pedi que os alunos se identificassem no verso dos desenhos, marcando o nome a habilitação e o período em que se encontravam. Também pedi que identificassem o número da tarefa, pois caso a sala ideal se assemelhasse a real, seria difícil distingui-las. Informei que os desenhos seriam empregados em uma pesquisa de doutorado, mas que não divulgaria os nomes dos alunos. A disposição das salas para a execução da tarefa seguiu a própria arrumação pré-existente, bem diversificadas entre si. No caso da turma de DSG1002 a sala L532 estava arranjada em grupos de 2 a 4 mesas, formando cinco grandes mesas. Na turma de DSG1003, na sala L260, o professor anterior havia arranjado as mesas lado a lado, formando um grande retângulo. A turma de DSG1005 encontrava-se na sala ART1 com a disposição padrão das mesas, enfileiradas diante do quadro. Por sua vez, a turma de DSG1032 situava-se na sala IMA01, com as mesas arranjadas em fileiras. Os

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

arranjos das salas estão representados esquematicamente na figura a seguir:

Figura 4-1 – Disposição das salas durante a proposta das atividades

Inicialmente, na primeira turma em que a atividade foi proposta, DSG1002, estabeleci o tempo de 40 minutos para a execução de cada tarefa de desenho. O tempo seria controlado e comunicado aos alunos e eles deveriam aproveitá-lo integralmente para a execução do desenho. Contudo, devido ao fato de muitos alunos terminarem seus desenhos com antecedência, o tempo foi reduzido para 30 minutos junto as outras turmas de modo a fazer os alunos aguardarem menos tempo para a realização da segunda tarefa.

137

Notei que durante a aplicação das tarefas, embora fosse solicitado que os alunos gerenciassem o tempo de execução para tentar detalhar e fazê-la no tempo previsto, o segundo desenho era realizado, na maioria dos casos em tempo inferior. Como a tarefa foi realizada durante as aulas e os alunos ao terminarem a segunda tarefa estariam liberados, infiro que em alguns casos o segundo desenho tenha sido acelerado para que os alunos conseguissem sair mais cedo. Penso ser necessário esclarecer aqui à natureza dos dados da pesquisa. Os desenhos foram resultados de uma atividade específica, construída e proposta de maneira separada do cotidiano das aulas de projeto e solicitados por mim no papel de visitante. Como vários alunos não me conheciam e a atividade não estava diretamente relacionada ao projeto, o estranhamento dos alunos à atividade deve ser considerado, mesmo quando consideramos que optamos por visitar turmas cujos professores demonstraram-se predispostos a colaborar. A minha interferência, como pesquisador, deve ser percebida tanto na consti-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

tuição dos dados, que deveriam atender às demandas da atividade proposta, como também na sua interpretação. Por se tratar de uma atividade planejada por alguém externo ao cotidiano das disciplinas de projeto, a natureza dos dados difere daquela colhida pelos professores da turma quando solicitam a observação de dados e a consequente apresentação dos mesmos através de desenhos. Assim, os desenhos realizados pelos alunos são frutos de uma interferência nítida deste pesquisador sobre o objeto de estudo, pois resultam de uma ação direta , ou seja, de uma proposta formulada e levada para salas de aula de disciplinas de projeto como um experimento. Ademais, devo considerar a existência de uma obrigatoriedade tácita na atividade como um fator influente na coleta dos dados. Como tarefa proposta durante uma aula, ela se tornou uma espécie de atividade de aula e adquiriu, de forma não assumida, um caráter mais ou menos obrigatório e pouco espontâneo. Assim, é possível que os alunos tenham sido induzidos a refletir sobre um tema que, embora faça parte do cotidiano, talvez não estivesse no rol das questões sobre as quais eles possuíssem uma opinião pré-formada. A espontaneidade dos desenhos, neste caso, pode ter sido cerceada pela demanda da atividade, o que pode ter modificado a forma e o nível de envolvimento e comprometimento dos alunos. 4.2

Expectativas e considerações

Devo confessar que minha expectativa sobre os desenhos, de um modo geral, era maior em relação ao nível de detalhamento, por tratar-se de uma pesquisa feita com alunos de Design que, desde o primeiro período, são estimulados, nas disciplinas de projeto a desenharem para retratar o contexto de trabalho e em outras disciplinas do curso para aprofundarem seus conhecimentos técnicos no âmbito

138

da representação em Design. Esperava encontrar desenhos bastante elaborados em relação aos detalhes, imaginando, inclusive, que me depararia com uma consciência nítida acerca dos objetos que rodeavam os alunos. Uma parte dessa expectativa deveu-se à suposição que os alunos, como designers aprendizes, entenderiam que todo objeto é fruto de projeto e, consequentemente, que a sala de aula, como um objeto, também seria construída a partir de um planejamento. Outra parte dessa expectativa deveu-se à maneira como formulamos o enunciado da atividade de desenho, pedindo que os alunos trabalhassem com detalhes. Além disso, solicitamos que os desenhos fossem “autoexplicativos”, ou seja, que fossem concebidos de maneira que eu, na qualidade de pesquisador, fosse capaz de ver e compreender independentemente das falas e explicações dos alunos. Com isso, imaginei que encontraria desenhos com detalhamento e caracterização suficientes que me permitissem distinguir professores de alunos, sexo, idade, humor etc. No entanto, muitos alunos optaram por desenhos extremamente sintéticos,

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

reduzindo as pessoas e objetos à formas geométricas primárias. De uma maneira geral, observei uma carência de caracterização, especialmente em relação às pessoas. Em muitos desenhos, elas foram representadas como “bonecos palito”, enquanto em outros, embora os corpos estivessem mais elaborados, as faces ficaram reduzidas aos traços estruturais, de forma circular/oval, às vezes com uma cruz para subdividir em hemisférios (característico da etapa de esboço e estruturação da figura humana em cursos de desenho). Muitas cabeças careciam de olhos, nariz, boca ou cabelo. Há casos de pessoas com expressão facial, mas sem cabelo e casos onde há cabelo mas não há rosto. Em suma, as representações foram bastante heterogêneas, como é possível observar nas representações abaixo (Figura 4-2), mas, foi possível concluir que predominaram as figuras intermediárias (bonecos palito e figuras esquemáticas).

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

139

Figura 4-2 - Diferentes níveis de detalhamento na representação de pessoas

Da mesma maneira, os formatos dos corpos também ficaram pouco detalhados. Em muitos casos, as proporções corporais foram sintetizadas de forma caricatural (braços e pernas curtas, cabeça grande). Diferenças em relação a altura, largura, porte físico entre outras praticamente não aparecem. As mãos foram constantemente reduzidas a traços ou círculos sem dedos de maneira esquemática. As posturas das pessoas foram retratadas, na maioria das vezes, de maneira reta e rígida, de forma pouco natural. Nos termos de Dondis (2007), a mensagem visual dos desenhos se afastou do nível representacional pela ausência de semelhança com os objetos (e sujeitos) representados. Desse modo, se aproximou em muitos casos dos níveis de abstração (mediante a síntese) e simbólico (mediante certas convenções de representação). Isso não significa que certos desenhos não apresentem qualquer semelhança

140

com as pessoas e objetos da sala, mas que não se privilegiou o “realismo” na forma de se representar. O detalhamento do espaço também foi pouco desenvolvido na maioria dos desenhos: em muitos casos não havia portas, paredes, janelas, entre diversos outros elementos presente na sala. Da mesma maneira, objetos e acessórios também foram suprimidos em muitos desenhos, tais como roupas, óculos, bolsas, mochilas, bonés, celulares que tiveram uma baixa ocorrência nas amostras. Os cenários foram, portanto, simplificados em muitos desenhos, deixando por vezes de indicar elementos comuns e presentes em muitas salas. Em muitos casos a sala, quando retratada, era definida por um grande retângulo, as mesas por retângulos menores (sem pernas quando visto de cima) e os objetos dispostos sobre a mesa por retângulos ainda menores. Em síntese, assim como a representação das pessoas, o espaço também foi representado de maneiras heterogêneas (Figura 4-3), mas a representação mais detalhada ocorreu em casos mais raros do que os que surgiram

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

na representação de pessoas.

Figura 4-3 – Níveis de detalhamento na representação das salas e dos objetos

A falta de detalhamento nos desenhos dificultou a maneira como identificar os elementos apresentados e, consequentemente, a interpretação dos dados . A

141

simplificação das figuras humanas dificultou na diferenciação das funções (alunos, professores, monitores) dos gêneros (homens e mulheres), das idades (jovens e velhos) e dos humores (alegria, tristeza, preocupação etc). A ausência de objetos e acessórios em alguns desenhos também dificultou o reconhecimento das pessoas em relação ao gênero, idade e função, pois certos elementos poderiam servir na caracterização destes aspectos. Da mesma forma, a caracterização dos espaços e salas também ficou comprometida em alguns desenhos, aspectos como a fonte de iluminação, o arranjo das mesas e cadeiras, os recursos disponíveis, entre outros, simplesmente não puderam ser deduzidos. Outro tipo de detalhamento diz respeito à maneira como as aulas foram retratadas. No enunciado, pedi que os alunos situassem “os diferentes momentos”. Entretanto houve diversos desenhos em que apenas um momento estava em evidência (Figura 4-4). Esses desenhos dificultaram a compreensão de como determinado momento se encaixava ao longo das aulas, ou se todas as aulas eram sim-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

plesmente daquela forma (o que ia contra a observação de campo efetuada em momento anterior da coleta de dados e apresentada no capítulo 3). Houve casos em que os alunos retratavam momentos simultâneos (Figura 4-5) de atividades de sala de aula e outros ainda em que os momentos estavam claramente divididos em etapas (Figura 4-6).

Figura 4-4 – Desenho com apenas um momento retratado

142

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Figura 4-5 - Desenho retratando momentos simultâneos

Figura 4-6 – Desenho retratando os momentos separados em etapas

Sobre a representação dos momentos, alguns alunos compreenderam o enunciado como a representação das etapas de projetos. Nesse sentido, representaram aspectos ligados ao planejamento, conceituação, geração de alternativas e detalhamento, conforme mostra o caso abaixo (Figura 4-7).

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

143

Figura 4-7 – Desenho retratando os momentos como as diferentes etapas de um projeto

Em outros casos, mais raros, os momentos foram representados como as diferentes atividades em sala de aula. Assim, abordaram as técnicas empregadas e dinâmicas presentes em sala de aula como oficinas, atividades como o brainstorming e debates, conforme mostra a figura abaixo (Figura 4-8).

Figura 4-8 – Desenho retratando os momentos como as diferentes dinâmicas de aula

144

Os dois exemplos ilustram a divergência na interpretação do enunciado, apresentando aspectos bem diferentes entre si. Considero, pois, que o enunciado mostrou-se ambíguo e admitiu a pluralidade de sentidos que levaram à representação tanto das etapas de projeto como dos diferentes tipos de aulas. Nem todos os desenhos careciam de detalhamento quanto a todos os aspectos, mas, de uma maneira geral, privilegiavam um ou outro aspecto, tornando-os, de uma maneira geral, mais simplificados do que a expectativa inicial. É claro que não se tratavam de desenhos de observação, pois a atividade pedia que desenhassem a partir da experiência, evocando suas lembranças como alunos ao invés de solicitar que retratassem aquela aula específica. Por um lado, isso pode ter sido um fator determinante na falta de detalhamento dos desenhos. Por outro lado, muitos desenhos tratavam da própria disciplina que cursavam e detalhes como as salas, os alunos, os objetos estavam presentes e poderiam ser observados. Infiro que o enunciado tenha ficado bastante abrangente. Solicitar aos alu-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

nos que representassem uma aula de projeto é uma tarefa complexa, repleta de elementos e variáveis. Possivelmente os alunos tenderam a simplificação das formas para que dessem conta de esboçar a complexidade das aulas de projeto. Contudo, sua elaboração contou com a orientação de um professor de desenho responsável pelas atividades de representação por observação em turmas de projeto. A opção pela escolha da orientação visava justamente a aproximar o enunciado do cotidiano dos estudantes, mas mesmo assim, foi possível observar a opção pela simplificação por parte dos alunos. 4.3

Representações das aulas de projeto: formas e conteúdos

Os desenhos foram realizados na grande maioria à grafite (lápis ou lapiseira) e houve o predomínio do desenho linear, quase sempre sem preenchimento ou textura visual. Em alguns casos, os alunos também utilizaram canetas para realizar os desenhos, de forma semelhante àqueles feitos à grafite. Em linhas gerais, os desenhos não usaram cores, apenas quando os próprios alunos tinham canetas coloridas ou lápis de cor disponíveis. A falta de detalhamento e descaracterização das pessoas conferiu um alto grau de impessoalidade aos desenhos. Todavia, houve casos, embora raros, em que o desenho enquadrava apenas o próprio aluno. Nestes casos, por não contemplarem a interação com outras pessoas eles foram descartados, pois escapavam ao escopo da pesquisa. Os temas tratados normalmente se referiam a algum momento ou etapa das aulas. Entretanto, houve casos em que a aula era relatada metaforicamente. No caso abaixo (Figura 4-9) o desenho faz uma analogia entre o processo de projeto e o

145

desafio de se escalar uma montanha. Apesar da abordagem interessante, também houve o descarte destes desenhos por não abordarem o espaço de sala de aula foco

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

de interesse da pesquisa.

Figura 4-9 – Representação do processo de projeto por meio da analogia à escalada.

Os enquadramentos empregados variam a proximidade e o ângulo em relação aos objetos representados. No que tange a proximidade, predominam os enquadramentos em planos gerais (relativamente afastado) que valorizam o contexto sobre os detalhes, mas há alguns casos de enquadramentos oblíquos (plano americano, primeiro plano, plano detalhe ou close-up) para enquadrar alguma pessoa ou elemento específico. Em relação aos ângulos, eles tanto um ângulo normal (na altura dos olhos Figura 4-10), valorizando os elementos no primeiro plano, quanto um ângulo alto num enquadramento plongée (visto de cima para baixo - Figura 4-11) que valoriza também os elementos mais ao fundo, chegando também ao extremo do enquadramento superior (vista aérea - Figura 4-12 ). Não houve casos em que o ângulo utilizado fosse abaixo da altura dos olhos, em enquadramento contra-plongée (de baixo para cima). A diferença no detalhamento do que é mostrado varia com as opções de enquadramento. Nos casos que empregam o ponto de vista superior ganha-se em relação a representação total da sala, mas perde-se em relação a representação dos detalhes, em especial de pessoas e objetos. Já nos casos da representação frontal, privilegiam-se as pessoas e objetos, mas perde-se na visão do todo.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

146

Figura 4-10 – Desenho que emprega o enquadramento normal (ângulo na altura dos olhos)

Figura 4-11 – Desenho que emprega o enquadramento plongée (ângulo alto)

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

147

Figura 4-12 – Desenho que emprega o enquadramento de vista aérea (ângulo superior)

Dada o pouco detalhamento de muitos desenhos, me foi fundamental ter efetuado a observação participante anteriormente (capítulo 3). A partir de minhas observações sobre a sala de aula e a minha familiaridade com certas aulas e professores pude interpretar os dados. Como exemplo, houve situações em que a única diferença entre uma pessoa e outra era o uso de óculos ou chapéu. Em alguns casos fui capaz de deduzir se tratar do professor regente, pois sabia que no projeto atual do autor do desenho, certo professor usava óculos e em outro caso chapéu. Outro fator que contribuiu para a interpretação dos desenhos foi os posicionamentos das pessoas. Em desenhos em que havia várias pessoas sentadas e uma em pé próxima a elas, normalmente eu interpretei que a pessoa em pé era um professor e os sentados os alunos. Isso porque durante as observações das aulas notei a tendência desse posicionamento. Isso significa que a interpretação dos desenhos supõe a minha familiaridade com as salas de aula que frequentei, como aluno e como observador. Nem todas as informações estão explícitas nos desenhos e dependeram da minha experiência para que eu fosse capaz de aferi-las. Isso faz com que a interpretação esteja condicionada ao meu olhar sobre os desenhos dos alunos e limitada pelas minhas suposições sobre as intenções dos alunos .

148

Nos desenhos apareceram certas convenções de representação. Muitos desenhos fizeram referências diretas aos elementos de quadrinhos, como os balões de fala e pensamento, bem como o emprego de onomatopeias para sinalizar sons e sinais de movimento, linhas de ação e sinais sobre a cabeça para indicar irritação (fumaça). Em alguns casos, os alunos criaram uma convenção para um produto do design “genérico” ou seja, descaracterizado: um objeto irreconhecível, composto por figuras geométricas organizadas de formas singulares sem remeter a

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

qualquer outro objeto.

Figura 4-13 – Formas geométricas em 4 desenhos diferentes representando os produtos finais

Em outros casos, surgiram convenções singulares, às vezes sinalizadas por legendas. Em um desenho, por exemplo, o aluno diferenciou alunos, monitores e professores de acordo com a complexidade dos chapéus (Figura 4-14). Os alunos não possuíam chapéu, os monitores utilizavam chapéu cônico e os professores um chapéu mais complexo, como feito de dobradura de jornal. Outros desenhos também criaram suas próprias formas de caracterização, diferenciando alunos e professores por acessórios, como camisas, gravatas, óculos etc.

Figura 4-14 – Detalhes da diferenciação entre as pessoas de acordo com o chapéu

Durante a interpretação, priorizei a observação dos detalhes (fragmento) dos desenhos, mas em alguns momentos o sentido só se completavam quando observava o contexto geral dos desenhos. Alguns desenhos encontravam-se claramente

149

subdivididos por linhas ou por espaços regulares, indicando momentos e elementos diferentes. Todavia, pude compreender alguns fragmentos, ainda que claramente separados, pela observação de um fragmento posterior ou anterior. Já nos desenhos onde não havia separação, fragmentei segundo o interesse da pesquisa em uma ou outra parte, de acordo com o que era retratado. Um exemplo claro disso é um desenho em que uma série de ações simultâneas ocorrem, com professores e com grupos de alunos, mas na mesma sala. A minha análise, neste caso, enfocou os diferentes núcleos. Entretanto, isso ocorreu ciente de que cada situação se inseria num contexto maior. 4.4

Método de registro, tratamento e análise

Houve um total de 187 desenhos dos quais 91 eram relativos à primeira tarefa e 96 relativos à segunda. Participaram da atividade 99 alunos, dos quais 30 do sexo masculino e 69 do sexo feminino. A primeira tarefa compreendeu 91 desenhos e a

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

segunda tarefa 96 desenhos. Em relação aos sexo, 30 alunos eram homens e 69 mulheres. Dos alunos, 42 eram da habilitação de Comunicação Visual, 12 de Projeto de Produto, 18 de Moda e 27 de Mídia Digital. Em relação às disciplinas, foram 33 alunos de DSG1002, 26 de DSG 1003, 25 de DSG1005 e 15 de DSG1032. Os dados e os percentuais estão sintetizados nas tabelas abaixo:

Sexo Homens Mulheres

Total 30

Percentual 30%

69

70%

Total 42 12 18 27

Percentual 42% 12% 18% 27%

Total 33 26 25 15

Percentual 33% 26% 25% 15%

Tabela 4-1Percentuais do sexo dos alunos Habilitação Comunicação Visual Projeto de Produto Moda Mídia Digital Tabela 4-2 Percentuais das habilitações cursadas Disciplinas DSG1002 DSG1002 DSG1005 DSG1032 Tabela 4-3 Percentuais das disciplinas em curso

Os desenhos coletados nas tarefas foram agrupados segundo as turmas em que foram produzidos. Em seguida, foram agrupados segundo a tarefa de descrição ou idealização da sala (tarefas 1 e 2). Houve 13 casos em que não havia qualquer indicação da tarefa, conforme havia solicitado. Em dois dos casos foi fácil

150

identificar, pois os alunos realizaram apenas a segunda tarefa em decorrência de terem chegado atrasados. Nos outros casos, a observação dos cenários foi fundamental para a interpretação e o posterior enquadramento segundo um desenho descritivo ou idealizado das salas de aulas de projeto. Uma vez agrupados por turma e tarefa, registrei os dados dos alunos que estavam presentes no verso dos desenhos. A partir dos dados fornecidos, comparei com as pautas dos professores e identifiquei os dados dos alunos sobre o período em que se encontravam e suas habilitações, complementando a informação que não foi fornecida. Feito o registro de todos os alunos numa ordenação aleatória não alfabética, atribuí um código para cada desenho realizado identificando os dados sobre o aluno que o fez. O código composto por dez ou onze dígitos identifica o desenho segundo o projeto, período atual do curso, habilitação, número do aluno na tabela, sexo e número da tarefa.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Portanto, como vemos na tabela abaixo (Tabela 4-4) o código 056CV10F01 diz respeito ao desenho de uma pessoa do projeto 1005, cursando o sexto período da habilitação de Comunicação Visual, é a décima pessoa da lista, do sexo feminino, e trata-se da tarefa 1 (descrição).

Turma 05

Período 6

Habilitação CV

Numeração 10

Sexo F

Código desenho 1 056CV10F01

Código desenho 2 056CV10F02

Tabela 4-4 – Sistema de identificação e codificação dos desenhos

O cálculo do período letivo dos alunos que não forneceram o dado foi feito a partir de seu número de matrícula, cujos três primeiros dígitos se referem à data de ingresso na universidade. Entretanto, o período assim calculado pode não corresponder ao período efetivamente cursado, pois não deduz possíveis trancamentos de matrícula, intercâmbio, transferência de curso etc. Neste caso um aluno que, por exemplo, tenha cursado dois períodos de Direito e tenha pedido transferência para Design, ainda que esteja efetivamente no terceiro período de Design, terá cinco períodos computados. Depois de registrados os dados sobre os alunos e atribuído o código de todos os desenhos, registrei o código a lápis em todos os desenhos. Os desenhos foram então digitalizados para permitir consultas futuras segundo o código e referencia contido nas planilhas. Para a análise, priorizei os conteúdos das imagens, ou seja o que estava sendo representado. Nesse sentido, priorizei os elementos ligados a “mensagem visual” sobre aqueles ligados à “sintaxe visual” (relacionados à composição e aos “elementos básicos da comunicação visual” (relacionados às propriedades visuais)

151

segundo os termos de Dondis (2007). Portanto, não valorizei os aspectos relacionados ao equilíbrio, tensão, nivelamento, aguçamento etc. Tampouco considerei os aspectos sobre as linhas, formas, direção, textura, cor etc. De acordo com os objetivos desta pesquisa, interessou-me mais me ater aos elementos representacionais, abstratos e simbólicos que apareceram no desenho de forma a explorar os significados dos desenhos. A partir da decisão de observar os conteúdos, a primeira etapa da análise foi a de identificar os elementos concretos representados nos desenhos. Desse modo, busquei todos os elementos de ordem arquitetônica (paredes, portas), mobiliário (cadeiras, mesas), equipamentos locais (computadores, serras) ferramentas portáteis (lápis, martelo, pincel), materiais e suportes (madeira, tecido, papel), técnicas empregadas nos suportes (fluxograma, desenho, gráfico, escrita), materiais de consulta (livros, sites, mostruários de materiais). Nesta etapa, iniciei com um primeiro levantamento dos objetos, listados se-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

gundo suas ocorrências a partir de uma turma. Optei pela turma do projeto avançado 1005 por ser bem diversificada quanto as habilitações e ser intermediária entre o projeto básico e o específico. Para identificação dos elementos concretos, foi preciso estabelecer uma distinção desses elementos para outros elementos, tais como pessoas, esquemas e ações. Nesse sentido foi importante observar que certas ocorrências de signos não funcionavam como representação do objeto, mas funcionavam como convenções de representação de certos conceitos. Foi o caso por exemplo das convenções de quadrinhos apresentadas como o caso da lâmpada para representar um insight, uma ideia. Alguns signos também exigiram uma atenção especial, como o relógio de parede que poderia representar o objeto na sala de aula ou uma indicação sobre o horário ou duração da aula. Especificamente quanto ao signo do martelo foi difícil distinguir se representava a ferramenta em si ou a ideia de construção de um objeto, nesse caso foi computado como objeto, pois a construção deduz-se do seu uso. Na medida em que os objetos foram anotados alguns foram agrupados devido às semelhanças e poucas incidências (bolsa e mochila), outros foram separados para distinguir suas características patentes (mesa circular de mesa retangular ou cadeira de poltrona). Fechada a lista a partir desta turma, foram computadas as ocorrências nesta e em outras turmas. Quando um elemento não listado era encontrado ele era incorporado à lista e era verificado se ele não constava dos desenhos já analisados. Abaixo apresento um exemplo dos elementos contabilizados em um desenho (Figura 4-15). No caso, aspectos visíveis sobre o espaço como o teto de Lona/Tenda na sala caracteriza uma das tendas (ART 4 ou 5). Há indicações da janela de vidro também no canto. Objetos imaginários, dentro de balões também

152

foram contabilizados (Alimento, Copo/Bebida e Cama). Já em relação ao mobiliário, apesar de aparecerem repetidos, tanto as mesas como cadeiras foram computadas apenas uma vez. Neste desenho também aparecem Mochila, Projetor, Laptop, Quadro de giz, Tela de Projeção e Luminária. Cada elemento do exemplo foi

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

computado como uma ocorrência na planilha.

Figura 4-15 Exemplo da contagem dos objetos e espaços nos desenhos

4.5

Seleção da amostra para a análise

Em relação aos desenhos da primeira tarefa, a intenção era localizar a partir da descrição visual das aulas de projeto (suas interações, personagens e momentos) os objetos, espaços e arranjos. Todavia, a amostra era bem variada e em alguns desenhos nem apareciam os aspectos das salas de aula. Nesse sentido estabelecemos que trabalharíamos a partir de um recorte da amostra em que os elementos espaciais e materiais mais recorrentes estivessem presentes. Assim, listei os objetos e elementos arquitetônicos e realizei a contagem de acordo com suas ocorrências nos desenhos. Computei as ocorrências apenas uma vez por desenho, descartando os casos em que apareciam repetidos, como mesas e cadeiras. Optei por essa contagem porque me interessou mais observar quais elementos os alunos mais retratavam e não quantas vezes eles apareciam. Desse modo, minha opção foi favorecer a contagem de alunos sobre a contagem de objetos em um desenho. Isso me permitiu evitar as distorções causadas por elementos repetidos, em detrimento daqueles que a maioria dos alunos retratava.

153

Após computar as ocorrências, pude verificar as maiores recorrências dos elementos. A tabela abaixo (Tabela 4-5) é o resultado da amostragem geral sobre a primeira tarefa (o cenário real) destacando os elementos mais recorrentes (45%) até a ocorrência de 10% em relação ao total de alunos.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Elemento Cadeiras Mesas de 2/4 pessoas Folhas de papel Escrita Caderno Laptop Quadro giz/ Quadro branco Desenhos/fotos Lápis Parede Mesas de 3/6 pessoas Mesas de 5 ou mais pessoas Portas Mesas de 1 pessoa Bolsa/mochila

Ocorrências 45 45 43 39 35 33 30 29 27 20 15 15 10 10 10

Percentual 45% 45% 43% 39% 35% 33% 30% 29% 27% 20% 15% 15% 10% 10% 10%

Tabela 4-5 – Elementos mais recorrentes relativos à primeira tarefa

Optei por selecionar as amostragens a partir de 10% de ocorrência de maneira a trabalhar com os elementos mais comuns, pois quanto menor a ocorrência, maior ficava a variação de elementos. Dentro da amostra geral, 10% corresponde a 10 alunos, portanto se viessem todos de uma mesma turma de 40 alunos, corresponderiam à 25%. Com isso, mesmo que determinado elemento ocorresse apenas em uma turma, ainda seria relevante para entrar na análise. A lista de elementos contava com 15 itens, variando entre 10% a 45% de ocorrência na amostra geral. Todavia, dentre os elementos mais recorrentes quatro eram tipos de mesas diferentes (1, 2, 3 e 5 pessoas). Como normalmente a ocorrência de um elemento excluía o outro, optei por reduzir as outras variantes de mesas da amostra, gerando uma lista com 12 elementos. Ainda com uma lista menor, nenhum aluno representou todos os 12 elementos num mesmo desenho, sendo que a maior ocorrência foi de 10 elementos (83%). Assim optei pela seleção de todos os desenhos da amostra que possuíssem ao menos a metade da ocorrência dessa lista (6 elementos). A primeira seleção contabilizou 23 desenhos (Tabela 4-6) que continham entre 6 e 10 elementos dos 12 mais recorrentes em todas as amostras. Entretanto, considerei realizar uma filtragem também pelos elementos mais recorrentes de cada turma, sobrepondo os dados.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

154

Código do desenho 022MD06F01 023CV10F01 022MD11M01 022CV26M01 022MD28F01 027MD29F01 33MD07F01 33CV08F01 38MO10F01 33MO12F01 035PP13F01 033MD14F01 035CV15F01 33MO16F01 033PP19F01 055MO08F01 055MO09F01 055MO16F01 055CV19F01 328CV04F01 3210CV06M01 329CV11F01 329CV14F01

Total de ocorrências 6 8 7 7 8 6 10 7 6 10 7 6 8 8 6 6 8 6 7 7 7 6 6

Tabela 4-6 – Listagem dos desenhos e a ocorrência dos elementos

Reproduzi o critério aplicado à amostra geral, para definir a amostra por turma. Listei os elementos mais recorrentes por turma e recortei em no mínimo 3 ocorrências. Como as turmas variavam em quantidade de alunos a porcentagem de três ocorrências variou entre 9 e 21%. Nas turmas em que havia mais consenso acerca dos elementos, ou seja, mais alunos concordavam entre si, as listas continham mais elementos. As listas variam em quantidades de 11 a 18 elementos.

155

DSG1002 Objetos Mesas de 2/4 pessoas Caderno Cadeiras Folhas de papel Escrita Quadro giz/ Quadro branco Mesas de 5 ou mais pessoas Lápis Desenhos/fotos Parede Mesas de 1 pessoa Mesas de 3/6 pessoas Massinha / Argila Portas Cama Laptop Cartazes

Ocorrências 16 15 14 12 12 10 9 9 8 5 4 4 4 3 3 3 3

Percentual 48% 45% 42% 36% 36% 30% 27% 27% 24% 15% 12% 12% 12% 9% 9% 9% 9%

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Tabela 4-7 – Ocorrências dos elementos nas amostras de projeto DSG1002

No caso da turma DSG1002 (Planejamento) os elementos mais recorrentes estão ligados aos objetos presentes nas salas de aula como mesas, cadernos e cadeiras. É interessante observar como os objetos de escrita e desenho manual estão mais presentes (Caderno, Folhas de Papel, Lápis) do que o digital (Laptop). DSG1003 Objetos Cadeiras Mesas de 2/4 pessoas Desenhos/fotos Escrita Quadro giz/ Quadro branco Folhas de papel Laptop Caderno Lápis Mesas de 3/6 pessoas Bolsa/mochila Parede Portas Martelo Prego Estojo Canetas Tábua de madeira Borracha

Ocorrências 12 9 9 9 8 8 7 7 6 5 5 4 3 3 3 3 3 3 3

Percentual 63% 47% 47% 47% 42% 42% 37% 37% 32% 26% 26% 21% 16% 16% 16% 16% 16% 16% 16%

Tabela 4-8 – Ocorrências dos elementos nas amostras de projeto DSG1003

Na turma de DSG1032 (Desenvolvimento) ainda estão destacados alguns elementos do ambiente de ensino (Cadeiras, Mesas, Quadro) junto às formas de

156

registro (Desenhos, Escrita, Folhas de Papel). Os elementos de registro escrito e visual (Caderno, Laptop) aparecem com a mesma ocorrência intermediária. Elementos relativos à construção de produtos (Martelo, Prego, Tábua de Madeira), embora com pouco destaque, aparecem apenas nesta amostra.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

DSG1005 Objetos Mesas de 2/4 pessoas Cadeiras Laptop Folhas de papel Quadro giz/ Quadro branco Escrita Caderno Parede Lápis Desenhos/fotos Tela de projeção Portas Cama Relógio de parede Computador desktop Fluxograma

Ocorrências 16 15 13 13 10 10 9 7 7 7 5 3 3 3 3 3

Percentual 64% 60% 52% 52% 40% 40% 36% 28% 28% 28% 20% 12% 12% 12% 12% 12%

Tabela 4-9 – Ocorrências dos elementos nas amostras de projeto DSG1005

Na turma de DSG1005 (Produção e Distribuição) também se destacam os elementos de sala de aula (Mesas e Cadeiras) seguidos pelos elementos de registro (Laptop, Folhas de Papel, Quadro, Escrita, Caderno). Outros elementos únicos na amostra também aparecem como Fluxograma, Relógio de Parede e Computador Desktop. Como a turma de DSG1032 possuía apenas 15 alunos e a menor lista (11 elementos), o critério de seleção facilitaria a entrada de mais alunos na amostra. Portanto incluí na lista também os elementos com duas ocorrências (9%), de maneira a tornar a lista mais seletiva (com 17 itens).

157

DSG1032 Objetos Laptop Folhas de papel Escrita Lápis Desenhos/fotos Parede Cadeiras Mesas de 2/4 pessoas Mesas de 3/6 pessoas Caderno Mesas de 5 ou mais pessoas Prédio Quadro giz/ Quadro branco Mesas de 1 pessoa Bolsa/mochila Fluxograma Livros

Ocorrências 10 10 8 5 5 4 4 4 4 4 3 2 2 2 2 2 2

Percentual 71% 71% 57% 36% 36% 29% 29% 29% 29% 29% 21% 14% 14% 14% 14% 14% 14%

Tabela 4-10 – Ocorrências dos elementos nas amostras de projeto DSG1032

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Na amostra do projeto DSG1032 (Conclusão de Comunicação Visual) os elementos de sala de aula aparecem com menos ocorrências que nas demais turmas. Esses elementos (Cadeiras, Mesas, Quadro) aparecem entre as ocorrências médias e baixas. O destaque maior está para os objetos de escrita e desenho, tanto digital (Laptop) como analógico (Folhas de Papel, Escrita, Lápis). Vale ressaltar o destaque dado ao Laptop que pela primeira vez consta entre os elementos mais recorrentes dos desenhos e com uma ocorrência bastante alta (71%). De um modo geral, conforme avançamos o nível das turmas, os aspectos relativos à sala perderam destaque gradativamente, enquanto os meios de registro (desenho/escrita), em especial o laptop, ganha importância. Infiro que esta relação deve-se ao nível de detalhamento técnico exigido dos alunos, para o qual o computador se torna um elemento facilitador e importante. Cabe ressaltar, no entanto, que as folhas de papel continuam presentes, sejam elas impressas ou mesmo escritas ou desenhadas, indicando que mesmo com o suporte eletrônico o analógico não perde seu destaque. A partir dos elementos mais recorrentes por turma, selecionei as amostras que continham entre seis ou mais ocorrências. Essa seleção continha 27 amostras que comparei com as 23 amostras definidas pela seleção geral. A tabela abaixo mostra a comparação entre as duas listas. Nos 8 casos em que as células estão vazias, significa que as amostras apareceram apenas em uma seleção.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

158

Seleção geral 022MD06F01 023CV10F01 022MD11M01 022CV26M01 022MD28F01 027MD29F01 033MD07F01 033CV08F01 038MO10F01 033MO12F01 035PP13F01 033MD14F01 035CV15F01 033MO16F01 033PP19F01 —

Ocorrência 6 8 7 7 8 6 10 7 6 10 7 6 8 8 6 —

055MO08F01 055MO09F01

6 8

055MO16F01 055CV19F01 — — 328CV04F01 3210CV06M01 — 329CV11F01 — 329CV14F01

6 7 — — 7 7 — 6 — 6

Seleção por turma 022MD06F01 023CV10F01 022MD11M01 022CV26M01 022MD28F01 027MD29F01 033MD07F01 033CV08F01 — 033MO12F01 035PP13F01 — 035CV15F01 033MO16F01 033PP19F01 054MD01F01 055CV07F01 055MO08F01 055MO09F01 055CV15F01 055MO16F01 — 055MD22M01 055MO24F01 328CV04F01 3210CV06M01 329CV10F01 329CV11F01 329CV12F01 329CV14F01

Ocorrência 7 10 8 7 9 7 10 9 — 13 8 — 8 9 7 8 7 7 9 9 8 — 7 7 7 9 7 9 8 7

Tabela 4-11 – Comparação entre a lista de seleção das amostras gerais e por sala

Ao cruzar os dados da lista de seleção geral (à esquerda) com as ocorrências por turma (à direita), percebi que a maioria das amostras já haviam aparecido na primeira lista. A diferença, portanto, apresentou 7 novos desenhos incluídos na seleção, passando para um total de 30 desenhos. Assim, optei por considerar todos os 30 desenhos para observar os elementos referentes ao momento das aulas, as pessoas e as ações. Nos desenhos selecionados para a amostra verificamos que 9 alunos retrataram um único momento de aula, 6 alunos retrataram momentos simultâneos e 15 alunos retrataram uma sequência de momentos. Isso demonstra uma coerência percentual entre a amostra selecionada em relação às formas de retratar presentes nas amostras gerais, conforme aponta a tabela abaixo (Tabela 4-12).

159

Amostras

Um momento

Momentos simultâneos

Geral (90) Seleção (30)

32% 30%

14% 20%

Sequência de momentos 53% 50%

Tabela 4-12 Ocorrências nas representações dos momentos de aula

A forma de retratar foi bastante influenciada pelo enunciado dos desenhos, quando pedi que situassem “os diferentes momentos” conforme apresentado anteriormente, em alguns casos, os alunos apresentaram etapas de projeto e outros momentos de aula. Todavia, esperava que os desenhos que mostrassem apenas um momento fossem minoria, e não foi o que aconteceu. A minoria dos desenhos foram aqueles que mostravam momentos simultâneos. A meu ver, os momentos simultâneos são justamente os que predominam ao longo das aulas, pois durante os formatos de atendimento, que é o mais comum, favorece que várias ações ocorram ao mesmo tempo. Ao notar que a repre-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

sentação da aula como um momento único, à revelia do enunciado, predominou sobre os momentos simultâneos, questionei-me sobre como aqueles alunos enxergam as aulas. Enxergam-na como uma forma única e invariável? Enxergam-na como uma aula tradicional? Ou apenas representaram um único momento por falta de interesse em detalhar a dinâmica das aulas durante a atividade? Não possuo meios para responder estas questões na presente pesquisa, mas identifico-as como possibilidades de pesquisas futuras. Os dados me levam a entender que a ocorrência de tantos casos que mostram o projeto como sequência de momentos demonstram que há também alunos que possuem um outro modo de enxergar as aulas. Nesses desenhos, compreendo que o projeto foi retratado como um processo, separado por fases distintas, com características próprias e que contribuem para se alcançar determinado resultado. Esta visão processual, ou seja, que parte da compreensão do processo, aponta também para uma visão de Design que entende que os resultados não são apenas fruto de um momento de inspiração, de insight, mas do percurso percorrido. 4.6

Identificação dos momentos, pessoas e atividades

Conforme o objetivo do trabalho, meu interesse residia na compreensão das práticas de ensino e aprendizagem e não nas etapas e no método de projeto. Portanto, me concentrei não na maneira como os alunos representaram as etapas de projeto, mas nos diferentes formatos de aula. Assim, identifiquei nos desenhos os seguintes momentos de aulas:

160









Exposição/explicação – Quando o professor se dirige aos alunos explicando ou expondo algum assunto. Reconhecível pelos professores à frente da sala e os alunos ao redor. Atendimento/Orientação – Quando os professores atendem/orientam cada grupo de alunos sobre seus respectivos projetos. Reconhecível pelos alunos diante dos professores, sem a participação do restante da turma. Apresentação – Quando os alunos apresentam os projetos para a turma e professores. Esse momento é reconhecível pela disposição peculiar, na qual os alunos que apresentam encontram-se no lugar tradicionalmente associado ao professor, na frente da sala junto ao quadro / tela de projeção. Na maioria dos casos a disposição assemelha-se a uma banca de avaliação, pois os professores são retratados sentados diante de uma mesa posicionada no centro da sala em frente aos alunos que apresentam, enquanto os demais alunos ficam dispostos ao redor. Outros momentos – Momentos definidos pelas relações entre alunos em grupos ou individualmente. Reconhecível pela ausência de professores indicados.

Identifiquei os agentes envolvidos segundo diversos critérios, seja pelo posi-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

cionamento e postura, como pelo tipo de material que portavam (mochilas tendem a identificar os alunos) ou mesmo as legendas colocadas nos desenhos. Alguns desenhos demonstraram uma tendência em apresentar os professores maiores que os alunos. Já as posturas poderiam ser em pé falando com uma mão levantada, que de acordo com o contexto poderia ser um professor palestrando ou um aluno apresentando. Nesses casos, a informação ao redor, como a presença de outras pessoas, ou uma banca à frente, definia do que se tratava. Quando havia alguma dúvida sobre a função da pessoa retratada, não a registrava. As funções identificadas foram: •



• • •

Professores: normalmente posicionados em frente ao quadro, em alguns casos junto às mesas dos professores ou tomando notas. O uso elementos característicos de alguns professores também permitiu identifica-los (chapéu, óculos, cabelos curtos ou crespos). A maioria parece tratar dos professores de disciplina, mas não há distinção clara se professores regentes de disciplina ou conteúdo. Alunos: normalmente posicionados nas mesas, portando bolsas ou mochilas. Correspondem a maioria das pessoas nas salas, mas em alguns casos foram retratados como apenas um aluno. Monitores: identificados apenas através de legendas, quando diferenciados dos demais alunos. Professores de Conteúdo: identificados apenas quando diferenciados através de rótulos e legendas. Parceiro/Intercessor: identificado apenas através de rótulos e legendas.

As ações foram identificadas apenas pelas posturas sinalizadas. O produto das ações como desenho, escrita, não foram considerados, mas em alguns casos serviram como referencia para interpretação do ato. Excluí da contagem as situações em que as pessoas apresentavam posturas passivas, ou seja, paradas eretas, sem nada que sinalizasse uma ação. Algumas ações eram ambíguas especialmente

161

quando mais de uma ação era admitida na situação. Um exemplo é o caso de um aluno em frente ao computador, quando não havia especificação. Neste caso, optei por contabilizar as ações possíveis: anotar/desenhar, consultar, ler. As ações listadas foram: • • •

• •

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

• • •





Pensar: normalmente identificado pelo sinal da lâmpada acesa ou o balão na forma de nuvens relacionados à cabeça dos sujeitos. Falar/Afirmar: identificado pelos balões, sinais de exclamações ou linhas saídos da boca dos sujeitos. Anotar/Desenhar / Registrar: situações em que os sujeitos estão com algum objeto de escrita na mão, apoiado contra um suporte de anotação. Em alguns casos não é possível distinguir se o aluno desenha, rabisca, toma notas ou descreve, portanto foram reunidos dentro de uma mesma categoria de registro. Mostrar: quando os sujeitos apontam ou expõe algum objeto para outro sujeito. Construir: quando o aluno está “com a mão na massa”, ou seja, montando um objeto, desenvolvendo um layout, programando um objeto virtual no computador etc. Questionar: diferente da fala, pode ser marcado pela interrogação ou pelo gesto de levantar o braço para fazer uma pergunta. Avaliar: ação realizada por professores nas apresentações dos alunos ou como ação dos alunos para definir suas escolhas. Dormir / Distrair: situações em que os alunos não estão engajados na atividade, seja marcado pelo sinal de sono (Zzzzzz), pela postura do aluno deitado sobre a mesa, pela conversa paralela ou pelo uso de elementos estranhos à aula (como no caso do Facebook, deduzindo-se que seja uma denúncia da falta de engajamento nas atividades da aula). Ler/Consultar / Pesquisar: situações em que os alunos empregam referencias diversas como fonte de informação: google, livro/revista, computador, etc. Trocar: situações onde está sinalizada a troca entre os sujeitos, seja pela marcação de setas de pontas duplas seja pela troca física de objetos (uma mão pega e a outra entrega).

  Os resultados da identificação dos momentos, personagens e ações na amostra com os 30 desenhos foram os seguintes:

162

  Aspecto

Descrição

Momentos

Exposição/Palestra

14

47%

Atendimento/Orientação

19

63%

Apresentação

10

33%

Outros momentos

17

57%

Professores

26

87%

Alunos

30

100%

Monitores

1

3%

Professores de Conteúdo

1

3%

Parceiro/Intercessor

1

3%

Pensar

14

47%

Falar/Afirmar

22

73%

Anotar/Desenhar / Registrar

8

27%

Mostrar

13

43%

Construir

11

37%

Questionar

8

27%

Avaliar

12

40%

Dormir / Distrair

4

13%

Consultar / Pesquisar

12

40%

Trocar

7

23%

Pessoas

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Ações

Ocorrências

Percentual

Tabela 4-13 - Ocorrências dos momentos, pessoas e ações nas amostras

Os resultados mostram uma tendência na representação destacada dos alunos, seguida pelos professores como personagens característicos das aulas de projeto. As demais ocorrências são pouco expressivas. Em relação aos momentos, há uma distribuição de situações diferentes e, como apresentado anteriormente, há casos em que mais de um momento foi representado. O momento de atendimento/orientação é o mais destacado, mas segue próximo dos demais momentos. Mesmo as apresentações que, como sabemos, ocorrem em momentos pontuais do semestre, foram lembradas e representadas. As ações são diversificadas, mas predomina a fala, destacando-se das demais. Seguida da fala, vem as ações de pensar, mostrar, consultar, avaliar e construir. Tais ações se relacionam às etapas do projeto, como os desenhos e a construção nas etapas de geração de alternativas e detalhamento, respectivamente. Além disso, as ações também se associam aos tipos de aula, como os alunos ao falar, mostrar, questionar, participam de formatos distintos como palestras, atendimentos, apresentações e outros momentos.

163

Reuni os desenhos ou fragmentos de desenhos que apresentassem os momentos de aula, para poder analisá-los. A análise foi agrupada segundo os momentos identificados, conforme exemplifico nos casos a seguir. 4.6.1

Momento de palestras/ aulas expositivas

A partir da amostragem, encontrei 11 ocorrências (37%) que caracterizavam o momento das palestras/aulas expositivas. Destas ocorrências, cinco desenhos privilegiaram apenas este momento, enquanto os demais retratam a palestra em um fragmento da imagem. Há poucas variações quanto à forma de representação, ora focalizando os professores de frente e os alunos de costas (6 casos), ora mediante uma vista superior (5). Nos casos em que são mostrados de frente, os professores predominam em pé (4) e não sentados (2). Nos desenhos de vista superior é difícil aferir se estão sentados ou em pé. O momento se caracteriza pela relação entre os professores com todos os alunos,

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

no sentido de expor algum conteúdo para a turma. Os desenhos retratam o momento apresentando a sala como um todo e os professores à frente, falando e se dirigindo à turma. O caso abaixo exemplifica a disposição da sala durante a aula expositiva.

Figura 4-16 Desenho 022MD28F01 (fragmento) da aula expositiva mostrando as ações dos alunos

As ações ficam evidentes no caso acima. O fragmento apresenta os alunos ao redor das mesas arranjadas na forma da letra “U “. Mas sobre as mesas são sinalizados cadernos (ou livros) abertos sobre as mesas. Enquanto os professores falam os alunos ora pensam (balão de pensamento) ora falam (balão de fala). As falas e pensamentos dos alunos foram registrados de modos diferentes, expressando dúvida

164

(interrogação), afirmação (exclamação), criatividade (lâmpada) ou mesmo o assunto comentado pelos professores (sinalizado pelo conjunto de linhas horizontais). 4.6.2

Momento de atendimento Dentre os desenhos selecionados, encontrei 19 ocorrências (63%) que ca-

racterizavam o momento das apresentações. Destas ocorrências, quatro desenhos privilegiaram apenas este momento, enquanto os demais o atendimento era um fragmento da imagem. Identifiquei a representação dos atendimentos a partir de certos elementos predominantes: os alunos diante do(s) professor(es), sentado do outro lado da mesa. Os pontos de vista são variados, enfocam os professores e alunos um de frente ao outro ou lado a lado, ora de frente, de lado, de cima. Os professores costumam aparecer sozinhos atendendo os alunos, mas ocorre de aparecerem atendendo em dupla também. Há variações também quanto à presença ou não de mesas, cadei-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

ras e objetos empregados. O elemento central para identificação talvez seja as indicações de diálogo entre alunos e professores, normalmente acompanhados por alunos falando, mostrando, tendo uma ideia, apontando algo ao professor que, por sua vez, está falando, mostrando, apontando. O desenho abaixo (Figura 4-17) mostra os alunos (retratados menores, falando) e a professora (retratada maior, como que ouvindo). Ambos estão sentados, a professora está de frente e os alunos de costas. Os alunos falam (balões de fala) manifestando dúvida (sinal de interrogação) ou afirmação (sinal de exclamação) enquanto cada um mostra uma folha de papel para a professora. A professora não manifesta nenhuma ação, mas entendo que como os alunos se dirigem a ela, ela presta atenção, ouvindo e observando.

165

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Figura 4-17 Desenho mostrando o atendimento e atividades simultâneas

Enquanto o atendimento ocorre, outros alunos desenvolvem atividades paralelas como a interação com o mural ou a construção de objetos, conforme mostra a imagem. Desse modo, a configuração do atendimento restringe-se ao grupo e à professora, convivendo com outras atividades simultâneas. As ações apresentadas envolvem falar, questionar e mostrar. 4.6.3

Momento de apresentação

Na amostra de desenhos selecionados, identifiquei 10 ocorrências (33%) que caracterizavam o momento das apresentações. Destas ocorrências três sinalizavam apenas este momento, enquanto os outros sete representavam também outros momentos, sendo as apresentações um fragmento da imagem. Identifiquei a representação das apresentações a partir de certos elementos predominantes: os alunos que apresentam estão em pé, na frente da sala, diante de um quadro ou projetor; os professores estão sentados diante de uma mesa de frente para os alunos, e os demais alunos, espectadores, estão sentados ao redor. A organização da sala assemelha-se a do momento de palestras, entretanto são os alunos que se encontram à frente. Uma diferença entre os formatos é a constituição de uma banca avaliadora, formada pelos professores que normalmente encontram-se à frente dos alunos. O ponto de vista mais comum enquadra os alunos que apresentam de frente e os professores de costas. Existem variações quanto ao posicionamento dos professores, a presença de espectadores e objetos na cena e o ponto de vista adotado,

166

mas predomina a descrição acima, conforme pode ser visto no fragmento do dese-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

nho abaixo (Figura 4-18).

Figura 4-18 Desenho 055MO24F01 (fragmento) que mostra a disposição da apresentação

No caso do desenho acima, os alunos aparecem em destaque, protagonizando as ações, principalmente de falar, representada pelo balão, e mostrar, representada pelo emprego da projeção digital na tela. Os professores estão posicionados como banca avaliadora e os demais alunos estão ao redor. Como o foco da ação está nos alunos, o restante da sala foi omitido, mas fica subentendida. 4.6.4

Outros momentos

Os momentos retratados até então dizem respeito aqueles em que interagem professores e alunos. Todavia, alguns desenhos ou em certos fragmentos, os professores não apareciam. Nesse sentido, se destacam as ações dos alunos, seja em grupo ou seja individual. 4.6.4.1

Atividade em grupo

As atividades em grupo estão bastante presente nos desenhos, aparecendo em 14 desenhos da amostra (46%) sendo apenas um deles o desenho completo e os demais fragmentos. As interações entre os alunos aparecem tanto com ações de fala, pensamento ou construção. A maioria dos desenhos (11) mostra os alunos ao redor de uma mesa, outros casos apontam alunos em pé ou sentados no chão. Além disso os desenhos que apresentam as atividades em grupo também sinalizam situações dentro e fora da sala de aula. Normalmente o trabalho em grupo está associado ao desenvolvimento do projeto, especialmente às discussões de propostas de projeto. As ideias de cada

167

aluno são discutidas nos grupos de trabalho de maneira que o resultado seja fruto da combinação delas. O fragmento do desenho abaixo (Figura 4-19) exemplifica a troca de ideias durante a construção do produto. Cada aluna do grupo concebe um objeto diferente a partir do objeto situado sobre a mesa.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Figura 4-19 Desenho 055CV07F01 (fragmento) mostrando a construção do objeto a partir de diferentes ideias

O desenho focaliza uma parte da sala de aula, omitindo o restante da sala, indicando que o trabalho em grupo acontece junto às mesas e paralelamente a outras atividades. As ações apresentadas envolvem o pensamento e a construção e indicam a interação entre as alunas para chegar a uma síntese. 4.6.4.2

Atividade individual

À exceção dos projetos específicos, as aulas de projeto normalmente envolvem a constituição de grupos que trabalham juntos ao longo da disciplina. Todavia, há situações de atividade individual, que envolvem a pesquisa e o desenvolvimento dos projetos, ou mesmo situações de dispersão. A atividade de leitura, por exemplo, é uma das atividades que aparece individualmente. Seja no computador ou em livros, os alunos aparecem sozinhos quando estão lendo ou pesquisando algo. No fragmento do desenho abaixo (Figura 4-20), embora trate de um projeto específico e, portanto, individual, mostra o aluno pesquisando (escrevendo, lendo e digitando). Caso fosse um trabalho em grupo, a diferença seria que em seguida haveria uma reunião com o grupo para trocar ideias.

168

Figura 4-20 Desenho 329CV11F01 (fragmento) mostra aluno pesquisando individualmente

As atividades de leitura, desenho e consulta, conforme retrata o desenho acima, são realizadas individualmente. A atividade individual ocorre na sala, mas principalmente em casa, quando os alunos trabalham em seus projetos.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

4.7

Conclusões do capítulo

Nesse capítulo apresentamos a proposta da atividade de representação gráfica como o intuito de verificar as maneiras como os alunos representavam as aulas de projeto, os diferentes momentos, pessoas e ações. Solicitamos que trabalhassem com o desenho para que, mediante a explicação visual, aspectos que talvez não fossem enfatizados verbalmente, como a forma das salas, os objetos presentes no ambiente e as posturas, pudessem ser contemplados. Apesar de esperar um detalhamento maior sobre os desenhos, considero que o objetivo da proposta foi alcançado, uma vez que foi possível identificar aspectos espaciais e materiais em sua relação com as atividades. Em consonância com a os objetivos da proposta, os desenhos mostraram por meio das escolhas dos alunos e também de suas omissões, os aspectos que consideram mais importantes para a caracterização das aulas de projeto. Ressalto que o tratamento dos dados reflete o percurso percorrido e as escolhas foram guiadas a partir das situações que se apresentavam. O método aqui foi o resultado construído ao longo do processo e não anterior a ele. Concordamos com Coelho (2006) ao advogar que a metodologia não deve ser tratada como “receita de bolo” . Relembrando as palavras do autor, concordamos que a “metodologia é, antes de tudo, o trabalho de organização do pensamento” (Coelho:2006, p. 53) e que, portanto é influenciada pelo processo de pesquisa. Assim, não adotamos procedimentos e técnicas pressupostas, mas adaptamos o uso de acordo com o que nos foi apresentado pelo contato com os alunos e os desenhos.

169

O pensamento acerca do método e o seu entendimento como algo que se relaciona ao processo nos parece pertinente, especialmente em relação ao campo de conhecimento do qual falamos por o pensarmos como não restrito a um corpo próprio de conhecimentos (Bomfim, 1994). E, consequentemente por valorizarmos a sua vocação interdisciplinar (Couto, 1997). Com isso, na construção metodológica da pesquisa optamos por conhecimentos, métodos e técnicas plurais oriundos da junção dos dados com campos de saber. As características do campo, conforme aponta Bomfim (1994), envolvem tanto a práxis como uma pretensão à fundamentação lógica que segue os princípios de diversas ciências. Todavia, como não há um corpo teórico próprio, no Design nos apoiamos em diferentes teorias e ainda em conceitos díspares. Em suma, não há um conjunto de teorias, métodos e técnicas consagrados que constituam um pensamento dominante no campo. Assim, o traço característico das pesquisas em Design seja, talvez, o da apropriação teórica-metodológica, ou seja, do emprego

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

de métodos e teorias de outras disciplinas de acordo com as oportunidades despertadas pelos dados obtidos na investigação. A metodologia como processo dialoga também com a práxis, uma vez que a atividade de design também é valorizada pelo entendimento processual. Essa valorização está presente tanto no projeto pedagógico do DAD, quanto nos desenhos dos alunos que apontam para o processo de projeto. Esse pensamento é consonante com a definição de Design apresentada por Miller (1988) “Design é o processo de pensamento que compreende a criação de alguma coisa” e que de maneira sucinta, enfatiza o valor do percurso tanto na criação de produtos como na constituição dos conhecimentos. Conforme vimos no segundo capítulo, as disciplinas de projeto contemplam diferentes aspectos de um processo complexo que como apresentamos no capítulo 3 ganham formas distintas e específicas. Desse modo, o curso valoriza o processo de trabalho e as escolhas que levam às definições do produto, mais do que o produto em si, o que se reflete também nas orientações dos professores ao privilegiar as situações frente aos produtos. Da mesma maneira, os desenhos de diversos alunos reconhecem a importância do percurso ao apresentar etapas de maneira literal ou metafórica. Os desenhos, de um modo geral, retomam diferentes etapas apresentadas no capítulo anterior como o planejamento (evidenciado pelos fluxogramas), a conceituação (presente na referência e nas ideias para o projeto) , a geração de alternativas (destacada pelas soluções diferenciadas) e o detalhamento (na construção dos protótipos e uso dos computadores). Em alguns casos, os momentos retratados foram precisamente as etapas de projetos em sequência.

170

Assim como o processo de projeto pressupõe diversas atividades criativas e intelectuais, os desenhos também apresentam uma tendência pronunciada em enfatizar o pensamento, as diferentes ideias e os insights. A análise preliminar apresentada aqui teve cunho interpretativo e auxiliou a pensar a relação sobre espaços, objetos e as práticas de ensino e aprendizagem. A partir dos momentos de aulas representados, reconhecemos algumas configurações típicas, recorrentes e que mais se aproximaram dos objetivos da pesquisa. Por esse motivo, recorremos à teoria dos gêneros discursivos de Bakhtin, por considerarmos que nos auxiliara a compreender as maneiras como as ações e ambiente de ensino são articulados. O próximo capítulo apresentará uma análise sobre as formas de aulas, contemplando as observações e os desenhos feitos pelos alunos, in-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

terpretados segundo a filosofia da linguagem de Bakhtin.

5 Os gêneros discursivos e as aulas de projeto

Após a observação participante (capítulo 3) e o tratamento e análise preliminar dos desenhos feitos pelos alunos (capítulo 4), concentrei a análise propriamente dita no atendimento ao objetivo da pesquisa. Como apresentado anteriormente, visei à observação das interações dos sujeitos com os espaços e recursos materiais nas salas de aula de projeto em relação às práticas de ensino e aprendizagem. Portanto, o foco da pesquisa é compreender como as aulas de projeto se relacionam com o ambiente em que se dá.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

A observação participante e as representações gráficas dos alunos indicaram que alguns formatos de aula apresentam configurações formais diferentes, empregando diferentes recursos. Esses formatos nos levaram a pensá-los segundo a filosofia de Bakhtin, que trata dos gêneros discursivos não como uma categorização hierárquica e tipificada, mas como formas relativamente estáveis de enunciados em sua relação com os interlocutores. Neste capítulo, portanto, apresentamos os conceitos de Bakhtin e de autores que, de algum modo, dialogam com seu pensamento acerca dos gêneros discursivos. Em seguida, tratamos dos casos identificados, considerados segundo a observação participante e os desenhos. Por fim, tecemos as conclusões dos capítulos, ressaltando a relação com a teoria em função dos aspectos analisados. 5.1

Os gêneros discursivos na teoria de Bakhtin

Bakhtin destaca a importância das interações sociais na constituição dos discursos. Grosso modo, Bakhtin afirma que a linguagem se constitui de maneira dialógica, a partir das interações sociais e que a partir daí se estabelecem as formas específicas de comunicação e as normas linguísticas. Com isso, o autor se posiciona contra duas tendências linguísticas: uma que ele chama de “objetivismo abstrato”, que tende a enxergar a língua como uma estrutura fixa e autônoma; outra que ele denomina “subjetivismo idealista” que compreende a língua como produto da expressão artística individual. O dinamismo da linguagem na perspectiva bakhtiniana está relacionado às condições materiais, ou seja, sociais e históricas em que as interações verbais se realizam. Bakhtin toma a oralidade, e não a escrita, como base de sua teoria e, portanto, compreende a constituição dos signos de maneira dialética e dinâmica e não co-

172

mo um sinal inerte que advém de um sistema abstrato da língua. Em linhas gerais, o autor compreende que a significação depende da relação estabelecida entre os interlocutores e o contexto em que se realiza, defendendo que a língua se modifica por mudanças nas condições históricas, sociais e nas necessidades comunicativas. Segundo Bakhtin, somente a dialética é capaz de resolver a contradição entre a unicidade e a pluralidade da significação. Desse modo, nem os signos possuem significados pré-estabelecidos por sistemas de regras e leis, que desqualificam as ocorrências divergentes como desvios, nem tampouco os signos admitem qualquer significado como a manifestação de uma expressão ou interpretação individual de cada sujeito, que descarte a possibilidade de significados partilhados por grupos sociais. Para Bakhtin, os signos não encerram em si os significados, pois estes são negociados, por meio das dinâmicas estabelecidas pela interação entre diferentes interlocutores. Mediante uma concepção que valoriza o dialogismo, Bakhtin não emprega a

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

noção de “texto” propriamente dita, mas adota em seu lugar os conceitos de “enunciado” e “gêneros textuais”. Estes conceitos são instrumentais na obra bakhtiniana, pois é a partir da relação dinâmica estabelecida entre eles que se desenvolve sua perspectiva da linguagem. As noções de enunciado e gêneros formam a base para uma compreensão da relação entre as manifestações individuais e coletivas. Bakhtin trata a noção de enunciado tanto como o resultado, como ao processo de elaboração. Como resultado, o enunciado é uma forma cristalizada de uma ação comunicativa. Já como processo, o enunciado se relaciona às interações entre os interlocutores, sejam eles diálogos internos entre diferentes ideologias no âmbito do próprio sujeito, ou externos com outros sujeitos. O conceito de enunciado (Bakhtin, 2003 p. 261) abrange o ato da fala e da escrita e o resultado do ato. A relação intrínseca entre ato e resultado concebe a linguagem numa perspectiva dinâmica que se relaciona aos aspectos sociais e históricos em que se desenvolvem. Ao propor o enunciado também como ato, Bakhtin o concebe como uma atividade que se insere dentro de uma perspectiva intertextual, ou seja, dentro de um processo discursivo de caráter histórico e social. Cada texto refere-se a outros textos, dado que é produzido dentro de uma sociedade e, portanto, reportase a formas anteriores e posteriores. Conforme afirma o autor: Toda enunciação, mesmo na forma imobilizada da escrita, é uma resposta a alguma coisa e é construída como tal. Não passa de um elo da cadeia dos atos de fala. Toda inscrição prolonga aquelas que a precederam, trava uma polêmica com elas, conta com as reações ativas da compreensão, antecipa-as. (Bakhtin, 2006 p.99)

173

Esse “elo da cadeia dos atos de fala” apresenta a característica dialógica presente inclusive nas manifestações escritas. Para Bakhtin essa é uma característica imprescindível, pois o enunciado pressupõe a relação com um interlocutor, dirigese sempre a alguém, presente ou ausente, supõe um “horizonte social”: Com efeito, a enunciação é o produto da interação de dois indivíduos socialmente organizados e, mesmo que não haja um interlocutor real, este pode ser substituído pelo representante médio do grupo social ao qual pertence o locutor. A palavra dirige-se a um interlocutor: ela é função da pessoa desse interlocutor: variará se se tratar de uma pessoa do mesmo grupo social ou não, se esta for inferior ou superior na hierarquia social, se estiver ligada ao locutor por laços sociais mais ou menos estreitos (pai, mãe, marido, etc.). Não pode haver interlocutor abstrato; não teríamos linguagem comum com tal interlocutor, nem no sentido próprio nem no figurado. Se algumas vezes temos a pretensão de pensar e de exprimir-nos urbi et orbi, na realidade é claro que vemos “a cidade e o mundo” através do prisma do meio social concreto que nos engloba. Na maior parte dos casos, é preciso supor além disso um certo horizonte social definido e estabelecido que determina a criação ideológica do grupo social e da época a que pertencemos, um horizonte contemporâneo da nossa literatura, da nossa ciência, da nossa moral, do nosso direito. (Bakhtin, 2006, p.113-114)

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

O enunciado como produto diz respeito às unidades resultantes das enunciações, com suas formas e características específicas. Já não se refere mais ao ato em si, mas a algo que surge dele. Segundo Irene Machado , estudiosa da filosofia de Bakhtin, o enunciado é “a unidade concreta do texto; uma unidade resultante das combinações dos gêneros discursivos – formas específicas de usos das variedades virtuais de uma língua” (MACHADO: 1996, p. 238). O enunciado também é, portanto, o resultado de combinações de formas, de gêneros. Possui uma ligação intrínseca com o ato de sua elaboração, que lhe é inalienável, mas não é mais o ato. A combinações de gêneros, que a autora menciona, consistem no aspecto a partir do qual Bakhtin introduz a relação entre as manifestações individuais e coletivas. Bakhtin reconhece a individualidade dos enunciados, mas reconhece também que eles se reportam à formas conhecidas, de acordo com as funções e os contextos em que se inserem: “cada enunciado particular é individual, mas cada campo de utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados, os quais denominamos gêneros do discurso.” (Bakhtin, 2003 p.262) Ao opor-se à uma concepção objetivista abstrata da língua, como a abordagem saussuriana, Bakhtin defende que a língua não seja um sistema autônomo e independente das relações sociais. Ao defender essa perspectiva, o autor identifica às formas particulares assumidas pelos enunciados em situações específicas. Ao mesmo tempo, Bakhtin também se opõe a uma concepção subjetivista idealista, por entender que esta não é uma manifestação apenas da expressão individual, mas relaciona-se a enunciados anteriores. Assim, o filósofo reconhece que os enunciados também possuem formas socialmente partilhadas, de caráter coletivo.

174

Sendo assim, a concepção bakhtiniana do “gênero discursivo” é um dos elementos que resolve o embate entre manifestação singular e coletiva. Isso porque os enunciados assumem formas singulares, mas se constituem a partir de gêneros, ou seja, formas “relativamente estáveis” de enunciados. Não é por acaso que Bakhtin, em momentos diferentes de seus textos, faz alusões aos enunciados e gêneros como elos, ou correias que ligam as formas singulares em formas coletivas: Os enunciados e seus tipos, isto é, os gêneros discursivos, são correias de transmissão entre a história da sociedade e a história da linguagem. Nenhum fenômeno novo (fonético, léxico, gramatical) pode integrar o sistema da língua sem ter percorrido um complexo e longo caminho de experimentação e elaboração de gêneros e estilos. (Bakhtin: 2003, p.26)

Conforme explica Marcuschi (2003), o gênero em Bakhtin caracteriza-se pela interação social e não por uma forma tipificada. Assim, não são as propriedades linguísticas determinadas dentro de um sistema hierarquizado de nomenclatura e regras que caracterizará o gênero, mas a situação, o contexto e o propósito comunicativo.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Machado chama atenção para a importância dos gêneros no dia-dia. Segundo a autora pelo fato de estarem vinculados aos enunciados e, assim, à ação social e cultural, os gêneros estão presentes em nosso cotidiano ao estabelecerem certas formas de comunicação: O mundo prosaico é assim potencializador dos gêneros discursivos que modulam as enunciações, determinando as formas genéricas dos enunciados pronunciados pelos falantes. Para Bakhtin, nossa fala é modulada pelos gêneros discursivos, pois todas as enunciações de nosso discurso-fala revelam escolhas particulares de formas construídas dentro de um todo, as enunciações. (Machado, 1996 P.243)

A afirmação de Machado identifica em Bakhtin uma relação entre as ações sociais e o emprego dos gêneros que viabilizam a comunicação verbal. De maneira análoga, Marcuschi (2003) também chama atenção para o papel que os gêneros assumem na interpretação dos enunciados. Nesse sentido, exemplifica que contar uma piada está ligado a certo tipo de expectativa, portanto contá-la em um local considerado inadequado seria uma violação das normas de uso de gênero. Todavia, Marcuschi chama atenção para o fato de os gêneros assumirem formas inusitadas, admitindo em si a intertextualidade. Enquanto um tipo admite apenas a predominância de certas formas características, um gênero pode incorporar vários tipos textuais. Por isso, o autor considera importante diferenciar os gêneros dos tipos textuais, pois estes dizem respeito a certos traços linguísticos predominantes. Dessa maneira, a partir de Bakhtin e outros teóricos que abordam o gênero pelo viés da interação social, o autor sintetiza as diferenças na seguinte tabela (MARCUSCHI, 2003 p.23):

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

175

Tipos textuais

Gêneros Textuais

constructos teóricos definidos por propriedades linguísticas intrínsecas;

realizações linguísticas concretas e definidas por propriedades sócio-comunicativas;

constituem sequências linguísticas ou sequências de enunciados no interior dos gêneros e não são textos empíricos;

constituem textos empiricamente realizados cumprindo funções em situações comunicativas;

sua nomeação abrange um conjunto limitado de categorias teóricas determinadas por aspectos lexicais, sintáticos, relações lógicas, tempo verbal;

sua nomeação abrange um conjunto aberto e praticamente ilimitado de designações concretas determinadas pelo canal, estilo, conteúdo, composição e função;

designações teóricas dos tipos: narração, argumentação, descrição, injunção e exposição.

exemplos de gêneros: telefonema, sermão, carta comercial, carta pessoal, romance, bilhete, aula expositiva, reunião de condomínio, horóscopo, receita culinária, bula de remédio, lista de compras, cardápio, instruções de uso, outdoor, inquérito policial, resenha, edital de concursos, piada, conversação espontânea, conferência eletrônica, bate-papo virtual, aulas virtuais etc.

Tabela 5-1 – Comparação entre Tipos e Gêneros Textuais

O quadro acima mostra as diferenças entre uma abordagem que privilegia as características linguísticas e outra que privilegia a interação social. De um lado os tipos textuais estão relacionados as características formais, adequados às normas de composição, sintaxe entre outros, desvinculados das suas situações de uso. De outro lado, e os gêneros discursivos estão relacionados segundo seus propósitos e funções de acordo com suas ocorrências em situações cotidianas. A vinculação dos gêneros aos contextos culturais e sociais admite uma pluralidade de gêneros tão diversa quanto as situações sociais possíveis. Nesse sentido, Marcuschi (2003) também expõe que determinadas áreas de conhecimento produzem certas formas discursivas específicas, gerando seus próprios gêneros oriundos de práticas comunicativas institucionalizadas. É o caso de certos gêneros presentes no discurso religioso (novena, ladainha, jaculatória). O próprio Marcuschi (2003, p. 23) exemplifica o caso da aula expositiva como um gênero discursivo. O exemplo evoca tanto a especificidade de uso como as possibilidades de variantes dentro do gênero. Por um lado, a situação de aula exige uma certa forma de elaboração verbal e certas estratégias empregadas por professores e alunos. Por outro lado, existe uma variedade de “aulas expositivas” que não seguem, necessariamente, a mesma forma, mas cujo propósito e situação social se assemelham. Neste caso trata-se de uma construção social e com isso, admite variantes de acordo com o seu propósito:

176

Os gêneros não são entidades naturais como as borboletas, as pedras, os rios e as estrelas, mas são artefatos culturais construídos historicamente pelo ser humano. Não podemos defini-los mediante certas propriedades que lhe devam ser necessárias e suficientes. Assim, um gênero pode não ter uma determinada propriedade e ainda continuar sendo aquele gênero. Por exemplo, uma carta pessoal ainda é uma carta, mesmo que a autora tenha esquecido de assinar o nome no final e só tenha dito no início: “querida mamãe”. Uma publicidade pode ter o formato de um poema ou de uma lista de produtos em oferta; o que conta é que divulgue os produtos e estimule a compra por parte dos clientes ou usuários daquele produto. (...) (MARCUSCHI, 2003, p.32) Apesar de admitirem diferentes tipos textuais e por privilegiarem uma função comunicativa adequada a um contexto, os gêneros também possuem formas características. A questão, conforme aponta Bakhtin, é reconhecer que tais formas não são arbitrárias e oriundas de um sistema pré-estabelecido e abstrato, mas

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

constituídas em situações históricas e sociais específicas. Tais formas, refletem portanto o contexto em que se inscrevem. A este respeito [gêneros linguísticos] faremos simplesmente a seguinte observação: cada época e cada grupo social têm seu repertório de formas de discurso na comunicação sócio-ideológica. A cada grupo de formas pertencentes ao mesmo gênero, isto é, a cada forma de discurso social, corresponde um grupo de temas. Entre as formas de comunicação (por exemplo, relações entre professores de conteúdo num contexto puramente técnico), a forma de enunciação (“respostas curtas” na “linguagem de negócios”) e enfim o tema, existe uma unidade orgânica que nada poderia destruir. (BAKHTIN 2006, p.42)

Portanto, os gêneros discursivos na concepção de Bakhtin não se constituem a partir de uma série de características formais, em sistemas classificatórios hierarquizados, em formas composicionais específicas. Os gêneros adquirem suas formas características mediante as práticas sociais e a partir dela se consolidam e se modificam de acordo com os interlocutores, contexto histórico, hierarquia social, ideologia etc. Nesse sentido, podem ser classificados quanto ao seu grau de elaboração: primários, quando tem origem em ações cotidianas espontâneas, normalmente orais; secundários, quando tem origem em comunicações mais complexas, incorporando outros gêneros, normalmente escritos. A distinção entre gêneros primários e secundários consiste em uma das poucas classificações que Bakhtin estabelece, uma vez que sua filosofia da linguagem não propõe um sistema classificatório, mas à observação das situações de emprego da língua. A distinção diz respeito aos níveis de elaboração, em que os gêneros primários ocorrem normalmente em situações orais e são mais simples e espontâneos, enquanto os secundários são mais elaborados, típicos da escrita e in-

177

corporam os gêneros primários. Os romances, por exemplo, são gêneros secundários que incorporam outras formas primárias, como o diálogo. Em suma, os gêneros discursivos são formas discursivas constituídas nas interações verbais que formam os enunciados. Estes, por sua vez, são dependentes das condições de enunciação, que envolvem aspectos sociais e históricos, estabelecendo o diálogo com formas pré-existentes e em relação a quem se destina. Portanto, a enunciação se dá dentro de uma situação dialógica, com um propósito específico e negociada entre os interlocutores. 5.2

Os gêneros das aulas de projeto

Embora Bakhtin trate dos aspectos discursivos na sua concepção de uma filosofia da linguagem, sua compreensão dialógica, a partir da dinâmica da interação verbal, pode ser empregada para compreender outras formas de interações sociais. Assim, a noção de que o discurso depende das condições de enunciação é operaci-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

onal, pois possibilita compreender que as relações e os significados dependem tanto dos interlocutores como também de suas condições materiais e históricas de produção. Este entendimento ressalta a importância do contexto para o processo de significação e os papéis das diferentes mediações no processo discursivo e nas interações sociais em geral. Não vemos necessidade de se restringir o discurso aos aspectos verbais apenas, pois há uma série de outros aspectos não verbais que participam das interações sociais. Os estudos acerca do discurso, presentes na sociolinguística interacional, por exemplo, apontam não apenas para as características verbais nas interações, como também para os aspectos não verbais. Os gestos, a entonação, a ênfase dada às palavras, o ritmo, as pausas, o posicionamento entre os participantes, entre outros aspectos, fornecem o que Gumperz (2002) chama de “pistas de contextualização”. Segundo o autor, estas pistas podem se sobrepor aos enunciados verbais, mudando o significado do que foi dito, de acordo com o que foi sinalizado ou sugerido pela pista de contextualização. Podemos, portanto, referir-nos à comunicação humana como canalizada e restringida por um sistema multinivelar de sinais verbais e não verbais, que são adquiridos e, ao longo da vida, automaticamente produzidos e intimamente coordenados. (Gumperz, 2002 p.166)

Dessa maneira, a sociolinguística interacional evidencia o importante papel que os sinais não verbais assumem na construção de sentidos nas interações sociais. Tais sinais podem ser interpretados e assumem um papel importante tanto na sociolinguística interacional como na antropologia. O antropólogo Clifford Geertz (2008), por exemplo, chama a atenção para a interpretação dos significados em uma

178

descrição etnográfica, valorizando os significados de gestos simples como uma piscadela de olhos que, dependendo do contexto pode sinalizar dissimulação, conivência, tique-nervoso ou mesmo a imitação de um tique. O gesto, acompanhado de palavras, poderia confirmá-las ou contradizê-las, daí a importância da contextualização. Mas não são apenas os gestos que encerram as possibilidades de interpretação. As pistas de contextualização também podem se referir ao local, à ocasião, ao momento, aos sujeitos envolvidos, à cultura dos participantes e uma série de outros fatores que possam indicar uma ou outra convenção de interpretação. Com isso, há um entendimento pertinente à sociolinguística interacional e à antropologia de que os aspectos espaciais, os recursos materiais são capazes de afetar as práticas de ensino e aprendizagem. Se os recursos materiais e espaciais potencializam ou limitam as possibilidades de ação, entendemos que eles participam diretamente da constituição de determinadas práticas de ensino e aprendizagem que são, também práticas comuni-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

cativas e discursivas. Com isso, os espaços e objetos também afetam a constituição dos enunciados e as possibilidades de significação. As interações sociais, para recuperar a expressão de Bakhtin, situam-se em um contexto, mas este não é apenas social e histórico, mas também material. Afinal, assim como as palavras, os objetos e espaços arquitetônicos também refletem os aspectos, estilos, propósitos e funções definidos social e historicamente. As interações ocorrem nestes espaços e as possibilidades de ação também são potencializadas ou limitadas pelas condições materiais. Ao se referir aos enunciados e, por extensão, aos gêneros (que se constituem a partir deles), Bakhtin indica três aspectos que formam os enunciados: [Os enunciados] refletem as condições específicas e as finalidades de cada referido campo não só por seu conteúdo (temático) e pelo estilo da linguagem, ou seja, pela seleção dos recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais da língua mas, acima de tudo, por sua construção composicional. (Bakhtin, 2003 p.261)

Ao nos apropriarmos da noção de gêneros para tratar das aulas de projeto do curso de graduação em Design da PUC-Rio e das interações com o ambiente, podemos reinterpretar os aspectos que constituem os elementos verbais para as interações de outra ordem. Os temas correspondem aos diferentes conteúdos das aulas, ou seja o que está sendo enfatizado. O estilo correspondem às escolhas dos recursos, às maneiras como são articulados diferentes aspectos verbais, visuais, gestuais de acordo com a intenção. A construção composicional diz respeito aos arranjos, a forma que assumem na sala e empregam os recursos. Além dos aspectos enunciados por Bakhtin, Marcuschi (2003) também chama a atenção para a função, o que na concepção proposta por Bakhtin está su-

179

bentendida no próprio conceito de enunciado. Assim, a função também foi considerada na análise que contemplou a seleção dos 30 desenhos selecionados, segundo os critérios apresentados no capítulo 4, desenvolvidos pelos alunos do curso. A análise a seguir contempla a observação, mediante os registros do diário de campo, como dois casos exemplares de desenhos que apresentam o momento de modo a contrastar as minhas opiniões às representações gráficas dos alunos. 5.2.1 5.2.1.1

Palestras e aulas expositivas Observação Havendo percebido a necessidade de abordar o assunto para auxiliar os alunos com o detalhamento dos projetos, um dos professores regentes da disciplina resolveu dar uma aula dedicada ao uso de cores. A sala estava organizada em fileiras e o professor manteve a disposição das mesas e cadeiras. À frente da sala, o professor chamou a atenção dos alu-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

nos que estavam sentados em grupo ao redor das mesas, de maneira que prestassem atenção à aula. O professor explicou brevemente o processo a partir do qual enxergamos as cores, e a formação das cores a partir da luz. Depois o professor tratou dos aspectos técnicos acerca do círculo cromático e das ferramentas empregadas para definir os diferentes padrões de cores. Para auxiliar a explicação, o professor foi ao quadro e desenhou um círculo listando a posição de cada tonalidade segundo o ângulo. A partir do esquema apresentado, ele explicou a maneira como os programas se referem às definições cromáticas. Os alunos permaneceram em seus lugares, enquanto professor explicava. A atenção dos alunos se dividia entre o professor e o trabalho do projeto. (DSG1005 - segunda-feira, 19 de outubro de 2009)

180

Figura 5-1 Professor ministrando uma aula expositiva sobre cor à frente da sala

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

As aulas expositivas ocorrem quando os professores regentes pretendem abordar um tópico específico, ou no momento de apresentação da disciplina. Fora isso, aos professores regentes tendem a orientar os trabalhos dos grupos no formato de atendimento. Já em relação aos professores de conteúdo, a aula expositiva é um formato de aula comum, na medida em que algumas aulas de conteúdo visam a apresentar conceitos para os alunos. Os professores regentes convidaram uma professora para palestrar sobre o assunto da produção gráfica na aula. A palestra foi conduzida mostrando os processos de produção e acabamento de materiais impressos. Para explicar os processos de produção, a convidada trouxe uma bolsa repleta de materiais gráficos. Sua fala era coordenada com a exibição de uma série de materiais como fotolitos, provas de impressão, amostra de impressos, escalas de cores, etc. Conforme ela explicava os processos, ela mostrava o exemplo e depois emprestava o material que circulava pela turma para que os alunos pudessem ver de perto. Além disso, ela empregou também uma apresentação digital, mediante a qual apresentava textos e imagens sobre o conteúdo, que era coordenado com sua fala. Para a palestra, o arranjo da sala não foi alterado, mantendo a organização das mesas dispostas em fila. Os alunos, sentados junto às mesas assistiam à aula e, eventualmente, faziam questionamentos. Alguns alunos faziam outras coisas, como ler, desenhar ou conversar. Nesses casos a atenção para a aula oscilava, alternando ora para a aula e ora para as atividades paralelas. Embora nem todos alunos estivessem plenamente concentrados na palestra, mantinhamse sentados em seus lugares. (DSG1002 – Quinta-feira, 04 de junho de 2009)

181

Em aulas expositivas e palestras, os professores regentes, os professores de conteúdo e, em alguns casos, palestrantes convidados normalmente expõem oralmente, mas costumam lançar mão tanto do quadro de giz para anotar ou desenhar, quanto de materiais e objetos que servem para ilustrar ou exemplificar, de imagens ou vídeos, ou ainda de apresentações eletrônicas em PowerPoint. O uso deste último recurso é bem comum entre os professores regentes e de conteúdo, uma vez que a sala conta com o equipamento. Durante as aulas expositivas, é possível que as atividades paralelas causem indisposições entre alunos e professores. Em alguns casos, as conversas dos alunos são inibidas e a atenção demandada para o que está sendo exposto sob a justificativa do conteúdo ser importante ou da utilidade daquilo para os projetos dos alunos. A participação dos alunos ocorre por meio do questionamento do professor direcionado a algum aluno, ou por manifestação espontânea dos alunos através

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

dúvidas e depoimentos que contradizem ou corroboram o que está sendo exposto.

Figura 5-2 Professora de conteúdo de texto usando o projetor durante aula expositiva

A disposição da sala durante as aulas expositivas e palestras conta com as mesas dispostas em fileira, círculo ou retângulo, onde ficam os alunos, voltando sua atenção para a direção do quadro/tela de projeção. O professor palestrante, costuma ficar à frente da sala, diante do quadro/tela de projeção dirigindo-se à turma como um todo. Esta disposição também é empregada pelos professores quando querem dar algum aviso à turma, empregando o quadro para anotação de datas e prazos (Figura 5-3).

182

Figura 5-3 Fotografia do quadro com avisos dos professores sobre a G2

Em alguns casos mais raros as aulas expositivas/palestras assumem um

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

formato variante constituído por uma grande mesa composta pela junção das demais. Esta disposição serve para quando o professor/palestrante pretende expor amostras de materiais para os alunos, dispondo-as sobre a mesa e falando sobre o assunto. Os alunos, costumam ficar em pé ao redor da mesa (Figura 5-4), observando a fala e a exibição dos materiais.

Figura 5-4 Alunos ao redor da mesa enquanto o palestrante fala a respeito dos materiais plásticos

183

Embora muitas aulas desenvolvidas por professores de conteúdo ocorram na forma de palestras, elas também podem apresentar outros formatos. Durante uma mesma aula, os diferentes professores regentes-conteudistas das disciplinas podem transitar entre um momento e outro. 5.2.1.2

Análise dos desenhos

A imagem abaixo (Figura 5-5) apresenta diferentes momentos de aula a partir do qual a autora encontra-se representada em destaque ao centro. Os diferentes momentos representados situam a aluna e sua dupla de projeto em diferentes situações de maneira bastante sintética. De uma maneira geral, o desenho foca nas ações da dupla e

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

omite diversos detalhes, como a representação dos cenários e dos demais alunos.

Figura 5-5 Desenho 033MD14F01 apresentado na íntegra

O foco de análise é um fragmento do desenho, situado no canto esquerdo superior. Essa parte do desenho (Figura 5-6) mostra um enquadramento normal em que o professor à frente da sala e duas alunas sentadas, assistindo a aula. A turma como um todo não aparece, mas está sintetizada na presença das duas alunas. O professor, no caso, está identificado pelo rótulo “conteudistas” que, pelo uso do plural, representa o conjunto de professores de conteúdo. A partir do posicionamento do professor à frente da sala como que explicando algo e dos alunos sentados, entendo tratar-se de uma palestra / aula expositiva.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

184

Figura 5-6 Desenho 033MD14F01 (fragmento) com professor palestrando

O professor está diante do quadro de giz (ou tela de projeção, não foi possível precisar) apontando para algum aspecto que procura enfatizar. A aluna está sentada com a mão levantada (a autora do desenho),manifestando o desejo de falar. Ao lado da aluna, uma colega e parceira de trabalho também está sentada. O fragmento caracteriza a sala de aula apenas pelo quadro e pelas cadeiras, omitindo os aspectos da sala (paredes, piso, janelas etc.), recursos (mesas, projetor) e pessoas (os demais alunos). A representação do projeto omitindo o restante da turma apresenta a aula de projeto por uma perspectiva da dupla, atrelada ao percurso de projeto, no qual enfatiza apenas aquilo que é considerado pertinente e excluí aquilo que é considerado irrelevante. A principal ação apresentada é a de mostrar, sinalizada pelo gesto do professor ao apontar algo no quadro. A ação de falar está subentendida pela posição e postura do professor, que ao indicar algo, parece enfatizar alguma explicação. A manifestação da aluna erguendo a mão também antecipa uma ação de fala, mas submetida à aprovação do professor, indicando também a autoridade atribuída a ele. Nesse desenho o conteúdo não está especificado, portanto não sabemos qual o tema em questão. Em relação ao estilo, notamos o emprego de recursos visuais quadro, pela ação de mostrar, e verbais, pela implicação da ação de falar. A composição considera o professor em pé à frente do quadro protagonizando a ação e os alunos sentados voltados para ele, assistindo e falando, quando autorizados.

185

O desenho abaixo também apresenta diferentes momentos a partir do qual a autora mostra o desenvolvimento do projeto. Nesse caso, a sala e a turma estão representados, embora apresente casos em que apenas os alunos estão em interação

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

entre eles ou com o professor.

Figura 5-7 Desenho 022MD28F01 apresentado na íntegra

O foco da análise está no fragmento situado no canto esquerdo superior (Figura 5-8). Essa parte mostra um ângulo superior e apresenta a sala de aula como um todo. À frente da sala encontram-se os professores, sentados, e ao redor da sala estão os alunos. A dupla de professores foi identificada pela posição que ocupa na sala, num lugar destacado à frente da sala, diferente dos demais alunos.

186

Figura 5-8 Desenho 022MD28F01 (fragmento) da aula expositiva mostrando as ações dos alunos

Os professores encontram-se sentados diante de uma mesa posicionada à PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

frente do quadro. Os alunos encontram-se sentados diante de mesas de três lugares, organizadas no formato da letra “U”. Além das mesas, cadeiras e quadro, a aluna também representou os limites da sala por linhas e a porta da sala, semiaberta. Sobre as mesas de professores e alunos encontram-se cadernos abertos (ou livros, difícil de distinguir). Quanto às ações ambos os professores estão falando, indicado pelo balão de fala. Um único aluno encontra-se falando, também indicado pelo balão de fala. Os demais alunos encontram-se pensando, indicados pelo balão de pensamento, mas de maneiras distintas, indicando afirmação (ponto de exclamação), dúvida (ponto de interrogação), algum conteúdo (linhas semelhantes às de fala) ou tendo uma ideia ou insight (lâmpada acesa). Outra ação que pode ser subentendida é a de leitura e, se tratando de cadernos, de escrita e desenho durante as aulas. Isso porque a presença dos objetos sobre as mesas sugere a importância conferida a eles durante a atividade. Ainda assim, nenhuma ação direta está sinalizada, talvez pelo pouco detalhamento das figuras humanas. Os professores protagonizam as ações por serem a maioria falante. O pensamento, embora indique a atividade por parte dos alunos, se dá apenas na esfera individual e parece ser reativa ao que está sendo dito. A representação dá conta da diversidade de pensamentos durante a aula expositiva. Todavia, não apresenta diversidade de condutas, uma vez que todos parecem engajados na mesma atividade, sem desvios de atenção claros. Nesse desenho o conteúdo da aula não foi indicado, o que impede de identificar o tema. Em relação ao estilo, os recursos de fala e de pensamento estão desta-

187

cados e de leitura e escrita estão subentendidos. A composição apresenta os professores sentados à frente da sala protagonizando a ação e os alunos ao redor da sala, ouvindo, pensando e, em menor grau, falando. 5.2.1.3

Considerações sobre a aula expositiva

As aulas expositivas e palestras ocorrem com frequência nas aulas dos professores de conteúdo e não são comuns nas aulas dos professores regentes. Isso porque em geral esse formato visa ao ensino de um ou outro conteúdo específico, enquanto o andamento dos projetos demanda mais tempo das orientações dos professores na dinâmica dos atendimentos. Todavia, apesar de o desenvolvimento de projetos tornar os atendimentos mais comuns, a amostra de desenhos que enquadram o momento das palestras é expressiva. O valor atribuído pelos alunos às aulas expositivas e palestras é principalmente de ordem intelectual. Os desenhos mostram os alunos tendo ideias a partir da fala

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

dos professores e, em alguns casos, exclamando ou interrogando em pensamento ou em palavras. Esta tendência indica, portanto, as aulas expositivas como uma situação de ensino e aprendizagem prioritariamente de conteúdos teóricos. Em alguns casos, as aulas podem apresentar conteúdos técnicos, enfatizando produtos e processos que contribuem diretamente para o desenvolvimento dos projetos. Em um dos casos descritos, um palestrante apresentaram objetos, recursos e mostruários diversos (papel, plástico, escala de cores etc.) de modo a familiarizar os alunos com ferramentas e processos de uso cotidiano nas diferentes especializações da área. Portanto, as aulas expositivas também auxiliam na familiarização com as ferramentas e processos, no sentido de constituir um repertório de ordem prática. O formato apresenta consenso nas representações como o posicionamento das pessoas, o detalhamento (professores mais detalhados que alunos), destaque e predominância da fala. As diferenças mais nítidas estão relacionadas aos pontos de vista adotados (frontal ou superior) e à organização e distribuição dos alunos na sala. Mas essa variação pode ser devido aos diferentes arranjos em salas de aula diversificadas. No momento das palestras o espaço da sala de aula é empregado na íntegra, demandando a atenção de todos no espaço da sala de aula. Porém, essa demanda por atenção e engajamento de todos os alunos às vezes é respondida com distração (alunos dormindo). Os desenhos demonstram a presença de alguns objetos empregados durante as palestras, favorecendo em especial aqueles que servem como registro (laptop, caderno, folha de papel, lápis e caneta). As interações com outros objetos (mochi-

188

la, estojo, pincel) não foram especificadas, aparecendo apenas sobre a mesa, mas não necessariamente em uso. Os recursos e objetos empregados pelos professores também não estão em evidência, excetuando-se o laptop e o caderno. Ainda assim, houve pouco detalhamento sobre o uso de apresentações digitais (PowerPoint) ou mesmo de recursos trazidos para a sala. Nesse caso, os desenhos sobre as aulas expositivas e palestras ativeram-se mais à fala dos professores. O tema das aulas é variado, pois depende dos conteúdos que são apresentados. Pode tratar de técnicas e processos, ou mesmo aspectos teóricos que possuam algum vínculo com o projeto. Embora variado, o conteúdo temático das palestras deve, a princípio, se relacionar ao desenvolvimento de todos os projetos em geral. Em relação ao estilo, os recursos empregados variam, mas prevalecem a fala, de maneira afirmativa por parte dos professores e frequentemente acompanhada de recursos visuais e textuais, como as apresentações em PowerPoint. Por parte dos

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

alunos, prevalece o pensamento, questionando, assimilando ou gerando ideias e, em alguns casos a fala, de maneira interrogativa. Os cadernos não aparecem com frequência e, quando a aparecem, o seu uso não está claro sobre o papel que exerce. A estrutura composicional apresenta um posicionamento típico em relação aos professores e palestrantes, que aparecem sempre à frente da sala. Já o posicionamento dos alunos, sempre mais afastados do quadro, varia entre o arranjo em fileiras, em retângulo (ou a variante aberta em forma de “U”) ou ainda, em casos mais raros, no formato de uma grande mesa composta pelo encaixe das mesas. As aulas expositivas e palestras são os momentos que mais se assemelham a uma aula convencional. Isso porque é um formato no qual o professor está à frente da sala e os alunos estão ao redor ou em filas. A ação costuma ser protagonizada pelo professor, os demais alunos estão retratados em atitude responsiva ativa (recebendo informação e devolvendo a informação de modos diferenciados, como indagações, reflexões, indiferença...). Nos arranjos e nas postura a hierarquia fica clara: o professor está em destaque e é tratado como autoridade, enquanto os alunos estão em segundo plano, tanto no posicionamento, como na caracterização e nas atitudes. A hierarquia e autoridade dos professores aparece neste momento nas ações e na ordenação da sala de aula. Á frente da sala, de pé, os professores exercem o poder, tanto ao falar como ao reprimir aqueles que estão distraídos ou que “atrapalham” a aula, como mostra o caso narrado no capítulo 3. A partir de um ponto de vista privilegiado, o poder disciplinar dos professores se manifesta. Aos alunos cabe acolher ou rejeitar, seja de maneira explícita ou simulando o engajamento. Ressalto que a distração e o não engajamento não está tão presente nos desenhos como me pareceu durante a observação das aulas. Há toda uma diversidade de

189

atividades paralelas que não foi retratada, tais como leitura de livros e revistas, conversas, desenhos etc. Isso talvez porque o foco da ação foi privilegiado e os alunos destacaram os professores, em alguns casos, até omitindo a presença de outros alunos.

5.2.2 5.2.2.1

Atendimentos Observação A professora regente chegou na sala para a aula e foi chamada por uma dupla de alunos. Ela sentou-se diante de uma das mesas junto à dupla, que depois cedeu o lugar para outras duplas, sucessivamente. Enquanto isso, o professor realiza o atendimento indo de mesa em mesa, parando para atender aqueles alunos que o solicitam. Uma dupla de alunos sentou-se junto à professora, colocando sobre a mesa uma caixa de onde tirou papéis, cartões, sacos de tecido e cubos de madeira, mos-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

trando suas ideias para a experimentação. Naquele projeto, os alunos trabalhavam com o ensino de música para crianças e identificaram uma dificuldade de aprendizagem em relação às notas musicais. Como proposta, os alunos pretendiam criar uma brincadeira em que as crianças pudessem sortear um conjunto de notas para tocá-las no teclado. Outra proposta era a construção de um teclado de papel, a partir do qual os alunos poderiam memorizar as notas e as posições. Os alunos estavam em dúvida sobre qual proposta levar para a experimentação. A professora sugeriu que trabalhassem ambas as propostas e verificassem no uso sua repercussão e aceitação. A professora também ressaltou a importância do acabamento dos experimentos, pois objetos coloridos e bem acabados poderiam influenciar nas escolhas, em detrimento de objetos mais rústicos. Outro aluno, que no caso trabalhava sozinho, sentou-se para o atendimento. Ele narrou seu projeto, que se passava em um curso de dança para préadolescentes. Como ele afirmava não saber dançar, tinha dúvidas sobre aspectos em que poderiam contribuir para a aula de dança. Entretanto, ele havia identificado as dificuldades em relação à aprendizagem da coreografia, especialmente por que os ensaios se alternavam em espaços com dimensões diferentes, o que dificultava o a ocupação dos lugares. A professora sugeriu que pensasse em possibilidades de atuação para aquela situação. A partir daí, o aluno formulou uma proposta de jogo coreográfico, em que a professora empregaria códigos associados aos passos da coreografia. Outra proposta formulada foi o desenvolvimento de um sistema para marcação dos espaços na sala, a fim de delimitar onde os dançarinos deveriam ficar.

190

Ao perceber as possibilidades de experimentos, o aluno saiu manifestando satisfação por ter encontrado soluções. Enquanto os alunos eram atendidos, alguns aguardavam sua vez, enquanto outros trabalhavam ou realizavam outras atividades. Uma aluna aproveitava o tempo de espera para realizar um trabalho de outra disciplina em seu laptop. Alguns alunos não estavam na sala, tinham ido trabalhar na construção do pro-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

duto no laboratório de volume. (DSG1002 – terça-feira, 16 de junho de 2009)

Figura 5-9 - Professora atendendo o aluno durante a fase de experimentação

Os atendimentos são momentos recorrentes ao longo da maioria das aulas nos quais os alunos apresentam e tiram dúvidas sobre seus projetos junto aos professores regentes. Na medida em que os alunos são informados sobre a proposta e o planejamento das aulas, os professores regentes passam a ministrar as aulas na forma de atendimentos. Nesse formato, as duplas de alunos narram seu percurso, apresentam ideias e discutem com os professores regentes questões específicas sobre seus projetos. Os atendimentos podem ser feitos junto à dupla de professores, mas é comum os professores se dividirem de maneira a atender o maior número de alunos possível. Normalmente, assim que os professores regentes chegam à sala, são demandados pelos alunos a esclarecerem dúvidas ou discutir seus progressos. Conforme as datas de avaliação se aproximam, a demanda por orientações cresce e a prática de fazer listas com ordem de atendimento passa a se tornar corriqueira. De acordo com a demanda das orientações, seja raro atender a todos os alunos em uma única aula. Por esse motivo, os professores tentam evitar atender os mesmos grupos em aulas consecutivas, de modo a garantir que todos tenham vez.

191

Os professores estavam atendendo os diferentes grupos, visitando os alunos de mesa em mesa. Naquele momento cada mesa era dominada por um grupo que se encontrava reunido trabalhando em seus projetos. Raros eram os casos em que as atividades não estavam ligadas ao projeto. Um dos grupos, formado apenas por mulheres, chamou a professora para auxiliar no detalhamento do produto. Elas trabalhavam em um catálogo sobre o Fashion Rio e mostraram o que havia sido feito em um laptop, apresentando as telas no programa de diagramação. Nesse caso contavam com a experiência e conhecimentos da professora que dominava o programa de diagramação e possuía experiência em Design gráfico. A professora se aproximou do grupo teceu comentários sobre o que estava sendo feito, sugeriu algumas modificações e deu algumas dicas sobre o uso do programa. A professora percebeu que precisaria explicar o processo de impressão e encadernação, para que o grupo conseguisse detalhar o produto. Assim a professora pegou o caderno de uma das alunas e passou a anotar algumas informações, acompanhadas de desenhos esquemáticos. Os desenhos ilustravam a monPUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

tagem dos cadernos no processo de impressão. (DSG1005 - segunda-feira, 30 de novembro de 2009)

Figura 5-10 – A professora anota e desenha no caderno da aluna as informações sobre processos gráficos

Desde a escolha do local de projeto, nos casos do Design em Parceria, até a entrega dos relatórios, os alunos buscam o atendimento dos professores. Às vezes, quando as dúvidas tornam-se recorrentes, os professores podem transitar do aten-

192

dimento para uma situação de aviso ou mesmo preparar uma aula expositiva à respeito do assunto para que todos os alunos sejam informados. A iniciativa para realizar o atendimento normalmente parte dos alunos, mas quando os professores notam que determinadas duplas não os tem procurado, vão ao encontro dos alunos, ora questionando-os sobre o andamento dos projetos, ora oferecendo ajuda, ou mesmo para mostrar alguma coisa que tenham associado àquele projeto específico. O atendimento costuma ser uma forma de conversa da dupla de projeto com o professor, em que os alunos relatam as atividades que fizeram e pedem orientação sobre os próximos passos. Em alguns momentos, a conversa abre espaço para se mostrar alguma coisa, seja um desenho que explique o local de projeto, seja uma fotografia de um objeto que inspirou o aluno, seja o material que foi comprado para a experimentação. Não é apenas o aluno que mostra coisas ao professor, há casos em que os professores trazem livros, revistas, imagens ou mesmo mate-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

riais que podem auxiliar os alunos em seus projetos.

Figura 5-11 O professor (de vermelho) mostra aplicativo no celular durante o atendimento

Os cadernos de projeto também são usados durante o atendimento, seja para mostrar estudos de objetos desenhados pelos alunos, para registrar informações rele-

193

vantes da conversa, ou mesmo para a intervenção direta do professor (Figura 5-10), no sentido de explicar alguma coisa ao aluno escrevendo ou desenhando no caderno. Enquanto os professores atendem os alunos, os demais alunos ficam livres aguardando sua vez enquanto realizam atividades paralelas. Há também situações em que os alunos sentam-se para ouvir o atendimento a outro grupo, mas esses casos são raros. Ocorrem, algumas devido a certa urgência do aluno em ser atendido (quando ficam antes do atendimento) ou quando esperam algum colega para ir embora (quando ficam depois do atendimento). Como o atendimento ocorre simultâneo a outras atividades na sala (inclusive ao atendimento do outro professor), a disposição espacial possui o centro da ação restrita a uma fração da sala. Em geral o professor e os alunos se reúnem em torno de uma mesa, sentados ou em pé, empregando recursos visuais e materiais para mostrar, ou apenas narrando oralmente. O centro da ação encontra-se na reunião entre professores e alunos ao redor da mesa do professor ou dos alunos.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Na periferia da ação encontram-se os alunos engajados em outras atividades, sejam elas relacionadas ou não aos projetos. 5.2.2.2

Análise dos desenhos

A imagem a seguir (Figura 5-12) apresenta um momento único, mas com atividades simultâneas. A imagem situa professores à frente da sala, alunos ao redor dos professores, sentados ou em pé, e monitores próximos a alguns alunos. O desenho não estabelece um foco único, mas apresenta um conjunto de ações, enfatizando também a expressão das pessoas.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

194

Figura 5-12 Desenho 022MD11M01 mostra a turma durante o atendimento

Entre as atividades dos alunos, o desenho mostra alunos dormindo (sinalizado pela onomatopeia “zzz”), conversando, brigando (caveiras e raios próximos acompanhados de expressão zangada), escrevendo (ou desenhando), em dúvida. Em relação às expressões há irritação (fumaça sobre a cabeça), alegria (sorriso), espanto (ou desespero, marcado por linhas saindo da cabeça). A sala representada, pela composição trata-se de uma das tendas (ART4 ou 5) devido ao formato circular e a presença de mesas, apesar de não sinalizar claramente a presença do toldo e do revestimento de vidro. A opção pela representação da tenda evidencia uma opção do aluno, pois não retratou a sala em que estava cursando o projeto e que realizou a tarefa, no caso L532, uma sala retangular. O foco de análise aqui não está visualmente delimitado, mas compreende o grupo junto ao quadro composto pelos professores e os alunos ao seu redor. Essa parte do desenho (Figura 5-13) mostra a dupla de professores sentada à frente do quadro (identificados pelo chapéu identificado na legenda). Os alunos estão ao redor, uma dupla sentada à esquerda e outra dupla com um integrante em pé mostrando um objeto com formato de almofada e outro sentado sobre uma mesa falando (linhas saindo da boca). Pelo posicionamento das pessoas e a ocorrência de diferentes atividades paralelas evidencia tratar-se de um atendimento.

195

Figura 5-13 Desenho 022MD11M01 (fragmento) com os alunos e professores durante o atendimento

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Um dos professores aparece distraído, com o olhar voltado para um inseto, enquanto o outro aparece irritado com os dentes cerrados e sobrancelhas arqueadas e uma faísca saindo da cabeça, reagindo aos alunos e demonstrando briga ou uma cobrança enfática. A dupla de alunos em atendimento, à direita, aparece com expressões tranquilas, um deles está em pé e mostra uma almofada enquanto o outro está sentado sobre a mesa enquanto fala (mostrando uma postura informal ao modificar a função do objeto). Os alunos à esquerda dos professores, estão retratados em situação de desespero. Os olhos estão arregalados, as bocas abertas, gotas de suor e linhas de ação, semelhante a algumas convenções visuais de mangá (quadrinhos japoneses) demonstram a ansiedade. O braço de um deles está levantado, enquanto ambos olham para os professores, como que aguardando nervosamente pela vez deles no atendimento. Na cena estão representados alguns aspectos do espaço e os objetos da sala de aula, como o quadro, mesas e cadeiras. Alguns aspectos foram omitidos como a lona, iluminação, tela de projeção e refrigeração. No quadro há anotações, mas não há referência direta a ela durante o atendimento. Além dos recursos presentes na sala, também foram retratados os objetos trazidos pelos alunos, como a almofada e os objetos de forma geométricas apoiados sobre a mesa. As principais ações apresentadas são as de falar e mostrar, protagonizada pelos alunos em atendimento. Outras ações são reativas, como a expressão do professor e dos alunos que aguardam sua vez no atendimento. Nessa parte do desenho, o conteúdo temático diz respeito ao projeto dos alunos em atendimento, embora não haja indicações do que o projeto trata. Pela

196

maneira como os diversos objetos estão em evidência, parece tratar da etapa de geração de alternativas. Em relação ao estilo são empregados os objetos conjugados com a fala, implicando as ações de falar e mostrar. A composição apresenta os alunos em pé e sentados, falando e mostrando os seus projetos aos professores que estão sentados ouvindo e reagindo aos alunos. A composição corresponde a um fragmento do espaço, onde ocorrem outras atividades. O desenho a seguir (Figura 5-14) mostra uma sequência de momentos, evidenciando as diferentes etapas do projeto. A representação está focada acompanhando o aluno, sinalizado pela mochila nas costas, ao longo dos momentos, omitindo o restante da turma e o cenário mais geral em que as ações se inserem. Apenas os objetos mais próximos do aluno aparecem, como mesas, cadeiras, folhas de papel e o laptop. Ao longo das etapas o aluno aparece interagindo com uma outra aluna (os alunos apresentam camisas estampadas e a mesma altura) e depois com dois professores diferentes, indicados pelo uso dos óculos e por serem mais altos, e

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

trabalhando individualmente. Cabe ressaltar que a autora do desenho estava cursando o projeto de conclusão, no qual os projetos são realizados individualmente.

Figura 5-14 Desenho 329CV11F01 mostra os momentos da aula e diferentes professores atendendo os alunos

197

As diferentes etapas apresentadas no desenho mostram o processo de projeto mediante uma sequência de 13 (ordenados da esquerda para direita e de cima para baixo, seguindo forma de leitura ocidental). A segmentação se dá pela separação entre uma parte do desenho e outra. A sequência se dá porque em cada fragmento o aluno apresenta um estágio da ideia (representadas por letras) que progridem alfabeticamente até chegar à ideia final (no caso a letra “X” representa a síntese das demais letras). Em relação à representação, a aluna optou por representar outra pessoa que não ela, estabelecendo o foco na ação de um aluno. A estampa na camisa do aluno sugere que se trate de um bom aluno, “o aluno número 1” do curso, enquanto sua colega também é uma aluna destacada entre os alunos, pois possui uma estrela na camisa, podendo representar uma monitora ou “boa aluna”. A distinção de sexo está representada pelo cabelo presente nas personagens femininas.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

O foco da análise consiste em uma das etapas separadas espacialmente, localizada no centro da figura. O fragmento (Figura 5-15) apresenta o aluno (aparentemente sentado) diante de uma mesa um professor de cada lado, falando com ele. A presença dos professores juntos ao aluno, separado do restante da sala revela tratar-se de um atendimento.

Figura 5-15 Desenho 329CV11F01 (fragmento) destacando o momento de atendimento

No fragmento um professor aparece em pé à esquerda do aluno falando com um braço erguido em postura de quem explica algo, sugerindo ou questionando uma ideia (sinalizada pela letra “D?”). Uma professora à direita aparece em postura semelhante e falando como se sugerisse ou questionasse duas outras ideias

198

(“F?G?”). O aluno encontra-se no centro com um papel sobre a mesa olhando para cima e com a boca aberta, sinalizando atenção e/ou perplexidade. A sala e os objetos presentes não estão apresentados, há apenas uma mesa em uma folha de papel sobre ela. Porém, em outros momentos da sequência o aluno aparece mostrando o papel para a outra aluna, como se nele estivesse representada a proposta de projeto. A principal ação nesse fragmento é a de falar, no caso questionando, as ideias do aluno. As ações no caso foram protagonizadas pelos professores e o aluno demonstra atenção ao que é dito, pois posteriormente (em outras etapas) incorpora os questionamentos e os sintetiza. O diálogo não está sinalizado no fragmento em questão, mas pelos demais desenhos é possível compreender que os professores já sabem do que o aluno está tratando, uma vez que dão sequência às ideias. Portanto, o aluno já deve ter se manifestado, apresentando ou mostrando para os professores da mesma forma que fez com a aluna, no terceiro desenho da sequên-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

cia. Também a ação de pensar só é apresentada depois, mas faz referência às ideias apresentadas no momento de atendimento. O emprego dos recursos não é claro no fragmento, mas pela sequência é possível identificar que o aluno mostra a folha para a aluna e trabalha sobre ela (lendo, escrevendo ou desenhando) além de empregar o laptop no trabalho. O conteúdo temático é apresentado de maneira genérica, diz respeito ao projeto do aluno, discutindo algumas ideias (identificadas pelas letras “D”, “F” e “G). O estilo empregado reflete as ações de fala, no caso protagonizada pelos professores e nenhum outro recurso é apresentado naquele momento, embora pelos outros momentos subentende-se a leitura, escrita, desenho sendo mostrados durante o desenvolvimento das ideias. A composição apresenta o aluno sentado ouvindo, acompanhado pelos professores em pé falando. A composição é um fragmento do espaço maior que não foi representado. 5.2.2.3

Considerações sobre atendimento

O atendimento é um momento recorrente da aula de projeto cuja importância se dá tanto por ocupar a maioria das aulas dos professores regentes, como por se tratar do momento mais recorrente nos desenhos dos alunos. Uma das principais funções atribuídas ao atendimento está no desenvolvimento das ideias ao longo do projeto, compreendendo as etapas de conceituação e geração de alternativas. Diversos desenhos indicam balões de pensamento e lâmpadas, sinalizando o caráter intelectual e criativo do momento. Porém, há também aspectos referentes às etapas de planejamento, quando os professores orientam no sentido das atividades e no detalhamento, quando a orientação diz respeito às especificações dos produtos.

199

Nesse sentido, as opiniões diferentes manifestadas por professores e alunos assumem um papel fundamental que favoreça a uma síntese de diferentes pontos de vista e contribua para o projeto, estabelecendo o atendimento segundo a função de orientar o desenvolvimento dos projetos. O processo envolve diferentes sentimentos, conforme aparece nos desenhos, além de dúvidas e incertezas. Alguns casos mostram preocupação, nervosismo, desespero, irritação, tranquilidade, descontração. Professores e alunos compartilham alguns desses sentimentos ao longo dos atendimentos e, em alguns casos, fora deles. Essas mudanças de humor sinalizam que trata-se de um processo dinâmico, com altos e baixos que afetam tanto os alunos como os professores. Os desenhos mostram que a atitude de alunos e professores pode ser ora mais ativa, ora mais passiva. Em alguns casos, os alunos procuram os professores, expõem e questionam. Em outros casos, são os professores que vão atrás dos alunos (com direito à broncas e caras feias). Portanto, a iniciativa é diversificada e

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

pende para os dois lados. A disposição de atendimento é característica, agrupando alunos e professores em torno de uma mesa. Entretanto, o ponto de vista adotado nos desenhos privilegia ora alunos, ora professores. Da mesma forma, a mesa pode pertencer aos alunos ou aos professores, o que confirma a alternância da iniciativa. Como os desenhos não privilegiam apenas um ou outro, compreendo que nos atendimentos a relação é mais equilibrada, ou seja, menos hierarquizada. O tema dos atendimentos varia de acordo com os projetos, mas como sua função está ligada à orientação sempre diz respeito ao andamento de determinado projeto, caso a caso. Em relação ao estilo, a fala é bastante presente, seja na narração e descrição ou no diálogo sobre as ideias do projeto. A fala aparece a articulada com a exibição de objetos relacionados ao projeto como desenhos, modelos, protótipos apresentados pelos alunos e, em alguns casos, evidenciado pelos professores como descrito na observação em relação ao emprego do celular e a anotação no caderno. A estrutura composicional compreende um pequeno núcleo formado pelos professores (em dupla ou não) e os alunos (em grupo ou individual), restrito à uma fração da sala, normalmente ao redor de uma mesa. O atendimento é um momento que admite outras atividades paralelas na sala, devido ao fato de a atenção dos professores estar voltada apenas a uma parcela dos alunos. Durante os atendimentos, a autoridade dos professores é retratada de diferentes maneiras. No primeiro desenho, um professor aparece zangado com os alunos, em sinal de desaprovação, o que evidencia um caráter mais autoritário sobre as escolhas dos alunos. No segundo desenho os professores questionam o aluno, causando

200

dúvidas que o mobiliza a agir. Assim, o atendimento admite ambas as posturas, depende do estilo de mediação adotado ou da maneira como alunos e professores encaram o processo de orientação, ora como julgamento ora como sugestão. 5.2.3 5.2.3.1

Apresentações Observação A aula começa, é dia de apresentações. O professor solicita que os alunos auxiliem na reorganização da sala, virando todas as cadeiras para o fundo da sala, de costas para o quadro. A professora da disciplina não estava presente, mas outra professora foi convidada para constituir uma banca avaliadora. O momento foi chamado de G0 (“gê-zero”) e funcionaria como uma prévia da primeira avaliação (G1). Embora não fosse atribuída nota às apresentações, os projetos seriam avaliados e comentados pelos professores de modo a se verificar o progresso dos alunos.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Os alunos que apresentam começam a fixar os cartazes no carpete ao fundo da sala utilizando os dispositivos desenvolvidos com velcro e clip de papel. Os cartazes de tamanho A3 (29,7 x 42 cm) eram ilustrados e escritos, feitos à mão. Depois de fixar os cartazes, os alunos possuíam cinco minutos para apresentar e falam do local escolhido, do parceiro e narram quais atividades ocorrem no local de desenvolvimento do projeto. Enquanto uma dupla de alunos se apresenta, a outra dupla organiza seus cartazes, fixando-os na outra metade da parede. A ordem de apresentação fora pré-estabelecida na aula anterior, portanto os alunos já sabiam quando iriam apresentar. O professor havia organizado daquela forma para que todos os alunos tivessem condições para apresentar, portanto ele controla o tempo de apresentações para que os alunos não extrapolem e prejudiquem as outras apresentações. Ao término da exposição de cada grupo, os professores comentam as etapas percorridas e a qualidade da apresentação. São feitos comentários sobre o tema escolhido, o local, o equilíbrio na fala dos integrantes, a qualidade dos cartazes, entre outros aspectos. (DSG1002 – terça-feira, 31 de março de 2009)

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

201

Figura 5-16 - Apresentação dos projetos dos alunos utilizando cartazes

As apresentações consistem em momentos pontuais ao longo do curso em que os alunos mostram seus projetos para a turma e para os professores regentes. Durante as apresentações, os grupos se revezam expondo seus projetos para os professores e o restante da turma, mediante a fala e o emprego de recursos visuais, como cartazes, modelos e apresentações digitais em PowerPoint ou PDF (Portable Document Format – criados a partir de diversos programas). Normalmente as apresentações ocorrem em momentos chave da disciplina e estão associadas a situações de avaliação. Todavia, na disciplina DSG1005 que observei, havia pequenas apresentações dos alunos com grande frequência no início do projeto, pois fazia parte da abordagem. Embora possam variar em quantidade, normalmente há ao menos duas apresentações para cada grupo vinculadas à avaliação: uma no meio do período (G1) e uma ao final do período (G2). Outra prática que se tornou comum é uma prévia da apresentação de G1, chamada de G0, em que os alunos mostram seus projetos, e a G1,5 (como prévia da G2), mas estes momentos não são avaliados com o rigor das outras apresentações.

202

O grupo de alunos se posicionou à frente da sala que estava organizada em fileiras. Os professores regentes estavam posicionados na primeira mesa da fileira enquanto os demais alunos posicionados nas outras mesas. Os alunos do grupo utilizaram a borda do quadro para posicionar suas pranchas (impressos colados em uma superfície regida). Eram sete, ao todo, a maioria no tamanho A3 (42x21cm). O grupo optou por não usar uma apresentação digital, diferenciando-se de todos os grupos anteriores. No lugar disso trouxeram as pranchas como forma de apresentação. Também vieram aparados de objetos que conceberam: uma maquete que representava em escala o espaço que haviam concebido; almofadas com estampas e o “casulo” uma rede de pendurar que serviria como banco. O projeto tratava-se de uma exposição paralela ao Fashion Rio para valorizar a produção artesanal e a tradição da renda de bilro. Como toda abordagem dos alunos estava ligada aos aspectos sensoriais voltados para a produção PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

manual, a opção pelas pranchas no lugar de PowerPoints foi consciente para criar coerência entre a forma e o tema. Enquanto apresentavam se referiam às pranchas e depois apresentaram os diferentes produtos. O “casulo” e as almofadas eram protótipos em tamanho natural, enquanto a maquete apresentava estes mesmos objetos em tamanhos reduzidos. Durante a apresentação, os professores regentes ouviam e realizavam anotações. Conforme os produtos foram apresentados eles manipulavam e analisavam os produtos, demonstrando interesse. Ao fim da apresentação os professores fizeram comentários positivos tanto em relação ao processo dos alunos quanto à apresentação. (DSG1005 - segunda-feira, 14 de dezembro de 2009)

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

203

Figura 5-17 – Alunos com suas pranchas e objetos durante a apresentação

O uso de recursos não é apenas estimulado, como também é exigido: os alunos devem mostrar o processo através dos desenhos, modelos e experimentos realizados até chegar ao produto (Figura 5-18 e Figura 5-19). Um modelo ou protótipo deve ser apresentado ao final, seja ele digital ou físico, como amostra do resultado alcançado. Todos os projetos do curso possuem momentos de apresentações, assinalando sua importância de tal forma que não é possível desenvolver um projeto sem apresentá-lo.

Figura 5-18 Conjunto de objetos e experimentos desenvolvidos por alunos no projeto 1002

204

Figura 5-19 Modelo em escala (maquete) desenvolvido por alunos no projeto 1005

A disposição espacial acompanha esta lógica e a sala é utilizada e organizada PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

como que uma aula expositiva, com carteiras em fila ou em círculo, voltados para o quadro. No entanto são os alunos que ficam no local comumente atribuído ao professor, à frente da sala, junto ao quadro ou tela de projeção. Os professores sentam-se em uma das filas ou na disposição de uma banca avaliadora, com uma mesa no centro ou ao fundo da sala, diante dos alunos (Figura 5-20). Em alguns casos, os professores de conteúdo e outros professores do curso de Design são convidados a compor a banca avaliadora.

Figura 5-20 Professores (de costas) acompanham a apresentação durante a G2 no fundo da sala

Diferentemente dos momentos de atendimento, na qual o grupo expõe o andamento do projeto ou discute questões pontuais apenas com os professores, as

205

apresentações demandam um relato do processo envolvendo toda a turma. A associação com a avaliação o posicionamento dos alunos à frente da sala torna o momento mais formal que os demais, no qual a avaliação é evidente e o tempo é rigorosamente controlado tanto para a fala de alunos como dos professores. Normalmente as apresentações ocorrem em momentos chave da disciplina e estão associadas a situações de avaliação. Embora possam variar em quantidade, normalmente há ao menos duas apresentações para cada grupo de alunos que coincidem com a entrada de graus no calendário acadêmico. No caso da apresentação de G1 é comum que os alunos apresentem as etapas relacionadas à definição do tema de projeto, problematização, geração de alternativas e definição de partido. Já na apresentação de G2 espera-se que os alunos narrem todo o processo e apresentem o protótipo ou modelo do produto desenvolvido (quando aplicável), evidenciando o detalhamento técnico necessário. As etapas podem variar de acordo com a disciplina, os professores ou as singularidades de cada projeto.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Embora os alunos sinalizem a importância da apresentação, este não é o único momento de avaliação. A avaliação do processo fica evidente quando os professores comentam aspectos e momentos não relatados na apresentação, como a frequência e dedicação dos alunos, ou mesmo as dificuldades deste ou daquele projeto. Ademais, alguns professores sentem a necessidade de estabelecer apresentações em momentos intermediários como forma de verificar o andamento dos projetos. A “G Zero”, por exemplo, foi verificada nas duas turmas observadas e funciona como uma “prévia” da G1, antecipando os possíveis problemas da G1. Outra apresentação intermediária é a “G 1,5”, que funciona de maneira análoga à G0 mas antecipando questões para a G2. O fato de se relacionarem com os momentos de avaliação faz com que os momentos sejam valorizados por professores e alunos, gerando comentários e criando expectativas e ansiedade por parte de alunos e professores. Com isso, é comum que se discuta o que deve ser exposto ou que etapas devem ser cumpridas até determinada apresentação. Os demais alunos que não estão apresentando são cobrados pelos professores a estarem presentes e atentos nas apresentações. É comum que os professores justifiquem esta cobrança afirmando que a apresentação funciona como aula e, portanto, tem presença obrigatória. Contudo, devido à associação com a avaliação, é comum que muitas atividades paralelas ocorram, como conversas, desenhos, além do emprego do tempo para a finalização de recursos utilizados na apresentação, ou atrasos devido à finalização de relatórios. Durante as apresentações não chega a ser raro o caso de alunos que chegam minutos antes de suas respectivas apresentações, por estarem

206

ocupados finalizando algo. Outra situação possível é os alunos se retirarem da sala

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

após suas apresentações, esvaziando a sala (Figura 5-21).

Figura 5-21 Sala vazia durante a apresentação da dupla na G2

5.2.3.2

Análise dos desenhos

A imagem a seguir apresenta três momentos distintos e sequenciais, separados espacialmente e ligados por setas. nos quais encontram-se os professores e os alunos. Num primeiro momento há uma aula expositiva, em seguida o grupo de alunos discutindo entre si e no terceiro momento a apresentação dos alunos para a turma e para os professores. O desenho é sintético e apresenta apenas alguns aspectos que caracterizam as pessoas, o espaço e os objetos presentes. Na maneira como foi elaborado, o desenho confere um detalhamento diferenciado aos aspectos que a autora quis valorizar. Assim, o grupo de alunos é mais detalhado que os professores, que por sua vez são mais detalhados que os demais alunos.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

207

Figura 5-22 Desenho 033MO16F01 na íntegra

O foco de análise aqui está no terceiro momento, representado na parte direita da imagem. Essa parte do desenho (Figura 5-23) mostra o trio de alunos em pé (embora os membros inferiores tenham sido omitidos) à frente do quadro (ou tela de projeção). Os professores estão sentados diante de uma mesa voltada para os alunos, numa composição de banca examinadora. Os demais alunos estão ao redor da sala, sentados diante de suas mesas. Pela posição dos alunos e dos professores, bem como as posturas, o fragmento trata de uma apresentação.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

208

Figura 5-23 Desenho 033MO16F01 (fragmento) retratando a apresentação dos alunos

Os três alunos estão em destaque na composição, representados frontalmente e à frente da sala. Os membros do grupo estão falando (balões de fala) e apontando, embora as mãos tenham sido omitidas, em direção ao quadro (ou tela de projeção) simultaneamente. A ação sugere que estejam falando e se referindo à imagem apresentada como apoio à explicação, ou mesmo o conteúdo do assunto. Diante deles estão os professores, sentados diante de uma mesa com folhas de papel nas mãos, indicando possivelmente as anotações para avaliação. Os demais alunos estão presentes, mas apresentam formas simplificadas e há objetos sobre as mesas que parecem folhas de papel e, em alguns casos, laptops, mas o uso e o que eles fazem não está claramente sinalizado. O fragmento apresenta uma parte da sala de aula, pois as linhas incompletas na extremidade inferior indicam a continuidade do desenho. No fragmento a sala está reduzida à representação do quadro, mesas e cadeiras, omitindo aspectos como paredes, piso, iluminação, janelas etc.

209

As ações mais claras são falar e mostrar, que são protagonizadas pelos três alunos simultaneamente. Outras ações que se desdobram é a de ouvir, no caso os professores e demais alunos, e avaliar, no caso dos professores. As atividades dos demais alunos não são muito claras, mas pela postura parecem estar atentos à apresentação. O conteúdo temático no caso é o projeto dos alunos e seu respectivo processo, que é narrado aos professores e colegas. O estilo empregado envolve a fala dos alunos e a exibição de um desenho no quadro (ou tela de projeção), ao qual os alunos fazem referência. A composição apresenta os alunos à frente da sala, os professores voltado para os alunos como uma banca examinadora e os demais alunos posicionados em mesas lado a lado nas duas laterais da sala. A representação a seguir (Figura 5-24) apresenta três momentos distintos e sequenciais, separados por contornos e ordenados por números. Num primeiro momento há uma apresentação, em seguida o grupo de alunos discutindo entre si e no terceiro momento um aluno (ou dois, não consegui determinar se é o mes-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

mo) mostra o detalhamento, em que se trabalha na construção do objeto fora da sala, sinalizada pela presença do computador desktop. O desenho é sintético e apresenta apenas alguns aspectos que caracterizam as pessoas, o espaço e os objetos presentes. Em alguns casos, as pessoas representadas não tiveram os rostos desenhados, ficando apenas os traços estruturais. Os ambientes também foram simplificando, apresentando apenas alguns elementos, dentre eles a tela de projeção, mesa e cadeiras, enquanto os demais aspectos da sala de aula foram omitidos.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

210

Figura 5-24 Desenho 055CV15F01 na íntegra

O foco de análise aqui está no primeiro momento, representado na parte esquerda superior da imagem. Essa parte do desenho (Figura 5-25) mostra dois alunos à frente da sala, identificados tanto por haver uma mulher, possivelmente a autora do desenho, como pela oposição ao professor. O professor encontra-se sentado voltado para os alunos, identificado pelo uso do óculos (que o professor da turma em que foi realizada, de fato usava). Tanto a aluna como o professor estão falando, e o restante da sala e o dos alunos foram omitidos. Pelo posicionamento dos alunos, do professor, e pelas ações trata-se de uma apresentação.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

211

Figura 5-25 Desenho 055CV15F01 (fragmento) do professor comentando o projeto

Os dois alunos estão em destaque na composição, representados frontalmente e à frente da sala. A aluna fala, gesticulando as mãos em sinal de explicação. Apesar de haver uma apresentação projetada na tela, não há uma referência direta a ela, mas subentendo o emprego como apoio à apresentação. O professor também fala, com o dedo levantado em riste e um lápis na mão, sinalizando uma arguição numa postura prescritiva e sugerindo a avaliação, por extensão do ato de anotar subentendido pela presença do lápis. As ações de fala são protagonizadas pela aluna e pelo professor, indicando o diálogo e a troca mediante as setas que vão de uma em direção ao outro e viceversa. O emprego dos recursos não está evidente, bem como as atividades no restante da sala. O professor também porta um lápis, o que sugere que em algum momento ele tome notas. A escolha pela representação apenas dos alunos do grupo e do professor sugerem que a aluna quis enfatizar apenas as pessoas mais envolvidas na ação. Houve portanto uma escolha por omitir o restante da turma, talvez por considerar o papel dos alunos em apresentar e do professor em avaliar, minimizando o papel do restante da turma, como público. No fragmento, a sala está reduzida à representação do quadro, mesas e cadeiras, enquanto, omitindo aspectos como paredes, piso, iluminação, janelas etc. As ações mais claras são falar e mostrar, que são protagonizadas pelos três alunos simultaneamente. Outras ações que se desdobram é a de ouvir, no caso os profes-

212

sores e demais alunos, e avaliar, no caso dos professores. As atividades dos demais alunos não são muito claras, mas pela postura parecem estar atentos à apresentação. O conteúdo temático no caso é o projeto dos alunos e seu respectivo processo, que é narrado aos professores e colegas. O estilo empregado envolve a fala dos alunos e a exibição de um desenho no quadro (ou tela de projeção), ao qual os alunos fazem referência. A composição apresenta os alunos à frente da sala, os professores voltado para os alunos como uma banca examinadora e os demais alunos posicionados em mesas lado a lado nas duas laterais da sala. O conteúdo temático em questão é o próprio projeto dos alunos e seu respectivo processo, narrado para o professor. Quanto ao estilo, a fala é priorizada, tanto em relação aos alunos como ao professor, indicando o processo de diálogo, mas que em relação aos alunos envolve a explicação e ao professor a arguição e avaliação. A composição contempla os alunos em evidência, em pé à frente da sala e o professor sentado na posição de avaliador, de frente para os alunos.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

5.2.3.3

Considerações sobre apresentação

As apresentações constituem um momento característico, mas pontual, das aulas tanto por compreender o relato em momentos-chave do projeto, como também por envolverem as avaliações parciais e finais. De acordo com essa importância, nos desenhos dos alunos há concordância com algumas das impressões registradas na observação das aulas: há uma disposição espacial característica, os alunos ficam em evidência, os professores participam pontualmente. Portanto, há uma dupla função nas apresentações, pois se destinam à comunicação dos processos de projetos para os professores e a turma e à avaliação. Pelo fato das apresentações coincidirem com a avaliação, compreendo que os alunos priorizaram a relação entre professores e apresentadores em seus desenhos. O papel relegado aos espectadores é menor, o que me leva a pensar que eles valorizam mais o momento em que estão apresentando e sendo avaliados, do que os momentos em que assistem seus colegas apresentar. Desse modo, parece que se dirigem mais aos professores do que aos colegas no momento da apresentação, contrariando a expectativa de alguns professores que tentam incentivar a presença da audiência nesse momento. A organização espacial acompanha esta hierarquização de papeis de uma maneira bem característica. A disposição da apresentação equipara-se a um formato de palestra ou aula expositiva (palestrante à frente e demais pessoas dispostos ao redor), mas com uma banca examinadora (com mesas e cadeiras quase sempre presentes) constituída pelos professores colocada à frente dos alunos. Em

213

alguns casos, a plateia está presente em fila ou ao redor, em outros há apenas a relação entre palestrantes e banca. Em relação a interação, os alunos que apresentam protagonizam as ações, falam e mostram enquanto os professores ouvem e observam. O diálogo é pouco retratado, mas presente o que condiz com a formalidade do momento que divide os momentos de fala dos alunos e de parecer dos professores. Entretanto, apesar de parecerem coadjuvantes, o exercício do poder pelos professores aparece quando realizam seus comentários e avaliações. É uma manifestação discreta, mas presente. Os recursos empregados pelos alunos estão apontados nos desenhos, mas de maneira discreta. A maioria dos desenhos destaca o uso da fala e mostra o emprego de texto e imagem projetados na tela. Todavia, há uma gama de recursos observados nas apresentações que não aparecem nos desenhos: experimentos, cartazes, desenhos, modelos, protótipos etc. Tais recursos costumam ser exigidos pelos professores nas apresentações e chega a ser comum que as mesas dos apresen-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

tadores fiquem repletas de materiais, desenhos e objetos. O conteúdo temático nas apresentações são os projetos de cada grupo e seus respectivos processos, é isso que mobiliza os recursos empregados e que implica as arguições dos professores. As diferenças em relação aos atendimentos não é temática, mas diz respeito a outros aspectos como a destinação, pois envolve a turma como um todo. Em relação ao estilo, as apresentações privilegiam a fala, principalmente por parte dos alunos e dos professores, no sentido de questionar, comentar ou avaliar. Além da fala, os alunos costumam exibir objetos e recursos visuais como apoio às explicações, nesse sentido o uso de maquetes, modelos, protótipos, desenhos é fundamental para apresentar o processo e os resultados do projeto. Os desenhos trataram pouco esses aspectos, mas a observação evidencia essa Em relação à estrutura composicional, as apresentações possuem um formato típico que coloca os alunos em evidência, à frente da sala e em pé dirigindo-se aos espectadores. Os professores se posicionam como uma banca examinadora diante dos alunos, embora em alguns casos também possam se sentar nas fileiras, como os alunos. Já os demais alunos situam-se ao redor da sala ou em fileiras, dependendo de como a sala for arranjada. Durante as apresentações, a sala é mobilizada como um todo, todavia alguns desenhos tratam apenas de fragmentos mostrando apenas a interação entre os professores e os apresentadores. Há uma hierarquização clara sobre os papeis desempenhados durante as apresentações. Em primeiro plano encontram-se os alunos que apresentam, representados de maneira destacada nos desenhos: estão em pé, à frente da sala, retratados como os protagonistas que falam e mostram seus projetos. Em segundo pla-

214

no estão os professores, como interlocutores, aos quais os alunos se dirigem. Os professores ouvem e observam a apresentação, ao mesmo tempo em que registram e avaliam, em certos momentos eles intervêm, comentando e dando seus pareceres. Em terceiro plano estão os demais alunos, espectadores que participam menos das ações, apenas assistindo ou, no máximo, aplaudindo. Em alguns momentos não estão sequer retratados ou participando das ações. Os monitores foram mencionados em apenas um desenho. O papel dos alunos apresentadores e professores condiz com as observações. Todavia, considerei algumas divergências quanto ao papel dos espectadores que encontram-se, na maioria dos casos, em posturas passivas e observadoras. Durante minha experiência em sala de aula, notei que nos momentos de apresentação é comum que os demais alunos se engajem em outras atividades tais como as de finalizarem suas próprias apresentações ou seus produtos, as de conversarem ou mesmo as de se ausentarem da sala. Desse modo, a dispersão dos demais alunos

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

espectadores pareceu-me mais comum do que os desenhos evidenciam. 5.3

Conclusões do capítulo

Neste capítulo apresentamos a proposta de empregar a concepção de gêneros discursivos para compreender as formas típicas que as aulas de projeto assumem. Como vimos, a noção de gêneros em Bakhtin depende da noção de enunciado, que compreende a dinâmica dialógica na qual o processo de comunicação se dá, considerando tanto suas condições sociais, como históricas. Os gêneros em Bakhtin correspondem às “formas relativamente estáveis de enunciado” e se constituem em situações específicas e com propósitos específicos. A noção de gênero discursivo é o que permite a relação entre enunciados singulares e as formas coletivas e históricas, pois como lembra Bakhtin, não somos os primeiros a romper o silêncio do mundo. Desse modo, os enunciados também se constituem a partir de gêneros, mesmo que em alguns casos eles os subvertam, conforme lembra Marcuschi. A respeito dos gêneros Bakhtin destaca a variação entre gêneros primários e secundários, enfatizando que a diferença está associada ao nível de elaboração, no qual os secundários normalmente incorporam os primários. Além disso, Bakhtin também aponta para os aspectos que constituem os gêneros, que são o conteúdo temático, estilo e composição. Fundamentados na concepção apresentada por Bakhtin sobre os gêneros discursivos e ancorados na colocação de Marcuschi (2003) de que a aula expositiva é um gênero discursivo, consideramos que os gêneros discursivos também auxiliam na compreensão das práticas de ensino e aprendizagem em sua relação com o

215

espaço físico e os recursos materiais. Isso porque esses aspectos possuem características próprias que potencializam ou limitam determinados tipos de ação e interferem, assim nas práticas de salas de aula. Consideramos também os estudos da antropologia e da sociolinguística interacional para compreender que os gestos, o ambiente e as situações constituem informações contextuais que afetam os significados. Portanto, foi a partir desse olhar que encaminhamos a análise, considerando tanto a observação participante como as representações gráficas dos alunos. Conforme mostraram os desenhos dos alunos e a observação participante, as atividades de sala de aula assumem algumas configurações típicas que permitiram sua identificação. Apesar dessas formas não serem únicas e exclusivas das aulas de projeto em Design, elas apareceram com destaque nos desenhos indicando sua importância para o desenvolvimento das etapas de projeto. Portanto, entendemos que tais formatos não apenas sejam importantes, como também estabele-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

cem maneiras típicas de interação que definem práticas de ensino e aprendizagem características do curso. Defendemos, assim, a ideia de que as aulas de projeto se dão por meio de gêneros, porque entendemos que as aulas possuem, ao mesmo tempo, características singulares, mas que remetem a outras formas pré-existentes e conhecidas. As aulas assumem formas típicas, reconhecíveis pela observação mas também evidenciada pelos alunos em suas representações dos momentos de aula. Quando solicitados a descreverem as aulas de projeto, os alunos mostram uma consciência clara sobre determinados tipos de aula, que, apesar das variações apresentam predominantemente características comuns. Como gêneros de aula, as formas de aula apresentam funções específicas, bem como tema, estilo e composição distintas. Adaptamos esses conceitos para compreender a interação entre as práticas de ensino e aprendizagem com os espaços e recursos materiais de sala. Os gêneros de aula identificados na observação e que encontraram eco nas representações foram as palestras/aulas expositivas, atendimentos e apresentações. Enfatizamos estes pela concordância entre observação e o ponto de vista dos alunos, todavia outros gêneros observados e pouco representados também poderiam ser considerados, como as dinâmicas de sala e as oficinas, mas não havia amostras suficientes para trata-los nessa pesquisa. Também não incluímos aqui outras atividades dos alunos, pois optamos por considerar as interações entre professores e alunos. Consideramos que merecem menção e talvez um trabalho mais aprofundado para tratar dessas relações e o processo de aprendizagem dos alunos de Design.

216

Quanto à função, cada gênero de aula tem uma atribuição específica. Os gêneros de aula de palestras/aulas expositivas possuem a função de prover determinados conhecimentos para os alunos que auxiliem nos projetos. Os gêneros de atendimento visam a orientar o desenvolvimento dos projetos. Já os gêneros apresentações objetivam a comunicação do processo para o grupo e sua respectiva avaliação. Os gêneros de aula possuem estilos, interpretados aqui como os recursos empregados para que se constituam. Também nesse aspecto são variados, embora as ações de falar e mostrar sejam recorrentes em todos, possivelmente pela natureza específica das aulas de projeto que envolve o desenvolvimento dos projetos e a comunicação entre professores e alunos. Entretanto, a maneira específica como os recursos são empregados varia. Nas palestras, trata-se do material trazido pelos professores e palestrantes, e a fala do professor se dá de modo mais autoritário, no sentido de haver um conteúdo a ser aprendido. Durante os atendimentos tanto o que é mostrado como a forma de fa-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

lar muda. Os alunos trazem seus desenhos, objetos, modelos, experimentos para mostrar aos professores e a fala se dá na forma de diálogo e de sugestão. Já nas apresentações também são os alunos que trazem o material para mostrar, mas a fala se dá de maneira mais formalizada e direcionada também ao público de alunos presentes, embora privilegiem a relação com os professores por conta da avaliação. O uso dos recursos presentes na sala também varia de acordo com o gênero de aula. As palestras e aulas expositivas costumam empregar o quadro de giz e/ou o datashow e tela de projeção de maneira a auxiliar as explicações. Nos atendimentos, esses recursos não são empregados, e o caderno e os recursos pessoais, como celular e laptop ganham mais destaque. Nas apresentações o quadro, datashow e tela de projeção voltam a ser usados, só que desta vez pelos alunos. A composição, ou seja, as formas e maneiras com que se configuram os gêneros de aulas são bastante diversificados e característicos. Como lembram Bakhtin (2006) e Marcuschi (2003), não se trata de uma classificação tipológica, mas formas mais ou menos estáveis que se dão a partir das interações, daí sua diversidade e sua atualização constante. De acordo com cada gênero os alunos e professores assumem posições e posturas específicas. Nas palestras e aulas expositivas os professores e palestrantes ficam à frente da sala, normalmente em pé, se dirigindo aos alunos como um todo. Os alunos, por sua vez, ocupam a sala sentados em fileiras ou rodeando a sala (variando se a sala for retangular ou circular). Nos atendimentos, a configuração característica é a de um pequeno núcleo que compreende os alunos e o(s) professor(es), em geral em torno de uma mesa. Durante os atendimentos, os demais alunos se engajam em diferentes atividades, vinculadas ou não ao projeto, enquanto aguardam a vez de serem atendidos.

217

Já nas apresentações a configuração situa os alunos que apresentam em pé à frente da sala, os professores sentados diante dos alunos como banca examinadora e os demais alunos ao redor como espectadores. A atividade, supostamente envolve a turma inteira, mas o foco dos alunos e o diálogo que se estabelece normalmente é com os professores. Vale lembrar que a recorrência desses gêneros de aulas também é diversificado. As palestras e aulas expositivas ocorrem principalmente com os professores de conteúdo, os atendimentos ocorrem predominantemente nas aulas dos professores regentes ao longo do período letivo, enquanto às apresentações constituem momentos-chave da disciplina. Se, por um lado os alunos identificaram as formas de aulas específicas, a partir da qual consideramos como gêneros, por outro lado a consciência acerca dos espaços nas representações demonstra uma tendência à omissão de diferentes aspectos que compõem as salas de aulas. A falta de diferentes aspectos das salas de

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

aula, referentes à sua estrutura, fontes de iluminação, vista, posição de portas e janelas, além das dimensões das salas, para mencionar alguns elementos, não foram contempladas em diversos desenhos. Além disso, elementos esperados como as mesas, cadeiras, projetores, que são empregados cotidianamente, foram omitidos em alguns casos. As omissões, porém, não consistem apenas em esquecimentos, mas consideramos também como parte das escolhas dos alunos ao desenhar, pois elegeram os aspectos que consideraram importantes, deixando de lado aqueles que considerados irrelevantes. Assim, as representações evidenciaram as pessoas, algumas ações, mas detalharam pouco os espaços físicos e os recursos materiais presentes. Os aspectos intelectuais foram bastante enfatizados em diferentes desenhos que mostravam a importância das ideias. Em contrapartida, o desenho das pessoas foi bastante simplificado, omitindo aspectos básicos como a definição do rosto, sexo ou os membros, como mãos e pernas. Há, portanto, uma aparente valoração da razão e do intelecto em detrimento das condições físicas e da maneira como os corpos ocupam os espaços e interagem com os objetos. Não foi possível aprofundar sobre aspectos relativos às posturas das pessoas, sobre as maneiras como se sentam, como as mãos, os pés se posicionam nas interações, entre outros aspectos devido ao nível de detalhamento dos desenhos. Evidentemente, há uma dificuldade de representação que uma representação mais realística envolve, mas há também uma tradição em se desconsiderar o papel do corpo e do ambiente em relação às práticas de ensino e aprendizagem. A omissão desses aspectos se relaciona a uma concepção de ensino que desconsidera o papel do espaço e dos recursos materiais no processo educacional.

218

Além das posturas outro tipo de omissão ocorreu acerca dos demais alunos e, em especial das atividades paralelas. Em diversos casos, os alunos retrataram apenas aquilo que acharam pertinente, omitindo os espectadores das apresentações, ou omitindo o restante da turma durante os atendimentos. Todavia, a observação indicava que estes alunos estavam presentes e que esses gêneros de aulas conviviam com uma diversidade de atividades. A omissão da diversidade de atividades também deve ser associada às noções de ensino, pois contemplaram apenas aquilo que consideraram pertinente para a aula. Dessa maneira, tudo aquilo que não possuía uma relação direta com os projetos dos grupos em alguns casos, como o trabalho de outros grupos, ou com o processo de projeto de uma maneira geral, como as conversas e distrações foram descartados. Com isso, o projeto é considerado de maneira idealizada, pela maneira como deve ser e não com as contradições e diversidades que lhe são inerentes. O reconhecimento, ainda que raro, da pluralidade de atividade que ocorre

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

dentro da sala indica ao menos o entendimento de que a aula se constitui dessa maneira. Embora em alguns casos possa se tratar de uma crítica ao comportamento dos colegas, pelo menos estes desenhos evidenciaram a sala de aula em sua heterogeneidade e pluralidade. Devemos considerar que os alunos não aprendem apenas na relação com os professores, tanto que o Design em Parceria obriga os alunos a observarem uma atividade fora da universidade, mediados pelo contato com o parceiro. Alguns gêneros, como as palestras/aulas expositivas, restringem as demais atividades, mas já os atendimentos favorecem a interação entre os alunos. Portanto, mesmo as aulas potencializam que o ensino e aprendizagem se desenvolvam também por outros meios que não a relação professor-aluno. O poder disciplinar é outro aspecto que faz parte das visões acerca do ensino de projeto. Em alguns casos os professores são enquadrados como autoridades e possuem a palavra final, seja de aprovação ou reprovação. Em outros casos a autoridade se encontra minimizada, equiparado à condição dos alunos que participam na sugestão de alternativas. Os diferentes papeis atribuídos aos professores em relação à autoridade demonstram valorações distintas sobre a importância do poder disciplinar nas salas de aula. Além disso, de acordo com os gêneros de aula se legitima ou se relativiza essa autoridade. O conflito entre autonomia e a necessidade de uma autoridade disciplinar mostra a alternância de papeis atribuídos aos professores em relação aos alunos. Por um lado, desenvolvem atividades em grupo e possuem a capacidade de definirem as próprias escolhas. Por outro lado, estão submetidos ao julgamento e a aprovação dos professores para que possam realizar suas escolhas.

219

As contradições entre desenho e observação, bem como as diferenças de opiniões refletem a ideia das práticas sociais, conforme apresenta Chartier (1990). De acordo com o autor, as práticas sociais se relacionam às suas representações, que nesse caso não se trata de desenhos, mas as ideias, noções, preconceitos que envolvem as práticas. O autor lembra que é comum que as práticas se alinhem com as representações, mas também podem apresentar conflitos, no sentido de grupos sociais que defendem uma ideia, mas possuem práticas que as contradizem. Ao tratar as aulas como práticas sociais, entendemos que elas também envolvem representações, ou seja, predisposições e visões que podem confirmá-las ou contradizê-las. A noção de Chartier também dialoga com a própria noção de Bakhtin, uma vez que reconhece a ocorrências das disputas e confrontos presentes pelas diferenças de classes, grupos e visões de mundo. Para Bakhtin (2006), os signos e os enunciados são as maneiras pelas quais se manifestam as ideologias e portanto, o processo de diálogo é também um pro-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

cesso de negociação, de adequação entre diferentes horizontes de expectativas. Desse modo, o que tentamos neste capítulo foi estabelecer um diálogo entre os momentos de aulas típicos evidenciados pelos alunos e a noção bakhtiniana de gênero A seguir, tecemos as considerações finais acerca da pesquisa.

6 Considerações finais e desdobramentos

Busquei, ao longo da pesquisa, compreender as práticas de ensino e aprendizagem nas salas de aula de projeto com foco nas interações dos sujeitos com os espaços e recursos materiais. Reconheço a importância do objetivo, que ao longo do percurso me permitiu rever algumas ideias e noções acerca do ensino que me parecem pouco contempladas. Apesar de relevante, o objetivo proposto mostrou-se amplo e complexo, assim como as próprias aulas de projeto e, portanto, considero que atendi apenas a uma parte dele. O percurso foi longo e apresentou mudanças significativas que determina-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

ram os resultados da pesquisa, a partir do qual o método foi o resultado do processo, articulado e modificado durante o percurso e não estabelecido à priori. Minhas escolhas de pesquisa foram profundamente orientadas por meu repertório e tomaram um referencial teórico e metodológico relacionado principalmente às ciências humanas e sociais, mais do que aos estudos próprios da Arquitetura e do Design. Ainda assim, essa pesquisa só foi possível da maneira que se apresenta por ter ser realizada no Design, em especial em um programa de pós-graduação que entende o Design pelo diálogo entre teoria e práxis e por sua vocação interdisciplinar. Como ponto de partida, considerei os estudos acerca da leitura de Chartier e Goulemot que apontam não apenas para o ato intelectual e mental, como para a manifestação da leitura como práticas sociais e sua materialidade. Chartier (1999, p.17) afirma que “os autores não escrevem livros, mas textos serão transformados em livros”. Com isso, o autor chama atenção para o fato de que as ideias são materializadas em um suporte físico que foi concebido por meio de escolhas editoriais, tipográficas, materiais, entre outras, que culminaram na concepção do objeto e que participam da leitura. Goulemot (1996), por sua vez, ressalta o papel do corpo e do espaço nas práticas de leitura, sentidos da leitura, reconhecendo seu papel na produção de sentidos. Ambos os autores apontaram dois aspectos relevantes na concepção da pesquisa que concernem às práticas sociais e ao papel da materialidade na constituição dessas práticas. A partir desses aspectos, me propus a observar o ensino de projeto, considerando as práticas na relação com sua materialidade, o que me orientou a compreender os espaços de ensino e aprendizagem e os aspectos históricos e sociais que os determinaram.

221

Assumi que as salas de aula constituem-se pelas práticas e pelos espaços físicos e recursos materiais que, assim como nos livros, são também frutos de escolhas, planejamentos e estratégias específicas. Os ambientes de ensino não ocorrem na natureza, mas são concebidos e construídos, atrelados tanto às visões de quem os planeja, como às visões de quem deles se apropria. Nesse sentido trabalhei junto à minha orientadora a partir da perspectiva cultural, alinhando tanto a perspectiva de Geertz (2008) e Chartier (1999), que entendem os seres humanos como produtores e participantes das práticas cotidianas e da construção de significados, como a filosofia de Bakhtin e sua noção de gêneros. Devido a opção pela perspectiva cultural favorecemos algumas abordagens, ferramentas e técnicas, enquanto acabamos omitindo outras, inclusive familiares ao Design, tais como a Ergonomia e a Proxemia que também contribuiriam para o aprofundamento da pesquisa. Portanto, a pesquisa considerou como objeto de estudo as práticas de ensino e aprendizagem nas aulas de projeto, no curso de Design da PUC-Rio. O curso

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

acabara de passar por uma reformulação de seu projeto pedagógico, incluindo duas novas habilitações e enfatizando a importância do projeto ao longo do curso, como seu eixo curricular. Conforme visto no segundo capítulo, o curso de Design na PUC-Rio se distingue por sua proposta interdisciplinar, contemplada no projeto e realizada mediante o currículo e o quadro de professores. Além da interdisciplinaridade, a prática do Design em Parceria, desde os anos 80, caracteriza e influencia o pensamento acerca das disciplinas de projeto na instituição. A prática valoriza a interação com o grupo social a que se destina e tem como premissas a observação participante e a parceria ao longo do projeto. Apesar da proposta inovadora, ela não inclui uma reflexão acerca dos usos e empregos do espaços de ensino e aprendizagem, cujas salas destinadas ao projeto variam em diversas características e recursos materiais, além de estarem condicionadas as decisões administrativas vinculadas ao campus da universidade. A PUC-Rio, apesar de reconhecida qualidade de ensino e pesquisa, mantém salas de aula concebidas e arranjadas da mesma maneira que no início de sua fundação, com carteiras individuais enfileiradas diante do quadro em espaços isolados do entorno. Ainda que equipadas com refrigeradores de ar, acesso à internet ou projetores digitais, suas concepções arquitetônicas, o mobiliário, o arranjo dos recursos ainda reforçam práticas de aulas condizentes com a época em que o campus foi criado, há 50 anos atrás. Os arranjos e a concepção de diversos espaços e recursos refletem uma herança moderna que privilegia a razão e a função e consolida o poder disciplinar. Há uma herança dessa forma de controle disciplinar (Foucault, 2007) na concepção dos

222

espaços físicos de ensino e, ainda hoje, convivemos com salas de aula que reforçam a autoridade dos professores e colocam os alunos sob sua vigilância. As estratégias de separação, organização funcional, distribuição e quadriculamento, entre outras são empregadas de maneiras semelhantes em penitenciárias, indústrias, hospitais e escolas. Ainda que as propostas pedagógicas tenham avançado em diferentes aspectos, o espaço físico e os recursos materiais presentes em salas de aula ainda reproduzem os parâmetros disciplinares para a constituição dos ambientes de ensino. Reconhecendo a importância que os espaços e os recursos materiais de ensino desempenham nas práticas de ensino e aprendizagem, concordamos com Doris Kowatolski (2011) ao entender que o projeto arquitetônico (e de design) da sala de aula deve ir além das determinações funcionais. A autora defende que os parâmetros estejam também ligados aos projetos pedagógicos e dos usos conferidos ao espaço. Apesar do projeto pedagógico ser importante, a concepção e o currículo

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

formam diretrizes que na prática social e durante as interações se modificam ou criam outras situações não contempladas na proposta. Portanto, entendemos a relevância de considerar tanto o projeto pedagógico e o currículo, como também de observar as práticas de ensino e aprendizagem nas aulas de projeto. Conforme apresentado no terceiro capítulo, o processo de projeto é complexo e emprega métodos e técnicas variados que se dividem em etapas distintas. Além disso, as aulas das disciplinas de projeto variam em função das propostas, abordagens e dos grupos de professores e alunos envolvidos. Porém, existem etapas relativamente comuns que envolvem o processo de projeto, sintetizadas em contextualização, conceituação, planejamento, , geração de alternativas e detalhamento. A partir da observação participante, verificamos que a realização das etapas se dá mediante diferentes momentos de aula, que envolvem formas de interação, atividades e arranjos espaciais diferentes. As atividades e o emprego dos recursos materiais nas salas de aula são variadas e definem um cenário híbrido, no qual convivem diferentes práticas e concepções de ensino. Há contradições e expectativas diferentes que são negociadas ao longo das práticas naquele espaço. Entretanto, a observação esteve exclusivamente fundamentada pelas minhas impressões, assim propusemos uma atividade de representação gráfica aos alunos de diferentes turmas das disciplinas de projeto para que desenhassem as aulas de projeto, evidenciando pessoas, momentos e interações. Também pedimos aos alunos que desenhassem uma sala ideal. A proposta de utilizar o desenho permitiu uma abordagem diferente da pesquisa em Antropologia e que, por um lado inova no sentido de trazer a percepção espacial dos alunos mediada por imagens e sua respectiva interpretação. Todavia, por outro lado, acabamos preterindo a escuta, a identifi-

223

cação das “categorias nativos” e as significações e explicações mediante o uso da verbalização. Nesse sentido, estudos de outras naturezas devem complementar, aprofundar e permitir a discussão dos resultados encontrados nesta pesquisa. No que diz respeito às representações dos alunos, contrariando minhas expectativas, constatei que foram bastante sintéticas, selecionando alguns aspectos e omitindo outros ao retratarem as pessoas, as atividades, os momentos, os objetos e os espaços. De um modo geral, os alunos demonstraram o reconhecimento de diferentes etapas de projeto, bem como momentos típicos das aulas, caracterizados pelas atividades, pessoas, objetos e uso dos espaços. A caracterização dos objetos em sala mostrou uma tendência em valorizar os objetos da sala (cadeiras, mesas, quadros) nas turmas mais elementares o que diminuiu progressivamente em relação às turmas mais avançadas. Já a representação de recursos tecnológicos como laptops ocorreu de maneira inversa, ganhando maior proeminência nas turmas avançadas. Entendo que essa tendência evi-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

dencia um distanciamento entre as ideias de “sala de aula” e “escritório de design” e modifica, consideravelmente, as visões e expectativas dos alunos. Na observação participante, destaquei que os alunos de projeto avançado tentam otimizar o seu tempo em sala de aula, enquanto os alunos de projeto básico se dispersam em outras atividades. Argumentei que o tempo mais escasso e a experiência são fatores que contribuem no aproveitamento do tempo. Essas diferenças modificam a visão dos alunos acerca da sala de aula e suas expectativas, uma vez que os alunos mais jovens esperam aprender a profissão, enquanto os mais velhos esperam exercê-la. Em relação ao sexo dos alunos, não observei diferenças significativas nas representações, nem nos comportamentos. Porém, devo admitir que não enfatizei esse aspecto dentro da pesquisa e que, portanto, podem haver diferenças de representação que me passaram despercebidas. Nesse sentido, o registro dos sexos dos alunos, os códigos dos desenhos, auxiliou como referência e permite que sejam revisitados e possam ser tratados em pesquisas futuras. A representação dos momentos de aula apresentou situações recorrentes que correspondiam a algumas formas de aula identificadas na observação participante. Desse modo, propusemos sua compreensão mediante a noção de Bakhtin de gênero, de maneira a destacar o papel que assumem nas interações e no processo de projeto. A noção de gênero em Bakhtin não trata de um tipo préestabelecido, mas um de enunciado relativamente estável que se dá mediante as interações. Essa noção foi fundamental para interpretar as aulas e compreender como as formas se relacionam aos conteúdos, potencializando determinadas práticas e criando certas expectativas.

224

Ao empregarmos o conceito de gêneros discursivos para as aulas, consideramos a função de determinadas aulas a partir das práticas e as interações, incluindo também os recursos materiais e espaciais e os arranjos do espaço. Com isso, o emprego da noção bakhtiniana de gêneros possibilitou enquadrar o objeto de pesquisa considerando a interação e admitindo as formas múltiplas que podem assumir. 6.1

Considerações sobre os achados da pesquisa

O Departamento de Artes & Design da PUC-Rio foi pioneiro na pesquisa no país e dentre vários trabalhos, dissertações e teses, há um constante questionamento acerca dos objetos de uso e sistemas de informação. Apesar disso o pensamento acerca dos espaços de ensino ainda não recebe um destaque que o vincule ao projeto pedagógico. Ainda que se apresente uma abordagem inovadora no ensino de projeto, o uso dos espaços e dos objetos não estão contemplados na proposta. O DAD possui salas de aula diferenciadas, com espaços e recursos materiais

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

que permitem questionar o ideal de uma sala de aula. As tendas, por exemplo, com suas lonas e espaços circulares envolvidos por jardins potencializam determinadas usos do espaço que as salas retangulares não permitem. Já a Barraca é ainda mais questionadora e desconstrói o espaço de ensino convencional, eliminado paredes, quadro, mesas e abrindo mão de diversos recursos. No caso da Barraca parece haver uma proposta mais clara quanto ao seu projeto e uso. A Barraca apresenta outras possibilidades em detrimento de suas configurações formais, seus objetos e espaços, mas que são considerados junto a maneiras como as aulas são conduzidas. O simples fato de não possuir paredes e sua proximidade de uma rua movimentada altera a relação com os elementos externos como o ruído e o trânsito de pessoas e veículos. Com isso, a atenção durante as aulas é variável. O que para alguns seria um problema, para os professores que fazem uso do espaço Barraca é algo natural que atua como parte do processo de aprendizagem. Considero o caso da Barraca um caso à parte, pois ao mesmo tempo que propõe uma sala de aula diferente das demais, há também um emprego consciente dos objetos e espaços que condiz com a abordagem. Vale lembrar que a professora Ana Branco, mentora do espaço Barraca, é uma das precursoras do Design em Parceria no departamento e que, com isso, alia a abordagem teórica e metodológica à constituição e uso do espaço. Todavia, há apenas uma Barraca no campus e poucos professores utilizam a sala em suas aulas. Além disso, alguns alunos são resistentes ao espaço e à abordagem do Design em Parceria, estabelecendo uma divisão entre os alunos que seguem ou não o “método da Barraca”. Isso foi percebido em conversas informais com alunos e ex-alunos, considerando também minha experiência de curso. Conforme ex-

225

posto no segundo capítulo, o curso admite diferentes abordagens e o Design em Parceria que, embora tenha influenciado o curso, concorre com outras abordagens. Nessa pesquisa não contemplei os aspectos singulares de cada habilitação e de um modo geral, busquei observar os alunos do curso como um todo. Há, no entanto, diferenças que se acentuam com o avanço do curso. Como exemplo, alguns professores de Projeto de Produto, nas disciplinas de Projeto Final (DSG1061) costumam realizar as aulas dentro dos laboratórios de representação tridimensional. Esse exemplo demonstra a introdução de um espaço e de objetos bem diferentes daqueles observados, relacionados à necessidade da habilitação e demandaria uma outra investigação a ser considerada em outras pesquisas. A consciência acerca do espaço e dos objetos por parte de alunos e professores me chamou a atenção ao longo da pesquisa. Vimos no terceiro capítulo que a professora de conteúdo de “anatomia do movimento” manifestou o interesse claro de modificar o arranjo da sala durante as aulas, como forma de contornar o pro-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

blema da dispersão em suas aulas. Porém, vale ressaltar que sua área de especialidade relaciona-se diretamente com a relação entre o corpo e os objetos e espaços. A exceção dela e de alguns casos pontuais, a investigação não contemplou a forma como os professores representam as salas de aula. Nesse sentido, a atividade de representação das aulas de projeto pode ser tratada em pesquisas futuras, de modo a considerar o ponto de vista dos professores. Por parte dos alunos, a consciência acerca do espaço e dos objetos foi baixa. Não se tratou apenas de pouco detalhamento por parte dos alunos em suas representações, mas da omissão de elementos básicos nas salas de aula. Conforme tratado no segundo capítulo, há diversos recursos comuns nas salas e aula (quadro, mesas, cadeiras, tela de projeção, refrigerador de ar) além de outros recursos exclusivos. Porém determinados desenhos sequer representaram esses elementos, indicando que sua atenção estava voltada para outros aspectos. As aulas de projeto foram representadas privilegiando o desenvolvimento das etapas dos projetos, destacando principalmente a atividade intelectual. Ao mesmo tempo em que os alunos recorreram a maneiras sofisticadas de traduzir visualmente a atividade intelectual, a representação das pessoas, das posturas, dos espaços físicos e dos objetos ficou bastante rudimentar, quando não ausente. Considero, portanto, que a consciência acerca do espaço e dos objetos de sala não seja muito detalhada, pois diversos alunos representaram as salas em que se encontravam e poderiam ter observados esses detalhes. Contudo, não há como esperar que os alunos possuam uma consciência física-espacial quando a universidade, as escolas e todo o percurso educacional do qual provém encontra-se vinculado a um sistema que privilegia o pensamento e

226

frequentemente desconsidera às condições materiais em que ele se dá. Somos, desde pequenos, educados a treinar nossa atenção e abstrair o espaço em que nos encontramos, ignorando inclusive o desconforto sob diferentes aspectos (físico, térmico, sonoro, visual etc.) em detrimento das atividades intelectuais. A desvinculação entre o pensamento e as condições materiais em que se dá revela, em ultima análise, uma separação cartesiana entre a razão e o corpo. Conforme aponta Sommerman (2006) Descartes introduz a questão da razão como única forma segura de conhecer. Mediante a formulação cogito ergo sum, afirma que só poderia ter certeza de que pensava, deixando um legado duradouro na filosofia ocidental. A razão passa a ser considerada de maneira quase independente do lugar, da situação, e das condições em que se realizam. Embora o desenvolvimento da filosofia e das ciências tenha relativizado esse predomínio da razão em função do embate com os empiristas, ainda sobrevivem noções que consideram a atividade intelectual de maneira isolada e desvinculada das condições materiais.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

A disciplina e o controle da atenção é um aspecto que se justifica mediante a abordagem racionalista. O problema da atenção, conforme aponta Crary (2001), torna-se um dos aspectos característicos da modernidade. O autor argumenta como a questão ganhou proeminência entre os pesquisadores ao longo do século XIX . A psicologia, por exemplo, começou a enfocar os distúrbios ligados à atenção, considerando os problemas que as pessoas manifestavam em conseguir focar em uma única coisa durante determinado tempo. Não por acaso, o período coincide com um processo de aceleração de diferentes aspectos da vida cotidiana, alavancados pelos avanços da ciência e da industrialização. Crary (2002) discute as mudanças de percepção nos observadores clássicos, pontual ou ancorado, para um observador moderno, atento e instável. Com isso também narra as expectativas acerca da atenção e concentração em contraste com um mundo onde tudo passa a ocorrer de maneira mais acelerada. O autor identifica um paradoxo, pois ao mesmo tempo em que se tenta impor um regime disciplinar à visão e à atenção, a industrialização, mediante o aumento da circulação de produtos e imagens, conduzia a um estado de atenção cambiante e fragmentado. A partir de Crary, considero o problema da atenção não desvinculado dessa cisão entre corpo e mente, como os racionalistas tendiam a estabelecer. A atenção responde não apenas à razão, como ao meio, aos estímulos dos diferentes sentidos. Além disso, não está ligada apenas ao interesse como também aos hábitos e as práticas. Portanto, o problema da atenção também é relativo à concepção dos espaços e objetos, pela maneira como estimulam as interações. Vemos isso em relação à Barraca, quando a própria sala já não mais isola os alunos do entorno, mas se mistura com ele e admite que seja cambiante. Mas nas

227

salas convencionais essa atenção também é cambiante, uma vez que as atividades múltiplas, simultâneas e paralelas, o emprego de celulares, laptops e outros dispositivos que permitem realizar diferentes tarefas ao mesmo tempo faz parte do cotidiano dos alunos. Desse modo, junto à questão do espaço e dos objetos, soma-se a problemática da atenção e de que maneiras deve-se abordá-la na sala de aula. Além da relação entre os estímulos externos em função da atenção, devemos considerar também os estímulos internos. Os alunos chegam a universidade convivendo com um mundo que oferece diferentes estímulos sensoriais, leituras hipertextuais, ubiquidade tecnológica entre outros aspectos, e por vezes são demandados a se “desconectarem”, ou seja, a concentrarem a atenção a um único aspecto. Como apontam Jackeline e Alexandre Farbiarz (2004), a questão dos diferentes estímulos é um problema que afeta a relação dos jovens com a leitura, com os livros didáticos e que entendemos se desdobrar também em relação ao ensino. Portanto, o problema da atenção é um tema que merece ser desenvolvido em outras pesquisas.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

O problema da atenção também remete a outra situação da sala de aula, que diz respeito às atividades paralelas desempenhadas pelos alunos. Como vimos no terceiro capítulo, os alunos leem, desenham, conversam, jogam, constroem modelos e protótipos entre outras atividades que realizam dentro da sala de aula. Considero que o processo de aprendizagem dos alunos de Design é bastante influenciado sobre essas práticas que se dão fora da relação professor-aluno. Porém, não me foi possível aprofundar esse aspecto na presente pesquisa e trata de outro tema a ser tratado em outros estudos. Outra consideração acerca da pesquisa diz respeito à segunda tarefa de representação realizada com os alunos e que não entrou para o escopo da análise. Como diversos desenhos omitiram as interações, que era um aspecto relevante para os objetivos da pesquisa e retrataram apenas os espaços, optamos por não tratar dos espaços idealizados pelos alunos. Além disso, diversos espaços ideais não apresentavam uma proposta inovadora, mas pequenos aperfeiçoamentos acerca das salas de aula. Devo destacar que um dado interessante que surgiu foi a presença dos elementos naturais, que numa análise preliminar pareceu saltar entre os desenhos. Ao retratar os lugares, diversos ambientes apresentavam-se em lugares abertos ou com vasos de plantas em lugares fechados. Outra tendência distinta foi dos alunos que representaram aprimoramentos técnicos nas salas de aulas, incluindo tomadas, acessos à rede, livros, computadores etc. Essas tendência destacou, portanto, o descontentamento dos alunos quanto aos recursos disponíveis. Outro aspecto que me chamou a atenção, embora tenha havido uma recorrência menor entre os desenhos, foi a caracterização da Barraca como espaço ideal.

228

Alguns alunos apresentaram claramente a Barraca, incluindo os aspectos do espaço e os objetos característicos em sua representação. Considerei interessante pelo fato de nenhuma atividade de representação gráfica ter sido conduzida na Barraca, e pelo fato de os alunos haverem representado sem a referência visual, sugerindo uma hipótese de que a consciência físico-espacial seja favorecida pela experiência

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

no local. Todavia, isso seria tema para outras pesquisas.

Figura 6-1 A barraca representada como sala ideal, em detalhes, mas sem as pessoas interagindo.

A consciência física-espacial dos alunos apresentada nos desenhos sugere que os jovens designers não estão refletindo sobre as próprias interações com os objetos e espaços de ensino. Pelas características do campo, seria esperado que, como alunos de Design, fossem capazes de avaliar os usos do espaço e manifestar suas críticas acerca dos espaços e objetos. Contudo, esses aspectos foram diversas vezes abstraídos pelos alunos e somente foram tratados quando a proposta tratou esse aspecto explicitamente. Ainda assim, muitos desenhos, como no caso acima, trataram de detalhar apenas os espaços e objetos, sem as pessoas, as atividades e os momentos de aula. Há portanto uma desvinculação clara entre as práticas e a interação com os objetos e os espaços e que possivelmente não está sendo tratada no curso. Apesar da predominância dos aspectos intelectuais nos desenhos, o Design também depende de um entendimento prático e material Não significa, que o Design não envolva uma atividade intelectual, racional e criativa, pois a atividade de projeto depende dela, conforme advoga Miller (1988). Mas, não se resume apenas

229

ao pensamento, pois como afirma Bomfim (1994), o Design também trata de uma práxis, fundamentada em diferentes campos de conhecimento. Dentre os saberes, ele contempla também os conhecimentos acerca das tecnologias e processos produtivos que são conjugadas com aspectos teóricos e metodológicos ao longo do processo de projeto. No Design, teoria e prática são articulados e dependem do entendimento dos recursos materiais e espaciais disponíveis. Bomfim evidencia que a prática de projeto em Design valoriza a relação entre o conhecimento dos processos produtivos, as características dos materiais, entre outros, com as possiblidades de uso nos projetos. Faz parte dos conhecimentos de um designer reconhecer que determinados materiais, como a madeira, por exemplo, permite ser trabalhada de determinadas maneiras, como cortada, encaixada e colada, mas que é limitada quanto à curvatura, exigindo técnicas complexos para conseguir esse tipo de resultado. Tal entendimento relaciona os conhecimentos teóricos e empíricos na práxis da atividade, reconhecendo que determinados

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

materiais potencializam ou limitam os projetos. De maneira análoga, é de se esperar que o campo do Design também relacione as condições materiais e espaciais das salas de aula à suas potências e limitações em relação a determinadas práticas de ensino. Embora esse entendimento encontre respaldo na teoria, refletido nas pesquisas em Design, ele não parece evidente, quando consideramos as práticas e, em especial, as representações dos alunos. Um aspecto preocupante em relação à falta de questionamento diz respeito ao fato desses alunos se tornarem profissionais responsáveis pelo projeto dos objetos e dos espaços. A ausência de um posicionamento crítico acerca desses aspectos pode conduzir a mera reprodução das formas pré-existentes, ou então a uma inovação meramente formal, mas ainda dentro de determinados paradigmas e estereótipos relativos ao ensino e à aprendizagem. A situação é preocupante considerando também algumas representações dos espaços ideais, pois quando tiveram a liberdade para propor qualquer coisa, diversos desenhos reproduziram as salas pré-existentes e apenas acrescentaram pequenas modificações, seja para melhorar o conforto (sofás, facilidade de acesso aos alimentos e banheiros) ou a produtividade (computadores, equipamentos, acesso à rede etc.). Porém poucos casos exploraram a inventividade e a concepção de novos cenários, que faz parte também do conjunto de contribuições que o Design pode oferecer. Devemos levar em conta que uma atividade de representação é uma atividade pontual e não corresponde a um projeto propriamente dito, este bem mais amplo e complexo. Além disso, é provável que os alunos nunca tenham refletido acerca do papel dos espaços e objetos para o ensino. Nesse sentido, ressaltamos

230

que as relações entre Design e Educação merecem maior aprofundamento, de modo a preparar profissionais que reflitam sobre os problemas da área. Além disso, a consciência física-espacial dos alunos e a capacidade de vislumbrar novos cenários merece aprofundamento em outros estudos. 6.2

Considerações acerca dos gêneros de aula

A compreensão das aulas de projeto mediante a noção de gêneros permite algumas implicações no sentido de incluir a perspectiva das interações e das condições espaciais e materiais em relação às práticas de ensino e aprendizagem. Ela se opõe a uma visão racionalista e funcionalista do espaço e dos objetos, que costumam ser trabalhados isoladamente, abstraindo-se o contexto de uso, de maneira a aprimorar suas características funcionais de maneira idealizada e desvinculada das práticas. Sobre esse aspecto a noção de gêneros e enunciados em Bakhtin auxilia a compreensão.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Se, por um lado encararmos as práticas de ensino como enunciados mediante uma perspectiva objetivista, teremos um tipo de prática que se assemelha mais ou menos ao um parâmetro segundo o qual as práticas deveria se alinhavar. Nesse sentido, a concepção dos espaços e recursos materiais do ambiente de ensino deveria ser definida pelos parâmetros, não pelas práticas específicas. Se, por outro lado, encararmos tais enunciados mediante uma abordagem subjetivista, teremos as práticas de ensino como manifestações individuais, como aspectos expressivos relativos à cada professor e à cada situação. Contudo, a concepção de espaços e recursos materiais do espaço de ensino seria impassíveis de projeto, uma vez que cada manifestação é singular e desvinculada de outras práticas. Contudo, se porventura encararmos as práticas de ensino como enunciados por uma perspectiva bakhtiniana, entenderemos que tratam-se de manifestações singulares mas que remetem as formas pré-existentes. Assim, por mais que haja a maneira singular como determinado professor interage com seus alunos, compreenderemos que essas maneiras se manifestam mediante a combinação de outras formas pré-existentes e conhecidas. Assim, as práticas são singulares, mas remetem a aspectos conhecidos, influenciadas pelo contexto social, cultural, histórico e material. O conceito de gêneros, aplicado ao pensamento das práticas como enunciados, auxilia, portanto a reconhecer a pluralidade das práticas, as formas mais ou menos estáveis e suas singularidades. Com isso, o projeto do espaço e dos objetos, a partir dos gêneros, pode compreender as práticas de ensino em sua dinâmica entre o singular e o coletivo, entre o fenômeno e as formas históricas.

231

Ao lembrarmos que Bakhtin considera o enunciado segundo a função comunicativa, poderíamos questionar se não estamos nos encaminhando para um novo funcionalismo. Entretanto a função neste caso é dialógica e, por isso mesmo, admite a pluralidade das manifestações sem o julgamento mediante parâmetros de certo ou errado, afinal Bakhtin trata de situações mais ou menos adequadas, e não de uma língua padrão e seus desvios. Diferentemente, uma perspectiva funcionalista contemplaria apenas a função por seu aspecto normativo, de maneira a privilegiar uma regra e evitar suas variações. Ao considerar os gêneros presentes nas aulas, como os atendimentos, entendemos que o quadro e o projetor se tornam supérfluos naquele momento, pois não se destina ao grupo como um todo. A atuação com o caderno, sobre as mesas, com as pessoas reunidas em grupo torna-se mais relevante. Já nos gêneros palestras e apresentações, a comunicação com toda a turma confere papeis importantes ao uso do quadro e do projetor. Contudo, sabemos que esses gêneros não estão

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

desvinculados na constituição do projeto como um todo, portanto os espaços devem admitir essas múltiplas formas. Também como gêneros, as práticas podem assumir variações significativas e que merecem ser observadas, pois não se trata de uma abordagem normativa. No gênero atendimento, os professores podem se dirigir às mesas dos alunos, ou os alunos se dirigirem às mesas dos professores. Os alunos podem empregar o caderno, o laptop, ou mesmo se apropriarem do quadro e do projetor para se expressarem, ao mesmo tempo em que a intervenção dos professores também é admitida. Nas palestras, por exemplo, o que se destaca é a comunicação com a turma como um todo e a disposição das mesas acompanha essa intenção, seja circundando a sala, seja disposta em fileiras, ou formando uma grande mesa. Pode-se empregar tanto uma apresentação digital projetada, como fazer circular objetos entre os alunos. Nas apresentações, de maneira semelhante às palestras, admitem diferentes arranjos na sala, desde que os demais alunos estejam voltados para o grupo que apresenta. O emprego dos objetos destina-se à comunicação com o grupo, em especial, com os professores que normalmente encontram-se em uma mesa diante dos alunos que apresentam em forma de banca examinadora. De acordo com cada gênero, alteram-se as expectativas de alunos e professores no processo de interação, pois pressupõe-se determinadas atitudes, as quais, ao serem subvertidas causam estranheza. Esse aspecto também ressalta a outra contribuição da noção bakhtiniana de gêneros, pois diferente de uma forma tipificada, os gêneros admitem sua subversão. No gênero de aula atendimento, considerando sua função de orientação, há diferentes expectativas em relação aos interlocutores. De um lado, há os alunos,

232

ansiosos por narrarem seus projetos que os levam a procurar os professores e formar filas de atendimento, demandando atenção para seus projetos. Do outro lado, há os professores que tem que conciliar o tempo de aula para lidar com os diferentes grupos de alunos e garantir uma atenção democrática a todos. Nem sempre estas expectativas se alinham e é fácil deduzir os conflitos entre diferentes grupos de alunos e professores em relação à atenção. Em relação ao gênero de aula palestra/aula expositiva, as expectativas também se modificam. O professor conta com a atenção total dos alunos e a participação em momentos pontuais, quando solicitados. Os alunos, por sua vez, esperam que os assuntos sejam de interesse e que sirvam para seus próprios projetos, na medida em que não notam uma relação clara, desviam-se para outras atividades. Os conflitos nesse caso são evidentes, como nas diferentes situações em que os professores chamaram a atenção dos alunos ou demandaram que parassem as demais atividades e se concentrassem.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

As expectativas em relação às apresentações também são diferenciadas, especialmente porque o gênero compreende duas funções: de comunicação e de avaliação. Os alunos esperam corresponder às demandas dos professores, concluírem seus projetos e serem bem avaliados, portanto se empenham endereçando-se aos professores. Os professores, por sua vez, esperam que os alunos sejam capazes de concluir seus projetos, evidenciando a consciência do processo e das etapas, e de comunicarem essas etapas para turma. Nesse sentido, também esperam que o restante da turma esteja empenhado em participar e ouvir as apresentações. Os conflitos se dão quando os alunos estão mais preocupados com suas próprias apresentações do que com a dos demais, seja se ausentando seja desviando a atenção da apresentação de outros grupos. Como podemos observar, o gêneros de aula não simplificam ou reduzem a diversidade de configurações, atividades ou expectativas, mas as reconhecem dentro de suas dinâmicas e funções. Isso não simplifica o processo de projeto dos espaços e objetos e nem o planejamento quanto ao usos, pelo contrário, aprofunda e chama atenção para as mudanças e diferenças, admitindo inclusive seu caráter transitório. Ao invés de se projetar uma sala de aula dentro de alguns parâmetros de funcionalidade, como conforto térmico, acústico, sonoro, visual, somam-se também aspectos variáveis, relacionados as diferentes situações de sala de aula que demandam flexibilidade tanto do espaço físico como dos recursos materiais. Além disso, a observação dos gêneros também apresenta as apropriações e subversões, mostrando outras possibilidades não contempladas inicialmente. O emprego dos carpetes das salas como mural, que emprega o grampo com velcro para fixa-los é um recurso inesperado, mas que se consolidou em determinadas

233

aulas. Portanto, cria uma expectativa de um revestimento de velcro ou mural disponíveis em todas as salas para que favoreçam determinadas práticas, como no gênero de apresentação. Assim como os gêneros discursivos são correias que ligam as formas singulares às formas históricas de enunciados, os gêneros de aula também devem ser entendidos assim. Um atendimento só pode ser reconhecido como tal por apresentar função, conteúdo temático, estilo e composição que se assemelha a outras formas, todavia também apresenta essas formas singulares. Com isso, tão importante quanto a investigação das práticas atuais está a investigação de formas anteriores. Temos aqui uma outra oposição em relação a algumas abordagens modernas, que propunham o novo pelas características do produto e sua função, sem com isso remeter à formas preexistentes. Pelo contrário, considero que o entendimento dos processos históricos, das disputas ideológicas e as formas de manifestação do poder interessam na determinação dos objetos e espaços, porque expli-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

cam parte do processo que determinou as formas conhecidas. Mediante a noção dos gêneros, é possível ligar o presente ao passado, possibilitando uma atitude reflexiva e crítica. Isso possibilita que a concepção dos espaços de ensino e aprendizagem não se oriente pela mera reprodução de formas anteriores e consagradas sem questionamento. 6.3

Desdobramentos

Compreendo que o estudo dos gêneros de aula favorece o entendimento das relações entre as práticas e os espaços físicos e recursos materiais. Contudo, entendo que essa pesquisa dá apenas alguns passos nesse sentido e que o tema é mais amplo e merece ser desenvolvido em estudos posteriores. Devo destacar que ao compreender os gêneros de aula a partir das observações e dos desenhos dos alunos, também omiti alguns momentos que poderiam ter sido enquadrados mas não foram explorados, pelo fato de ter me concentrado nas relações professor-aluno e naqueles que apareceram mais claramente nos desenhos. Notei nas observações as aulas com “dinâmicas empresariais” e com “oficinas” cujas funções, temas, estilo e configurações também eram singulares e poderiam ser tratadas como gêneros. Porém, como não apareceram de formas destacadas nos desenhos, optei por não me aprofundar em suas análises. Além disso, como a própria concepção de Bakhtin admite, novos gêneros podem surgir e os presentes podem se modificar ou desaparecer de acordo com as mudanças nas relações e no contexto. Portanto, o assunto admite formas manifestações diversas e assuntos para outras pesquisas.

234

O processo como um todo foi longo e cambiante, apresentando diferentes possibilidades e admitindo escolhas e abordagens múltiplas. As escolhas que guiaram esse processo foram ora definidas por minhas experiências, ora pelo diálogo com as diferentes pessoas e ora, também, pela interação com os dados da pesquisa. Ainda assim, é difícil realizar um fechamento uma vez que a pesquisa abre uma série de questões e possibilidades de desdobramentos. Vislumbramos um grande potencial a ser desenvolvido dentro do tema e fora do tema, que diz respeito ao ensino de projeto, aos gêneros de aula e aos espaços e recursos materiais. Nossa opção pelo enfoque nos gêneros de Bakhtin se deu pela nossa intenção (minha e de minha orientadora) em abordar a questão do espaço considerando a interação. Dentre as contribuições da pesquisa, esta é uma que devemos enfatizar, pois a proposta dos gêneros de aulas busca considerar as formas singulares e as formas históricas, relacionando-as em função da interação. Contemplar a multiplicidade e o hibridismo da sala de aula, seja em projeto de Design, seja fora do curso ou

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

do ensino universitário, torna-se relevante na medida em que desejamos tratar das práticas de ensino e aprendizagem. Acreditamos que os estudos para o aprimoramento da educação nunca serão excessivos, pois é um processo complexo. Atualmente, a interdisciplinaridade é reconhecida como uma das estratégias para superar a fragmentação dos saberes e da hiper-especialização. Todavia, a fragmentação nas ciências coloca obstáculos, uma vez que abstrai e recorta partes dos problemas. Conforme argumenta Morin (2002), há um desafio colocado pelo reconhecimento da complexidade que demanda que as ciências e a educação religuem os saberes que foram separados. Nesse sentido, a interdisciplinaridade ganha um papel fundamental em relação aos conhecimentos contemporâneos. Como vimos nas noções do Design apresentadas, nas características do DAD e na manifestação de seu projeto pedagógico, há um reconhecimento claro acerca do papel da interdisciplinaridade na constituição dos saberes empregados no Design. Cabe lembrar que o Design não possui seu próprio corpo teórico, nem métodos e abordagens únicas, mas diversas e por vezes contraditórias. Portanto, a interdisciplinaridade no Design é ao mesmo tempo constitutiva e necessária. Porém as salas de aulas vem sendo concebidas ainda diante de um entendimento disciplinar. As estratégias de organização, fragmentação e controle, estabelecem espaços delimitados, isolados e que reforçam um entendimento de ensino e aprendizagem desvinculado do contexto e das relações com outros saberes. Cabe, portanto, questionar se é possível alcançar a interdisciplinaridade se ainda convivemos com espaços e recursos que reforçam as práticas disciplinares. Com a presente pesquisa, acreditamos na importância de estudos e propostas acerca de espaços interdisciplinares.

235

Um outro aspecto, esse pouco contemplado na pesquisa, diz respeito do privilegio da razão sobre a emoção, a empatia, os valores e os desejos. Durante muito tempo a ciência e, por extensão, a escola privilegiaram apenas os aspectos racionais, que só foram questionados amplamente a partir da segunda metade do século XX, depois das atrocidades cometidas em nome da razão científica na segunda guerra mundial. O privilégio da razão também explica, de acordo com Maria Helena Martins, problemas na relação com a leitura(Martins, 2006) e com a escola(Martins, 2001) pois o afeto, as emoções, as experiências individuais, os desejos participam na construção de sentidos. Nesse sentido, gostaria de trazer uma parte do discurso do escritor uruguaio, Eduardo Galeano, em depoimento realizado na ocupação da praça Catalu-

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

nha, em Barcelona: (...)Além disso, te confesso: os intelectuais me dão pena! Eu não quero ser um intelectual. Quando me chamam de distinto intelectual eu digo: não! Eu não sou um intelectual! Os intelectuais são os que divorciam a cabeça do corpo. Eu não quero ser uma cabeça que rola por aí! Eu sou uma pessoa! Sou cabeça, corpo, sexo, barriga, tudo! Mas não um intelectual, esse personagem abominável! Como dizia Goya: "A razão cria monstros". Cuidado com quem somente raciocina. Cuidado! Devemos raciocinar e sentir. E quando a razão se separa do coração, comece a tremer. Porque esse tipo pode te levar ao fim da existência humana no planeta. Eu não acredito nisso. Eu acredito nessa fusão contraditória, difícil, mas necessária entre o que se sente e o que se pensa. E se aparece um que só sente mas não pensa, digo: esse é um sentimental. Mas se for um que só pensa, mas não sente, digo: ai, que medo! Esse é um intelectual! Que coisa espantosa! Uma cabeça que rola. Eu não quero ser uma cabeça (… ) –(Galeano, 2011).

O comentário feito por Galeano serve de provocação sobre como se encara o conhecimento. Já discutimos anteriormente, a maneira como o conhecimento é tratado por muitas pessoas a partir de uma perspectiva racionalista que abstrai o pensamento como uma produção estritamente intelectual, acompanhando uma dissociação entre corpo e mente. Portanto, a fala de Galeano subsidia o questionamento sobre um saber para além da razão e que envolve também o sujeito e seu corpo. Pensar os espaços físicos e recursos materiais é um passo importante. Todavia, o professor José Luiz Mendes Ripper, nos lembra, em depoimento dado em aula, que os resultados são frutos da interação entre objetos e ações: “nós designers costumamos nos ocupar dos objetos e damos pouca importância às ações. Não significa que os objetos não sejam importantes, mas as ações são igualmente importantes” (RIPPER, 2011). Isso justifica, portanto que os estudos em Design se voltem tanto para os produtos, como para o seu uso. A partir das palavras de Ripper, é possível pensar que o planejamento dos espaços e objetos é apenas um aspecto para o sonho da interdisciplinaridade. Para que exista, é necessária uma ação conjunta que busque a interação entre as diferen-

236

tes áreas: pedagogia, psicologia, design, arquitetura, geografia, sociologia, filosofia, letras, medicina, entre outras. Isso porque para uma mudança para um ensino interdisciplinar não bastam projetos pedagógicos, sociopolíticos, filosóficos, arquitetônicos etc. Se esta lógica permanecer os saberes continuarão compartimentados e assim só serão criados objetos desvinculados de ações, ou ideias desvinculadas de corpos. É preciso interagir, buscar ações e objetos conjuntos e assim os resultados

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

serão diferentes. Afinal, como disse Galeano, não somos cabeças que rolam por aí.

7 Referências

BAKHTIN, Mikhail (Volochinov). Marxismo e filosofia da linguagem.Trad. Michel Lahud e Yara Frateschi Vieira. 12ª edição. São Paulo: Hucitec. 2006. (1ª edição 1979) BAKHTIN, M. Estética da criação verbal – Introdução e tradução do russo Paulo a Bezerra); prefácio à edição francesa Tzvetan Todorov – 4 Ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

BOMFIM, G. Fundamentos de uma Teoria Transdisciplinar do Design: morfologia dos objetos de uso e sistemas de informação. Estudos em Design. v.5 – n.2, dez 1997. Rio de Janeiro : Associação de Ensino de Design do Brasil. p. 27-41 ________. Sobre a Possibilidade de uma Teoria do Design. Estudos em Design v.2-, n.2 (nov)-, 1994 - Rio de Janeiro : Associação de Ensino de Design do Brasil. p. IV-15- IV-22 BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas simbólicas. 5ª ed.; São Paulo: Perspectiva, 2004. BRANCO, Ana. Laboratório de Pesquisa do Aprendizado em Design. [website da professora] s/d. Página disponível em: http://wwwusers.rdc.pucrio.br/anabranc/portugues/barraca.html) acessada em fevereiro de 2012. CANNON DESIGN, VS FURNITURE e BRUCE MAU DESIGN The Third Teacher: 79 Ways You Can Use Design to Transform Teaching & Learning. New York: Abrams Books, 2010 CARDOSO DE OLIVEIRA, R. O trabalho do antropólogo, UNESP/Paralelo 15, São Paulo, 1998, cap.1 CHARTIER, R. A História Cultural: entre práticas e representações. Rio de Janeiro, Bertrand. 1990; _____. A ordem dos livros: leitores, autores e bibliotecas nos séculos XIV e XVIII, Brasília: UNB, 1999.

238

COELHO, Luis Antonio. Mudando de patamar: a pesquisa no design, In InfoDesign – Revista Brasileira de Design da Informação, 2005. Disponível em: Acesso em julho 2009. _____. Por uma metodologia de ideias In COELHO, L.A. [org.] Design Método. Rio de Janeiro: Ed.PUC-Rio, Teresópolis: Novas Ideias, 2006. COUTO, R. Movimento interdisciplinar de designers brasileiros em busca de educação avançada. 1997. 246f. Tese (Doutorado em Educação) – Departamento de Educação, PUC-Rio, Rio de Janeiro, 1997.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

________. O ensino da disciplina de Projeto Básico sob o enfoque do Design Social. 1991. 74 f. Dissertação (Mestrado em Educação) –Departamento de Educação, PUC-Rio, Rio de Janeiro, 1991 CRARY, Jonathan. A visão que se desprende: Manet e o observador atento no fim do século XIX In CHARNEY, Leo e SCHWARTZ, Vanessa R. O cinema e a invenção da vida moderna. Tradução Regina Thompson. São Paulo: Cosac & Naify, 2001. p.80-114 DAD, Site do Departamento de Artes & Design. Rio de Janeiro, s/d [website] (disponível em : http://www.dad.puc-rio.br/dad07/ acesso em fevereiro de 2012) DAD (Departamento de Artes & Design), Programa de Pós-Graduação em Design. Edital de Doutorado, Rio de Janeiro: PUC-Rio, 2008. (parte das informações também se encontram no site do DAD: http://www.dad.pucrio.br/dad07/index.php?pag=pos01, acesso em fevereio de 2012) DA MATTA, R. O ofício do etnógrafo, ou como ter “anthropological blues” In NUNES, E. A aventura Sociológica.. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1978. p. 23-35 DAUSTER, T. Um saber de fronteira – entre a Antropologia e a Educação. In DAUSTER, T [org.]. Antropologia e Educação: um saber de fronteira. Rio de Janeiro: Forma & Ação, 2007. p-13-35 ________. Uma revolução silenciosa: notas sobre o ingresso de setores de baixa renda na universidade. Revista Avá, nº 6, dez. 2004b. p. 77- 89 DAYRELL, J. A escola como espaço sócio-cultural. In DAYRELL, J. [org.] Múltiplos olhares sobre educação e cultura. Belo Horizonte: UFMG, 1996. p. 136-161 DONDIS, Donis. A Sintaxe da Linguagem Visual. Trad. Jefferson Luiz Camargo. 3a. Ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007.

239

EDWARDS, Verónica. Os sujeitos no universo da escola: um estudo etnográfico no ensino primário. São Paulo: Ática. 2003 FARBIARZ, Jackeline Lima e FARBIARZ, Alexandre. O designer como mediador entre o livro e o leitor. Anais do P&D Design 2004, São Paulo, FAAP. FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão . Trad. Raquel Ramalhete 33. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2007. FRASCARA, J. [ed.] Design and the Social Sciences: Making connections. London & New York: Taylor & Francis, 2002. GALEANO, Eduardo. Depoimento na praça Catalunha durante o evento La Acampada, Barcelona, 24/05/11. [vídeo] Disponível em: http://www.youtube.com/watch?feature=player_detailpage&v=mdY64TdriJk #t=488s . Acessado em novembro de 2011.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

GEERTZ, C. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1978. GOULEMOT, Jean Marie. Da leitura como produção de sentidos. In CHARTIER, R. [org.] Práticas de Leitura. Trad. Cristiane Nascimento. São Paulo: Estação Liberdade, 1996. p. 107-116 GUMPERZ, J. Convenções de contextualização. [trad. José Luiz Meurer e Viviane a Hebele]. In RIBEIRO, B. e GARCEZ, P. Sociolinguística Interacional. 2 ed. (revista e ampliada) São Paulo: Loyola, 2002. KOWALTOWSKI, D. Arquitetura escolar: o projeto do ambiente de ensino. São Paulo : Oficina de Textos, 2011. LAVILLE, C. e DIONNE, J. A construção do saber: manual de metodologia da pesquisa em ciências humanas; Trad. Heloísa Monteiro e Francisco Settineri. Porto Alegre: Artmed; Belo Horizonte: UFMG, 1999. MACHADO, Irene A. Os gêneros e a ciência dialógica do texto. In FARACO, C., CASTRO, G. e TEZZA, C. (orgs) Diálogos com Bakhtin. Curitiba, UFPR, 1996. p. 225-271 MARCUSCHI, L. A. Generos textuais: definição e funcionalidade. In DIONISIO, a A., MACHADO, A. e BEZERRA, M. (orgs) Gêneros Textuais & Ensino, 2 ed., Rio de Janeiro: Lucerna, 2003. MARTIN-BARBERO, Jesus. Dos meios às mediações: comunicação, cultura e hegemonia. Trad. Ronald Polito e Sérgio Alcides. 5ª Ed. Rio de Janeiro: UFRJ. 2008.

240

MARTINS, Maria Helena. O que é leitura. São Paulo: Brasiliense 2006. (1a edição: 1982). ______, Palavra e Imagem: um diálogo, uma provocação. In MARTINS, Maria Helena (org) Questões de Linguagem – 6a Ed. – São Paulo: Contexto, 2001. p. 95-105 (1a edição: 1991) MILLER, William R. The Definition of Design. [S.l.:S.n.], 1988. Disponível em , Acesso em 16 ago 2010. Tradução João de Souza Leite. MORIN E. , ALMEIDA, M.C, CARVALHO, E.A. (ORGS.). Educação e Complexidade: os Sete Saberes e outros ensaios. São Paulo. Cortez, 2002.

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

OLIVEIRA, I. O ensino de projeto na graduação em design no Brasil: o discurso da prática pedagógica. 2009. Tese (Doutorado em Design) – Departamento de Artes & Design/PUC-Rio, Rio de Janeiro, 2009. PAZMINO, Ana Veronica Paz y Mino, Modelo de ensino de métodos de design para produtos; 2010. Tese (Doutorado em Design) – Departamento de Artes & Design/PUC-Rio, Rio de Janeiro, 2010. PUC-Rio. Marco Referencial. Estatuto, Regimento, Constituição Apostólica “Ex Corde Ecclesiae”, Rio de Janeiro: PUC-Rio, 2001 RIBEIRO, F. Práticas Pedagógicas em Cursos de Graduação em Design: um estudo de caso. 2002. Dissertação (Mestrado em Design) – Departamento de Artes & Design/ PUC-Rio, Rio de Janeiro, 2002. RIPPER, José Luís Mendes. Comentários realizados durante as aulas da disciplina e Design e Interdisciplinaridade (ART2253) no Programa de pós-graduação em design, Departamento de Artes e Design, PUC-Rio em primeiro de novembro de 2011. SOMMERMAN, Américo. Inter ou transdisciplinaridade? da fragmentação disciplinar ao novo diálogo entre os saberes. São Paulo: Paulus, 2006. SUDSILOWSKY, Sérgio. Entre a razão e o senso comum : uma análise morfológica do espaço da arquitetura moderna, através do discurso de quem a habita / Sérgio Sudsilowsky ; orientador: Gustavo Amarante Bomfim. – Rio de Janeiro : PUC-Rio, Departamento de Artes e Design, 2003. VELHO, Gilberto. Observando o Familiar. In NUNES, Edison de O. A aventura sociológica, Rio de Janeiro: Zahar, 1978. páginas 36-46.

ANEXO I

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

Tabelas com a distribuição dos conteúdos de projeto

Conteúdios dos Projetos Básicos

242

Conteúdos dos Projetos Avançados e Específicos de Comunicação Visual

243

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

242

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

243

ANEXO II

Desenhos selecionados para a análise p.245 – 022MD06F01 p.246 – 023CV10F01 p.247 – 022MD11M01 p.248 – 022CV26M01 p.249 – 022MD28F01 p.250 – 027MD29F01 p.251 – 033MD07F01.1 p.252 – 033MD07F01.2

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

p.253 – 033MD07F01.3 p.254 – 033CV08F01 p.255 – 038MO10F01 p.256 – 033MO12F01 p.257 – 035PP13F01 p.258 – 033MD14F01 p.259 – 035CV15F01 p.260 – 033MO16F01 p.261 – 033PP19F01 p.262 – 054MD01F01 p.263 – 055CV07F01 p.264 – 055MO08F01 p.265 – 055MO09F01 p.266 – 055CV15F01 p.267 – 055MO16F01 p.268 – 055CV19F01 p.269 – 055MD22M01 p.270 – 055MO24F01 p.271 – 328CV04F01 p.272 – 3210CV06M01 p.273 – 329CV10F01 p.274 – 329CV11F01 p.275 – 329CV12F01 p.276 – 329CV14F01

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

245

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

246

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

247

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

248

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

249

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

250

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

251

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

252

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

253

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

254

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

255

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

256

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

257

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

258

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

259

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

260

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

261

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

262

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

263

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

264

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

265

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

266

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

267

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

268

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

269

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

270

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

271

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

272

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

273

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

274

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

275

PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0812144/CA

276

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.