OPERAÇÃO ÁGATA: GEOPOLÍTICA NO ARCO SUL DA FRONTEIRA DO BRASIL (2014)

October 16, 2017 | Autor: Aldomar Rückert | Categoria: Geopolitics, Borders and Borderlands
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OPERAÇÃO ÁGATA: GEOPOLÍTICA NO ARCO SUL DA FRONTEIRA DO BRASIL Anderson Bremm Peck [email protected] Mestrando do Programa de Pós Graduação em Geografia (POSGEA) Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), bolsista CAPES-PRÓ-DEFESA. Camilo Pereira Carneiro Filho Doutor em Geografia, Pós-Doutorando CAPES-PNPD no Programa de PósGraduação em Estudos Estratégicos Internacionais Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). [email protected] Aldomar Arnaldo Rückert Doutor em Geografia, Pesquisador CNPq, Programas de Pós-Graduação em Geografia e em Planejamento Urbano e Regional Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) [email protected] Resumo No mundo contemporâneo existe um elevado número de Estados-nações que possuem dificuldades de controlar suas respectivas fronteiras. A disputa entre países por maiores extensões de terra, por vezes, alterou e ainda altera a configuração dos mapas e também cria problema entre Estados. As áreas limítrofes dos países apresentam inúmeras características e cada zona apresenta particularidades políticas, sociais, culturais e econômicas. O caso brasileiro apresenta um problema ainda maior devido a sua extensão territorial ser continental. Na América do Sul quase todos os países fazem fronteira com a República Federativa do Brasil, exceto Chile e Equador. Cada país possui uma política própria de controle de seus limites e nesse sentido temos o Brasil com suas agendas específicas. A fronteira do Brasil foi palco de inúmeras disputas e conflitos ao longo dos últimos séculos, para a delimitação das atuais fronteiras. A preocupação com as fronteiras internacionais por parte do governo brasileiro tem como pano de fundo uma preocupação de proteger aquilo que é estabelecido contra aquilo que é marginal contra os fluxos que são considerados indesejáveis. O presente trabalho está constituído de quatro eixos norteadores. O primeiro eixo trata do conceito de Estado nacional e das teorias geopolíticas, que subsidiam a análise deste trabalho. Na parte subsequente é apresentada a questão dos limites e das fronteiras, necessária para a compreensão da realidade e dos agentes envolvidos. A operação Ágata é apresentada, depois disso é realizado um recorte espacial para melhor avaliar sua atuação. Devido aos seus 16.886 quilômetros de fronteira terrestre foram escolhidos para a análise o Arco Sul que compreende os estados da Região Sul do Brasil. Por fim, são analisadas as consequências políticas e sociais das operações realizadas nessa região. O trabalho pretende analisar a Operações Ágata e suas consequências na fronteira. Esta operação é realizada pelo Estado brasileiro com o intuito de assegurar e controlar a zona limítrofe. Com o intuito de estabelecer discussões e enriquecimentos para esse

trabalho foi escolhido o Eixo Temático 2: Fronteiras, Processos de Integração e Dinâmicas Produtivas. Palavras-chave: Operação Ágata; Estado brasileiro; Fronteira; geopolítica. Resumen En el mundo contemporáneo hay un gran número de Estados-nación que tienen dificultades de gestionar sus respectivas fronteras. La disputa entre los países con grandes extensiones de tierra, a veces cambió y todavía cambia la configuración de los mapas y también crea un problema entre estados. Las áreas limítrofes de los países tienen muchas características y cada área tiene características políticas, sociales, culturales y económicos. El caso de Brasil presenta un problema aún mayor debido a su extensión territorial es de tipo continental. En América del Sur, casi todos los países limítrofes de la República Federativa del Brasil, excepto Chile y Ecuador. Cada país tiene su propia política de controlar sus fronteras y en ese sentido tenemos Brasil con agendas particulares. La frontera de Brasil fue el escenario de muchas disputas y conflictos en torno a los siglos pasados, para delimitar los límites actuales. La preocupación por las fronteras internacionales por el gobierno brasileño tiene como fondo un deseo de proteger lo que se establece en contra de lo que es marginal frente a los flujos que se consideran indeseables. Este trabajo se compone de cuatro principios rectores. La primera área se ocupa del concepto de las teorías del estado nación y geopolíticos que apoyan el análisis de este trabajo. En la parte posterior de la cuestión de límites y fronteras, necesarias para la comprensión de la realidad y de los actores involucrados se presenta. Se presenta la operación Ágata, después de que se hace un recorte en la área espacial para evaluar aún más su rendimiento. Debido a sus 16.886 kilometros de las fronteras terrestres fueron elegidos para el análisis del Sur arco que comprende los estados del sur de Brasil. Por último, analizamos las consecuencias políticas y sociales de las operaciones llevadas a cabo en esa región. El documento analiza las operaciones Ágata y sus consecuencias en la frontera. Esta operación se lleva a cabo por el gobierno brasileño con el fin de garantizar y vigilar la zona fronteriza. Con el objetivo de establecer debates y enriquecimiento de este trabajo se eligió a la información principal del Tema 2: Fronteras, dinámicas de integración y procesos de producción. Palabras clave: Operación Agata; Estado brasileño; Frontera; la geopolítica.

Abstract In the contemporary world there is a high number of nation-states that have difficulties to manage their respective borders. The dispute between countries with larger tracts of land, sometimes changed and still changes the configuration of the maps and also creates problem between states. The areas bordering countries have many features and each area has political, social, cultural and economic characteristics. The Brazilian case presents an even greater problem due to its territorial extension is continental. In South America, almost all countries bordering the Federative Republic of Brazil except Chile and Ecuador. Each country has its own policy to control its borders and in that sense we have Brazil with particular agendas. The border of Brazil was the scene of many disputes and conflicts over the

past centuries, for delimiting the current boundaries. The concern with international borders by the Brazilian government has as its background a desire to protect that which is set against what is marginal against flows that are considered undesirable. This work is composed of four guiding principles. The first area deals with the concept of nation state and geopolitical theories that support the analysis of this work. In the subsequent part of the question of limits and boundaries, necessary for the understanding of reality and the actors involved is presented. The Agata operation is presented, after that is done one spatial area to further evaluate its performance. Due to its 16,886 kilometers of land borders were chosen for the South Arc analysis comprising the southern states of Brazil. Finally, we analyze the political and social consequences of the transactions carried out in that region. The paper discusses the Agata operations and their consequences on the border. This operation is performed by the Brazilian government in order to ensure and monitor the border zone. Aiming to establish discussions and enrichments for this work was chosen to Main Topic 2: Borders, Dynamics Integration and Production Processes. Keywords: Operation Agata; Brazilian state; border; geopolitics.

Introdução

Os limites internacionais do Brasil com os países da Bacia do Prata remontam ao século XIX. Em 1851, o Tratado de Límites foi firmado com o Uruguai e após a Guerra do Paraguai (1864 – 1870), por sua vez, os limites entre o Brasil, Argentina e Paraguai foram alterados. Em 1872, o Brasil fixou definitivamente sua fronteira com o Paraguai enquanto que a delimitação da fronteira com a Argentina ocorreu em 1895, através de arbitragem. O presente trabalho está constituído de quatro eixos norteadores. O primeiro eixo trata do conceito de Estado nacional e das teorias geopolíticas que subsidiam a análise deste trabalho. Na parte subsequente é apresentada a questão dos limites e das fronteiras, parte esta necessária para a compreensão da realidade e dos agentes envolvidos. A Operação Ágata é apresentada e depois disso é realizado um recorte espacial para melhor avaliar sua atuação.Por fim, são analisadas as consequências políticas e sociais das operações realizadas. Na contemporaneidade, existe um elevado número de Estados-nações que possuem dificuldades de controlar suas respectivas fronteiras. O caso brasileiro apresenta um problema ainda maior devido a sua extensão territorial ser continental. Na América do Sul quase todos os países fazem fronteira com a República Federativa do Brasil, exceto Chile e Equador. Cada país possui uma política própria

de controle de seus limites e nesse sentido temos o Brasil com suas agendas específicas. A disputa entre países por maiores extensões de terra, por vezes, alterou e ainda altera a configuração dos mapas e também cria problema entre Estados. As áreas limítrofes dos países apresentam inúmeras características e cada zona apresenta particularidades políticas, sociais, culturais e econômicas. Segundo Carneiro Filho (2013), o espaço fronteiriço se destaca pelo grau de permeabilidade que permite o fluxo constante tanto legal como ilegal de mercadorias e pessoas. Essa permeabilidade faz com que o habitante da fronteira conceba a organização de seu espaço em função de sistemas políticos-legais distintos. Nesse contexto é complexo analisar e homogeneizar as diferentes áreas fronteiriças ao redor do mundo, porque cada fronteira possui sua particularidade. O Estado brasileiro não pode ser pensado da mesma forma que os demais países sulamericanos, devido aos seus 15.719 quilômetros de fronteira terrestre. Dentre as formas de controle utilizadas pelo Estado brasileiro para manter a soberania e também a vigência das leis, temos inúmeros aparatos estatais, tais como: a) Forças Armadas; b)Polícias; c) Justiça Federal e Estadual, dentre outras forças. Cada uma delas se vale de ferramentas próprias e atua sobre determinadas áreas com maior ou menor intensidade. A periodicidade de atuação também varia entre os diferentes órgãos. Devido à sua abrangência e importância crescente nos últimos anos, a Operação Ágata foi escolhida para ser analisada ao longo deste trabalho. Essa operação é realizada conjuntamente por diversos órgãos do governo brasileiro, sendo uma das mais impactantes intervenções desenvolvidas na fronteira pela sua abrangência e periodicidade. A forma com que as operações ocorrem podem inibir possíveis atividades criminosas e contravenções realizadas nas áreas limítrofes dos países. Cada lugar possui diferentes consequências causadas por operações de segurança e controle, devido às particularidades existentes. Ao longo deste trabalho serão analisadas algumas das inúmeras consequências decorrentes da Operação Ágata, ocasionadas na tentativa de um controle mais efetivo das zonas de fronteira pelo Estado brasileiro. Serão analisados também os distintos enfoques da Operação Ágata no Arco Sul e suas consequências.

O Estado nacional e as teorias geopolíticas

O Estado nacional possui um território que é delimitado por fronteiras cujas passagens são por ele controladas. Este território configura uma unidade econômica homogeneizada por um conjunto de leis e normas. Dentre as atribuições do Estado nacional podemos citar: assegurar a ordem interna e a paz através do exercício legítimo da violência e garantir sua soberania e legitimidade face a outros Estados. Para tanto, o Estado possui os monopólios da justiça; do poder de polícia; das forças armadas; da diplomacia; dos impostos; e da criação e aplicação das leis (MATIAS, 2005). O termo Estado é trabalhado em diversas áreas do conhecimento, com inúmeras acepções que subsidiam diferentes análises. Os Estados se formaram por inúmeras razões, em épocas e com sentidos diferenciados. A fim de conceituar e diferenciar as funções do Estado recorremos a Sanchez (1992) que atribui quatro concepções fundamentais ao analisar o termo Estado. São elas: a) Estado-nação; b) Estado-poder; c) Estado-território; d) Estado-administração. Cada uma destas conceituações apresenta distintos fundamentos e recorre a diferentes formas de análise. No corrente trabalho apenas a concepção de Estado-nação será trabalhada, tendo em vista possuir uma utilização corrente nos meios geográficos. A palavra Estado pode ser conceituada como uma instituição política que possui a soberania reconhecida pelo direito. Por sua vez, podemos entender nação como uma comunidade formada por pessoas que compartilham elementos históricos e culturais (FONT; RUFÍ, 2006). O termo Estado-nação se remete a uma instituição política que possui soberania sobre um determinado território e que contempla elementos históricos e culturais comuns compartilhados por um grupo de pessoas. A soberania estatal pode ser vista como supremacia, que equivale ao poder maior que o Estado possui dentro de suas fronteiras e pode ser entendida como independência, o que decorre da igualdade jurídica entre os Estados no plano internacional, e implica a possibilidade de o Estado criar suas próprias regras sem influência externa (MATIAS, 2005). É importante salientar que ao longo da história alguns pensadores orientaram e subsidiaram através de suas ideias a formação de Estados. O caso alemão sofreu uma influência direta de Ratzel que associou a questão do solo, do idioma, dos costumes, dentre outras características para justificar seu pensamento sobre o

Estado moderno (RATZEL, 1982). Além de ter influenciado a criação dos ideais nacionalistas também teve papel fundamental na formação da ciência geográfica. Todo o trabalho dos geógrafos alemães para que se conhecesse melhor o território foi de suma importância para a independência da Alemanha. Maquiavel anteriormente a Ratzel já havia sido reconhecido como um importante estudioso da questão dos Estados. Sua abordagem estava repleta de exemplos históricos e vinha a fornecer ferramentas aos detentores do poder de determinados territórios. Apesar do Estado italiano não ter sido formado nessa época seus escritos vêm sendo de suma importância para a compreensão de algumas práticas geográficas e políticas de países até os correntes dias (MAQUIAVEL, 2008). Outro importante pensador da geopolítica mundial foi Halford J. Mackinder. A sua teoria tem na geoestratégia a chave para o controle mundial. Mackinder realizou uma hierarquização de diferentes espaços e a eles atribuiu valores específicos para o controle mundial (VESENTINI, 2005). A partir desta lógica destacou uma área central no planeta, que denominou pivot area, que compreende uma imensa região que se estendia da Europa à Ásia.Dentro dessa área delineada, atribuiu uma importância maior à Europa oriental, onde segundo ele se encontrava o que denominou de “heartland” (“terra-coração”). Mackinder defendia a ideia de que se algum país dominasse o “heartland” dominaria o mundo (VESENTINI, 2005). Dentre as teorias geopolíticas que tiveram êxito ao longo do século XX podemos destacar a obra do geógrafo americano Nicholas J. Spykman que havia se voltado para questões teóricas e metodológicas da geografia política e ao questionamento da geopolítica. Spykman realizou um estudo atualizando o pensamento de Mackinder e inserindo novos elementos na análise (COSTA, 2008). Para ele o “heartland” de Mackinder não representava mais um papel decisivo, mas sim as regiões de contato e que vão em direção ao centro dos continentes, como as suas

bordas

marítimas,

regiões

que

denominou

de

“rimland”

(caminho

circunferencial marítimo). Estas zonas eram capazes de compensar e até mesmo superar o “heartland” (COSTA, 2008). No caso brasileiro também existiram expoentes que pensaram a questão geopolítica do país, a maioria deles com forte ligação com o Estado e mais especificamente com as Forças Armadas, através da Escola Superior de Guerra (ESG). Dentre os vários nomes de renome podemos destacar o capitão Mário

Travassos (Projeção Continental do Brasil) e o general Golbery do Couto e Silva (Geopolítica do Brasil) que abordou a questão da geopolítica do Brasil e também o controle e a expansão de nossas atuais fronteiras. Muitas das ideias de Golbery do Couto e Silva hoje estão em desuso e sua obra deve ser contextualizada devido ao forte caráter doutrinador do período em que viveu.

Limite e fronteira

Os termos limite e fronteira possuem variadas e complexas significações. Segundo Machado (1998), podemos entender limite como fator de separação, pois separa unidades políticas e permanece como um obstáculo fixo, não importando a presença de certos fatores comuns, físico-geográficos ou culturais. A palavra fronteira, por sua vez, é considerada como fonte de perigo e/ou ameaça devido à possibilidade de desenvolver interesses distintos aos do governo central, remetendo aos problemas que cada Estado-nacional apresenta para o controle do território. A heterogeneidade da população de um Estado pode acarretar a falta de representatividade de determinados grupos, ocasionando problemas sobre o controle do território. As fronteiras podem ser perenes e os cidadãos de países vizinhos podem vir a ter mais similaridades com etnias, povos, tribos, dentre outros, do outro lado da fronteira do que com habitantes do mesmo país, o que pode acarretar problemas ao poder central (MACHADO, 1998). Grande parte das regiões de fronteira está isolada dos centros nacionais de seus respectivos Estados, quer pela ausência de redes de transporte e de comunicação, quer pelo peso político e econômico menor que possui. Por outro lado, as regiões de fronteira estão também formalmente isoladas dos Estados vizinhos pelo papel disjuntor dos limites políticos (MACHADO, 2005). Outro fator fundamental na construção dos limites internacionais é o mercado interno, que sempre teve importante papel na coesão dos Estados nacionais. Este também está sujeito aos poderes que comandam a gestão do território estatal. Podemos vislumbrar a partir da história que a questão das fronteiras sempre esteve sujeita a mudanças. No que tange ao processo de construção dos limites interestatais, o Barão do Rio Branco entendia que a decisão sobre determinado limite nem sempre é natural,

e ou de fácil decisão, devido ao elevado número de agentes envolvidos nas dinâmicas existentes. Em relação ao tema da fronteira do norte do Brasil e a disputa com as potências europeias, a saber, França, Países Baixos e Inglaterra, podemos notar que os acordos, discussões, reuniões, dentre outras práticas, foram frequentes, o que resultou no atual traçado para a fronteira setentrional do Brasil (JORGE, 1999). Podemos afirmar que as fronteiras nem sempre são “fechadas” e podem se alterar dependendo do contexto. A dificuldade de se encontrar mapas históricos de algumas regiões também reflete a falta de precisão e/ou definição de algumas áreas pelo mundo. Na atualidade a mundialização da economia repercute de forma aguda nas regiões fronteiriças de países desenvolvidos e com vizinhanças assimétricas. As fronteiras políticas entre os Estados vêm recebendo atenção crescente. Sobretudo aquelas que separam países ricos e países pobres. Podemos citar os exemplos das fronteiras entre Estados Unidos e México ou Europa e África. Para Foucher (2009), existe por parte dos Estados nacionais, sobretudo aqueles mais poderosos, a intenção de limitar e/ou controlar o fluxo de mercadorias e pessoas que buscam do outro lado da fronteira uma vida melhor. Para o referido autor, a fronteira também configura uma fonte de renda para os que controlam suas passagens. Ela é um mercado interessante para empresas que produzem equipamentos de segurança e vigilância (FOUCHER, 2009). “Desde 1991, mais de 26 mil quilômetros de novas fronteiras internacionais foram instituídas, outros 24 mil foram objeto de acordos de delimitação e de demarcação e, se todos os programas anunciados de muros, cercas e barreiras metálicas ou eletrônicas fossem levados a cabo, se alongariam por mais de 18 mil quilômetros. Nunca se negociou, delimitou, demarcou, caracterizou, equipou e vigiou e se patrulhou tanto.” (FOUCHER, 2009, p.9) No caso do Arco Sul da fronteira brasileira, uma de suas abordagens mais célebres, realizadas por Golbery a inseria na Área Geopolítica Continental PlatinoPatagônica – formada por Argentina, Chile, Uruguai e Brasil Platino (Estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul). Para Golbery, entre as características dominantes da geopolítica nacional da época estavam: a contenção ao longo das

linhas fronteiriças; a projeção pacífica para o exterior; e a colaboração com o mundo subdesenvolvido (FREITAS, 2004). O Brasil como principal potência da América do Sul tem suas fronteiras impactadas pelas populações dos Estados vizinhos, principalmente na região do Cone Sul. Sua política de fronteira desde o período do governo militar vem dedicando uma atenção maior a função de controle e segurança da faixa de fronteira. As recentes operações em conjunto com outros órgãos comprova a crescente preocupação com as áreas limítrofes do Brasil. Foucher (2009) nos ajuda a compreender a frequentes e atuantes operações na zona de fronteira: “As fronteiras se transformaram em ‘membranas assimétricas’, autorizando a saída, mas protegendo a entrada de indivíduos vindos do outro lado. E convém que o Estado interpelado por ter ‘perdido o controle da fronteira’, que nunca havia dominado completamente, demonstre sua capacidade de tomar medidas que se imponham para, aí então, restaurar sua autoridade, menos em relação aos segmentos afetados do que aos olhos de seus administrados.” (FOUCHER, 2009, p.19) A preocupação com as fronteiras internacionais por parte do governo brasileiro tem como pano de fundo uma preocupação de proteger aquilo que é estabelecido contra aquilo que é marginal contra os fluxos que são considerados indesejáveis.As Operações Ágata, realizadas pelo Estado brasileiro em suas fronteiras se justificam pelo fato do Estado ser responsável pela manutenção da ordem no interior de seu território. Em relação as suas fronteiras, atribuições concernentes à manutenção da integridade e governabilidade; à segurança da economia; ao controle da moeda e à competitividade da economia nacional (FONT; RUFÍ, 2006).

Operação Ágata

O Estado-Maior do Conjunto das Forças Armadas, que são compostos pela Aeronáutica, o Exército e a Marinha, possuem inúmeras operações e programas por toda a extensão do território brasileiro. Por vezes, as missões realizadas se subdividem em operações que tem o objetivo de realizar a cobertura de toda a área

do país. Devido à abrangência e também a variedade, foi imprescindível delimitar uma operação que viesse a contemplar a questão da fronteira e que tivesse algumas edições e objetivos claros. Dentre os programas toda a extensão do território brasileiro a Operação Ágata foi escolhida por ser um exemplo de políticas integradas não somente entre as diferentes áreas das Forças Armadas, mas também por contar com a participação de doze ministérios e vinte agências governamentais. A Operação se dá através de um planejamento e mobilização de forma integrada, com articulação contínua entre militares das Forças Armadas e agentes de segurança pública nas três esferas governamentais (BRASIL, 2014). O principal objetivo da Operação Ágata é coibir delitos como narcotráfico, contrabando e descaminho, tráfico de armas e munições, crimes ambientais, imigração e garimpo ilegais (BRASIL, 2014). A Operação Ágata surge, a partir da iniciativa do Plano Estratégico de Fronteiras de 2011, uma demanda da crescente interação transfronteiriça (BRASIL, 2011). Apesar do aumento do comércio sulamericano nem todo este comércio acontece de forma lícita e esta operação visa coibir de forma integrada qualquer contravenção realizada na zona fronteiriça. O numero de realizações da operação, sua extensão e a periodicidade fez com que a operação fosse dividida em regiões de abrangência. As regiões dos Comandos Militares que compõe a Operação Ágata são: do Sul, Oeste, Amazônia e Norte (Figura 1). Dentre os objetivos da Operação Ágata no Arco Sul, a questão dos garimpos ilegais não estaria ligada a essa região em específico, devido a não ocorrência dos mesmos na zona fronteiriça estabelecida.

Figura 1. Ilustração das áreas de atuação e os Comandos da Operação Ágata

Adaptação: Camilo Pereira Carneiro Filho, 2014. Fonte: BRASIL, 2014.

No caso da Operação Ágata sob o Comando Militar do Sul vê-se que sua atuação se dá nos estados da Região Sul (Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná, também chamado de Arco Sul). É importante salientar que a operação possui o compartilhamento das informações, com o escopo de auxiliar na compreensão da realidade a ser trabalhada pelas forças do governo, que muitas vezes desloca contingentes para cumprir determinadas missões em regiões fronteiriças. As edições realizadas no Arco Sul foram: Ágata 2, 5 e 7 (Tabela 1). As operações obtiveram um incremento de efetivo a cada edição da operação e também a área de atuação foi expandida.

Tabela 1. Operação Ágata no Arco Sul

ITEM

ÁGATA 2

ÁGATA 5

ÁGATA 7

Período

Setembro de 2011

Agosto de 2012

Estados abrangidos

MS / PR / SC / RS

MS / PR / SC / RS

Maio-Junho de 2013 AM / PA / AP / RR / AC / RO / MT / MS / PR / SC / RS

Países fronteiriçosabrangidos

Argentina, Paraguai e Uruguai

Argentina, Bolívia, Paraguai e Uruguai

Argentina, Bolívia, Colômbia, Guiana, Guiana Francesa, Paraguai, Peru, Suriname, Uruguai e Venezuela

Efetivosmovilizados

8.705

19.806

31.263

Fonte: BRASIL, 2014.

Além dos elementos relativos à vigilância a Operação Ágata também insere elementos sociais através de procedimentos de saúde. Pode-se verificar números como: 59.717 procedimentos de saúde; 18.304 atendimentos odontológicos; 29.482 atendimentos médicos; 9.000 vacinações; 195.241 medicamentos distribuídos. Os efetivos deslocados para cada operação cumprem, além de um papel de controle e segurança, com a busca de apoio, mesmo que parcial da população, aos diversos tipos de procedimentos citados. De acordo com Castro, o Cone Sul pode ser entendido como uma área de confluência do dinamismo político-econômico oriundo da relativa proximidade dos ecúmenos estatais brasileiros e argentinos – cuja gênese radica na rivalidade e choque de interesses luso-espanhóis anterior às independências verificadas em início do século XIX (FREITAS, 2004). As fronteiras do Prata, nos séculos passados, foram palco de inúmeras disputas, sendo que a última teve fim com a assinatura do Acordo Tripartite entre Brasil, Paraguai e Argentina, em 19 de outubro de 1979, que passou a regular o aproveitamento dos recursos hídricos do rio Paraná desde as Sete Quedas até a foz do Rio da Prata. À época, os dois países eram governados por ditaduras militares e havia o temor – não comprovado – que o Brasil, em um eventual conflito com a Argentina, abrisse completamente as comportas de Itaipu, aumentando o nível das águas do rio da Prata e inundando a cidade de Buenos Aires (CARNEIRO FILHO, 2013).

O filme “El baño del Papa” (2007), escrito e dirigido por César Charlone e Enrique Fernández, retrata um pouco da vida das pessoas que vivem do contrabando na cidade de Melo no Uruguai. O filme retrata esta questão inserindo também os órgãos de controle que se envolvem nessa atividade ilícita. Na zona fronteiriça são inúmeros os delitos cometidos e cada área limítrofe possui uma atividade distinta e/ou fluxo diferenciado.Dentre os delitos mais combatidos está o contrabando de inúmeros produtos, sendo o cigarro um dos principais. No Paraguai o contrabando de cigarros possui um enorme peso na economia. O país produz 65 milhões de cigarros ao ano. Desse total, mais de 90% (cerca de 60 bilhões de unidades) são destinadas ao mercado negro brasileiro através do contrabando. Só com impostos o Brasil perde aproximadamente 4 bilhões de reais por ano (CARNEIRO FILHO, 2013).

Conclusões

Os geopolíticos do Brasil criaram e instrumentalizaram diversos planos ao longo das últimas décadas, estando alguns deles ainda em voga. Dentre eles, temos o plano de proteção e controle das áreas limítrofes do Estado brasileiro.O Brasil carece de instrumentos para controlar e dar segurança de forma efetiva nos seus 15.719 quilômetros de área fronteiriça.O aumento das apreensões de materiais ilícitos nas zonas de fronteira pode atestar a ineficiente e/ou falta de controle por parte do Estado. A Operação Ágata em cada nova edição apreende consideráveis somas de dinheiro juntamente com toneladas de materiais ilícitos, além de criminalizar um elevado número de pessoas envolvidas nestas práticas ilegais. O combate à criminalidade na fronteira brasileira atingiu uma grande quantidade de pessoas, cuja renda provém não apenas do mercado informal como também do mercado formal de economia. Na região da Tríplice Fronteira Brasil-Argentina-Paraguai, por exemplo, o aumento da fiscalização da Receita Federal e da repressão oficial veio desacompanhado de políticas de geração de emprego o que foi responsável pelo aumento do desemprego. Os sacoleiros que antes vinham de todas as regiões do Brasil, movimentado o setor de serviço de Foz do Iguaçu (hotéis, taxis, restaurantes,

lojas, etc.) já não chegam na mesma proporção, causando uma queda na arrecadação do município. As ações sociais que a Operação Ágata tem realizado ajudam em algumas melhorias paliativas para as populações nas zonas de fronteira. No entanto, o trabalho realizado não vem com toda a estrutura e suporte necessário para acabar com as atividades ilícitas, uma vez que as pessoas que tiram sua subsistência disso não alteram sua atividade ilegal. Apenas são detidas e/ou diminuem as mesmas no período de maior fiscalização e controle por parte do Estado brasileiro. Todavia, políticas públicas que visem combater efetivamente estes tipos de contravenções ainda não foram implementadas. As regiões de fronteira continuarão mantendo, e por vezes até intensificam como é o caso das práticas ilegais no Arco Sul do Brasil.

Referências

BRASIL. Operação Ágata. Disponível em: Acesso em 24 de jul. De 2014. CARNEIRO Filho, Camilo Pereira. Processos de transfronteirização na Bacia do Prata: a Tríplice Fronteira Brasil-Argentina-Paraguai – Porto Alegre: UFRGS/Posgea, 2013. (254p.). COSTA. Wanderley Messias da.Geografia política e geopolítica: discursos sobre o território e o poder. 2ª Edição. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2008. FONT, Joan Nogué; RUFI, Joan Vicente. Geopolítica, identidade e globalização. São Paulo: Annablume, 2006. FOUCHER, Michel. Obsessão por fronteiras. São Paulo: Radial Livros, 2009. FREITAS, Jorge Manoel da Costa. A Escola Geopolítica Brasileira. Biblioteca do Exército. Ed.,2004. INDOIBERIA. Quem conquistou e quem defendeu o Rio da Prata na realidade. Disponível em: Acesso em 28 de jun. de 2014. JORGE, A.G. de Araújo. Rio Branco e as fronteiras do Brasil. Uma introdução às obras do Barão do Rio Branco. Brasília: Senado Federal, 1999.

MACHADO, L. O. 1998. Limites, fronteiras, redes. In: T. M. Strohaecker et ali. (Orgs.). Fronteiras e espaço global. Porto Alegre: AGB. pp. 41-49. MAQUIAVEL, Nicolau. O Príncipe. Capítulo XVI. 3ª Edição, São Paulo: Marins Fontes, 2008. MATIAS, Eduardo Felipe Pérez. A humanidade e suas fronteiras: do Estado soberano à sociedade global. São Paulo: Paz e Terra, 2005. RATZEL, Friedrich. O solo, a sociedade e o Estado. Revista do Departamento de Geografia da USP, 1982. ROSECRANCE, Richard. La expansión del Estado comercial. Comercio y conquista en el mundo moderno. Madrid: Aliança Editorial, 1986. SANCHEZ, Joan Eugeni. Geografia política. Madrid: Síntesis, 1992. VESENTINI, José William. Novas geopolíticas. São Paulo: Contexto, 2005.

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