OPERAÇÃO LAVA JATO TERÁ O MESMO DESTINO DA OPERAÇÃO MÃOS LIMPAS DA ITÁLIA?

August 5, 2017 | Autor: Fernando Alcoforado | Categoria: Sociology, Political Science, Politics
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F e r n a n d o A l co f o ra d o * A Operação Mãos Limpas foi uma investigação judicial de grande envergadura na Itália que visava esclarecer casos de corrupção durante a década de 1990. A partir da prisão de um militante do Partido Socialista Italiano (PSI), Mario Chiesa, acusado de cobrar propina na instituição que dirigia, desencadeou-se a megaoperação de investigações criminais. Com a Operação Mãos Limpas foram condenados políticos, empresários e agentes públicos e privados. O poderoso Bettino Craxi, principal líder do PSI e ex-primeiro-ministro da Itália, foi punido por prática de corrupção e financiamento ilegal de campanhas eleitorais. Pesou a confissão do empresário Salvatore Ligresti de que sua empresa pagava propina ao PSI e ao próprio Craxi para conseguir obras desde 1985 (Ver o artigo de Carlos Ramos, professor, consultor e doutor em ciência política pela Universidade Federal de São Carlos – Ufscar, sob o título Resultados da Operação Mãos Limpas publicado no website ). No artigo acima citado, Carlos Ramos afirma que ficou provado o tráfico de influência e corrupção em contratos milionários envolvendo a ENI, a empresa petrolífera estatal italiana. A Operação Mãos Limpas comprovou que a estatal petrolífera ENI funcionava como uma das principais fontes para o financiamento ilegal de partidos e políticos italianos. Florio Fiorini, diretor financeiro, e Gabriele Cagliari, presidente da ENI, confessaram que durante anos a empresa efetuava pagamentos mensais aos principais partidos políticos e seus líderes. Cagliari cometeu suicídio na prisão. Além dos esquemas de corrupção, a Operação Mãos Limpas revelou também as relações do Estado italiano com o crime organizado. Giulio Andreotti, líder da Democracia Cristã (DC) e ex-primeiro-ministro da Itália, foi também processado por associação com a máfia. Segundo as investigações, Andreotti era ligado ao mafioso Salvatore “Totó” Riina, na época o “chefe dos chefes” (“capo di tutti capi”) da Cosa Nostra, que segundo consta negociava contratos e intermediava transações lícitas e ilícitas com o governo. É muito grande, portanto, a semelhança entre a Operação Mãos Limpas da Itália e a Operação Lava Jato do Brasil. Da Operação Mãos Limpas resultou a decadência política e eleitoral dos principais partidos da época, o PSI (Parido Socialista) e o DC (Democrata Cristão). As forças políticas que dominavam a Itália desde o pós-guerra viram seu poder ruir e desaparecer. A força dos acontecimentos foi tão grande que os historiadores consideram que a Operação Mãos Limpas pôs fim à chamada Primeira República Italiana. Carlos Ramos, autor do artigo acima citado, afirma que, da experiência italiana, pode-se aprender que a deslegitimação do sistema político, por si só, não é capaz de provocar as mudanças necessárias. É preciso, como houve por lá, participação efetiva da opinião pública na luta contra a corrupção. Carlos Ramos ressalta o posicionamento do juiz federal Sérgio Moro, responsável pela operação Lava Jato no Brasil, que em artigo por ele publicado em 2004 e no qual analisava a Operação Mãos Limpas, afirmou que “(...) a ação judicial não pode substituir a democracia no combate à corrupção. É a opinião pública esclarecida que pode, pelos meios institucionais próprios, atacar as causas estruturais da corrupção”. 1

A operação Mãos Limpas teve como saldo a investigação de 6.059 pessoas, dentre eles 872 empresários, 1.978 administradores e 438 parlamentares, dos quais quatro haviam sido primeiros-ministros. O Tribunal de Contas Italiano afirmou que a corrupção dentro da gestão pública deste país alcançou 60 bilhões de euros por ano com reflexos no mundo todo. A operação Mãos Limpas alterou a correlação de forças na disputa política da Itália, reduzindo o poder de partidos que haviam dominado o cenário político italiano. Todos os quatro partidos no governo em 1992 - a Democracia Crstã (DC), o Partido Socialista (PSI), o SocialDemocrata e o Liberal - desapareceram posteriormente. O Partido Democrático da Esquerda, o Partido Republicano e o Movimento Sociale Italiano foram os únicos partidos de expressão nacional a sobreviver. Apenas o Partido Republicano manteve a sua denominação (Ver o artigo Corrupção na Itália publicado no website ). No Brasil, a Operação Lava-Jato, vem evoluindo a contento graças em grande parte aos movimentos cuidadosos do juiz federal Sergio Moro, o grande responsável pela condução do processo que investiga o megaesquema de corrupção na Petrobras. Desde março do ano passado, ele autorizou 161 mandados de busca e apreensão, decretou a prisão de sessenta pessoas e determinou o bloqueio de 200 milhões de reais em contas bancárias de suspeitos – incluindo altos funcionários da estatal e empresários poderosos (Ver o artigo Sergio Moro: O juiz que faz andar a máquina em busca dos culpados pelo petrolão publicado no website ). Defendidos pelos maiores advogados criminalistas do país, os acusados reagiram de imediato. Só de pedidos de habeas corpus foram enviados ao Superior Tribunal de Justiça e ao Supremo Tribunal Federal, pelo menos 37 – e apenas um vingou até agora: o que permitiu a libertação do ex-diretor da Petrobras Renato Duque e que foi concedido pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Teori Zavascki. As tentativas de tirar o processo das mãos do juiz Sergio Moro resultaram em fracasso. Os interessados em afastá-lo do caso percorreram todas as instâncias do Judiciário alegando que ele não tinha competência legal para conduzir o processo porque com o envolvimento de políticos no escândalo o “foro especial” de que dispõem, ou seja, o direito de serem julgados pelo Supremo Tribunal Federal. Alegaram também que as prisões dos suspeitos foram abusivas e de que o caso deveria ser transferido de Curitiba para o Rio de Janeiro, onde fica a sede da Petrobras. Nenhum desembargador do Tribunal Regional Federal ou ministro do STJ ou do STF acatou as contestações. Da mesma forma como aconteceu na Itália seria desejável a condenação e prisão de todos os envolvidos na megacorrupção que atingiu a Petrobras e o desaparecimento de todos os partidos políticos envolvidos na Operação Lava Jato. Adicionalmente, deveria ser convocada nova Assembleia Constituinte para promover a reforma do Estado e da Administração Pública no Brasil. É imperiosa a reforma do Estado e da Administração Pública no Brasil porque todo o sistema político e administrativo do País está contaminado pela corrupção e a máquina administrativa do Estado é ineficiente e ineficaz. Para construir uma nova ordem política e administrativa radicalmente democrática baseada na ética e no desenvolvimento em benefício de toda a população, a nova Assembleia Constituinte deveria considerar, entre outras medidas, o seguinte: 1) a substituição do regime presidencialista pelo parlamentarista para assegurar a estabilidade político-institucional do País com um renovado Supremo Tribunal Federal que atuaria como poder moderador; 2) os candidatos a cargos eletivos deveriam possuir “ficha limpa“ e 2

deveriam prestar contas sistematicamente do seu mandato a seus partidos e ao eleitorado; 3) os eleitores deveriam exercer tanto quanto os partidos políticos o controle social dos eleitos, acionando os mecanismos institucionais necessários à punição daqueles que eventualmente tenham traido o programa partidário e os interesses do eleitorado se pronunciando sobre sua cassação ou não através de plebiscito; 4) as decisões sobre questões de interesse fundamental para a população deveriam ser objeto de decisão através de plebiscito ou referendo; e, 5) todos os detentores de cargos públicos deveriam celebrar com o Estado contrato de gestão em que se comprometem a cumprir as metas estabelecidas que, em caso de seu descumprimento, deveriam ser demitidos. * Fernando Alcoforado, 75, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona, http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011) e Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012), entre outros.

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