Original do Brasil: Como a publicidade articula a cultura popular para promover bens de consumo

July 6, 2017 | Autor: Karoline Grubert | Categoria: Audience and Reception Studies, Branding, Comunicação, Brasil
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL FACULDADE DE BIBLIOTECONOMIA E COMUNICAÇAO DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇAO SOCIAL CURSO DE PUBLICIDADE E PROPAGANDA MONOGRAFIA DE CONCLUSÃO

ORIGINAL DO BRASIL: Como a publicidade articula a cultura popular para promover bens de consumo

Karoline Grubert Bezerra

Porto Alegre, 2002.

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL FACULDADE DE BIBLIOTECONOMIA E COMUNICAÇAO DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇAO SOCIAL CURSO DE PUBLICIDADE E PROPAGANDA MONOGRAFIA DE CONCLUSÃO

ORIGINAL DO BRASIL: Como a publicidade articula a cultura popular para promover bens de consumo

Karoline Grubert Bezerra

Orientadora: Nilda Jacks

Porto Alegre, 2002.

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RESUMO

O presente trabalho pretende mostrar como a publicidade e o marketing articulam elementos do conceito de cultura Nacional-Popular e do conceito de Internacional-Popular para promover os produtos das empresas explorando um mercado consumidor tanto nacional quanto internacional. Partindo da explanação do conceito destes conceitos, identifica-se como a publicidade e o marketing agem em cada uma dessas instâncias, trazendo como um exemplo prático dessa articulação o estudo ilustrativo do caso Guaraná Antarctica.

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SUMÁRIO

LISTA DE FIGURAS.................................................................................................05 INTRODUÇÃO..........................................................................................................06 1. NACIONAL-POPULAR........................................................................................09 1.1. CARACTERÍSTICAS DO NACIONAL-POPULAR.....................................10 1.2. MEDIADORES DO NACIONAL-POPULAR...............................................11 1.3. A CONSTRUÇÃO DO NACIONAL-POPULAR NO BRASIL....................12 2. INTERNACIONAL-POPULAR............................................................................18 2.1. CARACTERÍSTICAS DO INTERNACIONAL-POPULAR.........................19 2.2. MEDIADORES DO INTERNACIONAL-POPULAR...................................20 2.3. A CONSTRUÇÃO DO INTERNACIONAL-POPULAR...............................21 3. A PUBLICIDADE E O MARKETING COMO AGENTES DO NACIONALPOPULAR..................................................................................................................25 4. A PUBLICIDADE E O MARKETING COMO AGENTES DO INTERNACIONAL-POPULAR................................................................................31 5. GUARANÁ ANTARCTICA, ORIGINAL DO BRASIL: ESTUDO DE CASO..........................................................................................................................36 5.1. AMBEV: PRESENÇA BRASILEIRA NO MUNDO GLOBALIZADO.......36 5.2. A DISPUTA PELO USO DO NACIONAL-POPULAR.................................38 5.3. GUARANÁ ANTARCTICA: AGENTE DO NACIONALINTERNACIONAL-POPULAR................................................................................41 5.4. COPA DO MUNDO: COCA-COLA X GUARANÁ ANTARCTICA NA DISPUTA PELO NACIONAL-INTERNACIONAL-POPULAR.............................45 5.5. GUARANÁ ANTARCTICA: AGENTE DO INTERNACIONALNACIONAL-POPULAR............................................................................................55 CONCLUSÃO............................................................................................................62 BIBLIOGRAFIA........................................................................................................66

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LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1 – GUARANÁ ANTARCTICA................................................................41 FIGURA 2 – JOGADOR JARDEL COM CAMISETA TEASER..............................42 FIGURA 3 – CAMISETA DA SELEÇÃO COM PATROCÍNIO DO GUARANÁ ANTARCTICA...........................................................................................................46 FIGURA 4 – ATRIZ BRASILEIRA LUANA PIOVANI..........................................48 FIGURA 5 – ATRIZ COMEDIANTE BRASILEIRA DERCY GONÇALVES.......49 FIGURA 6 – COMEDIANTE BRASILEIRO BUSSUNDA EM DESTAQUE........49 FIGURA 7 – EM CIMA: ROQUEIRO JOÃO GORDO. ABAIXO: ROQUEIRO SUPLA........................................................................................................................50 FIGURA 8 – CARTAZ DE PONTO DE VENDA DA PROMOÇÃO “BOTE FÉ”..51 FIGURA 9 – BONECA SUSI COM GUARANÁ.....................................................56 FIGURA 10 – BICHINHOS DE PELÚCIA VENDIDOS JUNTO COM A EMBALAGEM CAÇULINHA DO GUARANÁ ANTARCTICA............................57 FIGURA 11 – CENAS DO NOVO COMERCIAL DE TV DO GUARANÁ ANTARCTICA...........................................................................................................60 FIGURA 12 – SEJA O QUE FOR, SEJA ORIGINAL..............................................60

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INTRODUÇÃO

A globalização econômica é um fato nos dias atuais. As transações financeiras não conhecem fronteiras nem nacionalidades. As empresas perderam suas características nacionais para se transformarem em transnacionais ou, simplesmente, empresas globais (como elas gostam de autodenominar-se). Ao mesmo tempo em que o fenômeno da globalização ocorre na economia, a cultura também passa por um fenômeno do mesmo gênero, a mundialização. Cada país possui sua própria cultura, sua própria memória nacional, mas com o advento da mundialização, constitui-se uma espécie de supracultura abrigada numa memória internacional construída a partir de um circuito de trocas internacionais. As trocas econômicas globalizadas acentuaram essas trocas culturais internacionais que se iniciaram com o advento da Indústria Cultural. O cinema, a música, as histórias em quadrinhos são apenas alguns exemplos dos constituintes desse circuito. Sem dúvida, a publicidade, interface do marketing na Indústria Cultural, também tem sido uma importante personagem na formação dessa memória internacional, ao ser usada pelas transnacionais, promovendo padrões de comportamentos globais, através da utilização de estereótipos culturais de países. Por ser a sociedade contemporânea pautada pelo consumo, movido pela publicidade, é importante que se compreenda esses artifícios dos quais a publicidade utiliza-se para promover o consumo e a adequação comportamental. O antropólogo Renato Ortiz, com sua obra, aprofunda a discussão do tema, trazendo um novo significado à problemática da cultura popular brasileira, que irá pautar este trabalho. Ele parte da análise do Nacional-Popular, conceito proposto por Gramsci, passando pelo surgimento da Indústria Cultural no Brasil, concluindo a responsabilidade dessa indústria pelo equacionamento do problema identitário brasileiro. Ao mesmo tempo em que ela equaciona a formação da identidade do país, promove-a como constituinte da memória internacional, ao analisar o processo em termos de mundialização da cultura.

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Para explicar essa extrapolação do Nacional-Popular, que tem a Indústria Cultura como um dos principais personagens, mediando as culturas nacionais e promovendo um circuito de trocas culturais internacionais, construindo uma sociedade global, o autor propõe um novo conceito de análise para a cultura, o Internacional-Popular. Embora o conceito seja difícil de ser apreendido porque ainda está sendo construído, ele é de suma importância para o momento atual em que se vive. Com a velocidade das comunicações e das informações, a publicidade e o marketing tem sido importantes ferramentas na constituição de uma memória internacional, promovendo bens culturais globais. Portanto, a obra desse autor, que descreve com presteza o fenômeno que se passa, configura-se em importante referência para os estudiosos da Comunicação, em especial para os da publicidade, uma das responsáveis pela mundialização da cultura. O objetivo deste trabalho é mostrar como a publicidade e o marketing usam o conceito de cultura Nacional-Popular e o conceito Internacional-Popular para vender os produtos das empresas no mercado de consumo. Para isso, no primeiro capítulo explica-se o conceito de Nacional-Popular, proposto por Gramsci e usado por Ortiz para estudar o caso do Brasil. Nacional-Popular é a memória nacional de cada país, construída a partir de referencias coletivos selecionados por alguns mediadores. No caso brasileiro, a construção da identidade contemporânea é predominantemente mediada pela Indústria Cultural. No segundo capítulo, explica-se o conceito de Internacional-Popular, que é a memória internacional formada pela seleção das memórias nacionais, que mais despertam interesse global, por alguns mediadores. Nesse caso, os mediadores são a Indústria Cultural e as transnacionais que promovem bens de consumo globais através do marketing e da publicidade. No terceiro capítulo procura-se mostrar como a publicidade e o marketing contribuem para a formação da identidade nacional brasileira através da integração da nação em torno de diversos bens culturais reconhecíveis nacionalmente que, ao serem englobados de acordo com os objetivos mercadológicos de consumo das empresas, possibilitam a sua exploração comercial.

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Em seguida, no quarto capítulo, procura-se mostrar como essas duas áreas trabalham para a adequação do Nacional-Popular aos padrões de referência mundiais, contribuindo para a promoção de alguns aspectos do Nacional-Popular brasileiro à integrante da memória internacional através da exportação dos bens culturais nacionais. Por fim, no último capítulo, estuda-se o caso ilustrativo da Ambev com o Guaraná Antarctica com o objetivo de, a partir de um objeto real, comprovar o uso do Nacional-Popular para promoção do produto dentro do país e para integração do Internacional-Popular, bem como para promoção do Internacional-Popular dentro do país para adequação do comportamentos brasileiros aos padrões mundiais, construindo tanto um mercado consumidor nacional quanto internacional para o produto.

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1. NACIONAL-POPULAR

O conceito de Nacional-Popular foi proposto por um autor italiano chamado Antonio Gramsci, quando analisou a produção e o consumo de literatura na Itália. Para ele, Nacional é símbolo de Popular. Na Itália, Nacional era símbolo de Literário. Os escritores faziam parte da elite e produziam obras que não retratavam a realidade popular. Eles não trocavam experiências com o povo e por isso o povo preferia consumir livros estrangeiros, principalmente os franceses, porque esses traziam a realidade popular e o humanismo necessário. Essa era uma das razões pelas quais o país ainda não era integrado identitariamente. Para Gramsci, o intelectual deveria ser a expressão dos interesses populares e produzir obras que manifestassem os desejos das classes populares, integrando as consciências do país. Gramsci em suas discussões não demonstrou a veracidade ou não das concepções de mundo proporcionadas pela produção cultural, mas sim, a relação de poder entre as classes sociais ou nações que se manifesta na cultura nacional. O antropólogo brasileiro Renato Ortiz, apropriando-se desse conceito, desenvolveu vários estudos sobre a sociedade brasileira no que diz respeito à cultura. Em seu livro “Cultura Brasileira e Identidade Nacional” (1985), ele desvenda a construção da Cultura Brasileira através do processo de busca da identidade nacional, analisando a reinterpretação do popular pelos grupos sociais e a própria construção do Estado brasileiro. Em outra obra, “A Moderna Tradição Brasileira” (1988), ele estuda novamente a cultura popular e a identidade nacional brasileira, mas agora sob o advento de um novo mediador da interpretação da cultura popular, a Indústria Cultural subsidiada pelo Estado, que integrará o país.

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1.1. CARACTERÍSTICAS DO NACIONAL-POPULAR

Nacional-Popular é sinônimo de identidade nacional. Ele caracteriza-se por uma relação política entre o nacional e o popular. Através da apropriação de elementos da cultura popular que fazem parte da memória coletiva de determinados grupos sociais, provenientes de uma tradição, folclorista ou não, transforma-os em características constituintes da memória nacional. Portanto, a identidade nacional constitui-se através do agrupamento de memórias coletivas. A memória coletiva sempre está vinculada a um determinado grupo social que a partilha. “É o grupo que celebra sua revificação” (Ortiz: 1985, p. 133) através de rituais. Isso confere à memória coletiva uma aproximação com o mito, considerando que este também se manifesta ritualmente. A memória coletiva reproduz o passado que é considerado sagrado pelo grupo social que a ritualiza, limitando-se a ele (Ortiz: 1985). A memória nacional é uma categoria de segunda ordem, integrando memórias coletivas de diversos grupos sociais e reinterpretando-as através de mediadores. A integração de todas as memórias só é possível, devido ao esquecimento dos conflitos existentes entre elas. Cabe aos mediadores a responsabilidade pela apropriação e adequação dessas manifestações da memória popular de acordo com os interesses dominantes. A interpretação dessas memórias, sendo feita de acordo com o jogo do poder, confere à memória nacional uma aproximação com a ideologia. “Enquanto história ela se projeta para o futuro e não se limita a reprodução do passado considerado como sagrado” (Ortiz: 1985, p. 135). O Nacional-Popular, sendo constituído através da memória nacional, que por sua vez é constituída pela memória coletiva, é responsável pela unificação das consciências do país. Uma vez eleitas pelos mediadores, certas manifestações pertencentes à memória

coletiva são

incorporadas à

memória

nacional,

transformando-se em características da nação, através do ensino pedagógico que os socializa (Ortiz: 1994). Mesmo elegendo alguns aspectos na memória coletiva, o Nacional-Popular não exclui a memória coletiva em si.

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1.2. MEDIADORES DO NACIONAL-POPULAR

O Nacional-Popular dispõe de vários mediadores na reinterpretação das manifestações populares e constituição da memória nacional. No caso brasileiro, eles são os intelectuais estudiosos da problemática da cultura, que podem ou não fazer parte da ideologia dos governos e a Indústria Cultural com seus constituintes. Os intelectuais participaram como mediadores na medida em que iniciaram a discussão sobre a autenticidade do “nacional”, na tentativa de construir uma cultura social e politicamente unificante. A partir dessa discussão, foram conduzidos vários debates em torno da problemática da veracidade da cultura do país, através da análise dos vários traços culturais apresentados pela sociedade. Muitas vezes, essas discussões foram norteadas pelos interesses das classes dominantes de validar esse ou aquele determinado tipo de manifestação cultural; em outras, as discussões criticaram a ordem instaurada. Baseados no produto dessas discussões, as instituições sociais reproduziram-nas, ensinando pedagogicamente aos brasileiros e contribuindo para a integração das consciências numa única consciência nacional. Ao longo do tempo, a Indústria Cultural assumiu um papel proeminente na mediação do popular e do nacional, integrando o país em termos mercadológicos. Exemplo disso foi a trajetória da Rede Globo e de sua programação, voltada para a cultura nacional durante os anos da ditadura. Abandonam-se as perspectivas anteriores, que eram políticas e sociais e assume-se a perspectiva econômica para problematizar a cultura nacional. Através dos meios de comunicação de massa, o popular é revisitado e interpretado de acordo com os interesses mercadológicos das classes dominantes. Importante é notar que, a cada momento novo vivido pela sociedade brasileira, são exigidas novas interpretações por parte do mediador, caracterizando as relações de poder entre as classes dominantes e as classes inferiores.

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1.3. A CONSTRUÇÃO DO NACIONAL-POPULAR NO BRASIL

No Brasil, a busca por uma identidade nacional iniciou-se com a “Semana de 22”, que inaugurou uma séria de discussões em torno da cultura brasileira e foi profundamente influenciada por duas revoluções que aconteceram no mundo em diferentes períodos: a Revolução Francesa, que defendeu ideais de liberdade, fraternidade e igualdade, baseados no iluminismo, fortalecendo a burguesia; e a Revolução Industrial, ocorrida na Inglaterra, que inaugurou um novo momento na história da humanidade, introduzindo a máquina a vapor, fundando o industrialismo e fundamentando a lógica competitiva do Sistema Capitalista. A “Semana de 22” compôs-se de exposições de diversos artistas brasileiros reunidos em torno do um mesmo ideal, inaugurar a modernidade no Brasil, configurada pelos avanços tecnológicos e pelas idéias iluministas. Com essa exposição, a elite pensante começou a dar-se conta de que a sociedade brasileira precisava ser construída, juntamente com a identidade nacional, em conformidade com esses ideais. Nesse momento, foram iniciados estudos em torno da problemática do homem brasileiro, baseados no evolucionismo, o que determinou o cunho racial desses estudos. Durante os anos 20 e 30, o pessimismo era dominante, em virtude das constatações a que se chegaram que diziam que o homem brasileiro era indolente e preguiçoso por natureza porque o elemento branco de sua composição tinha se perdido entre a mistura das três raças. Entretanto, Renato Ortiz adverte que identidade não pode ser confundida com caráter (Ortiz: 1985). Com o Estado Novo, as teorias desses intelectuais se tornam incompatíveis com a modernização pretendida pelo governo para o país. A ideologia anterior será substituída pela ideologia do trabalho. A interpretação desses mediadores que permitiam que o preconceito dominasse, esperando o branqueamento do país, deu lugar a uma nova interpretação da miscigenação. Os novos mediadores constituídos, afirmavam que o brasileiro, composto por três raças, permitia que o país fosse portador de grande diversidade e de uma boa convivência entre os povos integrantes

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da nação, inaugurando uma perspectiva folclorista ou de resgate da tradição para os estudos da cultura. No que diz respeito ao processo de modernização, enquanto avanço tecnológico, o Estado Novo deu os primeiros subsídios para o desenvolvimento do país, com investimentos em indústrias de base, modernização das cidades através da arquitetura e implantação do Rádio como meio de comunicação. Com a acentuação do caráter comercial do Rádio, difundiu-se pelo Brasil, a música popular. O Rádio e a música popular foram os propagadores da nova interpretação do homem brasileiro, o homem trabalhador. E, se no início do Movimento Modernista, o Brasil foi influenciado pelas revoluções da Europa, a partir da década de 40, o país terá como referência os padrões de comportamento americanos, incorporados nas estrelas de Hollywood e na sociedade de consumo, conseqüências do pós-guerra. Esses padrões de referência também ocuparam a programação do Rádio. Segundo Renato Ortiz, foi durante os anos 50, com o

governo

desenvolvimentista de Kubitscheck, que se multiplicaram os investimentos culturais de caráter comercial, sendo o advento da Televisão no Brasil, um dos primeiros. Além do pós-guerra, no qual os EUA tencionavam difundir o american way of life para o resto da América, o custo da tecnologia exigida para que se produzisse e reproduzisse nacionalmente os bens culturais brasileiros eram muito altos, contribuindo para que também a TV aderisse aos novos padrões de comportamento. “Filmes, anúncios publicitários, música popular e séries televisivas são formas de expressão que circulam no seu interior, independente de suas origens” (Ortiz: 1994, p. 60), o que, conseqüentemente, permitiu a construção de um circuito de trocas culturais com dimensões mundiais (Ortiz: 1994). Diante das dificuldades tecnológicas existentes, observa-se que, mesmo com a internacionalização econômica do país, aprofundando a modernização brasileira, a técnica ainda era insuficiente para a integração nacional, não proporcionando a completa exploração dos mercados, embora a publicidade já se apresentasse como uma importante indústria no país. Nesse mesmo período, os intelectuais do Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB) desenvolveram uma ideologia crítica e nacionalista sob a

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perspectiva da alienação. Os intelectuais isebianos posicionaram-se contra a reprodução estrangeira nas programações da Indústria Cultural, repudiando a alienação que a reprodução da cultura do colonizador provocava na sociedade brasileira. Na busca pela constituição de uma cultura brasileira, os isebianos procuravam despertar a consciência do trabalhador das classes operárias para as injustiças que lhe acometiam, entretanto, para os intelectuais do ISEB, somente eles seriam capazes de produzir uma cultura suficientemente crítica para tanto (Ortiz: 1985). Renato Ortiz nos lembra que o pensamento do ISEB “não se constitui em ‘fábrica de ideologia’ do governo Kubitscheck” (Ortiz: 1985, p. 46), que promoveu a internacionalização da economia brasileira. O ISEB promoveu um ideário nacionalista para diagnosticar e agir sobre os problemas sociais do país. Mesmo assim, a influência do ISEB foi profunda, pois

toda uma série de conceitos políticos e filosóficos que são elaborados no final dos anos 50 se difundem pela sociedade e passam a constituir categorias de apreensão e compreensão da realidade brasileira (Ortiz: 1985, p. 47).

Nos anos 60, o Centro Popular de Cultura (CPC) da União Nacional dos Estudantes (UNE) surgiu influenciado pela ideologia isebiana. A concepção de que o intelectual precisava falar para o povo, despertando-lhe a consciência para sua condição e desalienando-o, foi revestida pela visão marxista. Para cumprir com seus ideais, o CPC organizou várias apresentações populares, de caráter político. Com a característica política de seu discurso, eles consideraram somente a arte política como legítima, “(...) neste sentido, a prática do CPC implicaria a tomada de consciência da dependência dos países subdesenvolvidos com relação aos centros de decisões econômicas e culturais” (Ortiz: 1985, p. 75). Por considerar a arte política, a única legítima e aceitar que somente o intelectual pudesse despertar a consciência do povo, o CPC considerou as manifestações culturais que o povo produzia como cultura débil e alienante, que servia apenas para seu próprio entretenimento.

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O estudo da cultura popular sob a perspectiva da alienação defendida pelo CPC encerra-se em si mesmo, na medida em que nega as manifestações populares como categorias da cultura popular. Como o próprio Ortiz (1985) afirma, Gramsci não trabalha com o conceito de alienação e sim, com o conceito de relações de poder entre classes sociais ou nações. Na medida em que o conceito de alienação é abandonado e o conceito de jogos de poder é aceito, as discussões em torno da cultura brasileira avançam e considera-se um novo elemento nessa discussão, o surgimento da Indústria Cultural. Nos anos 70, o Regime Militar foi responsável pelo aprofundamento da internacionalização econômica, promovendo as transformações que ainda faltavam para consolidar a modernidade técnica da sociedade brasileira. O governo colocou à disposição da Indústria Cultural todo o aparato tecnológico necessário, construindo as bases para a indústria de telecomunicações e investindo na comunicação à distância, como parte do seu programa de integração nacional, o que favoreceu principalmente as redes de TV. Além disso, ele incentivou a produção de televisores no país, tornando a tecnologia acessível para toda a sociedade brasileira, barateando o custo da aquisição e, incentivou também a produção literária através de subsídios aos insumos dessas indústrias, beneficiando editoras e jornais, o que proporcionou a multiplicação do número de revistas com diferentes perfis de público (Ortiz: 1988). Os meios utilizaram-se do novo artifício das redes de difusão e exploraram os diferentes aspectos de cada região em que atuavam, sem deixar de salientar a questão nacional. Somado ao advento do videotape e ao início da produção de aparelhos de TV no país, temos a editoração eletrônica e a TV em cores, contribuindo para a produção de bens culturais nacionais. Nesse período,

ocorre uma formidável expansão, em nível de produção, da distribuição e do consumo de bens culturais. É nesta fase que se dá a consolidação dos grandes conglomerados que controlam os meios de comunicação de massa (Ortiz: 1988, p. 121).

Um dos primeiros bens culturais brasileiros desenvolvidos nessa época foi a telenovela. No início, ela começou timidamente a fazer parte da programação e ao

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longo da década de 70, ela vai ocupando a maior parte dela, atingindo bons níveis de audiência, em detrimento à programação estrangeira que vinha circulando nos meios. Isso despertou os empresários da Indústria Cultural brasileira para a possibilidade de exploração internacional desse bem, atestando “(...) o mercado brasileiro de televisão como possuindo uma dimensão internacional” (Ortiz: 1988, p. 200). Mesmo com a censura, o Regime não censurou os meios de comunicação de massa e sim, alguns exemplares desses gêneros que eram considerados subversivos. Segundo Ortiz, o Regime Militar reconhece

(...) a importância dos meios de comunicação de massa, sua capacidade de difundir idéias, de se comunicar diretamente com as massas, e, sobretudo, a possibilidade que têm em criar estados emocionais coletivos (Ortiz: 1988, p. 116),

o que favoreceria o plano de integração nacional das consciências dos brasileiros. Enquanto que, o principal objetivo dos empresários da época com relação aos meios era a integração do mercado através das redes de comunicação. Por isso, com a consolidação da Indústria Cultural, adquiriu-se (...) a possibilidade de equacionar a identidade nacional, mas reinterpretando-a em termos mercadológicos; a idéia de ‘nação integrada’ passa a reapresentar a interligação dos consumidores potenciais espalhados pelo território nacional. Nesse sentido se pode afirmar que o nacional se identifica ao mercado; à correspondência que se fazia anteriormente, cultura nacionalpopular, substitui-se uma outra, cultura mercado-consumo (Ortiz: 1988, p. 165).

Conforme o que os empresários queriam, os meios de comunicação de massa passam a ser capazes de relacionar cultura nacional de massa e cultura popular através da exploração dos mercados regionais com base nas características de cada região, integrando-os, mas de acordo com a demanda do mercado (Ortiz: 1988, p. 179). Abandona-se o tom político de resgate da tradição brasileira que vinha dando o

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mote para a constituição do Nacional-Popular em favor da construção de um mercado de consumo brasileiro. Renato Ortiz, compreendendo a transformação pela qual passa o NacionalPopular com o surgimento da Indústria Cultural, percebeu que o conceito não dava mais conta de explicar as trocas internacionais de bens culturais proporcionadas pela Indústria Cultural no mundo, uma das promotoras da unificação das consciências, da mundialização. Por isso, ele propõe um novo conceito para explicar esse fenômeno que se delineia, o Internacional-Popular. É importante salientar que, assim como o conceito de Nacional-Popular não exclui a existência das memórias coletivas, a proposição do Internacional-Popular não exclui o Nacional-Popular, complementa-o, na medida em que determinadas características do Nacional-Popular dos países são escolhidas e reinterpretadas pela Indústria Cultural.

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2.

INTERNACIONAL-POPULAR

Como já foi dito, o Internacional-Popular é um conceito proposto pelo antropólogo brasileiro Renato Ortiz, mais especificamente no final de seu livro “A Moderna Tradição Brasileira” (1988) e desenvolvido em um outro chamado “Mundialização e Cultura” (1994). O conceito deriva do Nacional-Popular quando analisado sob advento de uma sociedade global, que possui uma cultura mundializada, assim caracterizada devido ao consumo que também se globalizou, socializando padrões e valores a serem seguidos. Memória nacional e consumo se entrelaçam e com a mundialização do consumo, a memória nacional sofre uma transformação identitária (Ortiz: 1994). Diante da Indústria Cultural, o Popular, constituído de memórias coletivas sociais, transforma-se em memórias coletivas de consumo, ou seja, traduz-se pelas necessidades e desejos do consumidor. Assim sendo, o Nacional seria a reinterpretação de todas as diferentes necessidades e desejos do consumidor nacional. O Internacional-Popular, extrapolando o Nacional-Popular, reproduziria esse mesmo fenômeno só que em escala mundial. Com a proposição desse conceito, o autor admite que a memória nacional não pode ser reificada1, pois o período pelo qual estamos passando permite a formação de uma memória internacional. Partindo da premissa, já citada anteriormente, de que memória nacional é a reinterpretação das memórias coletivas segundo a conveniência de mediadores a serviço das classes dominantes nacionais, é possível concluir que a memória internacional é uma reinterpretação de memórias nacionais segundo o interesse de mediadores, que agora estão a serviço de interesses internacionais. Mais uma vez, justificando a escolha desse autor, percebe-se que a direção de seus estudos permite uma mudança de significados na análise da cultura no que diz respeito ao papel representado pela Indústria Cultural e, por conseqüência, pela Publicidade, objeto deste trabalho, em âmbito mundial.

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Reificação: o momento, dentro do processo de alienação, em que a característica de ser uma “coisa” se torna típica da realidade objetiva (Michaellis: 2002).

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2.1. CARACTERÍSTICAS DO INTERNACIONAL-POPULAR

A extrapolação da memória nacional-popular, ou seja, a formação de uma memória internacional-popular somente é possível devido às características inerentes a esse fenômeno. No agrupamento das memórias nacionais em âmbito mundial, elas só são aceitas pelos outros grupos constituintes da memória internacional-popular se as primeiras estiverem delimitadas dentro dos padrões de aceitação internacionais. Levando em consideração que o Internacional-Popular implica na formação de uma memória internacional de consumo, os bens culturais brasileiros, para serem aceitos mundialmente, devem ser mundializados. Dentre essas adequações aos padrões de aceitação internacional estão a desterritorialização, a citação, a mobilidade, a segmentação, a universalidade, a descentralização, a individualidade e o pluralismo. Através dessas características o Nacional-Popular pode ser mundializado. A desterritorialização da memória é conseqüência do objeto de consumo que perdeu suas raízes territoriais. Não se pode distinguir a sua nacionalidade e o seu uso não está vinculado a um determinado local, com suas características particulares. Em conseqüência disso, ele assume uma postura universalista, integrando as memórias de várias nações. A desterritorialização é uma conseqüência da mobilidade, que por sua vez é uma conseqüência da tecnologia. “A velocidade das técnicas unifica o espaço, fazendo com que os lugares se globalizem” (Ortiz: 1994, p. 106). Entretanto, a universalidade do objeto só é reconhecida, a partir da integração desse objeto à memória internacional, através da citação. Citação são referências verossimilhantes em relação a um objeto, previamente conhecido, devido à atuação da Indústria Cultural. Os meios de comunicação de massas, com a publicidade, a música, as histórias em quadrinhos, a TV, o Rádio, o Jornal, vêm condicionando os indivíduos ao consumo de objetos variados, iniciando o esvaziamento da sociedade nacional, fechada em si mesma, com suas particularidades para se construir uma sociedade internacional, reconhecida por todos, tendo como principal colaboradora a Publicidade, que capitaliza determinados signos e referência culturais mundialmente reconhecidas (Ortiz: 1994).

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A memória internacional apresenta ainda mais uma característica, a descentralização das decisões de consumo, uma vez que é possível escolher segundo uma quase infinita variedade de objetos existentes dentro de variados canais de distribuição, conseqüência do pluralismo das opções de consumo. Ao escolher, a individualidade impõe-se, pois se manifestam os desejos e necessidades dos indivíduos enquanto consumidores únicos. Assim como para a constituição da memória nacional foi preciso que os indivíduos com suas memórias coletivas esquecessem os conflitos existentes entre eles, também para a formação de uma memória internacional, é necessário o esquecimento dos conflitos existentes a nível mundial. A memória internacional nada mais é do que uma aprendizagem de padrões de comportamento que validam o esquecimento dos conflitos e contribuem para mundialização das memórias consubstanciadas nos objetos de consumo.

2.2. MEDIADORES DO INTERNACIONAL-POPULAR

Como já foi dito, no Internacional-Popular, os mediadores são universais e responsáveis pela reinterpretação do Nacional-Popular e integração universal das culturas, de acordo com os interesses dominantes. Dentre esses mediadores estão a Indústria Cultural com seus constituintes e as grandes corporações. Quando a Indústria Cultural assume o papel proeminente de mediação entre as memórias coletivas e a memória nacional, ela reinterpreta a integração das consciências nacionais em integração do mercado nacional, assumindo a função de socializar o consumo no Brasil. As corporações por sua vez, aproveitando-se das possibilidades de integração mercadológica proporcionadas pela Indústria Cultural e com os conhecimentos de mercado permitidos pelo Marketing, usam a Publicidade para ensinar e fomentar o consumo mundial.

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Diante do fenômeno da globalização, a Indústria Cultural, inserida na lógica capitalista de consumo, além de integrar o mercado nacional, vê diante de si a possibilidade de integrar o mercado internacional, através da exportação dos bens culturais, contribuindo para a formação de uma memória internacional-popular (Ortiz: 1994). Essa aliança de interesses globais proporcionou o aprofundamento da socialização dos objetos e bens culturais, possibilitando a transformação dos comportamentos e iniciando o processo de mundialização dos padrões.

2.3. A CONSTRUÇÃO DO INTERNACIONAL-POPULAR

A memória internacional é construída a partir de padrões de comportamentos mundializados. Entretanto, para que os comportamentos fossem difundidos, era necessário que a Indústria Cultural divulgasse esses referenciais estrangeiros, criando um circuito de trocas. “Esse circuito desterritorializado e unificante dos meios permitiu a constituição de uma comunicação mundial, que ultrapassa as diferenças locais ou nacionais” (Ortiz: 1994, p. 61). A divulgação dos referenciais estrangeiros proporcionou a adequação brasileira aos padrões internacionais. O que foi facilitado porque a própria “(...) formação da nação pode ser lida como um processo de desenraizamento. (...), liberando os indivíduos do peso das tradições regionais geograficamente enraizadas” (Ortiz: 1994, p. 45). Segundo Ortiz (1994, p. 50), a nação já “(...) é uma primeira afirmação da mundialidade. Ela carrega em seu bojo uma modernidade-mundo”. Portanto, a construção do Nacional-Popular, processo de escolhas das memórias coletivas a serem promovidas nacionalmente, já encontra dentro de si os requisitos para o Internacional-Popular, processo de escolhas das memórias nacionais a serem promovidas internacionalmente. Diante desse equacionamento, no qual a telenovela é um dos maiores exemplos, e da adequação ao gosto dominante dos meios de comunicações

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internacionais, o país tem a possibilidade de se transformar em exportador da produção cultural brasileira, sendo possível passar da “... defesa do nacional-popular para a exportação do ‘internacional-popular’” (Ortiz: 1988, p. 181), admitindo-se que o Ser nacional se realizou e que a cultura brasileira se mundializou. A mundialização da cultura, que consiste na construção e propagação de códigos reconhecíveis universalmente, é devida ao aprendizado anterior das referências para o consumo e produção cultural através das produções estrangeiras. Se com a formação nacional foram abandonadas as tradições regionais, com a mundialização, as tradições nacionais não mais serão a fonte privilegiada de legitimidade. Pode-se afirmar, então, que na cultura brasileira, o vínculo entre memória nacional e os objetos é rompido, promovendo a acomodação dos objetos dentro da memória internacional-popular (Ortiz: 1994). A telenovela, que era um bem cultural brasileiro, ao ser exportada, transforma-se num bem cultural internacional, exigindo que a sua produção também seja adequada aos padrões internacionais2, já citados anteriormente. O

reconhecimento

desses

objetos

desterritorializados

na

memória

internacional-popular é devido às citações em relação aos objetos originais, como já foi dito, mecanismo que promove a sensação de familiaridade com o que está sendo apresentado (Ortiz: 1994). Devido ao fato de os indivíduos já estarem acostumados com as referências proporcionadas pelos meios de comunicação de massa, eles já possuem uma série de informações sobre o objeto, mais ligados ao ato do consumo do que à sua nacionalidade, acondicionados em sua memória. As telenovelas brasileiras exportadas não guardam dentro de si a brasilidade, apenas citações em relação a ela, que suscitam uma imagem do país como objeto de consumo pelos cenários apresentados3.

2

Nos EUA, a abertura do Clone ganhou a voz de Shakira, cantora de grande identificação entre os hispânicos naquele país. O consultor de novelas da Rede Globo e doutorando no assunto pela USP, Mauro Alencar lembra de um caso similar ocorrido com “Lua Cheia de Amor” (1990): “No Brasil, a abertura exibia uma modelo imitando a Carmen Miranda, o que era muito nacionalista (grifo nosso). Nos países de língua hispânica, a abertura ganhou música de Julio Iglesias (cantor espanhol) e uma cena em que a Genuína, personagem da Marília Pêra, sonhava com o Francisco Cuoco” (Padiglione; Jimenez: 2002). 3 No caso de “Laços de Família”, que está sendo exibida na França, o Brasil apresentado é um país comum, simpático, urbano, ameno, atual, feminino e glamouroso (Neto: 2001).

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Quando as culturas encontram-se mundializadas, a globalização já é um fato que integra as mais diversas economias através da transformação das multinacionais em transnacionais, fragmentando a produção.

Dentro desta perspectiva, as necessidades básicas do homem seriam idênticas em todos os lugares, e sua vida cotidiana se nivelaria às exigências universais de consumo, prontamente preenchidas em suas particularidades (Ortiz: 1994, p. 139).

Isso demonstra que, mesmo com a padronização do consumo, o consumidor pode exigir produtos de acordo com as suas preferências devido às particularidades da região na qual se encontra, confirmando a não extinção do Nacional-Popular. O atendimento dessas particularidades exige a descentralização das decisões tanto em nível empresarial quanto em nível de consumo, revelando uma relação de forças centrípetas. Cada unidade de uma transnacional localizada em um determinado ponto do planeta tem autonomia para decidir o que é melhor para os rumos do negócio naquela região (Ortiz: 1994), conseqüência da mobilidade exigida pela modernidade. Já o consumidor estaria apto a fazer suas escolhas conforme as opções existentes e mais adequadas as suas necessidades, demonstrando sua individualidade diante da pluralidade das opções. Mesmo assim, não se abandona a padronização dos comportamentos porque essa individualidade se exprime em termos universais. O que se verifica é que existem categorias de diferenciação afins, que se configuram através de uma segmentação sem fronteiras, constituída por um grupo de habitantes do planeta com características comuns. “Esta tendência sugere que, doravante, as condutas se diferenciam em função de segmentos de consumo, e não mais segundo suas territorialidades” (Ortiz: 1994, p. 173). Por isso, é possível que uma organização como a Rede Globo descentralize sua produção de telenovelas, gravando em diferentes pontos do planeta e atingindo públicos, aparentemente, distintos4. Diante de tudo isso, verificamos que o Internacional-Popular reproduz um padrão de consumo mundial, através da escolha das memórias nacionais mais 4

Para dar apenas um exemplo, a novela “O Clone” teve cenas gravados no Brasil e em Marrocos.

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adequadas a serem promovidas universalmente. Como o Internacional-Popular não extermina a identidade nacional dos países, possibilitando que exigências da memória nacional desses povos suplante os padrões ditados pela memória internacional, existe uma exigência que objetos de consumo, como as telenovelas, sejam adaptados a alguns costumes locais5. Por isso, ao invés de serem dubladas, muitas telenovelas são refilmadas com atores e na língua dos países que a receberão6. Verifica-se o mesmo quando se fala em marketing e publicidade. Muitos produtos e muitas ferramentas da publicidade, para serem mais efetivos, precisam ser adaptados ao gosto local, o que será analisado mais adiante quando o estudo destinar-se ao Marketing e à Publicidade como agentes desse fenômeno.

5

A Rede Globo está exportando telenovelas desde 1973, quando vendeu o “Bem-Amado” para o Uruguai. Durante este tempo, a Rede Globo foi aprendendo o gosto peculiar de seus clientes e, hoje, quando a produção é exportada, ela sofre pequenos ajustes, cortes e inserções para garantir o sucesso do empreendimento. Em geral, as novelas que, aqui possuem 200 capítulos em média, quando exportadas tornam-se mais compactas e com capítulos de 25 a 50 minutos. Os assuntos que só são compreendidos no Brasil, desde que não sejam fundamentais para a compreensão da trama, são cortados na hora da exportação. Por exemplo: da lista de convidados do bar da Jura (Solange Couto) em “O Clone”, só Pelé e Ronaldinho Gaúcho, que são conhecidos no exterior, ficarão na versão internacional (Padiglione; Jimenez: 2002). 6 Para a pesquisadora sobre internacionalização da telenovela brasileira da USP, Maria Immacolatta Vassallo de Lopes, a iniciativa da Rede Globo em produzir uma telenovela específica para o mercado internacional, como “Vale Todo”, versão atual, com atores de língua hispânica, para a Telemundo (EUA), representa uma preocupação estratégica (Padiglione; Jimenez: 2002).

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3. A

PUBLICIDADE

E

O

MARKETING

COMO

AGENTES

DO

NACIONAL-POPULAR

Depois de discorrer sobre o Nacional-Popular e o Internacional-Popular na obra de Renato Ortiz, verificando a importância atribuída por ele à Publicidade e ao Marketing como agente tanto da construção do Nacional-Popular quanto do Internacional-Popular, inicia-se aqui o foco nestas áreas: a Publicidade, que tem como objetivo anunciar os produtos para os mercados consumidores e o Marketing, com o objetivo de planejar para maior obtenção de lucros. Na fase inicial da industrialização brasileira ocorrida durante a década de 20, a publicidade limitava-se a anúncios ilustrados por artistas plásticos com textos em forma de poesia feita pelos escritores da época. Esses anúncios eram usados para informar a chegada de produtos importados, algumas vendas de propriedades, leilões, etc, e circulavam preferencialmente nos jornais da época, pois já existiam cartazes, painéis pintados e panfletos (Marcondes: 2002). Em seguida, as revistas começaram a circular no Brasil, o que possibilitou anúncios mais informais dos que os que o jornal permitia. Com a Primeira Guerra Mundial, a publicidade brasileira desenvolveu-se devido à substituição das importações. O amadorismo inicial foi sendo abandonado e foram surgindo as primeiras agências brasileiras, sem a divisão de tarefas conhecidas hoje, mas já demonstrando os primeiros passos desse negócio. Essas primeiras agências cuidaram das contas das marcas estrangeiras que já eram vendidas no país, pois algumas multinacionais já tinham se instalado aqui, e desenvolviam-se em estreita relação com elas (Ortiz: 1988).

Entretanto, também as multinacionais

começaram a fazer publicidade, montando departamentos internos inteiramente dedicados à publicidade (Marcondes, 2002). Na década de 30, as primeiras agências estrangeiras começaram a chegar no Brasil para atender as contas das multinacionais que aqui se encontravam, mesmo com a crise de 29, que provocou uma fuga dos investimentos externos no país, não permitindo a industrialização de todos os setores da economia (Melo apud

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Rodrigues: 2002). Essa chegada fez com que muitas das contas entregues às agências nacionais, fossem repassadas para as estrangeiras. Durante este tempo, a publicidade produzida no país não apresentava elementos da cultura brasileira. As agências estrangeiras recém-chegadas e os departamentos de publicidade das empresas estrangeiras7, na maioria das vezes, apenas traduziam os anúncios de fora para o português. E, mesmo as brasileiras tinham como padrão de referência estética e comportamental os padrões de Nova Iorque, onde se encontra até hoje o centro publicitário dos Estados Unidos (Marcondes: 2002). Nessa época, a publicidade teve a sua disposição mais um meio de comunicação, o rádio, que logo se torna o veículo preferencial dos anunciantes que já se faziam presentes nos jornais e revistas da época. Pelo fato das agências estrangeiras já estarem presentes no país, mas encontrarem realidades mais evoluídas em suas matrizes, a técnica publicitária estava evoluída. As agências estavam apenas esperando pelo crescimento do mercado brasileiro para colocar as técnicas em prática. Por isso, quando o rádio surge, aparecem com ele os spots, os jingles, os patrocínios como as Novelas Gessy e o Repórter Esso, produzidas inteiramente pelos anunciantes devido à precariedade do meio (Marcondes: 2002). “Isso significava que os anunciantes e as agências de publicidade não era meros vendedores de produtos, mas também produtores de cultura” (Ortiz: 1988, p. 61). Também as revistas e os jornais proliferaram-se ainda mais, aumentando o número de suas tiragens e a diversificação de seus títulos, segundo as áreas de interesse do público (Ortiz: 1988), beneficiando ainda mais a Publicidade. Com a Segunda Guerra Mundial, os investimentos estrangeiros se multiplicaram sob o argumento de reconstrução do mundo após a guerra. Com isso, o Brasil do governo Kubitscheck assiste à multiplicação dos investimentos internacionais na economia e na produção de bens culturais. As multinacionais instalaram-se definitivamente no país, trazendo consigo as técnicas do fordismo, com princípios de centralização das decisões, que instituiu a linha de montagem e a produção em série com o objetivo de aumentar o lucro através da eficiência e padronização da produção (Ortiz: 1994, p. 160). Além disso, elas também trouxeram 7

Embora muitas empresas estrangeiras já pudesse ser classificadas como multinacionais, esse conceito foi desenvolvido mais recentemente.

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as recentes técnicas de marketing, que não poderiam ter outro foco senão o escoamento da produção (Churchill & Peter: 2000). É com essa multiplicação de investimentos que nasce a TV, seguida de outros investimentos como o início da edição brasileira da revista internacional “Seleções”, abrigando páginas de anúncio (Ortiz: 1988), convertendo-se em mais um instrumento para a publicidade. No início a televisão, um investimento ousado para a época, padecia em condições de precária tecnologia, uma vez que não existiam redes de teledifusão, que proporcionassem uma cadeia nacional e nem videotapes, que permitissem a prévia gravação dos programas. Além disso, o aparelho de TV era demasiadamente caro para a maioria da população brasileira e o custo da produção de programas locais era muito alto, sendo mais fácil comprá-los no exterior. Tudo isso contribuiu para a insipiência inicial do meio e fez com que os investimentos publicitários continuassem concentrados nos rádios e nos jornais. (Ortiz: 1988). Mesmo assim, alguns anunciantes patrocinaram esse investimento, anunciando durante anos inteiros (Marcondes: 2002), interessados no seu desenvolvimento para difundir suas marcas. A falta de profissionais especializados para lidarem com a tecnologia disponível era marcante o que deu um caráter laboratorial ao meio, os profissionais tinham que aprender experimentando. Nessa época de improvisos, a publicidade utilizou-se muito da figura da garota propaganda na TV. (Marcondes: 2002). E, assim como no Rádio, as empresas que anunciavam na TV precisavam produzir todo os materiais necessários para que a programação patrocinada fosse ao ar. Existia uma inversão de papéis, as agências de publicidade, que deveriam ser as agenciadoras, produziam programas enquanto os meios apenas vendiam o espaço (Ortiz: 1988, p. 60). Somente no final dos anos 50, é que o videotape foi incorporado às atividades da TV. Com a possibilidade de gravar previamente os programas, foi possível planejar a programação e introduzir algumas mudanças na estrutura da TV. Nos anos 60 e 70, o fordismo expandiu-se no Brasil, exigindo maior profissionalização e especialização dos setores da economia (Ortiz: 1994).

O

Regime Militar, como já foi dito anteriormente, aprofundando ainda mais a internacionalização iniciada pelo governo Kubitscheck, foi um dos grandes

28

responsáveis pela consolidação da Indústria Cultural, investindo em tecnologias que proporcionaram a formação de redes nacionais para a transmissão das programações televisivas. Além de ter desencadeado uma pesada industrialização no país (Ortiz: 1888). Em vista disso, o governo constitui-se no maior anunciante do país, contribuindo com o progresso da Indústria Cultural e da Publicidade no Brasil. Segundo Marcondes (2002, p. 41), “o ufanismo nacionalista, a ideologia progressista, a busca pela criação de um sentimento pátrio profundo são temas e conceitos aos quais a propaganda vai aderir”. Tudo isso, aliado ao fato de a TV padronizar sua programação e introduzir os espaços comerciais, permitiu à publicidade e ao marketing fomentar o consumo, utilizando da integração nacional, vista em termos mercadológicos, proporcionada por ela e consagrando-a em preferência nacional pelos anunciantes. Isso fez com que os jornais, as revistas e as rádios começassem a rever suas políticas empresariais, buscando novas maneiras de atrair o anunciante. O rádio utilizou a formação de redes também, através da associação entre diversas rádios de diversos locais do país, oferecendo uma programação padronizada e a possibilidade de comerciais regionais ou nacionais. Os jornais instituíram o deadline e os manuais de redação, com o propósito de padronizar os textos e agilizar a impressão. As revistas continuaram seguindo o caminho da segmentação e algumas circularam em âmbito nacional também (Ortiz: 1988). Como não podia ser diferente, o marketing voltou-se para as vendas (Churchill & Peter: 2000) e, com os institutos de pesquisa que, cada vez mais eram acionados para pesquisas de sondagem, de mídia, de audiência, de recall e pré-testes (Mattelart: 1990), ele precisou alinhar-se ao mercado, estudando os desejos e preferências do consumidor (Churchill & Peter: 2000). A publicidade, que já tinha sido incorporada como uma de suas ferramentas, obteve um grande desenvolvimento, tanto relacionado com as multinacionais que tinham capital para anunciar, quanto com os meios que se encontravam em condições de desencadear a propagação dos produtos. Nessa época, existiu uma intensa discussão entre os publicitários sobre a publicidade brasileira, incorporando a preocupação com a identidade cultural do país

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que vinha sendo discutida em diversas instâncias da sociedade. Então, foram criados o Clube de Criação e algumas premiações para incentivar anúncios autenticamente brasileiros, que não imitavam os estrangeiros, que chegavam ao país pelas agências estrangeiras. Isso conferiu um aumento na qualidade dos anúncios do país. As agências nacionais competiram de igual para igual com as agências internacionais, promovendo a nacionalização da publicidade, fazendo o Brasil despontar como sétimo mercado mundial em faturamento em publicidade (Marcondes: 2002). Nos anos 80, o fordismo começou a dar sinais de desgaste e uma crise instalouse no país. Os capitais de investimento estrangeiros deixaram o Brasil, refreando o desenvolvimento que vinha verificando-se (Rodrigues: 2000). A Publicidade precisou adaptar-se a esses tempos e por isso, buscou eficiência mercadológica, concentrando-se na Criação, Atendimento, Pesquisa e Mídia (Mattelart: 1990), demonstrando alguma sintonia com o fenômeno da globalização que já se encontrava adiantado nas economias centrais. Quando, nos anos 90, o Brasil entra na era da globalização, controlando a economia e reativando o consumo, as agências de publicidade são afetadas pelo fenômeno das fusões e associações desencadeadas pelo acirramento da competição proporcionado pela globalização, que deu origem às transnacionais. Devido ao fato do capitalismo brasileiro ser periférico e de economia inferior às hegemonias, muitas agências brasileiras não puderem fazer frente a essa situação e acabaram sendo vendidas ou tendo que ceder o controle acionário para grupos estrangeiros, outras se associarem entre si para poder competir igualmente com as estrangeiras (Mattelart: 1990). Isso transformou o mercado de agências no Brasil que, até então, vinha experimentando o crescimento das agências brasileiras (Marcondes: 2002). Diante desses dados, percebe-se que a insipiência inicial dos meios de comunicação no Brasil proporcionou a reprodução dos padrões culturais estrangeiros, que foi um dos responsáveis pelo aprendizado da técnica de produção de bens culturais. Entretanto, mesmo assim, a Indústria Cultural, destacando-se a publicidade, posicionou-se contra essa simples adaptação de bens culturais estrangeiros ao idioma local e passou a buscar a identidade cultural, o modo de produção de bens culturais brasileiros, que efetivamente integraria o mercado

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nacional. Na medida em que os avanços tecnológicos e o aprendizado das técnicas evoluíram, essa identidade pode realizar-se plenamente através da produção de bens culturais próprios. É assim que a telenovela, extraída das soap operas americanas são adaptadas ao gosto local, com temáticas que elegem determinados tipos de manifestações populares da memória coletiva para constituição da memória nacional. Ao transformar-se num dos principais bens culturais do Brasil (Ortiz: 1988), a telenovela será o carro chefe das programações televisivas, unindo diversos públicos em torno dela, o que oferece uma grande possibilidade de difusão publicitária durante os intervalos comerciais. A Publicidade, por sua vez, também elege a música popular, as personalidades, as paisagens brasileiras para integrar os repertórios de seus anúncios, bem como as manifestações locais de determinados grupos sociais para difundir, apelando para a brasilidade desses objetos. É assim que o Guaraná Antarctica vai defender-se da Coca-Cola, usando da defesa do Nacional-Popular, quando afirmar em seus slogans a origem brasileira.

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4. A

PUBLICIDADE

E

O

MARKETING

COMO

AGENTES

DO

INTERNACIONAL-POPULAR

Já na década de 20, a Publicidade tornava conhecida do mundo marcas como Pond’s, Kraft, Kodak, Lux e, principalmente, as marcas dos automóveis cujas empresas já possuíam uma estratégia internacional. Quando a globalização torna-se um fato, os mercados unificam-se, abolindo praticamente suas fronteiras. Isso desencadeia uma série de acontecimentos que promove o consumo em escala mundial em patamares nunca vistos. As multinacionais precisavam adaptar-se a esses novos tempos e por isso, associaram-se ou fundiram-se, dando origem às transnacionais (Ortiz: 1994) e, conseqüentemente, perdendo o caráter nacional que tinham. Essas fusões permitiram que as características do Internacional-Popular, desterritorialização,

citação,

mobilidade,

segmentação,

universalidade,

descentralização, individualidade e pluralismo -, já citadas anteriormente, fossem forjadas dentro da lógica de operação das transnacionais. A produção fragmentou-se, decomposta em vários locais diferentes, permitindo a formação de uma rede de negócios flexível que se estendeu pelo mundo. Essa intensa ramificação proporcionou uma considerável dilatação da distribuição dos bens de consumo, aliada à evolução progressiva dos meios de comunicação e transporte. E, com a Indústria Cultural consolidada pelo mundo, foi fácil difundir, em termos mundiais, uma gama variada de bens culturais. Essa ramificação, distribuindo produtos num mercado único e global, é realizável devido ao caráter universal dos produtos. É possível perceber isso quando se observam produtos como cartões de crédito, refrigerantes, automóveis, que são aceitos em muitos países. Existe uma demanda por esses objetos de consumo em vários locais do planeta, nos quais a memória internacional está em formação avançada, possibilitando o seu reconhecimento (Ortiz: 1994). A fragmentação da produção exige uma crescente descentralização das decisões, flexibilizando as relações (Ortiz: 1994, p. 155). É preciso que os executivos

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de cada local, no qual uma transnacional atue, tenham autonomia para decidir o que é melhor para a empresa dentro da realidade daquela região, com o propósito de tirar maior proveito da mesma, tornando plural o poder, que não encontra mais na matriz o centro único das decisões. A universalidade adquirida pelos produtos com a fragmentação requer um apelo universal de consumo por parte da publicidade, o que exigiu uma nova postura das agências. Percebendo o momento vivido pela economia e os novos desafios enfrentados pelos seus clientes, elas buscaram estender seus braços pelo mundo, seguindo o mesmo movimento das grandes corporações, através de fusões e associações (Mattelart: 1990). Por isso, os publicitários estão sempre se esforçando para captar o presente, transformando-o em apelo para o consumo generalizado de produtos desterritorializados, contribuindo para a mundialização (Ortiz: 1994, p. 151). Na tentativa de melhor conhecer o consumidor, as corporações utilizam um novo enfoque de marketing focado no valor (Churchill & Peter: 2000), que busca satisfazer as necessidades e desejos do consumidor, agregando o maior valor possível aos produtos. Esse novo enfoque desenvolveu-se devido à evolução tecnológica, que tornou possível a descoberta de uma imensa variedade de gostos e preferências dos consumidores através de pesquisas sofisticadas8. Essas descobertas deram suporte à exploração desse mercado único e mundial através do agrupamento de gostos e preferências afins. Então, segmentou-se o mercado, segundo os padrões de comportamento dos consumidores dos mais diferentes locais, originando uma padronização de segmentos em níveis universais (Mattelart: 1990). Se não fosse assim, as premissas para uma administração global estariam falidas. Por isso, a segmentação do mercado consumidor, descrito nas técnicas de marketing, utilizadas pelas corporações, abandonam a classificação por localização regional, passando a classificá-los de acordo com perfis de

8

No Brasil, o Instituto de Pesquisa IBOPE realiza em parceria com a americana Kantar Media Research, uma pesquisa detalhada do consumidor que extrapola os simples dados sociodemográficos, utilizando perfis de comportamento, gostos e preferências, opiniões, consumo de mídia, entre outros, para analisar o comportamento do consumidor brasileiro, chamada Target Group Index. Essa ferramenta de marketing foi desenvolvida pela inglesa BMRB (IBOPE: 2002).

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comportamento. A nacionalidade já não importa, o que conta é o caráter psicossocial de cada segmento (Ortiz: 1994). Em conseqüência disso, as corporações descobrem que não podem mais trabalhar o marketing voltado para as massas, mas que precisam trabalhar um micro marketing, buscando atingir cada consumidor como se fosse único. Por isso, desenvolvem ferramentas alternativas às da Indústria Cultural, afetando, inclusive, os investimentos em TV (Mattelart: 1990). Esse tratamento individualizado, aliado aos benefícios da fragmentação da produção, estimula a customização 9 de acordo com as preferências detectadas nas pesquisas e permitidas pelas estratégias de administração da empresa, elevando as exigências do consumidor em termos de pluralidade de opções, descentralizando ainda mais o poder das decisões. Diante disso, a competição atinge níveis muito altos, exigindo que as transnacionais unam-se, formando oligopólios, para resistir, pois os custos da administração dos produtos também estão elevando-se. Para tornarem-se mais competitivas, elas buscam unir-se a outras que possibilitem agregar maior valor aos produtos, englobando diversas etapas que envolvem desde a concepção até o lançamento do produto (Ortiz: 1994). Na Publicidade, percebe-se esse mesmo fenômeno ao observar as associações ou fusões cuja composição incluem agências de publicidade, meios de comunicação e institutos de informações eletrônicas (Mattelart: 1990). Toda essa análise mercadológica sobre a incidência da globalização, permite a observação das características do Internacional-Popular, explicitadas anteriormente. Segundo Ortiz, a desterritorialização proporcionada pela expansão dessa rede de trocas

(...) está na base da formação de uma cultura internacional-popular cujo fulcro é o mercado consumidor. Projetando-se para além das fronteiras nacionais, este tipo de cultura caracteriza uma sociedade global de consumo, modo dominante da modernidade-mundo (Ortiz: 1994, p. 110).

9

Quando uma empresa descobre através das pesquisas as necessidades e desejos específicos de seus clientes, ela pode agrupá-los em segmentos e realizar mudanças no produto ou serviço ofertado, para satisfazer essas necessidades e desejos detectadas (Kotler: 1999).

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Renato Ortiz (1994, p. 165) afirma ainda que a publicidade “cumpre um papel de destaque na constituição e na preservação deste universo, ela se revela como instância de reprodução da ordem social”, quando difunde os padrões universais. E reforça, dizendo que quando as agências transformam-se em transnacionais, instâncias mundiais de cultura, elas tornam-se responsáveis pela definição de padrões de legitimidade social. No caso do Brasil, a publicidade ao defender a identidade brasileira em seus anúncios, depois de ter aprendido as técnicas e padrões estrangeiros, assume a possibilidade de ser exportadora da cultura brasileira. É assim que músicas como “Essa moça ‘tá diferente” do cantor brasileiro Chico Buarque, integraram a trilha de alguns comerciais, difundindo a música popular brasileira pelo mundo (Mattelart: 1990). Outro exemplo significativo é o alcance que um produto da terra como a cachaça tem alcançado nos mais diversos locais do mundo, no qual ela possui um status mais elevado, diferente do que ela tem no próprio Brasil. Isso é devido ao fato de, ao ser exportada, ela carregar consigo todo um conceito de brasilidade a ser vendido, que faz parte de muitos bens culturais exportados pelo país. Trata-se de uma referência a tudo o que a memória internacional aprendeu sobre o Brasil, agregando mais uma informação a esse aprendizado ao afirmar que tal produto também é brasileiro. Como afirma Ortiz, a memória internacional-popular

(...) traduz o imaginário das sociedades globalizadas. Embora as memórias sejam muitas vezes produzidas por determinadas companhias, através da difusão de seus produtos, elas ultrapassam a intenção inicial do simples ato promocional (Ortiz: 1994, p. 144).

Elas mundializam consigo todas as referências conhecidas das culturas das quais elas advêm.

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Para melhor compreender um fenômeno tão difícil de ser captado devido à dificuldade de distanciamento que sua atualidade provoca, será estudado o caso ilustrativo da marca Guaraná Antarctica, pertencente à transnacional Ambev, um dos exemplos da mundialização da cultura brasileira consubstanciada no consumo.

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5. GUARANÁ ANTARCTICA, ORIGINAL DO BRASIL: ESTUDO DE CASO

5.1. AMBEV: PRESENÇA BRASILEIRA NO MUNDO GLOBALIZADO

A American Beverage Company (Ambev) ou Companhia de Bebidas das Américas surgiu da fusão entre a Cervejaria Brahma e Cervejaria Antarctica em 1999. Com a abertura da economia brasileira, diante do fenômeno da globalização, muitas empresas endividaram-se devido à alta do dólar e às dificuldades em competir com as empresas estrangeiras que chegavam, sendo diretamente afetadas pelas fusões que caracterizam esse período de globalização. Uma dessas empresas foi a Cervejaria Antarctica que, cheia de dívidas, foi comprada pela Cervejaria Brahma, que também é dona da marca de cerveja Skol. Com a fusão, a Ambev tornou-se a terceira maior cervejaria do mundo e detentora de 74% do mercado brasileiro de cervejas (Galvão:1999). O Guaraná Antarctica já era o refrigerante líder no segmento de guaranás no Brasil, estando entre os 15 refrigerantes mais vendidos do planeta, sendo o sabor guaraná, o 4º mais consumido no mundo (Ambev: 2001). Com a fusão, a marca ganhou a possibilidade de ser exportada para outros países. No mesmo ano, a Ambev anunciou um acordo com a empresa americana Pepsi Co para a produção e distribuição do Guaraná Antarctica no mundo. Utilizando-se da rede de produção e distribuição que a empresa americana possui e do seu interesse em desbancar a concorrente, outra empresa americana, a Coca-Cola Company, a Ambev pretende posicionar o Guaraná Antarctica entre os 10 refrigerantes mais vendidos do planeta (Ambev: 2001). Até 2000, quando a fusão foi definitivamente aprovada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), órgão que regula os processos de fusões e aquisições no Brasil, proporcionando a “concorrência saudável”, a Ambev

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sofreu inúmeros ataques da Cervejaria Kaiser, que ao sentir-se prejudicada, posicionou-se contra o processo de fusão. Antes do acordo com a Pepsi Co, em 1999, a Ambev já possuía um outro acordo, de 1980, com um grupo japonês do ramo de alimentos e bebidas, supermercados, imobiliário, financeiro, agropecuário, automotivo e de comunicação, Arai Shoji, responsabilizado, por esta razão, pela produção e distribuição do Guaraná Antarctica no Japão quando do lançamento deste em 2002 (Ambev: 2002). Os

acordos

feitos

pela

Ambev

com

outras

empresas

estrangeiras

proporcionaram a formação de uma rede de negócios em torno da empresa, qualificando-a como uma transnacional. Esses acordos do grupo brasileiro funcionam como franquias, nas quais a Pepsi Co torna-se responsável pela produção e distribuição do produto no exterior e a Arai Shoji torna-se responsável pela produção e distribuição do produto no Japão. As duas pagam uma porcentagem sobre as vendas do Guaraná Antarctica para a Ambev. A Pepsi Co, por sua vez, também tem acordos do mesmo gênero com algumas empresas para beneficiar os seus refrigerantes. Quando a Ambev fez o acordo com a Pepsi Co, pode utilizar-se da rede de acordos que a Pepsi já tinha. É o caso do acordo entre Pepsi Co e o grupo português do ramo de bebidas, Sumolis, que, agora, além de responsável pela Pepsi, é responsável pelo Guaraná Antarctica em Portugal (Ambev: 2001). Percebe-se a formação de uma rede quase infinita de influências desterritorializadas que marcam a extensão dos braços da Ambev pelo mundo, num jogo de poder descentralizado, no qual não se pode definir quem é superior a quem. Segundo o jornal espanhol El-Mundo,

La Ambev nace preparada para el mundo globalizado. Consolidada em Brasil, y rubricada su alianza mundial con PepsiCo, el primer objetivo será la suramericana. La empresa posee el 12% de los mercados de Argentina y Venezuela, en donde tiene fábricas propias, y en el resto del subcontinente comezó uma agresiva estrategia de compra de empresas menores y asociaciones com productores locales (Goitia: 2000)10 10

A Ambev nasce preparada para o mundo globalizado. Consolidada no Brasil e com o acordo firmado com a Pepsi, seu primeiro objetivo será a América do Sul. A empresa possui 12% do mercado

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Em contrapartida da responsabilidade da Pepsi Co em produzir e distribuir o Guaraná Antarctica no mundo, a Ambev ficou responsabilizada pela produção e distribuição dos produtos da Pepsi no Brasil. Como exemplo, cita-se o lançamento do refrigerante Pepsi Twist no país, do qual a Ambev fica responsabilizada pela produção e distribuição do produto, inclusive oferecendo uma campanha de publicidade que teve grande impacto junto ao público-alvo. A Ambev espera que a Pepsi faça o mesmo quando do lançamento do guaraná nos EUA, que ainda está em fase de pesquisa (Franco: 2000).

5.2. A DISPUTA PELO USO DO NACIONAL-POPULAR

Na era globalizada, as empresas buscam expandir seu mercado de atuação, mas não podem arcar com os custos de infra-estrutura em diversos pontos do planeta ao mesmo tempo, por isso fazem acordos ou compram empresas para se tornarem mais competitivas. Com a Ambev não foi diferente. Entretanto, com o nascimento dessa grande empresa, os concorrentes ficam mais atentos aos seus movimentos. É o que acontece com a Coca-Cola Company, reconhecendo o potencial do Guaraná Antarctica frente à Coca-Cola. De acordo com dados do mercado, a Coca-Cola Company seria a verdadeira dona da Cervejaria Kaiser no Brasil, (O Estado de São Paulo: 2000), entretanto manteria sigilo sobre isso devido à filosofia da companhia de não trabalhar com alcoólicos. Enxergando uma possível investida do Guaraná Antarctica no mercado mundial, no qual os refrigerantes da categoria cola estão em declínio, a Coca-Cola, usando a Kaiser, tentou impedir o processo de fusão, iniciando uma grande discussão sobre monopólio na sociedade brasileira.

da Argentina e Venezuela, nas quais têm fábricas próprias. No resto do subcontinente, começou um agressiva estratégia de compra de empresas menores e associações com empresas dos locais onde pretende atuar.

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Essa discussão alcançou a TV, através da Publicidade. A Kaiser produziu comerciais, alertando os consumidores sobre a concentração de mercado nas mãos de uma única empresa, a Ambev, e das conseqüências desse excesso de poder sobre os preços dos produtos. A Ambev, por sua vez, contra atacou alertando para os interesses ocultos da Coca-Cola Company que estava por trás da Cervejaria Kaiser. O propósito da Coca-Cola seria destruir uma companhia brasileira que possui um produto de grande potencial competitivo e que apresenta ameaças ao seu refrigerante. O jornal brasileiro O Estado de São Paulo ilustrou bem o caso dizendo:

Acusado pelo presidente da Kaiser, Humberti Pandolpho, de se valer do recente sentimento nacionalista (grifo nosso) que tomou conta da política brasileira, Marcel Telles, da Brahma, disse que é a favor da globalização, mas de mão dupla. Ele lembrou que o Brasil precisa ter uma chance de também atuar no mercado global, com um grande grupo como a Ambev, que será a quinta maior empresa de bebidas do mundo e a terceira maior cervejaria (Pinheiro: 2000).

Em outra matéria, o jornal publica:

“Esta luta não é a luta de duas grandes cervejarias contra uma cervejaria aparentemente pequena, como eles tentam apresentar”, explica Rodrigues (presidente da Ambev) na mensagem publicitária que está sendo transmitida pela TV. “É a luta de duas empresas brasileiras contra um gigante chamado Coca-Cola”, argumenta o executivo (O Estado de São Paulo: 2000)

Quando se analisa esses acontecimentos à luz dos conceitos trabalhados por Renato Ortiz, compreende-se que o momento vivido deve-se ao fenômeno da globalização e da mundialização. Quando os processos administrativos das companhias ganham a TV, em busca do aval da população integrada pelo apelo ao nacionalismo, que imediatamente recoloca a questão da identidade nacional frente às potências hegemônicas, defende-se o Nacional-Popular. Essa defesa torna-se

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praticamente infalível num país como o Brasil, que tem a necessidade de se afirmar, tanto é que o próprio presidente da Kaiser acusa o do Brahma de estar se valendo desse artifício no trecho acima. Conjuntamente com isso, já era sinalizado que esse bem de consumo seria exportado para vários países, usando a identidade brasileira como argumento de consumo, o que se verificou quando a Pepsi Co inseriu o Guaraná Antarctica no mercado mundial. Após a aprovação da fusão das duas empresas em 2000, percebendo que sua estratégia falhou, a Coca-Cola Company lança o seu próprio guaraná, o Guaraná Kuat (Franco: 2000), utilizando-se, do mesmo argumento de brasilidade, mas incorporando-o na fruta guaraná original da Amazônia, que compõe o Guaraná Kuat, já que não pode argumentar que todo o produto é genuinamente brasileiro por ser a fabricante norte-americana. A partir daqui, a disputa entre as duas empresas personifica-se na luta dos dois guaranás. Mesmo com o Guaraná Kuat pertencendo a uma empresa americana, seu argumento também é a origem brasileira (devido ao componente guaraná originário da Amazônia brasileira), o que manifesta a defesa do Nacional-Popular, através da promoção de mais um representante da esfera popular da cultura. E quando esse refrigerante começa a ser exportado pela Coca-Cola Company, promove-se esse bem a constituinte do Internacional-Popular, buscando firmá-lo no mercado mundial. De toda essa disputa, conclui-se que não se tratava apenas da simples defesa da identidade brasileira pela Ambev frente à americana Coca-Cola, mas sim, de uma disputa pelo uso de elementos da identidade brasileira como aliados na promoção dos produtos dessas corporações para que apenas um desses produtos representasse o Nacional-Popular brasileiro no contexto da memória internacional. Tratava-se da disputa por um instrumento que tem a capacidade de fortalecer esses produtos dentro do que Ortiz nomeia de Internacional-Popular. Portanto, o Nacional-Popular ora funde-se, ora confunde-se ao InternacionalPopular, formando o que poderia ser chamado no limite de “Nacional-InternacionalPopular”, capaz de ser usado na promoção do guaraná dentro e fora do país, de acordo com as circunstâncias. Fato comprovado quando tanto a Coca-Cola, uma

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multinacional, quanto o Guaraná Antarctica, uma empresa nacional, utilizam-se da identidade brasileira para promover seus guaranás no mercado mundial.

5.3. GUARANÁ

ANTARCTICA:

AGENTE

DO

NACIONAL-

INTERNACIONAL-POPULAR

Depois do anúncio da fusão da Brahma e da Antarctica, foram dados os primeiros passos para a internacionalização do Guaraná Antarctica (vide figura 1). O primeiro lançamento no exterior ocorreu em 2001, em Portugal. A justificativa da escolha dada pela Ambev foi a forte influência da cultura do Brasil em Portugal, estando o Brasil constantemente em moda nesse país, além dos interesses estratégicos do Grupo Sumolis e da Pepsi Co.

Ilustração 1 – Guaraná Antarctica

A campanha de lançamento contou com um filme que tinha a modelo e jogadora de futebol brasileira Fernanda Chuquer como protagonista. O filme mostrava uma partida de futebol feminino numa praia, no qual Fernanda é uma das

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jogadoras. Quando Fernanda faz um gol, levanta a camiseta como os jogadores de futebol masculino costumam fazer, só que ela está nua. Ao final do filme questionava-se “Será do Guaraná?” (Ambev: 2001). Ao mesmo tempo em que esse filme era apresentado na mídia portuguesa, o teaser “Por que será?” era estampado na camiseta do jogador de futebol brasileiro, que joga em Portugal, Jardel, sob a forma de patrocínio (vide figura 2). Cada vez que ele fazia um gol, levantava sua camiseta, na qual estava escrito “Por que será?” para que todos vissem. Por fim, após um tempo, numa outra fase da campanha, a pergunta foi respondida. Quando ele fez um novo gol, levantando a camiseta, estava escrito “Será do Guaraná?” (Semanal Expresso: 2001). Resposta que sugere o por quê do brasileiro ser animado e feliz como é.

Ilustração 2 –Jogador Jardel com camiseta teaser

Essas ações geraram inúmeros comentários nos vários meios de comunicação do país, principalmente quando o mistério foi desfeito e Jardel mostrou a camiseta, na qual estava escrito “Será do Guaraná?” (Distribuidor Online: 2002). A campanha do Guaraná Antarctica seguirá, usando estereótipos como o carnaval, o samba, o futebol e os biquínis (Eurosul- Notícias da União Européia para América Latina e Mercosul: 2001). A criação foi responsabilidade da BBDO, da associada de Portugal,

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que atende a conta da Pepsi International e, portanto, com o acordo, passa a atender a conta do Guaraná Antarctica também. Depois de ter sido lançado em Portugal, no início de 2001, o produto também foi lançado em Porto Rico, terceiro mercado em consumo de refrigerantes do mundo. O lançamento nesse país também seguiu o mesmo desenho que já se tinha verificado em Portugal. Além da campanha “Será do Guaraná?” (Aberje – Revista de Comunicação Empresarial: 2002), foram oferecidas diversas festas brasileiras, nas quais mostrava-se a capoeira, uma luta considerada original do Brasil, além de ações em sites voltados para os jovens (Guaraná.com: 2002). Depois de Portugal e Porto Rico, foi a vez da Espanha receber o Guaraná Antarctica. Novamente, a campanha de lançamento do produto continuou com o mesmo “Será do Guaraná?”. E, além disso, nesse país, o Guaraná Antarctica apoiou o jogo que a Seleção Brasileira fez contra a Seleção da Catalunha (Ambev: 2002), mais uma vez usando o futebol como argumento de consumo. A escolha de Portugal como primeiro país para o lançamento internacional, devido à admiração dos portugueses pelo Brasil, mostra o quanto o Nacional-Popular brasileiro é promovido a partir desse país, integrando a memória internacional. O Guaraná Antarctica está sendo apreendido como mais um representante da cultura brasileira quando auto denomina-se mais uma das características do brasileiro. Mais uma vez, percebe-se a promoção dos estereótipos característicos dos brasileiros, constituinte do conceito gramsciano de Nacional-Popular, como integrante da memória internacional sob o signo da brasilidade. Quando se percebe a imensa curiosidade gerada pela campanha em Portugal, compreende-se como a Indústria Cultural é mobilizada para promover os bens de consumo brasileiros junto aos portugueses, comprovando seu papel de mediadora da memória internacional popular. Além disso, o fato da escolha de Portugal também girar em torno de questões estratégicas para a Sumolis e a Pepsi comprova a tese da descentralização do poder de decisão dentro das transnacionais. Dessa vez, a união desses dois grupos foi decisiva para a tomada de decisão, entretanto, numa próxima vez, a decisão estratégica pode sair de uma outra união, tal como Guaraná Antarctica e Arai Shoji.

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Segundo Carla Coelho, gerente de comunicação corporativa da Ambev,

Surpreendentemente, o produto está sendo muito bem aceito. Não partimos do Brasil com uma fórmula de comunicação pronta. Entendemos as necessidades dos países. (...) Em Portugal é "será do Guaraná?". A campanha questiona: será do Guaraná a ginga do brasileiro, alegria do Brasil, a expertise no futebol e no samba? E em Porto Rico é a mesma coisa. E mesmo as latas do refrigerante, às vezes, sofrem pequenas alterações. Em Portugal, o Guaraná Antarctica está desde julho do ano passado e superou nossas expectativas de distribuí-lo em 10 mil pontos-de-vendas até dezembro. Em setembro, ele já estava presente em 12 mil estabelecimentos (Aberje – Revista de Comunicação Empresarial: 2002).

Diante disso, percebe-se o cuidado com a adaptação da comunicação de marketing exigida frente às diferenças características de cada país de lançamento, demonstrando o respeito pela identidade nacional de cada um. Isso é uma conseqüência da individualidade dos consumidores que, mesmo assim, podem ser agrupados em grandes segmentos de consumo no mercado mundial cujas explicações foram feitas anteriormente. Somado à promoção da identidade cultural brasileira, através de um estereótipo como o futebol aliado à marca do Guaraná Antarctica, comprova-se o sucesso nas vendas do produto e a conseqüente aceitação desse novo constituinte da memória internacional. Mesmo com a individualidade dos consumidores que exigiu pequenas adaptações na embalagem do produto, é possível perceber a existência de uma mesma campanha de lançamento para o Guaraná Antarctica em diversos países o que comprova a atuação da marca em um mercado global e único, caracterizado por um segmento de público, que aceita o produto refrigerante como sendo de consumo universal, atendendo às necessidades e desejos universais. O desenho da campanha para a Europa deverá seguir os mesmos rumos que até agora tem seguido, contribuindo para a mundialização desses aspectos da cultura brasileira. A publicidade, através de uma transnacional, cumpre seu papel de interpretadora das

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identidades dos países, promovendo as memórias escolhidas para integrar a memória internacional-popular. O Guaraná Antarctica foi lançado em 2002 no Japão devido à oportunidade gerada pela projeção da Seleção Brasileira de Futebol alcançada no mundo e, principalmente, no Japão. Esse lançamento merece um item à parte e será melhor compreendido a seguir.

5.4. COPA DO MUNDO: COCA-COLA X GUARANÁ NA DISPUTA PELO NACIONAL-INTERNACIONAL POPULAR

Em 2001, a Ambev tornou-se a patrocinadora oficial da Seleção Brasileira de Futebol, ao oferecer um contrato de R$ 10 milhões por ano para a Comissão Brasileira de Futebol (CBF), provocando o rompimento do contrato dela com a Coca-Cola (vide figura 3). A Revista Meio&Mensagem diz que:

O interessante nesse importante lance do marketing esportivo brasileiro é que o momento para tal tacada não poderia ser mais inadequado: o futebol vem sendo massacrado diariamente com denúncias envolvendo clubes e dirigentes; as CPIs da Câmara e do Senado assustam os investidores; as desavenças entre clubes; federações e patrocinadores também inquietam o mundo esportivo (Friedemann: 2001, p.51).

Entretanto, como já foi dito, Renato Ortiz (1988) mostra que a construção da memória nacional faz-se através do esquecimento das desavenças e conflitos entre os grupos coletivos. Mesmo com os brasileiros, momentaneamente, desacreditando no futebol nacional e à par da corrupção dos dirigentes de clubes e da CBF, portanto, contrários ao modelo atual do futebol no Brasil, o que se verificou, quando a Ambev começa sua campanha de promoção do futebol brasileiro dentro do país e pelo

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mundo (associando-o ao Guaraná Antarctica), foi a retomada do orgulho pelo futebol. Essa promoção do orgulho nacional em conjunto com as primeiras vitórias da desacreditada Seleção Brasileira evoca glórias passadas desse esporte nacional, provocando o surgimento de um nacionalismo futebolístico. Ao ter o Guaraná Antarctica associado a esse elemento da cultura popular brasileira, a Ambev alavanca as vendas do produto que personificou a cultura brasileira.

Ilustração 3– Camiseta da Seleção Brasileira com patrocínio do Guaraná Antarctica

A DM9DDB criou um filme para comemorar a estréia do acordo do Guaraná Antarctica com a CBF, falando das cores da bandeira, no qual mostrava o amarelo da camisa da seleção, o azul do calção e completava dizendo que só faltava o verde do Guaraná Antarctica. Esse filme trabalhou com a bandeira nacional, um dos símbolos da identidade brasileira, fazendo um paralelo desta com as cores do uniforme da Seleção Brasileira de Futebol, outro símbolo da identidade do país, com o guaraná completando essas cores. Esse paralelo promove a integração do Brasil, mas agora

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através do consumo do Guaraná Antarctica, mais uma característica de brasilidade (Ambev: 2001). A Ambev decidiu que o desenvolvimento da comunicação da marca ligada à Seleção Brasileira e à Copa do Mundo seria entregue a Carillo Pastore EURO RSCG11, ficando a DM9DDB12 só com os institucionais da marca. A DM9, não aceitando a divisão da conta, abriu mão dela e a Carillo Pastore acabou ficando com a conta inteira (Fukushima: 2001). A Carillo Pastore, aproveitando a volta do jogador de futebol brasileiro Ronaldinho aos campos de futebol, desenvolveu uma campanha, na qual ele era o garoto-propaganda. Segundo a Carillo Pastore, “Essa (...) foi a oportunidade encontrada pela agência para realizar a campanha de estréia da conta do guaraná Antarctica” (Franco: 2001). A escolha de Ronaldinho é muito providencial porque ele é um ídolo de projeção nacional e internacional. Se o Guaraná Antarctica promove o Nacional-Popular, usando-o como uma instância do InternacionalPopular, nada mais acertado do que selecionar um ídolo que está presente na memória nacional e internacional. Já no final do ano, dando seqüência a Campanha para a Copa, a Carillo Pastore fez um filme ressaltando a perseverança dos brasileiros quando às adversidades do ano de 2001 numa metáfora com os dribles do futebol, na voz da atriz brasileira Fernanda Montenegro (Giobbi: 2001), promovendo a integração da nação ao demonstrar mais uma característica da brasilidade encarnada pelo futebol, a perseverança. Em 2002, a Coca-Cola, por sua vez, mesmo perdendo um importante patrocínio como o da CBF, não desistiu da disputa com a concorrente e promoveu o jogador de futebol brasileiro Romário13 a garoto-propaganda, esquentando a discussão que já existia sobre a sua convocação ou não para o Mundial, numa promoção que sorteou passagens aéreas para a Copa do Mundo, intitulada “Cadeira Reservada”, na qual

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A Carillo Pastore EURO RSCG é fruto da fusão da agência brasileira Carillo Pastore com a agência auto intitulada global EURO RSCG, caracterizando uma transnacional (EURORSCG: 2002). 12 DM9DDB também é de uma fusão entre a brasileira DM9 e a americana DDB (DDB: 2002). 13 Romário assim como Ronaldinho também é um ídolo reconhecido nacional e internacionalmente.

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Romário convocava a torcida para participar da promoção e torcer pela Seleção (Franco: 2002). O Guaraná Antarctica iniciou o ano, promovendo um novo slogan “Original do Brasil, como Guaraná Antarctica” (vide figura 4), preparando-se para o lançamento do refrigerante durante a Copa do Japão (Franco: 2002).

Ilustração 4 – Atriz Luana Piovani

Em resposta a campanha da Coca-Cola com Romário, o Guaraná Antarctica lançou Luiz Felipe Scolari14, técnico da seleção de futebol, como garoto-propaganda, numa campanha intitulada “170 milhões de técnicos. Original do Brasil, como guaraná Antarctica”, na qual promovia todos os brasileiros a técnicos de futebol. A campanha teve sucesso imediato, o que fez a Carillo Pastore adicionar outros ídolos brasileiros para convocar a seleção, encarnando o conceito “170 milhões de

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Quem faz a convocação oficial dos jogadores de futebol para as partidas é o técnico, portanto só ele poderia convocar os torcedores a participar da promoção e a torcer pelo Brasil.

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técnicos”, tais como o roqueiro brasileiro Supla, a atriz Dercy Gonçalves, entre outros personagens irreverentes (vide figura 5, 6 e 7) (About: 2002).

Ilustração 5 – Atriz comediante brasileira Dercy Gonçalves

Ilustração 6 – Comediante brasileiro Bussunda em destaque

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Ilustração 7 – Em cima: roqueiro João Gordo. Abaixo: roqueiro Supla.

A Coca-Cola, por sua vez, dando continuidade a primeira promoção com Romário, lançou mais uma promoção, intitulada “Bola da Copa Coca-Cola”, na qual Romário brincava com a bola do jogo, provocando quanto a sua não convocação para o Mundial. Essa promoção sorteou três das bolas que foram usadas pela Seleção Brasileira nas primeiras partidas da Copa. Em contrapartida, o Guaraná Antarctica lançou a promoção “Bote fé”, na qual Luiz Felipe Scolari (vide figura 8), novamente, convocava os brasileiros para acreditar na Seleção e na promoção que sorteava prêmios em dinheiro para os concorrentes (About: 2002). Essa promoção foi apresentada sob a forma de merchandising na novela “O Clone” da Rede Globo, na qual explicava-se o funcionamento da campanha (Meio&Mensagem: 2002). A promoção do futebol foi

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aliada a um dos principais e mais importantes bens culturais integradores da nação, um dos responsáveis pela geração de assunto entre as pessoas, tentando por em discussão a promoção do Guaraná Antarctica e integrar o país no consumo de um outro bem brasileiro.

Ilustração 8 – Cartaz de ponto de venda da Promoção Bote Fé

Segundo a Ambev, a campanha “Bote Fé” deu continuidade ao conceito “Original do Brasil”, criado pela Carillo Pastore. O novo conceito amplia a associação do produto aos prazeres do povo brasileiro, afirma a Ambev (Ambev: 2002). Segundo Cláudio Carillo, diretor-presidente de criação da Carillo Pastore EURO RSCG, em mais uma demonstração da promoção do “Nacional-Internacional-Popular”,

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Não tem estrangeiro que venha ao Brasil e não experimente o Guaraná Antarctica e nem brasileiro que não adore o produto. O Guaraná Antarctica é uma unanimidade de sabor único característico do Brasil. E foi pensando exatamente nessa ligação forte do produto com o País que surgiu a idéia do novo conceito (Ambev: 2002).

A discussão em torno da convocação de Romário e a disputa para mostrar quem acreditava e apoiava mais a Seleção Brasileira tomou conta da publicidade das duas empresas, ganhando às televisões (Fukushima: 2002). Nota-se como a publicidade teve o poder de unificar o país em torno do futebol ao mesmo tempo em que ensinava que seus produtos eram parte da identidade nacional. Diante disso, percebe-se que a Ambev não está apenas vendendo o Guaraná Antarctica. Ela realmente ultrapassa o simples ato promocional, denotando e conotando um movimento mais amplo no qual uma ética específica, valores, conceitos de espaço e de tempo são partilhados por um conjunto de pessoas imersas na modernidade-mundo (Ortiz: 1994, p. 144). Ela tem um papel que supera a dimensão exclusivamente econômica, configurando-se em instância de socialização de uma determinada cultura e desempenhando as mesmas funções pedagógicas que a escola possuía no processo de construção nacional. Cerca de um mês de Campanha da Copa, a Coca-Cola lançou uma campanha com o tenista brasileiro Gustavo Kuerten, o Guga, no qual o jogador rebatia o Guaraná Antarctica que um vendedor oferecia-lhe pra lá e pra cá, aceitando finalmente o produto quando percebia que se tratava de um Guaraná Kuat. Em resposta a essa campanha, o Guaraná Antarctica lançou uma outra, na qual acusava a Coca-Cola de patrocinar seleções de outros países, questionando a veracidade da torcida da companhia pelo Brasil, além de afirmar que a Coca-Cola não era brasileira, declarando que nem guaraná eles sabiam fazer ao mostrar o Kuat. Isso levou a Coca-Cola a acionar o Conselho de Auto Regulamentação Publicitária (Conar), acusando o Guaraná Antarctica de xenofobismo e de induzir os brasileiros a pensarem que o Kuat não era guaraná. Antes disso, o Guaraná Antarctica já tinha acionado o Conar na época do lançamento do Kuat, porque a Coca-Cola tinha se apropriado de um personagem

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utilizado nas campanhas do Guaraná Antarctica, usando-o na sua campanha (About: 2002). Diante disso, percebe-se, mais uma vez, a disputa pelo “NacionalInternacional-Popular” na qual o Guaraná Antarctica defende a sua genuinidade de procedência brasileira frente à companhia americana. Quando a Copa do Mundo realmente começou, o Guaraná Antarctica foi lançado no Japão, chegando juntamente com a Seleção Brasileira de Futebol ao país, como mais um integrante da delegação brasileira na torcida pela Seleção (Ambev: 2002), através do acordo com o grupo japonês Arai Shoji. O produto chegou numa embalagem promocional em português e japonês, inclusive com a logomarca grafada em ideogramas e o símbolo da CBF. A companhia acredita que o Brasil está na moda no exterior, num fenômeno muito parecido com o que aconteceu com o México, quando a cerveja mexicana Corona foi lançada nos EUA. Hoje, ela é cerveja estrangeira mais vendida naquele mercado (Jimenez: 2000). É possível perceber isso de acordo com o que Juan Vergara, diretor-geral de refrigerantes Ambev, diz: Optamos, nesse momento, por fazer o lançamento desta embalagem promocional do Guaraná Antarctica no Japão para aproveitarmos a apresentação da Seleção Brasileira, da qual somos patrocinador oficial. Além de contarmos com a parceria da Arai Shoji, as pesquisas revelaram o forte interesse dos consumidores pelo produto e a sua imediata associação ao Brasil, que está em evidência no Japão, atualmente (Ambev: 2002).

O uso das pesquisas de marketing apresentado no discurso também é mais uma característica da globalização, que ao permitir o conhecimento profundo do consumidor através da evolução da tecnologia, também promove a busca pela descoberta do que mais satisfaria o consumidor. Nesse caso, a descoberta é a satisfação do consumidor ao aceitar o produto. Além disso, esse discurso mostra o uso da identidade nacional associada ao futebol como referência na construção da imagem do produto. O uso da citação das características brasileiras que o futebol suscita, faz sentido a todos os que já

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conhecem o futebol brasileiro, principalmente para o Japão, que já o conhece através do jogador de futebol brasileiro Zico, técnico de futebol nesse país por algum tempo. Portanto, não haveria melhor oportunidade para o lançamento do produto no Japão do que naquele momento. Os brasileiros já vinham sendo unidos em torno do futebol na defesa de sua identidade através das campanhas publicitárias das empresas, incluindo o Guaraná Antarctica, da evocação de glórias passadas e, conseqüentemente, tinham sua esperanças renovadas. O Japão já tinha o futebol e, principalmente a Seleção Brasileira, altamente conceituada dentro da memória nacional através de Zico, encontrava-se à espera da chegada da Seleção Brasileira no país. O Guaraná Antarctica apenas associou-se a esses eventos, promovendo-se a partir deles como mais um elemento na esfera da cultura internacional. Ao promover o futebol em conjunto com o Guaraná Antarctica no exterior, a Ambev está consolidando essa característica da memória nacional como integrante da memória internacional, pois o futebol brasileiro é aceito como um dos melhores do mundo. Usando essa referência, o Guaraná Antarctica está sendo inserido na memória internacional através da publicidade, como o guaraná que é do Brasil e que tem como referência o mesmo jeito e graça do futebol brasileiro. Além disso, essa promoção das características brasileiras atrelada ao Guaraná Antarctica garante um único produto na categoria guaranás correspondente às características da identidade cultural do Brasil, evitando que o Guaraná Kuat ocupe esse lugar na memória Internacional-Popular. Ao final da Copa, com a vitória brasileira, a agência BBDO, que atende a conta internacional do Guaraná Antarctica, preparou um anúncio nos principais jornais dos países em que o produto é comercializado seguindo a mesma linha “Será do Guaraná?”, com o jogador de futebol Ronaldinho segurando a bola. Além de lançar uma lata promocional alusiva ao pentacampeonato15 (Distribuidor Online: 2002). Segundo Juan Vergara, diretor-geral de refrigerantes e não alcoólicos da Ambev,

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O próprio futebol é uma característica da memória internacional, sendo que o futebol brasileiro atrelado à identidade cultural do Brasil também já está sendo percebido como integrante do Internacional-Popular.

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A conquista do pentacampeonato, bem como a excelente atuação da Seleção Brasileira durante o Mundial, foram pontos positivos para o Guaraná Antarctica. Além da grande exposição da marca em todos os uniformes de treino dos jogadores, foi possível reforçar o conceito do orgulho e paixão/originalidade brasileira que tanto a Seleção quanto a marca possuem (grifo nosso) (Ambev: 2002).

O Guaraná Antarctica colheu bons resultados na Copa do Mundo, o que encorajou a companhia a acelerar o projeto de internacionalização da marca. “A associação da imagem do nosso produto com a Seleção Brasileira deu muito gás para posicionarmos melhor nossa marca”, afirma Vergara, diretor de refrigerantes da Ambev (Bascchera: 2002). A conquista do Pentacampeonato consagrou o uso do “Nacional-Internacional-Popular” pelo Guaraná Antarctica.

5.5. GUARANÁ

ANTARCTICA:

AGENTE

DO

INTERNACIONAL-

NACIONAL-POPULAR

Se, anteriormente, colocou-se a hipótese de que o Nacional-Popular, ao fundir ou confundir, com o Internacional-Popular, daria origem a uma espécie de “Nacional-Internacional-Popular”, nesse item, trabalha-se com a hipótese contrária. Quando o Nacional-Popular (modificado pelo Internacional-Popular, originando o “Nacional-Internacional-Popular”) sofre a ação do Internacional-Popular, é possível demonstrar a formação do que poderia ser chamado de “Internacional-NacionalPopular”, numa espécie de ação reflexiva. Antes da Copa do Mundo, no final de 2001, quando o Guaraná Antarctica já estava sendo exportado, iniciou-se um trabalho com o público infantil através de ações de marketing cruzado junto com a empresa brasileira de brinquedos Estrela. O

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Guaraná Antarctica uniu-se à boneca Susi16 fabricada pela Estrela (vide figura 9), desenvolvendo um brinquedo no qual a boneca era apresentada com miniaturas de guaranás nas embalagens caçulinhas (embalagem pet de 237ml), além de canudos divertidos em tamanho real para o público infantil (Borges: 2001). A associação da boneca ao Guaraná Antarctica foi usada como artifício para ensinar o consumo de um produto que é, ao mesmo tempo, brasileiro e universal, através de um tipo de brinquedo, que também é brasileiro e de aceitação universal.

Ilustração 9 – Boneca Susi com Guaraná

Em seguida, dentro de um Projeto Ecológico chamado “Amigos da Natureza”, o Guaraná Antarctica lançou 14 bichinhos de pelúcia de animais em extinção na Amazônia em tamanho pequeno, que eram vendidos junto com as caçulinhas do Guaraná Antarctica (vide figura 10).

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A boneca Susi é uma boneca semelhante à boneca Barbie, brinquedo mundialmente conhecido e consumido pelo público infantil.

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Enquanto isso, estava em planejamento com a empresa de fast food McDonald’s uma outra ação de marketing cruzado. O Guaraná Antarctica desenvolveria mais quatro bichinhos diferentes, em tamanho maior, criados exclusivamente para essa parceria para serem vendidos em conjunto com lanches acompanhados de Guaraná Antarctica (Borges: 2001). Com parte das vendas da marca relacionada aos bichinhos da promoção “Amigos da Natureza”, a Ambev construiu um espaço denominado maternidade de animais “Caçulinhas do Brasil” no Zôo Parque – O Mundo dos Animais, inaugurada no mesmo ano (Ambev: 2002).

Ilustração 10 – Bichinhos de pelúcia vendidos junto com a embalagem caçulinha do Guaraná Antarctica

Essas ações demonstram a adequação da marca a um padrão de comportamento internacional que é a preocupação com o meio ambiente, com a ecologia. O Guaraná Antarctica, promovendo a preservação ambiental, não a promove indistintamente, mas sim, através de uma das características da identidade brasileira que é a Amazônia. Quando essa ação é tomada em conjunto com o McDonald’s, uma companhia americana, fica mais evidente a promoção dessa tendência mundial pela Ambev.

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Com essas promoções, o Guaraná Antarctica extrapola o simples ato promocional (Ortiz: 1994), assumindo o papel pedagógico de ensinar aos pequenos brasileiros, através do consumo das caçulinhas, a adequação aos comportamentos mundiais, atrelado a um bem cultural brasileiro. O que se verifica no depoimento a seguir, concedido por Juan Vergara, diretor de refrigerantes da Ambev:

O caráter educativo e ecológico da promoção faz do projeto Amigos da Natureza uma das ferramentas para conscientização das pessoas em torno do tema preservação do meio ambiente, principalmente na região amazônica, a terra natal do Guaraná Antarctica (Água Online – Revista digital: 2001).

O depoimento de Steve Reinemund, presidente da Pepsi Co, concorda:

The unique taste, the fact that guaraná is product of the Amazon region, grown with respect for ecology and the enviroment, togheter with Pepsi’s distribution reach are all excellent tools to support Guaraná Antarctica’s claim for a slice of the world soft drink market (Guarana.com: 1999).17

O Guaraná Antarctica, associando-se a elementos do conceito de NacionalPopular, antes de sua exportação, promove-se através dele. Ao ser exportado, agrega um novo valor a esse conceito, usando-o para promover-se dentro do contexto do Internacional-Popular, principalmente durante a Copa do Mundo. Ao final do Mundial, retorna ao mercado nacional trazendo consigo elementos da cultura internacional, como o caso da ecologia e da associação com empresas multinacionais. Ele transforma-se em instrumento de socialização de uma tendência de comportamento mundial. Ao adequar-se aos padrões internacionais, não contribui 17

O sabor único, o fato de o Guaraná Antarctica ser um produto da Amazônia, crescendo com respeito pela ecologia e pelo meio ambiente junto com o alcance da distribuição da Pepsi são excelentes ferramentas para manter uma fatia do mercado mundial de refrigerantes leves para o Guaraná Antarctica.

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só para a promoção internacional de aspectos da cultura brasileira, mas, também, para a difusão de alguns aspectos da memória internacional. Por isso, a mundialização pode ser vista como um processo “mais democrático”, ao contrário da internacionalização que impõe os aspectos da cultura de um país, sem permitir a troca (Ortiz: 1994). Dando seqüência nas ações para promoção do Guaraná Antarctica, após a Copa do Mundo, a Ambev realizou, em 2002, uma exposição sobre a Amazônia em São Paulo (Ambev: 2002), que contou com algumas tribos indígenas, maquetes de como a Ambev cultiva ecologicamente o guaraná, entre outras coisas. Uma ação que promove, mais uma vez, um elemento da cultura brasileira associada à tendência global de preservação ambiental, a Floresta Amazônica, reforçando essa característica brasileira dentro do país e associando-a à marca Guaraná Antarctica na memória internacional. Depois da Copa do Mundo, também foi iniciada uma nova fase da campanha da marca no Brasil, o Guaraná Antarctica trocou seu slogan por um mais irreverente “Seja o que for, seja original” (vide figura 11 e 12) e acaba de lançar uma série de filmes que mostram situações nas quais uma pessoa não é original em uma atitude ou resposta (O Estado de São Paulo: 2002). Embora o slogan tenha mudado, o apelo continua o mesmo, usando elementos da identidade brasileira para mundialização, através do produto.

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Ilustração 11 – Cenas do novo comercial de TV do guaraná.

Ilustração 12 – Seja o que for, seja original

Dando seqüência ao uso do marketing cruzado, iniciado com o público infantil, o Guaraná Antarctica alia-se com outra empresa de fast food, a Pizza Hut. Nessa promoção, o cliente que levar duas latas do Guaraná Antarctica cujo logotipo da

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Pizza Hut encontra-se estampado, ganha descontos nas pizzas (Estado de São Paulo: 2002), o que mais uma vez provoca o consumo do produto, mas dessa vez focado em uma faixa etária diferente daquela encontrada na ação com o McDonald’s. Embora nessa ação não seja usado o comportamento global de preocupação ecológica, uma outra tendência mundial apresenta-se, a associação entre empresas transnacionais, demonstrando a ação do Internacional-Popular sobre o “Nacional-InternacionalPopular” novamente. Uma das últimas ações, o Guaraná Antarctica, na contribuição para mundialização, é a participação do primeiro Duty Free Shop brasileiro. A rede Brasif acaba de inaugurar sua primeira loja nesse estilo, a Duty Free Made in Brazil no Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos. A inauguração contou com a presença do ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Sérgio Amaral, que diz que a tendência dessa iniciativa será a de oferecer produtos com uma boa dose de brasilidade, estimulando as exportações e também a exposição dos produtos nacionais aos olhos dos estrangeiros (Franco: 2002), comprovando a possível posse de alguns elementos da identidade cultural brasileira por parte da Ambev como apelo de consumo através de sua comunicação. Além disso, abre-se uma nova possibilidade para a continuação ao movimento reflexivo que se iniciou antes de sua exportação: o uso de um Nacional-Popular, que modifica o Internacional-Popular, transformando-se em “Nacional-Internacional-Popular”, que é modificado pelo Internacional-Popular, transformando-se novamente e adquirindo a possibilidade de modificá-lo de volta.

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CONCLUSÃO

O Nacional-Popular traduz a identidade cultural de um país construída a partir da escolha das memórias coletivas dos habitantes desse país. Já, o InternacionalPopular traduz uma identidade cultural universal construída a partir das memórias nacionais dos países que constituem o planeta. Esses três tipos de memórias – memória coletiva, memória nacional e memória internacional – encontram-se em três diferentes instâncias, sendo que nenhuma deixa de existir por causa da outra. Elas são acionadas em momentos diferentes, de acordo com os objetivos a que se pretende. Por exemplo: a publicidade pode trabalhar com uma memória coletiva que não faça parte da memória nacional, ao falar para um público extremamente segmentado. Da mesma forma, pode utilizar-se de uma memória nacional que não faça parte da memória internacional com o mesmo propósito. E, ainda, utilizar-se da memória internacional. A existência da memória nacional sobre as memórias coletivas deve-se ao advento da Nação que, para integrar os mais diversos povos dentro de suas fronteiras, utilizou-se da eleição de algumas memórias coletivas para caracterizá-la. Com o advento de uma sociedade global, calcada no consumo e dominada pelas grandes empresas, forma-se uma outra memória, a memória internacional. Englobando, em alguma medida, todas as outras, ela faz-se presente devido ao circuito de trocas culturais internacionais que se instaurou no mundo através da Indústria Cultural, disseminando padrões mundiais de comportamento. Quando se analisa a constituição do Brasil enquanto nação, percebe-se a eleição de algumas memórias coletivas tais como o futebol, o samba, o carnaval, a telenovela, como representantes da cultura nacional, sendo a Rede Globo de Televisão uma das principais mediadoras da cultura popular brasileira, agindo sobre o Nacional-Popular. Quando a Rede Globo assume o papel proeminente de mediadora da cultura do país, as bases para o estabelecimento de uma sociedade global já tinham sido lançadas porque a iniciante Indústria Cultural brasileira já se encarregara de integrar-

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se ao circuito de trocas internacionais. Quando o Brasil entra na era da globalização econômica, a cultura brasileira encontra-se preparada para a mundialização e alguns aspectos da memória nacional, como exemplo a telenovela, já estão prontos para serem promovidos a constituintes da memória internacional. Isso comprova que, o equacionamento do Nacional-Popular pela Indústria Cultural no Brasil traz em si o Internacional-Popular, devido ao caráter universal da Indústria Cultural. É devido a isso também ela é usada pelas corporações, através da publicidade, para expansão de seus mercados consumidores, inserindo-se no Brasil, conforme o desenvolvimento dela. O circuito de trocas desterritorializadas, de que fala Ortiz, ao mesmo tempo em que contribui para a formação do Nacional-Popular brasileiro, também contribui para que ele integre o Internacional-Popular, possivelmente formando uma espécie de “Nacional-Internacional-Popular”. Com o aprofundamento da velocidade das comunicações, esse circuito acelera-se e o Internacional-Popular novamente influencia

o

que

se

está

chamando

de “Nacional-Internacional-Popular”,

possivelmente formando o que poderia ser chamado de “Internacional-NacionalPopular”, integrando novamente o Internacional-Popular. Estabelece-se uma troca constante e uma mobilidade ascendente dos valores agregados a esses dois conceitos através do contato entre eles. O estudo do Guaraná Antarctica contribui concretamente para a análise desses fatos, produzindo uma visão sobre o uso de elementos do Nacional-Popular e do Internacional-Popular no contexto da publicidade e do marketing. A publicidade e o marketing usam o Nacional-Popular e o Internacional-Popular conforme os interesses da empresa a que servem. Percebe-se a existência desse jogo entre os conceitos conforme os objetivos das empresas. Ora usa-se o Nacional-Popular para integrar o mercado nacional, ora o “Nacional-Internacional-Popular” para integrar mercado nacional e internacional, ora usa-se o “Internacional-Nacional-Popular” para adequar o mercado nacional aos padrões internacionais e assim sucessivamente. A Ambev e a Coca-Cola, ao disputarem o uso de elementos Nacional-Popular durante o processo de fusão da Brahma e da Antarctica e depois entre o Guaraná Antarctica e o Guaraná Kuat, pretendem que seus produtos estejam associados à

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elementos da identidade nacional brasileira no contexto da memória nacional. Quando a exportação desses produtos torna-se realidade, a disputa busca a associação de apenas um desses produtos à identidade nacional para integração da memória internacional. Elas também usam a memória internacional para adequarem o mercado brasileiro aos padrões internacionais quando promovem aspectos dela ligados aos seus produtos no mercado nacional, que é o caso das ações ligadas à ecologia com relação ao Guaraná Antarctica que envolveram a Amazônia e a associação com empresas estrangeiros para ações de marketing cruzado. A disputa por essa correspondência à elementos da identidade nacional é possível porque o Nacional-Popular não fica estagnado, estando em constante transformação de acordo com os acontecimentos do cotidiano popular. “A cultura é um processo dinâmico que não cessa de alterar” (Fadul apud Melo: 1985). Mesmo assim, o Guaraná Antarctica possivelmente ocupe uma posição privilegiada como o verdadeiro sabor do Brasil porque a Ambev, cujas decisões têm apresentado maiores interesses no mercado brasileiro, é uma empresa que nasceu brasileira, enquanto que, a Coca-Cola nasceu americana. Por isso, ao Guaraná Antarctica é mais adequado utilizar-se do Nacional-Popular, para explorar seu consumo, seja dentro do país ou em comunidades brasileiras no exterior, quando afirma ser genuinamente brasileiro. Isso também possibilita, em algumas circunstâncias, uma posição mais vantajosa na disputa pela presença dentro do contexto do Internacional-Popular ao agregar símbolos de brasilidade para construir sua imagem no mercado de consumo global. Quando se trata de Internacional-Popular é praticamente impossível restringir essa análise a algum país porque ele só admite ser analisado quando se fala em sociedade global. Pensar o Nacional-Popular em termos nacionais é possível, mas quando o Nacional-Popular está a serviço do Internacional-Popular, novamente, depara-se com um fenômeno de proporções globais, que se mistura ao InternacionalPopular. Mais uma vez, cita-se como exemplo a ação do Guaraná Antarctica na Copa do Mundo, que extrapolou a simples defesa de elementos da identidade cultural brasileira.

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Diante disso, a defesa do Nacional-Popular perde o sentido frente ao Internacional-Popular quando se sabe que o mercado não aceita mais a oposição entre nacional e estrangeiro, sendo a sociedade vista pelos seus interpretadores, as transnacionais e a Indústria Cultural, como uma sociedade única, constituída por uma diversidade de segmentos globais. Ou seja, para a publicidade e o marketing, a memória nacional, além de ser cultivada por causa do mercado consumidor segmentado a que ela corresponde, é acionada também para legitimar uma posição disputada na memória internacional. O Guaraná Antarctica apropriou-se da originalidade brasileira para promover o consumo dentro do país enquanto não era exportado. Quando ele adquire essa capacidade, continua usando do mesmo artifício. Entretanto esses bens culturais promovidos pelo produto já fazem parte da memória internacional, o que permite uma promoção, ao mesmo tempo, do consumo nacional e do consumo internacional, no caso da Copa do Mundo. Portanto, não somente a articulação desses conceitos é possível e extremamente eficaz, como também a utilização de diversas combinações entre eles para satisfazer os objetivos mercadológicos das empresas. Mas mesmo assim, as empresas não possuem controle absoluto desse processo porque ele é muito maior do que o simples ato promocional de produtos, é um ato promocional de cultura e a cultura depende de vários outros fatores sócio-ambientais.

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