OS CAMINHOS DA REFORMA CHINESA: DE MAO ZEDONG A DENG XIAOPING

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UNIVERSIDADE ESTÁCIO DE SÁ MARIANNE NOVAES FALLEIRO CHAVES DE FIGUEIREDO

OS CAMINHOS DA REFORMA CHINESA: DE MAO ZEDONG A DENG XIAOPING

Rio de Janeiro 2003

MARIANNE NOVAES FALLEIRO CHAVES DE FIGUEIREDO

OS CAMINHOS DA REFORMA CHINESA: DE MAO ZEDONG A DENG XIAOPING

Monografia apresentada à Universidade Estácio de Sá como requisito para a obtenção do grau de bacharel em Relações Internacionais.

ORIENTADOR: Marco Antonio Quiniao Manquian Rio de Janeiro 2003 2

MARIANNE NOVAES FALLEIRO CHAVES DE FIGUEIREDO

OS CAMINHOS DA REFORMA CHINESA: DE MAO ZEDONG A DENG XIAOPING

Monografia apresentada à Universidade Estácio de Sá como requisito para a obtenção do grau de bacharel em Relações Internacionais.

25 de novembro de 2003

BANCA EXAMINADORA

Professor orientador Marco Antonio Quiniao Manquian Especialista em Relações Internacionais – Universidade Candido Mendes

Professor Theotonio dos Santos Doutor em economia por notório saber – Universidade Federal Fluminense ___________________________________________________________________ Professor Oscar Lins Mestre em Relações Internacionais – IRI/PUC-RJ

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Ao meu pai, pelas histórias do mundo na infância; À minha mãe, por sua existência; À existência, pela chance de ser.

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AGRADECIMENTOS

Agradecimentos especiais ao professor Theotonio dos Santos, seus livros e longas palestras particulares. Ao professor Carlos Eduardo Martins pelo apoio no inicio da idéia monográfica e durante sua execução. Ao professor Daniel Araão Reis pela atenção surpreendente e material acadêmico. Ao meu atencioso e multi-tarefas orientador, professor Marco Antonio. Atenção especial para cada um mesmo tendo diversos orientandos. Grande dedicação. À Mónica Bruckmann pelo incentivo sincero. À professora Carla Medina pela amizade e orientação durante todo o curso. Aos meus amigos, Carlos e Raquel. Companheirismo necessário. Ao meu melhor amigo e companheiro, João Bonatto. Sempre comigo. Aos meus irmãos. Aos meus avós. Duplamente pais. Ao Caio. Eterno companheiro; lua, sol ou nuvens. Felino dengoso que quando ninguém mais estava presente ainda sim preferia minha silenciosa companhia.

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As utopias são realizáveis. A vida marcha rumo às utopias. (HUXLEY, Admirável mundo novo. 1932). Guerra é paz Liberdade é escravidão Ignorância é força (ORWELL; 1984. 1949). 6

RESUMO O processo de reforma econômica levado a cabo a partir do final da década de 70 na China, foi fruto de um caminho de acontecimentos que culminaram na reforma. O presente trabalho visa mostrar como se chegou a este processo de reforma econômica chinesa. Para tal será analisado o período de governo de Mao Zedong (1949-1976), a transição do poder (1976-1978) e os primeiros anos do governo de Deng Xiaoping (1978-1984). A era Mao Zedong foi de extrema importância para a reunião chinesa sob um só comando central. Trouxe estabilidade política e econômica em um país onde por meio século vinha acontecendo uma séria disputa de poder que impedia seu desenvolvimento. Entretanto a era Mao não foi composta somente de políticas de sucesso. Eventos como o Grande Salto Adiante e a Revolução Cultural são marcantes tanto na história social como foram forças motrizes para um desencanto popular com seu maior líder e ícone, o próprio Mao. É neste contexto de desencanto que chega a morte do grande líder; a hipótese do presente trabalho se encontra no desencanto da população e na necessidade de que Mao deixasse o poder por completo para que fosse possível um processo de reforma. Depois de sua morte é dada partida, por Deng Xiaoping ao processo de reforma de um sistema socialista em busca de melhor dimensionar a influência das mudanças internas – que ocorriam na China desde a formação da República Popular – sobre a política externa. Buscava uma maior competitividade no mercado mundial e desenvolvimento do país. Foram usadas práticas liberalistas que Mao Zedong rechaçava e que enquanto vivo, as impediria de vigorar. Sua partida do poder foi essencial, já que nele sua influência era muito grande. Palavras-chave: Republica Popular da China. Reforma econômica. Socialismo

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ABSTRACT A chain of elements led to the reform process that took place in China at the end of the 70s. The present work intends to outline how did the chinese get to the reform processs. It is analysed de Mao Zedon’s era (1949-1976), the transition process (1976-1978), and the first years of Deng Xiaoping’s government (1978-1984). The Mao Zedong’s era was extremely important to China. It was capable to reunite the command under one central power. It brought political and economic stability to a country that had found itself under serious disputes for the power, which were preventing it from development. It also was able to gift the population with love and devotion towards a new leader. However, the Mao’s era was not only composed of success politics. The Great Lap Forward and the Cultural Revolution were important history marks that influenced the population and disenchanted themselves on the way the country was being led. Along with this context of disenchantment, comes the death of the great leader Mao Zedong. Here stands the hypothesis of the present work, the disenchant and the death of Mao. After these, it is launched, by Deng Xiaoping, a socialist system process of reform for searching a better dimensioning of the internal changes influences that were undergoing in China – since the proclamation of the People’s Republic. The main work field were the external policies, competitiveness on the world market and the consequent development of the country. It was essential that Mao had left the power completely so that the pragmatists were able to implement these liberalizing reforms. Mao was too against these practices, and as long as he was alive he had too much of an influence on the decision power to prevent it.

Keywords: People’s Republic of China. Economic Reform. Socialism.

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LISTA DE SIGLAS

EE UU – Estados Unidos da América. ELP – Exército da Libertação Popular. PCC – Partido Comunista Chinês. RPC – República Popular da China. URSS – União das Repúblicas Soviéticas. ZPEs – Zonas de Produção Especial.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...........................................................................................................11 CAPÍTULO 1

ANTECEDENTES HISTÓRICOS DA RPC..................................16

CAPÍTULO 2

O PERÍODO MAOÍSTA................................................................27

2.1

A DITADURA DEMOCRÁTICA POPULAR......................................................28

2.2

O GRANDE SALTO ADIANTE........................................................................ 30

2.3

OS JOVENS, MAO ZEDONG E A REVOLUÇÃO CULTURAL........................32

CAPÍTULO 3 3.1

O PROCESSO DE REFORMA E DENG XIAOPING...................39

O DESENCANTO.............................................................................................39

3.2

A

PARTIDA

DOS

VELHOS

CAMARADAS.......................................................41 3.3

UM GOLPE DE ESTADO TÉCNICO................................................................43

3.4

AS QUATRO MODERNIZAÇÕES E DENG XIAOPING……...........................45

CAPÍTULO 4

CONSIDERAÇÕES FINAIS.........................................................52

REFERÊNCIA..................................................................................................55 GLOSSÁRIO....................................................................................................57 ANEXOS ANEXO 1 – Mapa da China.............................................................................59 ANEXO 2 – O expansionismo japonês............................................................60 ANEXO 3 – Regiões militares..........................................................................61 ANEXO 4 – Primeiro plano qüinqüenal...........................................................62 ANEXO 5 – Comércio chinês..........................................................................63 ANEXO 6 – Terras aráveis..............................................................................64

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INTRODUÇÃO No extenso continente asiático, a oeste do oceano pacífico, se encontra uma grande nação e país – a China – hoje República Popular da China1. Um grande país em dimensões geográficas (9.600.000 km2) e demográficas, mais de 1,3 bilhões de habitantes2.

No contexto das relações internacionais, a China é notoriamente reconhecida por sua tradição isolacionista. Com as incursões das nações imperialistas do século XIX à Ásia está tradição foi maculada, um império secular ruiu por conflitos internos e externos e um processo de formação de república sólida permaneceu por quase meio século. Foi um momento de luto e luta, invasão de outros países – asiáticos e ocidentais – onde a nação chinesa convivia com falta de liderança estabelecida e forte guerra civil, sem mencionar as duas grandes guerras mundiais que não pouco freqüentemente ocorriam ao mesmo tempo e espaço.

1 2

Ver mapa China anexo 1. Dados de SHI, Quin. China. Pequim: Nova Estrela, 1997.

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Aderindo ao ideal leninista-marxista, em 1949 formou-se a Republica Popular da China sobre a liderança de Mao Zedong3 e seus companheiros que haviam resistido à “Longa Marcha”. Retoma-se o processo de reconstrução de uma nação e formação de um país agora sobre os princípios do socialismo. As portas são novamente fechadas ao mundo afora e a China retoma e cria sua forma de viver o mundo, com contatos esporádicos com o mundo4 em um contexto internacional bipolar, pós-Segunda Guerra Mundial. Os anos passam: três décadas. Um “Grande Salto Adiante” fracassa, uma “Revolução Cultural” desestrutura a nação deixando muitos de seus cidadãos vivendo no medo e nivelados por baixo. E o cenário interno e internacional urge por mudanças de estratégias dos países – por uma modernização – inclusive dentro da cerrada nação maoista-marxista-leninista chinesa. Os grandes líderes da Revolução popular chinesa já não governam mais: Mao se fora, Zhou Enlai também, Lin Biao morrera e fora difamado abalando a convicção do povo chinês nos seus governantes. Três décadas não foram suficientes para o desenvolvimento da nação; a pressão demográfica grande, escassez de alimentos e a insatisfação pela revolução cultural também se fazem presentes. Deng Xiaoping, que participara da Longa Marcha e que com Mao e seus companheiros formaram a Republica Popular da China (RPC), retoma um papel de liderança que por duas vezes lhe havia sido retirado. Desta vez mais forte e com propostas de reestruturação da RPC, remendando os erros do Grande Salto Adiante e da Revolução Cultural. Buscando uma maior inserção da China na economia mundial para lograr ganhos qualitativos; reformando e criando um socialismo de mercado. Quais são os elementos relevantes que explicam esta reforma chinesa iniciada com o governo de Deng Xiaoping? O objeto do presente trabalho é a forma que se chegou a este processo de reforma econômica chinesa e como se pôde criar esta economia de mercado socialista do tipo chinês como eles mesmo a denominam. O professor pesquisador Su Shaozihi (1985) defende que há um só socialismo, porém vários meios de 3

Para a transcrição dos vocábulos chineses foi utilizado o sistema pinyin, oficialmente adotado em 1980 em substituição ao Wade-Giles, usada até então. No caso de algumas cidades (Cantão) e personagens (Chiang Kaishek) manteve-se a antiga transcrição, para que fosse melhor reconhecida pelo leitor. 4 Quase que somente com o mundo socialista.

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alcançá-lo, e que o marxismo deve desenvolver-se através da prática. Ele não pode manter-se estagnado ou perderia sua vitalidade. Em uma análise política, como hipótese, foram necessários os insucessos da gestão Mao – Grande Salto Adiante e Revolução Cultural – e a morte do mesmo para que fosse possível uma reforma na economia de RPC pela linha dos pragmáticos5. Era necessário que Mao deixasse por completo o poder para que se mudasse o rumo da China. Seu personalismo era grande; seu poder também e ele não desejava uma reforma. Seu ideal de grande China não passava perto dos conceitos mais liberalistas do decorrente processo de reforma. E para entender o processo de reforma é necessário uma compreensão por parte do leitor de fatos essenciais da história da nação chinesa. São analisadas as implicações do “Grande Salto Adiante” e as importantes mudanças na sociedade chinesa em virtude da “Revolução cultural”, deflagrada a partir de 1966. Passando então, para uma análise de cunho político da China em seu período de reforma estrutural oficial que começou com a morte de Mao Zedong em 1976. A análise é estendida até outubro de 1984 quando na III Sessão Plenária do XII Comitê Central do Partido Comunista Chinês são feitas as primeiras análises do rumo das reformas. A partir daí elas tomam um ritmo ainda mais acelerado. Traçando uma longa onda histórica dos acontecimentos políticos na China do século XX, busco explicar como se deu o processo de reforma de uma economia socialista que desde então tem alcançado níveis de crescimento altos e constantes. Outras ex-repúblicas socialistas no seu processo de reforma acabaram por abandonar o rótulo marxista. E é exatamente por este crescimento extraordinário, por ser um país continental e possuir a maior população do mundo6 que estudá-la por si só já é muito importante para as relações internacionais; simplesmente por ser um país de grande importância política, econômica e cultural. Ela está constantemente presente em nossos dias. Suas decisões políticas têm influenciado o âmbito internacional, não só na Ásia, mas mundialmente. Economicamente estamos falando de mais de um bilhão e trezentos milhões de consumidores e uma capacidade de produção muito grande, temos hoje produtos chineses espalhados por todo o mundo e analistas a elegeram um dos melhores parceiros econômicos da atualidade. Estatísticas da OCDE prevêem que o PIB chinês em 2025 suplantará o dos EE UU que é hoje a 5 6

Liderados por Deng Xiaoping. Uma em cada cinco pessoas no mundo é chinesa.

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maior economia mundial.(MADDISON, 1998) (ver tabela 1). Para o Brasil, a China tem se colocado com um parceiro estratégico no desenvolvimento de ambas economias. Tabela 1 1820

1890

1913

1952

1978

1995

Participação no PIB Mundial

32.4

13.2

9.1

5.2

5.0

10.9

Participação na População Mundial

36.3

26.2

24.7

21.8

22.4

21.3

PIB per capita em porcentagem na Média Mundial

89.2

50.3

36.7

23.7

22.3

51.1

1

2

3

3

4

2

n.a.

1.7

1.6

1.6

0.8

2.9

PIB no Ranking Mundial Participação nas Exportações Mundiais Fonte: OCDE, Maddison, 1998, p. 56.

Estudar a reforma chinesa especificamente é importante para entendermos como evoluiu o pensamento socialista chinês. Entender o processo de formação de uma economia de mercado socialista é entender como o ideal socialista resolveu convergir seus objetivos finais à práticas da sua principal contraproposta: o capitalismo. A China tem conseguido fazer sua transição de uma economia socialista planificada7 para uma economia de mercado socialista. Entender este caminho é então de grande valia e exemplo para as relações internacionais. Do ponto de vista metodológico, este trabalho monográfico é calcado em fontes secundárias principalmente; tem um corte político e é de caráter exploratório, histórico, panorâmico da economia mundial. Em virtude das próprias limitações técnicas impostas por uma monografia, é também uma decisão metodológica a não abordagem dos fatores externos e manutenção da análise nos fatores internos da reforma chinesa. A seguir o leitor encontrará o capítulo 1 referente aos antecedentes históricos da temática. Esta parte conta com dados e fatos relevantes da nação chinesa desde a queda da dinastia Qing até a formação da República Popular. É buscado a explicação de como se estrutura a China e fornece ao leitor informações básicas sobre as peculiaridades chinesas. Isso no intuito de melhor situar o leitor na história chinesa e suas implicações no presente.

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Lembrando que não é necessário ser socialista para se constituir uma economia planificada e vice-versa.

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O capítulo 2 faz um panorama da era Mao Zedong. Narra as políticas do Grande Salto Adiante e Revolução Cultural apontando seus pontos negativos com base nas análises dos autores abordados na monografia. Busco demonstrar o que levou os chineses a se identificarem às idéias de Mao – e sua revolução – e na forma que o seguiam cegamente (SHAOZHI, 1985), e depois a identificarem nelas mesmas erros e motivos para se realizar uma reforma na economia como a que foi feita nos moldes das idéias de Deng Xiaoping. O capítulo 3 fala da morte de Mao e fim de sua influência na formulação de medidas econômicas na China. Fala também dos movimentos contra-reforma, mas mostrará como os ideais de Deng Xiaoping prevaleceram e como ele liderou o processo de reformulação da economia chinesa. Explica como surgiu a temática de que é preciso adequar as experiências mundo afora à realidade chinesa antes de aplicá-las dentro de seu território. Falará de que forma isso foi feito diante dos problemas enfrentados nestes primeiros momentos e avanços.8 Por último, nas considerações finais, se faz um balanço das principais conclusões extraídas da pesquisa.

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No glossário o leitor encontrará uma compilação dos aspectos conceituais do socialismo chinês, onde elementos chaves são descritos sucintamente para prover o leitor de um apoio ao entendimento do todo.

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CAPÍTULO 1

ANTECEDENTES HISTÓRICOS DA RPC.

A China é um dos países com a mais antiga civilização do mundo. Sua história possui fontes escritas de quase quatro mil anos; restos arqueológicos revelam que o homem primitivo já habitava a China há um milhão de anos (SHI, 1997). É um dos países com o mais antigo desenvolvimento econômico da história. Desde cinco, seis mil anos, o povo que vivia na bacia do rio Amarelo tinha a agricultura como ocupação principal e criava gado. Há três mil anos, na dinastia Shang, já era conhecida a técnica de fundição do bronze, utilizavam-se instrumentos de ferro e utensílios de cerâmica branca e esmaltada. A produção de seda e tecelagem também se encontrava desenvolvida e já havia aparecido a mais antiga técnica de tear (SPENCE, 2000). São exemplo na ciência e na técnica hidráulica antiga e a utilizavam bem na irrigação. No prolongado desenvolvimento de sua história, a China criou também uma brilhante cultura. Os pensadores Lao Zi, Sun Tzu, Sun Zi, Confúsio e outros exerceram grande influência na cultura tradicional da China e na mundial. Por volta de 1600 d.C., todos os governantes, na Europa, na Índia, no Japão na Rússia e no Império Otomano, estavam lutando para desenvolver burocracias sistemáticas que expandissem a sua base tributária e administrassem com eficiência seus crescentes territórios, bem como atraíssem para os novos centros do poder monárquico os recursos da agricultura e do comércio. A burocracia da China, contudo, já estava firmemente estabelecida, harmonizada por um milênio de tradição [conceito de extrema valia no país] e unida por um vasto corpo de leis estatutárias e provisões que, pelo menos na teoria, podia oferecer pareceres pertinentes a respeito de qualquer problema que pudesse surgir na vida cotidiana do povo chinês. (SPENCE, 2000, p. 27).

Nesta temática é importante entender como a China historicamente levava a cabo suas relações com o internacional, com o não chinês. Por volta do século XVII o costume e os símbolos do Ministério dos Rituais – encarregado das relações internacionais – tinha grande peso. A China tentava controlar os Estados com os quais relacionava-se sem despesas militares excessivas. Segundo Spence (2000) esperava-se

que

os

emissários

dos

países

interessados

fizessem

um

reconhecimento formal do prestigio cultural e político da China, empregando uma linguagem de subserviência nos documentos diplomáticos e fazendo as prostrações 16

rituais (kowtow) diante do imperador chinês nas audiências reais. Em troca, esses países tinham permissão de realizar um volume controlado de negócios com a China, principalmente mediante delegações especiais chamadas de “missões de tributos” pelos chineses, que podiam vir a Pequim segundo um calendário fixo anual. Na raiz das premissas básicas das relações exteriores da China estava a 9 presunção de que a China era o reino “central” e que os demais países, por definição, eram periféricos, afastados do centro cultural do mundo. […] Portanto mostravam pouco interesse por informações precisas ou estudos detalhados acerca de outros países. Basicamente os Qing [dinastia detentora do poder de 1644-1911] não se interessavam pelos ganhos que poderiam obter com o comércio exterior. (SPENCE, 2000, p. 131)

Em carta ao Rei Jorge II da Inglaterra, o Imperador Qianlong (de 1736 a 1799) explicava por que não desejava aumentar o seu comércio exterior: “Nunca demos valor a artigos engenhosos, nem temos a menor necessidade das manufaturas de seu país. Portanto, ó rei, no tocante à sua solicitação de enviar alguém para permanecer na capital, ao mesmo tempo em que não esta em harmonia com os regulamentos do Império Celestial, sentimos também que isso não nos trará nenhuma vantagem para teu país”. (In: SPENCE, 2000, p. 134)

Voltaire acerca da China disse: “O grande mal-entendido acerca dos ritos chineses surge por julgarmos as práticas deles à luz das nossas: pois levamos os preconceitos oriundos da nossa natureza contenciosa para os confins do mundo”. (In: SPENCE, 2000, p. 144). Devemos levar isso em consideração para podermos melhor compreender a tradição isolacionista da China na história das relações internacionais e quão complexo foi ver seu território – com as bélicas incursões européias mercantilistas – ser ocupado e suas tradições maculadas. Nos séculos XVII e XVIII, alguns países europeus – cultivando o capitalismo – passavam por revoluções industriais importantes e buscavam por novos mercados consumidores para seus produtos e o estabelecimento de colônias. Com a morte do Imperador Qianlong em 1799 e problemas de sucessão, a dinastia Qing se encontrava em um período de acelerada decadência. Interessada nos produtos e matérias-primas chineses e com o grande valor agregado do ópio nos mercados locais, no início do século XIX, a Inglaterra introduziu, para troca, grandes quantidades de ópio na China originando o fluxo de prata chinesas para o exterior,

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De fato China em chinês mandarin é Zhong gúo que significa país (gúo) central/do centro (Zhong).

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que trouxe uma alta vertiginosa dos preços do metal e dificuldades financeiras para o país. A Dinastia Qing reagiu proibindo-o, mas com a intenção de proteger sua lucrativa troca mercantil, o Reino Unido iniciou uma guerra de agressão a nação chinesa que acabou – em 1840 – obrigando o governo Qing a assinar o “Tratado de Nanjing” que foi para os chineses um humilhação e fez um país, uma nação, perder sua soberania, conceito tão importante para as nações ocidentais (SHI, 1997, p.35). Durante a última década do século XIX na China, o velho e o novo coexistiam. Ainda que somente nas cidades portuárias livres e devido às representações estrangeiras. O ritmo das mudanças parecia irresistível e irreversível. Barcos a vapor cruzavam o Rio Yangzi10 e mudavam a paisagem juntamente com outras peculiaridades ocidentais. As potências ocidentais haviam imposto sua presença na China e começavam a investir maciçamente no país, o impacto do imperialismo foi profundo. No interior a situação era diferente. As estações passavam e a semeadura e a colheita ainda eram as mesmas, as vezes adicionada de notícias distantes de mudanças no litoral. Assim, de certo modo, a marcha do imperialismo estrangeiro sobre a China tinha um efeito destrutivo: enfraquecendo as estruturas tradicionais da China, ela estaria apressando o dia do êxito da revolução proletária11.(SPENCE, 2000). Em 12 de fevereiro de 1912, devido a grandes pressões e buscando a manutenção de seus bens e vidas, a corte Manchu da dinastia Qing anunciou a abdicação do imperador Puyi de menos de sete anos. O édito de abdicação foi curto e simples. Com poucas palavras encerrava-se mais de dois milênios de história imperial. Dai por diante até a formação da Republica Popular da China (RPC) em 1949, o povo chinês passou por um período muito conturbado: muitos conflitos, fome, falta de liderança unificada e duas grandes guerras mundiais que afetaram e ajudaram a mudar o rumo político de toda uma nação.

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Importante rio na parte centro-sul da China “Nossa China é uma nação rural e a maioria da classe trabalhadora é composta de camponeses. Se eles não forem libertados, toda a nossa nação não será libertada também; os sofrimentos deles são os de toda a nação; as vantagens e deficiências da vida deles são vantagens e deficiências de toda nossa política. Saiam e desenvolvamnos e façam-nos saber [que eles devem] exigir libertação, falem sobre os sofrimentos deles, acabem com a ignorância deles para que se tornem gente que irá planejar sua própria vida”. Li Dazhao aos estudantes chineses que ensinava. (In: SPENCE. 2000, p. 304) 11

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A esperança dos políticos mais progressistas da China, enquanto lutavam para estabelecer uma república viável em lugar do desacreditado sistema imperial, era a criação de uma nova síntese governamental que transformaria o país em uma naçãoEstado moderna.(SPENCE, 2000, p. 271).

O confucionismo que moldara e formara a ideologia chinesa de relações interpessoais e dos governantes com os governados, já não lhes servia mais como código de leis únicas e supremas para regerem seu dia a dia, nem tampouco o Estado. Ele fora colocado em questão pelos intelectuais chineses que buscavam respostas em vários outros sistemas de organização do mundo afora visando responder às necessidades chinesas. Sob o impacto tanto da revolução russa em outubro de 1917, quanto do tratado de Versalhes ao fim da primeira Guerra Mundial – que foi considerado injusto pelos chineses – ocorreu o movimento de Quatro de maio, em 1919, considerado a origem ideológica de uma série de acontecimentos importantes que formariam a história moderna da China. Este movimento não diz respeito somente ao encontro de estudantes na praça de Tiananmen em uma manhã de maio de 1919, mas sim à discussão do darwinismo social e o crescimento do interesse pela ideologia comunista que eram sintomas de um levante cultural que se espalhava por toda a China naquele momento. Os eventos ocorridos deste dia em diante mostravam como ideais, além daqueles trazidos pelas nações imperialistas, repercutiam dentro do país e moviam massas em busca de novas ordens de organização. Os jovens estudantes tomavam grande parte nestes acontecimentos, como sempre haveria de ser. Protestos ocorriam de todos os tipos: manifestações de multidões, poemas em muros e cartazes, publicações, reuniões, grupos de estudos. Era como se as decisões do pós-guerra na longínqua Europa e a evidência crescente da falta de liderança e energia dos políticos corruptos da China atual, unissem-se na mente do povo e os impulsionassem a buscar uma maneira de devolver sentido à cultura chinesa. Através da força das idéias e das pessoas que o apoiaram, o Movimento Quatro de Maio provocou mudanças na consciência que, por sua vez, abriram possibilidades novas para a vida e a ação na China. É o surgimento do que veríamos sempre daqui para frente, a força popular como fator ativo na tomada de decisões. O confucionismo sempre pregara a subserviência aos governantes, agora com ele em questão, sem referências, e sentindo que não havia rumo nas lideranças chinesas, levantes populares ocorriam; 19

o pensamento corria solto. Enquanto no governo republicano instituído depois da renúncia da dinastia Qing tudo era muito difícil e se sentiam sem base de governo. Outros ideais surgiam e abalavam ainda mais essa base fraca que os sustentava. É aí que notamos um florescimento e estruturação do ideal marxista–leninista chinês. Li Dazhao, figura importante do quatro de Maio, um dos primeiros marxistas chineses e futuro fundador do partido comunista na China, dizia à juventude chinesa que as raízes do socialismo marxista podiam ser procuradas: “em três aspectos da nossa psicologia [chinesa]”: através do conhecimento, os chineses veriam o socialismo como uma crítica válida à ordem existente; através do sentimento, eles compreenderiam o socialismo como uma emoção que tornava possível a substituição da ordem corrente por uma nova; e através da vontade, eles alcançariam essa transformação aplicando esforços sobre o mundo objetivo. (In: SPENCE, 2000, p. 305).

Em julho de 1921, em um barco no meio do lago Zhejiang, encerrava-se a primeira reunião plenária do Partido Comunista Chinês (PCC), onde Mao Zedong, agentes do Comintern soviético e militantes comunistas chineses discutiram as questões centrais do momento e procuraram produzir um documento que estaria dentro da linha de posições básicas da União Soviética. Em 1922, o PCC já contava com mais de duzentos membros sem incluir os que estavam no exterior, como os jovens estudantes chineses mandados a estudar no ocidente para melhor compreender os movimentos operários e as teorias sociais; entre eles Deng Xiaoping e Zhou Enlai que se encontravam na França. O partido da situação – Guomindang (Partido Nacional do Povo), detentores legais do poder –possuía também certas vertentes socialistas no seu início, inclusive contava com apoio técnico e ideológico da recém estruturada URSS. Às grandes dificuldades políticas do Guomindang entretanto, adicionava-se: a fome proveniente da seca de 1919/20/21, o imperialismo crescente japonês na região e as eternas disputas com os Senhores Guerreiros. Não havia unidade territorial na China sob o comando de um único poder central. Na economia, a queda dos Qing não trouxera nenhuma independência do poder econômico estrangeiro. Entre 1912 e 1923, enquanto a economia chinesa se expandia, a participação estrangeira nos investimentos totais em navegação, por exemplo, continuava em torno de 77%. (SPENCE, 2000, p. 322).

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Os conflitos entre os poderes vigentes provocavam luto constante na sociedade chinesa. Os Senhores Guerreiros estavam envolvidos em muitas lutas e traziam consigo o peso da tradição que sempre confrontava os novos ideais da juventude chinesa. Cidadãos comuns, intelectuais e estrangeiros observavam, abismados, como se desfazia toda uma história, todo um costume devido a falta de união. É compreensível pois, entender como um povo outrora isolacionista, com a obtenção de sua unidade territorial, se voltasse novamente para dentro depois de tanto descaso com a vida como ocorreria após a formação da RPC. A Segunda Guerra Mundial foi ainda mais sangrenta na história chinesa. Durante a década de 20 o país estava dividido em territórios de poder de senhores guerreiros e do Guomindang de Chiang Kai-shek além da influência do PCC e seus sovietes. O PCC organizava-se principalmente em organizações operárias e no campo, formavam sovietes, pregavam a ideologia aos camponeses, e nesta época, realizavam uma reforma agrária não radical para não afastar de si as famílias abastardas terratenentes. Em 1930, os ataques do Guomindang e seus aliados ao PCC nas cidades estavam se tornando mais selvagens e mais bem sucedidos. As organizações operárias estavam em confusão, infiltradas por agentes do Guomindang que enfraqueciam o movimento. A superioridade militar do partido de Chiang Kai-shek obrigou o PCC a desenvolver uma estratégia bem sucedida de sobrevivência, pela qual desistia temporariamente de suas bases urbanas e apoio no proletário e se reconsolidava no interior. Há de se entender que nunca havia se constituído um capitalismo verdadeiro na China, portanto era de se esperar que o comunismo não viesse baseado somente – e principalmente – no proletariado, nas massas urbanas, e sim do campo; dos camponeses pouco instruídos, os mais afetados pela desestruturação proveniente do imperialismo e da falta de poder vigente central. O PCC sentia isso e lá no campo encontrou a força que necessitava para enfrentar o Guomindang e as outras forças que por ventura poderiam impedi-lo de formar uma república popular. Na década de 30, o Japão buscando difundir o que acreditava ser a superioridade da cultura nipônica – em seu momento expansionista – foi ao continente em busca de novos territórios; diziam estar trazendo ordem para a China. Tanto a Coréia como a China foram alvos deste expansionismo japonês, que foi violento e brutal, trouxe a milhares de civis a morte e a milhares de mulheres o 21

estupro e a vergonha de carregar filhos bastardos. Eles invadiram a Manchúria e lá tencionavam, e estabeleceram, um governo japonês – o Manchukuo. Em maio de 1933, desmoralizados e divididos, os exércitos chineses pediram paz e assinaram a uma trégua que lhes foi humilhante. A trégua de Tanggu estipulava que o nordeste da província de Hebei deveria ser uma zona desmilitarizada, patrulhada somente por policiais chineses sem armas hostis; a Manchúria pertenceria aos japoneses que já detinham também controle de cidades costeiras importantes como Shangai. Em agosto de 1934 – em resposta à política de Chiang Kai-shek de combinar um bloqueio econômico da região do Soviete de Jiangxi (um dos mais importantes do movimento comunista) com um cerco militar – os comunistas decidiram iniciar a “Longa Marcha”. Os dirigentes do soviete – entre eles Zhou Enlai – concluíram que o soviete deveria ser abandonado, mas que eles contariam apenas com o elemento surpresa para cruzar o bloqueio do Guomindang. Um grupo de mais de 80 mil homens, insuficientemente armados, deixou o soviete no dia 16 de outubro de 1934. Vinte e oito mil pessoas ficaram para traz, em sua maioria feridos, mulheres e crianças. Começara a “Longa Marcha”, um dos elementos centrais na História da China. Várias derrotas no seu caminho ocorreram, seus homens passaram por frio e fome, porém culminou em uma vitória estratégica ideológica marxista-leninista quando – 370 dias e 10 mil quilômetros depois – em 20 de outubro de 1935, eles chegaram à província de Shaanxi. Dos oitenta mil que haviam partido restara metade. No caminho os dirigentes partidários inflamavam as populações camponesas ou urbanas do interior com os ideais comunistas evocando o velho entusiasmo com o ideal coletivista em uma terra povoada de pobres. Realizavam comícios, distribuíam mercadorias confiscadas para os com fome, discutiam a reforma agrária e formavam comitês revolucionários que ficavam para trás difundindo ideais. Durante a “Longa Marcha” , em janeiro de 1935 – em Zunyi – Mao foi nomeado membro efetivo do Comitê Permanente do Politburo e assitente-chefe de Zhou Enlai para planejamento militar. O objetivo agora era formar um governo de defesa nacional unido para que todos os chineses pudessem unir forças contra a agressão japonesa. No lado do Guomindang, a Chiang Kai-shek parecia mais importante derrotar os comunistas primeiro a barrar o expansionismo japonês. Porém o exercito japonês avançava em direção à Mongólia interior e estava em andamento um fortalecimento da relação nipo-germânica. Num momento em dezembro de 1936, Chiang Kai-shek 22

foi capturado pelas forças do PCC, sob o comando de Zhang Xueliang. Depois de muita discussão, ficou decidido que ele não seria executado para não colocar o país em guerra civil maior. Sua popularidade como líder nacional aumentou quando foi liberado. O PCC se dispôs a colocar seu exército a serviço do Guomindang caso fosse anunciada uma frente nacional ampla contra os japoneses, proposta que foi recusada pelo partido nacionalista que mantinha sua linha anticomunista. A declaração de guerra total com o Japão em 1937 acabou com qualquer chance de Chiang Kai-shek criar uma Estado-nação forte e centralizado. O início da Segunda Grande Guerra Mundial na Europa, no verão de 1939, fortaleceu o poder nipônico em território sino. Pequim tombou. A Europa estava ocupada demais com sua própria guerra, a Ásia estava esquecida. Os japoneses haviam tomado – em um ano – os maiores centros industriais e as terras mais férteis12. Haviam isolado ainda mais a China do mundo. O “imperialismo europeu” não mais existia. A resistência comunista estava isolada nas terras pouco férteis de Shaanxi. E os nacionalistas do Guomindang em terras mais férteis em Chogqing. Inicialmente combatiam o mesmo inimigo, o Japão, mas já no inicio de 1941, embates entre comunistas e nacionalistas foram retomados; parecia improvável que um dia a China teria novamente um governo chinês unido. O desalento era enorme na população. A destruição japonesa era grande. A guerra parecia infinita e a paz uma mera lembrança em toda uma geração. Neste mesmo ano, 1941, os EE UU entraram na guerra. Suas ações no Pacífico foram essenciais para a libertação chinesa do julgo nipônico. Foi neste momento que a China passou a ser tratada pelas nações ocidentais – os Aliados – como “uma grande potência”.13 Ao Guomindang foram oferecidos empréstimos, armamentos e suprimentos. Ao PCC nada. O Guomindang era o governo legal reconhecido pelo ocidente. Da necessidade de sobrevivência, o PCC na pobre Shaanxi, se esmerou na arte da guerrilha – fazendo uso de armas rústicas e criando labirintos subterrâneos para surpreender os japoneses. Em agosto de 45, os soviéticos vieram em ajuda através do leste da Ásia, atacando os japoneses pela antiga Manchúria – na época Manchukuo.

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Ver mapa anexo 2. Para os ocidentais era – no momento – importante contar com os chineses, exaltando-os. Atraindo-os para si, ajudavam a conter o “eixo” e a posteriori a expansão comunista vinda do norte. 13

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Ao final da Segunda Guerra Mundial – duas bombas de destruição em massa depois – o Guomindang estava desmoralizado, fraco, endividado e dividido. Suas áreas controladas passavam por um processo inflacionário grande. Tentavam retomar o poder nas áreas anteriormente ocupadas pelo Japão, mas lhes faltava pessoal, tendo então que manter no governo pessoal que antes apoiara o julgo nipônico sem mencionar a corrupção dentro do partido. Isso desencantara a população e lhes fizera perder muito do apoio popular. O PCC, também buscando com seus parcos recursos tomar dirigência dos territórios ocupados pelos japoneses, partiram em grande parte para a região da Manchúria. Destituíam todos que apoiavam o regime do Manchukuo. A Ásia mudara. A Europa estava em ruínas. A China deparava-se com uma organização das relações internacionais distinta. EE UU e URSS eram os novos pólos de poder, e isso mudava muito a situação interna chinesa. Ao deixar o território chinês livre, os soviéticos haviam também deixado para trás enormes estoques de armas e munições para as tropas do Exército Vermelho do PCC. Esses comandados por Lin Biao tomaram a frente na região rearmando-se. O Guomindang desintegrava-se. Faltava-lhes um plano de governo que unisse a China sob o seu comando. Apesar de tentativas de Mao e Chiang de unirem forças, uma guerra civil foi inevitável. Depois de anos em guerra contra poderes além-fronteiras, os chineses mergulharam em uma guerra entre vizinhos. Enquanto isso, nas áreas dominadas pelo PCC, intensificava-se o processo de reforma agrária. A tática comunista era particularmente eficaz no norte, não só pela destruição que estes viveram nas últimas quatro décadas, mas também pelo fim da velha ordem social de associações de linhagem e religião. Nestas comunidades fragmentadas foi fácil para o PCC, com uma ideologia forte, penetrar. Ele dava terra a quem nada possuía antes. No campo ele construía a base forte para levar a revolução para as cidades, em sua maioria sob o comando dos nacionalistas. Eles buscavam o fim da propriedade privada. No ínterim, Lin Biao se esforçava para constituir de forma tradicional o Exercito de Libertação Popular (ELP). (SPENCE, 2000) A inflação era alta nos territórios nacionalistas. O uso do dinheiro era difícil, com as tabelas de preço sendo trocadas várias vezes ao dia. Um processo parecido com o que acontecia na Alemanha do pós-guerra.

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Neste palco de descontrole econômico e político por parte do Guomindang, os comunistas tomaram o papel principal e lograram alcançar o poder central da China. As guerrilhas camponesas sufocavam as saídas das cidades e suas linhas de suprimentos. Em 1948, o exército nacionalista passava fome. Com o material bélico soviético deixado para trás e as vitórias sobre o exército de Chiang Kai-shek, Mao Zedong decidiu abandonar a guerra de guerrilha e partir para o combate aberto. Eles já estavam à margem do rio Amarelo, nas cercanias de importantes complexos ferroviários para a China. Tianjin – uma importante cidade a menos de 200 quilômetros de Pequim – foi tomada pelo recém formado Exercito de Libertação Popular (ELP) e Lin Biao em janeiro de 1949. Avançando então em direção a Pequim, o general nacionalista em comando na cidade se sentiu obrigado à rendição. Tropas comunistas entravam em 31 de janeiro na capital chinesa. O Guomindang ainda era o partido da situação, porem Chiang já renunciara há dias, o que fragilizava ainda mais o poder nacionalista. Era difícil para o PCC tomar conta de um território tão extenso pela primeira vez. Estavam acostumados com o campo e aldeias. Mas eles haviam tomado as cidades. Funcionários do Guomindang eram mandados para casa ou então passavam por um processo de reeducação política socialista para serem incorporados às forças do ELP. Chiang Kai-shek estava isolado na região de Nanquim e Shangai; até que decidiu refugiar-se em Taiwan – a ilha chinesa no Pacífico que por muito tempo foi colônia japonesa mas com o final da Segunda Guerra voltara ao poderio chinês. O substituto de Chiang Kai-shek na presidência do Guomindang e da China, Li Zongren, encontrava dificuldades extremas com as pressões do PCC que: Liderado por Mao Zedong exigia oito pontos inflexíveis: (1) punir todos os criminosos de guerra; (2) abolir a inválida constituição de 1947; (3) abolir o sistema legal nacionalista; (4) reorganizar os exércitos nacionalistas; (5) confiscar todo o capital burocrático; (6) reformar o sistema agrário; (7) abolir todos os tratados traiçoeiros; (8) convocar uma conferência Consultiva Política Plena para formar um governo de coalizão democrático. (SPENCE, 2000, p. 486).

É interessante notar como o PCC buscava tomar o poder de forma legítima para evitar conflitos posteriores em demasia. Li examinou tais termos enquanto todo o ELP estava a postos no território chinês para evitar que forças externas à China tomassem parte nos conflitos. Foi um gesto e um aviso antiimperialista para as 25

nações que já se reestruturavam da guerra e buscavam ganhar mercados novamente. Com a recusa de Li – em abril de 1945 – uma após a outra, as cidades ainda sob o governo nacionalista foram tomadas quase sem resistência pelo PCC. Nos meses seguintes o ELP esforçou-se para dominar toda a grande China. Em finais de setembro, na Conferência Consultiva Política em Pequim, esta foi novamente designada capital do país, estabeleceu-se uma bandeira vermelha com uma estrela de cinco pontas amarelas e quatro estrelas secundárias14 e foi ordenado que os anos voltassem a ser designados de acordo com o calendário gregoriano ocidental. O anuncio oficial de Mao Zedong foi feito no Portão da Paz Celestial, na entrada da Cidade Proibida. Em primeiro de outubro de 1949 foi formalmente fundada a República Popular da China.

14

A estrela grande representava o PCC e as quatro menores, as classes que constituíam o novo regime: a burguesia nacional, a pequena burguesia, os operários e os camponeses.

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CAPÍTULO 2

O PERÍODO MAOÍSTA

O estabelecimento da República Popular na China marcou um grande divisor com o passado. Ela trouxe um novo modelo de governo, uma nova elite e foi um grande avanço em relação às performances econômicas anteriores. “Foi o equivalente chinês à revolução Meiji de 1868 no Japão”. (MADDISON, 1998, p. 15) Ambos países executaram sua estratégia de desenvolvimento sem o objetivo de prover um papel importante aos interesses capitalistas estrangeiros; levando-se em consideração que a China criava uma economia orientada pelo comunismo – inspirada nos modelos soviéticos – enquanto o Japão buscava uma variante do capitalismo. A RPC logrou

sucesso

em

áreas

que

o

governo

anterior

falhara

compulsoriamente. Ela foi capaz de trazer ordem interna, integridade territorial e alocar recursos para projetos de defesa e desenvolvimento. A ideologia comunista trouxe – em sua primeira fase – união segurança e crença na população chinesa de melhoria de vida, portanto os dirigentes contaram com a máquina populacional do país como apoio para seus projetos de governo. Este apoio perduraria, sob o ideal comunista e o culto a Mao, por vários anos. O novo regime tinha quatro objetivos maiores: mudar a ordem sócio-política, acelerar o crescimento econômico, melhorar a posição geopolítica chinesa e reestruturar a dignidade nacional. Neste contexto houve duas fases distintas de políticas e performances desde a criação da República Popular. A primeira delas é a fase maoísta que durou até 1978 e a segunda constitui o período de reforma de 1978 aos dias de hoje.

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2.1

A DITADURA DEMOCRÁTICA POPULAR

Entre a sociedade capitalista e a sociedade comunista, há o período de transformação revolucionária da primeira na segunda. A esse período corresponde também em período de transição política em que o Estado não poderá ser outra coisa que a ditadura revolucionária do proletariado.(MARX, Gotha: Comentários à margem do Programa do Partido Operário Alemão. 1875).

Na metade de 1949, Mao Zedong escreveu um ensaio intitulado “Sobre a ditadura democrática popular”. Nele ele resumia os preceitos básicos que constituiriam o recém-formado Estado chinês; esta experiência poderia ser classificada em duas categorias básicas: A primeira era a mobilização das massas da nação para construir uma “frente unida interna sob a liderança da classe trabalhadora”. Essa frente unida incluía o campesinato, a pequena burguesia urbana e a burguesia nacional, bem como a classe operária, e formaria a base de uma “ditadura democrática popular”, liderada pela classe trabalhadora. A segunda categoria abarcava os aspectos internacionais da revolução, inclusive a aliança da China com a União Soviética, os países do bloco soviético e o proletário mundial. (In: SPENCE, 2000, p. 489).

Ele – Mao Zedong – e o povo seriam ditatoriais aos que consideravam como “lacaios do imperialismo”15, bem como aos terratenentes e burgueses burocratas, enquanto o povo simples teria a capacidade de gozar a vida em um novo Estado, uma república do povo, com liberdade, enquanto a China desenvolveria seus potenciais socializando a agricultura e constituindo poderosas indústrias estatais de base. Os três primeiros anos após a instituição da República Popular foi um período de tentativa de restauração da economia nacional. Houve o confisco das empresas do capital burocrático e a sua transformação nas empresas estatais, a abolição do regime agrário feudal, o confisco de terras dos senhores e sua distribuição – em algumas regiões – entre os camponeses com pouca ou nenhuma terra, cumprindo as promessas feitas antes da tomada do poder. A China dedicava-se ao estabelecimento gradual da economia de propriedade pública dos meios de produção. De 1953 a 1956, camponeses foram conduzidos a organizar-se nas cooperativas de produção agrícola, tal como os artesãos a organizar-se nas 15

Uma das várias denominações correntes na época para os que eram considerados contra o regime.

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cooperativas de produção artesanal; a indústria e o comércio capitalistas foram transformados em empresas mistas, de capital estatal e privado. A economia de propriedade pública passou a ocupar a maioria absoluta na economia nacional. Em grande parte, estas medidas tomadas nos primeiros anos basearam-se na experiência soviética para a construção de una nova China. Era um “plano ambicioso de reforma agrária através da redução de arrendamentos e redistribuição de terras, e para o desenvolvimento da indústria pesada” estima-se que no centro da China meridional cerca de 40% da terra cultivada foi desapropriada e redistribuída e que 60% da população, de alguma maneira, beneficiou-se com isso; “a reforma destruiu efetivamente a base do poder da velha elite fundiária no campo” (SPENCE, 2000, pp 490-1). Lei e ordem, redistribuição de terras, aumento de produção, controle de inflação e indústrias pesadas eram temas principais da pauta governamental. O novo governo era composto por três poderes centrais: o Partido Comunista, a estrutura governamental formal e o exército; legado da experiência do soviete de Yan’an e da guerra civil. Para fins de organização militar a China foi dividida em seis grandes regiões16 sob o comando do Exército de Libertação Popular. O primeiro plano qüinqüenal de 1953 a 1957 logrou um bom sucesso no contexto geral17, mas já no final de 1956 notava-se que a tentativa de impor a agricultura cooperativa a algumas comunas levou ao caos e declínio da produção, conseqüência de má administração e de ordens contraditórias. No ínterim, durante o Vigésimo Congresso do Partido Comunista Soviético, Khruschev começava a fazer críticas a condução política e econômica da era Stalin. Este era muito admirado por Mao; o ataque do atual líder soviético ao seu ícone é, em parte, o início tanto de uma ruptura da China com a União Soviética como da deflagração da campanha das Cem Flores18. Historiadores e analistas discutem se a campanha das “Cem Flores” foi uma armadilha preparada por Mao para descobrir quem eram os adversários do regime que haviam permanecido calados e fazê-los autodenunciar-se para a repressão, ou se a amplitude e a virulência dos ataques também o teriam tomado de surpresa, acreditando ingenuamente poder atrair os intelectuais dando-lhes uma aparência de liberdade com o convite para apresentar críticas “construtivas” ao partido. (MEZZETTI, 2000, p. 57).

16

Ver mapa anexo 3. Ver tabela anexo 4. 18 Para maiores informações sobre a campanha das “Cem Flores” ver CHANG-SHENG, Shu. Os intelectuais chineses e o Estado: o movimento das Cem Flores. Tese (doutorado em História) – Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2002. 17

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2.2

O GRANDE SALTO ADIANTE

Ao final do Primeiro Plano Qüinqüenal foi lançado o “Grande Salto Adiante”: um movimento em direção a um comunismo diferente ao vivido pela União Soviética. A ajuda soviética no desenvolvimento industrial custava caro para a China. Um dos motivos da necessidade de um grande excedente agrícola era para pagar os empréstimos de Moscou. O plano do Grande Salto opunha-se à abordagem mais cautelosa da União Soviética em relação ao desenvolvimento econômico e à mobilização de massas. Segundo Mezzetti (2000, p. 61), o Grande Salto era a coletivização da vida como um todo: Lançado entre janeiro e maio de 1958, o Grande Salto consistiu na criação das comunas populares, entidade nova que incorporava aldeias e fazendas cooperativas com coletivização integral e integrada da agricultura, da indústria, do artesanato e do comércio. Morava-se em dormitórios, comia-se em refeitórios comunitários, não se fazia 19 mais o trabalho individualmente e sim em equipe, tal como decidido pela organização.

Havia um grande teor ideológico neste processo colocado aos chineses. Spence, acerca do Grande Salto, recorre às palavras de Mao onde demonstra suas convicções: Revolução contínua. Nossas revoluções vêm uma depois da outra. A partir da tomada do poder em todo país em 1949, seguiram-se rápida sucessão a reforma agrária antifeudal, a cooperativização da agricultura e a construção socialista da indústria comércio e artesanias privadas […] Agora devemos iniciar uma revolução tecnológica para que possamos superar a Inglaterra em quinze ou mais anos […] Depois de quinze anos, quando nosso alimentos, ferro e aço se tornarem abundantes, deveremos tomar uma iniciativa muito maior. Nossas revoluções são como batalhas. Após uma vitória, devemos imediatamente propor uma nova tarefa. Dessa forma, os quadros e as massas estarão para sempre cheios de fervor revolucionário, em vez de presunção. Com efeito, não terão tempo para presunção, mesmo que gostem de se sentir presunçosos. Com novas tarefas sobre os ombros, estarão totalmente preocupados com os problemas de cumpri-las. (In: SPENCE, 2000, p. 62-3)

19

Para melhor ilustração de como era a vida durante o Grande Salto recomendo o filme: TEMPO de viver. Direção: Zhang Ymou. Roteiro: Yu Hua Wei. Produção: Kow Fuhong e Christopher Tseng. Intérpretes: Ge You, Gong Li Niu Bem e Guo Tão. 1993. Rio de Janeiro: ANIMATRIX 2003. 1 fita de vídeo (129min), VHS, son., color. Ver também o livro: CHANG, Jung. Cisnes selvagens: três filhas da China. 1º reimpressão. São Paulo: Companhia das Letras, 1994.

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Segundo vários autores – entre eles Spence e Mezzetti – e inclusive em discursos da época, Mao considerava os chineses como páginas em branco. Por serem pobres e incultos “gente pobre quer mudar, quer fazer coisas, quer revolução. Uma folha de papel em branco não tem nódoas e assim as palavras mais novas e belas podem ser escritas nela, as figuras mais novas e belas podem ser pintadas nela” dizia Mao. (in SPENCE, 200 p. 545). Entretanto não tardou para que o Grande Salto se demonstrasse um fracasso inflado por falsas expectativas e políticas fora de contexto, abalando a economia e levando à fome generalizada. Afinal a China não era a página em branco. É uma civilização de história longa e costumes arraigados no seu dia a dia; nem uma revolução ideológica comunista forte como a de Mao era capaz de simplesmente apagar todo um passado cultural longamente escrito. Além disso a corrupção, os laços de filiação e o guanxi20 também atuavam como personagens presentes no dia a dia do chinês ordinário. “O golpe de misericórdia foi desferido pelas calamidades naturais, como inundações em algumas regiões e seca em outras, fenômenos, aliás, recorrentes na China […] No campo e na cidade reinavam a fome e a carestia” (MEZZETTI, 2000, p. 65). Enquanto os investimentos da China em indústria subiam para espantosos 43,4% da renda nacional em 1959, as exportações de grãos para a União Soviética também cresciam para pagar a maquinaria pesada. A quantidade média de grãos disponíveis para cada pessoa no campo, que fora de 205 quilos em 1957 e 201 quilos em 1958, caiu para desastrosos 183 quilos em 1959 e catastróficos 156 quilos em 1960. Em 1961, ela caiu de novo – para 154 quilos. O resultado foi uma fome em escala gigantesca, que ceifou 20 milhões de vidas ou mais entre 1959 e 1962. Muitos outros morreram pouco depois dos efeitos do Grande Salto – sobretudo crianças enfraquecidas por anos de desnutrição crescente. Na China de 1957, a idade média dos que morriam era de 17,6 anos; em 1963, caíra para 9,7. Em outras palavras, metade das que morreram naquele ano tinham menos de dez anos de idade. O Grande Salto Adiante, lançado em nome do fortalecimento da nação através do apelo a todas as energias do povo, tinha dado meiavolta e acabara devorando sua prole (SPENCE, 2000, p. 550).

Com slogans como “Viva o Grande Salto adiante”, “vocês todos produzam aço” e “Ninguém está tão perto quanto o presidente Mao”21 a população chinesa seguiu seus dirigentes, ilustrados na maioria das vezes na figura de Mao. Muitos na época nem tinham consciência que a fome fora causada pelas políticas verticais que lhes haviam sido impostas – principalmente os mais humildes. A economia planificada 20 21

Propina ou troca de favores Slogans retirados de: CHANG. op.cit: 1994.

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havia planificado também a fome e a informação. Os meios de informação atribuíram às catástrofes naturais a falta de alimentos foi – poucos sabiam ler. Em uma fórmula conhecida de manipulação de massas, manteve-se o cidadão comum dentro da ideologia desejada. Continuava Mao como o Grande Timoneiro, com o culto a sua pessoa presente nas casas, escolas, locais de trabalho, ruas, jornais etc. Como o “Grande Irmão” de George Orwell22. No final de 1961 a tomada de decisões econômicas da China saiu das mãos de Mao, que admitira ter tomado políticas não muito adequadas. Ela foi transferida para os que eram conhecidos como os pragmáticos na política chinesa, o já presidente Liu Shaoqi e o Secretário-geral do Partido, Deng Xiaoping. Eles começaram uma sucessão de reformas; é neste contexto que Deng Xiaoping pronunciara a observação: “não importa se o gato é branco ou preto, contanto que pegue ratos”: referindo-se à necessidade de reordenamento econômico, mais pragmatismo e políticas que aumentassem a capacidade produtiva real chinesa. Baseada em números factíveis e visando um abastecimento duradouro. Aboliram-se as cantinas públicas e a renda dos camponeses agora tinha relação com o trabalho; as propriedades familiares, que haviam sido confiscadas pelas comunas, foram devolvidas, incluindo ferramentas agrícolas e animais domésticos. Alguns tratos de terras poderiam ser utilizados para uma pequena produção privada a ser vendida nas feiras locais23. Na indústria e no comércio sancionaram-se oficialmente elementos de economia de mercado, e dentro de poucos anos a economia voltava a florescer. A perseguição aos direitistas desde de a campanha das Cem Flores fora afrouxada, percebia-se uma certa liberalização política.

2.3

OS JOVENS, MAO ZEDONG E A REVOLUÇÃO CULTURAL.

Porém não tardou que chegasse uma nova mudança no status quo da política chinesa. Em 1965, os níveis de produção agrícola tinham voltado aos anteriores ao Grande Salto, enquanto a produção da indústria leve estava se expandindo 27% ao

22

ORWELL, George. 1984. 27º edição. São Paulo: Nacional, 2002. Tais políticas implantadas pelos pragmáticos refletiam a política das “quatro modernizações” defendida por eles já antes do Grande Salto. 23

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ano e a pesada 17%. Graças aos depósitos de Daqing, a produção interna de petróleo era dez vezes maior que a de 1957, liberando a China de sua longa dependência dos fornecimentos soviéticos; a de gás natural crescera quarenta vezes24. Se esses avanços pudessem continuar, o país poderia ter uma chance de entrar em uma era de progresso econômico não espetacular, mas verdadeiro, sob a liderança do PCC “os profissionais e os planejadores do partido – não Mao e as massas – estariam abrindo o caminho para o futuro da China.” (SPENCE, 2000, p. 561) O êxito da condução político-econômica dos pragmáticos na China trouxe preocupação a Mao; pois o fez: […] sentir-se ameaçado. Liu Shaoqi, Deng Xiaoping, Chen Yun e Zhou Enlai, todos revolucionários veteranos, pareciam compartilhar cada vez menos de sua concepção de governo através da luta continua; com efeito, eles mal pareciam necessitar de sua presença ou inspiração (SPENCE, 2000, p. 562).

Ainda assim, no campo ideológico o culto à pessoa de Mao para o cidadão comum era instigado. Tanto dentro das forças armadas, impulsionado por Lin Biao – que era fiel comunista de Mao e Ministro da Defesa – como para com as massas. Apoiados pelos apoiadores de Mao e também por todos os outros dirigentes inclusive os pragmáticos. Mesmo não estando na condução das tomadas decisórias, a personalidade de Mao era respeitada, principalmente no que concerne a imagem que era passada à população em geral. É de 1964 a primeira edição dos “Pensamentos de Mao”, o livrinho vermelho distribuído como texto de estudo obrigatório para todos os integrantes do exército vermelho “e que muitas vezes republicado, se transformou em manual revolucionário para dezenas de milhões de guardas vermelhos a partir de 1966”.(MEZZETTI, 2000, p. 70) Já insatisfeito com o papel de coadjuvante na liderança chinesa e descontente com certas medidas econômicas vigentes, Mao lançou em 1965 os “23 artigos”. Um programa que em sua essência já era o da vindoura “Revolução Cultural”, onde dizia:

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Os imensos e ricos campos petrolíferos de Daqing, em Heilongjiang (norte da Manchúria) já eram explorados desde antes do Grande Salto por técnicos e camponeses usando práticas primitivas. Dados de SPENCE, 2000. p. 561

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Os inimigos de classe tentam utilizar a forma da evolução pacífica para restaurar o capitalismo. Essa situação de luta de classes reflete-se no interior do partido, no qual as alavancas de poder foram corrompidas ou usurpadas.[…] Trata-se de retificar e eliminar aqueles que, estando em posição de autoridade no seio do partido, tomaram o caminho do capitalismo; de desenvolver e consolidar, em vez disso, a frente de batalha nas áreas urbanas e rurais. […] Há pessoas assim em posições elevadas, até mesmos no Comitê Central, apoiadas por outras em posições mais baixas. (In: MEZZETTI, 2000, p. 69).

Brevemente se estabeleceria como inimigos de classe os intelectuais e artistas que não seguissem estritamente a linha da partido e que se dedicassem em demasia aos estudos, os dirigentes com passados suspeito ou que houvessem feito críticas a julgamentos de Mao e seus seguidores diretos, ex-terratenentes e quaisquer outras pessoas que julgassem serem suspeitas e seus familiares; era melhor garantir para que fosse feita uma verdadeira revolução cultural na sociedade chinesa. As observações de Jiang Qing25 e dos trabalhadores da cultura do ELP ao final de um fórum em Shangai26, diziam que se deveria “destruir a fé cega na literatura clássica chinesa e estrangeira”; este relatório final do fórum foi endossado pelo Ministro da Defesa Lin Biao, dizendo que “se o proletário não ocupar as posições nas artes e literatura, a burguesia o fará. Essa luta é inevitável”. (In: SPENCE, 2000, p.567). Podemos classificar isso como as diretrizes básicas que iniciaram a Revolução Cultural, segundo Spence: A Grande Revolução Cultural Proletária. Esse movimento desafia as classificações simples, pois embutidos nele estavam muitos impulsos que ao mesmo tempo alimentavam-se e obstruíam-se uns aos outros. Havia a concepção de Mao de que a revolução chinesa estava perdendo ímpeto devido ao conservadorismo partidário e à letargia da paquidérmica burocracia, […] Mao declarava que muitos burocratas do partido “estavam tomando o caminho capitalista”, mesmo quando pronunciavam slogans. Havia também a percepção de Mao de sua idade avançada – estava então com 73 anos – e a preocupação de que seus colegas mais antigos estavam tentando colocá-lo de lado. Havia elementos de faccionismos jogando Jiang Qing e os radicais de Shangai contra a burocracia cultural de Pequim, que queria manter suas bases no poder. Havia as estratégias políticas daqueles que divergiam claramente de Mao em relação ao ritmo e à direção das mudanças, entre os quais estavam veteranos comunistas da alta direção governamental como Liu Shaoqi, Deng Xiaoping, Chen Yun e Peng Zhen. (2000, p. 568).

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Terceira esposa de Mao, atriz coadjuvante de Shangai. Notoriamente conhecida na história como líder do “Bando dos quatros” que seriam apontados como mentores das mais conturbadas decisões da Revolução Cultural, para abrandar um pouco o papel de Mao nestas decisões. Segundo os autores mais consulados nesta monografia, Jiang Qing nutria certo desprezo pela esposa do então presidente Liu Shaoqi, talvez inveja, ciúme ou antipatia, e devido a isso deflagrou contra ela e seu marido uma grande perseguição política durante a Revolução Cultural. Eles foram exonerados de seus cargos nos primeiros anos do movimento. Ela, Wang Guang Mei, teve que passar por inúmeras sessões de autocríticas públicas. 26 Apoiados por Mao.

34

A Revolução Cultural foi um movimento que obteve eco na população jovem chinesa. Mao incitava-os a questionar a autoridade, não a ele próprio – a ele, eles deveriam exaltar – mas aos outros lideres, pequenos ou grandes, professores, pais, qualquer um que se questionasse o fervor socialista. Há de se entender que estamos falando de uma massa de pessoas já nascidas ou mesmo criadas sob a bandeira vermelha. Este era o mundo que conheciam, a vida ainda era difícil. A educação mantinha referências ao passado, os professores lhes exigiam respeito. Surgiu a guarda vermelha, a guarda de Mao. Jovens com braçadeiras organizados como exército que visavam manter os “ensinamentos de Mao”. Empunhavam seus livrinhos vermelhos e exigiam ser tratados de uma forma que a cultura milenar confucionista chinesa tradicionalmente não delegava aos mais jovens. Eles originalmente deviam subserviência aos mais velhos; o mais pobre aos mais ricos, o cidadão comum aos membros governamentais. Na primavera de 1966 a revolução desestabilizou estes valores tradicionais, baniu os dogmas do confucionismo – quem o defendesse estaria contra Mao. Justificou a violência contra os “negros”27. Milhares de pessoas passaram por recorrentes sessões de autocríticas, publicas ou conduzidas por agências oficiais criadas posteriormente para este fim. As escolas paralisaram seu trabalho. Não havia mais professores ou estes trabalhavam sob temor, não havia mais alunos, estes estavam preocupados com o serviço de serem a guarda de Mao. Diversas facções de guarda vermelha surgiram.28 No outono e inverno – do mesmo ano – as lutas se tornaram mais profundas e mais violentas, a destruição e perdas de vidas, mais terrível. Com todas as escolas e faculdades fechadas para a encenação da luta revolucionaria, milhões de jovens foram estimulados pelos líderes da Revolução Cultural a demolir os velhos prédios, templos e objetos de arte de suas cidades e vilas e a atacar professores, diretores de escola, dirigentes partidários e pais. […] o partido foi expurgado em seus escalões mais altos, até que Deng Xiaoping e Liu Shaoqi foram ambos destituídos de seus cargos e submetidos à crítica de massa e humilhações, junto com sus famílias. (SPENCE, 2000, p. 570).

A revolução Cultural pedia o ataque aos “quatro velhos” elementos da sociedade chinesa: velhos costumes, velhos hábitos, velha cultura e velho pensamento. Desta forma Mao volta triunfante ao poder. Os pragmáticos haviam

27

Os negros eram as pessoas suspeitas, as que eram levadas a autocríticas e também seus familiares e amigos mais próximos. 28 Novamente sugiro a leitura do livro de Jung Chang, (op.cit, 1994) para melhor ilustração da época.

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sido expurgados do partido e assim ele poderia levar sua China para o caminho correto do que achava ser o comunismo. A China isolava-se ainda mais do mundo. A produção privada fora totalmente banida, nem um punhado de verdura podia ser vendido privadamente por um agricultor. O comércio exterior era realizado através de contatos de órgãos governamentais, quem ofertava não tinha contato com quem comprava. Isso tudo em um momento em que, no mundo afora, reformas econômicas surgiam nas outras repúblicas de economia planificada socialistas. Dentro da China isso permanecia uma informação inexistente. Para o chinês comum, informações do além fronteira somente da aliada “Grande Albânia” (que nos mapas parecia extraordinariamente maior que o usual), filmes só chineses e albaneses, depois da obrigatória passagem pelos processos de censura. Iugoslávia, Hungria e Romênia passavam por processo de adaptação de suas economias às demandas do mercado, liberalização, normatização do seu socialismo utópico à realidade vigente. Processo que a própria União Soviética iniciara na virada da década de 50 com Khruschev que tanto desagradara Mao. Enfim, enquanto o líder Mao Zedong estivesse nas rédeas do poder chinês – como se encontrava naquele instante – na China não haveria liberalização da economia – tal qual os pragmáticos ensaiavam fazer – a não ser que Mao mudasse sua doutrina, o que ele não fez. Ele vislumbrava uma grande China por si só: independente de outras nações, forte, unida sob uma só doutrina, utópica, sob um grande líder. Assim como no tempo das grandes dinastias e assim como eram vistos os grandes monarcas que habitavam a Cidade Proibida em Pequim. As trocas chinesas com o exterior eram deficientes29, mesmo no campo cultural. Tudo que era ligado ao ocidental era considerado impróprio para o verdadeiro comunista vermelho. O patriotismo é um sentimento válido, justo e inerente à capacidade humana, porém a população chinesa vivia em um mundo cercado por estratégias de manipulação da informação que os formavam inaptos a fazer um julgamento que contivesse todos os elementos verídicos do todo. Portanto tal população era mantida sob o julgo de poucos. Enquanto isso, políticas agrícolas implantadas por Mao mostravam-se inadequadas e trouxe safras pouco lucrativas e produção industrial deficiente. O conhecimento técnico havia sido banido, assim as decisões tomadas por leigos não encontravam sucesso. Milhares de jovens, no auge

29

Ver tabela anexo 5.

36

do fervor revolucionário foram mandados ao campo para aprender com os camponeses. A vida era dura. A produção pequena. A Revolução Cultural, indubitavelmente um grande movimento de massa, foi essencialmente uma luta pelo poder lançada por Mao para reconquistá-lo, instrumentalizando o descontentamento das multidões que ele fora o primeiro a submeter à exaustão, à fome e ao chicote. (MEZZETTI, 2000, p. 78).

Durante dois mil anos a China tivera uma figura imperial que era o poder do Estado e a autoridade espiritual numa só pessoa. Os sentimentos religiosos que as pessoas de outras partes do mundo têm para com um deus, na China sempre foram dirigidos para o imperador. Mao, nascido camponês30, personificado como líder da República popular, possibilitou aos chineses voltar a sentirem-se grandes e superiores – tal qual se sentiam antes das incursões e do julgo europeu no final do século XIX – cegando-os para o mundo externo. A quase total falta de acesso às informações e a manipulação das mesmas para desinformar fazia da maioria dos chineses incapazes de discriminar entre os sucessos e os fracassos de Mao, ou de identificar o papel relativo dele e de outros líderes nas conquistas comunistas; o orgulho nacional era tão importante para os chineses que grande parte da população era genuinamente agradecida a Mao e tão pouco achavam ofensivo o culto a sua personalidade. Durante a Revolução Cultural vários expurgos de políticos do alto escalão ocorreram. Por serem endossadas por Mao, assim que um político era expulso passava a ser também considerado pela população um traidor, mesmo que antes houvesse sido um herói, como no caso do ex-presidente Liu Shaoqi, um pragmático, expulso junto com Deng, ele e sua esposa passaram exaustivamente por acusações públicas.31 Dos políticos que podemos destacar como mais duradouros no poder temos o premiê Zhou Enlai e o camarada Lin Biao. Lin Biao era vice-presidente, escolhido por Mao como seu sucessor. Como Ministro da defesa havia reestruturado o ELP, base de poder de Mao ideológico e de

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Porém oriundo de família camponesa rica, na classificação da RPC. Já Deng Xiaoping era oriundo de uma família camponesa média. 31 Quando presidente e primeira dama, Liu e Wang faziam viagens oficiais a outros países, por vezes foram fotografados em roupas ocidentais. Isto posteriormente foi usado contra eles. Também ambos tiveram educação com elementos ocidentais o que era muito mal visto na China dos dias da Revolução Cultural. Foram presos, Liu morreu pelos maus tratos em 1969 na prisão, sua mulher sobreviveu e quando seu marido foi reabilitado, já na década de 80, foi libertada.

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coerção. Era exaltado como um líder pela população, escrevera o prefácio do livro vermelho que era literatura imprescindível para o bom comunista. Foi um início de questionamento para a população quando em 1972, lhes foi anunciado que Lin Biao morrera em desastre de avião, com sua esposa e filho, durante uma fuga do país após uma tentativa sem sucesso de buscar apoio para assassinar Mao. Dados oficiais dizem que ele fugia para a União Soviética e seu avião caiu quando passavam na Mongólia, em 13 de setembro de 1971. Um jovem urbano mandado a aprender com os camponeses no povoado originário de Lin Biao, sobre sua morte, disse: Quando Liu Shaoqi foi derrubado, nós demos todo apoio. Naquela época, Mao Zedong foi elevado às alturas: ele era o sol vermelho e não sei o que mais. Mas a história de Lin Biao nos deu uma lição importante. Acabamos vendo que os dirigentes lá de cima podiam dizer hoje que uma coisa era redonda e amanhã, que era chata. Nós perdemos a fé no sistema. (in SPENCE, 2000, p. 580).

Publicações contemporâneas de instituições ligadas ao governo chinês dizem que a justificativa de Mao para a Revolução Cultural: Avaliou de maneira completamente errada a situação da classe chinesa e a situação política do PCC e do Estado […] O Estado e o povo sofreram os mais graves reveses e perdas desde a fundação da RPC. Vista a vida de Mao Zedong no seu conjunto, as suas contribuições para a revolução chinesa foram muito maiores que as falhas, a despeito dos erros graves cometidos na “revolução cultural”. (SHI, 1997, p. 39).

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CAPÍTULO 3

3.1

O PROCESSO DE REFORMA E DENG XIAOPING

O DESENCANTO

Mandado a trabalhar com a família a fim de reeducar-se no campo, Deng Xiaoping foi reabilitado depois da morte de Lin Biao em abril de 1973. Com um cargo submisso a Zhou Enlai – vice-primeiro-ministro – ele voltou e foi reaceito na esfera governamental por seus colegas como se nunca houvera saído, inclusive por Mao. Astutamente, Zhou o mantivera ileso das forças mais brutais da Revolução Cultural, como as que ocorreram ao outro pragmático, o ex-presidente Liu Shaoqi. Deng era um camarada revolucionário que manteria sempre a China unida, portanto, bem posta no cenário internacional, era peça essencial para uma inserção da China nos organismos supranacionais – já em 1974, Deng liderou uma importante delegação chinesa a uma sessão especial das Nações Unidas. Zhou Enlai gradativamente persuadira Mao para que o reabilitasse. A partir de então a política chinesa viu-se dividida entre duas vertentes: a moderada pragmática do premier Zhou Enlai e Deng Xiaoping e outros personagens afastados durante a Revolução Cultural e já reabilitados, e a vertente radical, refletida principalmente na figura da mulher de Mao – Chiang Ching – além de Wang Hongwen, Zhang Chunqiao e Yao Wenyuan. Mao e Zhou Enlai, as maiores forças decisórias da China, envelheciam. Mao retirara-se em parte do processo decisório, desejando manter-se somente na formulação de teorias de ordem filosófica. A saúde do premier Zhou, em 1974, agravava-se. É neste contexto que Deng Xiaoping volta à cena: como primeiro viceprimeiro-ministro do Comitê Central e finalmente, em 1975, galgando um posto de volta no Politburo, em seu Comitê Permanente, com o cargo de vice-presidente do Partido. Mao, apesar de ainda ter-lhe desconfianças, nomeou-o chefe do EstadoMaior e vice-presidente da comissão militar do Partido, cuja presidência cabia ao próprio Mao. Tudo isso numa tentativa de reorganizar a gestão de um país, econômica-político-militar, que se encontrava abalada desde os eventos da morte de Lin Biao. Apesar de ainda na Revolução Cultural, os radicais perdiam força e a 39

palavra de ordem era Modernização. Liderados pelo premier Zhou Enlai, os pragmáticos traziam novamente os ares de mudança. Em um de seus últimos discursos o premier já dizia ser necessário “completar a modernização da agricultura, da indústria, da defesa e da ciência e tecnologia” objetivos que posteriormente seriam levados a cabo por Deng (MEZZETTI, 2000). Já desde o Grande Salto adiante, Deng Xiaoping tentava introduzir os preceitos das quatro modernizações, sempre rejeitados pelos radicais que acreditavam na “revolução continua”32. Coube a ele ser taxado de seguir o “caminho do capitalismo” e à exclusão do processo decisório por diversas vezes. Em 1964, Zhou Enlai também tentara sem sucesso no Terceiro Congresso Nacional do Povo anunciar a política das Quatro Modernizações, porém o radicalismo da vindoura Revolução Cultural a rejeitara (ALVES, 2000). Agora, já na metade da década de 70, com os radicais enfraquecidos, esta proposta tomava força. No Quarto Congresso do Povo ela fora anunciada, almejavam concentrar-se no desenvolvimento das forças produtivas a fim de alinhar a base econômica à superestrutura político e social do socialismo criado desde então. Era uma tentativa de fazer com que as forças produtivas se harmonizassem com o sistema socialista. O Grande Salto e a Revolução Cultural haviam criado um vácuo entre eles. Estas disputas ideológicas no campo governamental estavam em harmonia com os levantes de ideais ocorridos na população chinesa. Era como se acordassem do sonho que lhes havia sido proposto e imposto. A morte de Lin Biao fora gota d’água para mudanças no âmbito social. Dizia um dazibao33 de novembro de 1974 em Cantão escrito por três jovens, ex-guardas vermelhos: Chineses […] não esqueçamos que era preciso “estudar dia após dia, sem trégua”. Estudar o quê? Repetir sempre o mesmo catecismo. Era preciso “reunir-se para estudar e aplicar”; estudar e aplicar o quê? Reunindo-nos e flagelando-nos em sessões cada vez mais hipócritas? As preces matutinas e confissões vespertinas, empapadas de religião e cheirando a divindade. A palavra mágica “lealdade” ocupava todo o nosso tempo […] Não esqueçamos o comunismo como “todos para todos”, isto é nada por ninguém. Não esqueçamos os massacres: quarenta mil massacrados somente na província de Cantão, um milhão de pessoas perseguidas, encarceradas.

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Um dos ícones ideológicos da Revolução Cultural de manutenção do ideal da ditadura do proletariado de Mao Zedong. 33 Grandes cartazes afixados em muros nas cidades e aldeias onde a população escrevia suas opiniões. Por vezes eram poemas, outras denuncias, pedidos de ajuda, etc.

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Ainda há pessoas capazes de não admitir o que oitocentos milhões de testemunhas presenciaram e viveram: a realidade funesta do sistema Lin Biao. Têm o desplante de pretender que a linha revolucionária do presidente sempre haja prevalecido “em qualquer lugar e tempo”. Pretendem dizer que aqueles massacres fazem parte da “linha revolucionária”? O sistema Lin Biao foi determinado pelas condições históricas da sociedade chinesa. O socialismo chinês é o parto prematuro de uma sociedade semifeudal e semicolonial, que contêm os resquícios ideológicos de mais de dois mil anos de domínio feudal. Essa ideologia até hoje não foi atacada. A tara da ditadura feudal pesa na consciência das massas e dos membros do Partido Comunista. (In: MEZZETTI, 2000, p. 82).

Aqui se encontra a hipótese do presente trabalho, o desencanto. O desencanto com o rumo da China que Mao criara trouxe o movimento de reforma. A fome, o nivelamento por baixo, políticas mal colocadas, ideologia proposta, imposta, cobrada; exaustivamente. Todos passavam a desacreditar na gestão Mao. A fartura que nunca chegava, pobreza. Perpetuação de elites no processo decisório, como uma nova dinastia, desta vez socialista. Para o chinês comum, para o camponês, a vida pouco mudara. Há quase três décadas lhes prometeram tudo para todos, bastava a força da massa chinesa, grande, unida. Agora, projetos mal sucedidos depois, tinham pouco para muitos. O desencanto tomava todos. Cidadãos e quadros políticos. Ficavam em inércia, na espera da janela que mudaria o rumo do país. Mao vivia, e sua palavra e ira eram fortes.

3.2

A PARTIDA DOS VELHOS CAMARADAS

Manifestações de apreço popular tomaram a China quando em janeiro de 1976, manhã do dia oito, aos 78 anos, Zhou Enlai faleceu do câncer que padecia havia quatro anos. Mao, já há muito debilitado pelo mal de Parkinson, não visitara Zhou nos seus últimos meses. As manifestações populares de luto por Zhou Enlai foram muitas. Era uma grande figura da realidade popular. A praça da Paz Celestial (Tiananmen) abrigou muitas flores e altares em reverência ao líder camarada falecido. Entretanto Mao permaneceu calado, sem declarações oficiais. Nas cerimônias de funeral, foi Deng Xiaoping quem proferiu o discurso de despedida ao camarada revolucionário Zhou. O país estava em luto. 41

No cenário político entretanto, havia uma grande preocupação da ala radical e de Mao. Já há um ano muito debilitado Zhou passara muitos de seus compromissos para Deng. Mao e a ala radical temiam que, com a morte do premier, Deng tomasse a liderança do país por completo. Em fevereiro seguinte, o Comitê Central nomeou Hua Guofeng34 como premier interino por indicação do presidente Mao. Hua era pertencente a vertente do presidente, combatia Deng fortemente, mesmo se apossando do lema das Quatro Modernizações em seus discursos.35 Uma campanha dentro do partido e popular foi lançada novamente contra Deng Xiaoping, acusando-o de reacionário. A memória de Zhou Enlai também estava sendo atacada neste movimento anti-Deng deflagrado por Hua e Mao; foi então que em abril, no Qin Ming – tempo de homenagem aos mortos na cultura chinesa – milhares de chineses, após depositarem suas homenagens a Zhou na praça Tiananmen, ficaram injuriados com a retirada total dos mesmos no dia seguinte. Protestos populares ocorreram violentamente. A repressão por parte do Estado também. Terminando com mais de centenas de prisões, todos classificados como contra-revolucionários. A voz popular tentava aflorar. Dois dias depois, dia sete de abril, em decreto assinado por Mao – seu ato final da vida política – Deng Xiaoping foi novamente afastado, porém não expurgado, de todos os cargos que ocupava, no Estado e no Partido. Na mesma oportunidade, Hua Guofeng, então ministro da segurança e premier interino, foi nomeado primeiroministro e primeiro-vice-presidente do PCC. Ele comandara a repressão às manifestações de luto por Zhou Enlai. Foi uma tentativa de Mao de assegurar quem ele desejava no comando da China depois que partisse. Deng Xiaoping buscou proteção dos protestos populares em Cantão. Tinha 72 anos e mais de dois expurgos no seu histórico. Mao dava por concluído o afastamento dos pragmáticos que considerava reacionários no poder.

34

Nascido em 1921, ex-secretário do partido na província de Hunan desde 1950, adentrou ao Politburo em 1973. Apoiador de Mao, ganhou o apreço do mesmo por fundar em Hunan um Dazhai de sucesso, orquestrar uma leal guarda vermelha na aldeia natal de Mao nos tempos da Revolução Cultural e fomentar a criação de uma fábrica de buttons de Mao – 30 milhões por ano. 35 Dizia que coletivizando num grau ainda maior a agricultura criando vários Dazhais (dec. 60/70. Modelo para a produção agrícola socialista obtido através da aplicação do pensamento de Mao Zedong com emprego de máquinas agrícolas coletivas) como o de Hunan onde se elevaria a produção em duas vezes e meia de grãos correntes e quatro vezes de grãos comercializáveis. Sem atinar para os padrões vigentes de plantio ou recursos das diferentes localidades, ele pregava aplicar os Dazhais em todo o país, modernizando a agricultura que desenvolveria, por conseqüência, a indústria, defesa nacional e ciência/tecnologia.

42

Em 9 de setembro do mesmo ano de 1976 Mao Zedong faleceu36. Como grande líder popular houve uma semana de luto e até hoje seu corpo repousa em um mausoléu no portão principal da Cidade Proibida. A 18 de setembro Hua realizou no discurso oficial elogios à pessoa de Mao diante de um milhão de pessoas. Todavia, em seu discurso enaltecedor, já apontava certas críticas ao radicalismo de esquerda em certas ações da política dos últimos anos de Mao, até ele desencantara-se com a aplicação de certas políticas. A população lamentou a perda do Timoneiro. Contudo, os eventos da morte de Lin Biao e principalmente, a repressão naquele mesmo ano de manifestações de carinho a Zhou Enlai – tão anteriormente exaltado – fizeram com que não houvesse uma comoção genuína como ocorreu ao antigo premier. Foram cumpridos diligentemente todos os compromisso oficiais nacionais da semana de luto. Dia 18 de setembro, às três da tarde, para as cerimônias oficiais finais, toda a China parou em silêncio por três minutos.

3.3

UM GOLPE DE ESTADO TÉCNICO

Menos de um mês passado da morte de Mao, apoiado pelas forças armadas, dia 7 de outubro, Hua Guofeng mandou prender a viúva de Mao. Chiang Ching teve grande participação nas políticas da Revolução Cultural e foi presa juntamente com outros principais participantes da ala radical do PCC: Wang Hongwen, Yao Wenyuan e Zhang Chunqiao. Isso não foi anunciado ao público. Mesmo assim, aos poucos manifestações de apoio a atitude de Hua foram sendo vistas nos dazibaos dos muros das cidades, principalmente em Pequim. O anuncio público foi feito dia 22 sob a acusação de o “bando dos quatros” haverem conspirado para usurpar o poder da direção suprema do partido e Estado. Segundo Mezzetti (2000, p. 88):

36

Além do mal de Parkinson, há muito padecia de paralisia progressiva, edema pulmonar e problemas cardíacos.

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Tecnicamente, o afastamento da viúva e dos outros três foi um golpe de Estado sobre a identificação vigente entre o Partido e o Estado. No momento da prisão, Chiang Ching, de 66 anos, era membro do Politburo; Zhang Chunqiao, vice-primeiro-ministro, chefe do departamento político do exército, membro do Politburo e de seu Comitê Permanente e primeiro-secretário do comitê do partido em Xangai; Wang Hongwen, de 46 anos, era vice-presidente do partido, membro do Politburo e de seu comitê Permanente e secretário do comitê do partido em Xangai e Yao Wenyuan de 46 anos, membro do Politburo e segundo secretário do comitê do partido em Xangai. […] Porém nunca um golpe de Estado foi acolhido com maior júbilo pela população. (grifos nossos)

Hua Guofeng firmou-se no poder desestruturando totalmente a estrutura restante da influência dos mentores da Revolução Cultural. Deng Xiaoping também se encontrava afastado, apesar de ser uma figura ainda importante. Tanto que em 1977, no aniversário da morte de Zhou Enlai – junto com manifestações de apreço a sua memória – ecoavam pedidos para a volta do pragmático Deng. Por vezes anteriores ele fora responsável pela condução da política econômica chinesa e obtivera um crescimento sustentável. Agora sem Mao no poder as coisas podiam ser diferentes. Contudo o governo Hua não trouxe mudanças à China. Ainda se fazia uso dos mesmos slogans e princípios, evocando a luta de classes, a revolução permanente e acusações à oposição (MEZZETTI, 2000). Seguia-se a política dos “dois quaisquer” de continuidade da política maoísta de gestão da economia. Segundo Shaozhi (1985, p. 5) essa política baseava-se no lema “quaisquer decisões que o presidente Mao tenha tomado deve ser apoiada firmemente; quaisquer instruções que o presidente Mao tenha dado deve ser mantida incondicionalmente”37. No desencanto, livres da influência viva de Mao, os chineses ainda se deparavam com o seu sucessor que perpetuava suas ações. Segundo Mezzetti, Hua Guofeng passou até a ser visto em pinturas imensas nos muros – China afora – sentado ao lado de Mao, com este passando-lhe o poder, com a frase que Mao supostamente lhe dissera antes da morte: “Contigo no comando, fico tranqüilo” escrita, novamente na tentativa de doutrinação. Daquela ideologia que tantos naquele momento já se encontravam questionantes.

37

“whatever decisions Chairman Mao made we should firmly support; whatever instructions Chairman Mao gave should unswervingly be carried out” (tradução livre)

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3.4

AS QUATRO MODERNIZAÇÕES E DENG XIAOPING

Deng Xiaoping opunha-se à manutenção da prática dos “dois quaisquer”. Apesar de afastado do poder oficial ainda era membro do partido, possuía seguidores em diversos setores do PCC, suas observações não eram descartadas e muitos se empenhavam por sua reabilitação. Novamente, segundo Mezzetti (2000), Hua chegou até a propô-la caso passasse a apoiar a política dos “dois quaisquer”. A proposta foi recusada. Foi o general Xu Shiyou – que recebera Deng em Cantão – quem articulou sua volta. Pressionando o Comitê Central logrou a volta de Deng em julho de 1977 a todos os seus cargos: vice-presidente do partido, vice-primeiro ministro, vicepresidente da comissão militar e chefe de Estado-maior. Em agosto do mesmo ano foi feito o anuncio oficial do fim da “Revolução Cultural” e da luta de classes, enquanto isso Deng também se ocupava em reabilitar outros quadros expurgados durante a última década. Seguiu-se um embate entre as forças de Hua e Deng. O primeiro defendendo a manutenção dos princípios de Mao, onde o conhecimento técnico exacerbado de uma área mostrava pouco interesse pelo socialismo, individualismo. A pessoa poderia ser considerado inimiga de classe e ser mandada para “aprender com os camponeses”. Já Deng “exaltava o papel dos docentes, insistia na urgência da instrução e da seleção de jovens de talento e na necessidade de levar à universidade estudantes bem preparados, não simplesmente por serem proletários”. (MEZZETTI, 2000, p. 97) Durante 1978 um grupo de 480 jovens chineses foi mandado a estudar em 28 países. Segundo Reis (1982, p. 87): A partir de 1978 Deng se fortalece cada vez mais. Sua influência deslocará progressivamente a de Hua Guofeng e, numa certa medida, ofuscará a predominância, até então incontestável de Mao Zedong, cuja atuação e pensamento passarão a ser criticados. Não só o culto perde intensidade e relativiza, mas também certas diretivas do “Grande Timoneiro” serão questionadas, sobretudo as que dizem respeito à Revolução cultural.

45

A confirmação formal de mudança de rumo na formulação da economia chinesa veio no Terceiro Pleno do 11º Comitê Central do PCC. Nele foi confirmada a busca pelas quatro modernizações, segundo Spence (2000, p. 613), “a plenária concluiu que, podendo a luta contra Lin Biao e a Gangue dos Quatro ser considerada vitoriosa, ‘a ênfase do trabalho do partido’ deveria mudar para a modernização socialista”. Alves (2000) argumenta que, além de marcar o triunfo de Deng na disputa pelo poder com Hua Guofeng e a reforma econômica, a decisão mais importante do Terceiro Pleno foi a de mudar a ênfase do partido para o desenvolvimento econômico. 38 Segundo Reis (1982), foi o próprio golpe de Estado técnico dado por Hua que propiciou a volta dos princípios das quatro modernizações. Retirando o “bando dos quatro” do poder e quase 1/3 dos quadros políticos do PCC acusados de partidários de Chiang Qing, o apoio de uma linha pragmática ficou mais forte. Adicionando-se ao fato de que Deng gradualmente reabilitava quadros outrora expurgados na Revolução Cultural favoráveis a sua via, este passou a ter grande apoio partidário para suas políticas. Foi decretado o fim da luta de classes visando propiciar uma maior estabilidade política e social para a implementação das políticas da reforma das Quatro Modernizações; o principal objetivo do país passou a ser: modernizar a agricultura, a indústria, a defesa e a ciência e tecnologia. A política das quatro modernizações é uma tentativa de melhor dimensionar a influência das mudanças internas que ocorriam na China – desde a formação da República Popular – sobre a política externa e competitividade no mercado mundial. E desenvolver o país. Basicamente é uma política em longo prazo onde segundo o próprio Deng (XIAOPING, 1983, p. 26): A modernização que nos empenhamos em fomentar é uma modernização ao estilo chinês, e o socialismo que estamos construindo é um socialismo com peculiaridades chinesas. O que fazemos é proceder essencialmente à tona com a situação e com as condições existentes no nosso país e apoiarmos principalmente os nossos próprios esforços.

38

Ficou decidido também que Hua manteria seu titulo de líder do partido para não causar abalos ao mesmo, entretanto desde então ele passou a executar somente tarefas cerimoniais.

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Acerca do socialismo em si Feng-cheng (1987, p. 1) diz que: Dando voltas por razoes indevidas e devidas Marx se empenha em “O Capital” por demonstrar que o capitalismo marcha inevitavelmente à extinção, e que em seu lugar surgiria o socialismo. Não é necessário debater aqui a correção ou não desta teoria, mas se deve apontar que em nenhuma parte do volumoso “O Capital” Marx explica como se levanta ou se desenvolve essa sociedade ideal de seus sonhos.

O caminho em si que o socialismo chinês percorreu conteve elementos peculiares e inerentes à realidade chinesa. O tamanho de seu território, sua demografia, capacidade produtiva, cultura, confucionismo, tradições, guerras, compõem uma história única. Uma realidade inerente a estes fatores. Grandes países são marcantes. A história da nação russa e a difusão do comunismo pelo mundo, tradicionalmente servem de base única para análises do socialismo. Este de fato livrou a União Soviética, por exemplo, da crise capitalista que constituía o mundo, depois de 1929. A forma que ele fora implantado foi sucedida em seu propósito por um bom período de tempo. Assim é racional compreender que este modo tenha sido usado como modelo. Entretanto não é única forma. O socialismo se constitui através das diversas formas que for implantado, sem uma maneira única, mas com um objetivo final em comum. A China camponesa – desestruturada depois de muitos anos de guerra civil, incursões européias e nipônicas – se difere da Rússia czarina em declínio onde Lênin e seus camaradas implantaram as idéias de Marx e Engels. A China da Longa Marcha, de Mao Zedong, Deng Xiaoping, Confúcio, sempre demonstrou sua busca por autenticidade; adaptando o que era estrangeiro na aplicação interna se lhes fosse necessário e desejado. Assim foi na formação da república popular, e agora era na estrutura da reforma. Relembrando Shaozhi (1985, p. 9): As reformas estruturais, lideradas em diversos países baseadas nas suas próprias realidades são o desenvolvimento da teoria de se tomar diferentes estradas para o socialismo. O Marxismo defende que há apenas um socialismo, mas os caminhos para ele variam. Assim podemos chegar a seguinte teoria: vários países socialistas podem ter diferentes estruturas; cada país socialista pode ter diferentes estruturas em estágios diferentes.

Assim, além dos diferentes caminhos das revoluções russa e chinesa, uma outra coisa que se distingue entre as duas reformas econômicas é que no caso da chinesa ela novamente foi fomentada inicialmente pelo campo, pelo camponês, enquanto a russo teve um caráter de proletariado urbano muito mais marcante. 47

Repetindo o sucesso da formação da república popular, a reforma econômica chinesa começou “cercando as cidades pelo campo” (CHUN, 1994, p. 9). Difere da proposta de Hua Guofeng, porque Deng – quem arquitetou a estratégia – discordava com o primeiro quanto a seguir priorizando a cultura camponesa não instruída como melhor forma de utilizar as terras aráveis39 e a água40. Passou a ser necessário ser “vermelho e especialista” para se fazer parte dos quadros políticos e do planejamento econômico – houve uma busca por novos quadros com titulação superior para aumentar a eficiência das decisões do Estado. Na criação do que chamaram de economia de mercado socialista do tipo chinês (MADDISON, 1998) era necessário modernizar a indústria, a agricultura, a defesa e a ciência/tecnologia. O carro chefe, a modernização da agricultura deveria ser fundamentada em um avanço tecnológico nos meios de produção agrícola. Esta deveria ser mecanizada. E os camponeses deveriam seguir uma nova ordem de trabalho onde haveria um “reforçamento da disciplina no trabalho, controle de assiduidade do sistema definido de responsabilidades, mecanismos racionais de remuneração de trabalho, […] regulação do trabalho dos indivíduos e das unidades coletivas”. (REIS, 1984, p. 92) Indústrias rurais não rentáveis deveriam ser desestimuladas. As famílias foram privilegiadas em detrimento das grandes brigadas de produção como melhor célula de trabalho. Além disso foi aumentado o número de lotes de produção particular e foi regulamenta a venda privada da produção da terra em feiras públicas. Entretanto a propriedade coletiva não foi questionada. Até hoje não é, indivíduos possuem a concessão da terra, podem até negociar a concessão destes pequenos lotes, mas a propriedade é pública. A modernização industrial implicaria numa grande absorção de tecnologia onde seriam escolhidos certos pólos específicos para desenvolvimento industrial. Priorizava-se a indústria pesada, produtora de máquinas e de meios de produção frente aos demais setores da produção industrial. O lucro por empresa voltou a ser 39

Priorizando a cultura camponesa Mao Zedong fez uso de vários projetos que resultaram em catástrofes ecológicas, mau uso e conseqüente baixa produção de terra, levando a fome generalizada em certas ocasiões (como na do Grande Salto Para Frente). Deng combatera tal política econômica. Agora implantaria a política das técnicas no plantio e uso racional das terras aráveis da China (ver anexo 6). 40 Para informações mais apuradas da situação da água na China ver: VILLIERS, Marq de. O dilema chinês: a China não está ficando sem água, exceto nos lugares em que a necessidade de água é maior. In: Água: como o uso deste precioso recurso natural poderá acarretar a mais séria crise do século XXI. pp. 360-374. Rio de Janeiro: Ediouro, 2002.

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incentivado, “quanto mais lucro para a empresa mais riqueza para o socialismo”, houve mudanças na remuneração dos trabalhadores para incentivar a produção individual, havia prêmios para os funcionários que se destacassem. O processo de modernização agrícola e industrial supõe uma ampla abertura para o mercado internacional de onde se espera venha a tecnologia avançada que permitirá emancipar a nação chinesa do subdesenvolvimento. Neste sentido, serão assinados acordos com o Japão E.E.U.U. e outros Estados capitalistas da Europa Ocidental para a importação de “pacotes tecnológicos” e de fábricas prontas. […] Os acordos internacionais, a partir de 1978, permitem e estimulam os investimentos conjuntos (jointventures) com empresas e Estados capitalistas, além de concessões para “projetos especiais” de firmas estrangeiras cuja produção se destina à exportação. (REIS, 1984 p. 93).

Neste contexto criam-se as Zonas de Produção Especial (ZPEs). Estas eram cidades escolhidas pelo Partido Comunista para aceitar investimentos externos diretos; planejadas para aumentar as exportações chinesas e servir de ponte para a adoção de tecnologia estrangeira. As primeiras zonas produtivas especiais foram Shenzhen, Zhuhai, Shantou e Xiamen, criadas em 197941. Elas tiveram papel importante na reforma – com práticas mais similares às de economias de mercado – foram grande atrativo para investidores. No campo da reforma modernizante da defesa, foi restabelecido os níveis hierárquicos que haviam sido abolidos desde 1965. Reorganizou-se as Forças Armadas com equipamentos sofisticados e treinamentos avançados de combate. As milícias populares perderiam importância e autonomia, subordinando-se ao controle dos militares profissionais. A modernização da ciência e tecnologia jogava um grande papel em todas as outras modernizações. Era necessário criarem-se técnicos e profissionais chineses para impulsionar o levante modernizante do país. Priorizou-se os especialistas em detrimento aos simplesmente vermelhos. Era uma mudança de conceito que a população teria que passar. Durante os anos de Revolução Cultural a dedicação exclusiva a uma temática era sinal de falta de fervor revolucionário e o indivíduo estaria passível a repreensões. Agora o contexto mudara, os dirigentes compreendiam que somente com pessoas que se dedicassem aos estudos se produziria prodígios chineses de nova geração. Os exames nas melhores universidades passaram a dar preferência àqueles que demonstrassem excelência

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em 1986 a ilha de Hanói e mais outra quatorze cidades também foram tornadas ZPEs.

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acadêmica e não mais um passado simplesmente proletário/camponês. Os professores recuperaram parte do prestígio perdido e o saber voltou a ser cultuado. Foi uma modernização cultural. Segundo Reis (1984, p. 95): As Quatro Modernizações representaram uma reviravolta radical em relação aos princípios e à política da Revolução Cultural. As preocupações com a produção, a produtividade e o rendimento econômico ganham prioridade absoluta. Em vez da “política no posto de comando”, celebrada pela Revolução Cultural, teremos” a política serve à economia”; as fabricas e os campos serão considerados principalmente como unidades de produção e não como espaços onde se desenrola a luta de classes; a agricultura será subordinada à necessidade do pólos industriais avançados; a tecnologia sofisticada passará a desempenhar papel decisivo, caindo para um plano secundário o slogan de Yan’an: “contar com suas próprias forças”.

Sobre processos de reforma Jan Prybyla (1986) diz que há uma diferença entre ajuste na economia e reforma econômica. O primeiro diz respeito a adequações, ajustes de políticas dentro da estrutura de um dado sistema. Sem necessariamente causar mudanças fundamentais no sistema operacional desta economia enquanto que: Uma reforma traz mudanças aos princípios do sistema governamental e nos arranjos institucionais deste sistema de geração, condução, processamento e coordenação da informação sobre custos/benefícios, motivação e distribuição dos direitos de propriedade. Reformas alteram qualitativamente o processo de tomada de decisões no sistema e o critério para a tomada destas decisões. Desta forma, marca a transformação do sistema em uma outra coisa. Para uma mudança numa economia centralizada planificada merecer o rótulo de reforma, a propriedade privada e de mercado devem se tornar determinantes na produção, no investimento e na distribuição da renda no sistema. (PRYBYLA, 1986, p. 22).

Claramente a China passou – e ainda passa – por uma reforma. A modernização é hoje força motriz do processo decisório chinês; a luta de classes foi abandonada, “vamos fazer crescer a economia para enriquecer a população” já dizia Deng Xiaoping (FENG-CHENG,1987). E quanto ao tempo de duração da reforma chinesa melhor citar o próprio Deng: A política de agilização da economia do país e de abertura para o exterior no terreno econômico não será uma política de curto, e sim de longo prazo, será uma política que não mudará, por menos, em cinqüenta setenta anos. Por quê? A razão é que para dar o primeiro passo para alcançar a meta de quadruplicação, necessitamos de vinte anos, e logo iremos dar o segundo, que necessitará de trinta a cinqüenta anos, provavelmente cinqüenta, para que nos aproximemos ao nível dos países desenvolvidos. Ambos passos juntos durarão justamente de cinqüenta a setenta anos. (XIAOPING,

1985, p. 69)

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Com as reformas a pleno vapor na China, estava claro para o cidadão chinês e para os investidores estrangeiros que a RPC estava bastante diferente da de outrora. Deng criara uma nova China (MEZZETTI, 2000). Sinuoso foi este caminho. A China porém mantinha-se unida sob um só poder central. O “País do Centro”, sob o comando de Deng, desejava fazer-se presente no mercado e cenário mundial. Ele criaria um socialismo de mercado para tornar isso viável. Mantendo a ideologia socialista para a autoridade governamental, para a propriedade e para o cidadão, ele daria à economia maior flexibilidade em busca de maior competitividade. Tudo em busca de um melhor desenvolvimento para a população. Estava criada a economia de mercado socialista do tipo chinês. O marxismo ao qual nos referimos, não obstante, há de ser um marxismo integrado com a realidade da China, e o socialismo de que falamos deve ser correspondente a realidade do país e ter peculiaridades próprias da China. (XIAOPING, 1985, p. 50)

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CAPÍTULO 4

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em 1984 o comitê Central do PCC decidia que:

A reforma da estrutura econômica de nosso país já leva vários anos de preparação e de colocação em prática. A III Sessão Plenária do XI Comitê Central, ao decidir sobre a mudança de centro de gravidade do trabalho do Partido na construção econômica, exaltou a necessidade de reformar a estrutura econômica com o objetivo de fazer real a modernização socialista.[...] O XII Congresso Nacional do Partido, defendeu a tarefa de realizar um reforma sistemática da estrutura econômica e sinalizou que tal reforma era uma importante garantia para persistir no caminho socialista e alcançar a modernização socialista. [...] As zonas rurais foram as primeiras onde a reforma da estrutura econômica registrou grandes êxitos.[...] Isso se deve fundamentalmente por, rompendo com audácia as ataduras ideológicas de “esquerda”, termos modificado a estrutura econômica que não se ajustava ao desenvolvimento das forças produtivas da agricultura e termos implantando em toda a linha produtiva o sistema de responsabilidade por contrato com remuneração em função do rendimento. [...] Entretanto só demos os primeiros passos na reforma nas cidades e ainda nos falta muito por fazer para erradicar as deficiências da estrutura da economia urbana que constituem sérios estorvos para o desenvolvimento das forças produtivas.[...] Somente mediante uma reforma enfática e sistemática poderá a economia urbana florescer e prosperar, cobrir as demandas da agilização da economia no país e de abertura ao exterior, desempenhar efetivamente o papel reitor que lhe corresponde e imprimir à economia nacional em seu conjunto o mais rápido e melhor desenvolvimento. (DECISION DEL COMITE CENTRAL DEL PARTIDO COMUNISTA DE CHINA SOBRE LA REFORMA DE LA ESTRUTURA ECONOMICA, 1984, PP. 3-6)

Longo foi o caminho. Através do objeto deste trabalho compreendemos que o florescimento do socialismo na China no começo do século XX foi necessário para trazer de volta a unidade territorial e soberania a uma nação. A República Popular formada em outubro de 1949 trouxe a organização a meio século de desordem. Um parque industrial pesado acabou por ser constituído e a reforma agrária delegou terra aos camponeses chineses. Também lhes foi oferecida uma nova ideologia a crer: a China Comunista sob o timão de Mao Zedong. E ainda: por quase três décadas as políticas foram estabelecidas de acordo com os pensamentos de Mao Zedong, sob sua doutrina e observação. Sempre articulando a sua manutenção no poder para levar a China onde acreditava ser o melhor caminho ao comunismo. Entretanto, durante a análise com base nos autores abordados neste trabalho demonstrou-se como os dois ícones da era Mao – o Grande Salto Adiante e a 52

Revolução Cultural – em termos de políticas de desenvolvimento tanto econômico quanto social, não lograram êxitos. De fato, a despeito da conquistada unidade territorial, a RPC de Mao mostrou-se composta por políticas equivocadas que falharam em alcançar as potencialidades produtivas da China. Por vezes a população foi posta em fome e por outras coagida socialmente devido a programas de mudanças culturais que acabaram nivelando todos por baixo. Como em um teste para a lealdade chinesa aos seus soberanos, ao final destas três décadas reinava o desencanto. A resignação e o trabalho árduo os mantinham em espera, a idade alcançava Mao e uma sucessão era inevitável e um meio de mudança estrutural. Em uma ênfase nos fatores internos, isto confirma a hipótese do presente trabalho, era necessário que ele deixasse por completo o poder. No campo político, não somente Mao havia se destacado durante a formação da RPC, figuras como Liu Shaoqi, Zhou Enlai, Deng Xiaoping e Lin Biao, também mantinham poder no processo decisório chinês. Todavia, durante a primeira quinzena de anos apoiaram o culto a Mao como força de união popular sob a ideologia socialista de Grande China. Ele tanto conquistou por mérito o poder no início, como lhe foi oferecido o papel de líder. Isso criou um grande personalismo que posteriormente perpetuou seu poder decisório mesmo quando alguns, também do governo, acreditavam que ele estava tomando decisões equivocadas42. Com esse poder, Mao astutamente manejara os personagens que desejava. Deng Xiaoping – o ícone da era da Reforma43– por diversas vezes foi expurgado; ele mantinha divergências demasiadas com o líder Mao Zedong. De qualquer forma este também sempre soube manejar bem sua volta ao círculo governamental e estava lá, às vésperas da partida dos velhos camaradas Zhou Enlai e Mao Zedong44. Mesmo os quadros políticos, leais ou não ao Timoneiro nutriam certo desencanto pelo resultado de trinta anos de gestão Mao. Mesmo Hua Guofeng, escolhido a dedo por Mao como sucessor, foi o precursor da crítica às políticas Mao.

42

Referência aos pragmáticos Na década de oitenta, Deng passou a ocupar a lacuna deixada na vida dos camponeses para o papel de líder da nação com a morte de Mao. 44 Ainda que enfraquecido pelo afastamento que Mao lhe impusera como último ato de sua vida 43

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Ele apontava que era a hora de se modernizar a China. Ficou pouco no poder, por consenso do partido foi substituído por Deng já no funeral de Mao. Entretanto a temática de modernização foi e ainda é uma política de Deng45, uma política da vertente pragmática. Assim passaram do desencanto e punho forte de Mao Zedong para as Quatro modernizações da agricultura, indústria, defesa e ciência/tecnologia. Deng Xiaoping foi capaz de posicionar a China como uma grande potência produtiva em acelerado crescimento econômico. A consolidação, os reajustes permanentes da reforma econômicos processados nos últimos anos do século passado geram efeito multiplicador de benefícios criando consciência coletiva de confiabilidade na economia [chinesa]. Tal fenômeno significa tanto segurança para os investimentos externos, quanto manutenção do nível de emprego. O fluxo contínuo da entrada de capital estrangeiro leva a crer que o sistema socialista, pela lógica capitalista, é bom e seguro para se investir. Realmente a República Popular da China rompendo os mitos aos transformar a estabilidade em instrumento social, levando a população a desfrutar das benesses do seu processo de desenvolvimento e os investidores a saborear seus lucros, estilhaçou preconceitos e tabus políticos-ideológicos em favor do seu regime socialista. (PROCÓPIO, 2003, pp. 398-9).

Já que o difusor do ideal comunista Marx não havia demonstrado o caminho para a sua sociedade comunista, os chineses – na prática de décadas – alegam tê-lo encontrado através da reforma e criando um socialismo de mercado que logre maior retorno e desenvolvimento a sua população. Criou-se uma economia de mercado socialista na RPC da “revolução continua” que Mao desenvolvera e tanto desencantara.

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Mesmo com sua morte em meados da década de 90, a China permanece com o slogan de modernização por orientação.

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REFERÊNCIAS ALVES, Leonardo Pace. Análise da literatura estadunidense sobre a política externa chinesa na década de 1980. Dissertação (Mestrado em Relações Internacionais). Rio de Janeiro: Instituto de Relações Internacionais/PUC-Rio, 2000. CHUN, Lin. “Situating China”. In: El mundo actual: situación y alternativas. México: Centro de Investigaciones interdisciplinares en humanidades/UNAM,1994. DECISION del comité central del partido comunista de China sobre la reforma de la estrutura económica. Documentos de China. Pequim: Ediciones en Lenguas Extranjeras, 1984. ENCICLOPÉDIA do mundo contemporâneo. 3º edição revisada e atualizada. Rio de Janeiro: Terceiro Milênio, 2002. FENG-CHENG, Fu. La reforma económica de los comunistas chinos vista de la experiencia de reforma económica de otros países comunistas. China: La liga Mundial Anticomunista, 1987. MADDISON, Angus. Chinese economic performance in the long run. Paris: OCDE. 1998. MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. Manifesto do Partido Comunista. Reimpressão. Porto Alegre: L&PM, 2002. MEZZETI, Fernando. De Mao a Deng: a transformação da China. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2000. PINTO, Paulo Antonio P. A China e o sudeste asiático. Porto Alegre: UFRGS. 2000.

55

PROCÓPIO,

Argemiro.

“China

em

tempos

de

mudança”.

In:

Relações

Internacionais: visões da Brasil e da América Latina. Brasília: IBRI, 2003. PRYBYLA, Jan S. “China’s economic experiment: from mao to market”. In: Problems of comunism. Washington: janeiro-fevereiro, 1986, pp. 21-38. REIS FILHO, Daniel Aarão. A construção do socialismo na China. 2º edição. São Paulo: Brasiliense, 1982. SHAOZHI, Su. “Develop marxism under contemporary conditions”. In: Selected writings on studies of marxism. Pequim: Institute of Marxism-Leninism-Mao Zedong Thought/CASS, 1983. SHAOZHI, Su. “Prospect for socialism as viewed from China’s experience and lessons”. In: Selected writings on studies of marxism. Pequim: Institute of Marxism-Leninism-Mao Zedong Thought/CASS, 1985. SHI, Qin. China. Pequim: Nova Estrela. 1997. SPENCE, Jonathan D. Em busca da China moderna: quatro séculos de história. 1º reimpressão. São Paulo: Companhia das Letras, 2000. XIAOPING, Deng. Construir un socialismo con peculiaridades chinas. Pequim: Ediciones en lenguas extranjeras, 1985. XIAOPING, Deng. Les questions fondamentales de la Chine aujourd’hui. Pequim: Editions en langues etrangeres. 1987. XIRAN. As boas mulheres da China: vozes ocultas. São Paulo: Companhia das Letras, 2003. ZEMIN, Jiang. Reforma e construção da China. Rio de Janeiro: Record. 2002

56

GLOSSÁRIO ASPECTOS CONCEITUAIS DO SOCIALISMO CHINÊS: COMITÊ CENTRAL – órgão central de coordenação do Partido Comunista Chinês. Dentre seus participantes são escolhidos os membros para o Politburo e seu Comitê Permanente COMUNA POPULAR – unidade central de organização política e econômica no campo, algumas compostas por milhares de famílias, implantadas durante o Grande Salto (1958-61) e popularizadas na Revolução Cultural (1966-76). Eram divididas em brigadas e equipes de produção que dirigiam as atividades e designavam os locais de trabalho. CONFUCIONISMO – sistema de ética baseado nos ensinamentos de Kongfuzi (551479 a.C.), que afirmava que o homem estaria em harmonia com o universo se agisse com paz, moderação e fiel a papéis sociais pré-estabelecidos e específicos. O confucionismo moldara a ética dominante das unidades sociais chinesas, do governo imperial às famílias camponesas; defendia o estudo clássico, o culto aos ancestrais e a submissão às autoridades. ECONOMIA DE MERCADO SOCIALISTA DO TIPO CHINÊS – denominação posreforma à política econômica chinesa após aplicação das quatro modernizações e decorrente abertura do mercado. Há, entretanto, manutenção oficial da orientação socialista, uma forma de tentar justificar um país socialista que aplica políticas liberalistas, normalmente classificadas como capitalistas. GRANDE SALTO ADIANTE – (1958-61) tentativa de Mao Zedong de aumentar drasticamente a produtividade econômica através da mobilização de massas e da inspiração de fervor revolucionário no povo. Fez uso de notícias mal colocadas de êxito nas políticas de coletivização em alto grau (comunas populares), acabou por se provar um fracasso economicamente e trouxe fome à população. Foi também um movimento em direção a um comunismo diferente ao do vivido pela União Soviética.

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PARTIDO COMUNISTA CHINÊS – fundado em julho de 1921, em um barco no meio do lago Zhejiang por Mao Zedong, agentes do Comintern soviético, e militantes comunistas chineses. Inicialmente usou as bases do socialismo soviético como diretrizes, mas já na década de 50, depois da formação da República Popular começou a distanciar-se do mesmo, buscando um viés próprio. Maior força política da China até os dias de hoje. QUATRO MODERNIZAÇÕES – A política das quatro modernizações é uma tentativa de melhor dimensionar a influência das mudanças internas – que ocorriam na China desde a formação da República Popular – sobre a política externa e competitividade no mercado mundial e conseqüente desenvolvimento do país. Busca a modernização da agricultura, indústria, defesa e ciência/tecnologia para o desenvolvimento econômico. REVOLUÇÃO CULTURAL – (1966-76) A revolução Cultural pedia o ataque aos “quatro velhos” elementos da sociedade chinesa: velhos costumes, velhos hábitos, velha cultura e velho pensamento. Segundo Mezzetti (2000) a Revolução Cultural também foi uma artimanha de Mao para voltar ao poder. Segundo Spence (2000) foi um movimento social complexo que começou com uma luta entre Mao Zedong e outros altos dirigentes pelo controle do PCC e acabou afetando toda a China com seu chamado à ”revolução continua”. De fato este movimento desestruturou o sistema educacional chinês, trouxe problemas ambientais e levou a prisão milhares de pessoas que não podiam posicionar-se dentro dos moldes sugeridos pela doutrina revolucionária cultural. ZONAS DE PRODUÇÃO ESPECIAL – cidades escolhidas pelo PCC para aceitar investimentos externos diretos; planejadas para aumentar as exportações chinesas e servir de ponte para a adoção de tecnologia estrangeira.

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ANEXOS ANEXO 1

MAPA DA CHINA

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ANEXO 2

O EXPANSIONISMO JAPONÊS.

.

Fonte: SPENCE, 2000, p. 426

60

ANEXO 3

REGIÕES MILITARES

Fonte: SPENCE, 2000, p. 497.

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ANEXO 4

PRIMEIRO PLANO QÜINQÜENAL

Fonte: SPENCE, 2000, p. 515

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ANEXO 5

COMÉRCIO CHINÊS

Fonte: SPENCE, 2000, p. 599.

ANEXO 6

TERRAS CHINESAS (1993)

13,5% 9,6%

76,9%

florestas e bosques

terras aráveis

outros



Desmatamento anual de 0,1 % (1990/95)



Irrigação em 53,6% das terras aráveis (1993)

Fonte: ENCICLOPÉDIA do mundo contemporâneo, 2002, p. 197.

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