Os materiais pétreos da “Casa Romana” (Cristelos – Lousada). Origem e implicações no ordenamento do território

August 11, 2017 | Autor: Joana Leite | Categoria: Geologia, Romanização, Roman Archaeology
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RGAOT’13 R E C U R S O S G E O L Ó G I C O S , A M B I E N T E E O R D E N A M E N T O D O T E R R I T Ó R I O

LIVRO DE actas UNIVERSIDADE DE TRÁS-OS-MONTES E ALTO DOURO Vila Real, 24 a 26 de outubro de 2013

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U AD DEPARTAMENTO DE GEOLOGIA

VII SEMINÁRIO RECURSOS GEOLÓGICOS, AMBIENTE E ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO

Livro de Actas  

 

Ficha Técnica Edição Departamento de Geologia Escola de Ciências da Vida e do Ambiente Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro Quinta de Prados Apartado 1013 5001-801 Vila Real Portugal

Título Livro de Actas do VII Seminário Recursos Geológicos, Ambiente e Ordenamento do Território

Editores Pacheco FAL, Coke CJM, Lourenço JMM, Costa MRM, Vaz NMOCM ISBN: 978-989-704-153-2

Os trabalhos editados no presente volume devem ser citados como no exemplo seguinte: Velho, J. & Ferreira, A. 2013. Avaliação do potencial cerâmico das argilas da Sub-bacia de Aguada de Cima (Anadia). In Pacheco, F.A.L., Coke, C.J.M., Lourenço, J.M.M., Costa, M.R.M. & Vaz, N.M.O.C.M. (Edts). Livro de Actas do VII Seminário Recursos Geológicos, Ambiente e Ordenamento do Território, pp. 17-24. ISBN: 978-989-704-153-2.

ÍNDICE Ensaios de Meteorização Artificial em Granitos Polidos Gonçalves, Bruno M.M. & Sousa, Luís M.O. .................................................................................................... 3 Elementos Terras Raras e Isótopos de Oxigénio no Estudo dos Escarnitos Ferríferos de Alvito, Sul de Portugal Gomes, Elsa M. C. & Silva, Maria Manuela G. Vinha .................................................................................... 11 Avaliação do Potencial Cerâmico das Argilas da Sub-bacia de Aguada de Cima (Anadia) Velho, J. & Ferreira, A. .................................................................................................................................... 17 Aplicação de um Equipamento Portátil de Fluorescência de Raios-X na Determinação de Alguns Elementos Maiores em Minério de Ferro Urbano, Emílio Evo Magro Corrêa & Brandão, Paulo Roberto Gomes ........................................................... 25 Impacto de Alterações Climáticas na Hidrologia da Bacia do Rio Beça Santos, R.M.B; Sanches Fernandes, L.F.; Moura, J.P.; Pereira, M.G. & Pacheco, F.A.L................................ 35 Impacto do Conflito de Usos do Solo na Qualidade das Águas Subterrâneas da Bacia Hidrográfica do Rio Sordo Valle Junior, Renato F.; Varandas, Simone G. P.; Sanches Fernandes, Luís F. & Pacheco, Fernando A. L. ..................................................................................................................................................................... 41 Evolução do Consumo de Petróleo a Nível Mundial: do Aparente Pico de Produção à Realidade dos Factos Velho, J. ........................................................................................................................................................... 51 Potencial Gerador de Hidrocarbonetos dos Argilitos Carbonosos do Karoo Inferior (Pérmico) da Bacia de Moatize – Minjova, Província de Tete, Moçambique Fernandes, Paulo; Rodrigues, Bruno; Jorge, Raul C.G.S. & Marques, João .................................................... 63 Impactes Ambientais Associados aos Resíduos de Construção e Demolição Monteiro, Hugo; Dias, António Guerner; Paschoalin Filho, João Alexandre & Côrtes, Pedro Luiz ............... 71 Potencial de Lixiviação de Compostos Orgânicos a Partir de Resíduos da Exploração de Carvão em Autocombustão (Escombreira de S. Pedro da Cova) Marques, Fernando; Silva, Joana; Ribeiro, Joana; Neto, Cândida; Sant’Ovaia, Helena; Marques, Jorge Espinha & Flores, Deolinda ............................................................................................................................. 77 Prospecção Biogeoquímica Utilizando Macrófitas Aquáticas na Ribeira da Celavisa (Góis) Morais, I. & Pratas, J........................................................................................................................................ 83 Uso de Biomonitores na Detecção de Anomalias de U nas Águas Subterrâneas das Áreas de Rebolia, Relves e Tapéus (Condeixa-a-Nova e Soure, Portugal Central) Campos, J.; Pratas, J. & Azevedo, J. M............................................................................................................ 91 Monitorização da Radiação Gama em Pedreiras de Granitos Ornamentais (Vila Pouca de Aguiar e Mondim de Basto). Martins, L.; Gomes, E.; Sousa, L.; Pereira, A. & Neves, L.............................................................................. 99 iii

Análise da Suscetibilidade à Inundação do Rio Tejo Entre Belver e Vila Nova da Barquinha Belo, João; Lourenço, Martinho; Rosina, Pierluigi & Cavaleiro, Victor ....................................................... 105 Locais de Interesse Geológico e Geomorfológico na Serra da Lousã, Centro de Portugal Henriques, Daniela; Tavares, Alexandre Oliveira & Gomes, Elsa M. C. ....................................................... 115 A Inventariação do Património Geológico do Território Montemuro e Gralheira na Fundamentação do Alargamento do Geoparque Arouca – Estado da Arte Rocha, Daniela; Sá, Artur & Brilha, José....................................................................................................... 123 Metodologia Para a Avaliação do Índice de Potencial Natural de Percursos Pedestres Sousa, Luís M.O.; Alencoão, Ana M.P. & Gomes, Maria E.P....................................................................... 129 Os Materiais Pétreos da “Casa Romana” (Cristelos – Lousada). Origem e Implicações no Ordenamento do Território Novais, Hugo; Lemos, Paulo; Leite, Joana & Nunes, Manuel ....................................................................... 135 Mobilidade Sustentável – Rede de Aldeias Vinhateiras do Douro Bessa, Isabel M. D.; Santos, Carla S. A.; Gouveia, Hernâni S. S.; Lourenço, José M. M.; Gomes, Luís M. F. & Aranha, José T. M............................................................................................................................. 145 Contribuição Para a Avaliação das Reservas do Granito Amarelo Real Sousa, Luís M.O. & Lourenço, José M.M...................................................................................................... 155 Crescimento Sustentável de Base Territorial – Para um Novo Paradigma Oosterbeek, Luiz ............................................................................................................................................ 161 Contribuição de um Sistema WebSIG Open Source na Gestão e Ordenamento Florestal Gomes, P.; Lourenço, J.; Moura, J. & Starnini, R. ......................................................................................... 163 A Exploração de Águas Subterrâneas: Um Caso de Educação Ambiental Centrado na Aprendizagem Baseada na Resolução de Problemas com Recurso à Modelação Análoga Ferreira, Cândida; Alencoão, Ana & Vasconcelos, Clara .............................................................................. 171 Ensino de Recursos Hídricos com Jogos Didáticos Henriques, Esmeralda & Costa, Maria do Rosário ......................................................................................... 175

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Os materiais pétreos da “Casa Romana” (Cristelos – Lousada). Origem e implicações no ordenamento do território The rock materials of the “Roman House” (Cristelos-Lousada). Origin and consequences in the territory management Hugo Novais*; Paulo Lemos**; Joana Leite***; Manuel Nunes**** * Professor, Escola Secundária de Lousada; ** Arqueólogo, Araducta; *** Arqueóloga; **** Arqueólogo, Terra Laussata * [email protected]; ** [email protected]; *** [email protected] **** [email protected] Resumo A “casa romana” faz parte de um pólo habitacional do séc. I d.C. e foi construída com recurso a rochas da região, nomeadamente corneanas e granito porfiróide, de grão grosseiro, com duas micas, essencialmente biotítico. As estruturas castrejas por ela intersetadas são construídas quase exclusivamente em corneanas. O objetivo deste trabalho foi identificar os locais prováveis de extração das rochas. Para tal procedeu-se à identificação das litologias de paredes e pavimentos da casa e a um levantamento geológico de pormenor da região. Na determinação das fontes prováveis foi usado o método de hierarquização proposto inicialmente por Muñoz de La Nava et al. (1989) e adaptado por Sousa (2000 e 2001). Foi possível identificar as áreas fonte dos dois tipos de rochas, que se encontram a uma distância máxima de 200 metros da casa. Palavras-chave: “casa romana”, granitos, corneanas, Índice de Explorabilidade, pedreiras Abstract The "roman house" is part of a housing pole of the I century AD and was built using rocks of the region, including hornfels and porphyritic granite, coarse-grained, with two-mica, mainly biotite. The fortified settlement by her intersected is built almost exclusively on hornfels. The aim of this study is to identify the likely sites of extraction of the rocks. For this to happen, the lithologies of walls and floors of the house were identified and a detailed geological survey was made in the region. In determining the likely sources was used an hierarchy method initially proposed by Muñoz de La Nava et al. (1989) and adapted by Sousa (2000 and 2001). It was possible to identify the source areas of the two types of rocks, which are at a maximum distance of 200 meters from the house. Key-words: “roman house”, granites, hornfels, exploitability index, quarries

1. Introdução A “casa romana” localiza-se no Concelho de Lousada (fig. 1), na encosta sudeste no Monte de S. Domingos, nas imediações do povoado da Idade do Ferro (Castro) com o mesmo nome da colina, cuja designação resulta de uma capela medieval de evocação a S. Domingos que ali terá existido. A casa faz parte de um polo habitacional romano, enquadrável no séc. I a V d.C. O polo habitacional deverá ter resultado de um processo de reorganização que se verificou após a conquista e destruição do povoado da Idade do Ferro, provavelmente durante as Guerras Cantábricas, entre 26 a 19 a.C. (Mendes-Pinto, 1999; Nunes et al., 2008). A casa foi sujeita a uma intervenção arqueológica na última metade da década de 90 do século passado, tendo as escavações sido retomadas apenas nos anos 2009 e 2010, pelos signatários. Em 2011 foi identificada a origem das argamassas usadas na domus romana (Nunes et al., 2011). No seguimento deste trabalho procedeu-se ao desenvolvimento de um método para identificação da origem dos materiais pétreos, que a seguir se apresenta.

1.1. Enquadramento geológico De acordo com a cartografia publicada (fig. 2), a casa localiza-se num afloramento de corneanas pelíticas, intensamente recristalizadas pela intrusão de massas granitóides de idade hercínica. A este da casa há um contacto entre as corneanas e um granito porfiróide, de grão grosseiro, com duas micas, essencialmente biotítico, que será doravante designado por granito de Lousada. A oeste encontra-se um granito monzonítico de grão médio, porfiróide, essencialmente biotítico, que ocupa quase todo o concelho de Paços de Ferreira. Por esse motivo será designado por granito de Paços de Ferreira. As corneanas da região são caracterizadas por apresentarem uma curta variação espacial entre amostras alteradas e sãs. Estas apresentam-se no terreno com tonalidades amareladas e avermelhadas. O contacto com o granito de Lousada não é nítido por haver alternância entre estes. Ao microscópio as corneanas têm textura granoblástica e apresentam quartzo, plagioclase, moscovite, biotite, andalosite, silimanite e fibrolite como minerais principais. (Medeiros et al., 1980).

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Fig. 1 - Localização da “casa romana” de Cristelos (Lousada).

Fig. 2 – Geologia da envolvente à “casa romana” (adaptado da Carta Geológica de Portugal à escala 1:50000, folha 9D - Penafiel). O granito de Lousada apresenta minerais grosseiros, destacando-se os feldspatos, com dimensões superiores aos restantes. Apesar de possuir duas micas, a moscovite é microscópica, sendo particularmente notória e abundante a biotite. O granito de Paços de Ferreira é uma rocha com tendência monzonítica, por vezes quase

granodiorítica (Pereira et al., 1992). É distinguível do granito anterior pela menor granularidade, a que se associa um enriquecimento em biotite. Medeiros et al. (1980) salienta que, para a zona envolvente à casa romana, o contacto entre os dois tipos de granitos não é notório, o que sugere a existência contemporânea das respetivas fases magmáticas, que

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Simultaneamente foram realizados trabalhos de campo com o objetivo de elaborar a cartografia geológica de pormenor da região. Como base foi usada a carta geológica de Penafiel à escala 1:50000, publicada pelos Serviços Geológicos de Portugal. O trabalho foi concluído com identificação da fonte provável dos diversos materiais pétreos. Na definição das áreas-fonte foi utilizado o sistema de hierarquização proposto por Muñoz de La Nava et al. (1989) para pedreiras contemporâneas e adaptado por Sousa (2000 e 2001). Destes trabalhos foram selecionados os parâmetros relevantes para a época em estudo, nomeadamente a topografia, facilidade de transporte e cobertura, de acordo com os pressupostos estabelecidos por Arnold (1989). Às condicionantes é atribuído um coeficiente, designado por “K” (tabela 1). Ao coeficiente é multiplicado um valor (V), associado ao respetivo parâmetro, que varia de 0 a 4, correspondendo este último à situação mais desfavorável. A potencialidade de uma zona é definida pelo Índice de Explorabilidade (Ie) e resulta da fórmula seguinte:

terão originado interpenetrações das duas massas. É ainda de salientar que no limite oeste do concelho afloram microgranitos de duas micas, essencialmente biotíticos. Trata-se de um granito de grão fino, de tons cinzentos, que se poderá tornar ocre como resultado da alteração. Cartograficamente, têm afloramento filoneano, com direção NE-SW, tendo intruido ao longo de um sistema de falhas que tem origem em Vandoma, concelho de Paredes e se prolonga até Vizela. A Sul da casa, a uma distância de 200 metros, afloram filões aplitico-pegmatiticos sub-verticais, de orientação NE-SW, essencialmente quartzosos (Medeiros et al., 1980). Na respetiva cartografia constata-se que ocupam fraturas e/ou falhas prováveis de orientação NE-SW. Pereira (1992) acrescenta que, nos filões da região, é frequente a ocorrência de quartzo e feldspato em associação à moscovite. Como minerais acessórios, é possível encontrar biotite, apatite, granada e turmalina. 2. Metodologia O trabalho iniciou-se pela cartografia das rochas do pavimento e paredes da casa, a que se seguiu a identificação da respetiva geologia.

Ie = Ktopografia * Vtopografia + Ktransporte * Vtransporte + Kcobertura * Vcobertura

Tab. 1 - Condicionantes propostas, relevantes para a exploração de pedreiras da Idade do Ferro (adaptado de Muñoz de La Nava et al., 1989 e Sousa, 2001). Parâmetro

Topografia (declive)

Facilidade de transporte

Cobertura

K

1

2

3

V

Menção qualitativa

Descrição

0

Muito favorável

10º - 20º

1

Favorável

0º - 10º

2

Aceitável



3

Desfavorável

20º - 30º

4

Muito desfavorável

30º - 40º

0

Muito boa

1

Boa

2

Aceitável

3



4

Muito má

Distância superior a 400 metros

0

Muito elevada

Sem meteorização e sem cobertura de solo

1

Elevada

Fraca meteorização, mas sem cobertura de solo

2

Aceitável

Zonas com meteorização (1m) podendo apresentar solo em alguns locais

3

Baixa

Zona muito meteorizada (3 m) e com cobertura de solo

4

Muito baixa

Zona de intensa meteorização (5m) e com cobertura de solo contínua e espessa

Distância máxima de 200 metros, a cotas iguais ou superiores ao local de destino Distância máxima de 200 metros, a cotas inferiores ao local de destino Distância entre 200 a 400 metros, a cotas iguais ou superiores ao local de destino Distância entre 200 a 400 metros, a cotas inferiores ao local de destino

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Com este, foi possível traçar contactos geológicos mais precisos, bem como identificar novas falhas (fig. 3).

3. Resultados 3.1. Cartografia geológica O levantamento geológico de pormenor confirma os dados existentes na cartografia geológica publicada.

Fig. 3 - Geologia de pormenor da região (fundo cartográfico gentilmente cedido pela Câmara Municipal de Lousada). 4. Discussão Com base nos dados apresentados torna-se possível determinar, com precisão, a proveniência dos materiais líticos da “casa romana”. As rochas que constituem os fragmentos de mós têm origem de mais fácil identificação pois trata-se de microgranito, um tipo de granito muito específico e raro na região. O local mais próximo onde este aflora com expressão cartográfica é na freguesia de Nevogilde, a 2700 metros de distância em linha reta. Trabalhos de reconhecimento do afloramento revelaram que este é compatível em mineralogia, textura e tonalidades com os fragmentos encontrados na casa romana. A estes dados acrescem os factos de ocorrerem evidências de desmonte no local e, segundo Mendes Pinto (1992), vestígios de uma ocupação da Idade do Ferro, contemporânea do povoado do Monte de S. Domingos. O conjunto de dados disponíveis é de tal forma vasto e compatível entre si que é possível teorizar sobre a possibilidade de estes vestígios corresponderem a evidências de uma atividade de base “comercial” entre os dois aglomerados já durante o período da romanização.

3.2. Materiais pétreos identificados As pedras associadas a estruturas castrejas que a casa romana interseta são, na quase totalidade, corneanas de tons ocres (fig. 4). É de destacar que é esta a rocha que constitui o substrato geológico dos vestígios em estudo. Nas paredes dos vários compartimentos da casa romana propriamente dita, predomina o granito de Lousada em quantidades equivalentes com corneanas, sendo raro o de Paços de Ferreira. Incorporadas na estrutura (paredes e pavimento), ou fazendo porte do espólio lítico exumado das áreas de derrube, encontram-se, ainda, abundantes fragmentos de mós reaproveitadas que consistem em microgranitos. À exceção destes, todas as rochas se encontram em afloramento nas imediações da Casa Romana (fig. 3). 3.3. Determinação do índice de explorabilidade As figuras 5 a 7 representam as áreas mais propícias à exploração de rochas de acordo com os critérios definidos na metodologia. A figura 8 refere-se ao Índice de Explorabilidade resultante da combinação dos dados das figuras anteriores.

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Fig. 4 - Alçado do muro 112 e 215, lado poente. O muro romano (à direita) constituído por granito, incorpora na nova estrutura um muro circular da Idade do Ferro (à esquerda) em corneana.

Fig. 5 - Potencialidades de acordo com a topografia (fundo cartográfico gentilmente cedido pela Câmara Municipal de Lousada).

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Fig. 6 - Potencialidades segundo a facilidade de transporte (fundo cartográfico gentilmente cedido pela Câmara Municipal de Lousada).

Fig. 7 - Potencialidades de acordo com o grau de cobertura das rochas (fundo cartográfico gentilmente cedido pela Câmara Municipal de Lousada).

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Fig. 8 – Cartografia do Índice de Explorabilidade (fundo cartográfico gentilmente cedido pela Câmara Municipal de Lousada). da presença de solos desenvolvidos, representantes de uma maior espessura de cobertura. O parâmetro “facilidade de transporte” originou limites de caráter circular por se ter escolhido o raio da distância em relação à casa (fig. 6). Este tipo de delimitação obriga a alguns cuidados na interpretação dos resultados pois, em zonas declivosas, o percurso de transporte mais indicado não costuma ser em linha reta. Na realidade, locais próximos mas em zonas de grande declive obrigam a percursos mais extensos e indiretos de forma a diminuir o declive do mesmo. Locais ligeiramente mais distantes que comuniquem por vias a cota constante serão de percurso mais fácil e, como tal, preferíveis aos primeiros. Este princípio não foi seguido na elaboração do mapa da figura 6 devido ao seu caráter subjetivo, uma vez que a cartografia dos percursos existentes na Idade do Ferro, sem qualquer prova arqueológica, seria altamente especulativa. A cartografia do Índice de Explorabilidade (fig. 8) foi definida por intervalos, para facilitar a leitura do mesmo, uma vez que se obteve um grande número de áreas, 54, cada uma com um Índice de Explorabilidade diferente das áreas envolventes. Por outro lado, a definição de intervalos permite a diminuição de um eventual enviesamento dos resultados de um dos parâmetros. Na cartografia é possível identificar uma área com Índice de Explorabilidade classificável como

As corneanas e granitos obrigaram à elaboração do Índice de Explorabilidade para a região. A variação altimétrica patente na envolvente ao castro e à “casa romana” é geradora de declives, encontrando-se várias vertentes com condições favoráveis à extração. Pela comparação das figuras 5 e 7, nota-se que o grau de cobertura é correlacionável com o declive, já que são as vertentes declivosas a apresentar menor cobertura. Este aspeto deve-se, possivelmente, aos agentes de geodinâmica externa, nomeadamente a água, que mobilizam o material resultante da meteorização. Os locais menos declivosos serão o destino desses materiais, aos quais também se associam linhas de água que contribuem para uma humidade permanente no subsolo. Assim, foi nos locais de menor declive que se encontrou uma maior espessura de cobertura e/ou meteorização. É importante salientar que, nas vertentes declivosas, foi fácil a determinação do grau de cobertura por esta ser reduzida. No entanto, a determinação nos locais de menor declive revelouse complexa uma vez que o contínuo aumento da espessura do material de cobertura tornou crescentemente difícil o acesso ao fundo geológico. Para a delimitação correta destas áreas foram usados dados de sondagens arqueológicas realizadas nas imediações da “casa romana”, taludes e outras aberturas usadas em terrenos agrícolas. A própria distribuição destes terrenos constituiu um indicador

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áreas identificadas deverão ser registadas em suportes próprios e ser alvo de acompanhamento em caso de mobilização das mesmas. O conhecimento obtido seria importante no próprio ordenamento do território, pois permitiria um aprimorar das estratégias de ordenamento relacionadas com preservação de vestígios arqueológicos potencialmente relevantes.

elevado. No que concerne às corneanas, que se encontram em todo o edificado escavado, o local com maior potencialidade corresponde à base sudeste e à vertente sudoeste do Monte de S. Domingos. Saliente-se que é um resultado esperado, tendo em conta que é a rocha sobre a qual assentam os vestígios arqueológicos e onde se encontra em boas condições para extração. É igualmente de salientar que este resultado é válido apenas para a zona da “casa romana”. Para o castro, que se encontra no topo da elevação, não é de excluir o uso de materiais da vertente norte, uma vez que ambas as vertentes possuem as mesmas condições e passam a estar à mesma distância em relação ao destino. Segundo Mendes-Pinto (1999), o castro de S. Domingos teria 3 linhas defensivas ainda reconhecíveis através de zonas aplanadas na vertente do monte. Estas três zonas são reconhecíveis na cartografia, principalmente no flanco NW. Sabendo que para a nivelação do terreno foi necessário o desmonte de material rochoso é de prever que, na área da colina, os patamares tenham sido a principal fonte de rocha para o edificado castrejo. As áreas que se encontram 200 metros a sudeste da “casa romana” e foram classificadas como fonte aceitável não deverão ter sido usadas pois obrigam a uma subida das rochas através de vertentes declivosas, claramente desfavoráveis em relação à situação oposta que ser verifica na vertente SW do monte de S. Domingos. Relativamente aos granitos, que se encontram nas habitações de construção após a conquista romana, foi identificado um local com potencialidade elevada. Este resume-se a uma área de 50 m2 no contacto entre corneanas e o granito de Lousada, resultado que era igualmente esperado e que atesta a fiabilidade do método desenvolvido. É de salientar que esta área se encontra no limite dos 200 metros de distância à casa, um limite já considerado como artificial. Assim, não é de excluir proveniências da zona contígua a este e classificada como aceitável.

6. Conclusões As rochas das estruturas associadas à “casa romana” podem ser agrupadas em dois conjuntos distintos, relacionáveis com a idade dos vestígios em apreço. As estruturas da Idade do Ferro apresentam quase exclusivamente corneanas, que se encontram em afloramento no local do edificado. As estruturas mais recentes contêm corneanas e granito de Lousada. De acordo com os critérios adotados, os locais que constituem fonte provável das rochas são o Monte de S. Domingos para as corneanas e um contato com o granito de Lousada nas imediações do mesmo topónimo. O facto de alguns dos locais identificados coincidirem com locais inicialmente previstos confirma a validade do método usado. Os fragmentos de mós em microgranito são provenientes do alto de Nevogilde podendo corresponder a vestígios de uma atividade “comercial” entre os dois povoados, já após a afirmação da presença romana na região. O conhecimento das fontes prováveis das rochas pode constituir um indicador indireto de sítios arqueológicos, cujo acompanhamento é importante em situação de modificação do uso do terreno. Neste processo os procedimentos de ordenamento do território têm importância de relevo, através da identificação de áreas extrativas com interesse arqueológico. O acompanhamento de intervenções no território em causa contribuiria para o entendimento do paleopovoamento da região e a relação que, ao longo dos séculos, as comunidades desenvolveram com os recursos naturais, nomeadamente geológicos. O conhecimento obtido teria uma influência recíproca, na determinação de estratégias de ordenamento do território e preservação da identidade das comunidades humanas ancestrais.

5. Implicações no ordenamento do território É nossa convicção que a identificação das fontes dos materiais pétreos usados na construção, não só dos vestígios em apreço, como do restante edificado histórico, permite conhecer melhor a relação dos respetivos habitantes com o meio físico. Permite igualmente, atendendo à pedra como bem transacionável, aprofundar o conhecimento das relações comerciais que se terão estabelecido entre os diferentes núcleos, sendo disso exemplo os vestígios de microgranito anteriormente referidos. No entanto, a construção de conhecimento que se deseja bem fundamentado só é possível com a conservação dos vestígios que se poderão encontrar nas áreas identificadas como fonte potencial. Não tendo como intenção limitar o uso do território com base em hipotéticos vestígios, entendemos que as

7. Referências bibliográficas Arnold, Dean E. (1989). Ceramic theory and cultural process. New studies in archaeology. Cambridge: Cambridge University Press. Medeiros, A.; Pereira, E.; Moreira, A. (coords.). (1980). Notícia explicativa da folha 9-D –Penafiel da carta geológica de Portugal à escala 1:50000. Lisboa: Serviços Geológicos de Portugal. Mendes-Pinto. (1992). Património Arqueológico de Lousada. Plano Diretor Municipal de Lousada. Lousada: Câmara Municipal de Lousada.

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Mendes-Pinto. (1999). O Castro de S. Domingos (cristelos-Lousada). Memória descritiva. Processo de classificação do Castro de S. Domingos. Muñoz de La Nava, P.; Escudero, J.; Suarez, I.; Romero, E.; Rosa, A.; Moles, F.; Martinez, M. (1989). Metodologia de investigación de rocas ornamentales: granitos. Boletín Geológico y Minero, 110, (3), 129-149. Nunes, M.; Sousa, L.; Gonçalves, C. (2008). Carta Arqueológica do Concelho de Lousada. CML. Nunes, M.; Lemos, P.; Leite, J.; Novais, H.; Oliveira, A. (2011). Estruturas negativas da “Casa Romana” do Castro de São Domingos (Lousada): as fossas escavadas no saibro. Oppidum, 5, 61-84. Pereira, E. (coord.). (1992). Notícia explicativa da folha 1 da carta geológica de Portugal à escala 1:200000. Lisboa: Serviços Geológicos de Portugal. Sousa, L. (2000). Estudo da fracturação e das características físico-mecânicas de granitos com vista à sua utilização como rocha ornamental. Tese de doutoramento. Vila Real: Universidade de Trásos-Montes e Alto Douro. Sousa, L. (2001). Prospecção e avaliação de granitos ornamentais. Série didáctica, nº 172. Vila Real: Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro. 7.1. Cartografia Medeiros, A.; Pereira, E.; Moreira, A. (coords.). (1980). Carta geológica de Portugal à escala 1:50000. Folha 9-D. Lisboa: Serviços Geológicos de Portugal. Carta Militar de Portugal. (1998). 1:25000. Folha 112. Lisboa: Instituto Geográfico do Exército. Carta Topográfica do Concelho de Lousada. 1:5000. Lousada: Câmara Municipal de Lousada.

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