Os Tons do Nordeste: Fotografia e Musicalidade

July 21, 2017 | Autor: Leonardo Garcia | Categoria: Semiotics, Sertão, Fotografia, Musicalidade, Nordeste
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centro universitário senac

josé leonardo garcia de andrade

os tons do nordeste: fotografia e musicalidade

são paulo 2014

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2   A553t Andrade, José Leonardo Garcia de

Os tons do Nordeste: fotografia e musicalidade/ José Leonardo Garcia de Andrade – São Paulo, 2014.   A553t Andrade, José Leonardo Garcia de 139 f.:il. color Os tons do Nordeste: fotografia e musicalidade/ José Leonardo Garcia de Andrade Paulo, de 2014.  Maria– São Cândida Almeida Castro Orientadora: 150Trabalho f.:il. color de Conclusão de Curso (Bacharel em

Publicidade e Orientadora: Propaganda) – Centro Universitário Senac, São Paulo, 2014.  Maria Cândida de Almeida Castro

Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharel em Publicidade e Propaganda) – Centro Universitário Senac, São Paulo, 2014. 1.Semiótica 2.Fotografia 3.Musicalidade 4.Nordeste

I.Castro, Maria Cândida de Almeida (Orient.) II.Título

1.Semiótica 2.Fotografia 3.Musicalidade 4.Nordeste I.Castro, Maria Cândida de Almeida (Orient.) II.Título CDD 659.1

CDD 659.1

josé leonardo garcia de andrade os tons do nordeste: fotografia e musicalidade trabalho de conclusão de curso apresentado ao

Centro Universitário Senac – Campus

Santo Amaro, como exigência parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Comunicação Social com Habilitação em Publicidade e Propaganda. orientação: profª dr.ª Maria Cândida de Almeida Castro A banca examinadora dos Trabalhos de Conclusão, em sessão pública realizada em ____ / ____ / ______, considerou o(a) candidato(a): 1) Examinador(a) 2) Examinador(a) 3) Presidente

são paulo 2014

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dedicatória Escrevo alguns versos Que não são de amor Mas para o amor Amor que me sustenta desde o nascer Que acalma os meus descompassos que conhece as minhas lágrimas meus risos e minhas teimosias Amor que justifica as minhas dores Que me segue passo a passo na vista de um rumo certo Amor que nem sei dizer em palavras E que não poderei esquecer jamais Aos meus pais

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agradecimentos (em versos de cordel) 1. se o meu sangue é poesia / trago à rima este dom vou contar uma bela história / como faz a cantoria 2. quero em versos agradecer / das conquistas que alcancei dos encontros e despedidas / nesta estrada onde a vida luta sempre pra vencer 3. peço agora tua licença / leitor de grande estima vou citar gente importante / que foi parte integrante nos processos desta sina 4. deixarei esclarecido / há quem diga que nao mereça mas repito com presteza / Ele é mais que importante pois é pouca a gratidão / pela força e majestade Deus de minha oração. 5. vou falar pra cada amigo / sem deixar ninguém de fora, daqueles que estão bem longe / e aos que estão bem perto agora agradeço a companhia / na tristeza ou na alegria guardo todos na memória

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6. na família o sustento, / quando o coração às vezes chora, se me alegro ou perco o trilho /eu confio a qualquer hora 7. sou um pouco da mistura / de Andrade com Garcia e por isso me orgulho / a cada noite ou cada dia dessa embolada de cultura 8. se fizer algum sentido / deixo todo o meu carinho

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para os mestres que passaram / iluminando o meu caminho 9. abro aspas de grandeza / p’ra que a rima aconteça quero a ela agradecer / antes mesmo que eu esqueça “à professora Cândida” 10. todo fim tem um começo / neste ciclo a girar vou me despedindo agora / porque o tempo sem demora vem depressa passear

9 “A vida com seus limites, meu eu infinito” (leonardo garcia)

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resumo O presente projeto, de cunho experimental, propõe-se a fazer uma tradução intersemiótica entre as linguagens musical e fotográfica. Para tal, parte-se das acepções da obra de Charles S. Peirce, sobre a semiótica, dentre outros pesquisadores como Cândida Almeida, Julio Plaza e Lucia Santaella, que propicia um melhor aprofundamento deste tema. A

metodologia é baseada numa análise de campo sobre composições de

cancioneiros nordestinos dentre eles Aldy Carvalho e Marcos Wendel, sendo esta linguagem o fio condutor ao encontro de um mundo que existe, físico ou irreal, retratado nas canções e melodias dos próprios cancioneiros. Imbuído das referências musicais, o desenvolvimento fotográfico torna-se possível, mediante aspirações dessas composições. O projeto experimental consiste em três momentos: a seleção das músicas, o ensaio fotográfico no sertão da Bahia e a exposição fotográfica no Campus do Centro Universitário Senac – Santo Amaro/SP. Desta forma, espera-se com a realização deste projeto empírico de caráter criativo, mostrar novas construções sígnicas referentes ao sertão do Nordeste, apresentando um jeito novo de ver e pensar a região. Palavras-chave: Semiótica; Musicalidade; Fotografia; Nordeste.

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abstract This project, as an experimental research, try to make an intersemiotic translation between musical and photographic languages. Therefore, it will be used Charles S. Peirce’s definitions about “semiotic” concept, as well the thoughts of other researchers as Candida Almeida, Julio Plaza, and Lucia Santaella, in the way to have a deeply knowledge of this

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subject. The methodology is based on brazilian northeastern’s popular song compositions analysis, as Aldy Carvalho and Marcos Wendel. This language will be the line that will connect the meeting of a world that exists, physic or unreal, represented by the songs and melodies of these popular singers. With musical references, the photographic development is possible by the aspirations of these compositions. The project will be divided in three parts: the music selection; the photo essay in the hinterland of Bahia state, and Photography Exhibition at Senac University Center Campus – Santo Amaro/SP. So, with this empirical project, that has a creative character, it's expected to show a new signical construction of brazilian’s northeastern backwoods, presenting a new way to think about this region. Keywords: Semiotics; Musicality; Photography; Northeast.

sumário introdução.........15 1. tradução intersemiótica e os processos de tradução das linguagens.........21 1.1 semiótica Peirceana...23 1.1.1 fenomenologia...24 1.1.2 os signos...33 1.1.3 tipos de signos...41 1.2 tradução intersemiótica...48

2. nordeste: entre a música e a imaginação.........55 2.1 imersão nordestina...57 2.1.1 contexto histórico...58 2.1.2 enredos nordestinos...64 2.2 a música do nordeste...67

3. fotografia: reflexos da memória.........73 3.1 sobre fotografia...75 3.2 o inteiro em pedaços...82 3.3 a escolha do olhar...83

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3.4 a tríade na fotografia...85

4. memorial criativo.........89 4.1 pré-produção...91 4.2 fotografia: o nordeste em cores...103 4.3 a edição...111 4.4 exposição: os trons do nordeste...118

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anexos.........121 considerações finais.........133 referências bibliográficas.........135 referências bibliográficas adicionais.........138

introdução Ser sertanejo, senhor. É fazer do fraco forte. Carregar azar ou sorte. Comparar vida com morte. É nascer nesse sertão. Terra, vida e esperança (Luiz Gonzaga)

Com base na musicalidade de artistas nordestinos, que utilizam-na para expressar sentimentos e falar de sua terra e suas raízes, este projeto se expande da linguagem musical à imagem fotográfica, produzindo um novo olhar dessa inquietude (comportamentos, crenças, valores) que se exala das obras dos compositores e cancioneiros, onde o real e o imaginário tornam-se únicos na construção e na propagação do que se imagina e se revela enquanto cultura nordestina. Segundo Rodrigues (2006), em sua dissertação apresentada ao programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal da Paraíba, As produções populares, por trazerem marcas das relações sociais daqueles que as produzem, tornam-se documentos genuínos e extremamente valiosos que permitem ao estudioso

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restaurar e apreender a visão de mundo de um povo cujos valores culturais, embora sofrendo as imposições mutiladoras da modernidade, ainda continuam vivos e latentes.(Rodrigues, 2006, p.26-27).

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O tema “Os tons do Nordeste: fotografia e musicalidade”, partiu da insistência de se contar do amor e da saudade de tantos nordestinos, distantes de sua terra. Aos chamados “retirantes”, que por muitos anos veem a região sul, mais precisamente à cidade de São Paulo, como fonte de idealização e concretização dos sonhos. Adotados pelo “sul do progresso”, vivem paralelos a novos hábitos, costumes, e muitas vezes exposto a preconceitos, e mesmo assim, a trajetória e vivência que carregam como bagagem cultural e de vida, reforça a vontade em nós, de expandir a cultura nordestina. Na transcrição da música para a fotografia, instituise um estudo sobre a semiótica de Peirce, na compreensão e ressignificação das coisas. E para tanto, o projeto experimental vem agregar todo o processo de construção sígnica, por meio de uma análise das com-

posições de artistas nordestinos, sejam estas cantadas ou apenas interpretadas instrumentalmente, para que a imagem fotográfica, como representação, busque na essência destas composições a sua própria trajetória sígnica, gerando assim, um novo olhar para as manifestações culturais e sociais do nordestino. Para tanto foi-se à fonte, para criar um vínculo a partir do contato físico e emocional, vivenciar o instante, rediscutir o discurso cantado e aclamado de uma certa região, esta, recortada no interior do sertão da Bahia, para criar em essência este projeto. O projeto tem como base teórica discursos que se complementam como os processos semióticos na composição fotográfica, e que são fundamentais no processo construtivo. Destacam-se as obras: “A invenção do Nordeste e outras artes”(Albuquerque, 2001), “Web Design: Guia de Produção e Análise”.Tese de Doutorado(Almeida, 2009),“Tradução intersemiótica”(Plaza, 2003),“A teoria geral dos signos: como as linguagens significam as coisas”(Santaella, 2000), “Os tempos da fotografia: o efêmero e o perpétuo”(Kossoy, 2007),

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“Sobre fotografia”( Sontag, 2004), “O ato Fotográfico”(Dubois, 2011).

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A partir destes esclarecimentos, dividiu-se a pesquisa em quatro capítulos que comportam e direcionam as leituras, as análises, enfim, a elaboração deste texto-dissertação. “Tradução Intersemiótica e os Processos de tradução das Linguagens”, “Nordeste: entre a música e a imaginação”, “Fotografia: reflexos da memória” e “Memorial Criativo”. No primeiro capítulo, com base nos ensinamentos de C. S. Peirce sobre a Semiótica, enfoca-se alguns pontos fundamentais desta teoria para auxiliar na construção teórica e criativa do projeto experimental aqui proposto. Discorremos sobre conceitos da Fenomenologia e sua estrutura tríade, para chegarmos ao conceito de Signo. Através da semiótica, um leque de tipos de signos será classificado para entendermos como se dá e como tende a acontecer a interpretação desses signos em nossa mente. No capítulo dois, abordaremos os aspectos históricos

da Região Nordeste, o surgimento do Nordeste como um recorte espacial no país. Caminharemos ao encontro do que nos fascina e nos envolve de tal forma, a pensar o Nordeste como alma cultural. Quais são suas maiores impressões e como os cancioneiros nos mostram toda esta veracidade em suas composições, serão questionamentos fundamentais para mergulharmos em suas histórias e assim direcionar as imagens fotográficas. No terceiro capítulo, discorre-se sobre a fotografia pensada como arte, como condutora ao propósito final deste projeto, porque é parte essencial da fotografia, apresentar e representar as coisas. Abordaremos sobre seus aspectos linguísticos e como o discurso da fotografia tende a nos envolver nesse processo de construção sígnica nas imagens fotográficas. No quarto e último capítulo, mostraremos todo o processo, registros, memorial e montagem da exposição, ficando a cargo deste, o dossiê de toda produção e experiência. Desta forma, este projeto experimental, embasado nos

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pensamentos de Peirce, busca quebrar, apresentar signos que não são simbólicos, ou seja, oferecer para o intérprete, outras relações que podem ser perceptíveis, que estão dentro do contexto Nordeste, que existem, que fazem parte e que são culturais.

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1. tradução intersemiótica e os processos de tradução das linguagens eu vejo a vida pela léguas que andei e aquarelas, são as estradas que passei. Comigo carrego o tempo, moinho a girar cata-vento. sina de cantador (aldy carvalho)

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1.1 semiótica peirceana

A Semiótica Peirceana dispõe a nós, os fundamentos teóricos na condução e análise deste projeto experimental. A Semiótica, ou ciência dos signos, ou a ciência geral de todas as linguagens verbais e não-verbais (Santaella, 2000) é uma proposta elaborada pelo filósofo e cientista, Charles Sanders Peirce (1839 – 1914), sendo uma ciência relevante dentro de todo o seu pensamento. Peirce deixou contribuições em múltiplas áreas do conhecimento: lógica, astronomia, matemática, teoria e história da ciência etc., com uma obra estimada em 92 mil páginas entre publicações e manuscritos. A Semiótica Peirceana tem seu fundamento embasado pela fenomenologia proposta pelo autor, que busca compreender o que é o faneron (fenômeno). Para Peirce faneron é “[...]todo e qualquer elemento observável, qualquer coisa que se apresente em uma mente qualquer, sem que

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haja necessidade de considerar a sua materialidade” (Almeida, 2009, p.31). Daremos continuidade à fenomenologia no item seguinte.

1.1.1 fenomenologia

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Tudo ou qualquer acontecimento denomina-se fenômeno (faneron), que perceptíveis ou não a nós, manifestamse. Ao estudo dos fenômenos, Peirce buscou em sua forma triádica, nas categorias fenomenológicas estabelecer a base de todo estudo semiótico e de como os signos se apresentam. Segundo a pesquisadora Lucia Santaella (2000), buscando uma explicação concisa, fenômeno é Sem nenhuma moldura preestabelecida, sua noção de fenômeno não se restringia a algo que podemos sentir, perceber, inferir, lembrar ou localizar na ordem espaço-temporal que o senso comum nos faz identificar como sendo “mundo real”. Fenômeno é qualquer coisa que aparece à mente, seja ela meramente sonhada, imaginada, concebida, vislumbrada, alucinada... Um devaneio, um cheiro, uma ideia geral e abstrata da

ciência... Enfim, qualquer coisa. (Santella, 2000, p.7)

Ao estabelecer definições quanto a forma que os fenômenos se apresentam, institui-se as três categorias fenomenológicas indissociáveis ao faneron e que agem initerruptamente. Estas categorias são gerais e podem ser aplicadas em todo e qualquer fenômeno quer sejam materiais ou não. São elas: a primeiridade, a secundidade e a terceiridade. Observemos a imagem:

Primeiridade

Secundidade

Terceiridade

Fig. 1 Diagrama das Categorias Fenomenológicas de C. S. Peirce, por Almeida (2009)

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O diagrama foi elaborado para representar visualmente a maneira como as categorias fenomenológicas apresentam-se. Os conceitos de cada categoria tornam-se mais claros.

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À primeira vista, a característica mais nítida ao observarmos a imagem do diagrama é a intensificação da forma geral, tríplice helicoidal, baseada no símbolo do infinito. [...] as categorias fenomenológicas são um continuum1,ou seja, elas se transformam, na medida em que o fenômeno passa a existir no mundo. Todo fenômeno parte de uma possibilidade (vir a ser) e se desdobra em outra possibilidade (tornar-se outro) ad infinitum.(Almeida, 2009, p.37-38)

Para que sejam cabíveis de entendimento na preservação dos conceitos abordados, as categorias fenomenológicas ganham suas definições verbal e visual, nos próximos subitens.

1 O continuum é a ideia da continuidade ou contiguidade no exercício metafísico de se conceber a existência de algo no mundo. (Almeida, 2009, p.37)

primeiridade A esta fase, encontra-se o fenômeno que, sem qualquer resquício de explicação, imaculado ao tempo de sua própria existência, sendo instantes de possibilidades ou algo que poderá vir a ser. Estando em sua essência a qualidade inata, desvinculada de subsídios e proposições, seu conceito firma-se no novo, “aliado às ideias de acaso, indeterminação, frescor, originalidade, espontaneidade, potencialidade, qualidade, mônada” (Santaella, 2000, p.8), porque não há nada que o anteceda ao conhecimento primeiro que a defina. Como aponta Almeida (2009), “essa categoria, é responsável pela possibilidade de todo e qualquer fenômeno existir e estar apto a qualquer tipo de experiência no mundo.”

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primeiridade Fig. 2 representação diagramática da Primeiridade

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Em suas explicações conceituais dos diagramas, Almeida (2009), nos mostra com coerência, o processo evolutivo e criacional dos diagramas. Em primeiro lugar, destacamos o fato de essa parte só ser composta por uma única cor. Isso reflete visualmente os conceitos de talidade, pureza, qualidade de fenômeno. [...] o que há na primeiridade e nessa representação visual é o fato de essa categoria não dar conta, ainda, de uma existência. [...] à categoria da primeiridade são as ideias de potência, possibilidade e infinitude. Buscamos representar graficamente esses princípios através do contorno da forma. Um contorno sem definição clara, abalroado de elementos dispersos, que tendem a se firmar na imagem para existirem enquanto forma. [...] É possível notar que a forma gráfica vai se tornando mais nítida, diminuindo o numero de elementos dispersos e o símbolo vai ganhando contorno mais definido.

Isso reflete a transição da primeiridade ruma à secundidade, momento em que o sentimento vai deixando de ser uma mera qualidade vaga, tendenciando a existir enquanto conflito e despertar de emoções. (Almeida, 2009, p.39-40)

Permitindo-nos assim, dar início à secundidade, que parte desta possibilidade de todo e qualquer fenômeno existir, suscetível a qualquer tipo de experiência no mundo.

29 secundidade O que era apenas uma mera possibilidade, uma qualidade pura sem nenhuma necessidade de representação, aqui, nesta categoria, tem reconhecida a sua existência, que é então identificada. Faz-se a relação do desconhecido, embora existente num determinado estado imperceptível, passando da abstração imácula ao concretismo das coisas. Nos diz Santaella (1999), Há um mundo real, reativo, um mundo sensual, independente do pensamento e, no entanto,

pensável, que se caracteriza pela Secundidade. Esta é a categoria que a aspereza e o revirar da vida tornam mais familiarmente proeminente. É a arena da existência quotidiana. Estamos continuamente esbarrando em fatos que não cedem ao mero sabor de nossas fantasias ( Santaella, 1999, p.47).

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Secundidade Fig. 3 representação diagramática da Secundidade

Notamos no diagrama acima, que a categoria da secundidade é representada por uma inter-relação entre dois componentes do fenômeno. Vejamos o que nos diz Almeida (2009), A presença da cor azul no interior da vermelha, provocando uma mistura de elementos. [...] duas coisas existentes, que reagem, mas ainda não são totalmente definidas sobre o que são, pois ainda não são passiveis de representação. [...] o contorno da imagem simbólica vai ficando mais definida. Com menos elementos dispersos em seus ambiente mais próximo. Isso implica dizer que no instante da secundi-

dade, o faneron vai ganhando conformação corpórea, [...] Uma relação que vai definindo a identidade do fenômeno. (Almeida. 2009, p.42)

Partimos agora para a Terceiridade, cujo mérito é o da representação.

terceiridade 31 Esta categoria toma a forma daquilo que era aspirado e em seguida identificado por meio da representação. Este contexto materializa as percepções advindas das outras categorias fenomenológicas, é o estágio proeminente do tornar-se no ad infinitum de interpretações. Cabe à Terceiridade a continuidade, a certeza de que nada no mundo é estático. Tudo é vivo, tudo muda, se transforma. [...] Cabe à Terceiridade o papel da representação e a forma mais simples de terceiridade encontra-se no signo representação. Representar é exercer o papel de mediação entre aquilo que é representado e a ideia que se produz em uma mente qualquer (Almeida, 2009, p.43).

Tem-se a ideia generalizada. O “algo” é concreto às

nossas inferências e que dele desencadeia várias outras formas de pensá-lo, criando um diálogo concomitante entre as categorias para assim continuar rumo à novas concepções.

32 Terceiridade

Fig. 4 representação diagramática da Terceiridade

De posse dessas noções conceituais e após observar com atenção a imagem diagramática, finalizamos o processo de elucidação das três categorias fenomenológicas através da categorização da terceiridade, levando-se em consideração os seguintes destaques: O contorno da forma diagramática que representa a terceiridade é bem mais definida do que das outras duas. [...] nesse momento, o faneron é uma representação de alguma coisa. Tanto duas qualidades (vermelho) quanto a sua relação com outra coisa (azul), tornam-se mais claras. Isso porque essa relação agora é uma representação (verde). [...] cabe à terceiridade a noção de processo. É possível notar, por exemplo, que o elemento representado (verde) já esboça ação

de continuidade um instante seguinte. [...[ o fenômeno torna-se um médium (mediador) entre aquilo que ele representa e o que ele virá a ser.(Almeida, 2009, p.44)

Apresentadas as categorias universais fenomenológicas, passo inicial de fundamentação para a semiótica Peirceana (estudo dos signos), que abordaremos no item subsequente, e que é a partir das categorias fenomenológicas que os signos serão analisados, estruturados.

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1.1.2 os signos Para Peirce, em sua mais breve explicação “Signo é alguma coisa que representa algo pra alguém”, o conceito de signo é descrito como uma “relação triádica”, constituído por elementos correlacionados – representamem, objeto e interpretante. Tal envolvimento é concomitante e ininterrupto. Um signo é um primeiro (representamen – parte do signo latente por materialização e representação) que mantém uma relação com um segundo (seu objeto) e busca determinar um terceiro (o interpretante). (Almeida, 2009, p.50).

Para Santaella,

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Um signo intenta representar, em parte, pelo menos, um objeto que é, portanto, num certo sentido, a causa ou determinante do signo, mesmo que o signo represente o objeto falsamente. Mas dizer que ele representa seu objeto implica que ele afete uma mente de tal modo que, de certa maneira, determina, naquela mente, algo que mediatamente devido ao objeto. Essa determinação da qual a causa imediata ou determinante é o signo e da qual a causa mediada é o objeto pode ser chamada de interpretante. (Santaella, 2001, p. 42-43)

Fig. 5 diagrama do Signo

Apresentam-se em sua forma conceitual, cada componente do signo em suas divisões internas.

35 Fig. 6 diagrama dos componentes do Signo

representamen O representamen parte do signo em primeira instância, com características da primeiridade, vista nas categorias fenomenológicas. É a parte do signo perceptível. É parte dele, o papel de mediação entre os dois outros correlatos (objeto e interpretante).

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Fig. 7 Representamen

É parte intrínseca ao representamen o seu “ground”, seu fundamento. Apesar de não ser uma subdivisão do representamen, o fundamento é a propriedade que permite ao signo ser signo.( Almeida, 2009, p.52)

objeto O objeto é a parte de determinação do signo. A coisa em si. O que está sendo substituído. O objeto é parte contextual do signo, universo de refencialidade.

O signo representamen estabelece um tipo de relação de troca (ação e reação) com o objeto, propiciando que o signo carregue, em si, algum tipo de correspondência com seu objeto. Aquilo que, dentro do signo, apresenta alguma correspondência com algo fora (objeto dinâmico) do signo é o objeto imediato.( Almeida,2009 p.33).

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Fig. 8 Objeto do Signo

Percebemos a existência de um objeto que já é intrínseco ao signo (objeto imediato), ou seja, tem-se um referencial imediato contido no signo, que ele (o signo) “só pode referenciar algo fora dele porque há algo, dentro dele, que apresenta alguma semelhança” (Almeida, 2009, p.54).

E um outro (objeto dinâmico) que está fora, é toda a potencialidade e determinação do signo, a infinidade de proposições passíveis de representação. “O objeto dinâmico é aquela parte do objeto que está fora, mas que se conecta ao representamen mediatamente através do objeto imediato.” (Almeida, 2009)

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interpretante O interpretante será sempre o que é criado numa mente interpretadora imediatamente. Para que a ideia de signo possa ser melhor compreendida, atribuímos a ela, a imagem seguinte, que nos mostrará as divisões sígnicas. 1. O representamen – a bandeira em chamas; 2. O objeto – o país (EUA); 3. Interpretante – revolta, opressão, indignação etc.

39 Fig. 9 S.S. Mirza/AFP – portal de notícia do UOL

O interpretante possui três variações distintas: Interpretante Imediato, Interpretante Dinâmico e Interpretante Final. Sendo necessária a abordagem de cada uma delas para melhor compreendermos.

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Fig. 10

Interpretante

O interpretante imediato concentra-se dentro do signo, é o que dirige à interpretação. Diz-se da potencialidade que todo signo tem em si, suscetível à interpretação. “Pode-se entender o interpretante imediato como a capacidade que um signo tem de ser interpretado. O interpretante dinâmico “trata do significado que o signo efetivamente produz numa mente interpretadora”, ou seja, está no interpretante dinâmico a realização do signo, que por meio da semiose que é a ação do signo “de gerar um interpretante e tornar-se, por consequência, outro signo.(Almeida, 2009, p. 56-57).

O interpretante final, ele nunca é alcançável, pois ele seria um interpretante completo. Embora seja o interpretante final que aponta o caminho, ele “não consiste na forma pela qual uma mente age, mas pela forma pela qual qualquer mente deveria agir. Ou seja, “é o interpretante que poderia ser gerado, caso todos os interpretantes dinâmicos fossem capazes de esgotar o potencial significativo do signo.” (Almeida, 2009, p.57)

1.1.3 tipos de signos De acordo com Santaella (2001), na composição do signo, a partir da divisão das partes que interagem, Peirce instituiu classificações ternárias (tricotomia) dos possíveis tipos de signos. Peirce define que os signos se diferenciam segundo a maneira pela qual ele próprio (signo) estabelece uma relação entre as suas partes (representamen, objeto e interpretante) e o modo como essas partes são regidas pelas categorias fenomenológicas. (Almeida, 2009. P.59)

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Assim, Estando o objeto do signo, por exemplo, em regência pela primeiridade, esse tipo sígnico diferenciar-se-á de outro quando sua regência estiver na secundidade ou quando na terceiridade. As relações sígnicas podem ser do Representamen (signo) consigo mesmo: Qualissigno, Sinsigno, Legissigno. Representamen com seu Objeto: ícone, Índice, Símbolo. Representamen com seu interpretante: Rema, Dicente, Argumento. “Além dos tipos de Signos, Peirce estabeleceu uma lógica de relações – entre o signo e seus correlatos [...]”(Almeida, 2009, p.64). Divididos em dez classes, apenas mencionaremos a sua existência, ficando o nosso aprofundamento na relação Representamen com seu objeto, porque está no estudo do objeto do signo, aquele que o determina, todo o processo de referência e construção deste projeto. Está no objeto o nosso alicerce, que age de forma dinâmica, cujo potencial é nos levar a reconhecer o signo que é perceptível por ele (o objeto) rumo ao interpre-

tante e as suas ressignificações. A seguir abordaremos os conceitos relevantes quanto a forma que o Signo ou representamen se relaciona com o seu objeto, determinando tipos de signos específicos. Seguindo o pensamento tríadico Peirceano, são eles: ícone, Índice e Símbolo, que serão exemplificados e definidos, sendo possível enxergamos a predominância de cada um deles nas imagens que se seguem, mesmo que estas contenham os três tipos (ícone, índice, símbolo).

ícone Quando o representamen assemelha-se com seu objeto, que sempre nos fará lembrar de algo. Almeida (2009) nos diz que “na relação com seu objeto ela só pode ser um ícone, isto é, só pode representar algum objeto por semelhança de qualidades.”(p.61). O ícone pode ser, dentro das classes do signo, um Qualissigno Icônico Remático, Sinsigno Icônico Remático e Legissigno Icônico Remático.

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Um exemplo simples encontra-se nas cores. Escolheremos a cor vermelha, que nos remete a: sangue, amor, comunismo, quente.

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Fig. 11 ©iStockphoto.com/Renee Lee

Notamos então a similaridade entre o representamen (a cor vermelha) com seu objeto (sangue etc.). Torna-se ícone na medida em que se assemelha com seu referente.

índice Quando o representamen tem uma relação direta com o seu objeto, ou seja, ele nos expõe a algo ocorrido ou que irá acontecer. É característica desse tipo de signo possuir um objeto definido. Exemplos de índices não faltam, pois eles nos rodeiam existencialmente. O mercúrio elevado no termômetro é o índice da alta temperatura de um corpo, por exemplo (Almeida, 2009, p. 62).

Observemos a imagem seguinte. Os elementos constitutivos de sua narrativa situam no campo indicial.

Fig. 12 http://geraldojose.com.br/

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A carcaça de um animal em solo árido, indicando devastação que a seca proporcionou. O índice está para sugerir, indicar, ele não oferece uma interpretação pronta.

símbolo

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O representamen age regido por leis, uma relação convencionada com seu objeto. Tudo que tende a uma interpretação da mesma maneira, é um símbolo. Almeida (2009) relata que, A lei determina por meio de um hábito na mente do intérprete que o símbolo será interpretado de acordo com essa lei. As palavras, por exemplo, são símbolos porque suas leis de representação são estabelecidas por convenção.[...] Criados de maneira arbitrária, os símbolos facilitam a comunicação, na medida em que a sua significação é compartilhada por convenção estabelecida por um conjunto grande de pessoas.(Almeida, 2009, p.62)

As palavras (o verbo) são símbolos, elas são utilizadas para denominar um objeto. Os símbolos garantem uma interpretação pronta.

Fig. 13 Imagem de internet

47 Discutidos os conceitos semióticos, notamos a sua importância como base teórica para este projeto experimental, que surge na transição de um signo a outro, num processo de tradução intersemiótica de linguagens. Os apontamentos seguintes ampliam essa experiência sígnica, ministrada pelo autor Julio Plaza em seu livro “Tradução Intersemiótica”.

1.2 tradução intersemiótica As ideias são ressurgimentos de vivências enraizadas pelo tempo, que discorre sobre tudo. Para que algo novo tenha existência, foi preciso ter existido algo que o fez existir, ou seja, as ideias processam-se num diálogo infinito de construir-se e fazer-se construir.

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A esta engrenagem de pensar a ideia como uma releitura de significados, torna possível todo o processo e idealização deste projeto experimental, que defende a ideia da tradução intersemiótica para conduzir o projeto experimental, de como as linguagens (verbal e não-verbal) se transformam, dando espaço para outras representações e linguagens (signos). Plaza (2003) nos diz que “um signo traduz o outro não para completá-lo, mas para reverberá-lo, para criar com ele uma ressonância” (Plaza, 2003, p. 27). Sob o prisma semiótico, institui-se a este projeto a ideia que nos confirma as palavras do autor acima citado, e uma série de transcrições sígnicas serão apresentadas,

suscetíveis a novas interpretações, perfazendo um diálogo infinito. Numa tradução intersemiótica, “os signos empregados têm tendência a formar novos objetos imediatos, novos sentidos e novas estruturas que, pela sua própria característica diferencial, tendem a se desvincular do original” (Plaza, 2003, p.30). Cabe portanto, ao novo signo concebido, uma identidade própria, que à luz do signo gerador, parte para a sua infinitude. “Nessa medida, a tradução [...] se apresenta como ‘a forma mais atenta de ler’.”(Plaza, 2003, p.2). As traduções dão espaço a novos conceitos e nos mostram o processo de desenvolvimento que se instaura entre uma obra (tomamos como exemplo as obras de arte) e outra. Este processo tem como proposta não exteriorizar toda a potência evidenciada pela obra a ser traduzida, mas a partir de suas experiências conduzir a um novo objeto, de qualidades próprias e que o distancia de comparações com o seu referente. E aqui se poderia enxergar o novo a partir da semiótica de Peirce como sendo aquela quali-

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dade produtora da obra de arte, ou seja, a “ideia” como ícone, como possibilidade ainda não atualizada, tendo por isso mesmo, qualidade de oriência, do original no seu sentido primevo e instaurador. (Plaza, 2003, p.8)

Tem-se a proposta do novo, daquilo que se completa por ele mesmo, embora esclarecemos que este (o novo), será sempre conduzido pelo seu antecessor, como nos relata

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Plaza (2003), “[...] o novo depende do devir, isto é, da recepção e do repertório, como medida de informação que se dá entre o previsível e o imprevisível, entre banalidade e originalidade.(Plaza, 2003, p.8). Todo pensamento se dá em signo, que são destinados – ou seja, não existem possibilidades de um signo não dar continuidade a outro, que ao passo de interpretação, conduzem a novos e sucessíveis significados, o ad infinitum – ,a formar novos signos num processo de semiose (a ação do signo). A este processo, caracteriza-se como “continuidade e semiose”, como “transformação de signos em signos”, (Plaza, 2003, p.17), porque “um signo transforma-se em outro, antes mesmo que ele se complete. Ou seja,

sua completude está no processo, no signo adiante, [...].”(Almeida, 2009, p.49). Do mesmo modo, a tradução intersemiótica – um signo gerando outro signo – nos permite analisar o pensamento como consequência dessa metamorfose que nos sugere os signos. Segundo Plaza (2003), [...] Qualquer pensamento é necessariamente tradução. Quando pensamos, traduzimos aquilo que temos presente à consciência, sejam imagens, sentimentos ou concepções ( que, aliás, já são signos ou quase-signos) em outras representações que também servem como signos. Todo pensamento é tradução de outro pensamento, pois qualquer pensamento requer ter havido outro pensamento para o qual ele funciona como interpretante. (Plaza, 2003, p. 18).

Nesses aspectos, o método de evolução desse projeto experimental tende a ocupar-se na tradução da linguagem musical para a linguagem fotográfica, que busca não o sentido intrínseco da linguagem doadora de signos, mas que cria um novo discurso, um outro sentido próprio, da linguagem imagética, que se revela pela fotografia.

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Plaza (2003) afirma que “[...] A tradução mantém uma relação íntima com seu original, ao qual deve sua existência, mas é nela que a vida do original alcança sua expansão póstuma mais vasta e sempre renovada.”(Plaza, 2003, p.32), e partindo dessa afirmação notamos a ação da continuidade em que se estabelece a teoria dos signos de Peirce, ou seja, “[...] seus infinitos desdobramentos em novos signos”(Almeida, 2009, p.47).

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Segundo Plaza (2003), “[...] o pensamento influencia a linguagem e esta incide sobre o pensamento”(Plaza, 2003, p.19), imprime essa contextualidade inerente e inseparável de todo o processo de tradução, e que “[...] cada linguagem nos faz perceber o real de forma diferenciada”(Plaza, 2003, p.19), ou seja, a musicalidade – linguagem escolhida em primeira instância – nos levará ao encontro de um mundo existente, físico ou imaginário, que o próprio autor/cancioneiro, tenta transmitir em suas composições. Do mesmo modo, a imagem fotográfica, nos envolve e nos direciona a esse mesmo mundo, físico ou imaginário, mas de um outro campo de sentidos. Este processo dialó-

gico entre a música e a fotografia perfaz um método de tradução intersemiótica constante fortemente alcançado pela sinestesia, que segundo Sartori(2012)é uma maneira diferenciada de se perceber a realidade.[...] essa habilidade permite que algumas pessoas tenham percepções ou sensações alteradas, como: dor ou przer a partir de um música, ou a partir de uma cor; ouvir (as vibrações)a música pelas mãos;cheiros a partir das cores; sabor a partir das imagens... É como se houvesse um curto-circuito entre os sentidos [...]. (Sartori, 2012, p.7)

Neste sentido, a sinestesia presente na produção deste projeto experimental, rompe os conceitos óbvios da realidade pela troca de sentidos, ou seja, um som que é uma imagem; a imagem de um som etc. As linguagens mesmo sendo singulares, porque cada uma delas apresenta suas particularidades e formas distintas de percepção e interpretação, ressoam a pluralidade de significados que fazem parte delas e que abre um leque de possíveis traduções, estas, sujeitas ou não à tradução por uma mente intérprete. Nós só traduzimos aquilo que nos interessa, como “pri-

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meira qualidade de sentimento”, parafraseando Plaza (2003), e complementa quando nos diz que “[...] não se traduz qualquer coisa, mas aquilo que conosco sintoniza como eleição de sensibilidade, como “afinidade eletiva”.(Plaza, 2003, p.34). Assim, a tradução valese do potencial que uma mente intérprete estabelece no ato de traduzir, ela age de forma sincrônica com o que se busca eleger como proposta de significados.

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Definidos os conceitos do signo e de como suas transformações acontecem, numa tradução intersemiótica, daremos passo a um novo questionamento relevante ao nosso tema, ficando a cargo do segundo capítulo, para explorar as características que evocam a região Nordeste.

2. nordeste: entre a música e a imaginação Entre as cores e o som, o silêncio... Máquina a coser: retalhos, lembranças, risos nesta estrada de aveloz ritmado. (leonardo garcia)

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2.1 imersão nordestina Conhecemos valores de outras culturas através da sua identidade, que define e caracteriza seus costumes, suas crenças, a forma mais singular de se existir. Essa absorção de contrastes e particularidades transforma o mundo antes desconhecido em um novo e o que era apenas observado, dá vida a novos conceitos. Quando não estamos inseridos em determinados lugares, de súbito o rejeitamos, mas quando o vivenciamos, tais lugares ganham novas dimensões, que se entrelaçam com nossos costumes e crenças e assim passamos a repeitar e a reconhecer. O Nordeste, região cenário para este projeto, com suas manifestações folclóricas e populares, destaca-se no cenário brasileiro na literatura, música, dança, artesanato e na culinária. Mas, em que momento na história brasileira a imagem do Nordeste foi construída? Quem definiu o Nordeste como Nordeste? Qual o seu surgimento? Quais imagens durante anos foram construídas e

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confirmadas como o real? São inúmeras as interpretações e respostas que nos permitem avaliar e tomar como verdadeiro, o imaginário construído na cultura. Não queremos criar um diálogo ufano nem agir como tal, mas apresentar em suma, interesses que convergem à idealização desse projeto, que em conformidade com o tema proposto tende a enriquecer e alimentar o que buscamos retratar como Nordeste, por meio de uma representação visual fotográfica contaminada pela musicalidade que nasce naquelas terras.

2.1.1 contexto histórico O Nordeste brasileiro é fruto da divisão que se faziam no país, separando este em dois polos divergentes, quer sejam nos aspectos espaciais quer sejam socioculturais. Albuquerque (2011) descreve como “[...] filho da ruína da antiga geografia do país”. De um lado o sul, símbolo do progresso e das aspirações europeias. Do outro, o norte, desolado, árido, pobre, esquecido à margem da intolerância e abandono.

As grandes distâncias, a deficiência nos meios de transporte e comunicação, o baixo índice de migrações internas entre Norte e Sul, tornavam estes espaços completamente desconhecidos entre si, verdadeiros mundos separados e diferentes que se olhavam com o mesmo olhar de estranhamento com que nos olhavam da Europa. (Albuquerque, 2011, p.53)

Ao notarem essa realidade como fragmentos da construção social brasileira, tornavam-se nítidas as divergências que se emergiam de ambas as regiões. O sul, como a centralização do poder, só mantinha algum saber sobre o Norte, a partir do que se falavam pela imprensa e principalmente “[...] daquilo que os discursos de seus representantes, no Parlamento, diziam e faziam ver.”(Albuquerque, 2011, p.54) Com o crescimento da própria imprensa e a vontade de se conhecer “realmente” o país, permitiram que jornais publicassem inúmeras notas de viagens a uma ou outra região do país, entre as décadas de vinte e quarenta. Os Estados do Sul, mais precisamente São Paulo e Rio de Janeiro eram vistos como “centro distribuidor de sentido em nível nacional”, e com isso

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As “diferenças” e “bizarrias” das outras áreas são marcadas com o rótulo do atraso, do arcaico, da imitação e da falta de raiz. Esses relatos do estranhamento funcionam também no sentido de criar uma identidade para a região de quem fala, em oposição à área de que se fala. (Albuquerque, 2011, p.54)

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Todo esse processo te, nos mostra que dada de acordo com partindo de pontos um contexto criado

de caracterização da região Nordesa história desta, era tecida e molo que se construíam como verdades, estratégicos para generalizar todo pelos “sulistas”. [...] o que se diz da região não é o reflexo do que se vê na e como “região”. Os dois regimes de enunciação possuem uma independência, as palavras e as coisas são independentes; a região se institui, paulatinamente, por meio de práticas e discursos, imagens e textos que podem ter, ou não, relação entre si, um não representa o outro. A verdade sobre a região é constituída a partir dessa batalha entre o visível e o dizível. O que emerge como visibilidade regional não é representado, mas construído com a ajuda do dizível ou contra ele. Falar e ver são formas diversas de dominar este objeto regional, que podem dirigir ou não no mesmo sentido. ( Albuquerque, 2011, p.59)

O surgimento do termo Nordeste, foi estabelecido para denominar a área de atuação da Inspetoria Federal e

Obras Contra as Secas (IFOCS), criada em 1919. Neste discurso institucional, o Nordeste surge como a parte do Norte sujeita às estiagens e, por essa razão, merecedora de especial atenção do poder publico federal. O Nordeste é, em grande medida, filho das secas; produto imagético-discursivo de toda uma série de imagens e textos, produzidos a respeito deste fenômeno, desde que a grande seca de 1877 veio colocá-la como o problema mais importante desta área. (Albuquerque,2011, p.81)

É partindo deste contexto histórico que a atenção dos meios de comunicação , em especial os do sul do país, concentra-se a perceber o Norte e todas as suas “aflições”, através da seca. Ela é, sem dúvida, o primeiro traço definidor do Norte e o que o diferencia do Sul, notadamente, num momento em que o meio é considerado, ao lado da raça, como fatores determinantes da organização social. [...] As primeiras imagens do Norte para a maioria dos sulistas eram aquelas trazidas pelos jornais sobre seu “flagelo” e suas vítimas. Era por meio de espetáculos, jogos, festas feitas para arrecadar fundos para as vítimas do flagelo, que os sulistas ouviam falar de seus “irmãos do Norte”. (Albuquerque, 2011, p.81-82)

A este parecer, nos move

entender o surgimento da re-

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gião Nordeste, como produto esquecido no tempo e reencontrado às margens do maior problema e que ainda hoje a caracteriza: a seca, a sua representação primária. Embora, novos discursos se entrecruzem, dando a esta região dimensões que vão ao encontro de tantas representações, o Nordeste, hoje, é celeiro de grandes autores, compositores, musicistas, escritores e tantos outros artistas desconhecidos pela mídia, que nos faz perceber de sua importância sociocultural dentro e fora do país. O Nordeste é uma produção imagético-discursiva formada a partir de uma sensibilidade cada vez mais específica, gestada historicamente, em relação a uma dada área do país. E é tal a consistência desta formulação discursiva e imagética, que dificulta, até hoje, a produção de uma nova configuração de “verdades” sobre este espaço. (Albuquerque, 2011, p.62)

Traçamos aqui, um discurso do surgimento da região Nordeste, veiculado pela mídia da época. Este surgir, ou seja, o Nordeste estava sendo identificado como tal por aqueles a quem o conhecimento daquela região era desconhecido, notadamente revelam-se a nós, as categorias fenomenológicas, bem como as representações sígnicas. Os signos para representar a região, os costu-

mes, a vida daquele povo, ora desconhecido, e que num certo momento da história, tornou-se a conhecer. A expressão Região Nordeste, ou, simplesmente Nordeste, possui, atualmente, significados já muito cristalizados que evocam uma série de imagens, tanto das suas características geográficas, quanto culturais, sociais e econômicas. Entre as primeiras, podemos citar elementos da paisagem que incluem desde o recorte litorâneo com suas praias e seus remanescentes coqueirais, até a paisagem mais seca do agreste e, sobretudo, a do sertão, com sua vegetação símbolo, formada pelas cactáceas e seus tipos humanos, entre o quais sobressai o vaqueiro com sua vestimenta de couro e sua pele curtida pelo sol. (Bernardes, 2007)

Denis Bernardes (2007), faz um recorte dessa construção simbólica sobre o Nordeste, e que nos convida a olhar esta região não somente sob o prisma da primeira impressão, constituída na década de vinte, e que em dias atuais, se preserva essa representação, como um lugar inóspito, seco e sem vida, mas a enxergar as várias faces que afloram desta, e que são imprescindíveis ao nosso experimento. No plano cultural, as imagens do Nordeste, dentro e fora da região estão cada vez mais marcadas pelas manifestações da chamada cultura popular: maracatu, bumba-meu-boi, rei-

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sado, coco de roda, chegança, frevo, caboclinho, literatura de cordel, xilogravuras, rabequeiros, ciranda, pastoril, entre outras. (Bernardes, 2007, p.x)

Este é o ponto a que pretendíamos chegar, à cultura popular do Nordeste, para preencher nossas vontades quando intentamos buscar subsídios no campo da arte.

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2.1.2 enredos nordestinos Em todo discurso da região Nordeste, percebemos quão enraizados foram os signos na sua construção. As imagens criadas ao longo da história, fragmentando o real, deram o suporte necessário para que a leitura do Nordeste fosse notadamente regida por parâmetros sígnicos. Divergir sobre estes signos tão solidificados, requer pensarmos na desconstrução destes para a formação de outros. O projeto como um todo, demonstra esse anseio, de tornar visível novas elucidações sobre a região,

que tem um amplo campo a ser explorado e desmistificado, com seus inúmeros nuances moldados pela arte, propósito maior dessa tradução de linguagens. Pensar a região requer vê-la, e vê-la não é olhar para a empiria amorfa... mas organizar uma dada visibilidade com imagens que sejam consideradas sintéticas, imagens que remetem a uma pretensa essência. (Albquerque, 2001, p. 165-166)

Seria pois, o ressurgir da região posicionada em novos conceitos simbólicos. Simbólicos por gerarem uma certa conformidade, o que chamaríamos de novos ares, novas inferências sobre a temática Nordeste. Uma região qualitativa, com fisionomia, ritmo e harmonia. Uma região que, para se ver e dizer, precisaria arte. Região como expressão cultural, não apenas como reflexo do meio. [...] Região como “um ente cultural, uma personalidade, um ethos”. (Albuquerque, 2001, p. 101-102)

A beleza exuberante e rústica do Nordeste bem como a diversidade de seu povo, são pontos de tradições que refletem em suas festas, com suas crenças, cores, formas e sons ( nota-se a presença imensurável do colorido, dos tons fortes e carregados, expressando a vida e

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alma do sertão) em contraste com os símbolos que caracterizam-no. Este território ambíguo, seco e fulgente, da dor e da alegria, do feio e do belo, permite-nos entender mesmo dicotômico que é possível enxergar um só conceito, uma só distinção, encontrado por meio da arte. Esta, sobressai a todas as outras características da região. A arte em si, carrega todo o seu potencial, a sua magnitude e referência para explorarmos o Nordeste. São descobertas de uma nova forma de ver, um novo ângulo para olhar os objetos familiares... Fazem ver aquilo que a visibilidade comum torna invisível, e em vez de serem representação de uma identidade, são invenção por meio da fratura, da quebra, de uma nova identidade, de uma nova forma de ver. (Albuquerque, 2001, p. 165)

Como resgate desta soberania de tons e cores, buscamos moldar este projeto, adequando-o a esta nova forma de ver e pensar a região Nordeste. Encontrando em seus caminhos e circunstâncias, o brilho e a expressão de seu povo. O Nordeste parece sempre estar no passado, na memória, evocado saudosamente para quem está

na cidade, mesmo que esta seja na região. O Nordeste é este sertão mítico a que se quer sempre voltar. Sertão onde tudo parece estar como antes, sem modernidade, infenso a mudanças. Um espaço preso no tempo cíclico da natureza, dividido ente secas e invernos. [...] O sertão é o lugar da pureza, do verdadeiro brasileiro, onde meninos ainda brincam de roda, os homens soltam balões, onde ainda existem as festas tradicionais de São João. (Albuquerque, 2001, p. 182-183)

Estes aspectos, não comuns às cidades grandes, revelam o singular, a proeza de se ver intactos, costumes e crendices advindas de outras épocas e que se perpetuam mesmo diante das fortes mudanças com a globalização e o forte impacto tecnológico.

2.2 a música do nordeste A música contamina com suas alegorias rítmicas todo o nosso pensamento. As produções musicais de cancioneiros nordestinos escolhidas a fazerem parte deste projeto, trazem à mente o retorno a lugares, pessoas, manifestos e ritos empoeirados pelo tempo.

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A vida no sertão é apresentada, fragmentando-se, disfarçando as asperezas da seca, do lamento e das lembranças, no compasso do som. É na década de quarenta que surge Luiz Gonzaga como o criador da “música nordestina”. [...] querendo “dar um rumo mais nordestino” às suas canções, Gonzaga procura um letrista que fosse capaz de transformar em poesia as suas lembranças de infância, os seus temas “regionais”. (Albuquerque, 2001, p. 174)

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Notamos a forte similaridade entre o que propomos a criar com este projeto, ao desejo que Gonzaga teve, que era traduzir por meio da sua arte, a música, toda a sua vivência, diante da distância que o separava de seu lugar. Buscamos traduzir nas imagens fotográficas, os mesmos anseios, de uma vida no sertão que ficou distante no tempo. Os signos sonoros encontrados nas melodias e canções de compositores nordestinos produzem, Uma sensação de proximidade da “realidade regional”, presentificando-a por meio de aboios, gritos, estalar de chicotes, tinir de chocalhos... cantorias, pinicar de violas. As letras como os próprios arranjos, suscitam

lembranças, emoções, ideias, ligadas a este espaço distante e abstrato nomeado Nordeste. (Albuquerque, 2001, p. 181)

As características sígnicas que se misturam à música, tendem a proporcionar um encantamento momentâneo. Este é o ponto de partida para que novos signos germinem, dando lugar a novas representações. O mesmo acontece nas imagens fotográficas. Permitem ao intérprete essa proximidade com o regional, com as cores e os costumes do povo nordestino. O que propomos a criar, a priori, são signos que nos permitam enxergar a outra face do Nordeste, [...] um Nordeste de grande “personalidade cultural”. Um Nordeste que quer conquistar um lugar para sua cultura em nível nacional, que quer mostrar... que existe, que tem valor, que é viável. O espaço da cultura brasileira [...]. (Albuquerque, 2001, p.185)

O compositor e musicista Aldy Carvalho, num de seus trabalhos, “Sina de cantador”, descreve em versos e melodia, a vida de um cancioneiro, um dos personagens sígnicos do Nordeste. O cantador tem o seu destino cruzado e conduzido pela música, desbravando o mun-

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do que passeia, descobrindo os amores e dissabores da vida. O artista utiliza em suas metáforas, a sua identidade. Eu vejo a vida pelas léguas que andei E aquarelas, são as estradas que já passei Comigo carrego o tempo, moinho a girar cata-vento O destino se põe ao meu olhar.

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Em análise do trecho acima, sua proposta discursiva iguala-se substancialmente ao nosso projeto. O que o artista tenta codificar em suas frases melódicas revelando aspectos do seu cotidiano, está na sua inserção como prova de seu imaginário, como forma de expressão da realidade em que se vive. Assim, o autor/ fotógrafo imprime em suas imagens fotográficas resquícios de sua vivência, um mundo criado a partir de sua própria existência. O autor vê em sua criação, a sua imagem, mostrando a sua essência, sua identidade (re)configurada nas fotografias. As próximas páginas serão dedicadas à linguagem visual, codificada nas imagens fotográficas. Serão apre-

sentados conceitos que fundamentam o processo de criação experimental como um projeto artístico.

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3. fotografia: reflexos da memória 73 “ [...] a caixa mágica assegura a veracidade e bane o erro, compensa a inexperiência e recompensa a inocência.” Sunsan, Sontag

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3.1 sobre fotografia Tem-se a imagem, fotografada, recortada no tempo e espaço. Imagem que se contrói, pelas cores que encantam, pelos contos da região no sertão da Bahia. Estes “tons” retirados do Nordeste, moldados pela ótica da fotografia. Tomamos posse do título da obra de Susan Sontag (2004) para nomear as primeiras abordagens e reflexões. Buscamos analisar a fotografia como mecanismos que aguçam o pensamento artístico, porque todo o desenvolvimento deste projeto experimental, é baseado em construções poéticas, ritmadas, de cancioneiros que exalam a arte em cantorias. Estas construções, operam como ponto decentralizador deste processo de tradução entre linguagens, permitindo resgatar e materializar nas imagens fotográficas, toda uma história, a partir do olhar e da própria vida do autor.

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A linguagem fotográfica, da qual nos apropriamos para dar vida à tradução intersemiótica entre as linguagens sonora e visual (fotográfica), permite-nos de certa forma, tomar a realidade num curto espaço de tempo, tomar no sentido de reter, arquivar, como registros de um dado momento, tornando perpétuo, o considerável efêmero.

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Mas o que seria a realidade? As imagens captadas pelas lentes de uma câmera, são meros cortes de alguém que sob o olhar, tenta condicionar o que se vê, a permanecer ali, estático, “não passa de uma fração de instante e um corte de espaço que não podemos viver nem reviver” (Bubois, 2011, p. 81), configura uma realidade imaginada, construída por aquele que a define no ato fotográfico, incumbido ao expectador submeter-se às suas próprias conclusões. Toda foto tem múltiplos significados; [...] A sabedoria suprema da imagem fotográfica é dizer: “Aí está a superfície. Agora, imagine – ou antes, sinta, intua – o que está além, o que deve ser a realidade, se ela tem aspecto”. Fotos, que em si mesmas nada podem explicar, são convites inesgotáveis à dedução, à especulação e à fantasia. (Susan Sontag, 2004, p.33)

Voltamos a questionar esta realidade enquadrada pelas imagens fotográficas, que por hora entendida como sinônimo de invenção, e por hora “fornecem um testemunho” (Sontag, 2004), são como fragmentos do real. O projeto experimental, tem em si essa ambivalência interiorizada. São recortes que apontam uma defesa, um argumento maior, que é tornar visível novos conceitos, ou melhor, novos signos à tão emblemática caracterização nordestina. As imagens são concebidas e materializadas conforme as intenções de seus autores, segundo um filtro cultural e uma determinada visão de mundo. [...] O documento fotográfico, fragmentário por natureza, é o resultado final de elaboradas construções técnicas, estéticas e culturais [...]. (Kossoy, 2007, p. 104)

O que forçosamente nos envolve, é entender que por intermédio da imagem fotográfica, a vida que será contada em cada clique disparado, são resquícios envoltos por memórias, “o momento convertido no eterno” (Sontag, 2004), “mantendo a lembrança, [...] de uma época desaparecida. Imagens silenciosas”. (Kossoy, 2007) [...] “é uma das qualidades mais preciosas e mais originais da imagem fotográfica, di-

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ferentemente do cinema, da televisão [...] Silêncio não somente da imagem que renuncia a qualquer discurso, para ser vista e lida de algum modo ‘interiormente’ – mas também o silêncio no qual mergulha o objeto que ela apreende.”(Kossoy, 2007, p.133).

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São lembranças que se regeneram e ganham forma nas imagens “petrificadas” (tomamos aqui, a palavra gerida de um discurso que Dubois (2011) nos oferece em seu livro “O ato fotográfico”, onde ele faz uma analogia da mitologia grega à fotografia), de personagens reais, que encenam o cotidiano próprio, e mesmo sem entender, narram uma história criada por aquele que os observa. Fotografia é memória enquanto registro de aparência dos cenários, personagens, objetos, fatos; documentando vivos ou mortos, é sempre memória daquele preciso tema, num dado instante de sua existência/ocorrência. (Kossoy, 2007, p.131)

Sontag (2004), diz que: “fotografar pessoas é violá -las, ao vê-las como elas nunca se veem, ao ter delas um conhecimento que elas nunca podem ter.” (p.25). A autora é categórica em sua afirmação, suas palavras carregam um tom agressivo e não foge à realidade. As

lentes estão para penetrar, tomar para si instantes de uma vida que passa, inesperada, surpreendente. Como caçadores por sua caça, agimos silenciosamente para o momento certo do corte, tornando espetáculo, o “comum” (sintetizando a mesmice, o trivial dos personagens que não foram postos a criar quaisquer cenas diante das lentes). [...] Muitos dizem que os fotógrafos são caçadores de imagens. É verdade, somos como caçadores que passam muito tempo à espreita da caça, esperando que ela decida sair de deu esconderijo. Fotografar é a mesma coisa: é preciso ter paciência para esperar o que vai acontecer. Pois algo vai acontecer, necessariamente. (Sebastião Salgado, 2013, p. 10)

“Codificado em forma de imagem” (Kossoy, 2007), revela-se a alma do artista/fotógrafo, o seu propósito enquanto arte, porque “toda obra de arte reflete a personalidade do seu autor.” (Dubois, 2011). Este, debruça seu olhar, esculpe cada momento, molda qual oleiro a sua obra, reescreve cada palavra enquanto poema e não cansa de deixar sua aquarela totalmente bela.

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A palavra fotografia, gerada a partir de dois radicais gregos (photo - luz; grafia – escrita), traduz a essência (a semântica) em perfeita harmonia: escrita pela luz. Tal significado, conduz a pensarmos a imagem fotográfica como poesia, carregada de um lirismo singular. Para este projeto experimental, caberá à fotografia, situar-se neste tom poético, levando o intérprete a encontrar sonetos, versos e poemas escritos pelas metáforas em suas imagens. A imagem fotográfica cria um diálogo oportuno, não limitado, mas absolutamente aberto às interpretações, ela (a fotografia), conta-nos Sontag (2004), “não se limita a apresentar a realidade”, percorre muito mais além este campo, “visto que esta coloca a possibilidade (utópica) de construir o mundo e sua imagem a partir dos infinitos pontos de vista prováveis”( Plaza, 2003). As imagens revelam seu significado [...] quando recuperamos as histórias que, em sua forma fragmentária, trazem implícitas. Através da fotografia aprendemos, recordamos, e sempre criamos novas realidades. Imagens técnicas e imagens mentais interagem entre si e fluem ininterruptamente num fascinante processo de

criação/construção de realidades – e de fções. (Kossoy, 2007, p.147)

A fotografia “[...] tem se prestado, desde sua invenção, ao registro amplo e convulsivo da experiência humana”(Kossoy, 2007), é, de fato, “experiência capturada” (Sontag, 2004). Age de dentro para fora mutuamente, exterioriza o que estava oculto (a função poética da fotografia) ao passo que interioriza o que já estava exposto (resguarda dentro da imagem capturada). Ela toma posse daquilo que jamais lhe será roubado: “O espaço recortado, fragmentado, o tempo paralisado; uma fatia de vida (re)tirada de seu constante fluir e cristalizada em forma de imagem”.(Kossoy, 2007, p.133. Este espaço recortado dá lugar a novas percepções, novas formas de enxergar muito além do que está exposto daquele instante, enclausurado pelas lentes da câmera. A este conceito, seguem as aspirações no item subsequente.

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3.2 o inteiro em pedaços

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As imagens fotográficas [...] nos fazem sentir que o mundo é mais acessível do que é na realidade.” (Sontag, 2004). O que nos chama atenção, para o cuidado e reflexões produzidos na mente. Enxergar naquele recorte, limitado pelo enquadramento, pela escolha do que seria revelado, muito mais o que ele se revela. O inteiro em pedaços como sublinhado ao título. Os “pedaços”, subentendido como uma metáfora das imagens fotográficas, encarnam uma síntese, um ponto escolhido para que se processem à mente intérprete, uma visão ampla muito além do que aquela cena capturada se mostra. Não se trata, obviamente, de um diálogo convencional. Trata-se de um diálogo mudo, subliminar, sensível e inteligente, que, diante de uma foto ou de uma conjunto de fotos, é gestado entre o nosso olhar e a nossa mente. Imagens técnicas, visuais [...] interagindo com nossas imagens mentais (originadas da nossa experiência do real e configuradas em função de nosso repertório pessoal). (Kossoy, 2007, p. 148)

Outrora, o que denominamos “inteiro”, suscita a acreditarmos no vasto campo observado, da sua impossível transposição pelas imagens fotográficas, daí a oportunidade de se montar em partes, o todo. A fotografia iguala-se, neste contexto, qual fonte de uma pesquisa, que recolhe informações de um dado número da população, que induz a pensar o resultado generalizando-o.

3.3 – a escolha do Olhar Espreitar o campo da arte para a produção das imagens fotográficas, foi contundente às nossas expectativas. Era preciso mostrar mais do que era possível capturar pelas lentes da câmera, era preciso ir além de uma realidade sólida, vista a olho nu por nós, que vivenciávamos todo o percurso de produção das imagens fotográficas. [...] São essas as viagens da mente: nossos “filmes” individuais, nossos sonhos, nossos

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segredos. Tal é a dinâmica fascinante da fotografia, que as pessoas, em geral, julgam estáticas. Através da fotografia dialogamos com o passado, somos os interlocutores das memórias silenciosas que elas mantêm em suspensão. (Kossoy, 2007, p. 147)

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A este discurso fundamentam-se a intencionalidade do olhar fotográfico, o olhar criativo, assim como as escolhas dos recursos técnicos como elementos do processo de criação. Estas técnicas variam em grandes escalas: cor, montagem do foco, luz, sombras, cortes, etc. São processos que configuram a montagem deste olhar criativo, implícito antes, durante e depois do ato fotográfico. O espectador, como intérprete, é levado a analisar criticamente, partes significativas da produção social deste projeto pelas imagens, porque a fotografia como linguagem artística, assegura, como fonte de conteúdos e conhecimentos, a um só momento, a democratização desse meio e a apropriação desta linguagem. A esse posicionamento, a fotografia nos permite fugir de suas características reais, alcançando pela arte, outras formas enquanto criação artística. Em suma, “A arte é

definida como aquilo mesmo que permite escapar do real”(Dubois, 2011).

3.4 a tríade na fotografia Apropriando-se dos questionamentos abordados no capítulo primeiro, sobre a Semiótica, a fotografia configura-se nas três formas sígnicas. Age-se por indícios, “a foto é em primeiro lugar, Índice”, porque “sua realidade primordial nada diz além de uma afirmação de existência” e que “enquanto índice, a fotografia é por natureza um testemunho irrefutável da existência de certas realidades”(Dubois, 2011), ela indica, mediante o ato fotográfico, que algo existe ou existiu. Serão sempre vestígios de um contexto, recortes de um espaço no tempo. [...] a fotografia, antes de qualquer consideração representativa, antes mesmo de ser uma imagem que reproduz as aparências de um objeto, de uma pessoa ou de uma espetáculo do mundo, é em primeiro lugar, essencialmente,

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da ordem da impressão, do traço, da marca e do registro (marca registrada, diria Denis Roche). Nesse sentido, a fotografia pertence a toda uma categoria de “signos” (sensu lato) chamados pelo filósofo e semiótico americano Charles Sanders Peirce de “índice” por oposição a “ícone” e a “símbolo”. [...] os índices são signos que mantêm ou mantiveram num determinado momento do tempo uma relação de conexão real, de contiguidade física, de copresença imediata com seu referente (sua causa), enquanto os ícones se definem antes por uma simples relação de semelhança atemporal, e os símbolos por uma relação de convenção geral. (Dubois, 2011, p. 61)

86 Produzindo uma espécie de afogamento momentâneo do espectador quando este debruça o olhar sobre o que é revelado por ela, a fotografia transcende o imaginário, produz, questiona, transmite inquietudes que os “olhos” que a observa, atenta-se a decifrar, usurpar o máximo de suas representações, bem como suas apresentações. Produz-se à mente intérprete, diante da imagem fotográfica, um universo de outros semelhantes, a que recorremos aos conceitos de Ícone, em seu papel de assemelhar-se com o objeto (a imagem observada). “O importante no ícone é a semelhança com o objeto – quer

este exista, quer não”(Dubois, 2011), quando os elementos constitutivos da imagem fotográfica tem um grau de semelhança com o seu referente, a ideia de ícone é predominantemente ressaltada. Susan Sontag (2004), em seu livro “Sobre fotografia” questiona esse impacto que a fotografia causa, ao afirmar que “as fotos modificam e ampliam nossas ideias”(p.13). certamente estes, os verbos modificar e ampliar, ditam o posicionamento desse projeto experimental. O espectador, ao mergulhar em “os tons do Nordeste: fotografia e musicalidade”, de uma forma ou de outra, será levado a perceber o Nordeste, não mais restrito às concepções advindas de outros tempos, mas instigado a enxergar um Nordeste que sempre esteve lá, bastava-se apenas levar o “foco” (abster-se das imagens solidificadas), a um novo direcionamento, uma nova perspectiva. Ou seja, adquirem sentido, como fazem os Símbolos, criam uma espécie de norma, agem por convenção. Notoriamente, vemos a fotografia como processos semióticos. Ela carrega em si todo o seu potencial sígni-

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co, perfazendo a tríade das relações do representamen (signo) com seu objeto: índice, ícone, símbolo.

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Discursamos sobre a fotografia, destacando a forma poética de suas enunciações. As páginas a seguir nos convidam a adentrar no campo de pesquisa, o sertão da Bahia, cenário escolhido para ser explorado, na construção deste projeto. A linguagem sonora traduzindo-se nas imagens reais, de um lugar único, com suas riquezas e vulnerabilidades expostas. Somos guia, enquanto guiados pela presença inestimável do acaso.

4. memorial criativo o sol pedia descanso entre as folhas e os espinhos. mergulhava no silêncio, naquele enteardecer alaranjado. era um rei que descansava depois do horizonte. eu, um peregrino cortando caminhos, costurando e desenhando tudo outra vez. (leonardo garcia)

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4.1 pré-produção Desde a primeira ideia a respeito do projeto, foi-se pensado num ensaio fotográfico que nos permitisse desbravar e desvendar pelas imagens, o sertão nordestino, bem como vivenciar o projeto ao passo de sua construção, e inundar-se com o real. O ensaio fotográfico, como tradução de uma musicalidade, parte de uma seleção de artistas/cancioneiros do Nordeste, dentre eles, Aldy Carvalho e Marcos Wendel. Aldy Carvalho nasceu em Petrolina/PE, que além de cantor e compositor, é violinista e poeta. Sutis interesses provindos do pai, compositor do universo popular da região nordestina como a poesia, prosa, música e o teatro. Em seu trabalho, notamos o sincretismo recheado de baiões, martelos, emboladas, xotes, modinhas, sagas etc. E nas palavras do próprio cancioneiro, “um ajuntado de cantigas e imagens, o lirismo do Sertão das

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léguas que andei”2.

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Marcos Wendel, natural de Pernambuco, da cidade de Caruaru, formou-se em filosofia pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Caruaru (FAFICA). Desde seus nove anos, aprendeu música. Iniciando com seu primeiro instrumento, um sax alto, e em seguida, a flauta transversal, ponto inicial de sua trajetória, porque é do encantamento do pífano e do estilo característico das bandas de pífanos que o que começaram a surgir suas primeira composições. Fiz minhas primeiras composições em 2012 as quais renderam a gravação de um disco instrumental denominado “ritmos do nordeste”, onde pretendi abarcar um pouco da diversidade rítmica e musical da cultura nordestina e principalmente da pernambucana. Tendo como principais influências artistas populares e ícones da musica nordestina, principalmente da cena musical pernambucana como Luiz Gonzaga, Alceu Valença entre outros, assim como influências diretas do movimento Armorial.3

2 Citação extraída das redes sociais do cancioneiro: www.aldycarvalho.blogspot.com, flickr.com/aldycarvalho 3 Citação extraída das redes sociais do cancioneiro: www.facebook. com/marcoswendel

Estes cancioneiros, carregam em sua trajetória e composições, o próprio Nordeste, a pureza de se contar entre versos e melodias, a alma desta região. Destes cancioneiros, elegemos as músicas que nos permitissem traçar este percurso, como a playtlist4 de uma viagem, que nos levassem ao Nordeste num reencontro entre passado – toda uma trajetória de vida deixada nos solos do sertão – e presente, mesclando as dicotomias próprias do Nordeste. O lugar escolhido para o ensaio fotográfico, foi o sertão da Bahia, com viagem realizada entre os dias 24 de Junho a 8 de Julho do ano corrente. Época de comemorações religiosas e as festas juninas e suas derivações. Este ensaio fotográfico obteve traços de artistas contemporâneos. Utilizando o “foco seletivo” comumente usado por Claudio Edinger (1952), abusando das cores baseando-se nas produções artísticas de Cassio Vas-

4 Playlist é um termo inglês que geralmente é utilizado no meio da radiodifusão para se referir a uma determinada lista de canções, que podem ser tocadas em sequência ou embaralhadas. O termo tem vários significados especializados nos domínios da radiodifusão e dos computadores pessoais. (fonte: http://pt.wikipedia.org)

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concellos (1965).

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Deste modo, faz-se necessário entender como cada artista direciona seus trabalhos, servindo-nos de referências na construção das imagens. Artistas supracitados como Claudio Edinger (1952), fotógrafo brasileiro, que nasceu no Rio de Janeiro. Formado em Economia, que optou pela fotografia na mesma década em que se formara, realizando sua primeira exposição no Museu de Arte de São Paulo (MASP). Com um repertório marcado pela preocupação relevante às questões sociais, e que, observou-se o seu olhar sobre as manifestações culturais e a forma estrutural da sociedade. Edinger (1952), em seus trabalhos fugia das imagensclichês, fotografava personagens anônimos na composição de cada cena. Esse projeto parte desse ponto de vista, buscando revelar outras maneiras de se pensar a região nordestina, ressaltando outros focos, a produzir novos interpretantes, ora em processos mais icônicos, indiciais ou simbólicos.

Ao explorarmos o foco seletivo que é deixar nítidas, partes das imagens, mais que outras, seleciona-se um ponto de interesse, visto que o espectador/ intérprete, busca na imagem observada áreas nítidas para prender sua atenção e olhar fixo a este ponto relevante. Esse processo aspira levemente à ideia de sonho, lembranças, delicadeza, produzindo um efeito envolvente sem perder a sua essência contextual. O foco seletivo, condiciona à imagem, efeitos de destaque, sendo um dos recursos maus explorados pelos fotógrafos. Utilizando os meios técnicos, para parafrasear o foco seletivo, notamos que este, está relacionado à baixa profundidade de campo, adquirida por maiores aberturas do diafragma, da distância focal da lente (zoom) em oposição à distância entre a câmera e o objeto. Sendo também muito explorado por Edinger em seus experimentos, o foco seletivo, nas palavras do artista, nos diz que “além de ser a forma como enxergamos o mundo, cria um paradoxo e uma síntese dentro da imagem. E o que o mundo tem de mais interessante são os paradoxos

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e as sínteses”, diz o fotógrafo.5 Destacam-se a seguir, fotografias do artista produzidas entre 2005 e 2010 no sertão da Bahia.6

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5 Trecho retirado da coluna editorial de Ricardo Setti, revista letrônica Veja. (Fonte: http://veja.abril.com.br/blog/ricardo-setti/ tag/claudio-edinger/ 6 As imagens foram selecionadas da página oficial do artista: www. claudioedinger.com

97 Fig. 14 Bom Jesus 2005

Fig. 16 Povoado da Passagem 2005

Fig. 15 Itaporangaba 2007

Fig. 17 Andaraí 2010

Observadas as composições fotográficas do artista Edinger, notamos a singularidade dos detalhes, o foco centrado num ponto específico, direcionando o olhar do intérprete àquele ponto da imagem.

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Outro artista referencial, é o fotógrafo Cássio Vasconcellos (1965), nascido na capital paulista, que estudou fotografia na Imagem e Ação na década de 1980. Como trabalhos iniciais, voltou-se para a impressa, fotografando para a revista Isto É, e em seguida para o jornal Folha de São Paulo, nesta mesma década. Na seguinte década, migrou-se para a foto publicitária. Após esse período, montou seu próprio estúdio, que em paralelo à sua carreira profissional, preocupava-se em atuar no campo da expressão pessoal, e lá no início, em 1983, já havia realizado exposições individuais. Com enquadramento arrojado e um olhar subjetivo, explorava basicamente em sua fase inicial, temas urbanos. Na década de 1990, opta por manipulações técnicas. Em seu ensaio “NOTURNO”, abusa das cores, preenchendo esse paradoxo entre a luz e a escuridão. Este ensaio,

atribui-se muito ao que pretendemos com esse experimento, desfocar as “lentes” das pessoas que retratam e caracterizam o Nordeste como o “Nordeste da seca”, para observarem a explosão de cores que emanam deste lugar. A seguir, algumas das fotografias do artista Vasconcellos, de seu ensaio “Noturno”, produzido na cidade de São Paulo entre 1998 a 2002.7

7 As imagens foram selecionadas da página oficial do artista: http://www.cassiovasconcellos.com.br

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100 Fig. 18 Higienópolis/ São Paulo

Fig. 20 Pq. Vila Lobos/ São Paulo

Fig. 19 Marginal Pinheiros/ São Paulo

Fig. 21 Fura-fila/ São Paulo

Observamos nestas imagens, o predomínio das cores primárias, cores quentes, prevalecendo sobre os tons mais atenuados e frios. Deste modo, buscamos agregar ao projeto esta supervalorização das cores que destacamse entre as demais, inundando o olhar, dando vida a lugares que parecem inóspitos, mórbidos. A partir das concepções dos fotógrafos já mencionados, pensamos o ensaio fotográfico dividindo-o em três partes, e a estas, um tema a ser explorado, com músicas específicas para cada um dos temas, que nortearão a construção das imagens. Os temas são: “Recantos das Cores”, “Alforje das Lembranças” e “Meu lugar”. Ao tema “Recanto das Cores”, um perfil de imagens construídas pela força e qualidade das cores, símbolo fascinante nordestino. Este, caminhando de encontro às imagens construídas que revelam o Nordeste seco e sem vida. O colorido supre essas concepções e marcam uma trajetória, uma história tecida com alegria e encanto. As músicas pré-selecionadas são: “Capoeira Psicodélica” (Marcos Wendel, 2012), ”Levanta Poeira” (Marcos Wendel, 2012), “Maracatu flauteado” (Marcos Wendel,

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2012), “Voo de Passarinho” (Aldy Carvalho, 2011).

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No “Alforje das Lembranças”, atribui-se às imagens a singularidade, a solidão de um momento. Espaço da saudade, lembranças alegres ou tristes. Foca-se na particularidade das coisas, dos objetos que dispostos à cena carregam o lirismo nordestino. Músicas: “Aboio sertanejo” (Marcos Wendel, 2012) , “Estrada de Aveloz” (Aldy Carvalho, 2011), “Marias” (Aldy Carvalho, 2011), “Sina de Cantador” (Aldy Carvalho, 2011). Ao tema “Meu Lugar”, revelam-se as paisagens, festividades, a vida no sertão, com suas expressões e particularidades distintas. O Nordeste, espaço de magia e descobrimento. Músicas: “Patuscada” (Aldy Carvalho, 2011), “Saudades do meu Nordeste” (Marcos Wendel, 2012). Ressaltamos que todo esse trajeto para a realização das imagens fotográficas, são processos relativos, ou seja, poderemos no percurso deste, optar ou não, por outras formas de produção, como também dispor de mais referências tanto musicais quanto imagéticas.

4.2 fotografia: o nordeste em cores Assumo aqui o papel de interlocutor desta narrativa. O “eu” enquanto autor/criador na construção e contextualização dos relatos ou das experiências transcritas a partir deste subitem. Eu sempre acreditei num Nordeste muito além de seus estereótipos (lugar árido, seco, de pessoas famintas, lugar de abandono e solidão), às vezes era difícil entender os porquês dos preconceitos impostos à região. Quando Kossoy (2007) diz que as imagens são instrumentos de manipulação política e ideológica, tornou-se claro todo o propósito deste projeto experimental. Se num dado momento da história as imagens criadas da região permaneceram no imaginário da sociedade como “verdades”, as imagens fotográficas produzidas para desconstruir estes clichês, expõem um outro Nordeste, desmistificado, sem apegos simbólicos.

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Os quinze dias percorridos entre cidades e povoados com seus mais variados personagens, busquei adentrar nas impressões e marcas nordestinas. Suas cores percorriam nas veias e feições de seu povo (a que também faço parte).

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De um entardecer a outro, envolvido pelas músicas de cancioneiros nordestinos, as cenas que se constituíam, guiavam-me de tal forma ao encontro com o passado, esquecido num canto qualquer da memória, mas que se (re)configurava em novas concepções ali, no presente. Presente este, não tão distante daquele passado. Seus “tons” (usando a metáfora para falar de um tempo a outro) ainda eram fragrantes. Foi percorrendo lugares, conhecendo pessoas, vivenciando o momento do aqui e agora que as cores que eu buscava, eram impressas num processo dialógico entre a música e a fotografia, contaminado por memórias. [...] Com elas, viajamos no tempo, em direção aos cenários e situações que nelas vemos representados; através de nossas lembranças, de nossa imaginação, viajamos ao passado e vi-

vemos por instantes essa ilusão documental.” (Kossoy, 2007, p.146)

Olhares serenos, gestos únicos davam-me a oportunidade de transbordar às imagens fotográficas, captadas pelas “lentes” (não somente às lentes óticas, mas o olhar sobre o instante que se passa) as expressões e vivências. A particularidade de cada momento que era captado, mortificado pelo instante da ótica, o “particular absoluto” como afirma Phillipe Dubois (2011).

lirismos do sertão Ao adentrar no ‘mundo’ do sertão nordestino, sertão este de tantos aforismos, que inúmeras vezes é revivido nas páginas de um romance, num conto, no colorido do cordel ou na letra e melodia da canção, tem-se a soberania do arcaico e rústico, quer sejam nos costumes, crendices ou sejam nas próprias características da região, demonstrando uma beleza incontestável. Transmite uma plasticidade única, o que condiz ao ‘belo’, em seu sentido amplo.

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Diante de um vasto campo cinematográfico, nossas lentes perdiam-se em tantos detalhes que por vezes tornava-se tarefa árdua direcionar o foco a apenas um ponto estratégico/específico. Embora todo o percurso fotográfico tivesse uma pré-produção, tratava-se de um ensaio instigado a buscar cada situação-imagem ao acaso, sem talvez ousar estabelecer uma roupagem para cada clique. Eram apenas a música, a câmera e eu entre os caminhos e os cenários do sertão. Eu tinha o suporte técnico, a câmera, e encontrava-me ali no sertão da Bahia, vivenciando a realidade indispensável à construção das imagens fotográficas. Toda imagem fotográfica que comporá o discurso final deste projeto, bem como sua contextualização, serão reflexos de um tempo, farão parte de um passado ‘reencarnado’. [...] imagens podem voltar a ter uma ‘função na vida’: representar uma família, reatarse umbilicalmente a um referente, alguém que necessite de identificação e de memórias, um fantasma, um androide, um clone, não importa. Essas representações podem agora ressurgir ou ressuscitar, digamos assim, numa nova ‘encarnação’. (Kossoy, 2007, p. 142)

Estes reflexos, como imagens capturadas tecem uma identidade própria. Os sentimentos, os personagens dispostos constroem um enredo, carregam em si, a alma do autor. A este vínculo, tem-se a ideia de um trabalho moldado, autoral, incapaz de ser pensado sem a presença de seu autor.

a poética artística pessoal Todos os contos tem um início, este, nasce de sua finitude.. Um reverso construído nas imagens fotográficas. Todo o ensaio pautado pela soberania do acaso, revela uma passagem no tempo, uma história de memórias. Uma história que nasceu tão particular. Pensar a fotografia como meio de atravessar o tempo, para trazer à superfície toda uma vivência, que se emoldura entre as imagens capturadas, com toda sua plasticidade e poesia. Agir por semelhança (ícone), talvez seja este o meu empenho em transformar as minhas alusões passadas pela fotografia.

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Quando decidi que caminho tomar frente a tantos outros destinos, foi preciso desviar-se dos obstáculos, que não foram poucos. De início, as inúmeras encruzilhadas que permitiam escapar do tema-alvo, as ideias fluíam e com elas as tantas dúvidas, e entre orientações a outra, este projeto foi finalmente decidido. Um outro momento, tido como obstáculo, foram os suportes técnicos.

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Uma boa câmera me possibilitaria a qualidade das imagens, que até o último segundo eu não tinha ( o amigo Paulo, parecia ter entendido a minha necessidade, e sem objeções, cedeu sua câmera, o que ficarei imensamente grato por tamanha generosidade e confiança). Sem contar de minha pouca experiência como fotógrafo. Estes dois pontos deixaram-me amedrontado com a tamanha responsabilidade que este projeto tomaria de mim. Os conceitos teóricos estavam em ordem, mas o ato em si, a prática caminhava pelo âmbito da dúvida. A viagem para o sertão baiano, cronometrada em 15 dias e nada além disso. A doença repentina de minha mãe, que me forçava mais atenção e cuidados a ela. Eu sabia

que todo mísero segundo era oportuno, e várias vezes acompanhando minha mãe aos médicos em cidades vizinhas, conduzia a câmera, na esperança de registrar momentos que fariam parte do ensaio fotográfico, tendo a música sempre presente em cada ato. Como não lembrar da introdução melódica da música “Sina de Cantador” do compositor e cancioneiro Aldy Carvalho, ao fotografar um instante de fé, de joelhos prostrados, diante de um símbolo religioso resguardado?. E assim o fiz. Foram registros importantes na construção deste projeto, capturados em momentos decisivos, que jamais eu os poderia registrar em um outro momento ou situação. As primeiras imagens fotográficas começaram tímidas, sem a audácia que muitos outros fotógrafos possuem. Surgiam sem pretensões, sutis, casuais. Todo o ensaio foi orientado pela casualidade como dito antes. E entre as mais de 400 fotografias, entre erros e acertos, escolhi as imagens que se caracterizavam como reflexos de minha própria vida, traduzindo-se em cores e personagens. De certo, estas imagens fotográficas traduzem o meu infinito particular.

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Fotografia contaminada pelo olhar, pelo corpo, pela existência de seus autores e concebida como ponto de intersecção entre as mais diversas modalidades artísticas, como o teatro, a literatura, a poesia e a própria fotografia tradicional. (Chiarelli, 2002, p.115)

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Durante o processo de criação, os verbos Ser e Estar, adquiriram suas distintas definições. Ser, na essência do que acredito, do nordestino que carrego, da bagagem cultural, das tradições e crendices, do sotaque acentuado. Estar, quando percebi que já não era o mesmo, que mudanças advindas da vivência no “sul”, me fizeram entender que eu era um “estranho” em meu próprio lugar de origem. Aquela vida de antes, hoje estava cada vez mais distante de mim. Notei um abismo interior quanto ao meu sotaque, um traço característico, modificado parcialmente, notadamente percebido no reencontro de meus entes queridos lá do sertão. Eu sou e ainda faço parte daquele lugar, a que me recordo, que me enche de saudades, mas naquele momento, eu apenas estava, qual estrangeiro garimpando e revirando as coisas que um dia fizeram parte de mim (ainda fazem).

Esta reflexão, ratifica com veemência esse desejo de falar da terra que me fez germinar, de meu povo, que por meio deste projeto me fez experimentar, reviver toda uma vida, guardada em mim, sempre viva.

4.3 a edição O ensaio fotográfico pensado lá na pré-produção, com suas referências em fotógrafos singulares, dividia-se em três distintos ensaios “Recanto das Cores”, “Alforje das Lembranças” e “Meu lugar”. Selecionadas as imagens, a forte presença de uma unicidade entre elas, de um diálogo conjunto, me fez perceber que elas não poderiam fazer parte de um ensaio quebrado, com subtemas e afins, mas estruturadas num único tema, vinculadas a uma só narrativa. Para tanto, foi pensado no tema “Os tons do Nordeste”, que revelava toda a essência deste projeto, que valese da música e da fotografia (tons sonoros e tons visuais) em sua composição.

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Tons que se mesclam, tecem conceitos, lidam com o imaginário. A propósito, as imagens fotográficas serão apresentadas em conformidade com os tons musicais que me inspiraram neste processo de tradução.

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Foram selecionadas 20 fotografias8, em sua maioria retratando personagens do cotidiano, imagens que me fizeram enxergar o Nordeste, tendo a música como guia, porque a música estava presente como produtora dos caminhos que me levavam às imagens.O foco seletivo prevaleceu em algumas das imagens com a função de posicionar o olhar do espectador a um ponto estratégico. Seria pois a ação do autor, indicando, especificando a leitura de cada imagem. Também era uma forma de imprimir o meu ponto de vista, o que realmente era relevante nas imagens para ser explorado, discutido, observado. Como uma forma de persuadir o olhar do espectador, manipular a um certo ponto, mas sem perder a sua plasticidade.

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vide anexo

4.3.1 breve análise semiótica Com base nos pressupostos da teoria de Peirce, as noções de signos tornam-se inerentes ao registro fotográfico. Tais conceitos segundo Kossoy (2000), são indissociáveis no processo de criação fotográfico, “não podem ser compreendidos isoladamente”. Isso mostra que para a fotografia, as relações sígnicas entre Índice, ícone e o Símbolo, agem em conjunto, ligeiramente identificáveis, mas interligados qual processo de semiose. Toda imagem fotográfica carrega em sua essência a tríade sígnica do índice, ícone e símbolo. Em suma, o Índice te leva a uma interpretação sem ser óbvia. Ele te indica, te direciona um caminho. “qualquer que seja o conteúdo de uma fotografia nele teremos sempre o rastro indicial”(Kossoy, 2000). O índice em o poder de indicar não de ter certeza. O Ícone tem o papel de se assemelhar ao referente. É Sugestivo. Sugere alguma coisa. Ele não indica e não

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interpreta. Ele te traz um universo de outros semelhantes. O Símbolo te dá uma interpretação pronta, a relação é puramente convencional. Seguem as análises9.

Oração10 114 Era manhã de sexta, de sol quente, da feira da cidade. Parei próximo a entrada da Capela observando os passos dos fiéis. E assim iniciou-se o processo de produção fotográfico. A esta imagem, revela um Nordeste das crenças e tradições, da fé incontestável. Ouvir parte da melodia contida na música “Sina de Cantador”, trouxe ao contexto visual toda uma simbologia pulsante, no resgate às lembranças que outrora eu vivi.

9 Foram feitas as análises de 3 imagens fotográficas que fazem parte da Exposição “Os tons do Nordeste” anexadas ao término deste Capítulo 10 Fig. 24 do Anexo

Lembro-me de quando minha avó levava-me sobre os ombros, numa noite de novena à Capela. Eu ainda pequeno, de nada sabia. Rezas, cantos, olhares fixos. A quem clamavam? prostrados ou não, velas, rosários. A imagem posta sobre o altar revelava a candura daquele momento, às vezes ouvia os murmúrios de vó Maria, atenta à imagem e a mim. Acredito que a imagem por revelar signos religiosos, quer sejam nas particularidades de um tempo vivido por mim, quer sejam nas velas acesas, na senhora prostrada em reverência e adoração, é predominantemente simbólica. As cores fortemente marcadas entre os tons Azul e Vermelho da Capela num diálogo entre os mesmos tons encontrados no vestido da senhora de joelhos, insinua pensar numa similaridade, como reflexos do acaso, mesmo assim, os símbolos estão fortemente marcados em todo o contexto fotográfico.

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dona maria11

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A imagem que fiz de Dona Maria, quando convidado a almoçar em sua casa por sua neta (prima de um certo grau), carrega em si a figura emblemática da mulher Nordestina. O momento revela a sua ingenuidade diante da vida que se segue. O seu olhar profundo, intimista, insinua o poder da matriarca, tão comum às famílias nordestinas. Mulheres de personalidades fortes, ficavam no comando da casa enquanto seus maridos partiam. Mãe de numerosos filhos, cuidados e educados da mesma forma que fora. Com um recorte cauteloso que a posiciona no centro da fotografia, de perfil, nos sugere toda uma soberania, Dona Maria como representação fortemente icônica da mulher do Nordeste.

11 Fig. 22 do Anexo

caminho12 A benção, Madrinha, estou pra chegar. Arrume a cozinha, prepare o jantar. O rei me chamou, eu vou pelo mar. O navio apitou, não tarda a zarpar. Avise a Maria que eu levo pra ela. um vestido branco de flor na lapela. Ó mariana, não precisa chorar. Te levo uma fita, um brinco e um colar. Aldy Carvalho – A benção Madrinha A sonoridade encontrada nesta canção me trouxe aos indícios de um Nordeste da saudade, dos caminhos que se constroem da vida, dos encontros e das despedidas, marcas deixadas de alguém que chega, ou que outrora se vai.. Sertão que se derrama em risos e lágrimas. Passados cinco anos quando decidi estabelecer-me no sul, em São Paulo, volto a olhar este mesmo caminho,

12 Fig. 31 do Anexo

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quando retorno, embora passageiro, ao meu sertão sob o céu anil de nuvens brancas. Este nordeste que eu reencontro sempre esteve presente, a direção do olhar é que modifica o lugar e constrói sobre ele outras imagens. Evidencio o Nordeste por ser belo como é, com sua rusticidade aflorada, a terra da saudade, do reencontro com o passado.

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4.4 exposição: os tons do nordeste Mantendo a estrutura triádica do pensamento Peirceano, a Exposição contará com três painéis. A tríplice fotográfica contará com o repertório dos compositores e cancioneiros nordestinos, músicas que fizeram parte desta tradução e que estiveram presentes durante todo o processo. Para tanto, serão instalados fones de ouvidos para cada tríplice de panéis de imagens, proporcionando maior envolvimento do espectador nesta tradução intersemiótica constante.

A matriz sonora, segundo Almeida(2009) É aquela que por seu princípio fundamental deve conduzir emocionalmente o público, imprimindo um ritmo cognitivo no processo de fruição da narrativa. [...] seria o som... a imprimir no espectador a forma como ele irá interagir emocionalmente com a obra. (Almeida,2012,p.93)

Já as imagens, em específico a este projeto experimental, as imagens fotográficas Aparecem para informar o espectador sobre a narrativa. Ser, informar, visualizar.[...] a partir do momento em que a sonoridade envolve emocionalmente o espectador, é importante que ele tome ciência do que acontece, quem acontece, onde acontece para que o contexto possa ser absorvido, para que a história seja delineada.(Almeida, 2012, p.93)

Cria-se um diálogo entre a música e a fotografia e vice-versa, é nesta interação que o espectador inicia o processo de imersão ao projeto, para que a sua leitura seja amplamente codificada, compreendida. Os signos transformam a nossa forma de ver e pensar a região pois eles estão inseridos na construção social e espacial do Nordeste,. A exposição retrata em essên-

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cia as cores, símbolo maior de toda a cultura nordestina. Cores que assumem uma identidade, ganham formas ritmadas pela sonoridade cancioneira, colorem um mundo de possibilidades, os tons sonoros e visuais da região Nordeste.

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Quando decidi transformar o projeto experimental em exposição, nascia a probabilidade de um grande número de pessoas conhecer e experimentar das minhas ideias. As composições fotográficas criadas na construção de novos signos bem como a desconstrução de tantos outros seriam alcançadas. Eu não queria me prender ao fato de tê-las fixas apenas em meu material teórico, pensava nessa infinidade de possibilidades interpretativas que surgiriam a partir do momento que fossem expostas. Assim, fica a certeza de que a exposição sintetiza todo o meu trabalho artístico e autoral aprimorado neste projeto experimental.

anexos

#ostonsdonordeste

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fig. 22 Dona Maria. Raspador-Ribeira do Amparo/Ba

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fig. 24 Capela de Stª Tereza. Ribeira do Pombal/Ba

fig. 23 Capelinha. Raspador-Ribeira do Amparo/Ba

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fig. 25 contrastes. Raspador-Ribeira do Amparo/Ba

fig. 26 o som das águas. Cipó/Ba

fig. 27 O som das águas. Cipó/Ba

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fig. 28 O som das águas. Cipó/Ba

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fig. 29 Artesã. Cipó/Ba

fig. 30 Seu Zé. Raspador-Ribeira do Amparo/Ba

fig. 31 Caminho. Boca da mata-Ribeira do Pombal/Ba

fig. 32 Aboio. Bendó - Ribeira do Amparo/Ba

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fig. 33 Cipó/Ba

fig. 34 Meninos do Galo. Raspador-Ribeira do Amparo/Ba

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fig. 35 Dona Zefinha. Raspador-Ribeira do Amparo/Ba

fig. 36 menina do Galo. Raspador-Ribeira do Amparo/Ba

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fig. 37 velharia. Raspador-Ribeira do Amparo/Ba

fig. 38 menino da rural. Cipó/Ba

fig. 39 passeio. Raspador-Ribeira do Amparo/Ba

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Fig. 41 exaustão. Ribeira do Pombal/Ba

fig. 40 Meninita. Raspador-Ribeira do Amparo/Ba

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considerações finais Quando enxergamos pela arte a forma sublime de experimentar possibilidades, tudo na vida se transforma e começamos a aprender que a arte molda o nosso jeito de pensar e ver o mundo. Este projeto buscou na arte, a sua maneira de tornar visíveis novas elucidações sobre a região Nordeste, que tem um amplo campo a ser explorado e desmistificado. A região Nordeste ainda é vista como lugar seco e sem vida, lugar do abandono, das injustiças sociais. Ir de encontro a todos esses conceitos firmados durante anos é revelar um Nordeste das cores, Nordeste de paisagens singulares e das impressões de seu povo em seu cotidiano, que por meio da tradução intersemiótica de linguagens, sonora e visual (fotográfica), buscou construir novos signos frente a tantas outras interpretações sígnicas inseridas na região. Tivemos como resultado, quando nos permitimos mergu-

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lhar nas melodias e canções de compositores nordestinos, um reencontro com o nordeste, haja visto, da nossa inserção no sertão da Bahia para capturar pelas lentes da câmera, as imagens que se emergiram deste processo de tradução.

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Embasados nos conceitos Peirceano, sobre semiótica, constatamos nas composições fotográficas, as relações sígnicas e de como elas agem concomitantes, apesar que, os signos (ícone, índice, símbolo) têm suas características distintas e podem prevalecer uma mais que outra. A exemplo, as imagens fotográficas escolhidas para a Exposição “Os tons do Nordeste”, imbuídas da presença dos três tipos sígnicos, era possível enxergar a predominância de cada um deles em cada grupo de imagens fotográficas selecionado para compor a tríade do pensamento Peirceano na exposição. E assim, como nos afirma Sontag, “as fotos modificam e ampliam nossas ideias”, sendo este projeto experimental, uma das tantas possíveis oportunidades de percepção e de formação de novos conceitos sobre a região Nordeste.

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