PÁGINAS PSICOTRÓPICAS: O TEMA DAS DROGAS NAS MATÉRIAS DE CAPA DA REVISTA VEJA

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LEANDRO NORONHA DA FONSECA – R.A. 910125489

PÁGINAS PSICOTRÓPICAS: O TEMA DAS DROGAS NAS MATÉRIAS DE CAPA DA REVISTA VEJA

UNIVERSIDADE NOVE DE JULHO SÃO PAULO – 2013 2

LEANDRO NORONHA DA FONSECA – R.A. 910125489

PÁGINAS PSICOTRÓPICAS: O TEMA DAS DROGAS NAS MATÉRIAS DE CAPA DA REVISTA VEJA

Trabalho de Conclusão de Curso II, apresentado como requisito parcial para aprovação no curso de Comunicação Social com habilitação em Jornalismo, da Universidade Nove de Julho (UNINOVE), campus Memorial.

Orientadora: Prof.ª Ms. Ana Lúcia Tsutsui

UNIVERSIDADE NOVE DE JULHO SÃO PAULO – 2013 2

Aos meus pais e minha família, vítimas da mídia conservadora; Aos que se reúnem na Praça do Pôr do Sol para fumar maconha, e aos que passam pelos campinhos de futebol de Guaianazes para o mesmo fim; Aos que se espremem em banheiros apertados para cheirar mais uma “carreira” da noite; Aos que perambulam o centro de São Paulo em busca de mais uma “pedra” e lutam para sobreviver em meio a uma política higienista; Aos que se esbaldam nas fantasias do ecstasy e do LSD nas raves e baladas; Aos que escondem os braços perfurados pela agulha de uma seringa; E aos que bebem para celebrar a vida, para afogar as mágoas e para espantar os demônios da alma.

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AGRADECIMENTOS

A lista de pessoas que me ajudaram é extensa. Para não deixar um nome ou outro fora dela, faço um agradecimento a todas as pessoas que contribuíram de uma forma ou de outra, direta ou indiretamente, para que este trabalho fosse concluído. Entretanto, deixo aqui uma gratidão especial à Profª Ms. Ana Lúcia Tsutsui, orientadora deste trabalho que, com todo seu carinho, atenção e dedicação, possibilitou que ele estivesse hoje em suas mãos. Agradeço, também, a Karina Mendes e Nicole Patrícia, amigas que tiveram toda paciência do mundo em ouvir minhas dúvidas, ideias, angústias e anseios durante o desenvolvimento deste trabalho.

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A campanha da TV me mostra como um burro Que na escola vai repetir, ser mau aluno Em nenhum comercial o cuzão publicitário Me expõe como vítima do tráfico Aqui só é humilhado pobre que usa droga Nunca o boy dono da plantação de coca A lente não faz foco em condutor de Maranello Com personal trainer e endereço em Campo Belo Filma aí o gambé trazendo crack pra eu vender Recebendo divida com moto e DVD Governo omisso mete areia com campanha falsa Que resulta em carne envenenada no seu cão de guarda E você asfixiado com gás que sai do forno Pra eu trocar por 5g seu vinho do porto Se viciado é criminoso, tão tudo perdido Tratamento clínico não é choque no distrito

“Aperte o gatilho, por favor” – Facção Central

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RESUMO

O presente trabalho de conclusão de curso analisa as matérias de capa da revista Veja, de 2000 a 2012, sobre o tema as drogas e seus usuários. A partir de um estudo acerca das drogas no âmbito histórico, refletindo sobre elas a partir de uma fenomenologia social, são apresentados alguns conceitos de dependência, também inseridos nas lógicas de saúde e segurança públicas. Com embasamento na teoria organizacional no jornalismo, elaborada por Warren Breed, é traçado um perfil de Veja para compreender sua potencialidade em influenciar e formar opinião pública. Foram escolhidas as manchetes, título das matérias, capas e fontes de informação como elementos para se chegar à conclusão da análise.

Palavras-chave: Revista Veja, drogas, teoria organizacional, usuários de drogas, matérias de capa.

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ABSTRACT

The following term paper analyses the cover stories about drugs and its users on the magazine VEJA, from 2000 to 2012. It begins with a historical study about drugs, reflected from a social phenomenology and presenting some dependence concepts, also inserted on public health and security. VEJA’s profile is based on the journalistic organizational theory, created by Warren Breed, and it presents the potential the magazine has to influence and form the people’s opinion. The elements chosen to conclude the analysis were the magazine’s headlines, the story titles, the front covers and the information resources.

Keywords: VEJA magazine, drugs, organizational theory, drugs users, cover stories.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 — Capa da edição 1659...........................................................................................................63 Figura 2 — Capa da edição 1733...........................................................................................................64 Figura 3 — Capa da edição 1985...........................................................................................................64 Figura 4 — Capa da edição 2009...........................................................................................................65 Figura 5 — Capa da edição 2030...........................................................................................................66 Figura 6 — Capa da edição 2050...........................................................................................................67 Figura 7 — Capa da edição 2087...........................................................................................................68 Figura 8 — Capa da edição 2091...........................................................................................................69 Figura 9 — Capa da edição 2129...........................................................................................................70 Figura 10 — Capa da edição 2136........................................................................................................71 Figura 11 — Capa da edição 2157........................................................................................................72 Figura 12 — Capa da edição 2222.........................................................................................................73 Figura 13 — Capa da edição 2277.........................................................................................................74 Figura 14 — Capa da edição 2293.........................................................................................................7 4 Figura 15 —Primeiras páginas da matéria de capa da edição 1659.......................................................7 5 Figura 16 —Primeiras páginas da matéria de capa da edição 1733.......................................................7 6 Figura 17 —Primeiras páginas da matéria de capa da edição 1985.......................................................7 7

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Figura 18 —Primeiras páginas da matéria de capa da edição 2009.......................................................78 Figura 19 —Primeiras páginas da matéria de capa da edição 2030.......................................................79 Figura 20 —Primeiras páginas da matéria de capa da edição 2050.......................................................8 0 Figura 21 —Primeiras páginas da matéria de capa da edição 2087.......................................................8 1 Figura 22 —Primeiras páginas da matéria de capa da edição 2091.......................................................8 2 Figura 23 —Primeiras páginas da matéria de capa da edição 2129.......................................................8 3 Figura 24 — Primeiras páginas da matéria de capa da edição 2136......................................................8 4 Figura 25 — Primeiras páginas da matéria de capa da edição 2157......................................................8 4 Figura 26 — Primeiras páginas da matéria de capa da edição 2222......................................................8 5 Figura 27 — Primeiras páginas da matéria de capa da edição 2277......................................................8 6 Figura 28 — Primeiras páginas da matéria de capa da edição 2293......................................................8 7

Gráfico 1 —Quantidade de fontes de informação nas matérias analisadas............................................88

Tabela 1 — Espaço que Veja deu ao tema das drogas, em 12 anos........................................................55

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ..............................................................................................................................12 1. O HOMEM ENTORPECIDO E A SOCIEDADE DA RAZÃO ........................................... 14 1.1. O MUNDO, AS DROGAS E O HOMEM................................................................................14 1.2. O BRASIL, AS DROGAS E O HOMEM.................................................................................18 1.2.1. Nova lei, velho problema............................................................................................22 1.3. DEFINIÇÕES E DINÂMICAS DO VÍCIO..............................................................................24 1.3.1. Abordagem biopsicossocial........................................................................................25 1.4. PROBLEMÁTICA SOCIAL.....................................................................................................27 1.4.1. Proibicionismo Vs. Descriminalização.......................................................................29 2. (IN) FORMAÇÃO PÚBLICA: A MÍDIA COMO EMPRESA E FORMADORA DE OPINIÃO.........................................................................................................................................33 2.1. BREED E A SUA TEORIA.......................................................................................................33 2.1.1. Definição da teoria organizacional.............................................................................34 2.1.2 Dinâmica da teoria nos veículos de comunicação no Brasil........................................39 2.2 MÍDIA E SOCIEDADE: RELAÇÕES.......................................................................................41 2.2.1 Opinião pública: formar, informar e deformar.............................................................42 2.3 INTERFERÊNCIA DA MÍDIA NO TEMA DAS DROGAS.....................................................45 3. A ÓTICA DA REVISTA VEJA SOBRE O TEMA DAS DROGAS E DE SEUS USUÁRIOS......................................................................................................................................49 3.1 VEJA, PRODUTO DE UMA EMPRESA..................................................................................49 3.2 ANÁLISES.................................................................................................................................52 3.2.1 Metodologia.................................................................................................................52 3.2.2 Análise das manchetes.................................................................................................54

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3.2.3 Análise das capas.........................................................................................................61 3.2.4 Análise do título das matérias......................................................................................75 3.2.5 Análise das fontes........................................................................................................88 CONSIDERAÇÕES FINAIS...........................................................................................................91 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................................................................94

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INTRODUÇÃO

Discorrer sobre drogas necessita estudar o ser humano em sua complexidade. É impossível tratar do assunto sem pensar o homem não apenas em sua individualidade, mas também como parte de um processo civilizatório que resulta no que chamamos de sociedade. Não somente pelas drogas existirem desde os primórdios como caminho para abrir “as portas da percepção” – parafraseando o escritor Aldous Huxley, em seu livro homônimo de 1954 – ou para outros fins. Tratar do seu uso implica trilhar por diversas áreas do conhecimento, e por este motivo se torna exaustivo seu estudo, porém, fascinante. A medicina, em sua amplitude, nos faz entender a dinâmica das drogas em contato com a mente e o corpo humanos. Assim como a sociologia e a psicologia auxiliam uma reflexão do homem em sua complexidade intrínseca como sujeito pensante diante do uso dessas substâncias. Ou seja, cada ciência nos permite ver (ou estudar) o assunto sob óticas diferentes para, assim, entendê-lo por completo. Pelo menos, é o que se espera para compreender as drogas longe dos mitos e pré-conceitos formulados pela falta de informação. E por falar em informação, quais instrumentos mais importantes pela sua disseminação senão os veículos comunicacionais? Desde o século XV, a imprensa, no qual Johannes Guttenberg é “pai”, exerce grande influência na sociedade, em diversos âmbitos. Discorrer sobre os veículos de comunicação, também é estudar o indivíduo em sua complexidade. É estudá-lo como transmissor e receptor de informações, munido de sua individualidade. Em contrapartida, temos a influência dessas informações em cada sujeito em contato com os meios de comunicação, principalmente das empresas milionárias, detentoras de um império midiático e, portanto, com potencialidade de atingir um número maior de pessoas. Além de outros fatores, é através dessas informações transmitidas e sua tradição que um veículo ganha credibilidade e se estabelece como inexorável ferramenta de conhecimento. A responsabilidade social se dá, em profundidade, quando se toca neste ponto. Uma mentira jamais pode estar maquiada de verdade em uma informação 12

passada: é assim que se pautam os princípios do jornalismo, baseados teoricamente na apuração de dados, neutralidade e imparcialidade. Porém, ao colocarmos os olhos no jornalismo que consumimos todos os dias, direta ou indiretamente, temos certeza de que esses princípios existem, em boa parte, somente nas páginas de livros. Diante da imensidão de ambos os temas (drogas e comunicação), estas dezenas de páginas que foram escritas não os contemplam por completo. Contudo, há, aqui, um esforço em estudá-los de forma ampla e, posteriormente, propor ao leitor uma reflexão no mesmo grau. A importância de compreender o usuário de drogas como sujeito integrado em uma sociedade é a mesma de compreender a revista Veja, por exemplo, como formadora de opinião. Alguém não usuário de drogas, ao ler a citada revista, pode pautar seu modo de pensar o assunto a partir de uma reportagem. O presente trabalho pretende, então, analisar estas questões individualmente para, posteriormente, serem relacionadas. Trabalho, este, que é apenas um grão de areia diante da vastidão da praia que é o assunto das drogas. Refletir e discuti-la é construir uma sociedade melhor ou, ainda sob a utilização de metáforas, um castelo de areia; castelo, este, que facilmente é destroçado por meio do preconceito, da desinformação e do moralismo.

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1. O HOMEM ENTORPECIDO E A SOCIEDADE DA RAZÃO

Entender a situação atual das drogas no mundo necessita de um estudo acerca da evolução da própria humanidade. Como será demonstrado neste capítulo, a utilização dessas substâncias está presente desde tempos primórdios e sua dinâmica se transforma através de diversos fatores – sociais, culturais, políticos – de determinada época e dentro de um contexto histórico. Compreender as drogas neste sentido permitirá sua abordagem ser menos limitada a questões de criminalidade, possibilitando a percepção da complexidade que este tema carrega e a necessidade de não reduzir essa discussão a meros conceitos difundidos pelos valores e morais da sociedade contemporânea.

1.1. O MUNDO, AS DROGAS E O HOMEM

Antes de mais nada, se faz necessário conceituar o significado de “droga” para dar início ao estudo aqui proposto. São denominadas drogas as substâncias químicas capazes de modificar o funcionamento do organismo, provocar alterações fisiológicas ou de comportamento, seja uma modificação medicinal ou clínica (GÓIS; AMARAL, 2009, web). Tendo essa definição em mente, pode-se, então, chamar de droga desde o café que estimula e inibe o sono, até o crack, que proporciona o entorpecimento. Para melhor organização de sua significação, serão abordadas as drogas ilícitas, ou seja, aquelas proibidas por lei – maconha, cocaína, haxixe, LSD, heroína, etc. No que diz respeito às drogas lícitas, serão trazidas aqui somente o tabaco e o álcool, devido a potencialidade de ambos em causar danos diversos ao usuário. Pelas muitas questões que impossibilitam um estudo mais aprofundado neste trabalho, não serão trazidas ao corpus de análise

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matérias de capa da revista Veja sobre medicamentos, drogas comerciadas legalmente (com ou sem prescrição médica) em qualquer farmácia, como os opiáceos, barbitúricos, antidepressivos, etc. Seja para fins práticos, medicinais ou religiosos, o consumo de substâncias psicoativas não é um fenômeno recente. Sabe-se que “o consumo sistemático de um grande conjunto de substâncias capazes de alterar o comportamento, a consciência e o humor dos seres humanos é comprovadamente milenar” (LABATE; FIORE; GOULART, 2008, web). O homem não somente aprendeu a suprir suas necessidades físicas e orgânicas, como a fome e a sede; aprendeu, também, a responder aos impasses do desejo – Fernandes cita Richard Rudgley ao apontar o ato de sonhar como uma pulsão natural do homem pela alteração dos estados de consciência (2011, p. 20-21). Portanto, a exploração do inconsciente deve ser encarada como uma prática intrínseca ao ser humano.

Do ponto de vista do campo de estudos da cultura e da política, no seu sentido mais amplo, a existência e o uso de substâncias que promovem alterações na percepção, no humor e no sentimento são uma constante na humanidade, remontando a lugares longínquos e a tempos imemoriais (SIMÕES, 2008, web).

Ao longo da História, os efeitos das substâncias psicotrópicas estão relacionados a várias questões, seja para a cura ou tratamento de alguma enfermidade, seja para cultuar divindades, seja para afastar as angústias da alma. A ingestão dessas substâncias, além de suprir a “pulsão natural” do homem pela exploração de seu inconsciente, de alterar humores e percepções, é uma prática que ganhou conotações místicas e divinas por determinadas civilizações no decorrer da História, variando o sentido de acordo com cada cultura e condição social.

En ello se manifiesta la superioridad del espíritu sobre sus condiciones de existencia; y en poder afectar los ánimos mismos reside lo esencial de algunos fármacos: potenciando momentáneamente la serenidad, la energía y la percepción permiten reducir del mismo modo la aflicción, la apatía y la rutina psíquica. Esto explica que desde el origen de los tiempos se hayan considerado un don divino, de naturaleza fundamentalmente mágica (ESCOHOTADO, 2002, web).

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Dentro dessa perspectiva, nota-se as drogas, também, como instrumento de práticas religiosas, de elevação espiritual. Mais do que uma utilização recreacional, o uso de psicoativos está, também, interligado a práticas religiosas entre civilizações, como, por exemplo, as précolombianas, no qual havia o consumo ritual do peiote pelos índios Huichol das serras de Nayarit, ou o consumo da planta Pachamama, que servia para que os adivinhos curandeiros lessem o futuro. O auxílio de drogas psicoativas foi utilizada como recurso da divinação através da comunicação com deuses pelos grandes sacerdotes (VARELLA, 2005, web). Entretanto, o uso de substâncias psicoativas para fins religiosos não foi praticado somente por povos da América Latina. O vinho era representado, pelos gregos, como “a marca distintiva do ser humano, enquanto presentes das divindades civilizadoras Dionísio e Deméter” (Fernandes, 2011, p. 23). Fernandes (2011) aponta, também, que o vinho era pouco usado nas refeições pelos gregos, e possuía uma aura sacra, sendo a embriaguez considerada como um meio de contato com o mundo espiritual e com os deuses. Em contrapartida, a ingestão do vinho feita pelos romanos era feita com a substância misturada em água, pois, “para eles, o vinho não diluído era como um ser vivo, e perigoso, contra o qual o homem civilizado deveria se bater” (DUPONT apud Fernandes, 2011, p. 25). Não somente a ingestão de drogas era feita afim do indivíduo ter algum tipo de contato transcendental ou místico. Por exemplo, é notado o uso da maconha no continente asiático para fins medicinais, sendo que “os chineses e os egípcios conheciam-na e utilizavam suas propriedades analgésicas” (BONTEMPO, 1980, p. 7). O uso milenar da maconha pelos chineses foi considerado útil do ponto de vista terapêutico.

A maconha foi usada como medicamento desde os mais remotos tempos. Parece certo que ela fazia parte dos espécimes do herbário do imperador chinês Nung, há quase 5000 anos, e um tratado médico chinês de 2000 anos atrás recomendava o seu uso como anestésico em cirurgias (MANSUR; CARLINI, 2004, p. 83).

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Em relação a outras civilizações, a maconha foi utilizada na Índia como hipnótico, analgésico e espasmolítico; no Oriente Médio, devido as restrições ao uso do álcool pelo Alcorão, a planta foi utilizada pelos muçulmanos, também, como medicamento (MANSUR; CARLINI, 2004, p. 83). Também com fins terapêuticos, a cocaína, substância presente numa planta sul-americana chamada Erythroxylon coca, era cultivada e usada, inicialmente, pelos incas, e depois se expandiu para a Europa através dos conquistadores espanhóis. Feita à base da planta, o “vinho de coca foi considerado durante muito tempo uma bebida reconstituinte e reconfortante, que dotava os apreciadores de novas energias” (MANSUR; CARLINI, 2004, p. 47). As drogas, porém, começaram a serem vistas de maneira diferente e pouco religiosas e/ou místicas. Os psicotrópicos passaram a ser encarados de modo pejorativo pela Igreja Católica. Dentro do modelo cristão da autorrenúncia, acompanhava-se um modelo de saúde como salvação da alma, onde o uso de drogas é condenado, dando espaço para a utilização de recursos como orações, relíquias, peregrinações, confissão, penitência, e etc (CARNEIRO, 2008, web). É percebido, também, certo “combate” ao uso de drogas por parte do cristianismo.

A saber: 1) Que no sólo como enteógenos sino en todos sus usos las drogas psicoactivas distintas del alcohol —e incluso éste— son radicalmente aborrecibles para un culto como el cristiano ortodoxo; 2) Que desde sus comienzos el cristianismo persiguió directa e indirectamente, pero con gran tenacidad, los focos de cultura farmacológica; 3) Que si esto no nos resulta hoy todavía mucho más manifiesto es porque se apoyó sobre quemas ingentes de libros y el sigilo de una censura (ESCOHOTADO, 2002, web).

Entre os períodos da Expansão Europeia e a Revolução Industrial, as substâncias psicoativas deixaram de ser consideradas elementos divinatórios e lustrais, reguladas por rituais religiosos, para se converterem, também, em produtos comerciais (RIBEIRO; RIBEIRO, 2009, web).

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O marco deste processo foram as Guerras do Ópio (1839 – 1841), a partir das quais os ingleses garantiram o monopólio internacional, consolidaram o domínio britânico no Extremo Oriente e implementaram a prática comercial de substâncias psicoativas em larga escala (PASSETTI, 1991 apud RIBEIRO; RIBEIRO, 2005, web).

No Brasil, no período das grandes navegações dos séculos XVI e XVII, produtos como o pau-brasil, o açúcar e o tabaco foram denominadas drogas pelos homens do período (GÓIS; AMARAL, 2009, web). Sendo assim, “através destas especiarias é que surgiu o comércio. No Brasil as duas drogas mais importantes dos dois primeiros séculos da colônia foram o pau-brasil e o açúcar” (GÓIS; AMARAL, 2009, web). Adiante, o subcapítulo tratará especificamente das drogas no Brasil.

1.2. O BRASIL, AS DROGAS E O HOMEM

No Brasil, o contato com substâncias alteradoras da consciência se deu antes mesmo dos europeus desembarcarem por aqui. Os colonizadores tiveram contato com culturas muito diferentes das suas, e alguns as relataram na literatura. Um dos hábitos de algumas tribos, como por exemplo os Tupinambá, é a ingestão de cauim, bebida alcoólica fermentada, semelhante a cerveja, feita com diversos produtos, como a mandioca e o milho.

Ao contrário do que acontece quando tratam das dimensões mais simbólicas das bebidas nativas, os relatos de viajantes e cronistas europeus são bastante ricos quando descrevem os usos dos cauins em festas e reuniões. Estes relatos mostram muito bem que as cerimônias dos índios no Brasil – assim como ocorre com a maioria das sociedades ditas primitivas – tinham características bastante complexas (FERNANDES, 2011, p. 96).

O uso dessas bebidas envolve a chamada cauinagem, cerimônia dedicada à obtenção da embriaguez, praticada em sacrifícios canibais, casamentos, funerais, entre outros (FERNANDES, 2011, p. 162). A cauinagem lida com o desejo do índio em se encontrar em um estado de alteração, que é também perigoso e pode redundar em uma alteração sem volta (SZTUTMAN, 2008, web), 18

devido ao excesso da substância no organismo do indivíduo. Sendo assim, percebe-se uma linha que separa, e ao mesmo tempo une, a relação de prazer-perigo contida nos nativos com essas bebidas fermentadas. Além, do álcool, a utilização de outras drogas foram registradas no Brasil, principalmente após a chegada dos europeus. O primeiro registro sobre o uso da maconha, por exemplo, data de 1564 (QUEIROZ, 2008, web). Neste aspecto, é importante ressaltar que as trocas culturais existiram no Brasil não somente entre os europeus e os indígenas, mas também se deu entre os escravos africanos, levados ao Brasil dentro de navios negreiros e sob condições sub-humanas.

Os escravos teriam trazido a droga para o Brasil neste século. No século XVII, o vice-rei de Portugal enviava carregamentos de sementes de maconha para que a planta fosse cultivada no Brasil em larga quantidade devido à sua importância como produtora de fibra. As velas das caravelas eram feitas de cânhamo (QUEIROZ, 2008, web).

No época colonial, as drogas eram destinadas ao consumo, ao uso médico e também como especiaria, tidas como produto exótico e de luxo. Dentro deste contexto, não havia uma discriminação clara na distinção entre droga e alimento pelos povos indígenas, que utilizavam algumas especiarias como alimentos, mas também a utilizavam como remédios (GÓIS; AMARAL, 2009, web). A chegada dos europeus permitiu a introdução na vida das muitas tribos indígenas colonizadas de suas experiências culturais e hábitos, entre elas o contato etílico. Fernandes aponta o conflito cultural entre os colonizadores e os índios no modo de beber e de se relacionar com a embriaguez ao contrapor o exagero alcoólico de uma cauinagem com os novos padrões de consumo e de etiqueta incorporada pela elite europeia (2011).

Contudo, ainda mais importante do que esta diferenciação de identidade étnica ou social, construída em torno dos regimes etílicos, estava a noção de que o beber em demasia configurava uma falha de natureza religiosa, um pecado. O beberrão contumaz não realizava apenas um ato contrário à boa ordem civilizacional, mas cometia uma falha grave enquanto membro da comunidade cristã (FERNANDES, 2011, p. 163).

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Como citado anteriormente, a Igreja regulava e julgava hábitos que iam contra os preceitos da religião católica, principalmente no que se refere ao uso de substâncias psicotrópicas. Ao longo do tempo, a terra do pau-brasil se desenvolveu e sofreu um processo civilizatório, que, paulatinamente, deixou para trás sua própria cultura e identidade e deu lugar aos costumes e valores impostos pelo mundo ocidental com o auxílio da evangelização disseminada pelos jesuítas.

A partir do século XIX, dentro do contexto sociocultural de cada nação, a popularização do consumo desses ‘novos produtos’ (desprovidos de qualquer ‘lastro cultural’ que funcionasse como mecanismo de controle informal de seu consumo) acarretou uma série desdobramentos e impactos sociais, tais como relatos de overdose, complicações crônicas à saúde e o desmantelamento de hábitos sociais locais tradicionalmente instituídos (MUSTO, 1987; ESCOHOTADO; 1995 apud RIBEIRO; RIBEIRO, 2005, web).

A massificação do consumo de substâncias psicoativas resultou na criação de políticas públicas para que fossem resolvidos esses problemas, principalmente com o surgimento do conceito de Saúde Pública no século XIX (GORDON, 1995 apud RIBEIRO; RIBEIRO, 2005, web). Entretanto, a elaboração de políticas voltadas ao controle das drogas não surgiu somente por uma preocupação com a saúde da sociedade por parte do governo. Entende-se questões políticas, econômicas e morais envolvidas nesse processo.

A produção de leis e normas sobre drogas no Brasil está intimamente ligada as sucessivas convenções e conferências ocorridas no início do século XX, são elas: a Conferência em Xangai em 1909 e a Convenção de Haia em 1912, também conhecida como primeira convenção do ópio. Este cenário internacional é fundamental para compreendermos de que forma, isto é, sob quais influências a produção de leis e normas sobre drogas ocorrem no Brasil (CARVALHO, 2011, web).

O desenvolvimento de uma política proibicionista, iniciada nos Estados Unidos da América, teve seus ecos no Brasil que persistem até os dias atuais. O controle estatal de combate as drogas no Brasil, que teve início após comprometimento na Conferência Internacional do Ópio, se iniciou com o uso de drogas por prostitutas, pequenos marginais, indivíduos pobres, enfim: 20

camadas esquecidas e malvistas pela sociedade burguesa, pela mídia e pelos grupos moralistas (GÓIS; AMARAL, 2009, web).

No início da década de 20, contudo, a situação modificara-se. De um lado, o Brasil havia-se comprometido na Convenção de Haia a fortalecer o controle sobre opiáceos e cocaína, o que de fato nunca fizera; de outro, os “vícios elegantes” dos rapazes finos logo perderam a aura romântica perante os olhos governamentais ao se disseminarem entre as “classes perigosas”, ou seja, entre negros, pardos, imigrantes e toda a plebe urbana nacional (CARNEIRO, 1993 apud RODRIGUES, 2002, web).

Nota-se, portanto, questões morais e raciais muito fortes ligadas à proibição do consumo de psicoativos, além da influência recebida pelos Estados Unidos e sua guerra às drogas, que, neste âmbito, resultou na já conhecida americana Lei Seca ocorrida na década de 1910, que gerou um gigantesco mercado ilegal circundado por circuitos clandestinos relacionados a outras drogas proibidas como, por exemplo, a cocaína. Nesse sentido, “o aparato burocrático-repressivo cresce desmesuradamente para tentar dar conta das atividades ilegais e de pessoas (negros e imigrantes chineses, mexicanos, irlandeses e italianos) lançadas nesses ambientes de marginalidade” (RODRIGUES, 2002, web). A partir desse episódio, o Brasil deu prosseguimento em sua própria política proibicionista, ainda inspirada nos Estados Unidos, proibindo a venda de substâncias psicoativas e, posteriormente, o seu consumo. A partir da década de 60 – especificamente após o golpe militar de 64 – a repressão foi acentuada. Desde a década de 20 o país “vinha seguindo o projeto internacional de criminalização das drogas encampado pelos EUA. A partir de 1964, a repressão torna-se terminologia usual, a guerra fria justificava o aumento do aparato repressivo” (CARVALHO, 2011, web). As leis criadas para a manutenção da política de drogas brasileira sofreram mudanças ao longo do tempo, e desde sempre sofreram críticas por parte de estudiosos de diversas áreas acerca de sua real eficácia. Sancionada pelo então presidente Ernesto Geisel, “a legislação brasileira que 21

tratou desta problemática foi a Lei 6.368 de 1976, esta lei ficou muito tempo em vigor sendo que com as mudanças sociais já não atingia a finalidade esperada” (GÓIS; AMARAL, 2009, web). A mais notória mudança ocorrida em leis de entorpecentes se deu no ano de 2002, que tornou a se modificar em 2006 e permanece vigente até os dias de hoje. O assunto será abordado a seguir.

1.2.1. NOVA LEI, VELHO PROBLEMA

A Lei nº 10.409, sancionada em 2002 e no qual teve muitos de seus artigos vetados pelo então presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, deu origem, após diversas mudanças ocasionadas por projetos de lei, a atual legislação de drogas do Brasil (Lei nº 11.343), de 2006, e no qual proporcionou uma relevante alteração no Código Penal. Para entendê-la, no entanto, é necessário um esclarecimento sobre o modo como a Lei nº 10.409/02 foi alterada até originar a vigente Lei nº 11.343/06.

(…) o Poder Executivo encaminhou ao Congresso um novo projeto de lei (n. 6.108/02), que tramitou por dois anos na Câmara dos Deputados, e foi apensado ao Projeto de Lei n. 7.134/02, originário do Senado Federal (PLS nº 115/02). A Câmara analisou os dois conjuntamente e aprovou no Plenário, em 2004, o Substitutivo da Câmara de Deputados (PLS nº 7.134-B). Devido às alterações feitas pela Câmara, o projeto retornou ao Senado, onde tramitou como SCD n. 115/02, que deu origem à nova lei de drogas (n. 11.343/06) (BOITEUX, 2006, web).

A nova lei de drogas – também denominada de Nova Lei de Tóxicos ou Nova Lei Antidrogas – resultou em mudanças significativas na política de drogas. A principal delas é a diferenciação legal entre o usuário de drogas e o traficante. Ao contrário do que se pensa, “o que esta nova lei traz de novo não é uma descriminalização, e sim uma despenalização” (VERÍSSIMO, 2010, web) do indivíduo que se utiliza de psicoativos. Em contrapartida, a pena mínima para o tráfico de drogas cresceu de três para cinco anos, previsto no artigo 33 da Nova Lei de Tóxicos (BOITEUX, 2006, web). Em relação ao usuário, as penas previstas para quem fosse 22

flagrado consumindo drogas ilícitas resultavam em “advertência verbal, prestação de serviço à comunidade, medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo e, em último caso, multa” (VERÍSSIMO, 2010, web). Sobre essa legislação, há críticas por parte de especialistas.

Os dispositivos criminalizadores, presentes nas convenções internacionais e nas leis nacionais, como a brasileira Lei 11343/2006, se caracterizam por uma sistemática violação de princípios garantidores inscritos nas declarações internacionais de direitos e nas constituições democráticas (KARAM, 2011, web).

Uma das consequências negativas da nova lei seria o aumento do contato de ditos “pequenos traficantes” com a criminalidade vigente dentro das penitenciárias, tendo por resultante a privação de liberdade e a estigmatização social.

Assim, a mera despenalização do uso de drogas, mesmo benéfica ao usuário, é ainda muito tímida por insistir em manter o controle penal sobre o uso de todas as drogas, independente de quantidade, ainda que tal uso não cause qualquer risco concreto aos demais. Mas muito pior, sem dúvida, será a condenação de pequenos traficantes a penas de, no mínimo, cinco anos, por retirar os pequenos traficantes de seu convívio familiar, integrando-os nas facções criminosas, além de submetêlos à estigmatização, humilhação e violência dentro das prisões (BOITEUX, 2006, web).

Não cabe a este estudo, no entanto, avaliar a validade ou eficácia da Nova Lei de drogas. É importante ter ciência da existência desta lei e de que a mesma causou mudanças relevantes na legislação brasileira e, consequentemente, na relação do Estado e da sociedade com os entorpecentes. Deixando de lado os motivos políticos, ideológicos ou morais pelos quais o consumo de substâncias psicotrópicas foi proibido no Brasil e na maioria dos outros países, tem-se a noção dos prejuízos ocasionados pelo abuso de drogas para a saúde pública e, por isso, leis como a nº 11.343/06 são instituídas afim de amenizar esses problemas. Um dos problemas, talvez o central, que envolve o consumo de psicotrópicos é a chamada dependência, ou vício, que será estudada no subcapítulo a seguir. 23

1.3. DEFINIÇÕES E DINÂMICAS DO VÍCIO

Além das mais variadas doenças que o abuso de determinadas drogas pode acarretar, uma das questões levantadas pela Ciência é a dependência – também denominada de vício ou, mais pejorativamente, toxicomania. Ao contrário do que muito se pensa, não são todos os indivíduos que têm contato com entorpecentes que desenvolvem algum tipo de dependência. Isso porque diversos fatores influenciam para que o vício possa existir.

(…) Qual é o processo pelo qual o comportamento de consumo de substâncias em certas pessoas evolui para padrões de comportamento compulsivos de procura e consumo, à custa da maior parte de outras atividades, e que provoca a incapacidade de parar com tal consumo, isto é, o problema de recaída? A responsabilidade parece residir numa ação combinada e complexa de fatores psicológicos, neurobiológicos e sociais (OMS, 2004, web).

Diante da vasta possibilidade de abordagens que este tema pode trazer, um dos parâmetros que foram estabelecidos a fim de sistematizar o estudo é entender a dependência em suas mais diversas concepções. Na maioria dos casos, a dependência é definida em física - “refere-se aos sinais e sintomas físicos adversos provocados pela abstinência de uma droga” (SWIFT; LEWIS, 2009, web) - e psicológica, que “decorre da sensação de prazer e bem-estar ou da necessidade de evitar o mal-estar provocado pela falta da droga, requerendo, assim, o uso periódico ou contínuo” (REZENDE, 2000 apud LIMA, 2005, web), ocasionada por elementos biopsicossociais que variam de pessoa para pessoa.

Na empreitada para constituir uma explicação, senão total ao menos satisfatória, para a dependência, usualmente fala-se de uma causalidade “biopsicossocial”, termo que propõe um caráter multicausal à gênese e multidisciplinar à discussão sobre a dependência (LEITE, 2005, p. 38).

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Sendo assim, nota-se a complexidade que envolve o tema e um não poder identificá-lo com definições reducionistas. Ao abordar o tema dentro de variadas vertentes, tem-se a possibilidade de um estudo mais plural sobre ele.

1.3.1. ABORDAGEM BIOPSICOSSOCIAL

Parte de uma vertente biológica, a ideia ser humano como uma “máquina biológica”, característica que perpassa a modernidade desde o século XIX (LEITE, 2005, p. 39), é tomada pelo pensamento científico para tentar explicar a dinâmica do vício através da interação entre a substância e o sistema nervoso central (SNC) do indivíduo. Entende-se a “toxicomania” sob essa ótica como resultado de processos químicos do organismo humano. Nela, segundo Leite (2005), “a observação de um tecido orgânico é menos difícil definir normalidade e patologia”. Apesar de “menos complicada”, conceituar o vício no campo biológico do termo “biopsicossocial” seria o melhor caminho a se rumar num discussão acerca do tema?

Essa proposição certamente deve levar em conta a variabilidade dos efeitos das substâncias químicas, mas não como limite a ela, e sim como combinação de fatores que tende à impossibilidade de uma literalização nos moldes da pura substância agindo no organismo (LEITE, 2005, p. 47).

Portanto, tendo ciência dessa “combinação de fatores”, relatar a dependência apenas sob a ótica biológica é estreitar a possibilidade de uma visão mais ampla sobre o tema.

A atual visão biomédica, restrita às dimensões fisiológicas do funcionamento cerebral não consegue explicar satisfatoriamente como se estruturam as personalidades individuais sob o prisma de sua interação adaptativa com a sociedade (MOTA, 2008, web).

Para isso, se faz necessário compreender a terminologia “psicossocial” de vício.

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(…) se a dependência química é nomeada cada vez mais como uma doença, isso reflete também o prestígio de que o discurso médico desfruta na sociedade contemporânea, provocando uma visão cada vez mais medicalizada dos fenômenos sociais (MOTA, 2008, web).

A terminologia “psicossocial” pretende uma análise do homem a partir das esferas do psiquismo e da sociologia, no qual “existe uma teia de conexões causais que não permitem separar o psicológico do social, mesmo que esta relação possa ser compreendida enganosamente como dissociada pelas instâncias acadêmicas” (MOTA, 2008, web). Leite (2005) apresenta o aspecto psicossocial como uma dinâmica que envolve fatores de risco e desequilíbrios psicológicos que ocasionam em atitudes impulsivas do indivíduo. A abordagem psicossocial traz a posição do usuário e sua relação com a droga e os seus mais diversos motivos para usá-la, seja por questões socioeconomias (pobreza, vulnerabilidade social, região residida, etc) ou de caráter pessoal (ausência da família, por exemplo).

O encontro com as drogas transforma o modo como se sente, alcançando possibilidades antes desconhecidas ou apenas suspeitadas, de maneira que passa a valorizar tais substâncias como via de acesso a um viver mais agradável e pleno, ou ainda, suportável e distanciado. A droga advém como promessa e também experiência de sentir-se melhor. Dessa forma, a dependência configura-se quando a confiança nessa promessa obscurecer todos os outros apelos do mundo, fazendo com que o cuidado consigo mesmo fique limitado a esta única forma de promoção de um viver melhor (SIPAHI; VIANNA, 2001, web).

No campo do psiquismo, o uso de substâncias psicoativas é referenciado como uma espécie válvula de escape, no qual o usuário se utiliza dos efeitos inebriantes da droga para se afastar das amarguras do mundo, o que não é via de regra, pois cada indivíduo consumidor de entorpecentes possui uma relação única com a substância, que motivará – ou não – a busca pela droga de modo obsessivo.

Já psiquiatras e psicólogos em geral e psicanalistas em particular postulam que o uso de drogas é uma atitude regressiva de uma personalidade mal constituída, mal amadurecida, fixada numa busca narcisista do prazer, uma atitude escapista e infantilizante por meio da qual se foge das responsabilidades e da realidade do

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mundo adulto em favor de uma busca obsessiva e ingênua por "orgasmos farmacológicos" (OLIEVENSTEIN, 1970 apud VARGAS, 2006, web).

Ainda sob o consumo de tóxicos ser encarado como uma forma de “escapismo”, Freud (1974) discute os métodos utilizados pelo homem afim de evitar o sofrimento, sendo um deles o uso de drogas (denominado por ele de “intoxicação”), a qual há uma influência química no organismo do indivíduo provocando-lhe as sensações desejadas.

O serviço prestado pelos veículos intoxicantes na luta pela felicidade e no afastamento da desgraça é tão altamente apreciado como um benefício, que tanto indivíduos quanto povos lhes concederam um lugar permanente na economia de sua libido. Devemos a tais veículos não só a produção imediata de prazer, mas também um grau altamente desejado de independência do mundo externo, pois sabe-se que, com o auxílio desse 'amortecedor de preocupações', é possível, em qualquer ocasião, afastar-se da pressão da realidade e encontrar refúgio num mundo próprio, com melhores condições de sensibilidade (FREUD, 1974, p. 35).

As reações químicas no organismo, a pré disposição biológica do ser humano e as condições sociais e psicológicas são fatores determinantes para o esclarecimento acerca do desenvolvimento da dependência, seja ela física ou psíquica. A relação droga-usuário também se modifica de acordo com a sua própria relação com o mundo; mundo, este, que, mergulhado em seus valores e morais, enxergaram o usuário de droga de maneira questionavelmente negativa.

1.4. PROBLEMÁTICA SOCIAL

Ora, se a existência das drogas existe há tanto tempo – vimos anteriormente que o uso dessas substâncias é datado na Antiguidade, e até mesmo antes dela -, não haveria motivos de se combatê-las, como é feito por muitos países. O fato é que o tema tenha se tornado uma problemática, ocasionada pelo abuso dessas substâncias que afetam em diversas questões a vida em sociedade. Além dos variados fatores que colocam a saúde do próprio usuário em risco, fala-se das consequências negativas que o consumo abusivo de substâncias psicoativas agem na 27

sociedade. Se tornou corriqueiro noticiar acidentes de trânsito motivados pela embriaguez ao volante; ou, ainda, tratar sobre as mais diversas violências dentro de um lar ocasionadas por um familiar alcoólatra. São esses os fatos que propõem pensar as consequências do abuso de drogas no âmbito social. A problemática social do uso e abuso de drogas procurou ser tratada de forma específica em cada país, e sua solução ser procurada nos mais variados campos de estudo.

O consumo de drogas, quando inadequado, constitui um mal a ser controlado, mas que, arriscamo-nos a dizer, jamais será extinto. É preciso que se consiga lidar adequadamente com a questão, e não parece ser o direito penal o melhor meio de se tutelá-la juridicamente (TAFFARELLO, 2009, web).

No século XIX, o conceito de Saúde Pública nasceu da conscientização por parte dos países industrializados acerca da importância da universalização do atendimento médico como forma de se prevenir doenças e melhorar o estado de saúde da população (RIBEIRO; RIBEIRO, 2009, web). Foi então que o abuso de drogas passou a ser encarado, também, como uma questão de saúde pública, e não somente como algo a ser controlado por intervenções policiais.

Certamente, há um valioso avanço humanitário quando se passa da abordagem policial à noção de doença, mas esse avanço requer que se pense em uma doença que inclua aquilo que anteriormente foi colocado como um componente enigmático em sua causalidade, sendo o enigma colocado como um limite para a própria concepção de doença. Limite que remete ao particular de cada caso, à posição subjetiva de cada sujeito quanto ao prazer e à relação dessa posição quanto aos discursos, saberes, costumes e valores de seu tempo em meio às suas condições sociais de existência (LEITE, 2005, p. 87).

Além da gama de fatores levantados anteriormente para o desenvolvimento de uma

dependência, a causa da doença/dependência também é particular de cada indivíduo, de como o mesmo se relaciona e se vê no mundo, de como ele cresceu e foi educado, e etc. Portanto, é um pensamento precipitado o de que a dependência esteja ligada a um único e decisivo fator. Seria reduzir este assunto a uma abordagem superficial demais para sua amplitude. 28

(...) nunca se deve esquecer que o bem-estar dos indivíduos transcende meras questões sanitárias e que a sociedade não pode ser concebida em seu todo, nos moldes de uma instituição hospitalar onde, em troca do zelo pela sua saúde, o individuo deve submeter-se a severas restrições á sua liberdade pessoal (MACRAE, 1998, web).

As estratégias de prevenção ao uso de drogas são instrumentos utilizados para contornar o problema de forma mais efetiva do que a repressão às drogas propriamente dita. Recursos capazes de solucionar a questão da dependência antes mesmo dela se desenvolver, ou seja, fazendo com que o sujeito não tenha o contato com essas substâncias. Essas estratégias se compõem, na maioria dos casos, de campanhas efetuadas em colégios ou veiculadas na mídia, por exemplo, como também as restrições a propagandas e/ou publicidade de bebidas alcoólicas e tabaco. Deve-se lembrar de que políticas públicas voltadas a essa questão também são fundamentais instrumentos de prevenção.

(…) a oferta pública de encontros com a arte desponta como importante investimento “em prevenção”. Não apenas o esporte, as diferentes formas de produção artística solicitam aos sujeitos uma produção de questionamento de seus lugares no mundo, de enfrentamento e simbolização do mal-estar (LEITE, 2005, p. 109).

As possibilidades de solução ao “problema das drogas” são muitas e possuem sua efetividade em maior ou menor grau de acordo com a forma com que o tema é tratado. Tema, este, que, como será estudado a seguir, é pautado pela sociedade sob múltiplas óticas.

1.4.1. PROIBICIONISMO VS. DESCRIMINALIZAÇÃO

Ainda cercado de tabus, a temática das drogas, mais especificamente das ilícitas, se tornou preocupação por parte da sociedade e do poder público brasileiro, devido, entre outros fatores, a

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motivos pontuados no subcapítulo anterior, e vem se tornando cada vez mais permeado de embates ideológicos.

Com efeito, um clima passional permeia quase todas as abordagens do assunto. Os setores favoráveis à repressão penal não hesitam em associar as drogas proibidas a todo tipo de mal que assola a sociedade, enfatizam as tragédias, e procuram estigmatizar qualquer tentativa de discussão, até mesmo acadêmica, como “caso de polícia”. O outro extremo costuma reivindicar a descriminalização pura e simples e a não-ingerência do estado no problema, exerce um patrulhamento ideológico do tipo “todo mundo tem que usar”, e transforma qualquer tentativa de discussão em “ato público”, quando não de desobediência civil (VASCONCELOS, 2002, web).

Para se compreender a discussão entre ambas as vertentes, deve-se estudá-las individualmente. Seria necessário espaço e tempo mais extensos para um estudo mais aprimorado não apenas acerca do proibicionismo e do antiproibicionismo, mas também sobre as substâncias psicotrópicas em si devido a profunda complexidade da questão. Entre prós e contras a favor de uma reforma na política de drogas, há o desejo de se mudar a relação da sociedade com essas substâncias. Os sistemas antiproibicionistas têm como uma das principais críticas ao proibicionismo sua potencialidade em perpetuar a existência do tráfico de drogas, já que as mesmas são proibidas pelo Código Penal e a única forma de serem conseguidas é através da ilegalidade. Cada um de forma específica, esses modelos de política pública relativa ao uso de drogas visam não apenas a redução dos riscos inerentes ao consumo, mas também do tráfico e do crime organizado como um todo, além da corrupção policial (ZALUAR, 2002, web). Vale salientar que o antiproibicionismo é um sistema alternativo ao proibicionismo e que, entre suas vertentes, propõe legalizar ou descriminalizar as drogas. Entre ambas, há uma diferença importante e que se faz extremamente necessário identificar, e que muitas vezes é confundida e/ou distorcida.

Em síntese, a descriminalização indica uma reforma no código penal que abrande o tratamento dispensado aos usuários, mantendo (ou até mesmo enrijecendo) a penalização dos traficantes. Estados que descriminalizam drogas controladas, diferenciam traficante de usuário pela quantidade de psicoativos transportada por

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um indivíduo que seja abordado pela autoridade policial (RODRIGUES, 2004, web).

Em contrapartida, a legalização despenalizaria o circuito da produção, venda e consumo de drogas psicoativas, “encontrando meios de regulação pela nova legislação específica” (RODRIGUES, 2004, web). Ou seja, a descriminalização tiraria da ilegalidade os usuários de entorpecentes e a colocaria nas mãos de quem os vende: os traficantes. Enquanto isso, a legalização permitiria uma liberdade maior quanto ao uso das substâncias não penalizando sua produção, consumo e – enfaticamente – sua comercialização, que não aconteceriam de forma alguma dentro do típico modelo de sistema proibicionista vigente em vários países. Compreende-se o proibicionismo como um sistema que possui como principal ferramenta a repressão ao uso e comercialização de drogas ilícitas (OLINGER, 2006, web). Nesse âmbito, propõem-se a proibição total do contato do sujeito com essas substâncias. O sistema proibicionista fundamenta que “os atuais problemas consequentes ao uso abusivo do álcool se somariam os causados pelo aumento descontrolado do consumo de drogas que fossem legalizadas” (MANSUR; CARLINI, 2004, p. 09). Entre outras críticas a dinâmica do proibicionismo, fala-se sobre o mesmo ser “um modelo político-repressivo altamente segregacionista e moralista, incompatível com o atual estado evolutivo da ciência penal” (TAFFARELLO, 2009, web). Parece haver uma ênfase na crítica do caráter moral proposto por tal sistema, ao qual se ergue um questionamento acerca da penalidade imposta pela conduta de um indivíduo que, livre e pertencente a um país (teoricamente) laico e democrático, escolhe se utilizar de substâncias psicoativas.

A criminalização de um vício privado, de uma conduta meramente autolesiva, é uma interferência penal que se direciona tão somente a preferências e decisões subjetivas de determinados indivíduos, ou seja, uma interferência penal ideológica e moralista. Nestes termos, a criminalização das drogas não se trata de uma reprovação pela conduta dos cidadãos, mas sim sobre o seu modo de vida (VARGAS, 2011, web).

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Ainda sob vigência, o proibicionismo brasileiro continua a caminhar tendo como guia os modelos norte-americanos de repressão às drogas. Mesmo com a Nova Lei de Tóxicos, de 2006, a qual delineia a distinção entre o comprador e o vendedor de entorpecentes, despenalizando o usuário, o assunto permanece entrelaçado a pré-conceitos, o que dificulta uma abordagem isenta de estereótipos e discursos reducionistas e generalizantes. Como estudado no capítulo, a existência de substâncias psicotrópicas acompanhou o desenvolvimento da humanidade e seu uso tomado de múltiplas significações de relação por parte da subjetividade do próprio usuário, que pode ou não desenvolver algum tipo de dependência ao longo do tempo. Compreender essas nuances é o que parece ser primordial para a perpetuação da cidadania e do direito fundamental de cada ser humano, que é o de ser livre para tomar os rumos da própria vida.

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2. (IN) FORMAÇÃO PÚBLICA: A MÍDIA COMO EMPRESA E FORMADORA DE OPINIÃO

Diversos fatores contribuem para que uma notícia seja, ou não, capa de uma revista ou primeira página de um jornal. E mais: há, também, uma diversidade de fatores envolvendo a linha editorial adotada por determinado veículo de comunicação. É ela quem sustenta a posição políticoideológica deste veículo (essa linha, como será visto mais à frente, pode ou não ter a concordância ou “adesão” por parte do jornalista, e está mais ligada aos altos escalões da empresa). No modelo capitalista de economia convém enquadrar os veículos de comunicação como empresas, ou seja, instituições que se interessam muito mais com os lucros do que com as despesas, assim como a figura do jornalista se encaixaria, dentro deste contexto, como a de um funcionário, que é pago mensalmente para produzir conteúdo para a empresa na qual trabalha, e, o mais importante, para seguir a linha editorial dela. Dentro deste contexto é que se dará início, no presente capítulo, aos estudos sobre a Teoria Organizacional no âmbito jornalístico.

2.1. BREED E A SUA TEORIA

A dificuldade em definir, em concreto, o porquê de determinadas notícias serem veiculadas em um veículo midiático – e, mais do que isso, como elas são veiculadas –, vem da própria essência sociocultural inserida nos processos jornalísticos. Para isso, surgem as pesquisas em comunicação.

No nosso entender, a Pesquisa em Comunicação compreende, portanto, o estudo científico dos elementos que integram o processo comunicativo, a análise de todos os fenômenos relacionados ou gerados pela transmissão de informações, sejam dirigidas a uma única pessoa, a um grupo ou a um vasto público (MELO, 1998, p. 20).

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No campo do jornalismo, “as ações, os fazeres e seus contextos são de alta complexidade, pois se trata de um processo social e cultural de intermediação, com múltiplos emissores produtores (de informações e opiniões) e receptores usuários” (CHAPARRO, 1994, p. 17-18). Alguns teóricos da comunicação, motivados pela dinâmica complexa do “fazer jornalístico”, se puseram a estudá-la, como foi o caso de Warren Breed, nos Estados Unidos. Nascido em 1915, o sociólogo e jornalista norte-americano Warren Breed procurou estudar, em sua tese de doutorado em sociologia pela Universidade de Columbia, na década de 50, a dinâmica das redações quanto ao processo de produção das notícias pelos jornalistas. Na mesma década de sua tese de doutorado, Breed publica o artigo Social control in the newsroom: A functional analysis, o qual “(...) analisa o comportamento dos jornalistas a partir da perspectiva da organização, empregando observação direta, entrevistas e pesquisas” (INFOAMÉRICA, 2013, web). Nasce, portanto, a teoria organizacional do jornalismo. Ao estudar as redações, Warren Breed apontou que a socialização do jornalista depende de procedimentos de recompensa-punição, que acaba colaborando para a homogeneização das notícias publicadas em determinada organização jornalística (SOUSA, 2008, web). A teoria organizacional possibilita compreender os constrangimentos vividos pelo jornalista/funcionário no processo de realização das notícias, dentro do ambiente jornalístico/empresa (como as redações de jornais, como estudadas por Breed, mas que, aqui, podem ser compreendidas por outros meios, como revistas, sites, etc).

2.1.1. DEFINIÇÃO DA TEORIA ORGANIZACIONAL

Antes de trazer aqui os fundamentos do sociólogo norte-americano, é interessante entender que as teorias do jornalismo – que, além da organizacional, contam com as teorias do newsmaking, do gatekeeper, do espelho e outras tantas – buscam compreender este campo sob uma ótica menos 34

“idealizada” pelo senso comum, de que o jornalismo cumpre seu papel de informar com neutralidade e objetivamente a sociedade.

Entretanto, a bibliografia existente sobre as diversas Teorias do Jornalismo auxilia, e muito, as discussões sobre o mito da objetividade da imprensa, visto que quem está por trás das linhas das notícias publicadas é um jornalista, dotado de uma carga emocional e subjetiva. Além disso, as empresas jornalísticas mantêm padrões que precisam ser respeitados e questões mercadológicas também são levadas em conta (SILVA et al, 2005, web).

Ainda sobre este aspecto: A pesquisa sobre o jornalismo, por sua vez, há décadas, enfatiza as limitações deste campo como modo de conhecimento do mundo e de mediação do chamado real. Para tanto, inúmeras teorias e processos de análise já foram sistematizados e revisitados sinalizando que aquilo que o jornalista entrega ao receptor é apenas mais uma versão do ocorrido – apesar de ser um discurso embasado em uma contratação cujas cláusulas principais são o compromisso com a objetividade e a imparcialidade no relato. Mas exatamente por tal narrativa só se concretizar pela linguagem é que o jornalista vê sua almejada objetividade obstaculizada (BRUCK, 2013, web).

A partir de ambos os pressupostos, pode-se compreender, então, as teorias do jornalismo como meios de serem questionadas a efetividade da objetividade e neutralidade pregadas pelo modelo estadunidense de se fazer notícia, aplicadas em muitos veículos comunicacionais do Brasil e do mundo. A teoria de Warren Breed compreende diversos aspectos dentro do processo jornalístico de publicação das notícias. As questões mercadológicas, citadas acima, não apenas são levadas em conta dentro de uma organização midiática, mas também repercutem extrema influência do sistema capitalista. Pena (2005) afirma que, na perspectiva da teoria organizacional, o jornalismo é um negócio e busca o lucro. Essa teoria compreende que “o trabalho jornalístico é influenciado pelos meios de que a organização dispõe. Assim, esta teoria aponta para a importância do fator econômico na atividade jornalística” (TRAQUINA, 2004, web). Assim sendo, é inerente às empresas jornalísticas a preocupação pela arrecadação de capital, através do marketing e da publicidade, para que seja realizada sua manutenção e funcionamento. 35

Por causa dos custos e da lógica do lucro, o trabalho jornalístico acaba sendo submetido a constrangimentos em função do orçamento da empresa. A dimensão econômica enfatiza a percepção da notícia como um produto que deve ser inserido na relação entre produtor e cliente e satisfazer as exigências do cliente (VIZEU, 2003, web).

Além desses constrangimentos financeiros sofridos pela prática jornalística, há um fator determinante, apontado na tese de Warren Breed, acerca das condições sociais e também culturais envolvidas nesse processo: a linha editorial do veículo.

Ela é definida e regulada pelos

proprietários do jornal, da revista, etc., ou pelos altos escalões do mesmo, ou seja, diretoresexecutivos e diretores de redação. Breed (1955) aponta: “As owner or representative of ownership, he has the nominal right to set the paper's policy and see that staff activities are coordinated so that the policy is enforced”. Ou seja, o dono da organização jornalística possui o direito nominal de definir a política do seu jornal e ver que as atividades da equipe são coordenadas de modo que essa política é aplicada. Dessa forma, presume-se, então, que toda organização jornalística possui sua linha editorial, que pode ser baseada (ou não) em questões ideológicas, econômicas, culturais, entre outras.

Para Breed, o contexto profissional-organizativo-burocrático exerce influência decisiva nas escolhas do jornalista. Sua principal fonte de expectativas, orientações e valores profissionais não é o público, mas o grupo de referências constituído pelos colegas e pelos superiores. O jornalista, então, acaba socializado na política editorial da organização através de uma lógica de recompensas e punições. Em outras palavras, ele se conforma com as normas editoriais, que passam a ser mais importantes do que as crenças individuais (PENA, 2005, p. 136).

Assim, a linha editorial tem de ser seguida e respeitada pelo jornalista, funcionário da organização, mesmo que ele não compactue com ela. O que ocasionaria a conformidade desses profissionais perante a política editorial do veículo? Na empreitada de responder a este questionamento, Breed apontou seis motivos que levariam isso a acontecer.

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a. a autoridade institucional e as sanções; b. os sentimentos de dever e estima para com os superiores; c. as aspirações à mobilidade profissional; d. a ausência de fidelidades de grupo contrapostas; e. o carácter agradável do trabalho; f. o facto de a notícia se ter transformado em valor (WOLF, 2003, p. 182).

Esses motivos estão inseridos em um processo de recompensa-punição. O primeiro deles seria o medo do jornalista em ser demitido da empresa. Entretanto, como Breed (1955) observou: “Fear of sanctions, rather than their invocation, is a reason for conformity, but not as potent a one as would seem at first glance”. O temor quanto à demissão não seria uma razão tão forte para fazer o funcionário se conformar com a linha editorial da organização. Leva-se em conta, também, o fato de que o publisher é quem decide sobre as edições das matérias, quais trechos devem ou não ficar, e, mais do que isso, quais publicações devem ou não serem assinadas. O jornalista e sociólogo norte-americano compreende que, como segundo fator, os “laços de amizade, respeito e admiração acabam unindo os profissionais a seus superiores, e eles se transformam em sentimentos de obrigação para com a empresa” (PENA, 2005, p. 136). O teórico observa essas relações em algumas situações:

The staffer may feel obliged to the paper for having hired him. Respect, admiration and gratitude may be felt for certain editors who have perhaps schooled him, "stood up for him," or supplied favors of a more paternalistic sort. Older staffers who have served as models for newcomers or who have otherwise given aid and comfort are due return courtesies. Such obligations and warm personal sentiments toward superiors play a strategic role in the pull to conformity (BREED, 1955, web).

Como apontado acima, o jornalista acaba seguindo e respeitando a política editorial da organização por sentir-se obrigado simplesmente pelo fato de ter sido contratado, por algum superior ter lhe sido cordial ou ter ajudado em algum momento, ou, ainda, como ocorre com jornalistas mais antigos na empresa, por um sentimento de respeito por eles que às vezes servem de modelo profissional. O terceiro fator corresponde aqueles profissionais que desejam subir de cargo no veículo de comunicação e que “acreditam que terão dificuldades em obter uma promoção caso lutem contra a 37

política editorial da organização” (PENA, 2005, p. 136-137). As ambições de sucesso na carreira profissional impedem que o indivíduo deixe de seguir as normas da empresa. Traquina (2004, web) esclarece acerca do quarto motivo que faz com que os jornalistas se conformem: “Segundo Breed, o local de trabalho dos jornalistas é relativamente pacífico, e as organizações sindicais não têm interferido em assuntos internos”. Esse ambiente também contribui para o quinto fator apontado por Warren Breed, que se pauta muito mais no trabalho exercido pelo profissional do que o espaço propriamente dito. Em relação a este aspecto, Pena (2005, p. 136) pontua que “os jornalistas consideram seu trabalho agradável, longe da rotina, com tarefas interessantes e essenciais para a sociedade”. O trabalho proporciona ao jornalista uma série que vantagens como ter contato com situações que talvez não sejam típicas de outras profissões, ter acesso a informações que boa parte da sociedade não tem, assim como o contato com pessoas famosas. Como último fator, Breed nota que a produção de notícias é um valor para os jornalistas, ou seja, não há nada mais importante para eles do que produzir as notícias. O tempo investido nessa prática não o permite contestar a linha editorial da empresa (PENA, 2005, p. 137). Criando-se um valor para o fazer jornalístico, Traquina (2004, web) aponta que “é preciso ir em busca das notícias; é preciso vencer a hora do fechamento; assim a harmonia entre os jornalistas e a direção é cimentada pelos seus interesses comuns pela notícia”. Apesar de todos os fatores anteriormente apresentados contribuírem para o jornalista se conformar com a política editorial da organização, Breed aponta a possibilidade dele, de um forma ou de outra, “burlar” esse sistema.

A falta de clareza de grande parte das normas presentes na política editorial, que costuma ser vaga e pouco estruturada. As rotinas de produção da notícia, muitas vezes, escapam ao controle dos chefes, que não estão presentes durante a coleta e redação das informações. O jornalista pode privilegiar determinado entrevistado ou dar enfoque específico a um assunto. Geralmente, o jornalista acaba se tornando especialista em uma determinada área. E o chefe vai pensar duas vezes antes de interferir na reportagem dele. Principalmente se a pauta foi sugerida pelo próprio

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repórter. O jornalista pode ameaçar a chefia com a pressão do furo, alegando que o jornal concorrente deve publicar a matéria. O "estatuto de jornalista", que é uma espécie de starsystem da profissão. Aqueles que têm estatuto de estrela, como colunistas ou repórteres especiais, podem transgredir com mais facilidade a política editorial (PENA, 2005, p. 137-138).

Ou seja, “(...) sob certas condições, os controles que levam ao conformismo com a política editorial da empresa jornalística podem ser ultrapassados” (TRAQUINA, 2004, web). No entanto, vale salientar que isso ocorre em determinadas situações e que as possibilidades do jornalista ter de seguir, obrigatoriamente, a linha editorial do veículo de comunicação, são muitas.

2.1.2 DINÂMICA DA TEORIA NOS VEÍCULOS DE COMUNICAÇÃO NO BRASIL

Diversos estudiosos, ao longo da história dos estudos de comunicação no Brasil, se propuseram a estudar determinados veículos de comunicação nacionais. Destes, pode ser citado como um dos principais jornais do país a Folha de São Paulo, que foi, e continua sendo, alvo de muitos estudos. Em 2005, um artigo realizado por Silva et al analisou os editoriais do jornal nas edições dos dias 02, 04 e 05 de maio do ano de 2005. Dentre os textos analisados, os autores localizaram, além de outras teorias, a manifestação da dinâmica da teoria organizacional. Em relação aos três editoriais do dia 02 estudados, a teoria estudada por Breed foi apontada em duas. Em uma delas, os autores discorrem:

Neste caso, a teoria sobressalente seria a organizacional, segundo a qual existiria toda uma hierarquia de controle sobre a informação. O gatekeeper, nessas circunstâncias, abre e fecha os portões de acordo com o chefe do estabelecimento, perdendo, em parte, o seu poder de decisão sobre a informação (SILVA et al, 2005, web).

No dia 04 de maio, de três editoriais, a teoria foi apontada em todas elas – na maioria dos casos, acompanhada de alguma outra teoria. Em um dos editoriais analisados, foi apontado que:

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(…) pode-se dizer que as teorias aplicáveis à veiculação da informação seria a organizacional, em conjunto com o agenda setting. No primeiro caso porque, em última análise, uma informação acompanhada de opinião desta ordem só seria admissível caso os proprietários do jornal assim o permitissem (SILVA et al, 2005, web).

Os editoriais no dia 05 seguem o mesmo processo dos outros, apresentando (isoladamente ou não) a teoria organizacional em alguns textos. Mas a teoria aplicada ao jornal Folha de São Paulo não se limita aos impressos, somente. Outro artigo também estuda a dinâmica dessa teoria, no caso, na rádio online Putzgrila.

Quando um jornalista entra na Putzgrila é alertado pelo editor-chefe sobre a política editorial da empresa que define ser proibido veicular músicas que fujam do gênero rock and roll; as canções que fazem parte dos estilos das vertentes do rock são permitidas. No entanto, aquele que colocar na grade de programação uma música do estilo sertanejo, por exemplo, será punido por ir contra as regras da organização (NISSEN; FREIRE, 2013, web).

Com base nas informações acima, pode-se fazer dois apontamentos. O primeiro deles é a sobre os procedimentos de recompensa-punição citados na tese de Warren Breed, que se encaixa na dinâmica da organização. O funcionário sofrerá algum tipo de punição caso seja tocada alguma música de gênero diferente ao rock and roll, ou seja, caso ele não siga a política editorial da rádio online. O outro apontamento é em relação à aplicabilidade dessa teoria em tempos de avanços tecnológicos e adventos da Internet e das redes sociais. A posição do jornalista frente aos constrangimentos organizacionais é alvo de algumas críticas. A produção de notícias, sempre atrelada à linha editorial da organização, é regulada, como se viu, pelos funcionários que ocupam cargos mais altos na hierarquia organizacional, e pode promover uma espécie de despersonalização do profissional.

Sem entrar no mérito ou julgamento de valor e aplicabilidade da teoria, os apontamentos de Breed colocam-se como pontos instigantes para pensar sobre o exercício da profissão. Listá-los nesta discussão tem o exclusivo objetivo de compreender melhor por que tais cerceamentos ainda se dão. Certamente, não se pode desconhecer como causa o fato de a história do jornalismo no Brasil ser

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marcada pela neutralização do profissional jornalista enquanto sujeito, ator e autor intelectual. Produtor de conteúdo e de conhecimento. Uma anulação que começa (ou termina) pelo texto – onde ele é, por determinação de obtusos manuais, obrigado a apagar suas marcas enquanto enunciador e sujeito observador - e se dissemina por todo o processo de produção jornalística (BRUCK, 2013, web).

Apresenta-se a teoria organizacional em diversos veículos de comunicação brasileiros e em múltiplas mídias, sendo notada na televisão, no rádio (e em suas novas formas após a revolução das novas mídias) e no tradicional impresso, tendo sido apresentada a teoria em um jornal, o que não impede do mesmo acontecer com qualquer outro produto no setor impresso.

2.2 MÍDIA E SOCIEDADE: RELAÇÕES

Em sua essência, o jornalismo se insere no campo da Comunicação Social. Entendendo a comunicação como “uma necessidade básica da pessoa humana, do homem social” (BORDENAVE, 2006, p. 19), percebe-se a sua demasiada importância quanto ao processo de desenvolvimento de uma sociedade. Compreende-se a sua importância, então, para além do simples – e ao mesmo tempo complexo – processo de comunicar, de transmitir uma mensagem, uma informação; o jornalismo, no âmbito social, só existe porque há uma sociedade, e é para ela que a mensagem deve chegar. Ure (2013, web) afirma que “a mídia segue sendo um potente transformador da cultura”. Além dessa possibilidade de transformação cultural, é válido salientar que ela “fornece os modelos mentais para organizar a própria identidade e para projetá-la nas relações com os outros” (MININNI, 2008, p. 164). Nota-se, portanto, a mídia como importante instrumento de transformação coletiva e individual.

Mesmo não estando restrita apenas à mídia, a comunicação é exercida fortemente através dela. É através dos veículos de comunicação que as mensagens e informações chegam a uma quantidade massiva de pessoas. Mais do que isso, a mídia age como ativadora de percursos interpretativos através do contato do sujeito com uma realidade que lhe é comum ou não. 41

Seu enorme poder reside na capacidade de construir e difundir representações ao menos temporária e parcialmente partilhadas, ou seja, modos de compreensão da realidade. O que a maior parte das pessoas sabe a respeito de muitos contextos possíveis de vida no mundo (…) não resulta da experiência direta, mas de seu contato com a mídia (MININNI, 2008, p. 113).

Em relação a esta realidade construída, Amaral (2013, web) aponta a efetividade do contato que o sujeito possui com ela, refletindo que “o real não é o que ocorre: é o que é narrado pelos meios de comunicação de massa, e como é narrado. A revelação é que torna o fato real”. A partir disso, põem-se em xeque a realidade apresentada pela mídia, que pode retratá-la de muitas maneiras e de forma subjetiva, contrariando o conceito de imparcialidade e objetividade da profissão jornalística. O contato do homem com os meios de comunicação possibilitou transformações na relação de ambos. Enquanto o sujeito encara uma realidade construída pelos veículos de comunicação, estes “deixam de reportar, para interferir no fato e passam a ser o fato; não narram, invadem o andamento do fato em narração; não informam, formam opinião; não noticiam, opinam. São o novo espaço da pólis, com pensamento próprio, com projeto próprio” (AMARAL, 2013, web). Partindo do pressuposto de que os veículos de comunicação contribuem para a formação de uma opinião pública sobre determinados assuntos, será traçado, a seguir, um breve estudo sobre este processo.

2.2.1 OPINIÃO PÚBLICA: FORMAR, INFORMAR E DEFORMAR

Não por acaso, os meios de comunicação de massa foram considerados o “Quarto poder” do mundo, junto à política, à religião, etc. Essa designação permite encarar a potencialidade da mídia em exercer sobre a sociedade diversos poderes. Entre eles está a sua capacidade em levar uma informação à sociedade e, através de complexos processos, fazer com que ela reflita e tome uma “posição” quanto ao que foi transmitido. Como apontado por Mininni (2008), “a mídia pode 42

influenciar o clima de opinião, sugerindo que uma determinada crença ou atitude seja difundida e partilhada pela maioria, independentemente do fato de poderem de fator ser averiguadas” (p. 128129). Essa influência, entretanto, não deve ser encarada de forma modelada, igual em todas as situações.

(…) Shils e Janowitz (1948) salientam o aspecto fundamental que caracteriza este âmbito de estudos: a eficácia dos mass media só é susceptível de ser analisada no contexto social em que funcionam. Mais ainda do que do conteúdo que difundem, a sua influência depende de características do sistema social que os rodeia (SHILS; JANOWITZ, apud WOLF, 2003, p. 51).

Entende-se por massa “um conjunto homogéneo de indivíduos que, enquanto seus membros, são essencialmente iguais, indiferenciáveis, mesmo que provenham de ambientes diferentes, heterogéneos, e de todos os grupos sociais” (WOLF, 2003, p. 25). É esta massa, portanto, que é alvo das influências midiáticas. A relatividade permite entender a variabilidade que envolve o processo de influência dos meios de comunicação de massa sobre a sociedade. Para a formação de uma opinião pública, faz-se necessário considerar também o sujeito pessoal ou coletivo que deseja se comunicar na intenção de disseminar no “espaço público” aquilo pelo qual quer que socialmente seja conhecido e compreendido pelo “público”, ou, que seja apropriado por um segmento específico da sociedade; em segundo lugar, que haja meios pelos quais esta comunicação se estenda o mais rápido e na maior abrangência possível a uma massa de pessoas que conjuntamente formam o público alvo desta comunicação (CRUZ, 2013, web).

O aperfeiçoamento e expansão das mídias, como se viu acima, possibilitou atingir um número maior de pessoas, e de uma forma mais rápida. Isso aconteceu no processo de desenvolvimento dos principais meios de comunicação, como os impressos, o rádio e a televisão.

A influência social dos meios aumentou na medida de sua penetração e difusão as técnicas de impressão aperfeiçoadas permitiram o uso de várias cores, tiragens de milhões, formatos originais em jornais, revistas, livros, folhetos e cartazes. O rádio estendeu a voz do homem através de montanhas e desertos, até os lares mais humildes e isolados. O cinema, ao incorporar o som e a cor, ao ampliar a tela e

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empregar lentes especiais, oferece uma expressão cada dia mais fiel da realidade. A televisão juntou o alcance geográfico do rádio às potencialidades visuais do cinema e se converteu numa “magia a domicílio” (BORDENAVE, 2006, p. 30).

A influência dos meios de comunicação de massa vem não apenas dos meios jornalísticos, em si, mas também se estende para a publicidade e a propaganda, por exemplo, que, com técnicas e recursos específicos, buscam atingir a sociedade para muitas finalidades, seja para causar o convencimento da compra de um produto, seja para convencer-nos de qualquer outra coisa. Apesar dessa multiplicidade de meios dentro da comunicação de massa, o presente estudo se deterá apenas nos meios jornalísticos. Entendê-los parece esclarecer esse processo de influência por parte da revista Veja, que será analisada mais adiante. Como se sabe, os meios jornalísticos, onde trabalham conjuntamente editores, redatores e locutores, são criadores e amplificadores da realidade. A informação que emitem não é mais que uma representação ponderada do real, carregada de subjetividade, mas com impacto comunitário. É certo que a cobertura informativa fixa a agenda dos temas públicos e, ainda mais, estipula como se deve pensá-los (URE, 2013, web).

Se mostra de suma importância a participação da imprensa para a formação de um pensamento da sociedade. Mas, então, os meios de comunicação detém do pleno poder de inserir ou alterar a opinião de um indivíduo – e, mais do que isso, de uma sociedade? Mesmo dotados dessa potencialidade, pode-se encará-los como instrumentos que podem desencadear atitudes, no qual “atuam como intermediários na ação social dos grupos. Da atividade participante dos indivíduos que integram a sociedade é que resulta a verdadeira conformação da Opinião Pública” (MELO, 1998, p. 216). Mininni (2008, p. 114) aponta um caráter deformador nas representações da realidade social por parte da mídia. Essa distorção da realidade pode acarretar um processo de estereotipificação. Como observa o autor, “a mídia tem oportunidades extraordinárias para construir de maneira velada e fazer circular representações estereotípicas de alguns aspectos da realidade de grande importância social” (MININNI, 2008, p. 115). 44

(…) entender os estereótipos como uma prática situada do discurso social e midiático implica uma denúncia da ideologia implícita em toda e qualquer pretensão de classificação. De qualquer maneira, sobretudo no uso desenvolto realizado pela mídia, o estereótipo é um instrumento de imposição de módulos interpretativos claramente definidos por fenômenos que, muitas vezes, se configuram como nuvens de sentido com os contornos imprecisos, indistintos (MININNI, 2008, p. 118).

Como também foi observado, “quanto mais marginal for um grupo, mais a sua visibilidade será entregue a estereótipos na mídia” (MININNI, 2008, p. 116). Chaparro (1994, p. 25) aponta que a Estética do jornalismo é a estética do relato genuíno, confiável, verdadeiro. Ao representar a realidade social (principalmente se for a de um grupo estigmatizado) sob um prisma não condizente com as coisas do que jeito que são, o campo do jornalismo não cumpre, portanto, seu papel pragmático de informar com verdade. Observa-se toda potencialidade dos meios de comunicação de massa em servirem de ferramenta para mudanças pessoais e coletivas, e que, com o aperfeiçoamento da ciência e da tecnologia, possibilitou ser expandida e massivamente acessada.

Ferramenta, esta, que

esporadicamente pauta o tema das drogas e contribui para uma posição da sociedade sobre o assunto.

2.3 INTERFERÊNCIA DA MÍDIA NO TEMA DAS DROGAS

Não raro o assunto das drogas surge nos veículos de comunicação. A base teórica de Warren Breed, sobre os constrangimentos organizacionais, serve para refletir que todo veículo de comunicação, com suas normas e manuais, inflige uma punição caso o funcionário não respeite a sua política editorial. Por estes e outros motivos, o jornalista, portanto, se conforma com essas limitações, mas que não o impossibilita de ultrapassar essas regras.

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Sabendo disso, tem-se a ciência de que toda organização tem sua linha editorial, que influencia o modo como as drogas serão retratadas. Essa abordagem se tornou objeto de alguns estudos, que ainda são escassos perante a importância do assunto para uma reflexão social. Pode-se dizer que um dos estudos mais abrangentes acerca do tema foi realizado pela ANDI (Agência de Notícias dos Direitos da Infância), em conjunto com o Programa Nacional de DST/Aids do Ministério da Saúde. Publicada em 2005 e intitulada Mídia e Drogas - O perfil do uso e do usuário na imprensa brasileira, a pesquisa quanti-qualitativa analisou a produção editorial brasileira de jornais e revistas, veiculada entre agosto de 2002 e julho de 2003. Sobre os resultados da pesquisa, é valido apresentar algumas informações. De acordo com esta pesquisa, o consumo e os usuários de entorpecentes são retratados sob um prisma policialesco, focando casos individualizados, ligados à violência, independentemente da localidade regional do veículo de comunicação (PARENTE, 2005, web), pois foi avaliada a publicação de veículos de comunicação de diversos estados brasileiros. Quanto à abrangência do assunto, foi concluído que: Há poucas matérias contextuais mais explicativas (…) e também não é elevado o percentual daquelas que ousam avaliar e propor algo (…) o compartamento da imprensa, assim como em muitos outros assuntos, acaba por refletir a ausência generalizada de discussão da temática na própria sociedade sendo, além de reflexo, um retroalimentador desta situação (PARENTE, 2005, web).

Em relação aos tipos de texto publicados, são em sua maioria reportagens, apesar de também haver textos opinativos que abordam o tema. Além disso, sobre as fontes ouvidas pelos jornalistas para compor o texto, “8,4% trouxeram opiniões divergentes e 43,5% apresentaram mais de uma fonte, com uma concentração nas polícias (...), na área de saúde, nos usuários e em adultos em geral” (PARENTE, 2005, web). Ou seja, de acordo com os dados do estudo, menos da metade dos textos analisados utilizaram mais de uma fonte. A pesquisa aponta, ainda, “um elevado percentual de textos que não traz indicação dos seus autores” (PARENTE, 2005, web). Sobre a pesquisa realizada pela ANDI e o Ministério da Saúde, Goulart (2011) aponta que: 46

De um modo geral, esse estudo constatou que, no período analisado, a mídia brasileira tendia a manifestar uma abordagem sobre as drogas que destacava estereótipos sobre o uso dessas substâncias, reforçando elementos de um imaginário social que, ao condenar uma parte delas, estigmatiza, também, certos grupos sociais (GOULART, 2011, web).

De acordo com outro estudo baseado na mídia impressa, realizado em 2003, “as drogas lícitas (embora de uso regulado), como os ansiolíticos, ou os anabolizantes, tem pouco destaque na mídia, embora sejam tão utilizadas quanto outras drogas” (NOTO et al, apud GOULART, 2011, web). Já em relação aos derivados da coca (como a cocaína em pó e o crack, por exemplo), a mídia as associa a situações extremas de vício ou de violência, apresentando tendências no aumento de seu consumo (NOTO et al, 2003, web). A partir dessas informações, presume-se, então, que, de acordo com o tipo de droga, as substâncias ilícitas sejam extremadas, sendo, por vezes, deixado de lado uma abordagem em relação ás drogas lícitas que, como observado no primeiro capítulo, também causam dependência e diversas consequências negativas para a saúde. Devido a sua complexidade, outro fator importante a ser apresentado é o modo como se aborda esse tema. As nuances quanto a esse processo podem ser percebidas através de frases ou termos que remetem a determinado pensamento. Gallina (2006) observa a utilização de palavras que denotam agressividade e violência de impacto nas reportagens estudadas pelo autor, as quais revelam também uma disposição de confronto diante da própria condição humana. Outro apontamento diz respeito a tendência dos veículos jornalísticos em abordarem as drogas e seus usuários pendendo para um lado emotivo, o que, dentro de uma perspectiva pessoal, pode dificultar uma reflexão racional e objetiva.

A ênfase “emocional” estampada nos artigos jornalísticos é outro fator que merece atenção, principalmente por ter sido observada com maior freqüência nos textos de “especialistas” que lidam com a questão no seu cotidiano (advogados, médicos, entre outros). Esse dado é um indicador do quanto o discurso sobre drogas recebe o tom “emocional” nos mais diferentes setores da sociedade (NOTO et al, 2003, web).

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Apesar do teor de dramaticidade dado ao assunto, revela-se que a mídia não deixa de apontar os danos do consumo de drogas para a saúde, mas também transporta a concepção de consequência negativa para o âmbito da moral.

Salientamos, então, a importância significante de algumas falas nas reportagens que dão diretrizes ao consumo a partir dos experimentadores. Sugerem, em sua maioria que os psicoativos realmente degradam física e psiquicamente os indivíduos e as famílias, e representam uma ameaça aos valores nobres da sociedade. Evocam a dimensão da loucura, da perda parcial ou absoluta dos valores familiares, do risco permanente da recaída, da impotência atrelada aos graus de dependência física ou psíquica e vivências próximas da morte (GALLINA, 2006, web).

As informações dos estudos apresentados neste subcapítulo apontam algumas características e tendências da mídia ao tratar sobre substâncias psicoativas. É importante observar que os estudos, aqui utilizados como embasamento teórico, foram realizados em anos diferentes, com veículos jornalísticos de diversos estados do Brasil, com metodologias diferentes. Além disso, a mídia impressa (jornais e revistas) foi focada, descartando a possibilidade de uma análise sobre esse processo em outros veículos de comunicação, como a televisão e o rádio. Portanto, não devese encarar os dados de forma generalizada. Apesar de representarem alguns pontos distintos, mostram o quanto a mídia ainda pauta o tema no âmbito policial, o que seria um reflexo da política repressora de combate às drogas mantida pelo país. Percebe-se, também, a necessidade das drogas e seus consumidores serem abordadas de uma forma menos alarmista e estereotipada.

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3. A ÓTICA DA REVISTA VEJA SOBRE O TEMA DAS DROGAS E DE SEUS USUÁRIOS

Não por acaso a revista Veja foi escolhida como objeto de estudo para o presente trabalho. Múltiplas questões a tornam passível de análise. Sua representatividade entre os meios de comunicação do país é uma delas e se dá, principalmente, como se verá adiante, pela sua longa história no jornalismo brasileiro e sua capacidade de atingir parcela significativa da nossa sociedade. No terceiro e último capítulo, a revista Veja passará pelo estudo no qual visa o presente trabalho: a análise de alguns elementos das reportagens de capa. Para ilustrar sua importância como um dos principais meios de comunicação impressos no país, será traçado um brevíssimo histórico, também para se entender suas origens. Os valores construídos no decorrer de seus mais de 40 anos de existência serão apresentados.

3.1 VEJA, PRODUTO DE UMA EMPRESA

O Grupo Abril é uma das maiores referências em organizações comunicacionais no setor da mídia impressa, especificamente das revistas. As publicações são voltadas para diversos públicos segmentados e atingem tanto homens (revistas “Alfa” e “Men´s Health”, por exemplo) quanto mulheres (Gloss, Claudia, Tititi, etc). Os públicos são muitos e a empresa possui um vasto número de títulos para atingi-los. A Veja é apenas um dos muitos produtos que o Grupo Abril busca vender. Na década de 60, mesmo período em que se instalava no Brasil uma ditadura militar, surgia a revista Veja após a extinção da antiga “Realidade”, revista também do Grupo Abril que teve sua importância na época. A Veja teve sua primeira edição publicada em 09 de setembro de 1968 e atualmente conta com uma tiragem em torno de 1 milhão e 100 mil exemplares (NASCIMENTO, 49

2002, p. 22). Segundo dados recentes do Instituto Verificador de Circulação (IVC)1 de 2013, a tiragem da revista é de 1.191.803, sendo o produto com maior número de assinantes da editora Abril, contabilizando 917.193, e também de tiragem. Sua importância é considerada pois é “(...) a quarta maior revista desse segmento no mundo, sendo superada pelas americanas Time, Newsweek e U.S. News and World Report” (AUGUSTI, 2005, web). Diante desses dados, deixa-se clara a representatividade da revista na imprensa nacional e também internacional. Outra questão que torna a revista uma referência no país se dá pela sua própria história. Existente há mais de quatro décadas, Veja se consagrada como um dos veículos impressos não apenas mais lidos, mas também conhecidos. Como aponta França (2011, p. 41), “a revista Veja se firmou como a principal do país, servindo de referência para todas as outras. A institucionalização da revista dá-se pelo longo processo temporal de reciprocidade de tipificações entre Veja e seus leitores”. A tradição deste produto é deveras importante para se entender sua potencialidade em formar opinião, sendo já conhecido por muitos brasileiros, leitores ou não da revista. É importante abordar o poder que o veículo comunicacional em questão possui em ditar comportamentos dos leitores. Detentora do conhecimento e informação através de suas fontes, Veja assume um papel fundamental na construção de um saber frente a uma suposta ausência de conhecimento dos leitores em relação às publicações.

O jornalismo, sob o aspecto abordado por Veja, aparece, inevitavelmente, como uma instituição com poder normatizador. Assume uma postura capaz de ditar normas para o leitor. Tem autonomia para determinar aspectos da vida particular do indivíduo. Considerando que o público padrão de Veja é a classe média, segmento em busca de dicas sobre como viver melhor e que não acessa facilmente aqueles profissionais que representam, muitas vezes, as fontes consultadas pela revista, esse poder tem mais chances de se concretizar. Remetendo o saber científico para o leitor, o discurso do veículo em questão aponta para o homem contemporâneo aquilo que deve determinar seu comportamento (AUGUSTI, 2005, web).

1

Dados disponíveis em: http://publicidade.abril.com.br/tabelas-gerais/revistas/circulacao-geral/imprimir. Acesso em: 31/05/2013.

50

Ainda sobre este aspecto, Nascimento (2002, p. 87) aponta as citações de professores ou dados dos institutos de pesquisa como exemplo de utilização de vozes autorizadas pela Veja, a qual “transfere legitimidade aos fatos publicados nas reportagens”. Encara-se, então, esse mecanismo como preocupação do veículo em apresentar a veracidade dos fatos. O jornalista Luís Nassif trabalhou na revista Veja até 1979, quando se transferiu para o Jornal da Tarde. Em 2007 iniciou a publicação de uma série de artigos críticos sobre os bastidores da revista em seu blog “Luís Nassif Online” (http://www.advivo.com.br/luisnassif). Sobre a sua prática jornalística, o ex-funcionário da revista Veja fez alguns apontamentos:

1. Levantam-se alguns dados verdadeiros, mas irrelevantes ou que nada tenham a ver com o contexto da denúncia, mas que passem a sensação de que o jornalista acompanhou em detalhes o episódio narrado. 2. Depois juntam-se os pontos, cria-se um roteiro de filme, muitas vezes totalmente inverossímil, mas calçado nos fatos supostamente verdadeiros. 3. Para “esquentar” a matéria ou se inventam frases que não foram pronunciadas ou se tiram frases do contexto ou se confere tratamento de escândalo a fatos banais. Tudo temperado por forte dose de adjetivação (NASSIF, 2008, web).

Além do processo de adjetivação adotado pela revista, é também apontada a forte presença da opinião nos textos.

Embora carregado de informação, seu texto é fortemente permeado pela opinião, construída principalmente por meio de adjetivos, advérbios e figuras de linguagem. Veja construiu, de si mesma, uma forte imagem de legitimidade para proferir saber – frente a um suposto não-saber dos leitores, da população em geral e, sem certos momentos, das próprias fontes (BENETTI, 2007, p. 42).

As características apontadas acima trazem para reflexão a prática jornalística tradicional, baseada na imparcialidade do jornalista que, teoricamente, não deveria se utilizar de recursos acima citados (“adjetivos, advérbios e figuras de linguagem”) para construir o texto, já que os mesmos distanciam a neutralidade proposta pelos fundamentos ético-filosóficos do jornalismo, no qual, “ao apresentar sua posição como não situada socialmente, os jornalistas ocultam o fato de que sua perspectiva incorpora e ativa os pressupostos que naturalizam a ordem social e a política 51

estabelecida” (MIGUEL; BIROLI, 2013, p. 74). É importante lembrar que a opinião possui seu devido espaço nos jornais e revistas: os artigos dos colunistas. Entretanto, na Veja, essa dinâmica aparece também nas matérias e reportagens.

3.2 ANÁLISES

Tendo em vista o papel crucial que os veículos comunicacionais de massa desempenham na edificação de uma consciência social, e sendo a revista Veja uma das principais representantes desta mídia de massa no segmento do impresso brasileiro, uma análise se faz necessária acerca do tema das drogas e seus usuários, tema, este, que resvala não somente no âmbito sociocultural, mas também no de segurança e saúde públicas.

3.2.1 METODOLOGIA

A realização do estudo sobre o perfil das drogas e de seus usuários disseminado pela Veja nas reportagens de capa se deu pela pesquisa bibliográfica sobre tóxicos e mídia, somada à análise de conteúdo da revista. Sobre este método, Rocha (2005) expõe os objetivos da análise de conteúdo na realização de pesquisas textuais. Nascida de uma longa tradição de abordagem de textos, essa prática interpretativa se destaca, a partir do início do século XX, pela preocupação com recursos metodológicos que validem suas descobertas. Na verdade, trata-se da sistematização, da tentativa de conferir maior objetividade a uma atitude que conta com exemplos dispersos, mas variados, de pesquisa com textos (ROCHA, 2005, p. 308).

Antes de explanar os métodos utilizados para a realização da análise, é importante fazer alguns apontamentos: Veja, desde seu surgimento, sempre deu espaço ao tema das drogas em 52

algumas de suas edições, seja nas pequenas notas, seja nas matérias de capa. Seria necessário um estudo aprofundado para analisá-las todas. Por isso, foram estipulados alguns parâmetros para formar o corpus da pesquisa, começando pelo ano de publicação e o tipo de texto. Para a análise, serão analisadas somente as matérias de capa publicadas entre os anos 2000 a 2012. Em relação aos anos, houve uma preocupação em selecionar matérias escritas antes da Nova Lei de Tóxicos (em 2006) e depois dela. É importante deixar claro que, entre os anos estipulados para formulação do corpus de análise, em alguns deles não foram localizadas matérias de capa que se encaixassem nos parâmetros preestabelecidos. Foram eles: 2001, 2003, 2004 e 2005. Sobre as matérias de capa, sabe-se que este é um espaço de suma importância para qualquer revista e, assim sendo, há uma abordagem mais específica na matéria. Como foi estudado anteriormente na Teoria Organizacional, os processos jornalísticos dentro de um veículo de comunicação obedecem a regras e hierarquias, sendo, portanto, de decisão dos superiores a matéria que se tornará capa. É na capa que a revista estampa seu “produto”. Supõe-se que a decisão da matéria que ocupará este espaço é criteriosa. Por isso, a escolha de aqui analisá-las. Outra questão que precisa ser esclarecida quanto ao corpus de análise é o tema. Como já se sabe, foram escolhidas as matérias de capa que falem sobre drogas e também sobre seus usuários. É praticamente impossível tratar sobre drogas e não relacioná-la aos seus usuários. Mas, como foi observado durante a coleta do material, algumas publicações tendiam a dar mais ou menos enfoque a um dos dois. Para exemplificar, temos a edição 2087, cuja manchete é A luta pela vida, que aborda o suposto afastamento do ator Fábio Assunção das gravações de uma novela por conta do vício em cocaína: nela, a revista foca o usuário. Já na edição 2129, Alcoolismo: é possível prevenir a doença sem cortar a bebida, o enfoque é dado na substância em si. Sobre o aspecto do enfoque no usuário, é preciso esclarecer a escolha de três edições específicas para comporem o corpus de análise. São edições que não possuem como tema central as drogas. A edição 2030, “Pegou geral”, de 2007, é uma delas: tem como pauta o filme “Tropa de 53

Elite”, mas aborda a questão dos usuários de droga em relação ao tráfico de drogas. Além disso, há as edições 2091 e 2136. A primeira, Vida e morte de novela, retrata a morte do ex-companheiro da atriz Susana Vieira, Marcelo Silva, ocasionada por overdose de cocaína. Já a última, Quem cheira mata... traz, outra vez, o assunto do tráfico e o relaciona aos usuários. Devido à diversidade de drogas que existem no mundo e que foram tratadas pela Veja, também foi estabelecido um critério quanto à escolha da substância na matéria de capa. E este tema, especificamente, é trazido com alguma frequência às capas da revista. Partindo do conceito geral das drogas, seriam incluídos no corpus de análise também os medicamentos. Mas, para focar o estudo, foram escolhidas somente as drogas ilícitas; quanto às lícitas, somente o álcool e o tabaco, devido a potencialidade de ambos em causarem prejuízos tanto para o indivíduo quanto para a sociedade. Ainda nesta questão, é interessante informar que, dentro dos quesitos estipulados para esta pesquisa, foram localizadas mais de 8 edições que deram capa às drogas medicamentosas, quase a mesma quantidade das matérias coletadas. O método de pesquisa será tomado por duas vias. A primeira delas é o método de pesquisa quantitativo, no que se refere a dados numéricos. Estes dados nos permitirão contextualizar informações mais gerais sobre as reportagens. Em relação ao método de pesquisa qualitativo, a análise será realizada através de alguns elementos jornalísticos. São eles: manchete, capa, título da matéria e fontes.

3.2.2 ANÁLISE DAS MANCHETES

Para se ter uma ideia da importância que a revista Veja dá ao tema das drogas, abaixo temos uma tabela (ver Tabela 1) que traz esses dados em forma quantitativa.

54

Isso nos permite concluir que, ao total, somente 3% das capas, nestes doze anos analisados, trouxeram a questão das drogas e de seus usuários. Comparado a outros assuntos, é um tema pouco abordado por Veja.

ANO

CAPAS

TOTAL EM %

2000

52

1,92%

2002

51

1,96%

2006

52

1,92%

2007

52

3,85%

2008

52

5,77%

2009

52

3,85%

2010

51

1,96%

2011

52

1,92%

2012

52

3,85%

TOTAL (2000 - 2012)

466

3,00%

Tabela 1: em porcentagem, espaço que Veja deu à questão das drogas de 2000 a 2012.

Do material selecionado para a análise em questão pode-se levantar algumas ponderações quanto ao teor das manchetes. É importante lembrar que as manchetes estampadas na capa das revistas não são usadas como título das reportagens, apesar de possuírem sempre relação com o tema. Notam-se referências tanto aos usuários de drogas quanto às substâncias propriamente ditas. Há, como será explicado adiante, uma alteração no posicionamento que a revista detém sobre o usuário, que varia de acordo com o indivíduo pautado. Isto também ocorre com as substâncias. 55

Analisando as manchetes exclusivamente (descartando aqui a imagem da capa), é observado que o assunto das matérias não fica totalmente explícito. Elas não são factuais, como é o caso das manchetes de jornal, por exemplo, que deixam clara a pauta que será tratada na publicação. Para um entendimento completo do que será tratado pela revista, se faz necessário recorrer para outros elementos na capa, que funcionam como uma espécie de complemento da manchete que dão o restante das informações. Pode-se notar isso na edição 2222, publicada em 22 de julho de 2011, intitulada As prisioneiras do crack. A manchete, somente, deixa vaga a informação, fazendo o leitor se questionar: quais prisioneiras? Quem são? Essas perguntas são respondidas nas chamadas, que complementam dados ao leitor. Ou seja, em relação a esta manchete, o leitor percebe que o assunto que será abordado é o crack, mas não sabe exatamente o que será trazido ali, fazendo com que ele leia as outras informações na capa para compor um entendimento completo. É importante frisar que essa comunicação incompleta percebida nas manchetes da Veja se dá na premissa da inexistência da imagem da capa, que algumas vezes (mas nem sempre) arremata todas as informações e faz o leitor compreender o que será abordado na matéria. Portanto, caso não houvesse qualquer imagem (ou outros elementos) na capa e apenas a manchete, seria árdua a tarefa de descobrir o que a revista abordará. Para exemplificar o que está sendo posto, podemos citar a edição 2087, publicada em 19 de novembro de 2008. À frente, a manchete A luta pela vida. Atrás, a imagem do ator Fábio Assunção. Se não houvesse a foto do indivíduo, o leitor não saberia do que se trata a matéria. Na edição 1659, do ano de 2000, temos a manchete Maconha quase liberada. O elemento aponta para a iminência da liberação desta droga. Ao ler a matéria por completo, compreende-se, então, que essa suposta “liberação” não seria legal, mas sim social. Em 2002, a edição 1733 traz como manchete Drogas: mais uma vítima. Ao se utilizar do termo “vítima”, a revista coloca o usuário – no caso, aqui, a cantora Cássia Eller – como alguém 56

que sofre danos ou prejuízos, frente ao seu causador, a droga. Compreendendo que o dano pelo abuso seja a morte, a manchete desta edição coloca a droga como “assassina” da cantora. A edição 1985, publicada em 2006, estampa a manchete O álcool e o cérebro dos jovens. O elemento faz relação direta com a ingestão da substância alcoólica com os danos cerebrais que a mesma pode ocasionar nos jovens. Na manchete, as consequências do abuso do álcool na juventude estão ligadas diretamente ao cérebro e à cognição. Temos a edição 2009, publicada no ano de 2007, que traz a manchete Como desligar o vício. Ao se utilizar o verbo “desligar”, a revista propõe olhar a dependência como uma máquina, no qual, da mesma forma que pode ser ligada, pode também ser desligada. O vício é visto de uma perspectiva puramente técnico-científica. Sobre esta questão:

Essa suposição da ciência técnico-empirista como lugar de enunciação da verdade, ao invés de uma enunciação tangencial e parcial da mesma, está longe de restringirse à etiologia da dependência; trata-se mais de uma tendência ampla que perpassa outros campos do saber (…) e, quanto aos saberes que visam o homem, essa tendência se coloca como redução do homem à biologia (LEITE, 2005, p. 38).

Reduzir a dependência a questões somáticas descarta a possibilidade de enxergarmos o assunto através de outros campos, como o da psicologia e da sociologia. Além disso, como posto no primeiro capítulo, o desenvolvimento da dependência se dá por variados fatores e seu tratamento é muito mais complexo do que um interruptor de luz, que acende e apaga quando se bem entende. A partir da perspectiva da Veja, anunciando a dependência como um mecanismo que pode ser ativado e desativado, compreende-se o usuário de droga por um ser mecânico, robótico, que funciona à base de comandos, esquecendo de que, mais do que um usuário ou dependente da droga, o indivíduo é um ser humano carregado de questões pessoais, portanto, de subjetividades. A edição 2030, publicada em 2007, traz como manchete “Pegou geral”. O título faz referência à música “Tropa de Elite”, do grupo de rock Tihuana, trilha sonora do filme homônimo, dirigido por José Padilha e lançado no mesmo ano da edição em questão. Utilizado informalmente, 57

o termo “pegar” pode ter diversas significações. No contexto da música, faz referência ao trecho “Tropa de Elite/ Osso duro de roer/ Pega um, pega geral/ Também vai pegar você”. O “pegar” denota a ação do B.O.P.E. quanto a um indivíduo (“pega um”) ou vários (“pega geral”). A manchete, por si só, não esclarece quem será alvo desta ação; somente a linha fina dirá isso: O filme Tropa de Elite é o maior sucesso do cinema brasileiro porque trata bandido como bandido e mostra usuários de drogas como sócios dos traficantes. Esta manchete remete à condição dos usuários de drogas – além dos “bandidos” – como abordada de forma correta no longa-metragem. Portanto, o filme Tropa de Elite “pegou geral” os “drogados” e “bandidos”, da mesma forma que o B.O.P.E os pegaria. É interessante observar que, na edição 2030, o usuário de drogas é diretamente relacionado à criminalidade. Tanto é que são relacionados como “sócios” de traficantes, citados logo depois dos “bandidos”. O uso de drogas, aqui, é crime, e não doença. No ano de 2008, a manchete Raio X da saúde saiu na edição 2050. O “raio X” seria a pesquisa sobre hábitos de vida dos brasileiros (como pode ser descoberto na linha fina) e mostra, na capa, a figura de um corpo sob a visão de um raio-X, no qual segura um copo de bebida alcoólica e um cigarro, apontando para alguns dos motivos que causam doenças nos brasileiros. Sabendo que o “raio X” é uma radiação eletromagnética, cujo efeito é a visualização do corpo humano além do que os olhos podem ver, o termo propõe um olhar diferenciado para a saúde, extremamente aprofundado a ponto de poder ver internamente a saúde em suas características, minúcias, etc. A edição 2087, de 2008, traz como manchete A luta pela vida. A partir dela, podemos fazer alguns apontamentos: tendo conhecimento pleno do que trata a matéria, consideramos “luta” o processo de reabilitação do ator Fábio Assunção, dependente de cocaína. A palavra “luta”, tendo o significado de conflito entre duas (ou mais) pessoas, países, etc., remete a um combate contra o vício o tratamento do ator, mais diretamente à droga. Esta “luta” travada pelo autor tem como 58

finalidade a busca (ou retomada) pela vida, retirada pela substância (ou o vício). Em suma, o vício e a droga tiraram do ator sua vida e sua “luta” (ou tratamento) busca retomá-la. Ainda no conceito de “luta”, entende-se qualquer embate travado entre dois polos, onde um dos dois (independentemente do lado que se está) é inimigo que deve ser combatido. Temos, então, nesta posição, a droga, inimiga da vida e Fábio Assunção, vitimado pelas suas consequências, o sujeito que decidiu lutar contra ela. Vida e morte de novela foi a manchete da edição 2091 publicada em 2008. Outra vez a revista traz à capa o assunto das drogas relacionado a uma celebridade, desta vez a atriz Susana Vieira. Na matéria em questão, o usuário de drogas não seria ela, mas sim seu ex-marido, Marcelo Silva, morto por overdose de cocaína. Ao relacionar “vida e morte” à novela, a manchete referencia a própria condição da atriz Susana Vieira que, na época do ocorrido, participava de uma novela na Rede Globo. Como ocorre na edição 1733, a droga volta a ser relacionada à morte. Publicada em 2009, a edição 2129 trouxe como manchete Alcoolismo: é possível prevenir a doença sem cortar a bebida. A dependência do álcool é uma doença e é apresentada na manchete como tal. Uma doença que pode ser prevenida mesmo com a ingestão da substância. O álcool, neste caso, é uma droga tolerada, mesmo sob a possibilidade de desenvolver uma doença. Isso se dá pelas próprias condições socioculturais a que está condicionada. Sendo o álcool uma droga lícita e presente (direta ou indiretamente) na vida de todas as pessoas, é de se esperar que também seja tratada pela revista de modo mais aceitável. Também de 2009, a manchete Quem cheira mata... foi publicada na edição 2136. A manchete é uma frase que possui continuidade na linha fina. A matéria propõe abordar diversos motivos da criminalidade no Rio de Janeiro. A revista listou quinze causas e a primeira delas é a que dá título à manchete. Ou seja, dentre os mais de dez causadores no crime no Rio de Janeiro, Veja traz primeiramente os usuários de cocaína. Isso coloca os usuários na posição de criminosos – processo mais ou menos parecido com o que ocorre na edição 2030. Mais do que criminosos por 59

usarem e portarem uma substância ilícita, os usuários são estritamente ligados à criminalidade por “sustentarem” o tráfico. A edição 2157, publicada em 2010, tem como manchete O Psicótico e o Daime. O psicótico é aquele que sofre de psicose, ou seja, um distúrbio psíquico que provoca perda de contato com a realidade. O indivíduo que sofre da doença e é tratado na matéria de capa é Carlos Eduardo Sundfeld Nunes (conhecido como Cadu), assassino confesso do cartunista Glauco. O uso frequente de ayahuasca — conhecida como chá de Santo Daime (chá alucinógeno ingerido para fins religiosos) — por Cadu, que teve o quadro de sua doença agravado pela substância alucinógena, teria provocado o crime. No caso, a manchete relaciona o uso da droga diretamente à loucura. No ano de 2011, a manchete As prisioneiras do crack foi publicada na edição 2222. Ao contrário do que se pode imaginar, a matéria aborda as mães dos dependentes em crack, e não os usuários em si. A palavra “prisioneiro” tem por significado aquele que sofre com a ausência de liberdade. Essa prisão é ocasionada, como denota a manchete, pelo crack. A droga é colocada quase que como uma algema, uma cela, cujo vício afeta não somente ao usuário, mas também à sua família. A matéria foca especificamente nas mães desses dependentes. Temos, então, o entorpecente como causador de danos diretos e indiretos. Em 2012, a edição 2277 trouxe a manchete Menor + álcool: proibido mas ninguém liga. Ela substitui a palavra “mais” pelo símbolo +, remetendo a um cálculo matemático. A soma dos dois elementos (o menor e o álcool) teriam como resultado “proibido mas ninguém liga”. Novamente a revista se preocupa em tratar o assunto do álcool e relacioná-lo aos jovens, como ocorre na edição 1985. A manchete busca criticar a suposta condescendência dos adultos pelo uso de bebidas alcoólicas por indivíduos menores de idade. Ao colocar que “ninguém liga” para o assunto, Veja aponta para a tolerância da sociedade brasileira para com essa prática. Ainda no ano de 2012, temos a edição 2293, que traz como manchete Maconha: as novas descobertas da medicina cortam o barato de quem acha que ela não faz mal. A partir do 60

pensamento de que “o fazer científico na modernidade visa a reduzir o real a um objeto e a teoria a uma elaboração do real, deixando assim de evocar qualquer esfera contemplativa da verdade, como o fazia a ciência da Antiguidade” (LEITE, 2005, p. 70, grifo do autor), podemos entender que o trecho “as novas descobertas da ciência” traz uma abordagem científica, que, teoricamente, estaria livre da instância da ideologia ou de outros fatores externos. A medicina e a ciência, portanto, isentas, comprovariam as consequências negativas advindas pelo uso de maconha. Dentro desse discurso, seria a medicina que diz que maconha faz mal, e não a Veja.

3.2.3 ANÁLISE DO PROJETO GRÁFICO

A partir de uma análise geral de todas as capas englobadas no corpus, podemos fazer alguns apontamentos. Quanto a sua função e características, pode-se dizer que as capas de revistas:

Apesar de estarem integradas a um conjunto maior de enunciados que constituem as revistas, têm uma função comunicativa diferenciada. Por isso, podem ser consideradas uma unidade enunciativa com características próprias, destacando-se do conjunto das informações que compõem o conjunto. Isso porque desempenham o papel de informar e anunciar ao mesmo tempo (PUZZO, 2009, web).

Como visto acima, os elementos que compõem a capa, além de anunciar o conteúdo da revista, também exercem a função de transmitir uma informação. No caso da Veja, isso ocorre apenas em alguns elementos, que vão se completando e ganhando sentido. No caso as manchetes, como se viu, são vagas e muitas vezes não informam de forma clara e direta o leitor. Por isso, se faz necessário recorrer a outros elementos, como a linha fina e a imagem. De todas as capas coletadas para análise, foi verificada uma predominância das fotos. Todas elas passaram por algum tipo de edição e outras, ainda, servem de recurso para montagens. São exceção as edições 2009 e 2293, que trazem uma arte para compor a capa. Este recurso

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também é abundantemente utilizado pela revista não só nas imagens estampadas em cada edição, mas também em algumas das fontes gráficas das manchetes (sempre em caixa alta). A edição 1659, de junho de 2000, traz à capa, sobre um fundo azul, um cigarro de maconha abaixo da manchete em amarelo (Figura 1). A revista poderia ter estampado o cigarro de maconha apagado, simplesmente a folha da erva ou qualquer outro elemento visual, mas não; optou por colocá-lo aceso, e não sem motivo. Em concordância com a iminência da “liberação social” da maconha da manchete (Maconha quase liberada), a droga acesa indica o início da possibilidade de seu consumo. Podemos utilizar semáforo como metáfora para exemplificar este processo: o “baseado” funciona como uma espécie de semáforo, e estando aceso indica que o sinal está livre. Acima há uma densa fumaça esbranquiçada, que toma conta de quase toda parte de cima da capa. Ela reforça a ideia da suposta aceitação da droga pela sociedade. Em janeiro de 2002, a edição 1733 mostra a foto da cantora Cássia Eller sobre um fundo preto (Figura 2). A cor é utilizada para reforçar a morte da artista – o preto, na sociedade ocidental, representa o luto. Para reafirmar o falecimento da artista, foi escrito seu nome no lado esquerdo, acima do ombro, junto ao ano de seu nascimento e morte. A foto mostra Cássia fazendo careta, mostrando seu jeito despojado. É interessante observar que a utilização de uma foto de rosto é feita, também, na edição 2087, mas mostra outra feição do personagem na capa. A escolha da imagem com o trejeito remete a uma ausência de seriedade de Cássia e ao seu estilo de vida. É usada caixa alta na fonte da manchete, que possui cor amarela e está em degradê na palavra “drogas”.

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Figura 1 - O cigarro de maconha aceso indica o início da possibilidade de seu consumo.

A capa da edição 1985, que chegou às bancas em 06 de dezembro de 2006, apresenta a imagem de um cérebro sob o efeito de uma tomografia (Figura 3). Dentro do órgão e centralizado há a imagem de uma garrafa. Os dois elementos fazem referência à manchete, O álcool e o cérebro dos jovens. Tendo ciência de que essa imagem tomográfica apresenta uma visualização aprofundada e minuciosa do cérebro, a partir do que ocorre dentro dele, compreende-se o álcool (representado na capa por uma garrafa) como uma espécie de diagnóstico. A posição da garrafa (dentro do cérebro) faz ligação direta com os problemas cognitivos ocasionados pela substância. A cor preta utilizada no fundo desta capa não detém do mesmo significado que a capa anterior, da edição 1733: a cor preta de fundo é própria das imagens resultantes de exames de tomografia, assim como nos de raio-X.

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Figura 2 – Para reafirmar o falecimento da artista, foi escrito seu nome no lado esquerdo, acima do ombro, junto ao ano de seu nascimento e morte.

Figura 3 – A cor preta de fundo é própria das imagens resultantes de exames de tomografia.

Na edição 2009, publicada em 2007, a arte gráfica ultrapassa a imagem da capa e também se apresenta na palavra “vício” da manchete (Figura 4). A letra “O” fui substituída por uma espécie de alavanca, dando a entender que o vício pode ser ligado e desligado. Sobre um fundo cinza 64

metalizado, acima da manchete são mostradas seis pequenas figuras, que representam algumas drogas. A primeira imagem é uma seringa, relacionada às drogas injetáveis (como a heroína, por exemplo). A segunda, terceira e quarta são imagens de um cigarro, de uma garrafa (objeto aqui outra vez utilizado para representar o álcool) e a folha da maconha, respectivamente. Adiante, temos a imagem de um comprimido, representando as drogas medicamentosas. Por fim, a imagem de uma caveira, representando a morte (o vício, outra vez, é relacionado a ela). Abaixo de cada uma dessas pequenas figuras, temos botões.

Figura 4 – Capa dá a entender que o vício pode ser ligado e desligado.

A alavanca e os botões direcionam a uma ideia de mecanismo. Todos estes elementos apontam para a possibilidade de seleção da droga no qual se há um vício (álcool, cigarro, maconha, etc.) através dos botões e a possibilidade de “desligá-lo” através da alavanca. No ano de 2007, a capa da edição 2030 traz a imagem de um soldado do B.O.P.E (Batalhão de Operações Policiais Especiais) não identificado, pois tem o rosto coberto por um capacete (Figura 5). O soldado empunha uma metralhadora e a aponta para baixo. Ao fundo, há uma imagem do filme “Tropa de Elite” sob um efeito acinzentado. A arte da capa, em si, não se mostra 65

significativa em relação às drogas. Entretanto, justamente por colocar usuários de drogas como “sócios do crime”, como aponta a linha fina, entende-se que a revista faz uma relação direta desses personagens com o crime e a ação policial.

Figura 5 – Aqui, usuários de drogas são colocados como “sócios do crime”.

A edição 2050, de 2008, traz algumas das características da edição 1985. A capa apresenta a imagem de um esqueleto sobre o efeito de raio-X (Figura 6). A matéria trata de uma pesquisa sobre hábitos dos brasileiros, não aborda exclusivamente as drogas, mas relaciona o álcool e o tabaco como hábito, principalmente na capa. O esqueleto em raio-X segura um cigarro aceso e um copo do que parece ser uísque. Assim como a imagem tomográfica do cérebro na edição 1985 apresenta uma visualização aprofundada e minuciosa do cérebro, a partir do que ocorre dentro dele, a edição 2050 traz o corpo humano quase por completo, da cintura pra cima. A pesquisa referenciada pela Veja seria, então, o raio-X do brasileiro, ou seja, o apresentaria por dentro e por completo, que estaria tendo hábitos prejudiciais à saúde, como beber e fumar. O fundo preto, também, representa uma característica deste tipo de imagem.

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Figura 6 – A pesquisa seria o raio-X do brasileiro, apresentando por dentro e por completo seus hábitos prejudiciais à saúde

No ano de 2008, a edição 2087 traz à capa uma foto do ator Fábio Assunção sobre um fundo vermelho (Figura 7). É utilizada a fotografia como elemento visual nesta edição. Ao contrário da edição 1733, no qual traz a imagem de Cássia Eller fazendo careta, a foto da edição em questão apresenta Assunção com feições sérias. Mostra o vício na vida do ator como um drama (como pode ser verificado também na linha fina).

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Figura 7 – Aqui, o ator, dependente da cocaína é uma “vítima” e não “sócio do crime”.

Em 2008 foi publicada a edição 2091 que, coincidentemente (ou não), também aborda a questão das drogas com o mundo das celebridades (Figura 8). Traz o elemento fotografia, mas há edição nas imagens. Em primeiro plano, do lado esquerdo, temos a imagem colorida de perfil da atriz Susana Vieira. Ao fundo, há uma outra foto, desta vez de Marcelo Silva, ex-marido da atriz. A imagem dele está toda em vermelho, mesma cor utilizada ao fundo. A escolha pela coloração de uma imagem e não de outra referencia a própria manchete: enquanto temos a “vida” apresentada na foto colorida da artista, temos a “morte” em tonalidade vermelha na foto de Marcelo, que foi usuário de cocaína. O vício em drogas – mais especificamente em cocaína – novamente é relacionado à morte.

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Figura 8 – O vício em drogas outra vez é relacionado à morte.

Na capa da edição 2129, lançada em 2009, temos mais uma fotomontagem (Figura 9). Sobre fundo branco, um homem engravatado aparece sendo erguido por uma pinça e, abaixo dele, um enorme copo de uísque com gelo. O copo e a pinça são desproporcionais à figura do homem. O homem faz referência a um cubo de gelo e a pinça serve para içá-lo, serve para tirar o cubo de gelo/homem de dentro do copo. A revista dá um sentido literal à expressão “se afogar na bebida”. Portanto, o homem “afogado” no álcool (ou no vício dele) é retirado do copo pela pinça, como se fosse um cubo de gelo.

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Figura 9 – A revista dá um sentido literal à expressão “se afogar na bebida”.

No ano de 2009, a capa da edição 2136 possui o fundo completamente preto (Figura 10). Nela, há a figura de uma nota de R$ 50,00 enrolada, em forma de canudo, e a figura de uma metralhadora formada com pó branco. Em relação a este último elemento, pode-se fazer alguns apontamentos: Um elemento bastante marcante é uma arma que se posiciona graficamente na parte inferior da página e é construída (preenchida) por um pó branco. Esse pó branco atua na referenciação do objeto do discurso “cocaína”, o qual pode acionar o conceito pré-construído de que o tráfico de drogas remete à violência, e por isso uma arma apresentada em sua forma pelo próprio pó da cocaína (TRINDADE, 2010, web).

Apesar de Trindade (2010) ter se utilizado de outros métodos para realizar a análise desta capa especificamente, é válido apresentar este ponto do artigo. Sendo o tráfico de drogas relacionado diretamente ao usuário, a revista se utiliza de um discurso que coloca em um mesmo patamar ambas situações: vender e consumir drogas.

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Figura 10 – Revista coloca em um mesmo patamar o ato de vender e consumir drogas. Ou seja, o uso de entorpecentes é outra vez relacionado ao crime.

No ano de 2010, temos a capa da edição 2157 que se utiliza da fotografia (Figura 11). Temos a imagem de Carlos Eduardo Sundfeld Nunes (conhecido como Cadu), assassino confesso do cartunista Glauco, que está atrás de grades. O homem tem seus olhos fixos em direção à frente, encarando a câmera, e possui um sorriso de canto. O fato de estar preso e sorrindo remete ao “psicótico” da manchete, relacionando a suposta insanidade de Cadu com o uso do chá de Santo Daime.

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Figura 11 – Atrás das grades, o “psicótico” Cadu sorri. A utilização do Chá de Santo Daime é relaciona à insanidade.

A capa da edição 2222, publicada em 2011, também traz o elemento fotografia (Figura 12). A imagem embaçada de uma mulher atrás de uma porta cujos ornamentos se assemelham à grades referencia a manchete (“prisioneiras”). Há uma edição na palavra “crack”, em laranja, onde as letras possuem um efeito de degradação. A fotografia mais a arte da fonte na palavra da manchete relacionam o uso do crack com o aprisionamento (não necessariamente à criminalidade, à penitenciária) ocasionado pela dependência e também à destruição e a deterioração. Em 2012, temos a edição 2277 que traz à capa, sobre um fundo branco, de uma pessoa entornando uma garrafa de bebida (Figura 13). Apesar de haver um efeito de escurecimento na imagem do indivíduo, nota-se que é uma mulher jovem, pois é possível identificar alguns traços dela na foto. O efeito de escurecer a imagem deste indivíduo se relaciona diretamente com o conteúdo da manchete, “Menor + álcool”, pois busca não identificar a jovem – ou, melhor dizendo, a menor de idade - que bebe. Ou seja, a ocultação da identidade dela se relaciona diretamente por ter menos de dezoito anos. Outro ponto que pode ser notado é como ela se utiliza da bebida. Bebendo diretamente do gargalo o líquido, a menor de idade parece consumir a substância sem 72

moderação alguma. Veja relaciona o abuso do álcool por menores de idade através destes elementos analisados.

Figura 12 – Uso do crack é comparado ao aprisionamento que a dependência acarreta no usuário, e não necessariamente ao encarceramento.

Por último, temos a edição 2293 de 2012. A capa possui predominantemente a cor branca (Figura 14). Ela é utilizada como fundo na capa. Abaixo, há uma folha da maconha. Em vermelho, temos, em letrais garrafais, a palavra “Maconha”. Analisando os três elementos, podemos tirar algumas conclusões: a cor branca se relaciona diretamente à medicina (citada na linha fina). O tamanho da imagem da folha da Cannabis sativa é pequeno diante da imensidão do branco (medicina) na capa. O vermelho da manchete representa sinal de perigo quanto a droga. Ou seja, temos a medicina, que é muito maior do que a maconha, que é, segundo a revista, perigosa para a saúde.

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Figura 13 – Bebendo diretamente do gargalo o líquido, a menor de idade parece consumir a substância sem moderação alguma.

Figura 14 – A cor vermelha na palavra “Maconha” também indica perigo.

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3.2.4 ANÁLISE DO TÍTULO DAS MATÉRIAS

O título das matérias não é o mesmo do que o das manchetes, apesar de, alguns serem semelhantes. Assim como nas manchetes, foi notada a ausência de objetividade no título das matérias. Com isso, o leitor recorre a outros elementos (como linha fina e fotos) para identificar exatamente do que se trata a matéria. A edição 1659, de 2000, tem como título de matéria Cada vez mais jovens (ver Figura 15). Nota-se que são “cada vez mais jovens” os usuários de maconha, a partir da leitura da linha fina. Denota a suposta preocupação da revista quanto ao uso de substâncias psicoativas por crianças, adolescentes e jovens, como pode ser percebido nas edições 1985 e 2277.

Figura 15 – Edição 1659: indícios de um aumento no consumo de Cannabis sativa por jovens.

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Junto à manchete, que propõe uma iminência da liberação social da maconha, ou seja, de sua aceitação por parte da sociedade, o título mostra que essa suposta aceitação se daria pelo uso da droga por esses indivíduos jovens. Na edição 1733, de 2002, temos o título Droga e agonia no auge da vida (Figura 16). O título relaciona diretamente o uso da droga (no caso da matéria, a cocaína) com a agonia. Essa agonia teria sido vivida pela cantora momentos antes de sua morte. Morte, esta, que interrompeu a vida de Cássia Eller no “auge” de sua vida e também de sua carreira, como aponta a matéria.

Figura 16 – Edição 1733: droga relacionada ao desespero e à morte precoce.

Quando Veja se utiliza do termo “auge”, indica também um sentido de prematuridade, como se a morte tivesse interrompido o sucesso da carreira da artista. Neste sentido, temos, então, a droga representada neste título como motivadora de uma morte nada tranquila, que, além de trazer “agonia”, também é responsável por destruir uma carreira em ascensão e promissora. Assim, como induz a manchete, a droga vitimizou a cantora. 76

Em 2006, o título Inimigo íntimo da edição 1985 (ver Figura 17) nos permite fazer alguns apontamentos. O álcool é tratado como “inimigo”, mais especificamente da saúde dos jovens. A palavra “íntimo” denota proximidade do jovem. Ou seja, o álcool é uma substância prejudicial, principalmente aos jovens e que está mais próximo dele do que se imagina.

Figura 17 – Edição 1985: o álcool é perigoso e está mais próximo dos jovens do que se imagina.

Sendo o álcool um “inimigo”, entende-se que ele traz consequências negativas e prejuízos, onde a substância não é “amiga” do jovem, sendo adversa e desfavorável a ele. A linha fina nos responde onde essa “intimidade” com o álcool se estabelece: em casa, junto aos membros da família. Essa relação indica a permissividade da sociedade no consumo do álcool pelos jovens. O título Para desligar o circuito do vício, da edição 2009 (Figura 18) publicada no ano de 2007, faz uma referência à manchete na capa. Como constado acima, o olhar de Veja sobre a dependência é de uma perspectiva puramente técnico-científica, como uma máquina, no qual a 77

dependência pode ser acionada. Essa comparação fica mais explícita no título da matéria, quando a revista cita o “circuito do vício”.

Figura 18 – Edição 2009: o ser humano é uma máquina e o vício tem seus “circuitos”.

Essa visão mecânica da dependência nos propõe encarar o ser humano como um aparelho. A própria fotomontagem da matéria, como pode ser visto na figura acima, propõe esta ideia, ao unir o cabo de uma tomada com a cabeça de uma mulher. O “desconector” do vício seriam alguns medicamentos que foram lançados no Brasil, na época da publicação da matéria. A partir do título, entende-se que a revista descartou as questões socioculturais que também motivam o surgimento da dependência, como apontou Leite (2005) no primeiro capítulo, dando a ela um viés puramente orgânico, somático e biológico. Em 2007, a edição 2030 traz o título A realidade, só a realidade (Figura 19). A realidade sugerida pelo título quanto ao filme Tropa de Elite, sendo teoricamente uma obra de ficção, denota a veracidade com que a história do longa-metragem retrata o que se passa no Brasil. 78

Figura 19 – Edição 2030: o longa-metragem mostra que é uma realidade o usuário de droga ser “sócio” de traficantes.

Essa realidade que a Veja encontra no filme Tropa de Elite é em relação à criminalidade. A ideia do velho jargão de que o usuário de drogas “sustenta” o crime pode ser encontrada na linha fina da capa, quando a revista diz que o filme de José Padilha aborda os usuários de entorpecentes como “sócios” dos traficantes. É colocada nos usuários certa carga de culpa pela questão da criminalidade. E sendo que o filme mostra “somente a realidade”, Veja indica que isso é verdade incontestável. Mas, se no Brasil a venda e produção da maconha, o crack ou cocaína são proibidos por lei, de que forma o usuário destas substâncias adquirirá sua droga a não ser por meios ilegais? O título Um raio X da saúde dos brasileiros (ver Figura 20), na edição 2050 publicada em 2008, é semelhante à manchete desta capa.

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Figura 20 – Ediçã0 2050: um olhar de raio-X na saúde dos brasileiros apontaria para o que não pode ser visto facilmente.

O título apenas acrescenta a informação de que o “raio X” é da saúde dos brasileiros. O efeito deste tipo de exame, o raio-X, é a visualização do corpo humano em profundidade, interiorizada, uma visão diferente da do ser humano. O termo no título propõe um olhar interno da saúde dos brasileiros. Além disso, também indica certa medicalização neste olhar, já que o raio-X é utilizado comumente em exames médicos. A pesquisa mostrada pela revista seria, então, o raio-X do brasileiro, ou seja, apresentaria por dentro os hábitos prejudiciais à saúde. Na edição 2087, lançada no ano de 2008, temos o título A luta de Fábio (ver Figura 21). O termo “luta” indica o processo de tratamento do ator Fábio Assunção em relação ao seu vício em cocaína.

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Figura 21 – Edição 2087: a dependência em cocaína do ator é vista pela revista como uma “luta”.

Ao contrário do que vimos na edição anteriormente analisada, Fábio não é sócio do crime. Muito pelo contrário. Sua dependência é encarada como uma dificuldade, uma batalha, uma guerra no qual seu inimigo é a droga. “Luta” aponta para a reabilitação como um processo dificultoso. Em 2008, temos na edição 2091 sob o título Escândalo, pó e morte (Figura 22). Temos por “escândalo” a traição pública sofrida por Susana Vieira, o “pó” a droga utilizada por Marcelo, ex-marido da atriz, e a “morte” como consequência dela. Estes três elementos parecem ser correlacionados no título. Mais uma vez temos o uso de entorpecente como causador de mortes. A utilização da palavra “pó”, em vez de “cocaína”, indica certa intimidade da revista ao tratar do assunto, já que o termo é coloquial e usado comumente para designar a droga.

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Figura 22 – Edição 2091: a droga é relacionada, novamente, como causadora de mortes.

No ano de 2009, o título A boia da prevenção, publicada na edição 2129, indica uma metáfora, usada na palavra “boia”. Sabendo que boia é um objeto que faz o indivíduo flutuar na água, e o impede de se afogar, os medicamentos mostrados na matéria agiriam desta forma quanto à questão do abuso do álcool. Na fotomontagem (ver Figura 23) isso é mostrado claramente, com a imagem literal do objeto, ao lado de um copo de uísque. A questão da prevenção indica uma ação no uso da substância quando ainda não foi desenvolvida uma dependência. A edição 2136, do ano de 2009, traz o título Uma prova de fogo (ver Figura 24). O termo “prova” indica testar, experimentar; pôr alguém à prova. Sendo ela “de fogo”, seria crucial, de extrema importância. Essa prova remete, como pode ser testado na linha fina, à Olimpíada e 2016, que será realizada no Rio de Janeiro; a questão do tráfico de drogas parece, para a revista, pôr em xeque a realização do evento.

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Figura 23 – Edição 2129: medicamentos servem de “boia” para quem se “afoga” no álcool.

O título Alucinação assassina (ver Figura 25), lançado em 2010 na edição 2157, propõe indicar a “alucinação” – ou seja, o efeito da substância sobre o indivíduo – como motivadora de um crime. É importante pensarmos que essa ideia refuta uma ideia extremada quanto ao uso não só do chá de Santo Daime, mas também do de outras substâncias. Podemos pensar que o motivo do assassinato do cartunista Glauco foi devido ao simples uso da droga, e não de seu uso junto aos problemas psicológicos que o autor do crime, Cadu, possui.

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Figura 24 – Edição 2136: Olimpíada de 2016 seria uma prova de fogo pela qual o Brasil passaria por causa da criminalidade

Figura 25– Edição 2157: o usuário do chá de Santo Daime é assassino.

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Na edição 2222, temos o título As mães reféns do crack (ver Figura 26), publicado em 2011. Ao contrário da manchete, que fala apenas em “prisioneiras”, o título da matéria mostra que as mães dos usuários de crack são “reféns” da droga, de forma indireta. Ao relacionar o crack aos familiares dos usuários, indica que os problemas ocasionados pela substância extrapolam os usuários, estendendo-se às mães e pais dessas pessoas. Ao indicar a droga como “prisão”, tem-se a ideia de que a mesma tira do usuário sua liberdade, esquecendo-se da possibilidade de que ele, mesmo sobre o uso e/ou dependência do entorpecente, pode tomar decisões e trilhar os rumos de sua vida, mesmo que a droga lhe prejudique a saúde ou lhe traga outras consequências negativas.

Figura 26 – Edição 2222: a droga prejudica os familiares e é uma prisão.

Em 2012, o título Vergonha nacional (Figura 27) da edição 2277 exerce uma carga forte de culpabilidade à nação brasileira. É esta nação que, segundo o título, seria permissiva quanto ao

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uso do álcool por menores de idade. Este uso é uma “vergonha”, ou seja, um ato digno de desonra e humilhação.

Figura 27 – Edição 2277: nação tem culpa por permitir que menores de idade bebam.

No ano de 2012, a edição 2293 traz o título Maconha faz mal, sim (ver Figura 28). A palavra afirmativa no fim da frase indica uma réplica, a resposta de uma pergunta, uma afirmação, um apontamento. Segundo o título, a maconha seria encarada como uma droga inofensiva e que, portanto, não traria prejuízos profundos à saúde dos usuários. O título parece apontar para o discurso antiproibicionista que vêm ganhando força e adeptos no Brasil, de alguns anos para cá. Como mostrado na matéria, a medicina, correta em toda sua credibilidade e em seu discurso supostamente livre de ideologias, seria quem desbancaria o discurso dos antiproibicionistas.

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Vale ressaltar que a matéria aponta diretamente para isso, quando cita, ao longo do texto, as Marchas da Maconha que ocorrem em diversos estados brasileiros, manifestos que pedem a legalização dessa e de outras drogas.

Figura 28 – Edição 2293: é a medicina quem diz para os antiproibicionistas e usuários que os malefícios da Cannabis sativa existem.

3.2.5 ANÁLISE DAS FONTES

Para melhor elaboração da análise, foram separadas as fontes de informação utilizadas pela Veja em todas as matérias de capa escolhidas para o corpus do estudo. Após a leitura de todos os textos, foram identificadas alguns tipos de fontes, que foram separadas e classificadas para melhor organização e entendimento do estudo. Assim, temos as seguintes fontes de informação: o usuário de drogas, os ex-usuários de drogas, os familiares dos usuários; pesquisas científicas, englobam estudos de profissionais individualmente ou de centros de pesquisa, universidades, etc.; 87

especialistas, que incluem psiquiatras, psicólogos, médicos, profissionais da segurança pública, etc.; dados oficiais; políticos e outros. A categoria “outros” foi elaborada afim de encaixar todas as fontes encontradas das matérias e que não se enquadram nos outros quesitos mostrados anteriormente. Isso inclui as fontes retiradas de outros veículos de comunicação, depoimento de celebridades (que não são nem especialistas, nem usuários e nem familiares de usuários) ou de personagens em geral que a reportagem entrevistou. De forma geral, foram apresentados diversos tipos de fontes em todas as matérias. Ao total de todas as matérias do corpus, de 2000 a 2012, foram contabilizadas 122 fontes. Em praticamente todas elas foram constatadas a presença de usuários de drogas como fontes de informação. Em todas as matérias há a presença de especialistas e de dados de pesquisas científicas, realizadas por universidades, centros de pesquisas, etc., nacionais e/ou internacionais. A seguir, temos um gráfico (Figura 29) que ajudará a visualizar melhor a proporção destas fontes.

Gráfico 1 – Ao total, foram contabilizadas 122 fontes de informação. A maioria delas é constituída de especialistas (37%) e usuários (16%).

A partir do gráfico acima, podemos analisar alguns pontos. Nas matérias analisadas, a Veja se utilizou em sua maioria (37%) de especialistas no assunto das drogas. São esses profissionais: psicólogos, psiquiatras, delegados (ou outro profissional da segurança pública), etc. Mas, em sua 88

maioria, os especialistas são psiquiatras e médicos de diversas áreas desta ciência. Em relação à utilização deste tipo específico de fonte, há estudos que apontam ser uma característica da própria revista.

(…) a informação produzida pelos mídia não circula no campo do verdadeiro, mas sim no do verossímil, o que equivale a dizer que as informações publicadas (…) utilizam esses “testemunhos autorizados” para se revestirem de aparência da verdade com objetivo de obterem, a partir daí, sua condição de credibilidade (QUERÉ, apud NASCIMENTO, 2002, p. 87).

Nascimento (2002) se utilizou de outros métodos para seus estudos, mas se torna válido utilizar de sua análise quanto às fontes de especialistas que, como citado acima no subcapítulo 3.1, essas fontes dão legitimidade aos fatos publicados nas reportagens, como preocupação do veículo em apresentar a veracidade dos fatos. Isso também se dá quanto às fontes de pesquisas científicas (12%), que aparecem como os estudos do Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (CEBRID), do Instituto Nacional de Câncer (Inca) e do Instituto de Saúde Pública da Suécia, por exemplo. Os dados oficiais (4%), como do Ministério da Saúde e da Organização das Nações Unidas (ONU), aparecem em menor quantidade. Um fator curioso em relação a estas fontes é que a revista tende a, no assunto das drogas, se utilizar das mesmas fontes. Por exemplo, a presença do psiquiatra Ronaldo Laranjeira (edições 1659, 1985, 2050, 2087, 2129, 2222, 2277 e 2293) se dá em praticamente todas as matérias. Assim como a do psiquiatra Dartiu Xavier da Silveira, apesar de ser menos frequente (edições 1733, 1985 e 2091). E a massiva utilização do psiquiatra Laranjeira não se dá por acaso. O especialista é conhecido no ramo da medicina e da psiquiatria por não ser favorável à descriminalização e/ou legalização das drogas no Brasil. Laranjeira é utilizado para reforçar a ideologia da revista, que, diante do que foi analisado até o momento, também se posiciona contra uma política de drogas antiproibicionista.

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O segundo tipo de fonte mais utilizado nas matérias analisadas é a dos usuários (16%). Entretanto, nem todos eles são identificados nas matérias, no intuito de preservação de identidade. Na capa Maconha quase liberada, edição 1659, por exemplo, são colocadas as iniciais do nome do usuário e sua idade. Na edição 2277, Menor + Álcool: Proibido mas ninguém liga, são identificados somente o sexo e a idade do usuário. Portanto, a Veja dá algum espaço para os usuários de drogas em suas matérias sobre o tema. Não só aos usuários, mas também como aos familiares destes usuários (9%), como se deu na edição O Psicótico e o Daime (entrevista com pai de Cadu) e em As prisioneiras do crack (mães e pais de usuários de crack). É importante fazer essa observação, levando em conta que a revista se utiliza dessas fontes como forma de apresentar a questão das drogas e/ou da dependência através de um outro viés, com tom mais emocional, onde os familiares “desabafam” sobre os problemas decorrentes da droga na vida do usuário. Os ex-usuários contabilizam 4%, um número pequeno se comparado às outras fontes, mas que serve também para dar ênfase emocional à matéria. O depoimento desse tipo de fonte se constitui, em sua maioria, de relatos sobre os prejuízos decorrentes ao uso de entorpecentes e de como estas pessoas têm uma vida melhor depois que deixaram de consumi-los. Os políticos (3%) também são pouco utilizados como fontes. Por exemplo, temos um depoimento de Fernando Gabeira, deputado federal, na edição 1659, e do ministro da Saúde da época, José Gomes Temporão. O dado nos permite compreender que o assunto de drogas parece, para a Veja, não resvalar na questão política. Por fim, temos os “outros”, que constituem 13%. É um número considerável, se o compararmos às outras fontes de informação. Nessa categoria, foram inclusos aqueles depoimentos que não se enquadravam em nenhuma das outras categorias. A presença dessas fontes se dá, principalmente, nas edições em que o assunto de drogas e/ou usuários de drogas serve apenas de “pano de fundo”. Na edição 1733, sobre a suposta morte de Cássia Eller por overdose, Ronaldo Villas e João Viana, empresário e baterista da cantora, respectivamente, são usados para retratar a vida da cantora e sua dependência em cocaína. Na edição 2030, “Pegou geral”, é 90

utilizado como fonte um depoimento do diretor do filme Tropa de Elite, José Padilha, e dados de uma pesquisa do Vox Populi (encomendada pela Veja, segundo consta) sobre a receptividade dos brasileiros quanto ao longa-metragem. A utilização destas fontes também acontece na edição 2087, com o ator e diretor Miguel Falabella sobre o uso de cocaína pelo ator Fábio Assunção, e também do autor Aguinaldo Silva. Isso acontece também na edição 2091 com os depoimentos de Cristiano, irmão de Fernanda, ex-namorada do ex-marido da atriz Susana Vieira, Marcelo Silva, também vítima de overdose de cocaína. Portanto, este tipo de fonte é usado quando a matéria aborda o uso de drogas por parte de celebridades, com depoimentos de terceiros que conviveram com o artista, também com o intuito de dar ares emotivos e dramáticos à questão.

3.3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em relação à revista Veja, podemos concluir que foram confirmadas algumas das hipóteses deste estudo, elaboradas ainda em processo de projeto. Levando em consideração o perfil conservador tomado pela revista Veja em sua linha editorial, as drogas, um assunto ainda considerado “tabu” no país, são tratadas por este veículo com grandes restrições. Enquanto Veja criminaliza os usuários, colocando-os como corresponsáveis pela criminalidade e violência no país, temos outra abordagem por ela quando o usuário é uma celebridade. Enquanto o famoso artista loiro de olhos azuis passa por uma situação difícil com seu vício em cocaína, outro dependente na mesma substância não é mais do que um criminoso, alguém que deve ser punido por lei. Em contrapartida, temos uma revista que a todo momento apresenta, assim como uma vitrine de farmácia, soluções milagrosas para doenças à base de drogas medicamentosas. Temos uma revista que, para tratar o vício em uma droga, propõe a utilização de outra droga, esta permitida por lei e objeto de lucro de grandes laboratórios farmacêuticos internacionais. A salvação de uma droga estaria em outra droga? 91

As informações dos estudos apontam algumas características e tendências da mídia ao tratar sobre substâncias psicoativas. É importante ressaltar que houve um enfoque na mídia impressa, descartando a possibilidade de uma análise sobre esse processo em outros veículos de comunicação, como a televisão e o rádio. Portanto, não devemos encarar os dados de forma generalizada. Apesar de representarem alguns pontos distintos, mostram o quanto a mídia ainda pauta o tema no âmbito policial, o que seria um reflexo da política repressora de combate às drogas mantida pelo país. Percebe-se, também, a necessidade das drogas e seus consumidores serem abordadas de uma forma menos alarmista e estereotipada. A produção de notícias, sempre atrelada à linha editorial da organização, é regulada, como se viu, pelos funcionários que ocupam cargos mais altos na hierarquia organizacional, e pode promover uma espécie de despersonalização do profissional. A posição do jornalista frente aos constrangimentos organizacionais é refletida dentro da teoria organizacional, que cabe em diversos veículos de comunicação brasileiros e em múltiplas mídias, como também acontece com a Revista Veja. Na perspectiva da teoria organizacional, o jornalismo é um negócio e busca o lucro, onde o fator econômico é de suma importância para a atividade jornalística. Assim sendo, é inerente às empresas jornalísticas a preocupação pela arrecadação de capital, através do marketing e da publicidade, para que seja realizada sua manutenção e funcionamento. Dentro dos estudos de Warren Breed, percebe-se que a função jornalística é estabelecida a partir de múltiplos fatores, sendo o principal deles seguir a linha editorial do veículo de comunicação a qual se está prestando um serviço. Portanto, nem sempre o cunho ideológico contido em um texto jornalístico deve ser encarado como pertencente ao indivíduo que o escreveu, ou seja, o jornalista. Este profissional segue as regras já estabelecidas do veículo, assim como sua linha editorial. No caso da Veja, os jornalistas que escreveram as matérias aqui analisadas não necessariamente são contra o uso de drogas e compactuam com sua total proibição; eles seguem as orientações das altas hierarquias da revista e de sua linha editorial. 92

Ainda sob vigência, o proibicionismo brasileiro continua a caminhar tendo como guia os modelos norte-americanos de repressão às drogas. Mesmo com a Nova Lei de Tóxicos, de 2006, a qual delineia a distinção entre o comprador e o vendedor de entorpecentes, despenalizando o usuário, o assunto permanece entrelaçado a pré-conceitos, o que dificulta uma abordagem isenta de estereótipos e discursos reducionistas e generalizantes. Como estudado, as drogas acompanharam o desenvolvimento da humanidade e seu uso tomou múltiplas significações de relação por parte da subjetividade do próprio usuário, que pode ou não desenvolver algum tipo de dependência ao longo do tempo. Compreender essas nuances é o que parece ser primordial para a perpetuação da cidadania e do direito fundamental de cada ser humano, que é o de ser livre para tomar os rumos da própria vida. A desumanização do usuário de entorpecentes é construída através de um discurso moralista e, tendo ciência da importância da Veja como formadora de opinião – é um dos veículos impressos mais lidos no Brasil –, a disseminação de suas ideologias pode promover a estigmatização dos usuários de drogas, apresentando-os para o restante da sociedade como um risco e responsáveis por grande parcela da criminalidade no país.

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