PALAVRAS VIVIDAS Um estudo de caso sobre os escândalos de corrupção no Brasil. 2009 (Monografia de Graduação)

July 3, 2017 | Autor: C. Fioretti Bongi... | Categoria: Social Sciences, Political Anthropology, Brazil, Ciências Sociais, Corruption
Share Embed


Descrição do Produto

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS
FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS












palavras vividas
Um estudo de caso sobre os escândalos de corrupção no Brasil







Claudia Fioretti Bongianino


















Belo Horizonte
2009
Claudia Fioretti Bongianino













palavras vividas
Um estudo de caso sobre os escândalos de corrupção no Brasil






Monografia apresentada como requisito
parcial para a obtenção do título de
Bacharel em Ciências Sociais, ênfase em
antropologia.










BANCA EXAMINADORA:

Prof. Dr. Daniel S. Simião
Prof. Dra. Deborah Lima







Belo Horizonte
2009









































À minha mãe.













































Agradeço às pessoas queridas que fazem parte da minha vida: àquelas que
estão comigo desde sempre e que sempre estarão por perto; àquelas que se
fazem presente embora estejam distantes; àquelas que já não estão comigo
mas são importantes pra mim. Agradeço aos professores que tive ao longo da
minha formação e aos colegas do PET, que me despertaram novas abordagens,
novas inquietações, novas sensibilidades. Agradeço ao professor Daniel
Simião pela orientação em minhas pesquisas e à professora Deborah Lima pela
atenção que dedicou à minha monografia. Agradeço, por fim, aos professores
Mário Fuks, Bruno Reis Renan Springer e Eduardo Vargas pela ajuda ao longo
do curso, e à professora Léa Perez, por ter me despertado o amor pela
antropologia.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES E TABELAS



Figura 1 - Foto de Roberto Jefferson
...........................................................................
13

Figura 2 - Foto de Miro Teixeira
............................................................................
...... 13

Figura 3 - Capa da Veja cuja menção, no alto, à esquerda, diz: "Exclusivo:
o
escândalo da compra do PTB pelo PT saiu por 10 milhões de reais
.......... 14

Figura 4 - Foto de José Dirceu
............................................................................
.......... 15

Figura 5 - Foto de José
Genuíno.....................................................................
............... 16

Figura 6- Capa da Veja cuja menção, no alto, diz: "Exclusivo: o vídeo da
corrupção em Brasília[...]"
....................................................................
......... 18

Figura 7 - Sequência de 18 capas da Veja sobre corrupção
......................................... 19

Figura 8 - Edição da Veja que retrata os corruptos como uma
praga de
roedores............................................................
............................. 21

Figura 9 - Edição da Veja que retrata Roberto Jefferson como
"O homem bomba"
....................................................................
................ 22

Figura 10 - Ilustração da reportagem que retrata Roberto Jefferson como
'lixo' escondido sob o tapete
....................................................................
............ 23

Figura 11 - Foto de Silvio Pereira publicada na segunda capa da Veja
inteiramente dedicada à corrupção
...................................................................
............. 24

Figura 12 - Terceira capa da Veja inteiramente dedicada à corrupção
......................... 25

Figura 13 - Ilustração da reportagem que retrata Aldo Rebelo e José Dirceu
como bombeiros
....................................................................
................................ 26

Figura 14 - Edição da Veja que retrata Roberto Jefferson derrubando Delúbio
Soares 2005
....................................................................
............................. 28

Figura 15 - Quinta capa da Veja inteiramente dedicada à corrupção
........................... 30

Figura 16 - Foto de Lula e José Dirceu ilustrando um nocaute
.................................... 31

Figura 17 - Foto de Marcos Valério, o "lobista mineiro"
............................................. 32

Figura 18 - Capa da última Veja de junho de 2005
...................................................... 33

Figura 19 - Imagem da estrela do PT nos jardins da Alvorada
..................................... 33


Tabela 1 - A corrupção nas edições da Veja entre 14 de maio e 25 de
junho de 2005
....................................................................
......................... 19





SUMÁRIO



INTRODUÇÃO

1. Pensando o Brasil: escândalo, corrupção e cultura
.................................... 8

PRIMEIRO CAPÍTULO

2. Construindo "O Mensalão": denúncia, escândalo e corrupção
.............. 12
2.1 Denúncias de corrupção
..........................................................................
...... 12
2.2 Escândalo dos Correios
..........................................................................
....... 17
2.3 'Escândalo do Mensalão'
..........................................................................
..... 27


SEGUNDO CAPÍTULO

3. Pensando o "Escândalo do Mensalão": denúncia, escândalo e
corrupção
..........................................................................
........................... 35
3.1 Escândalo?
..........................................................................
.......................... 35
3.2 Corrupção?
..........................................................................
........................... 36
3.3 Política Brasileira?
..........................................................................
............... 41


TERCEIRO CAPÍTULO

4. Pensando a corrupção no Brasil
................................................................. 47
4.1 Vínculos políticos?
..........................................................................
............. 47
4.2 Relações formais?
..........................................................................
............... 49
4.3 Trocas?
..........................................................................
................................ 51

CONCLUSÃO

5. Relações em relação: O ' Mensalão' e os escândalos de corrupção
no Brasil
....................................................................
................................. 56

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
...................................................................... 59
INTRODUÇÃO
1 Pensando o Brasil: escândalo, corrupção e cultura

Escândalos de corrupção marcam o cenário atual da política brasileira.
No entanto, esse fato aparentemente consensual apresenta uma questão um
tanto quanto intrigante: a corrupção permanece no Brasil, embora seja
condenada como escândalo; mais do que isso, a corrupção permanece
escadandalosa, embora seja do conhecimento de todos o fato de ela existir
de maneira corriqueira. Esse aparente paradoxo parece demonstrar-se de
maneira particularmente evidente no caso do 'Escândalo do Mensalão', o qual
está relacionado a um esquema de pagamentos mensais para que deputados
votassem a favor de projetos de interesse do Executivo. Efetivamente, essas
práticas não tinham despertado muita atenção até serem denunciadas por
Roberto Jefferson, em entrevista concedida à Folha de São Paulo em junho de
2005, quando passaram a ser definidas como corruptas e tornaram-se
escandalosas.
Talvez a chave de leitura para essa questão possa ser encontrada no
fato de que a própria definição do que seja corrupção assenta num profundo
dissenso. Conforme aponta a maioria dos estudos realizados sobre a prática
da corrupção, as diferentes sociedades e os diversos grupos no interior de
cada sociedade não concordam quanto a que ações especificamente seriam
corruptas e corruptoras. Especificamente no Brasil, como mostra Marcos
Otávio Bezerra (1995), a definição de corrupção não é absoluta, sendo
extremamente difícil traçar um limite entre o que é corrupção e o que não
é, entre o que é lícito e o que não é.
Um exemplo disso é a fala do empresário Emílio Odebrecht (JORNAL DO
BRASIL, 24 mai. 1992), quando indagado sobre o que considera corrupção:
Eu acho que a sociedade toda é corrompida e ela corrompe.
Hoje para o sujeito resolver alguma coisa, até para sair
de uma fila do INPS, encontra seus artifícios de amizade,
de um presente ou de um favor. Isso é considerado um
processo de suborno. O suborno não é um problema de
valor, é a relação estabelecida. (BEZERRA, 1995, p. 11)


Nesse trabalho, procuro estudar o 'Escândalo do Mensalão', retomando o
material publicado na revista Veja nos meses de maio e junho de 2005. Dessa
forma busco analisar a percepção que as pessoas têm da corrupção e o modo
como reagem a ela, assim como quais práticas são percebidas como corruptas
e o modo pelo qual as pessoas dão sentido a elas.
Sendo a Veja a revista semanal de informação mais lida no Brasil,
acredito que o estudo do material publicado nela durante o mês da denúncia
de Roberto Jefferson e durante o mês anterior me permitiu ter acesso a essa
dimensão escandalosa do 'Mensalão'. No entanto, estou ciente de que a
abordagem da Veja corresponde a apenas um dos olhares possíveis sobre essa
questão, um olhar inevitavelmente enviesado. Não desconsidero a
possibilidade de manipulação da informação por parte da mídia, mas escolho
realizar uma discussão em outra linha, isto é, voltada para a análise das
definições e explicações para a corrupção que podem ser extraídas do
material publicado por Veja no período especificado acima. Em outras
palavras, tomo a forma como se constrói uma "denúncia" nas matérias de Veja
como fonte para compreensão do que pode ser visto e conceituado como
'escândalo' e como 'corrupção' na sociedade brasileira neste momento.
Com efeito, os dois meses de revista Veja que analiso são de certa
forma, o campo da minha pesquisa. Dediquei um mês da minha pesquisa para
mergulhar nessas páginas, lendo e relendo as reportagens, atentando para as
palavras e imagens contidas nas edições. Procurei explorar ao máximo o
estranhamento causado pelo fato deu não ser uma leitora uma leitora assídua
de jornais e revistas, muito menos da Veja. Conhecia alguns dos fatos
narrados pelas reportagens e havia realizado uma revisão bibliográfica
sobre escândalo, corrupção e sistema político brasileiro. No entanto, a
maior parte daqueles fatos e, sobretudo daqueles argumentos e daquelas
ilustrações, me eram estranhas. Vivenciei o texto da Veja, esforçando-me
para captar a perspectiva das pessoas que estavam presentes nas palavras
contidas nas cartas e reportagens desses dois meses da revista. Atentei
para a maneira como elas justificavam publicamente suas atitudes e
opiniões, buscando compreender como as palavras contidas na Veja ganhavam
vida ao serem lidas, comentadas, contextualizadas, retomadas, enfim,
vividas pelos leitores da revista, pelos seus repórteres e pelos políticos
que eram citados por ela.
Assim, no primeiro capítulo busco descrever a maneira pela qual o
'Mensalão' transformou-se em um escândalo, mostrando os passos da seqüência
por meio da qual o 'Mensalão' foi amplamente divulgado, dramatizado,
rotulado e executado, sendo convertido em motivo de execração, por meio
desse rito. Além disso, procuro explicitar alguns processos ritualizados,
nos quais determinadas ações eram esperadas, por meio dos quais os
argumentos construídos em torno da denúncia de 'Mensalão' passaram pela
condição necessária para transformar-se em escândalo.
No segundo capítulo, relaciono a descrição feita no primeiro capítulo
com a bibliografia disponível sobre escândalo, corrupção e política
brasileira. Nesse sentido, aponto para as definições e para as
interpretações formuladas acerca da corrupção pelos repórteres da revista
Veja, por seus leitores e pelos políticos citados por ela. Paralelamente,
retomo os estudos desenvolvidos por Sherman (1990) e por Thompson acerca da
temática do escândalo; revejo a argumentação de uma série de autores sobre
corrupção; lanço mão da teorização de Kant de Lima (2008) sobre cidadania e
daquela esboçada por Abranches (1988) e Cintra (2004) acerca do sistema
político brasileiro; por fim, exploro o estudo de Chaia et alii (2001)
sobre recentes escândalos políticos no Brasil.
No terceiro capítulo, analiso mais especificamente os estudos
antropológicos realizados acerca da corrupção no Brasil, tendo como
referência os estudos recentes de Bezerra acerca da corrupção, das relações
estabelecidas entre os políticos e das dinâmicas envolvendo recursos
públicos no Brasil. Para pensar algumas das questões exploradas por
Bezerra, retomo as noções clássicas de dádiva e de pessoa moral, sem
pretender, no entanto, colocar as trocas políticas brasileiras no mesmo
plano ético e epistemológico que o sistema de Mauss (2003).
Finalmente, concluo o trabalho argumentando que a corrupção no Brasil
apresenta diferentes definições e interpretações, sendo que os atores
parecem ter uma explicação para o fato de a corrupção permanecer embora ela
seja condenada escandalosamente. Além disso, a corrupção brasileira parece
estar fundamentada em características específicas da ética e da moral
brasileira, assim como em uma configuração peculiar do sistema político no
Brasil. No entanto, parece haver alguns elementos que diferenciam a
corrupção de práticas análogas a ela, comumente realizadas e aceitas,
fazendo com que a partir de determinado momento essas práticas sejam
taxadas de corrupção, sejam denunciadas e se tornem um escândalo, como no
caso do 'Mensalão'.
PRIMEIRO CAPÍTULO
2 Construindo "O Mensalão": denúncia, escândalo e corrupção.

2.1 Denúncias de corrupção
Em meados de 2005, subitamente todos estavam escandalizados com a
corrupção. Não se falava em outra coisa: 'Mensalão'. Sinceramente, na
ocasião não me preocupei em saber detalhadamente do que se tratava.
Imaginei que, mais uma vez, políticos haviam sido denunciados por
participar de algum esquema ilegal de distribuição de recursos públicos. No
entanto, para meu espanto, todos pareciam extremamente preocupados em
saber.
Tanto alarde se devia ao fato de que alguns dias antes, precisamente
em 6 de Junho de 2005, Roberto Jefferson, então deputado pelo PTB (Partido
Trabalhista Brasileiro), havia concedido uma entrevista ao jornal Folha de
São Paulo, denunciando um esquema de pagamento de mesada a deputados para
votarem a favor de projetos de interesse do Poder executivo. Mensalmente
Delúbio Soares, tesoureiro do PT (Partido dos Trabalhadores), entregaria 30
mil reais a líderes ou presidentes de partidos da base aliada, como o PP
(Partido Progressista) e o PL (Partido Liberal), para que eles
distribuíssem o dinheiro nas próprias bancadas em troca de apoio nas
votações de interesse do governo. Segundo Jefferson, essa prática ilegal
era comumente denominada pelo neologismo 'Mensalão' nos bastidores da
política.
A denúncia foi amplamente noticiada pelas redes de televisão nacionais
e pelos principais jornais e revistas do país. A partir de então, o
neologismo ganhou ressonância nacional e se popularizou, causando revolta
geral quanto a esse esquema do que passou a ser visto como 'compra de
votos' de parlamentares. O escândalo foi tamanho que foi chamado também de
'a maior crise política do governo Lula'. De fato, parece ter se tratado da
maior crise política e do maior escândalo do governo Lula, mas nada disso
parece estar ligado especificamente aos fatos denunciados - e é isso que me
chama a atenção nesse episódio.
































Efetivamente, oito meses antes da denúncia de Roberto Jefferson, esse
esquema de compra de votos de parlamentares havia sido denunciado na edição
de 24 de Setembro de 2004 do Jornal do Brasil, tendo sido inclusive
denominado explicitamente de 'Mensalão'. Na ocasião, Miro Teixeira (ex-
ministro das comunicações e ex-líder do governo na câmara) denunciou ao
jornal o esquema de pagamento de propina em troca de votos, que seria
oferecido pelo PT a parlamentares do PTB, do PP, do PL e também do PMDB
(Partido do Movimento Democrático Brasileiro).













Conforme afirmam os autores da reportagem, Paulo de Tarso, Hugo
Marques e Sérgio Pardelas: "Chamado 'Mensalão', trata-se de uma mesada fixa
em troca de votos favoráveis no painel eletrônico" (LYRA. Jornal do Brasil,
24 set. 2004). Segundo Miro, além desse 'Mensalão', haveria outros esquemas
operados pelo PT por meio dos quais o partido compraria apoio político.
Um exemplo seria o caso que havia sido denunciado pela revista Veja
alguns dias antes, na edição que saiu nas bancas em 18 de Setembro de
2004[1]. Segundo a reportagem da revista, que mereceu inclusive menção na
capa (FIG. 3), Roberto Jefferson (então deputado e presidente do PTB) e
José Dirceu do PT (então ministro-chefe da Casa Civil) teriam selado um
acordo que estabelecia que o PTB apoiasse candidatos do PT nas eleições de
2004 em troca de cerca de 10 milhões de reais.
















Tal apoio seria recompensado por meio de cargos federais e liberação
de emendas orçamentárias, que poderiam ser utilizados pelos deputados para
comprar material de campanha e para ajudar os prefeitos e vereadores a
ficarem bem com suas bases. Segundo a reportagem, o então presidente Luiz
Inácio Lula da Silva, do PT, saberia do acordo, mas teria "sido poupado dos
detalhes pecuniários" do mesmo, o qual faria com que o PTB se tornasse o
maior aliado do PT em Brasília, garantido também mais tempo de televisão
para o Partido dos Trabalhadores (OLTRAMARI. Veja, edição. 1872).


























É interessante notar que o tipo de argumentação apresentado nessa
reportagem, segundo a qual o presidente não estaria ciente dos fatos
denunciados foi recorrente ao longo dos escândalos de corrupção ocorridos
no governo Lula. Diversos jornalistas e políticos repetiram esse tipo de
argumentação e, quando estourou o 'Escândalo do Mensalão', o próprio
presidente estruturou sua defesa em torno do argumento de que ele não sabia
de nada.
Voltando às denúncias de 2004, em 25 de Setembro de 2004 é reportada
uma nova denúncia na revista Veja, segundo a qual haveria uma fita
registrando o PT oferecendo 500 mil reais ao PSDC (Partido Social
Democrático Cristão), para que esse partido não se aliasse ao PSDB (Partido
Social Democrático Brasileiro) nas eleições municipais de Osasco
(OLTRAMARI. Veja, edição 1873).
Nessa edição da revista, retoma-se a denúncia feita na edição
anterior, reportando os movimentos da oposição que pedia a investigação das
transações entre o PT e o PTB. Além disso, a revista traz algumas reações
das pessoas envolvidas nas denúncias: José Genuíno, presidente do PT teria
dito: "Não fizemos acordo financeiro. Fizemos um acordo político eleitoral"
(OLTRAMARI. Veja, edição 1873).
















As repercussões desses eventos, porém são muito poucas. Até mesmo na
revista Veja de 25 de setembro de 2004, há apenas uma reportagem sobre as
denúncias de corrupção, o assunto não é mais tratado nem na capa nem nas
demais reportagens da edição. Na televisão, o Jornal Nacional noticiou a
denúncia feita por Veja do acordo entre PT e PSDB ainda no dia 18 de
setembro, mas se limitou a isso (DENÚNCIA. Jornal Nacional online, 18 set.
2004). Nos dias seguintes, nenhuma menção à denúncia de Miro Teixeira
acerca do 'Mensalão', tampouco às repercussões dessas denúncias. Tudo
parece acabar aqui. Nas edições seguintes da Veja nenhuma nova denúncia,
nenhuma reportagem sobre esses casos, nenhuma Carta aos Leitores sobre o
assunto, nenhuma Carta dos Leitores comentando as notícias. Enfim, nenhuma
grande repercussão dessas denúncias, das quais eu mesma nem me lembrava
antes dessa pesquisa. Nada disso se tornou um escândalo, parece ter se
tratado apenas de mais uma leva de denúncias de corrupção que não parecem
ter significado muita coisa.
Certamente pode-se perguntar por que essas denúncias não foram
suficientemente escandalosas para passar de denúncias a escândalos. Essa
pergunta, porém, não me proponho a responder. Limito-me a pergunta como
outras denúncias sobre os mesmos fatos se tornaram escandalosos ou, em
outras palavras, como foi construído o 'Escândalo do Mensalão', seja
enquanto escândalo, seja enquanto 'Mensalão'. Percebe-se, do pouco que foi
apresentado até aqui, que não foram os simples fatos a escandalizar no caso
do 'Mensalão', Os mesmos fatos já haviam sido denunciados algum tempo antes
sem maiores alardes e só se tornaram escandalosos em determinado contexto.
Além disso, o 'Mensalão' enquanto conduta condenável escandalosamente só
passou a existir após ter sido denunciado e ter se transformado em um
escândalo em meados de 2005 - um escândalo extremamente escandaloso, diria
eu.

2.2 Escândalo dos Correios
Nos oito messes entre uma denúncia de 'Mensalão' e outra, vários
outros casos de corrupção foram noticiados, todos sem grandes alardes. Esse
estado de coisas começou a mudar, porém, em 14 de maio de 2005, quando a
revista divulgou um vídeo flagrando um funcionário dos Correios, Maurício
Marinho, recebendo propina de empresários para fraudar licitações.
Segundo a denúncia de Policarpo Júnior, Marinho seria apenas mais um
dos vários "políticos desonestos que querem cargos apenas para fazer
negócios escusos – cobrar comissões, beneficiar amigos, enriquecer
ilicitamente" (JUNIOR. Veja, edição 1905). No vídeo, Marinho descreve o
funcionamento do esquema de pagamento de 'acertos' financeiros para entrar
no rol de fornecedores dos Correios e afirma que ele realiza esse esquema
em nome do PTB, sob ordens de Roberto Jefferson, o então deputado federal e
presidente do partido.
















A chamada da capa da revista (FIG. 6) prometia causar grande impacto:
"Exclusivo: o vídeo da corrupção em Brasília. A incrível seqüência do
dinheiro saindo das mãos do corruptor para o bolso do corrupto. Mais:
diálogos inesquecíveis" (VEJA, edição 1905). E o impacto realmente foi
forte. Parte desse vídeo foi ao ar nas principais redes de televisão,
mostrando Marinho embolsando 3 mil reais em dinheiro, como adiantamento
para garantir a fraude na estatal. Em meio a isso tudo, no dia 18 de maio,
a oposição registra o pedido de abertura da CPI dos Correios, enquanto o
governo tenta obstruir sua instauração.
Na semana seguinte à divulgação do vídeo, que tinha merecido apenas
uma menção na capa da edição anterior da revista, a corrupção ocupa toda a
capa da edição de 21 de maio de 2005. A partir daí até o final de setembro
daquele ano, todas as 17 capas seguintes da revista foram sobre o
'Escândalo do Mensalão' e/ou suas repercussões.
Depois dessa série de 18 capas 'monotemáticas', o 'Mensalão', a
corrupção e o PT ainda aparecem nas capas, matérias, colunas, cartas e
sessões da Veja, mas não com a mesma freqüência. Talvez isso se deva a um
interesse peculiar da população brasileira, ou da revista, pela dinâmica
política do país naquele período. Não saberia dizer. Todavia, não tenho
dúvida de que a valorização dessas denúncias pela mídia seja um aspecto
importante do 'Escândalo do Mensalão'.






















Voltando à edição de 21 de maio de 2005, com ela, além de começar a
série de capas sobre corrupção, começa também a série de cartas e
reportagens sobre esse tema. A edição se abre com uma carta ao leitor, na
qual a corrupção é definida como um "câncer na alma do Brasil" (CARTA.
Veja, edição 1906), mas defende-se a possibilidade de combater esse
'câncer', sendo a ação da mídia - e da Veja - uma importante arma na luta
contra a corrupção.
"TABELA 1 - A corrupção nas edições da Veja entre 14 de maio e 25 de"
"junho de 2005 "
"A corrupção "Veja "Veja "Veja "Veja "Veja "Veja "Veja "
"aparece nas: "1905 "1906 "1907 "1908 "1909 "1910 "1911 "
"Cartas dos "0 "2 "14 "11 "6 "18 "17 "
"leitores " " " " " " " "
"Reportagens "1 "4 "5 "6 "4 "3 "6 "


Na sessão de cartas dos leitores, por sua vez, duas cartas sobre a
denúncia de corrupção nos Correios, publicada na edição anterior. Uma é do
secretário geral do PPS, Rubens Bueno, a outra de Cássio Taniguchi, ex
prefeito de Curitiba pelo PFL (Partido da Frente Liberal, atual Democratas,
DEM). Ambos esclarecem que não estão relacionados com os fatos narrados na
edição anterior da revista e Bueno aproveita para
cumprimentar a revista e o repórter pela excelente
reportagem investigativa, em que a Veja demonstra, mais
uma vez, o importante papel da imprensa na divulgação de
denúncias de corrupção, o que contribui de maneira eficaz
para o aprofundamento da democracia e para a punição dos
que se locupletam com o dinheiro público. (BUENO. Veja,
edição 1906)


Nessa mesma edição da Veja, uma reportagem analisa a mobilização do PT
(a qual seria a maior realizada pelo governo até então) para tentar barrar
a criação da Comissão Parlamentar de Inquérito para apurar o caso (CPI dos
correios), cujo pedido foi viabilizado rapidamente pela oposição e por
vários aliados. Efetivamente, Eduardo Braga, governador da Amazônia pelo
PPS (Partido Popular Socialista) teria dito: "Lula está preocupado com a
crise política e a imagem negativa dos políticos e das instituições"
(CABRAL. Veja, edição 1906). Essa seria a razão do governo ter lançado mão
de mobilização ímpar para angariar apoio no Congresso e convencer deputados
a retirar suas assinaturas do requerimento da CPI. Além disso, em conversa
com aliado, José Dirceu teria dito: "É impossível que uma CPI minimamente
bem feita não pegue o Delúbio e o Silvinho", referindo-se a Delúbio Soares,
tesoureiro do PT, e Sílvio Pereira, secretário geral do partido (CABRAL,
Veja, edição 1906).
A partir das outras três reportagens sobre corrupção publicadas na
edição, é possível identificar algumas definições de corrupção fornecida
pelos repórteres da revista. Em primeiro lugar, parece tratar-se de uma
prática que transforma as pessoas em ratos ou ratazanas, ou simplesmente em
roedores do dinheiro público (FIG. 8).
Corrupção seria o ato praticado pelas pessoas denunciadas nas
reportagens citadas acima: Corrupção seria propina, compra e venda de
votos, compra e venda de licitações; corrupção é dinheiro que escoa dos
cofres públicos para o bolso dos corruptos; corrupção é algo que afugenta
investimentos e causa turbulências políticas; corrupção é dinheiro que
deixa de ser investido em políticas públicas; corrupção é praga, é câncer,
é imoralidade pública; é comprometimento com padrinhos políticos e não com
o interesse público (CABRAL; CARNEIRO. JUNIOR; PETRY, Veja, edição 1906).
















Na revista Veja de 28 de maio de 2005, Roberto Jefferson aparece na
capa como "O homem bomba" (FIG. 9). Mais adiante, na Carta ao Leitor, Veja
esclarece que a revista publica denúncias de corrupção unicamente para
servir a seus leitores e ao interesse público. Na carta ao leitor, a
revista enfatiza mais uma vez o fato de que publica denúncias "tendo como
único objetivo servir a seus leitores e ao interesse público" (CARTA. Veja,
edição 1907). Além disso, reporta a especulação feita por políticos
governistas sobre as motivações que levaram Veja a publicar as reportagens
sobre corrupção, afirmando que:
A crise política deflagrada pelas revelações foi
interpretada pelo ministro Aldo Rebelo como uma tentativa
da "direita de desestabilizar governos democraticamente
eleitos". Ainda mais dramático, o senador petista Aloizio
Mercadante falou em uma "conspiração das elites contra o
governo operário" (CARTA. Veja, edição 1907).


Mais uma vez faço notar a recorrência do tipo de argumentação
apresentado aqui. Efetivamente, Diversos políticos, seja nesses escândalos
do governo Lula, seja em outros escândalos de outros governos, repetiram o
argumento segundo a qual as denúncias de corrupção corresponderiam a uma
conspiração para enfraquecer o governo.


















Nessa edição são publicadas mais catorze Cartas de Leitores comentando
a corrupção. Indignação e tristeza com as denúncias, admiração pela revista
Veja – esse é o tom geral da sessão de cartas dessa edição. Também nessas
cartas é possível perceber algumas definições de corrupção, dessa vez,
fornecidas pelos leitores da revista: "uma infecção generalizada,
lamentável, que se espalha por contágio" (CARTAS. Veja, edição 1907) - como
afirmam Rodrigo Gava (Curitiba, PR), José Blota Neto (São Paulo, SP) e Irad
Gantuss (Belém, PA), remetendo-se à reportagem publicada na edição anterior
da revista intitulada "Diga-me com quem andas..." (PETRY. Veja, edição
1906). "Corrupção é um problema causado pela falta de controle interno da
legalidade dos atos da administração pública, o qual consiste em usar a
coisa pública a favor de interesses pessoais ou de seus aliados", como diz
Carlos Augusto M. Vieira da Costa (Curitiba, PR); "algo que pode ser
extirpado por meio de punição ágil e exemplar", segundo Antônio José dos
Anjos Brito (Salvador, BA); "uma praga que pode acabar com o Brasil", de
acordo com Neneca Motta Mello (Serra Negra, SP); corrupção é algo "absurdo,
é uma ratazana malversadora", define Renato Santos Chaves (Teresina, PI);
conforme afirma Fernandes de Oliveira (São Paulo, SP), corrupção são
"escândalos e escândalos diários" (CARTAS. Veja, edição 1907).
Ainda nessa edição da revista, André Petry sustenta em sua coluna que
a corrupção é "roubalheira, desvio de dinheiro público e máfia, mas que não
é enquadrada pela lei, pois no Brasil pune-se apenas o roubo de xampu"
(PETRY. Veja, edição 1907). Além disso, a edição conta com cinco novas
reportagens sobre corrupção (CABRAL; FILHO; LIMA; PATURY, SILVA. Veja,
edição 1907), nas quais a prática é retratada como "lixo escondido sob o
tapete" (FIG. 10).
















A reportagem de Otávio Cabral narra uma suposta visita feita a Roberto
Jefferson pelos ministros Aldo Rebelo (do PCdoB – Partido Comunista do
Brasil) e José Dirceu. Eles teriam implorado que Jefferson e outros
parlamentares do PTB retirassem suas assinaturas do pedido de CPI.
No encontro, Roberto Jefferson teria dito que:
estava sendo abandonado pelo governo, que o governo sabia
de tudo que ele, Jefferson, vinha fazendo e que, agora,
ainda tinha de agüentar calado o discurso de José
genuíno, presidente do PT, segundo o qual o presidente
precisava se empenhar em 'requalificar' sua base de
apoio". (CABRAL. Veja, edição 1907)


Além disso, no encontro Jefferson teria repetido a afirmação feita por
ele a José Dirceu no mesmo dia, porém mais cedo: "Na cadeira em que eu
sentar na CPI, também vão sentar você, o Delúbio e o Silvinho" (CABRAL.
Veja, edição 1907). A Veja ressalta que os três governistas citados por
Jefferson, José Dirceu, Delúbio Soares e Silvio Pereira, participaram
diretamente da distribuição de cargos federais entre os aliados. A
reportagem termina com uma defesa da importância da instauração da CPI, por
ela ser a única instância a ter prerrogativas de propor mudanças
institucionais com base em suas investigações.
















Segundo a reportagem, tal encontro corresponderia a um dos vários
esforços feitos pelo governo para barrar a instauração da CPI: ameaça aos
aliados que assinassem a CPI, que deixariam de receber o dinheiro de
ementas ao orçamento e poderiam perder cargos no governo; anúncio de
aumento de gastos; liberação de emendas ao orçamento para viabilizar obras
de interesse dos deputados em seus redutos eleitorais; tentativa de
barganhar a retirada de assinaturas no pedido de CPI nos correios em troca
de desistir de outras CPIs que pudessem ser danosas a outros partidos.
Otávio Cabral nos conta, ainda, que no dia 24 de maio de 2005 Roberto
Jefferson e outros petebistas retiraram suas assinaturas do pedido de CPI,
mas que todo esforço do PT parece ter sido em vão, pois a CPI é instaurada
em 25 de maio de 2005. Em meio a isso tudo, Lula parece mostrar
despreocupação, pois, segundo a Veja, "Lula sabe melhor do que ninguém que
as denúncias de corrupção e o aproveitamento político delas pela oposição
fazem parte do jogo democrático normal" (CABRAL. Veja, edição 1907).
















Na Veja de 04 de junho de 2005, continuam as denúncias de corrupção.
Dessa vez tratam-se de petistas que aceitam propinas para permitir que
madeireiras devastem parte da Amazônia (MIZUTA; RIZEK. Veja, edição 1908).
Nessa revista, encontram-se cinco reportagens sobre corrupção (CABRAL;
JUNIOR; MIZUTA; NUCCI; RIZEK. Veja, edição 1908) e onze novas Cartas de
Leitores indignados com as denúncias e parabenizando a revista. Daniel
Oliveira (Goiana, GO), remetendo à coluna de Petry se manifesta com uma
frase potente, que faz pensar: "Na pizzaria Brasil, o ladrão de galinhas é
o único meliante punido com os rigores da lei" (CARTAS. Veja, edição 1908).
Em meio a manifestações de revolta com a corrupção e o PT, Luis M. Santos
(Niterói, RJ) fornece mais uma definição para corrupção, "o ato de pôr e
dispor de bens públicos"; por sua vez, Benedito Pessioni (São Paulo, SP)
fornece sinônimos para a prática, "maracutais e conchavos" (CARTAS. Veja,
edição 1908), enquanto Mario Carlos Rogério Vercesi (Aparecida de Goiânia,
GO) diz:
no Brasil, governos, no curso da história, se movimentam
muito mais para acobertar suas alianças, apesar de
gratuitamente desonestas, do que para proporcionar aos
cidadãos que lhes pagam os serviços e bens que deveriam
respeitar (CARTAS. Veja, edição 1908).


A edição se abre com a afirmação, na Carta ao Leitor, de que pela
primeira vez na história brasileira a crise política não afetou a economia.
Na reportagem de Otávio Cabral da edição, o tema é novamente o esforço
feito pelo governo para tentar barrar a CPI (FIG. 13).
















A reportagem apresenta ainda posição de Lula quanto ao escândalo dos
Correios:
quando apareceu o vídeo da corrupção nos correios o
presidente Lula ficou indignado. Achou chocantes as
imagens do servidor público recebendo propina de R$ 3000.
[...] O presidente avalia que parte da balbúrdia política
no congresso resulta da ação do próprio PT, sempre
atropelado por conflitos internos (CABRAL. Veja, edição
1908).


Por fim, Otávio apresenta uma pesquisa do instituto Sensus, em que a
corrupção aparece como o principal motivo para que os entrevistados não
tivessem orgulho do Brasil - ganhando inclusive da violência e da pobreza
(CABRAL. Veja, edição 1908).


2.3 'Escândalo do Mensalão'
Em 06 de junho de 2005, dois dias depois da edição da Veja analisada
acima ir às bancas, o jornal Folha de São Paulo publicou a entrevista em
que Roberto Jefferson revela o esquema do 'Mensalão':
Folha - E o que o sr. sabe?
Jefferson - um pouco antes de o [José Carlos] Martinez
[então presidente do PTB] morrer, ele me procurou e
disse: "Roberto, o Delúbio [Soares, tesoureiro do PT]
está fazendo um esquema de mesada, um 'mensalão', para os
parlamentares da base. O PP, o PL, e quer que o PTB
também receba. R$ 30 mil para cada deputado. O que você
me diz disso?". Eu digo: "Sou contra." [...] No princípio
de 2004, liguei para o ministro Walfrido [Mares Guia,
Turismo, PTB] e disse que precisava relatar algo grave.
[...] Aí fui ao ministro Miro Teixeira, nas Comunicações.
Levei comigo os deputados João Lyra (PTB-AL) e José
Múcio. Falei: "Conte ao presidente Lula que está havendo
o 'mensalão'". [...] Fui informando a todos do governo a
respeito do "mensalão". Me recordo inclusive de que,
quando o Miro Teixeira, depois de ser ministro, deixou a
liderança do governo na Câmara, ele me chamou e falou:
"Roberto, eu vou denunciar o 'mensalão'. Você me dá
estofo?". Eu falei: "Não posso fazer isso. Vamos abortar
esse negócio sem jogar o governo no meio da rua. Vamos
falar com o presidente Lula que está havendo isso". Me
recordo até que o Miro deu uma entrevista ao "Jornal do
Brasil" denunciando o "mensalão" e depois voltou atrás.
No princípio deste ano, em duas conversas com o
presidente Lula [...] eu disse ao presidente:
"Presidente, o Delúbio vai botar uma dinamite na sua
cadeira. Ele continua dando 'mensalão' aos deputados".
"Que 'mensalão'?, perguntou o presidente. Aí eu expliquei
ao presidente. [...] O presidente Lula chorou. Falou:
"Não é possível isso". E chorou. Eu falei: É possível
sim, presidente. Estava presente ainda o Gilberto
Carvalho [chefe-de-gabinete do presidente]. Toda a
pressão que recebi neste governo, como presidente do PTB,
por dinheiro, foi em função desse 'mensalão', que
contaminou a base parlamentar. Tudo o que você está vendo
aí nessa queda-de-braço é que o 'mensalão' tem que passar
para R$ 50 mil, R$ 60 mil. Essa paralisia resulta da
maldição que é o 'mensalão' [...]
Folha - O que, em sua opinião, levou a essa situação?
Jefferson - É mais barato pagar o exército mercenário do
que dividir o poder. É mais fácil alugar um deputado do
que discutir um projeto de governo. É por isso. Quem é
pago não pensa (LO PRETE. Folha de São Paulo, 06 jun.
2005).


Na edição seguinte da Veja, que saiu nas bancas dia 11 de junho de
2005, mais uma capa sobre corrupção. Como num jogo de Dominó, Jefferson
(protagonista do escândalo dos Correios) derruba Delúbio Soares, o rosto do
'Escândalo do Mensalão'(FIG. 14). Aqui, mais uma Carta ao Leitor sobre
corrupção. Dessa vez, celebra-se a instauração da CPI dos Correios e o fato
da reportagem de Policarpo Junior, publicada na Veja em 14 de maio, ter
sido fundamental nisso. Ainda na carta, a revista reitera que a missão do
jornalismo é exatamente vigiar o poder (CARTA. Veja, edição 1909).
















Também nessa edição, inúmeras Cartas dos Leitores indignadas com a
corrupção e com a devastação da Amazônia. Há também vários elogios à
postura e à atitude da revista, somando um total de seis cartas (CARTAS.
Veja, edição 1909). Além disso, na sessão Veja Essa, algumas frases
interessantes: "Quando a sociedade acredita que a corrupção é generalizada,
não adianta tentar convencer as pessoas de que elas estão erradas", afirma
João Geraldo Piquet Carneiro (advogado no Jornal do Brasil). "O governo
paga um preço pelas más companhias que tivemos de ter em razão de que o
presidente Lula não foi eleito com maioria no Congresso", diz Olívio Dutra
do PT, então ministro da cidade, "atribuindo os escândalos de corrupção aos
aliados do governo" (VEJA essa. Veja, edição 1909).
Explicação análoga à de Olívio Dutra fornece Fernando Gabeira, ex
Petista, atual deputado do PV (Partido Verde). Em entrevista realizada por
Thaís Oyama e publicada nessa edição da Veja, Gabeira afirma: "Eles tiveram
que entrar no jogo e tiveram de comprar sua base, já que não podia buscá-la
no PMDB nem no PSDB" (OYAMA. Veja, edição 1909). Então a entrevistadora
pergunta:
em que medida essa saída fisiológica não seria também
responsabilidade do sistema político brasileiro, em que o
Executivo não tem maioria garantida no Congresso e
precisa ficar o tempo todo tentando seduzi-lo para
conseguir governar? (OYAMA, Veja, edição 1909).


E Fernando Gabeira responde:
acho que a culpa dessa estrutura é parcial. Porque se
você considerar o centro-esquerda brasileira, como o PT e
o PSDB, existe uma base numérica para você dirigir o
país. O problema é que, como os dois não vão jamais se
entender, estão ambos condenados ao fisiologismo (OYAMA.
Veja, edição 1909).


Nessa mesma edição da Veja, a coluna de Tales Alvarenga apresenta
outra afirmação boa para pensar:
do ponto de vista político [...] parecer honesto é
suficiente. [...] Entre os políticos a ética é um
instrumento maleável. Tomar dinheiro de empresários e
banqueiros antes da eleição é um ato tido como moralmente
aceitável, embora seja de fato um primeiro passo para a
corrupção (OYAMA. Veja, edição 1909).


Além disso, Tales Alvarenga afirma em sua coluna que a denúncia de
'Mensalão' feita em 2004 foi abafada pelo Congresso, "mas, a esta altura, é
melhor apurar do que abafar mais uma vez. O Brasil se cansou de tanto
abafa" (ALVARENGA. Veja, edição 1909).
Ainda na Veja de 11 de junho de 2005, quatro novas reportagens abordam
a temática da corrupção (CABRAL; SILVA; NUCCI; COUTINHO. Veja, edição
1909). A primeira delas, assinada mais uma vez por Otávio Cabral, resume a
denúncia de 'Mensalão' feita por Roberto Jefferson no dia 06 de junho.
Mensalmente Delúbio Soares entregaria 30 mil reais a líderes ou presidentes
de partidos da base aliada, como o PP e o PL, para que eles distribuíssem o
dinheiro nas próprias bancadas, em troca de apoio nas votações de interesse
do governo.
Segundo a reportagem, um deputado Petista teria afirmado que "o PT
acredita que o Congresso é um poder burguês. Por isso acha que lá só tem
corrupto e que o jeito mais fácil de controlá-lo é com dinheiro" (CABRAL.
Veja, edição 1909). Além disso, Lula teria criticado o ministro José Dirceu
"responsabilizando-o pela construção de uma base política tão
irremediavelmente fisiológica" (CABRAL. Veja, edição 1909). O PT teria
reagido às denúncias afirmando em nota que "a relação do partido com as
legendas aliadas se assenta em pressupostos políticos e pragmáticos"
(CABRAL. Veja, edição 1909). Na introdução a essa reportagem, afirma-se que
a divisão de cargos promovida pelo governo do PT seria a origem da crise
política criada pelos escândalos dos Correios e do 'Mensalão'.
















A edição seguinte da revista saiu em 18 de junho de 2005, após o
depoimento de Jefferson ao Conselho de ética, concedida 14 de junho, e
depois de José Dirceu ter pedido demissão do cargo de presidente da Casa
Civil, dia 16 de junho. Nessa edição, mais uma capa sobre a crise no
governo Lula causada pelas denúncias de corrupção, que a essa altura já se
tornaram grandes escândalos. Mais uma Carta ao leitor reiterando o
compromisso da veja com a informação visando servir ao interesse público e
mais quatro reportagens sobre corrupção (CARTA. Veja, edição 1910). Na
sessão de Cartas dos Leitores, são publicadas onze cartas sobre as
reportagens noticiadas pela revista Veja acerca dos últimos escândalos de
corrupção, duas parabenizando a postura da revista e cinco comentando a
entrevista de Gabeira – num total de dezoito cartas relacionadas à
corrupção (CARTAS. Veja, edição 1910).
Na primeira das três reportagens sobre o 'Mensalão' que Veja traz
nessa edição, nosso já conhecido Otávio Cabral, relata o pedido de demissão
de José Dirceu. Trata-se, segundo o autor, de um nocaute – título da
reportagem e imagem simbolizada na ilustração (FIG. 16).
















Ainda nessa reportagem, Otávio Cabral informa os leitores da Veja
sobre o depoimento feito por Roberto Jefferson no processo de cassação de
seu mandato, cinqüenta horas antes do pedido de demissão de José Dirceu.
Nessa ocasião, Jefferson teria dito: "Zé Dirceu, se você não sair daí
rápido, você vai fazer réu um homem inocente, que é o presidente Lula.
[...] Rápido, sai daí rápido, Zé!" (CABRAL. Veja, edição 1910).
Além disso, o deputado do PDT teria feito questão de inocentar o
presidente Lula e de acusar José Dirceu, José Genoíno, Silvio Pereira e
Delúbio Soares. No depoimento, Jefferson teria apontado Marcos Valério
Fernandes de Souza como o operador do Mensalão.
Nas demais reportagens dessa edição da Veja, volta a falar de
Jefferson, mas a atenção se foca sobre Marcos Valério (EDWARD; OYAMA; Veja,
edição 1911). A revista apresenta esse personagem e como ele atua.
Caracterizado pelos repórteres José Edward e Felipe Patury enquanto "o
lobista mineiro" (EDWARD. Veja, edição 1910), somos informados de que o
empresário mineiro Marcos Valério era o encarregado do PT de distribuir o
'Mensalão' a deputados através de malas de dinheiro.
















Em 25 de junho de 2005 saiu nas bancas a última edição da Veja desse
fatídico mês de junho de 2005. Nessa edição, mais uma capa sobre a crise no
governo Lula causada pelas denúncias de corrupção, as quais a essa altura
já se tornaram grandes escândalos. Mais uma Carta ao leitor reiterando o
compromisso da veja coma informação visando servir ao interesse público e
mais sete reportagens sobre corrupção (CARTA. Veja, edição 1911).
















Na sessão de Cartas dos Leitores, são publicadas dezesseis cartas
sobre as denúncias de corrupção e uma carta de Zé Geraldo, deputado federal
do PT no Pará, na qual ele confirma "o recebimento de contribuições"
(CARTAS. Veja, edição 1911).
















Entre as seis reportagens sobre corrupção presentes nessa edição
(CABRAL; GRYZINSKI; PATURY; PETRY; PORTELA; SABINO. Veja, edição 1911),
Otávio Cabrasl sugere em sua reportagem que o 'Mensalão' foi causado por
uma ocupação predatória do governo por petistas e por aliados, os quais
confundiram o partido com o Estado (CABRAL. Veja, edição 1911). Além disso,
na reportagem de André Petry retoma-se o vídeo flagrando a corrupção nos
Correios, o qual é descrito como a Pedra de Roseta da corrupção: assim como
o pedaço de granito encontrado por Napoleão teve conseqüência muito maior
que aquela imaginada no momento da descoberta, pois permitiu decifrar os
hieróglifos egípcios, o vídeo denunciado pela Veja teve importância muito
maior que aquela intuída inicialmente, pois, segundo a revista, permitiu
descobrir o Mensalão (PETRY, Veja, edição 1911).
A partir de então, repetia-se incessantemente a importância da mídia
enquanto defensora do interesse público; indagações constantes eram feitas
sobre o fato de Lula ter ou não conhecimento do Mensalão; manifestações
enfáticas de indignação com a corrupção eram pronunciadas; o interesse foi
tamanho que passou-se a acompanhar os depoimentos dados pelos acusados.
Procurei aqui reconstituir a vida das denúncias que vieram a se tornar
o 'Escândalo do Mensalão'. O passo seguinte que tento dar é analisar esse
percurso com a ajuda de uma literatura acerca das temáticas do escândalo,
da corrupção e do sistema político brasileiro.
SEGUNDO CAPÍTULO
3 Pensando o 'Escândalo do Mensalão'

3.1 Escândalo?
Diversos estudos têm demonstrado que um caminho interessante a ser
percorrido para tentar estudar a corrupção, sem lançar mão de variáveis
transcendentes, pode ser encontrado na vertente de análise que busca
compreender a relação entre corrupção e escândalo. Ao focar nos escândalos
políticos e abordar os fatores que condicionam seu surgimento, torna-se
possível analisar a percepção que as pessoas têm da corrupção e o modo como
reagem a ela, assim como quais são as práticas percebidas como corruptas e
corruptoras, o modo em que se instituem e as pessoas envolvidas.
Efetivamente, de acordo com Lawrence Sherman (1990) o escândalo
envolve a revelação de fatos considerados denunciáveis, sua publicação,
divulgação e dramatização (por meio de discussões, ameaças, defesas e
investigações), chegando, por fim, a sua execução (julgamento) e rotulação.
Analogamente, John Thompson (2000) define o escândalo como ações e eventos
que envolvem tipos específicos de transgressões, as quais são
suficientemente sérias a ponto de exigir uma resposta pública quando as
pessoas tomam conhecimento delas. A esse respeito vale ressaltar que esse
último autor enfatiza a importância crucial da comunicação midiática na
divulgação dos escândalos políticos, uma vez que ela transcende o tempo e o
espaço dos fatos denunciados, tendo extensão própria. Assim, ela coloca
seriamente em risco a reputação das pessoas envolvidas no escândalo, a qual
é concebida por Thompson (2000) como um poder simbólico, isto é, como um
recurso extremamente precioso, que as pessoas buscam acumular, cultivar e
proteger. A preservação da própria reputação é uma questão que tange
sobretudo os políticos, que, por ocupar posições públicas importantes,
gozam de elevado prestígio e visibilidade, sendo, pois, elevada também a
cobrança de comportamentos formais e pessoais adequados. Assim, a
descoberta de transgressões por parte de homens públicos – envolvendo
questões sexuais, financeiras e de mau uso ou abuso do poder – é o que
caracteriza o escândalo propriamente político, o qual torna-se uma arma nas
disputas que caracterizam o campo político[2].


3.2 Corrupção?
Como foi apontado anteriormente, desde a edição 1906 até a edição 1914
de Veja, as capas, cartas e reportagens das edições freqüentemente trazem
comentários enfatizando o importante papel desempenhado pela mídia - e por
Veja - ao "servir à opinião pública" denunciando casos de corrupção. Além
disso, o material divulgado pela revista e analisado no capítulo anterior
apresenta inúmeras manifestações de indignação com a corrupção, a partir
das quais é possível identificar algumas definições para essa prática.
Segundo definições presentes nas páginas da revista Veja, corrupção é:
'praga, câncer, imoralidade pública';
'propina, compra e venda de votos, compra e venda de
licitações';
'comprometimento com padrinhos políticos e não com o interesse
público';
Nas palavras dos leitores, as definições giram em torno de:
algo que 'pode ser extirpado por meio de punição ágil e
exemplar';
'é um problema causado pela falta de controle interno da
legalidade dos atos da administração pública, problema esse que
consiste em usar a coisa pública a favor de interesses pessoais
ou de seus aliados';
'escândalos e escândalos diários';
Essas definições de corrupção estão de acordo com os três tipos
básicos de definição para a corrupção, identificados por Arnold
Heidenheimer (1970): a definição legalista, segundo a qual haveria
corrupção quando um funcionário público se desvia dos deveres formais do
seu cargo buscando recompensas para si e/ou para outros; a definição
economicista, que considera como corrupção qualquer utilização do próprio
cargo público para maximizar a própria renda pessoal; e a definição
centrada no bem público, que denomina de corrupção a violação do bem
público para obter ganhos particulares.
Yves Méni (1996), por exemplo, ao pensar a temática da corrupção,
identifica um conceito jurídico e um conceito sociológico dessa prática. O
primeiro aborda a corrupção enquanto um delito, tal como é prescrito nas
leis penais, enquanto o segundo trata a corrupção como um desvio dos
imperativos éticos estruturados na sociedade. Ambos os conceitos, portanto,
correspondem a abordagens segundo as quais a corrupção seria contrária ao
funcionamento natural do sistema político e introduzida por alguma causa
externa, a saber, desvio jurídico ou sociológico. Em direção análoga seguem
as argumentações de Samul Huntington (1975) e de Rese-Ackerman (1999), para
quem a corrupção seria acarretada, respectivamente, pela ausência de
institucionalização política suficiente e pela falta de moderação
burocrática (isto é, pela presença excessiva ou escassa demais de
burocracia estatal).
Seguindo esse mesmo tipo de perspectiva, Fernando Filgueiras (2006)
defende a tese de que, no que tange especificamente ao Brasil, a corrupção
seria decorrente do desenho institucional brasileiro e de sua cultura
política, que seriam insuficientes para garantir o adequado funcionamento
da democracia. Haveria, segundo ele, uma baixa accontability[3] e uma
decorrente falta de sanções contra a corrupção; haveria um personalismo
exacerbado que favoreceria o clientelismo e a patronagem; haveria um
isolamento entre o processo de tomada de decisões e as pressões sociais;
haveria um distanciamento entre o sistema partidário eleitoral e o sistema
partidário parlamentar; uma falta de fidelidade partidária e de maiorias
estáveis; por fim, haveria um baixo índice de participação cívica e baixos
laços de sociabilidade. Em suma, haveria uma série de incongruências entre
o contexto brasileiro e os modelo ideais de democracia, as quais seriam,
segundo o autor, a causa do elevado índice de corrupção no Brasil.
A partir do que foi exposto acima é possível perceber que a maior
parte dos estudos trata a corrupção como exógena, embora ela seja retomada
periodicamente para explicar aquelas que são chamadas de anomalias do
sistema. Tal procedimento é altamente assimétrico, pois estabelece de
antemão o que corresponderia ao funcionamento normal e exclui a priori da
análise toda uma série de fatores. Assim, no sistema político, o conceito
de corrupção é utilizado para dar conta de uma prática que é recorrente,
mas é sempre explicada como desvio, falta ou excesso, irracionalidade,
ignorância ou ingenuidade.
Ao proceder dessa maneira, porém, esse tipo de abordagem deixa em
aberto inúmeras questões, principalmente no que diz respeito à freqüência
dos escândalos de corrupção no Brasil: se todos sabem que existe corrupção
no Brasil e ela é vista unanimemente como um problema a ser combatido,
porque sua existência persiste? Por que a corrupção é escandalosa, a
existência de corrupção no Brasil não é do conhecimento de todos? Corrupção
no Brasil é proibida ou permitida? Se é proibida e escandalosa por que
persiste em existir? Se existe, por que é proibida e escandalosa?
Além dos três tipos básicos de definições para corrupção, apontados
anteriormente, Marcos Fernandes Gonçalves da Silva (1995) identifica um
quarto tipo, a saber, a definição do senso comum. O autor nota que, no
Brasil, a maior parte da população percebe a prática da corrupção como um
fenômeno associado aos políticos, às elites econômicas e aos servidores
públicos que usam o poder que possuem para extorquir renda. Um exemplo
disso é uma das definições fornecidas pela revista Veja, segundo a qual
corrupção é o ato praticado por "políticos desonestos que querem cargos
apenas para fazer negócios escusos – cobrar comissões, beneficiar amigos,
enriquecer ilicitamente" (JUNIOR. Veja, edição 1905).
Analogamente, Marcos Aurélio Caminha (2003) – baseando-se na
argumentação desenvolvida por João Maurício Adeodato (1992) – sustenta que
a corrupção corresponderia a uma forma de legitimação não jurídica do
poder, isto é, uma forma de impor decisões sem o uso da força. Nesse
sentido, a corrupção no Brasil parece estar relacionada com o fato de aqui
conviverem duas éticas paradoxais, tal como evidencia Regina Mendes (2008):
uma ética é explícita e se expressa no discurso liberal e democrático da
isonomia constitucional (segundo a qual todos são iguais perante a lei); a
outra ética é implícita e se expressa no fato de os privilégios estarem
positivados no ordenamento jurídico. Como evidencia a autora, tal situação
seria legitimada e mantida pelo princípio de Ruy Barbosa, segundo o qual,
no Brasil, para promover a igualdade seria necessário tratar desigualmente
os desiguais na medida em que se desigualam. Esse princípio (chamado pela
autora de 'jusnaturalismo às avessas'), baseia-se na suposição de que a
desigualdade jurídica seria decorrente da natural e irredutível
desigualdade social, e parece fundamentar também determinadas
sensibilidades jurídicas entre a população brasileira.
De fato, como demonstram os estudos realizados por ela e por Roberto
Kant de Lima (2008), o sistema judicial criminal brasileiro não é aplicado
da mesma forma a todos os cidadãos. De acordo com eles seria possível
dividir a cidadania brasileira em três classes, à maneira de José Murilo de
Carvalho (2001): a primeira classe é constituída pelos sujeitos de status
mais elevado, os quais estão acima da lei e se beneficiam dela para
defender seus interesses por poder, dinheiro e prestígio; a segunda classe
é composta pela classe média, a qual está sujeita aos benefícios e rigores
da aplicação incerta do código civil e do código penal; por fim, a terceira
classe é formada pelos indivíduos de status mais baixo, os quais estão
desprotegidos pela sociedade e pela lei, estando sujeitos apenas ao código
penal.
Esse fato parece estar profundamente enraizado na opinião pública
brasileira, como evidenciam algumas frases das edições analisadas da
revista Veja. Com efeito, foi visto acima que André Petry, afirma em sua
coluna publicada na Veja de 28 de maio de 2005, que a corrupção brasileira
não é enquadrada pela lei, apesar de ser "roubalheira, desvio de dinheiro
público e máfia", pois no Brasil pune-se apenas o roubo de xampu (PETRY.
Veja, edição 1907). Outro exemplo era a carta do leitor Daniel Oliveira
(Goiana, GO) que na edição 04 de junho de 2005 sustenta, remetendo-se ao
texto de Petry, que "na pizzaria Brasil, o ladrão de galinhas é o único
meliante punido com os rigores da lei". (CARTAS. Veja, edição 1908).
Seguindo a argumentação apresentada acima, essas e outras práticas
jurídicas e sociais profundamente discriminatórias parecem ser justificadas
por uma representação elitista e evolucionista da cultura e da sociedade.
Com efeito, a convivência de um sistema explicitamente igualitário e
implicitamente hierárquico requer práticas e valores desiguais que
compensem o desequilíbrio decorrente da ambigüidade entre essas duas éticas
contraditórias, permitindo sua atualização, manutenção e reprodução. Nesse
sentido, a corrupção seria um reflexo e um reforço da configuração
hierárquica da sociedade brasileira.


3.3 Política brasileira?
As edições da revista Veja citadas acima permitem identificar não
somente possíveis definições para a corrupção, mas também algumas
explicações sobre essa prática. Como foi visto no capítulo anterior, Olívio
Dutra e Fernando Gabeira sugerem que o governo teria tido que estabelecer
parcerias por meio do 'Mensalão' devido ao fato de não ter sido eleito com
maioria no Congresso (OYAMA; VEJA essa. Veja, edição 1909). Além disso,
Gabeira concorda com a entrevistadora da Veja Thais Oyahama, que afirma que
o 'Mensalão' corresponderia uma saída fisiológica decorrente da
configuração do sistema político brasileiro, uma vez que o Executivo não
tem maioria garantida no Congresso. No entanto, Gabeira sustenta que essa
responsabilidade do sistema seria parcial, pois se o centro-esquerda
brasileiro se unisse haveria maioria para governar, no entanto os partidos
que o conformam, como o PT não se unem e assim ficam condenados ao
fisiologismo (OYAMA. Veja, edição 1909).
Outra frase que ajudou a pensar a corrupção no primeiro capítulo foi a
afirmação de Tales Alvarenga, segundo o qual é suficiente que os políticos
pareçam honestos, uma vez que a ética é um instrumento maleável entre eles.
Aceitar empréstimos de empresários e banqueiros, por exemplo, é tido por
eles como um ato moralmente aceitável embora seja, de acordo com Alvarenga,
o primeiro passo para a corrupção. Além disso, ele afirma que a denúncia de
'Mensalão' devia ser apuradoa, ao contrário da denúncia de 'Mensalão' feita
em 2004, que teria sido abafada pelo Congresso (ALVARENGA. Veja, edição
1909).
Essa explicação nativa da corrupção, apresentada por Olívio Dutra, por
Fernando Gabeira e por Tales Alvarenga, também está presente no ensaio de
Roberto Pompeu de Toledo, publicado na edição de 21 de maio de 2005. Nesse
texto, o autor fala do sistema político brasileiro como:
ritual, em vigor pelo menos desde a retomada dos governos
civis em 1985, de retalhar a administração em pedaços que
são oferecidos aos agrupamentos mais suspeitos, em troca
de apoio no Congresso. [...] 'Presidencialismo de
Coalizão' é como primeiro Sergio Abranches, e depois toda
uma corrente da ciência social brasileira, chama o
sistema em vigor no país, em que nunca um partido tem
maioria sozinho no Congresso e precisa de aliados.
'Presidencialismo de safadeza' seria um bom apelido para
os safados. 'Governabilidade' virou eufemismo para
tolerância com a corrupção. (TOLEDO, edição 1906)


De fato, Sérgio Abranches (1988) e Antonio O. Cintra (2004) denominam
o sistema político brasileiro de 'presidencialismo de coalizão', uma vez
que ele seria particularmente marcado por constantes disputas, negociações
e conflitos. Em seus trabalhos, que podem ser lidos como uma interpretação
nativa da política brasileira (assim como as frases reportadas acima), os
autores evidenciam os valores e significados dados pelos próprios políticos
acerca do sistema político e mostram como ele é percebido por seus agentes,
abrindo assim uma janela para entender como esses atores interpretam suas
práticas. Esses autores argumentam que haveria, no Brasil, a combinação de
um "presidencialismo imperial" com um regime multipartidarista e
bicameralista, no qual a representação é proporcional. Dessa forma, para
aprovar um projeto, o presidente (embora dotado de amplos poderes) deve
fazer frente aos interesses de fortes oligarquias regionais e, sem dispor
de agremiação majoritária suficiente, deve superar duas instâncias
legislativas. Tal diversidade de centros de poder criaria, segundo eles, a
necessidade de constituir grandes coalizões (nas fases pré-eleitoral,
eleitoral e durante o governo), tanto no eixo partidário, quanto naquele
regional-estadual. Em ambos os casos, a autoridade presidencial seria
contrastada por facções internas ao partido, lideranças de outros partidos
e lideranças regionais, tornando instável todo o sistema de governo. Assim,
este estaria constantemente em risco, sendo o presidente refém dos
interesses (ideológicos, programáticos ou pessoais) de seus parceiros, já
que seu desempenho político dependeria sempre de sua eficiência em
respeitar os compromissos partidários e regionais (que, inclusive, não
foram necessariamente fixados ou explicitados na fase de formação da
coalizão).
Os autores afirmam que apesar dessa desestabilidade potencial, a
estabilidade e governabilidade do sistema seriam garantidas, por um lado,
pelos amplos poderes e pelos recursos político-financeiros de que dispõe o
executivo e, por outro, pela concentração do poder (dentro do Legislativo)
na Mesa Diretora e nas lideranças partidárias. Com efeito, ao mesmo tempo
em que o Executivo necessita do Legislativo para aprovar sua pauta, o
Legislativo depende do Executivo, responsável pela liberação dos recursos
políticos e financeiros de importância estratégica para os parlamentares,
que por meio deles podem levar obras e serviços às suas bases eleitorais,
garantindo sua aprovação junto às mesmas. Tal competência estratégica é
utilizada pelo Executivo como prêmio para os parlamentares fiéis,
configurando, pois, uma estrutura de punições e recompensas, que rege o
sistema político brasileiro. Ao votar disciplinadamente, Executivo e
Legislativo colaboram um com o outro, reciprocamente, permitindo a obtenção
de consenso e, ao mesmo tempo, os parlamentares se credenciariam para levar
benefícios ao seu eleitorado e assegurar a própria reeleição.

A lógica adotada para formar essas coalizões é a distribuição de
cargos ministeriais proporcionalmente ao tamanho das bancadas (e, portanto,
proporcionalmente ao tamanho do potencial apoio). De fato, como comprovam
os estudos desenvolvidos por José Eisenberg (1998) e Otávio Amorim Neto
(1998), os governos que conseguiram maior estabilidade foram aqueles que
formaram coalizões com os partidos de maior representatividade numérica no
legislativo. Todavia, uma vez que os recursos existentes são limitados e
insuficientes para contentar os diversos interesses regionais, é inevitável
o surgimento de disputas em torno do controle de bens públicos.
Vera Chaia et alii (2001) exploram bem esse ponto ao estudar dois
casos exemplares de escândalos ocorridos em 2001, durante a última gestão
do Governo de Fernando Henrique Cardoso – a saber, o escândalo da Violação
do Painel do Senado, envolvendo o presidente do Senado Antônio Carlos
Magalhães, e o escândalo Sudam (Superintendência do Desenvolvimento da
Amazônia), Banpará (Banco do Estado do Pará) e TDAs (Títulos da Dívida
Agrária), envolvendo o senador Jader Barbalho. Nesse trabalho, os autores
sustentam que as denúncias de corrupção estariam relacionadas aos conflitos
por interesses específicos entre os políticos que formam a base de
sustentação do governo. De fato, nos casos analisados, os conflitos
internos por prestígio entre Antônio Carlos Magalhães (ACM) e Jader
Barbalho tinham o potencial de culminar em escândalos políticos, isto é, em
comportamentos e denúncias de comportamentos que não condizem com as
atitudes que se esperam de homens públicos.

Nesses conflitos, os políticos usam alguns fatos circunscritos aos
bastidores da arena pública – que não são considerados transgressivos pelos
políticos enquanto mantidos nos bastidores, mas que têm potencial de
transformar-se num escândalo político se chegarem a público – como arma
capaz de ameaçar a reputação dos políticos com quem se está em situação de
disputa. Com efeito, fatos como a trocas de insultos e agressões verbais,
ou a prática da corrupção, adquirem significados profundamente diferentes
na construção da imagem do político se são mantidos nos bastidores da
política ou se são expostos na arena pública. Quando são circunscritos aos
bastidores, são argumentos utilizados para mobilizar apoios a favor de
princípios concorrentes, mas se tornam escândalos quando são expostos na
arena pública.
Os autores demonstram que foi exatamente isso que acabou ocorrendo nas
disputas políticas entre ACM e Jader Barbalho, que culminaram em escândalos
de corrupção. Ambos tentaram se fortalecer colocando um em risco a
reputação do outro e denunciando seus comportamentos comprometedores.
Entretanto, ambos acabaram prejudicando a própria imagem quando as
denúncias foram a público: protagonizaram conflitos por interesses pessoais
e paralisaram as atividades do Legislativo em função disso. Assim, os
autores concluem que, se por um lado é possível formar sólidas maiorias
parlamentares aglutinando em torno do governo federal forças políticas
heterogêneas por meio de troca de postos na máquina pública, por outro o
sistema político como um todo se torna refém dessa estratégia. Não apenas
os conflitos de interesse oriundos dela podem paralisar e minar a reputação
do governo, mas também ela contribui para que as fronteiras entre os
interesses públicos e privados não fiquem bem definidas.
Nesse sentido parece-me particularmente significativa a interpretação
reportada pela revista Veja em 11 de junho de 2005, segundo a qual a
divisão de cargos promovida pelo governo do PT seria a origem da crise
política criada pelos escândalos dos Correios e do 'Mensalão'. A revista
ancora essa interpretação no fato de que Lula teria reagido às denúncias
responsabilizando José Dirceu pela "construção de uma base política tão
irremediavelmente fisiológica" (CABRAL. Veja, edição 1909). Esse
fisiologismo político é uma expressão recorrente nas reportagens da revista
Veja, sendo utilizada de maneira corriqueira pela revista, dando a entender
que o sentido dela fosse amplamente compartilhado pelos leitores.
Efetivamente, fisiologismo aqui parece indicar um funcionamento natural,
mas negativo, da política brasileira, que parece estar relacionado com a
presença de conflitos políticos que são resolvidos por meio do
estabelecimento de vínculos.
Ainda segundo a revista, o PT teria respondido às denúncias afirmando,
em nota, que "a relação do partido com as legendas aliadas se assenta em
pressupostos políticos e pragmáticos" (CABRAL. Veja, edição 1909). Faço
notar que esse tipo de argumentação é recorrente em casos de denúncias de
corrupção. Talvez essa reação não seja uma negação absoluta das denúncias,
mas uma reformulação, nos termos nativos, de práticas que apenas em alguns
momentos e contextos são definidas como corruptas.
TERCEIRO CAPÍTULO
4 Pensando a corrupção no Brasil

4.1 Vínculos políticos?
Marcos Otávio Bezerra (1994, 2001) introduz uma perspectiva
interessante para pensar os escândalos de corrupção, ao estudar as relações
e os princípios sociais que estruturam as ações designadas de corruptas e
corruptoras. Tomando como exemplo as etapas de elaboração e execução da Lei
Orçamentária da União, Bezerra (2001) evidencia como a troca de benefícios
públicos por apoio político e votos, que se estabelece no plano local,[4]
corresponde a um momento de uma relação que envolve também o plano nacional
e institui obrigações morais que se estendem no tempo. Segundo ele, as
esferas políticas locais e nacionais não são autônomas, mas objetivam um
sistema complexo de relações de dependências mútuas e assimétricas em torno
das quais se articulam os interesses, as práticas e as concepções políticas
no Brasil.
Para obter votos (e se re-elegerem ou elegerem os candidatos que
apóiam), os deputados, senadores e autoridades governamentais devem obter
recursos para as localidades a que estão politicamente vinculados (ou seja,
as próprias bases eleitorais). Todavia, para ter acesso a esses recursos
eles dependem da burocracia do aparato estatal, que pode ou não lhes dar
acesso a esses recursos. Assim, eles mobilizam os vínculos que têm com os
políticos no plano federal para facilitar a liberação de recursos e
garantir a manutenção do apoio que recebem nas localidades a que estão
politicamente vinculados. Ainda segundo o autor, o estabelecimento desses
vínculos não está ligado, necessariamente, ao próprio pertencimento
partidário, mas a concessão de apoio pode ser sim condicionada ao
estabelecimento de um vínculo partidário entre o político que apóia e o que
é apoiado – podendo essa ser uma das razões para migrações de partidos.
Bezerra (2001) aponta, portanto, para a existência de várias formas de
disputas – além daquelas apontadas por Chaia et alii (2001) – as quais são
voltadas, em última instância, para a obtenção de recursos para as próprias
bases eleitoras: aquelas envolvidas com a destinação de recursos para
estados e regiões, aquelas envolvidas na aprovação de emendas individuais
dos parlamentares e aquelas relativas à alocação de recursos nos
ministérios. Todos esses conflitos estão fundamentados em uma disputa por
prestígio junto à opinião pública, que identifica a realização de obras
como um feito de determinado político em particular. Assim, os
parlamentares tentam facilitar seu acesso aos recursos públicos, enquanto o
Executivo tenta vincular-se com os parlamentares para facilitar sua
obtenção de recursos, buscando ambos aumentar seus prestígio junto a suas
bases eleitorais. Percebe-se, pois, que há uma forte interdependência entre
políticos situados nas instâncias locais e nacionais. Efetivamente,
Da perspectiva eleitoral, o apoio político do prefeito e
vereadores é essencial para uma parcela significativa dos
parlamentares. Para estes, o poder do prefeito resulta,
entre outros aspectos, do controle sobre a administração
municipal e sua reputação no município. Apesar da
legislação assegurar ao parlamentar o direito de ser
eleito em todo o Estado, o que opera na prática, como tem
sido apontado por alguns autores, é uma forma de
distritalização do voto. Assim, ao viabilizar o
atendimento de um "pleito", o parlamentar, ao mesmo
tempo, investe na continuidade da relação e renova os
compromissos políticos existentes. [...] Se a obtenção de
recursos contribui para a consolidação dos laços,
promessas que não se concretizam ou a incapacidade dos
políticos para obter os recursos podem levar à sua
dissolução. Isto faz com que estes laços precisem ser
continuamente renovados (BEZERRA, 2001, p. 9).




Conforme argumenta Bezerra (2001), quanto maior o prestígio daquele de
quem se recebe o apoio, maior a chance de se ter acesso a recursos.
Destarte, os partidos que apóiam o governo têm virtualmente maior
possibilidade de obter recursos, agilizando e facilitando o trâmite
burocrático, por meio dos vínculos partidários, das relações de amizade,
dos compromissos políticos e do prestígio dos parlamentares.


4.2 Relações formais?
Em um estudo anterior, Marcos Otávio Bezerra (1994) desenvolve mais
explicitamente a importância dos vínculos para a política brasileira.
Seguindo uma abordagem similar àquela adotada por Chaia et alii (2001), o
autor busca estudar dois escândalos de corrupção, a saber, os casos Valença
e Coroa-Brastel, focando, porém, nas relações e nos princípios sociais que
estruturam as ações designadas de corruptas e corruptoras. A partir desse
trabalho, o autor sustenta que a corrupção corresponderia à extensão da
esfera privada à esfera pública e da esfera pública à esfera privada.
Efetivamente, a esfera pública e oficial brasileira seria marcada por
relações formais, decorrentes do cargo que se ocupa, mas também pelas
relações pessoais (tais como parentesco e amizade) que os indivíduos têm na
sociedade. Uma vez que essas últimas são difundidas e socialmente
institucionalizadas no cotidiano, elas não são questionadas ou combatidas
quando são estendidas à esfera pública e às relações oficiais. Analogamente
não são questionados os ganhos que se obtém por meio das relações pessoais,
os quais são institucionalizados na esfera privada e, conseqüentemente na
esfera pública, já que uma é estendida à outra.
O autor demonstra que a corrupção estaria fundamentada em preceitos
morais, modalidades de relações e mecanismos sociais característicos da
sociedade brasileira. Essa fundamentação pode ser expressa por aquilo que
Luis Roberto Cardoso de Oliveira (2005), define como moralidade, a saber,
aquilo que orienta as ações e práticas na vida cotidiana. Nesse sentido,
ela corresponderia ao conjunto culturalmente contextualizado e
intersubjetivamente compartilhado de valores, sentimentos e emoções, o qual
dá sentido e significado social ao ato, transformando-o em atitude. Nesse
sentido, se poderia dizer que no Brasil haveria uma conexão íntima entre
corrupção e moralidade.
De fato, como sustenta Bezerra (2001), de forma geral, a obtenção
corrupta de recursos materiais e institucionais do Estado está inserida em
um ciclo de transações que engloba a corrupção, mas não se limita a ela.
Analogamente, interesses econômicos existem nas trocas corruptas, mas essas
últimas não podem ser explicadas apenas em termos de interesses, mas também
em função das obrigações sociais prescritas nas relações sociais existentes
entre as pessoas envolvidas nessas trocas. O exercício de um cargo público,
ou seja, de uma função impessoal, não retira os indivíduos das relações
pessoais em que estão inseridos. Tais relações possuem um caráter
instrumental[5], pois o fato de se possuir relações pessoais com pessoas
que (mantêm relações pessoais com aqueles que) detêm recursos é,
virtualmente, um meio de ter acesso a esses recursos. Assim, as relações
constituem um tipo de capital social que pode ser utilizado como uma
estratégia socialmente aceita para se alcançar objetivos situados no plano
das relações formais – como no 'caso Valença' – ou para transformar
interesses privados em interesses do Estado – como no 'caso Coaroa-
Brastel'.
A análise fornecida por Bezerra (1994) do 'caso Valença' nos faz
perceber, pois, que a troca de favores e a obtenção recíproca de benefícios
entre pessoas com quem se mantêm relações pessoais é intrínseca a essas
relações:
Concebe-se como algo natural e legítimo recorrer direta
ou indiretamente a pessoas que ocupam posições chaves no
Estado de modo que se tenha acesso e se utilize de modo
privilegiado os recursos do mesmo. Do ponto de vista das
relações pessoais, concebe-se como um ato socialmente
admissível que tanto se façam pedidos pessoais a estas
pessoas como que os pedidos sejam atendidos (BEZERRA,
1994, p. 31).


Uma vez que os trâmites burocráticos são lentos e pouco eficientes,
faz-se uso das relações pessoais de modo que seja concedida atenção
especial à solicitação feita por meio do procedimento formal, quando ela é
acompanhada de um pedido pessoal. Efetivamente, a reciprocidade integrante
da moralidade brasileira implica no fato de que os pedidos realizados a
pessoas que integram a própria rede de relações pessoais[6] estejam
fundamentados em obrigações sociais que postulam que tais pedidos devam ser
atendidos para que essas relações sejam mantidas. Percebe-se, pois, que
essas redes de relações pessoais e de troca de favores são dotadas de um
contorno oficial, que confere a elas uma certa legitimidade e as integra ao
Estado: elas não correspondem a um poder paralelo, mas contrariamente se
nutrem e dependem do Estado, não havendo uma descontinuidade efetiva entre
atividades cotidianas da política brasileira e entre aquelas que são
denunciadas como corruptas. Além disso, como nos faz notar Bezerra (1994),
é curioso constatar que as exigências e garantias
administrativas - como no caso das licitações públicas ou
as exigências técnicas - têm sido estrategicamente
utilizadas em benefício de interesses de caráter privado.
Como se operasse uma espécie de círculo vicioso, as
dificuldades, os obstáculos, etc. levam às intervenções,
que, por sua vez, são o que garante que as dificuldades e
obstáculos estarão presentes. Trata-se, por assim dizer,
de um mecanismo que se auto-perpetua na medida em que
cria as próprias condições de sua reprodução (BEZERRA,
1994, p. 32).


4.3 Trocas?
No entanto, Bezerra evidencia que, embora sejam rotineiras as troca
de favores e a obtenção recíproca de benefícios entre pessoas que ocupam
cargos públicos, práticas desse tipo podem ser consideradas corruptas
quando envolvem interesses econômicos, e, principalmente, quando os
interesses individuais são colocados acima dos interesses relacionais. Como
demonstra a fala de Sérgio Menin, concedida em depoimento à CPI, é
importante frisar o fato de se tratar de um pedido de natureza pessoal, mas
sem interesses individuais: "Apenas solicitei ao Sr. Ministro uma atenção
para o pedido, que eu desconhecia. Tampouco, tirei proveito para minha
empresa desse fato." (D.C.N., 15/09/88: 2340. In: BEZERRA, 1994, p.11).

Além disso, o que parece levar à denúncia de corrupção é a não
retribuição adequada, anulando a reciprocidade da relação por colocar os
interesses individuais acima da própria relação – ao exigir, por exemplo,
uma comissão acima do preço praticado em troca do favor concedido, como
expressa a fala do prefeito que denunciou o 'caso Valênça': "o que fez o
rompimento do 'esquema' foi a comissão de 50% cobrada". (Jornal do Brasil
de 14/01/88. In: BEZERRA, 1994, p.14). Um último exemplo a esse respeito é
o fato de Sérgio Menin deixar o cargo obtido pela troca de benefícios
públicos que caracterizou o 'caso Valença' assim que é feita a denúncia,
demonstrando que a relação é mais importante que os benefícios obtidos por
meio dela. Com efeito, como afirma o autor, "findam os negócios, mas as
relações persistem" (BEZERRA, 1994, p.15).

Outro aspecto importante dessas práticas, evidenciado por Bezerra
(1994), é que elas não são vividas como trocas desinteressadas, unilaterais
e independentes umas das outras. Além disso, elas estão fundamentadas na
confiança (não sendo asseguradas por contratos formais). Parece-me
importante ressaltar, pois, que não se trata de um esquema de trocas
econômicas, uma vez que, como foi dito anteriormente, a relação é mais
importante que o interesse individual – aspecto que absolutamente não faz
parte das trocas econômicas. Nesse sentido, considero interessante pensar
até que ponto essas práticas se assemelham ao esquema de trocas de dádivas
proposto por Mauss (2003). Não proponho dar o mesmo estatuto ético e
epistemológico às trocas políticas brasileiras e ao sistema de Mauss, mas
acredito que esse ponto mereça uma reflexão mais detida.
De acordo com a formulação de Mauss (2003), o sistema de dádiva
corresponderia a uma seqüência descontínua de atos aparentemente
voluntários, generosos e gratuitos, mas marcados pela obrigatoriedade
sociológica de dar, receber e retribuir. Nesse sistema, pessoas morais
estariam unidas em relações recíprocas de dívida e crédito, que estabelecem
vínculos e hierarquias, ambos em um só tempo, entre essas pessoas morais.
Tal sistema apresenta, portanto, um caráter profundamente paradoxal e
agonístico, pois dádiva implica em dívida, dar significa perder - ainda que
momentaneamente - para se poder dar. Tratado pelo autor como um fato
social total, o sistema de dádivas apresenta aspectos de natureza múltipla
da totalidade social, incluindo instâncias econômicas, jurídicas,
estéticas, morfológicas, religiosas (ritualísticas) e morais (políticas e
familiares).
Como foi antecipado acima, as troca de favores e a obtenção recíproca
de benefícios entre pessoas que ocupam cargos públicos não são
estabelecidos entre pessoas morais, no sentido maussiano, isto é, sujeitos
revestidos de características sociais que lhes conferem obrigações, mas sim
entre indivíduos. O sistema político não constitui uma totalidade como as
sociedades estudadas por Mauss (2003) que praticam o dom enquanto fato
social total. Por outro lado, não me parece exagerado sugerir que esses
indivíduos pratiquem essas trocas com base em uma obrigação moral, ainda
que não se trate de uma obrigação moral sistêmica, como em Mauss (2003),
fazendo com que nem todas elas possas ser denominadas de trocas econômicas.
De fato, segundo a definição de Weber (1999), as relações mantidas em
coexistência e seqüência no mercado econômico são intrinsecamente efêmeras
e curtas (limitando-se à entrega recíproca dos bens de troca), cada troca
encerrando-se em si mesma. Assim, a associação criada entre as partes
envolvidas na troca estritamente econômica também é especificamente curta e
efêmera, encerrando-se também ela em si mesma. O contato entre os
indivíduos se dá de maneira prática, objetiva e impessoal, uma vez que
estes se orientam a partir do interesse único (compartilhado
conscientemente por todos os membros dessa comunidade de mercado econômico)
pelos bens de troca.
Voltando a Bezerra (1994), ele argumenta que além da relação ser mais
importante que os interesses pessoais, a obrigação social de se atender ao
pedido de uma pessoa com quem se mantém relações pessoais seria mais
importante do que a obrigação institucional de se ater aos procedimentos
formais. Efetivamente, aquele que atende a um pedido pessoal, em detrimento
das obrigações formais decorrentes do cargo que ocupa, também evidencia uma
maior preocupação com a relação. Nesse sentido, o 'caso Coroa-Brastel'
fornece um exemplo interessante da importância do investimento na relação,
uma vez que, conforme foi apontado anteriormente, ela corresponde a um meio
virtual de se ter acesso a recursos e obter benefícios.

Ao analisar esse caso, Bezerra (1994) nos faz perceber como o
empresário Assis Paim buscou "credenciar-se" junto ao Estado, mobilizando
seus contatos pessoais ou atendendo diretamente às demandas do governo de
que adquirisse empresas em situação de insolvência. Ao proceder dessa
maneira o empresário criou condições para que seus interesses junto ao
Estado deixassem de ser tratados em termos puramente formais, comprometendo-
se pessoalmente com a instituição e fazendo com que ela se comprometa com
ele sem perder suas propriedades de instituição, apenas facilitando os
trâmites burocráticos dos requerimentos oficiais do empresário. Assim,
continua o autor, por um lado essas trocas estão de acordo com a
temporalidade da dádiva, já que os ganhos puramente econômicos do
empresário não resultam de maneira imediata do atendimento às demandas do
Estado. Por outro lado, porém, há uma explicitação da obrigatoriedade da
dádiva, uma vez que o empresário considera que os serviços prestados ao
governo devem ser necessariamente retribuídos e que sua concessão
corresponde a uma estratégia conscientemente utilizada por ele para obter
vantagens do Estado.
CONCLUSÃO
5 Relações em relação: O ' Mensalão' e os escândalos de corrupção no
Brasil:


Do que foi apresentado nos capítulos acima parece precipitado afirmar
que a corrupção no Brasil esteja associada a meras 'faltas'. Primeiramente,
ela não corresponde a uma prática unanimemente definida, tampouco
unanimemente condenada. A partir das falas extraídas da revista Veja, é
possível perceber diferentes definições e interpretações para essa prática.
Além disso, elas evidenciam que a existência da corrupção no Brasil é do
conhecimento de todos, mas que, mesmo assim, a denúncia de novos casos se
mostra escandalosa e capaz de engendrar uma crise política, explorada pela
mídia, como no caso do 'Mensalão'. Assim, apesar de condenada
escandalosamente, a corrupção permanece e os atores parecem ter uma
explicação para isso, a qual se expressa em termos de "fisiologismo
político".
Ao mesmo tempo, conforme aponta Caminha (2003), a corrupção
corresponde a uma forma de legitimação não jurídica do poder que se
manifesta de diferentes maneiras e estaria fundamentada na coexistência das
éticas igualitária e hierárquica, as quais se refletem na corrupção e são
reforçadas por ela. Como mostram Chaia et alii (2001) e Bezerra (1994 e
2001), a estabilização dos governos depende do estabelecimento de vínculos
entre os políticos, e o prestígio dos homens públicos junto a seus
eleitores depende do estabelecimento de uma interdependência entre a esfera
pública municipal e nacional, mas também entre o executivo e o legislativo.
Assim, os políticos fazem uso de vínculos de todo tipo, inclusive pessoal,
para obter acesso a recursos públicos, levando a uma indistinção entre
público e privado.
Em tal contexto, a moralidade da reciprocidade brasileira vê com bons
olhos a obtenção recíproca de vantagens por meio de trocas de favores entre
pessoas com quem se mantém relações pessoais, havendo inclusive uma
obrigação social em se realizar essas trocas. A argumentação desenvolvida
nesse texto sugere que tal prática só é percebida como negativa quando
coloca os interesses pecuniários acima dos interesses políticos e os
interesses individuais acima dos interesses relacionais (os quais são
também individuais e econômicos, mas não apenas). Nesses casos, a troca
pode passar a ser taxada de corrupção, caso seja denunciada e se torne um
escândalo.
Parece ter sido exatamente isso o que ocorreu no 'Escândalo do
Mensalão' em 2005. Como argumenta Sherman (1990) Fatos considerados
denunciáveis foram revelados por Roberto Jefferson, publicados no jornal
Folha de São Paulo em 06 de junho de 2005 e amplamente divulgados na mídia.
Eles foram dramatizados em discussões, defesas e investigações, foram
rotulados de 'Mensalão' e, por fim, foram executados e julgados por uma
Comissão Parlamentar de Inquérito.
Efetivamente, as ações e os eventos denunciados em 2005 envolviam
tipos específicos de transgressões por parte de homens públicos, as quais
foram suficientemente sérias a ponto de exigir uma resposta pública quando
as pessoas tomaram conhecimento delas. Gerou-se, pois, um escândalo, uma
indignação generalizada quanto aos fatos denunciados e uma forte pressão
para a instauração de uma CPI.
No entanto, ao contrário do que sustenta Thompson (2001), a presença
desses tipos específicos de transgressões, por si só, não parece ter sido
suficiente para caracterizar um escândalo. Efetivamente, no caso do
'Mensalão', o mesmo tipo de transgressão havia sido denunciado em 2004, sem
se tornar um escândalo. Foi apenas em 2005, quando essas transgressões
foram não apenas reveladas e publicadas (como em 2004), mas também
amplamente divulgadas, dramatizadas, rotuladas e executadas que elas se
tornaram escândalos.
Assim, parece que os escândalos de corrupção no Brasil envolvem
transgressões que só parecem suficientemente sérias, a ponto de exigir uma
resposta pública, quando são divulgadas e dramatizadas. A corrupção no
Brasil parece tornar-se escandalosa apenas quando é divulgada e
dramatizada, como em 2005. Caso contrário, convive-se com essas
transgressões sem que elas escandalizem. Isso parece estar relacionado com
o fato de a corrupção ser uma prática muito próxima a outras práticas
corriqueiras da sociedade brasileira, como a troca de favores, sendo muitas
vezes difícil estabelecer o limite entre uma e outra.
No entanto, nos escândalos de corrupção esse limite parece ser
explicitado, ao mostrar casos extremos e escancarados de corrupção, que
causam indignação, talvez exatamente por isso. Nos escândalos, a corrupção
é separada das demais práticas sociais que lhe são próximas, como a troca
de favores, a barganha política etc. Ela é definida como falta e
relacionada àquilo que é denominado de fisiologismo da política brasileira.
Assim, a "praga da corrupção" é completamente descolada da dinâmica social
que a fundamenta, pois corrupto é sempre o outro.




Referências Bibliográficas

ABRANCHES, Sérgio. Presidencialismo de coalizão: o dilema institucional
brasileiro. Dados, IUPERJ, v. 31, nº 1, 1988.

ADEODATO, João Maurício. Uma teoria (emancipatória) da legitimação para
países subdesenvolvidos. Anuário do Mestrado em Direito, Recife, nº 05,
1992.

ALVARENGA, Tales. Chega de abafa. Veja. 11 jun. 2005. Edição 1909.
Disponível em: .
Acesso em: 26 nov. 2009.

ALVES, Joedson; ROMERO, Hélvio/ AE. Rebelo e Dirceu apagando o 'fogo'.
Montagem com fotos. In: CABRAL, Otávio. Operação de guerra. Veja. 04 jun.
2005. Edição 1908. Disponível em:
. Acesso em: 26 nov. 2009.

BEZERRA, Marcos Otavio. Bases Sociais da Prática da Corrupção no Brasil.
(Palestra
pronunciadas no Departamento de Antropologia da UnB, 17 e 24 nov. 1993).
Brasília, 1994.

______. Corrupção: um Estudo Sobre Poder Público e Relações Pessoais no
Brasil, Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1995.

______. Políticos, Representação Política e Recursos Públicos. Horizontes
Antropológicos, Porto Alegre, v. 7, n. 15, p. 181-207, jul. 2001.

BOURDIEU, Pierre. O poder simbolico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2000.

BUENO, Rubens. Cartas. Veja. 21 mai. 2005. Edição 1906. Disponível em:
. Acesso em: 26 nov. 2009.

CABRAL, Otávio. A maior crise de Lula. Veja. 21 mai. 2005. Edição 1906.
Disponível em: . Acesso em: 26
nov. 2009.

______. O que será que ele sabe? Veja. 28 mai. 2005. Edição 1907.
Disponível em: . Acesso em: 26
nov. 2009.

______. Operação de guerra. Veja. 04 jun. 2005. Edição 1908. Disponível
em: . Acesso em: 26 nov. 2009.

______. O PT assombra o Planalto. Veja. 11 jun. 2005. Edição 1909.
Disponível em: . Acesso em: 26
nov. 2009.

______. Nocaute. Veja. 18 jun. 2005. Edição 1910. Disponível em:
. Acesso em: 26 nov. 2009.


______. O assalto ao Estado. Veja. 25 jun 2005. Edição 1911. Disponível
em: . Acesso em: 26 nov. 2009.

CAMINHA, Marco Aurélio Lustosa. A corrupção na Administração Pública no
Brasil. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 176, 29 dez. 2003.

CAPA da Veja edição 1872. Autor desconhecido. Veja. 18 set. 2004. Edição
1872. Disponível em
. Acesso em:
26 nov. 2009.

CAPA da Veja edição 1905. Autor desconhecido. Veja. 14 mai. 2005. Edição
1906. Disponível em:
. Acesso em:
26 nov. 2009.

CAPA da Veja edição 1906. Autor desconhecido. Veja. 21 mai. 2005. Edição
1906. Disponível em:
. Acesso em:
26 nov. 2009.

CAPA da Veja edição 1907. Autor desconhecido. Veja. 28 mai. 2005. Edição
1907. Disponível em:
. Acesso em:
26 nov. 2009.

CAPA da Veja edição 1908. Autor desconhecido. Veja. 04 jun. 2005. Edição
1908. Disponível em:
. Acesso em:
26 nov. 2009.

CAPA da Veja edição 1909. Autor desconhecido. Veja. 11 jun. 2005. Edição
1909. Disponível em:
. Acesso em:
26 nov. 2009.

CAPA da Veja edição 1910. Autor desconhecido. Veja. 18 jun. 2005. Edição
1910. Disponível em:
. Acesso em:
26 nov. 2009.

CAPA da Veja edição 1911. Autor desconhecido. Veja. 25 jun 2005. Edição
1911. Disponível em:
. Acesso em:
26 nov. 2009.

CAPA da Veja edição 1912. Autor desconhecido. Veja. 02 jul. 2005. Edição
1912. Disponível em: . Acesso em:
26 nov. 2009.

CAPA da Veja edição 1913. Autor desconhecido. Veja. 09 jul. 2005. Edição
1913. Disponível em: . Acesso em:
26 nov. 2009.

CAPA da Veja edição 1914. Autor desconhecido. Veja. 16 jul. 2005. Edição
1914. Disponível em: . Acesso em:
26 nov. 2009.

CAPA da Veja edição 1915. Autor desconhecido. Veja. 23 jul. 2005. Edição
1915. Disponível em: . Acesso em:
26 nov. 2009.

CAPA da Veja edição 1916. Autor desconhecido. Veja. 30 jul. 2005. Edição
1916. Disponível em: . Acesso em:
26 nov. 2009.

CAPA da Veja edição 1917. Autor desconhecido. Veja. 06 ago. 2005. Edição
1917. Disponível em: . Acesso em:
26 nov. 2009.

CAPA da Veja edição 1918. Autor desconhecido. Veja. 13 ago. 2005. Edição
1918. Disponível em: . Acesso em:
26 nov. 2009.

CAPA da Veja edição 1919. Autor desconhecido. Veja. 20 ago. 2005. Edição
1919. Disponível em: . Acesso em:
26 nov. 2009.

CAPA da Veja edição 1920. Autor desconhecido. Veja. 27 ago. 2005. Edição
1920. Disponível em: . Acesso em:
26 nov. 2009.

CAPA da Veja edição 1921. Autor desconhecido. Veja. 03 set. 2005. Edição
1921. Disponível em: . Acesso em:
26 nov. 2009.

CAPA da Veja edição 1922. Autor desconhecido. Veja. 10 ser. 2005. Edição
1922. Disponível em: . Acesso em:
26 nov. 2009.

CAPA da Veja edição 1923. Autor desconhecido. Veja. 17 set. 2005. Edição
1923. Disponível em: . Acesso em:
26 nov. 2009.

CARDOSO DE OLIVEIRA, Luis Roberto. Direitos republicanos, identidades
coletivas e esfera pública no Brasil e no Quebec. Série Antropologia, 304.
Brasília, 2001

CARNEIRO, Marcelo; LINHARES, Juliana. Temporada de caça aos ratos. Veja. 21
mai. 2005. Edição 1906. Disponível em:
. Acesso em: 26 nov. 2009.

CARTA ao leitor. Veja. 21 mai. 2005. Edição 1906. Disponível em:
. Acesso em: 26 nov.
2009.

CARTA ao leitor. Veja. 04 jun. 2005. Edição 1908. Disponível em:
. Acesso em: 26 nov.
2009.

CARTA ao leitor. Veja. 11 jun. 2005. Edição 1909. Disponível em:
. Acesso em: 26 nov.
2009.

CARTA ao leitor. Veja. 18 jun. 2005. Edição 1910. Disponível em:
. Acesso em: 26 nov.
2009.

CARTA ao leitor. Veja. 25 jun 2005. Edição 1911. Disponível em:
. Acesso em: 26 nov.
2009.

CARTAS. Veja. 28 mai. 2005. Edição 1907. Disponível em:
. Acesso em: 26 nov. 2009.

CARTAS. Veja. 04 jun. 2005. Edição 1908. Disponível em:
. Acesso em: 26 nov. 2009.

CARTAS. Veja. 11 jun. 2005. Edição 1909. Disponível em:
. Acesso em: 26 nov. 2009.

CARTAS. Veja. 18 jun. 2005. Edição 1910. Disponível em:
. Acesso em: 26 nov. 2009.

CARTAS. Veja. 25 jun 2005. Edição 1911. Disponível em:
. Acesso em: 26 nov. 2009.

CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil: o longo caminho. Rio de
Janeiro:
Civilização Brasileira. 2001

CHAIA, Vera; TEIXEIRA, Marco Antonio. Democracia e escândalos políticos.
São Paulo Perspec, v. 15, n. 4, pp. 62-75, 2001.

CINTRA, Antônio Otávio; AVELAR, Lúcia (orgs.) Sistema Político Brasileiro –
uma introdução. São Paulo: Konrad Adenauer/ UNESP, 2004.

COUTINHO, Leonardo. RIZEK, André. O PT deu a senha para desmatar. Veja. 11
jun. 2005. Edição 1909. Disponível em:
. Acesso em: 26 nov. 2009.

DENÚNCIA de acordo entre PT e PTB. Jornal Nacional online. 18 set. 2004.
Disponível em: . Acesso em: 26 nov. 2009.

EDWARD. José; PATURY, Felipe. O pagador do mensalão. Veja. 18 jun. 2005.
Edição 1910. Disponível em: .
Acesso em: 26 nov. 2009.

FILGUEIRAS, Fernando. A Corrupção no Brasil e as Instituições Políticas.
2006.

FILHO, Roberto Stuckert/ Ag. O Globo. Silvio Pereira. 1 foto. In: PATURY,
Felipe; PORTELA, Fábio. O líder por testemunha. Veja. 28 mai. 2005. Edição
1907. Disponível em: . Acesso
em: 26 nov. 2009.

GOLDMAN, Márcio. Como funciona a democracia: uma teoria etnográfica da
política. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2006.


GRYZINSKI, Vilma. O dicionário da crise. Veja. 25 jun 2005. Edição 1911.
Disponível em: . Acesso em: 26
nov. 2009.

HEIDENHEIMER, Arnold J. A political corruption:readings in comparative
analysis.
New York: Hold Rinehartand Winstow inc, 1970.

JUNIOR, Policarpo. O homem-chave do PTB. Veja. 14 mai. 2005. Edição 1905.
Disponível em: . Acesso em: 26
nov. 2009.

______. FRANÇA, Ronaldo. Mesada de 400 000 reais para o PTB. Veja. 21 mai.
2005. Edição 1906. Disponível em:
. Acesso em: 26 nov. 2009.

______. Uma mentira contada na PF. Veja. 04 jun. 2005. Edição 1908.
Disponível em: . Acesso em: 26
nov. 2009.

KANT DE LIMA, Roberto. Cultura Jurídica e práticas policiais: a tradição
inquisitorial. In: Ensaios de antropologia do direito. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2008.

LANNA, Marcos. A dívida divina. Campinas: Ed. da Unicamp, 1995.

LIMA, Sérgio/ Folha imagem. José Genuíno. 1 foto. In: OLTRAMARI, Alexandre;
CABRAL, Otávio. Os outros quinhentos... Veja. 25 set. 2004. Edição 1873.
Disponível em: . Acesso em: 26
nov. 2009.

______. Roberto Jefferson. 1 foto. In: LO PRETE, Renata. Jefferson denuncia
mesada paga pelo tesoureiro do PT. Folha de São Paulo. São Paulo, 06 jun.
2005. Disponível em:
. Acesso em: 26
nov. 2009.

LIMA, João Gabriel de. Perus e cafunés. Veja. 28 mai. 2005. Edição 1907.
Disponível em: . Acesso em: 26
nov. 2009.

LO PRETE, Renata. Contei a Lula do Mensalão, diz deputado. Folha de São
Paulo. São Paulo, 06 jun. 2005. Disponível em:
. Acesso em: 26
nov. 2009.

______. Jefferson denuncia mesada paga pelo tesoureiro do PT. Folha de São
Paulo. São Paulo, 06 jun. 2005. Disponível em:
. Acesso em: 26
nov. 2009.

LYRA, Paulo de Tarso; MARQUES, Hugo; PARDELLAS, Sérgio. Miro denuncia
propina no Congresso. Jornal do Brasil Online. 24 set. 2004. Disponível em:
. Acesso em: 26 nov. 2009.

MARQUES, Alan/ Folha imagem. José Dirceu. 1 foto. In: OLTRAMARI, Alexandre;
CABRAL, Otávio. Os outros quinhentos... Veja. 25 set. 2004. Edição 1873.
Disponível em: . Acesso em: 26
nov. 2009.

______. Lula e José Dirceu em nocaute. 1 foto. In: CABRAL, Otávio.
Nocaute. Veja. 18 jun. 2005. Edição 1910. Disponível em:
. Acesso em: 26 nov. 2009.

MAUSS, Marcel. Ensaio sobre a Dádiva: forma e razão da troca nas sociedades
arcaicas. In: ______. Sociologia e Antropologia. São Paulo, Cosac & Naif,
2003.

MENDES, Regina L. T. Cultura jurídica e práticas policiais: a tradição
inquisitorial. In: Ensaios de antropologia do direito. Rio de Janeiro:
Lúmen Juris, 2008.

MENY, Ynes. Corrupcion "fin de siglo": Cambio, crisis y transformacion de
los valores. In: Revista Internacional de Ciencias Sociales, Paris/ UNESCO,
n°149, set. 1996.

MIRO Teixeira. 1 foto. Autor desconhecido. In: LYRA, Paulo de Tarso;
MARQUES, Hugo; PARDELLAS, Sérgio. Miro denuncia propina no Congresso.
Jornal do Brasil Online. 24 set. 2004. Disponível em:
. Acesso em: 26 nov. 2009.

MIZUTA, Erin; PORTELA, Fábio. Da floresta ao deserto. Veja. 04 jun. 2005.
Edição 1908. Disponível em: .
Acesso em: 26 nov. 2009.

MOURÃO, Tião/ 1º plano. Marcos Valério. 1 foto. EDWARD. José; PATURY,
Felipe. O pagador do mensalão. Veja. 18 jun. 2005. Edição 1910. Disponível
em: . Acesso em: 26 nov. 2009.

NUCCI, Carina. O mouse contra os ratos. Veja. 04 jun. 2005. Edição 1908.
Disponível em: . Acesso em: 26
nov. 2009.

NUCCI, Carina; SILVA, Chrystiane. Blindagem até quando? Veja. 11 jun. 2005.
Edição 1909. Disponível em: .
Acesso em: 26 nov. 2009.

OLIVEIRA, Ronaldo de/ CBPRESS. A estrela do PT nos jardins da Alvorada. 1
foto. In: CABRAL, Otávio. O assalto ao Estado. Veja. 25 jun 2005. Edição
1911. Disponível em: . Acesso
em: 26 nov. 2009.

OLTRAMARI, Alexandre; CABRAL, Otávio. 10 milhões de divergências. Veja. 18
set. 2004. Edição 1872. Disponível em:
. Acesso em: 26 nov. 2009.

______. Os outros quinhentos... Veja. 25 set. 2004. Edição 1873. Disponível
em: . Acesso em: 26 nov. 2009.

OYAMA, Thaís. "O PT acabou". Entrevista: Fernando Gabeira. Veja. 11 jun.
2005. Edição 1909. Disponível em:
. Acesso em: 26 nov. 2009.
OYAMA, Thaís; RIZEK, André. As boas relações de Marcos Valério. Veja. 18
jun. 2005. Edição 1910. Disponível em:
. Acesso em: 26 nov. 2009.
PALMEIRA, Moacir e GOLDMAN, Márcio (orgs.). Antropologia, voto e
representação política. Rio de Janeiro: Contra Capa, 1996.

PATURY, Felipe; PORTELA, Fábio. O líder por testemunha. Veja. 28 mai. 2005.
Edição 1907. Disponível em: .
Acesso em: 26 nov. 2009.

PATURY, Felipe. Os cofrões do "Freddy Krueger". Veja. 25 jun 2005. Edição
1911. Disponível em: . Acesso
em: 26 nov. 2009.

PETRY, André. Diga-me com quem anda... Veja. 21 mai. 2005. Edição 1906.
Disponível em: . Acesso em: 26
nov. 2009.

______. É a cara do Brasil. Veja. 28 mai. 2005. Edição 1907. Disponível em:
. Acesso em: 26 nov.
2009.

______. A aula magna da corrupção. Veja. 25 jun 2005. Edição 1911.
Disponível em: . Acesso em: 26
nov. 2009.

PORTELA, Fábio. Irresponsabilidade aprovada. Veja. 25 jun 2005. Edição
1911. Disponível em: . Acesso
em: 26 nov. 2009.

RIZEK, André. Ratos e, agora, cupins. Veja. 04 jun. 2005. Edição 1908.
Disponível em: . Acesso em: 26
nov. 2009.

ROSE-ACKERMAN, Susan Corruption and Government, Cambridge: Cambridge
University Press, 1999.

SABINO, Mario. Muito barulho por nada. Veja. 25 jun 2005. Edição 1911.
Disponível em: . Acesso em: 26
nov. 2009.

SHERMAN, Lawrence W. "The Mobilization of Scandal". In: HEIDENHEIMER,
Arnold J. et alii. Political Corruption: A Handbook. New
Brunswick,Transaction Publishers, 1990.

SILVA, Chrystiana. Baixinho de 1,85 m. Veja. 28 mai. 2005. Edição 1907.
Disponível em: . Acesso em: 26
nov. 2009.

______. Mais um na mira. Veja. 11 jun. 2005. Edição 1909. Disponível em:
. Acesso em: 26 nov. 2009.
SILVA, Marcos F. G. da. A economia política da corrupção: o escândalo do
orçamento. São Paulo, Núcleo de Pesquisa e Publicação (NPP) da FGV-SP,
1995.

TEIXEIRA, Carla Costa. Decoro parlamentar: entre agressões morais e
indisciplinas estratégicas. In: TEIXEIRA, Carla Costa; CHAVES, Christine de
Alencar (Org). Espaços e tempos da política. Rio de Janeiro: Relume Dumará,
2004.

THOMPSON, John B. Political scandal: power and visibility in the media age.
EUA/GB: Blackwell Publishers, 2000.
TOLEDO, Roberto Pompeu de. O sistema em xeque. Veja. 21 mai. 2005. Edição
1906. Disponível em: . Acesso
em: 26 nov. 2009.
VEJA essa. Veja. 11 jun. 2005. Edição 1909. Disponível em:
. Acesso em: 26 nov. 2009.

VITALE, Pauli; DUTTI, Sergio/ AE. Corrupção é 'lixo' sob o tapete. Montagem
com fotos. In: CABRAL, Otávio. O que será que ele sabe? Veja. 28 mai. 2005.
Edição 1907. Disponível em: .
Acesso em: 26 nov. 2009.

WEBER, Max. Economia e sociedade. Brasília, DF: Editora Universidade de
Brasília, 1999.

WOLF, Eric. Parentesco, amizade e relaçoes patrono-cliente em sociedades
complexas. In: Antropologia e poder: contribuiçoes de Eric Wolf. Brasilia:
Ed. UnB, 2003: pp. 93-114.
-----------------------
[1] A revista Veja sai nas bancas todo sábado, porém traz como data da
edição a quarta-feira seguinte. Como a repercussão das notícias da revista
se dá a partir da data de publicação, quando reporto aqui a data relativa à
edição da revista refiro-me sempre à data em que a edição saiu nas bancas.

[2] Pierre Bourdieu (2000) utiliza a definição de campo político para
denominar a arena de discussão e disputa, composta pelas lideranças
políticas,. Segundo ele, o campo político gozaria de relativa autonomia e
seria composto por específicos objetos de disputa, que garantem prestígio e
poder simbólico (acumulado por meio de capital social, capital cultural
etc).
[3] O termo accountability se refere à prestação de contas dos atos de
autoridades e governos perante a sociedade civil (FILGUEIRAS, 2006: 3)
[4] Exemplos de estudos na literatura antropológica acerca da "barganha
eleitoral" no plano local são aqueles realizados por Palmeira (1996),
Goldman (2006), Kushnir (2002), Lanna (1995), entre outros.
[5] Eric Wolf (2003) trata desse aspecto instrumental das relações
pessoais, apontado por Bezerra (1994), quando analisa um tipo específico de
amizade, denominado por Wolf (2003) de 'amizade istrumental'.
Diferentemente de Wolf (2003), porém, Bezerra (1994) considera essa
instrumentalidade um elemento constitutivo da amizade em geral e das demais
formas de relação pessoal, não apenas de um de seus tipos.
[6] O autor emprega a noção de rede de relações pessoais para se referir ao
"conjunto limitado de contatos diretos e indiretos de uma pessoa que se
caracteriza por estar fundado em relações de caráter pessoal" (BEZERRA,
1994:4).

-----------------------
1





FIGURA 1 - Foto de Roberto Jefferson, publicada na reportagem em que ele
denuncia o 'Mensalão' em 2005.
Fonte: LIMA. Folha de São Paulo, 06 jun. 2005.





FIGURA 2 - Foto de Miro Teixeira do PDT (Partido Democrático Trabalhista),
publicada na reportagem em que ele denuncia o 'Mensalão' em 2004.
Fonte: MIRO. Jornal do Brasil, 18 set. 2004.





FIGURA 3– Capa da Veja cuja menção, no alto, à esquerda, diz: "Exclusivo: o
escândalo da compra do PTB pelo PT saiu por 10 milhões de reais".
Fonte: CAPA da Veja edição 1872.





FIGURA 4 – Foto de José Dirceu, na reportagem que a Veja denuncia a compra
do PTB pelo PT.
Fonte MARQUES, Veja, edição 1872.




FIGURA 5 - Foto de José Genuíno, publicada pela revista Veja na reportagem
em que é denunciada a compra do PTB pelo PT.
Fonte: LIMA, Veja, edição 1873.



FIGURA 6 – Capa da Veja cuja menção, no alto, diz: "Exclusivo: o vídeo da
corrupção em Brasília. A incrível seqüência do dinheiro saindo das
mãos do corruptor para o bolso do corrupto. Mais: diálogos
inesquecíveis".
Fonte: CAPA. Veja, edição 1905.



FIGURA 7 – Sequência de 18 capas da Veja sobre corrupção.
Fonte: CAPA. Veja, da edição 1906 até a edição 1923.


INCLUDEPICTURE
"http://veja.abril.com.br/idade/exclusivo/250505/imagens/capa380.jpg" \*
MERGEFORMATINET

FIGURA 8 – Edição da Veja que retrata os corruptos como uma praga de
roedores.
Fonte: CAPA. Veja, edição 1906.




FIGURA 9 – Edição da Veja que retrata Roberto Jefferson como "O homem
bomba".
Fonte: CAPA. Veja, edição 1907.







FIGURA 10 – Ilustração da reportagem que retrata Roberto Jefferson como
'lixo' escondido sob o tapete.
FONTE: VITALE. Veja, edição 1907.



FIGURA 11 – Foto de Silvio Pereira publicada na segunda capa da Veja
inteiramente dedicada à corrupção.
FONTE: FILHO. Veja, edição 1907.



FIGURA 12 – Terceira capa da Veja inteiramente dedicada à corrupção.
Fonte: CAPA. Veja, edição 1908.



FIGURA 13 – Ilustração da reportagem que retrata Aldo Rebelo e José Dirceu
como bombeiros tentando apagar o 'fogo' causado pelas denúncias de
corrupção.
FONTE: ALVES. Veja, edição 1907.




FIGURA 14 – Edição da Veja que retrata Roberto Jefferson derrubando Delúbio
Soares.
Fonte: CAPA. Veja, edição 1909.




FIGURA 15 – Quinta capa da Veja inteiramente dedicada à corrupção.
Fonte: CAPA. Veja, edição 1910.




FIGURA 16 –Foto de Lula e José Dirceu ilustrando um nocaute.
Fonte: MARQUES. Veja, edição 1910.




FIGURA 17 – Foto de Marcos Valério, o "lobista mineiro".
Fonte: MOURÃO. Veja, edição 1910



FIGURA 18 – Capa da última Veja de junho de 2005.
Fonte: CAPA, Veja, edição 1911.



FIGURA 19 – Imagem da estrela do PT nos jardins da Alvorada.
Fonte: OLIVEIRA. Veja, edição 1811.
Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.