Participação em rede: o Gabinete Digital do Governo do Rio Grande do Sul (Brasil)

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Mestrado em Novas Mídias e Práticas Web Disciplina de Estudos Eleitorais

Participação em rede: o Gabinete Digital do Governo do Rio Grande do Sul (Brasil) Lucas Rohan*

Dezembro de 2015. *Supported by the Erasmus Mundus Action 2 Programme of the European Union

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Resumo

O caso do Gabinete Digital, ferramenta do Sistema de Participação Cidadã do Governo do Estado do Rio Grande do Sul, no Brasil, durante os anos de 2011 e 2014, tem sido estudado de diferentes perspectivais pela academia brasileira. Neste artigo, os resultados apresentados pelos realizadores da experiência de participação on-line nos permitem verificar um gradual aumento no número de cidadãos envolvidos a cada nova consulta pública. Para uma ferramenta de participação on-line é ainda mais necessário “legitimar o clique” provando sua eficácia com ações concretas. Há vários casos de sugestões colhidas pelo Gabinete Digital que se transformaram em ações de Governo. Com base na teoria robusta da participação política e dos autores que investigam os efeitos da internet, este artigo sugere que a eficiência de um sistema de participação on-line é um fator motivador que ajuda a aumentar o número de pessoas envolvidas.

Tags: participação política, internet, democracia, redes sociais

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Introdução: internet e participação política

O estudo sobre o uso de plataformas digitais está ganhando mais espaço na área acadêmica e diversos autores se dedicam a produzir investigações sobre os potenciais da rede, seus pontos fortes e seus pontos fracos, o uso dos dispositivos móveis e a mensuração de resultados. Isso acontece a partir do ponto de vista das mais diversas áreas, desde o comércio, passando pelo marketing até chegar à política. Nessa última, verifica-se interferência direta das novas Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs) tanto politica quanto governamentalmente. Uma nova forma de se comunicar baseada na mediação por computadores certamente afetou políticos e governos de forma muito forte nos últimos anos. Eles são representantes populares e a comunicação entre representantes e representados define a agenda do poder institucional. Por isso, o estudo do papel das novas mídias, das redes sociais ou da internet como um todo no processo de participação política tem relevância e é objeto deste pesquisador. A primeira questão que vem a mente de quem junta internet e participação política na mesma linha de raciocínio de um objeto de estudo é saber qual é o efeito do advento das novas tecnologias na quantidade e na qualidade da participação. No artigo “Political participation and the internet: a field essay“ (Participação política e internet: um estudo de campo), as pesquisadoras Eva Anduiza, Marta Cantijoch e Aina Gallego, da Universitat Autònoma de Barcelona, recorrem a vários autores para mostrar que a academia está dividida sobre os efeitos da internet na quantidade de participação política. Há autores que afirmam que ela poderia reduzir a participação, outros que a veem como um meio que pouco pode afetar, e terceiros que defendem o entendimento das novas tecnologias da informação como uma potente ferramenta de comunicação pode incrementar a participação política. “É evidente que a existência de um novo meio permite novas formas de participação política que não existiam anteriormente”, afirmam. O impacto sobre os níveis de participação, dizem as pesquisadoras, vai depender do grau em que os novos

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canais são utilizados: se o uso é marginal, é improvável que vá produzir uma sociedade mais participativa. Ainda no mesmo artigo, as autoras argumentam que os cidadãos descontentes “podem encontrar na internet uma alternativa que constitui um meio de estimular o surgimento de novos modos de participação”. Apesar de ainda não haver trabalho acadêmico que prove, alguns autores consideram que a exposição a uma maior quantidade de informações via internet produz maior interesse na política e a favorece a participação. No entanto, pondera o estudo, os consumidores de informação na internet em geral são responsáveis pela seleção dos conteúdos que vão absorver. Assim, são usuários ativos e as consequências para o comportamento político estariam condicionadas apenas aos usuários que têm predisposição a consumir informações sobre política. Por causa disso, as autoras consideram que a internet promove interesse na política em quem a usa para acessar esse tipo de conteúdo, mas, ao mesmo tempo, reforça a cultura da não-participação daqueles que não são interessados em política e que encontram na internet uma infinidade de outros conteúdos para consumir. Essa reflexão sobre o efeito da internet na participação é importante para justificar porque, quando se cria uma estratégia de usar as novas tecnologias para estimular a cultura participativa, também é necessário pensar em como trazer para o grupo dos que participam aqueles que nunca estiveram interessados. Esse autor pensa que mostrar resultados efetivos de uma atitude de participação é um bom método para comprovar a eficácia e conquistar mais engajamento. Vendo que o voto não foi em vão, por exemplo, outros cidadãos podem se sentir desejosos de participar. A ideia de Democracia Digital – chamada também de Democracia 2.0, Democracia 3.0, entre outras nomenclaturas - está relacionada com a utilização, por parte do Estado, de plataformas digitais de comunicação (BARROS; MIOLA, 2015). Esse viés é objeto de pesquisa de muitos autores, sendo que dois deles se destacam e embasam boa parte do meu trabalho de pesquisa: o sociólogo espanhol Manuel Castells e a pesquisadora brasileira Raquel Recuerdo. Da Universidade Federal de Pelotas, no Sul do Brasil, Recuerdo emana importantes colaborações para a pesquisa

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acadêmica sobre análise de redes e mensuração de resultados. Castells, cuja apresentação é dispensável, fornece extenso material relacionando as novas formas de comunicação digital com movimentos políticos e sociais e a participação em rede. A investigação que tem sido feita nessa área parte de movimentos sociais e sua presença nas redes, do uso dessas plataformas em campanhas eleitorais e da presença de instituições e políticos na internet. Este artigo vai na contramão, como outros, e parte dos resultados de um experimento de participação digital promovido pelo próprio Estado. O exemplo é o Gabinete Digital (GD), no Rio Grande do Sul (COCCO, 2013). O setor público, de maneira geral, tem ampliado a utilização de ferramentas digitais para intermediar relações entre governo e cidadãos. Só que, sem prévio conhecimento sobre o uso dessas novas formas de comunicação (justamente porque são novas), a percepção geral é de que muitos governos ainda utilizam-nas de forma muito rudimentar. Isso pode ser explicado pelo fato da internet evoluir velozmente, o que muitas vezes obriga os profissionais a um processo de trabalho do “aprender fazendo”. Mesmo em Porto Alegre, cidade que tem histórico de participação popular por ser berço do Orçamento Participativo, investigadores detectavam um tímido uso dessas novas tecnologias. A maior parte da comunicação on-line estabelecida pelo governo com o público tem o objetivo de produzir opinião pública favorável ou, no máximo, fornecer informações básicas sobre o funcionamento do Estado (GOMES, 2005). O próprio Castells (1999) disse, nos primórdios desses experimentos, que os agentes públicos utilizavam a internet como um simples quadro de avisos e não como uma ferramenta de natureza dialógica. A escolha do GD como objeto central de análise se deu justamente por aparentemente quebrar esse paradigma. Mais além de produzir opinião ou divulgar coisas básicas, ele se propôs a dar aos cidadãos real poder de interferir nas ações do Estado. Qual foi o resultado disso é o que vamos analisar neste artigo a partir de uma descrição dos projetos desenvolvidos pelo Gabinete Digital e que constam no balanço final de suas atividades. Para o embasamento quantitativo, que não é central nessa

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análise, citamos os dados oficiais disponibilizados pelo Estado nesse mesmo documento. Castells (2003) identifica a flexibilidade e o poder de comunicação da internet como fatores decisivos na definição da importância da interação social on-line na organização social do mundo. “As redes on-line, quando se estabilizam em sua prática, podem formar comunidades, comunidades virtuais, diferentes das físicas, mas não necessariamente menos intensas ou menos eficazes na criação de laços e na mobilização”, diz o sociólogo espanhol, para quem “a dimensão política de nossas vidas está sendo profundamente transformada” no que chama de “co-evolução” da internet e da sociedade. A Internet encerra um potencial extraordinário para a expressão dos direitos dos cidadãos e a comunicação de valores humanos. Certamente não pode substituir a mudança social ou a reforma política. Contudo, ao nivelar relativamente o terreno da manipulação simbólica, e ao ampliar as fontes de comunicação, contribui de fato para a democratização. A Internet põe as pessoas em contato numa ágora pública, para expressar suas inquietações e partilhar suas esperanças. É por isso que o controle dessa ágora pública pelo povo talvez seja a questão política mais fundamental suscitada pelo seu desenvolvimento. (CASTELLS, 2003, p. 135).

No texto “Internet e participação política” (2007), de Wilson Gomes, o autor cita o que considera requisitos básicos de uma democracia antes de relacioná-la com a internet. A disponibilização de informações para que os cidadãos possam tomar decisões mais qualificadas, a participação dos cidadãos nos debates públicos e nos processos de formação da opinião pública, a liberdade política, com meios e oportunidades de participação em instituições democráticas ou em eventos e atividades políticas e as oportunidades para interagir com seu representante e para dele cobrar explicações e prestações de contas no interstício eleitoral são as necessidades apontadas pelo autor e que coincidem com uma boa experiência de participação digital como a que será analisada a seguir.

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Gabinete Digital: conceito e instalação

O Gabinete Digital do Governo do Estado do Rio Grande do Sul foi criado para ser um espaço de discussão da sociedade sobre temas do governo com foco nos diálogos em rede. A iniciativa foi inspirada em ações similares de participação digital já consolidadas no mundo, com forte influência da estratégia montada pelo presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, após a emblemática eleição de 2008, considerada por muitos pesquisadores um marco na utilização das novas tecnologias pelo ambiente político. O site, as redes sociais e a estrutura do Gabinete Digital começaram a operar em 2011 como canais de participação cidadã e diálogo do Governo com a sociedade para buscar respostas à crise de representação que acomete regimes democráticos na atualidade. As palavras do coordenador-geral publicadas no balanço final dos trabalhos do Gabinete Digital, que transcrevo a seguir, revelam que a iniciativa começou num ambiente em que se buscava entender como as novas ferramentas digitais poderiam contribuir – ou não – para a participação popular. “Adentramos um terreno ainda pouco explorado e priorizado no Brasil que, ao mesmo tempo, vai se impondo como uma necessidade diante do desconforto crescente da sociedade em relação às nossas Instituições Democráticas e das possibilidades abertas no campo das Tecnologias da Informação e da Comunicação”, diz o Secretário-Geral de Governo e Coordenador do Gabinete Digital, Vinícius Wu (RELATÓRIO 2015, p. 5). Braço digital do Sistema Estadual de Participação Popular e Cidadã instalado pelo Governo do Estado naquela ocasião, o Gabinete Digital se consolidou ao longo do mandato e foi premiado pela Organização das Nações Unidas (ONU). Durante os três anos em que operou, o projeto teve dois momentos de grande destaque. Como ferramenta de governo, em 2014 quando realizou a maior consulta pública on-line sobre orçamento já realizada no Brasil. Como afirmação política, em 2013 durante a

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onda de manifestações populares que entrou para a história política brasileira como Jornadas de Junho.

Consolidação e protagonismo nas Jornadas de Junho

Partindo da base de que quanto mais democracia, melhor, foram organizadas consultas públicas sobre temas específicos, diálogos diretos entre membros do governo e internautas, fiscalização de obras públicas e campanhas online. Mas além de ter se tornado uma importante ferramenta de governo, ajudando o Poder Executivo a tomar decisões, o Gabinete Digital também foi importante politicamente. A política está intimamente ligada ao governo, pois é a sua personalidade. Sendo assim, sabendo que as sociedades mudam através do conflito e são administradas por políticos, uma vez que a internet está se tornando um meio essencial de comunicação e organização em todas as esferas de atividade, é óbvio que também os movimentos sociais e o processo político a usam, e o farão cada vez mais, como um instrumento privilegiado para atuar, informar, recrutar, organizar, dominar e contradominar (CASTELLS, 2003). O ciberespaço tornou-se um terreno disputado politicamente. Nessa área, o Gabinete Digital desempenhou importante papel em 2013, quando o Brasil vivia uma convulsão social com ondas de protestos em todo o País. Nas ruas, jovens expressavam suas insatisfações com toda a classe política - pois o alvo não era apenas o Governo Federal, mas também os Estaduais e Municipais, além dos Legislativos. Essa série de manifestações, as Jornadas de Junho de 2013, começou em algumas cidades com pequenos protestos contra o aumento na tarifa de transporte público e foi conquistando adeptos até se transformar em uma onda de manifestações “contra todos”. Os políticos brasileiros e os governos ficaram atônitos e poucos souberam como reagir. Era a primeira vez em muitos anos que a população brasileira saía às ruas para protestar.

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Nesse ambiente turbulento, o Gabinete Digital se propôs a intermediar o diálogo entre os manifestantes e o governador do Rio Grande do Sul. No dia 20 de junho de 2013, enquanto os protestos aconteciam, o governador Tarso Genro realizou uma audiência pública, com participação dos internautas através do envio de imagens, questionamentos e contribuições. A ação destacou-se por colocar frente a frente o governador e um grupo de manifestantes diante de 500 mil espectadores acompanhando o diálogo em tempo real pela internet. Dias depois, o governador voltou a se reunir com os manifestantes, dessa vez pessoalmente no Palácio Piratini, sede do Governo. A partir da demanda que estava no cerne da inquietação das ruas – a tarifa do transporte público – o Governo propôs um programa chamado “Passe Livre Estudantil”, beneficiando estudantes que viviam no interior do Estado e precisavam viajar diariamente a outra cidade para estudar. Eles foram cadastrados e, com o uso de uma identificação, contavam com transporte gratuito em linhas regulares de transporte público. O Governo explicou, na época, que respondeu o clamor das ruas dentro de suas atribuições, pois no Brasil a concessão de transporte público coletivo dentro das cidades é responsabilidade dos Executivos locais (Prefeituras Municipais). O Governo Estadual, de acordo com o sistema brasileiro, é responsável pelas ligações entre diferentes cidades.

Outros projetos e outros resultados

Iniciativa do Gabinete Digital consolidada ao longo do mandato, a consulta pública chamada “Governador Pergunta” consistia em um convite à participação a partir da provocação do Estado. Era formulada uma questão pelo Governo e os cidadãos, através da internet, poderiam enviar propostas e submetê-las à votação popular também no ambiente online. O projeto foi lançado em 9 de novembro de 2011 e teve três edições. Na primeira, o Governo perguntou: “Como podemos melhorar o atendimento à saúde pública?”. Foram computadas, de acordo com dados oficiais, mais de 1.300 propostas

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recebidas, 50 delas priorizadas em 120 mil votos recebidos durante os 30 dias de consulta aberta. Na segunda edição, a pergunta foi: “Como governo e sociedade podem, juntos, promover a paz no trânsito?”. Foi registrado um aumento significativo no número de participações. Foram 2 mil propostas enviadas pelos cidadãos, sendo que 10 delas foram priorizadas e incorporadas ao Plano Estadual de Segurança no Trânsito para a década 2011 – 2020. Essa consulta recebeu 240 mil votos, o dobro da anterior. A terceira edição, realizada após as Jornadas de Junho de 2013, trouxe um debate proposto pelos cidadãos em manifestações nas ruas: “Na sua opinião, quais devem ser as prioridades da reforma política?” era a pergunta proposta pela equipe do Governo. Foram recebidas 2.840 propostas em apenas 16 dias de consulta, com registro de 181 mil votos. O projeto Governo Escuta se consolidou aumentando, a cada edição, o número de interações diárias. A primeira edição, sobre saúde pública, registrou média diária de 4 mil votos. Quando estimulou o debate online sobre o trânsito, o Governo recebeu diariamente uma média de 6.150 votos. Em 2013, com o ambiente político efervescente, a consulta registrou média diária de 11.312 votos. O mesmo aumento é registrado no envio de propostas pelos cidadãos. Na primeira edição, foram 43 propostas recebidas por dia; na segunda, 51 sugestões diárias e, na terceira, 177 propostas foram enviadas por dia durante duas semanas de consulta aberta. Com esses números, sabemos quais foram os resultados em termos de audiência e de participação nos debates. Mas qual teria sido o resultado prático disso em ações de governo, que mexem com a vida das pessoas? A partir da primeira consulta, sobre saúde pública, foram recebidas muitas demandas por mais leitos hospitalares e novos hospitais regionais. Assim, o Governo cumpriu a meta de investir 12% de sua Receita Líquida em saúde, acelerou obras de hospitais regionais e, em 2014, o Rio Grande do Sul se tornou o Estado com o maior número de leitos hospitalares por habitante.

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Após a segunda edição do projeto, que discutiu ações para promover a paz no trânsito, o Governo atendeu os pedidos de redução no Imposto sobre Veículos Automotores (IPVA) para motoristas que não tenham registrado infrações. O resultado da terceira consulta, sobre a reforma política, originou uma série de propostas de alterações no sistema político brasileiro reunidas em um documento mais tarde apresentado como sugestão à Comissão da Reforma Política do Congresso Nacional brasileiro. O Gabinete Digital transmitiu, nos 3 anos de existência, 15 audiências públicas sobre temas diversos dentro do projeto chamado “Governo Escuta”. Os temas abordados foram: Bullying nas Escolas Públicas, Lei de Estrangeirismos, Cultura Digital, Democracia e Governos no Século XXI, Liberdade na Sociedade Digital, Impactos e Legado da Copa do Mundo, Reforma Política, Saúde Pública no Brasil e no RS, Sistema Estadual de Cultura, Novo Modelo de Pedágios, Segurança dos Taxistas, Jornadas de Junho: O que dizem as ruas?, Crise da Representação e Renovação da Democracia, Políticas para as Mulheres, Encontro com Blogueir@s e Ativistas Digitais e Diálogos da Copa. Foi em uma edição desse projeto que, ainda em 2011, o Gabinete Digital promoveu um debate acerca do polêmico Projeto de Lei aprovado na Assembleia que vetava a utilização, em propagandas e documentos oficiais do Rio Grande do Sul, de palavras em outros idiomas. O governador vetou o projeto após ouvir a sociedade. Foi também durante um Governo Escuta, dessa vez sobre o modelo de pedágios do Rio Grande do Sul, que surgiram contribuições para a definição de quais seriam as principais ações da recém-criada Empresa Gaúcha de Rodovias e do modelo participativo de gestão dos pontos de pedágio no Estado, com as chamadas praças comunitárias. A interação direta entre o governador e os cidadãos foi priorizada em muitas ocasiões, como no projeto “Governador Responde” realizado também pelo Gabinete Digital. Entre 2011 e 2014, o governador respondeu em vídeo 15 questões enviadas por cidadãos. Elas foram selecionadas através do voto aberto, sendo as mais votadas

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respondidas pelo chefe do Executivo. Outras perguntas foram respondidas em texto pela equipe do Governo. Um total de 105 questionamentos respondidos de cerca de 500 enviados. É sabido que uma das facetas da internet está ligada ao aumento do poder de fiscalização por parte do cidadão comum. O Gabinete Digital criou em 2013 o site “De olho nas obras”, que consistia em um portal que listava as obras realizadas naquele momento pelo governo acompanhadas do status de seu andamento e outras informações. O site permitia visualizar dados específicos de cada obra, enviar comentários, imagens e vídeos e acompanhar a evolução em uma linha do tempo. Foram afixados QR-Codes nas placas das obras monitoradas permitindo o acesso direito às informações pelo celular. Uma das características políticas importantes do Gabinete Digital era a proximidade com diversos grupos de atores sociais de influência na sociedade. Os membros da estrutura governamental eram próximos, por exemplo, do movimento hacker e de um grande número de blogueiros e ativistas das redes sociais das mais diversas origens. Essa proximidade gerou a ação “Diálogos em Rede”, promovida em 7 ocasiões depois de 2013 envolvendo cerca de mil pessoas entre público presencial e online. Em 2014, último ano de governo, o Gabinete Digital promoveu a maior consulta pública online do Brasil. Foi a Votação das Prioridades do Governo para o orçamento de 2015. Através de 255.751 votos apenas pela internet os cidadãos ajudaram a decidir onde o governo deveria aplicar cerca de R$ 200 milhões do orçamento. As consultas realizadas pelo Gabinete Digital apenas pela internet envolveram quase 1,5 milhão de pessoas. Isso, num universo de pouco mais de 8 milhões de eleitores.

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Conclusão

Partimos de um exemplo reconhecido de sucesso em um lugar com reconhecida tradição em participação popular. O Gabinete Digital demonstrou, através dos números que produziu, ser uma ferramenta eficiente de estímulo da participação política no Estado do Rio Grande do Sul, onde foram assentados os alicerces dos governos participativos com a criação do Orçamento Participativo na década de 90. Podemos extrair dos números divulgados pelos responsáveis pelo projeto em seu balanço final somados à consistente literatura que disseca as razões, motivações e ações dos indivíduos que participam politicamente e a não menos consistente – embora desatualizada, pela velocidade da evolução das novas tecnologias da informação – literatura sobre o uso da internet nesse meio, a conclusão de que o fato de mostrar resultado pode ser um fator motivador para aumentar os níveis de participação dos cidadãos no governo. As ações desenvolvidas pelo Gabinete Digital, como consultas públicas e audiências on-line relatadas acima, observaram um aumento gradativo de participações na medida em que os resultados dessa apareciam. Ao ver uma sugestão enviada em um ambiente on-line inserida em um Projeto de Lei ou em um Decreto Governamental, o cidadão foi estimulado a não perder a oportunidade de fazer parte desse processo de decisão. Entendo que muitas iniciativas de participação através das novas tecnologias, como redes sociais, acabam por falhar ao tentarem se transformar muito mais em uma ferramenta de marketing do Governo para promover o governante ou o seu discurso do que numa real forma de coletar opiniões, sugestões e possibilitar troca interativa de experiências com os cidadãos. Em outras palavras, muitas ações parecidas com o Gabinete Digital erram ao falarem sozinhas sem escutar o que o cidadão conectado tem a dizer. É muito comum governos e governantes pensarem que estão em um pedestal fora do alcance das mãos do cidadão comum e, de lá, sentirem-se no direito de usar

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um campo tão fértil como são as novas tecnologias apenas como mais um meio de fazer propaganda. No caso relatado nesse artigo aconteceu exatamente o contrário e talvez por isso tenha sido reconhecido como exemplo de sucesso. O Gabinete Digital, operado durante três anos no Governo do Estado do Rio Grande do Sul e fechado quando o novo governo assumiu, em janeiro de 2015, provou em números e ações que as novas tecnologias da informação podem ser aliadas de um governo participativo e democrático.

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Bibliografia

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