PASSAGEM DE TURNO EM ENFERMAGEM: uma reflexão

August 11, 2017 | Autor: Vera Cavaco Pontes | Categoria: Nursing, Ethics
Share Embed


Descrição do Produto

ISSN 0872-8844

N.º115 . AGOSTO 2014

enfermagem em revista

ÉTICA QUESTÕES ÉTICAS INERENTES À PASSAGEM DE TURNO JUNTO DOS DOENTES

O ESSENCIAL SOBRE PASSAGEM DE TURNO EM ENFERMAGEM: UMA REFLEXÃO

SUMÁRIO

SUMÁRIO

P04 EDITORIAL P05 ÉTICA QUESTÕES ÉTICAS INERENTES À PASSAGEM DE TURNO JUNTO DOS DOENTES

P13 O ESSENCIAL SOBRE PASSAGEM DE TURNO EM ENFERMAGEM: UMA REFLEXÃO

P19 CIÊNCIA & TÉCNICA A REDE SOCIAL DA REDE: CUIDADOS CONTINUADOS INTEGRADOS

P28 CIÊNCIA & TÉCNICA OS ENFERMEIROS E A VACINAÇÃO DO HPV

P38 CIÊNCIA & TÉCNICA ADESÃO À TERAPÊUTICA ANTI-RETROVIRAL. QUAIS AS INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM?

P47 CIÊNCIA & TÉCNICA A IMPORTÂNCIA DA ENFERMAGEM FORENSE EM CONTEXTO DE INVESTIGAÇÃO CRIMINAL

P54 CIÊNCIA & TÉCNICA QUANDO A FAMÍLIA DO DOENTE CRÍTICO ENTRA NO MUNDO DA EMERGÊNCIA: UM ESTUDO DE REVISÃO

P66 CIÊNCIA & TÉCNICA PRESENÇA DAS FAMÍLIAS NO SERVIÇO DE URGÊNCIA DURANTE A REANIMAÇÃO E OS PROCEDIMENTOS INVASIVOS. QUAL O ESTADO DA ARTE?

P74 CIÊNCIA & TÉCNICA TRAUMATISMO TORÁCICO. LESÕES NÃO ESPECÍFICAS

FICHA TÉCNICA PROPRIEDADE E ADMINISTRAÇÃO Formasau, Formação e Saúde, Lda. Parque Empresarial de Eiras, Lote 19, Eiras - 3020-265 Coimbra T 239 801 020 F 239 801 029 CONTRIBUINTE 503 231 533 CAPITAL SOCIAL 21.947,90 € DIRECTOR António Fernando Amaral DIRECTORES-ADJUNTOS Carlos Alberto Margato / Fernando Dias Henriques EDITORES Arménio Guardado Cruz / João Petetim Ferreira / José Carlos Santos / Paulo Pina Queirós / Rui Manuel Jarrô Margato ASSESSORIA CIENTÍFICA Ana Cristina Cardoso / Arlindo Reis Silva / Daniel Vicente Pico / Elsa Caravela Menoita / Fernando Alberto Soares Petronilho / João Manuel Pimentel Cainé / Luís Miguel Oliveira / Maria Esperança Jarró / Vitor Santos RECEPÇÃO DE ARTIGOS Mariana Cruz Gomes CORRESPONDENTES PERMANENTES REGIÃO SUL Ana M. Loff Almeida / Maria José Almeida REGIÃO NORTE M. Céu Barbiéri Figueiredo MADEIRA Maria Mercês Gonçalves COLABORADORES PERMANENTES Maria Arminda Costa / Nélson César Fernandes / M. Conceição Bento / Manuel José Lopes / Marta Lima Basto / António Carlos INTERNET www.sinaisvitais.pt E-MAIL [email protected] ASSINATURAS Mariana Cruz Gomes / Célia Margarida Sousa Pratas INCLUI Revista de Investigação em Enfermagem (versão online) PREÇOS ASSINATURA INDIVIDUAL Revista Sinais Vitais (6 números/ano): €10.00 / Revista de Investigação em Enfermagem (4 números/ano): €10.00 ASSINATURA CONJUNTA (SV 6 números/ano + RIE 4 números/ano): €15.00 ASSINATURAS ANUAIS: pessoas colectivas (Instituições /Associações): Revista Sinais Vitais (6 números/ano): €20.00 / Revista de Investigação em Enfermagem (4números/ano): €20.00 / Assinatura conjunta (SV 6 números/ano + RIE 4 números/ano): €35.00. FOTOGRAFIA 123rf© NÚMERO DE REGISTO 118 368 DEPÓSITO LEGAL 88306/ 95 ISSN 0872-8844

3

EDITORIAL

EDITORIAL ANTÓNIO FERNANDO S. AMARAL, Enfermeiro [email protected]

A AGOSTO 2014

questões de alocar aos enfermeiros mais atividades tem vindo a ser debatida nas redes sociais de forma muito vigorosa. De um lado, alguns enfermeiros a defenderem a possibilidade de se aumentarem as atividades e tarefas a desempenhar, pedidos de radiografias e outros exames de diagnóstico, a prescrição de medicamentos, etc. Do outro, os responsáveis da Ordem dos Médicos a esgrimirem argumentos no sentido de que não seja permitida a delegação dessas atividades.

4

Tenho para mim que esta discussão é mais séria do que uma mera discussão, mais ou menos corporativa, feita no facebook ou noutra rede social. O atual governo, através do seu ministro da saúde, tem desvalorizado significativamente a profissão de enfermagem e os seus profissionais. Primeiro diminuído o valor/hora e depois diminuindo o número de enfermeiros nos serviços a níveis próximos do dos anos 70, fazendo com que a maioria dos serviços funcione no limiar dos padrões mínimos de segurança e, claro está, com claras repercussões na qualidade dos cuidados que são necessários prestar e clara perda de eficiência para os serviços. Claro que tudo isto, sendo prejudicial para os enfermeiros, porque lhes trás mais cansaço e stress, é-o sobretudo para os utentes do SNS que vêem o seu acesso aos cuidados prejudicado e serem inibidos do seu direito a que lhes sejam prestados cuidados em segurança. Penso que este deveria ser o debate e a reivindicação dos enfermeiros. Voltar ao regime de 35 horas e a um aumento do número de enfermeiros nos serviços, de modo a garantir cuidados de enfermagem às populações e não apenas alguns cuidados prestados por enfermeiros. Claro que muitos dos nossos colegas embarcam na demagogia do governo para um aumento da atividade, mas esquecem-se que com isso estão a privar os doentes de cuidados de enfermagem para passarem a ter cuidados prestados por enfermeiros orientados por protocolos na maioria deles elaborados por médicos. Onde fica a nossa autonomia se realizarmos apenas tarefas delegadas à margem das que derivam de um processo de tomada de decisão, baseado em conhecimento de enfermagem. De uma vez por todas, vamo-nos centrar no essencial e só depois de estarem garantidos os cuidados que advêm da nossa matriz é que devemos pensar em task shifting se isso melhorar o bem-estar e o acesso dos doentes e a eficiência do sistema. Cumprir protocolos apenas, não.

ÉTICA

ENTRADA DO ARTIGO ABRIL 2013

Questões éticas inerentes à passagem de turno junto dos doentes ANA TEIXEIRA Enfermeira especialista em Enfermagem de Reabilitação. ACES Tâmega III Vale do Sousa Norte - Centro de Saúde Lousada

DANIELA DIAS Enfermeira especialista em Enfermagem de Reabilitação. Serviço de Urgência do Centro Hospitalar do Porto – Unidade de Santo António

CHRISTINE MARTINS Enfermeira especialista em Enfermagem de Reabilitação. ACES Tâmega III Vale do Sousa Norte - Centro de Saúde Lousada

LUÍS VIEIRA Enfermeiro especialista em Enfermagem de Reabilitação. Serviço de Urgência do Centro Hospitalar do Porto – Unidade de Santo António

5

RESUMO A passagem de turno é por excelência um momento de troca de informação relevante de forma a assegurar a continuidade de cuidados. Quer ela se realize na sala de trabalho, junto do doente ou junto do doente e complementada na sala de enfermagem, é imprescindível respeitar a confidencialidade das informações e o direito de privacidade que assiste o doente, levando a que os enfermeiros sejam criteriosos quanto à informação a transmitir junto dos utentes.

ABSTRACT The shift change is par excellence a moment of exchange the important information to insure the continuity of care. Whether it take place in the room along with the patient or supplied in the nursing retreat, who is essential to respect the confidentiality of information and the right to privacy which assists the patient, so that nurses are an important piece of knowledge to pass on their users, passing the most insightful information and relevant.

Palavras-Chave: Passagem de turno, enfermeiros, sigilo profissional, confidencialidade, privacidade

Keywords: Shift change, nurses, professional secrecy, confidentiality, privacy

AGOSTO 2014

ÉTICA

6

INTRODUÇÃO O doente, durante o internamento vê-se confrontado com um lugar e com relações diferentes das familiares e sociais às quais está habituado, podendo sentir-se assustado, fragilizado, ansioso ou mesmo em situação de desequilibro físico, psíquico ou emocional. Na perspetiva de Briga (2010, p. 5), “O hospital é um enredo de interacções, um palco de cenários multifacetados, mas o hospital é, acima de tudo, nomeadamente pelas relações que aí se estabelecem, um lugar privilegiado de comunicação, onde nascem vínculos particulares e pessoais entre os doentes que a ele recorrem por necessidade e os profissionais que aí desempenham as suas funções". Temos como objetivo perceber como a passagem de turno junto dos pacientes condiciona os seus direitos e os deveres dos profissionais e traçar algumas sugestões de alteração para um maior respeito pelo direito à privacidade e confidencialidade na prática dos cuidados de saúde em particular, promovendo uma reflexão critica sobre o tema que permita melhorar a qualidade dos cuidados de enfermagem tendo por base uma comunicação eficaz, porque comunicar é antes de mais, uma arte, uma capacidade que nos é intrínseca. No entanto, parece-nos claramente necessário prosseguir a reflexão acerca desta questão bioética, que a todos toca, e em si encontra inscrita a dignidade da pessoa humana como fundamento ético. Em 2001, foi elaborado um parecer do Conselho Jurisdicional da Ordem dos Enfermeiros que não responde de forma objectiva a algumas particularidades suscitadas na prática, restituindo aos enfermeiros a responsabilidade individual e colectiva, de modo a não colocar em causa os direitos dos utentes.

COMPETÊNCIAS NO CUIDAR EM ENFERMAGEM A Ordem dos Enfermeiros (2003) refere que a competência do Enfermeiro implica um nível de desempenho profissional demonstrador de uma aplicação efetiva do conhecimento e das capacidades, incluindo ajuizar. Assim, podemos dizer que um Enfermeiro é competente quando reúne e mobiliza o conjunto de saberes (saber, saber-fazer, saber-ser e saber-estar), aplicando-os na prestação de cuidados, atendendo à vertente científica, técnica e relacional (Conceição e Ramos, 2004). Na humanização dos cuidados de enfermagem jamais se pode dispensar a relação de ajuda e o cuidar. “Cuidar, é AJUDAR A VIVER (…)” (Collière, 1999, p.227), é (…) um acto de reciprocidade que somos levados a prestar a toda a pessoa que, temporária ou definitivamente, tem necessidade de ajuda para assumir as suas necessidades vitais (…)” (Idem,p.235). A relação de ajuda implica comunicação. Comunicar é cuidar. Cuidar é humanizar. A humanização permite a compreensão do indivíduo no seu contexto físico, psíquico, emocional, social e cultural. Para cuidareficazmente, o enfermeiro deve saber observar e avaliar corretamente e responder à sua comunicação de forma adequada a cada situação. Isto requer conhecimentos técnicos, compreensão e disponibilidade nas relações humanas em situações deficitárias. A comunicação é um processo de transmissão de mensagens no campo do relacionamento de pessoa para pessoa. Não há interações passivas e é impossível não comunicar. Assim, estas duas premissas dizem-nos que a comunicação é um processo complexo que envolve trocas verbais e não verbais de

ÉTICA

informações, ideias, sentimentos e emoções. Costa (s.d., p.70), salienta que comunicação “É um acto de partilha que, se for eficaz, produzirá mudanças, actividade ou inactividade, palavras ou silêncios, tudo possui um valor de mensagem”. Cada pessoa reage a esta mudança de acordo com as suas crenças, valores, história de vida e cultura. Se por um lado, a comunicação verbal com os doentes é, muitas vezes, dificultada pela presença de diversas condicionantes, por outro lado, os enfermeiros esquecem frequentemente as potencialidades da comunicação não verbal. A comunicação não verbal é uma troca sem palavras, englobando um conjunto de expressões corporais e de comportamentos que transcendem, acompanham e suportam as relações entre as pessoas dando-lhes significado. Através da comunicação não verbal, transmitimos as mensagens de forma inconsciente, por meio da expressão facial, da linguagem corporal, das características físicas, da tacésica e da proxémica e na realidade o que advém da comunicação não verbal é mais facilmente retido relativamente às palavras. Tal como refere Briga (2010) “é preciso não esquecer que as mensagens silenciosas do olhar, da expressão facial ou da postura são em grande parte inconscientes e podem trair a nossa vontade, os nossos verdadeiros sentimentos”. Mehrabian, citado por Briga (2010, p.31) afirma que ”somente 7% das nossas comunicações serão traduzidas em palavras, 38% sê-lo-ão pelas características da voz e 55% pelo resto do corpo”, sendo facilmente compreendida a importância de estabelecer uma relação harmoniosa entre estes dois tipos de expressão.

O DEVER DE SIGILO PROFISSIONAL: PRIVACIDADE E CONFIDENCIALIDADE DOS DADOS RELATIVOS AO DOENTE O enfermeiro tem sobre a pessoa que cuida o dever de sigilo na medida em que o enfermeiro é obrigado a guardar segredo profissional sobre o que toma conhecimento no exercício da sua profissão e assume o dever de “considerar confidencial toda a informação acerca do destinatário de cuidados e da família, qualquer que seja a fonte, partilhar a informação pertinente só com aqueles que estão implicados no plano terapêutico, usando como critérios orientadores o bem-estar, a segurança física, emocional e social do indivíduo e família, assim como os seus direitos, divulgar informação confidencial acerca do indivíduo e família só nas situações previstas na lei, devendo, para tal efeito, recorrer a aconselhamento deontológico e jurídico e a manter o anonimato da pessoa sempre que o seu caso for usado em situações de ensino, investigação ou controlo da qualidade de cuidados. Cabe ao enfermeiro garantir cuidados globalizantes e individualizados, tendo como valor o respeito pela dignidade humana, de forma a que a experiência de dor e sofrimento, por que passa o indivíduo, se dê num clima e ambiente de segurança, protector da sua dignidade e intimidade”. Para Morais (2011, p.255) “a assistência à saúde é sustentada pelo valor da confiança.” Por este motivo, o carácter de confidência preserva o relacionamento entre o profissional e o doente e, quando este segredo se quebra, põe em causa toda a relação de confiança que se criou entre os dois. A confidencialidade é um atributo que qualquer profissional de saúde necessita de aprender a desenvolver, já que dela depende a confiança que o utente irá nele depositar. “O doente tem direito à pri-

7

AGOSTO 2014

ÉTICA

8

vacidade e o médico o dever de confidencialidade. A confiança no médico só é mantida desde que este guarde sigilo absoluto dos factos. A confidencialidade só pode ser quebrada quando o doente autoriza ou quando lesa gravemente direitos de terceiros” (Serra, citado por Morais, 2011, p. 87). Francisconi e Goldim (1998, p. 271) defendem que “a preservação de segredos está associada tanto à questão da privacidade quanto da confidencialidade”. Para Francisconi e Goldin(1998, p.271) “a privacidade é a limitação do acesso às informações de uma dada pessoa, bem como do acesso à própria pessoa e à sua intimidade. É a preservação do anonimato e dos segredos. É o respeito ao direito de o indivíduo manter-se afastado ou permanecer só. É o direito que o paciente tem de não ser observado sem sua autorização”. Já Miguéns, citado por Veríssimo (2009, p.21), analisa o conceito de privacidade como sendo um “ambiente de recato, sossego, intimidade, seio de família”, referindo também que a vida privada de cada pessoa merece respeito e tem o direito a não ser violada ou divulgada. Confidencialidade tem origem na palavra confiança, que é a base para uma boa relação terapêutica. O paciente acredita que o profissional a quem confia certos assuntos irá preservar tudo o que lhe for relatado, tanto que revela informações que muitas vezes, outras pessoas com as quais convive, nem sequer supõem existir. Assim, todas as informações relativas ao doente – situação clínica, diagnóstico, prognóstico, tratamento e dados pessoais – são confidenciais. No entanto, se o doente der o consentimento e não houver prejuízo para terceiros, ou se a Lei o determinar podem estas informações ser utilizadas, tendo como regra que o doente deve ser

alertado para a necessidade de não colocar em risco a segurança ou a vida de outros. Confidencialidade é a garantia do resguardo das informações dadas em confiança e a protecção contra a sua revelação não autorizada (Francisconi e Goldim, 1998). Constitui uma atitude ou comportamento de respeito, de silêncio, de segredo, relativamente a um facto, dado íntimo ou privado, da vida de uma pessoa. “Em contrapartida, o direito à privacidade é violado quando se obtém, por exemplo, a informação de um computador ou de um registo, ou seja, quando uma pessoa sem autorização entra na sala de arquivos ou na base de dados do computador de um hospital” (Silva, 2007, p.41). Para Ourives (s.d., p. 255) “a confidencialidade é assumida como uma forma de privacidade informacional que acontece no âmbito de uma relação de cuidados, onde a responsabilidade de cuidar do outro é um acto de confiança que nos foi concedido e não um direito que possuímos”. Dessa forma, os profissionais somente deverão ter acesso às informações que efetivamente contribuam ao atendimento do paciente. A autorização ao acesso à informação é uma dádiva do doente e implica uma necessidade terapêutica, não um direito ao seu uso abusivo. Ainda segundo este autor, “a dimensão ética da confidencialidade impõe a necessidade de discernir o valor terapêutico da informação e avaliar aquilo que constitui matéria do segredo partilhado em equipa e aquilo que deve ser mantido em segredo”.

METODOLOGIA A revisão da literatura decorreu entre Novembro de 2011 e Dezembro de 2012, tendo sido operacionalizada através da pesquisa

ÉTICA

eletrónica de artigos em bases de dados: SciELO, Google, Google Académico, PubMed, Repositório Científico de Acesso Aberto de Portugal, B-on, assim como referências de livros e teses nos períodos de 1998 a 2011, nas línguas inglesa e portuguesa. Os descritores utilizados foram: passagem de turno, enfermeiros, sigilo profissional, confidencialidade, privacidade. Como critérios de inclusão foram considerados as publicações em texto integral, com limitação da pesquisa aos anos 1998 a 2011.

RESULTADOS Após a revisão de literatura efectuada focamo-nos unicamente nos artigos/livros/dissertações que abordavam as questões éticas inerentes à passagem de turno, bem como o seu local. Através desta estratégia de pesquisa foram encontradas 5 publicações, 2 livros e 5dissertações.

Passagem de Turno Um dos momentos mais importantes e privilegiados na formação dos profissionais de enfermagem é a passagem de turno. Este é um momento por excelência de troca de informação relevante de forma a assegurar a continuidade de cuidados (Pereira, 2001). Segundo Ferreira (2010), a passagem de turno é um tempo significativo, que permite a avaliação do trabalho realizado num turno, a organização do turno seguinte e a discussão partilhada dos assuntos e dos problemas surgidos na enfermaria. Assim, baseando-nos no Parecer do Conselho Jurisdicional da Ordem dos Enfermeiros sobre a passagem de turno, constatamos que é “um momento de reunião da equipa de enfermeiros, tendo como objectivo assegurar a continuidade de cuidados, pela transmissão verbal de informação, e como finalidade promover a melhoria contínua da qualidade dos cuidados, enquanto momento de análise das práticas

9

AGOSTO 2014

ÉTICA

10

e de formação em serviço/em situação” (Ordem dos Enfermeiros, 2001). Esta transmissão de informação é efectuada de forma oral, complementando assim a informação escrita nos registos de Enfermagem. Por conseguinte, a passagem de turno não deverá ser encarada como uma simples transmissão de ideias e conceitos mas sim como um dos pilares fundamentais do constante aperfeiçoamento dos cuidados de enfermagem prestados (Carneiro citado por Ferreira et al., 2010). Neste seguimento de ideias, podemos afirmar que a passagem de turno dos enfermeiros é um momento determinante no seu quotidiano profissional, porque representa um momento de grande cumplicidade na qual os profissionais de saúde refletem sobre as suas práticas, gerando por vezes mudanças de comportamentos e atitudes que promovem o desenvolvimento pessoal e profissional. Os locais de Passagem de turno são geridos, em cada contexto de trabalho e atendendo às suas características, de forma considerada mais adequada para responder às finalidades – e tanto podem ser utilizados espaços de trabalho específicos ou exclusivos dos enfermeiros como espaço da unidade de cada utente, ou outros, não sendo estas opções mutuamente exclusivas (Ordem dos Enfermeiros, 2001).Deste parecer resultou que o importante não será o local propriamente dito, mas as informações transmitidas próximo de terceiros, sendo que se deve sempre salvaguardar o direito dos utentes à privacidade e confidencialidade. A passagem de turno dos enfermeiros, junto ao doente, é uma prática internacional e comum em muitos contextos hospitalares do nosso país. O seu principal intuito é envol-

ver os utentes no seu processo de cuidados, mas, devido sobretudo ao carácter delicado e pessoal das informações transmitidas, muito se tem discutido sobre as suas vantagens e desvantagens. Nas situações de passagem de turno junto do utente em espaço de enfermaria, terão de ser acautelados alguns aspectos, já que os conteúdos da informação tenderão a ser diferentes dos que poderão ser transmitidos posteriormente/anteriormente em gabinete/sala de enfermagem. “O comprometimento da confidencialidade é uma violação grave de um direito do doente e em quase todas as passagens de turno ocorre um lapso, pois nem só o diagnóstico merece reserva. Por exemplo: a incontinência, a não colaboração, a confusão, o risco de contaminação, a não adesão dos prestadores de cuidados ou a falta de apoio da família, a falta de auto-controlo, a ansiedade, a agressividade, a infecção, algumas dependências no auto-cuidado, o uso de álcool e drogas, etc, também não são do foro da reserva da intimidade? E as demais respostas às situações de doença, serão ou não? Todas as respostas são subjectivas, pois convém não esquecer que o que é considerado confrangedor para uma pessoa pode não o ser para outra. Consideremos, ainda a interrogação de um dos participantes. Porque todos os enfermeiros entram no quarto, quando só um me vai prestar cuidados? De facto, uma transmissão triangulada, entre os enfermeiros (o que termina e o que inicia a o turno) e o utente, seria muito mais adequada e vantajosa” (Ferreira, 2010, p.36). A passagem de turno poderá ser realizada num ou em vários locais, de acordo com as características de trabalho e a sua informação poderá ser fornecida junto do doente em enfermaria e complementada em espaço de trabalho, salvaguardando sempre os di-

ÉTICA

reitos dos utentes nomeadamente no que concerne à privacidade e confidencialidade e garantindo sempre a possibilidade de utilizar o “Privilégio Terapêutico”. Durante a passagem de turno devemos ter em consideração o direito do doente à confidencialidade e privacidade, proteção da intimidade e à reserva da sua vida privada. Assim, o respeito pelo direito à privacidade implica o dever dos profissionais de saúde em praticar os seus atos no respeito pela intimidade da pessoa estando apenas presentes os elementos essenciais para a execução do mesmo. A partilha de informação pertinente deve ser apenas e só com aqueles que estão envolvidos no plano terapêutico, considerando sempre o melhor interesse do paciente, isto é, o seu bem estar, a segurança física, emocional, social e os seus direitos. O momento de passagem de turno tem como objectivo centrar os cuidados nos utentes, de forma personalizada, fornecendo-lhes mais informação, mas também melhorar o desempenho global dos enfermeiros, interpelando-os relativamente aos cuidados prestados durante o turno de trabalho cessante, procurando sempre manter ao máximo a confidencialidade e privacidade dos utentes, levando a que os enfermeiros sejam criteriosos quanto à informação a transmitir junto dos utentes.

CONCLUSÃO A passagem de turno é também um momento de formação intra-equipa e de reflexão sobre a prática de cuidados de enfermagem prestados, tendo como objectivo principal a continuidade de cuidados e a garantia do bem-estar do doente. Assim, a passagem de turno, junto dos doentes, acarreta

muitas vantagens ao processo de enfermagem, no entanto, deve existir um processo de comunicação, de certa forma preconizado, no sentido de não transmitir informações ao doente que possam prejudicar o seu estado de saúde, isto porque a saúde envolve uma enorme componente emocional. Temos que ter consciência que certa informação não deve ser divulgada junto ao doente, pela sua fragilidade tantas vezes presente. A linguagem utilizada pelos profissionais deve impor também um certo cuidado uma vez que, certos termos que nos poderão parecer banais, revestem-se de enorme importância para aquele que está numa situação de fragilidade psicológica, podendo potenciar um aumento do medo, da preocupação, da tensão a que o doente está sujeito. Por outro lado, o facto de a informação ser transmitida nas enfermarias pode conduzir a um certo desrespeito pelo direito de privacidade subjacente ao estado de doente, uma vez que os pacientes que nada têm a ver com o processo clínico do outro, têm um acesso involuntário ao mesmo. Mais concluímos que, o facto da informação ser transmitida de enfermeiro para enfermeiro leva a uma participação passiva do doente no seu processo clínico, e isto poderá ser contestável. A passagem de turno, em enfermaria, permite a continuidade dos cuidados, o conhecimento mútuo enfermeiro-utente e o cumprimento do seu direito à informação. Contudo, também se pode verificar o comprometimento da confidencialidade, a despersonalização, a pouca interacção enfermeiro - utente e informação que pode ser entendida pelo doente como repetitiva, pouco interessante e com linguagem técnico-científica. A passagem de turno nas enfermarias terá pois que ser muito bem pensada antes de

11

ÉTICA

AGOSTO 2014

ser aplicada nos serviços e deve ser realizada com muita ponderação. A informação transmitida, deverá ser junto ao doente e complementada em local adequado, dependendo da realidade do serviço, como, a sala de trabalho O doente deve ser envolvido como gestor da sua própria saúde e doença sendo, portanto, o mais interessado por todo o processo. As intercorrências devem sim ser discutidas entre os profissionais para depois comunicar ao paciente de uma maneira que ele absorva melhor.

12

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRIGA, S. C. P. (2010) - A comunicação terapêutica enfermeiro/doente: perspectivas de doentes oncológicos entubados endotraquealmente. Dissertação de Mestrado em Ciências de Enfermagem apresentada ao Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, Universidade do Porto, Porto. Recuperado em 15 Novembro 2011, de http://repositorio-aberto.up.pt/ handle/10216/26914 COLLIÉRE, Marie-Françoise (1999) - Promover a Vida (Maria Leonor Braga, Trad.). (pp.227-235).Lisboa, Abecasis. CONCEIÇÃO, Maria Fátima Abrantes & Ramos, Paula Cristina Alvim (2004, Julho). Experiência Profissional: O caminho para a competência. Sinais Vitais, nº55, pp.31-33. COSTA, Maria Arminda (s.d.) - Relação Enfermeiro-Doente. In N.M.C.P. & P. S. (Coord.), Para uma Ética da Enfermagem: Desafios (pp. 63 - 80). Coimbra: Gráfica de Coimbra. FERREIRA, R., Luzio, F., Santos, M. (2010, Março 1). Passagem de turno dos enfermeiros nos quartos (visita de enfermagem): opinião dos utentes. Revista Referencia [em linha] - II série - nº 12, , pp.29-37. [consult. 15 Nov. 2011]. Disponivel em: https://docs.google.com/viewe r?a=v&q=cache:52WT5KK9zK4J:www.esenfc.pt/rr/admin/conteudos/downloadArtigo.php%3Fid_ficheiro% 3D300%26codigo%3D+Passagem+de+turno+dos+e nfermeiros+nos+quartos+(visita+de+enfermagem):+ opini%C3%A3o+dos+utentes.+Revista+Referencia& hl=pt-PT FRANCISCONIE Goldim. (1998). Aspectos Bioéticos da Confidencialidade e Privacidade. In Iniciação à Bioética (1ª edição). Brasília. pp.271. MORAIS, A.M. M. (2011) “Segredo profissional - Que limites?”. Dissertação de Mestrado em Bioética. Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, Porto.

[Em linha]. [Consult. 25 Nov. 2011]. Disponível em: http://repositorio-aberto.up.pt/handle/10216/21927 ORDEM DOS ENFERMEIROS (2003). Competências dos Enfermeiros de cuidados gerais. Lisboa. [Em linha]. [Consult. 15 Nov. 2011]. Disponível em: http://www. ordemenfermeiros.pt/publicacoes/Documents/CompetenciasEnfCG.pdf ORDEM DOS ENFERMEIROS (2001, Outubro). Passagem de Turno Junto dos doentes em Enfermaria: Parecer do Conselho Jurisdicional. Ordem dos Enfermeiros, nº4, pp. 1-3. [Em linha]. [Consult. 15 Nov. 2011]. Disponível em: http://www.ordemenfermeiros.pt/documentos/Documents/Parecer_CJ_20-2001.pdf OURIVES, Alzira (s.d.). Confidencialidade e Privacidade. In N.M.C.P. & P. S. (Coord.), Para uma Ética da Enfermagem: Desafios. Coimbra: Gráfica de Coimbra, p. 249 – 262. PEREIRA, Filipe Miguel Soares. (2001). Teor e valor da Informação para a Continuidade dos cuidados em Enfermagem. Dissertação de Mestrado, Universidade do Porto, Porto. SILVA, A.M.F.S (2007) - O direito à privacidade do doente no serviço de urgência - . Dissertação de Mestrado em Bioética. Faculdade de Medicina, Universidade do Porto, Porto. [Em linha]. [Consult. 25 Nov. 2011]. Disponível em: http://repositorio-aberto.up.pt/ handle/10216/22110 VERÍSSIMO, M. D. A. (2009) - Importância que os alunos de 4º ano do Curso de Licenciatura em Enfermagem atribuem à humanização e ao respeito pela privacidade na prestação de cuidados. Projecto de Graduação para obtenção da licenciatura em Enfermagem apresentada à Universidade Fernando Pessoa, Faculdade de Ciências da Saúde. [Em linha]. [Consult. 25 Nov. 2011]. Disponível em: http://bdigital.ufp.pt/ handle/10284/1381.

O ESSENCIAL SOBRE... ENTRADA DO ARTIGO ABRIL 2013

PASSAGEM DE TURNO EM ENFERMAGEM: uma reflexão VERA SOFIA JOAQUIM CAVACO Enfermeira no Hospital de Faro com Especialização em Enfermagem Médico-Cirúrgica, Mestranda em Enfermagem na Universidade Católica Portuguesa

PATRÍCIA CRUZ PONTÍFICE-SOUSA Enfermeira com a Especialização em Enfermagem Médico-Cirúrgica, Mestre em Comunicação em Saúde, Professora na Universidade Católica Portuguesa.

13

RESUMO A passagem de turno em enfermagem assegura a continuidade de cuidados, pela transmissão verbal de informação, num momento de análise das práticas e de formação em serviço. Assim é necessário desafiar os enfermeiros a compreender a importância da informação a transmitir, do tempo necessário e dos comportamentos a promover. Realça-se o carácter essencial da informação clara, sem ambiguidades e sistematizada, de modo a evitar a banalização deste momento, contribuindo para a continuidade e qualidade dos cuidados e segurança da pessoa. Palavras-Chave: Passagem de Turno, Continuidade dos Cuidados, Melhoria da Qualidade

ABSTRACT The nursing shift report ensures continuity of care, by verbal transmission of information, analysis of practices and in-service training. For that is necessary to challenge nurses to understand the importance of the information provided, the required time and the better behaviors. It is essential emphasize the clear, unambiguous and systematic information, in order to avoid the trivialization of this moment, contributing to the continuity and quality of care and patient security. Keywords: Shift Report, Continuity of Care, Quality Improvement

AGOSTO 2014

O ESSENCIAL SOBRE...

14

NOTA INTRODUTÓRIA A passagem de turno ou passagem de ocorrências em enfermagem é um dos momentos privilegiados de partilha entre enfermeiros. Partilham-se informações para a prestação de cuidados, mas também reflexões profissionais e vivências pessoais de cada um. Muitos classificam este momento como um reencontro diário entre profissionais com um objectivo comum, tal que durante o horário de trabalho podem não voltar a encontrar-se até à nova passagem de turno. De facto, este momento é definido por Nunes et al. (2005) como uma reunião de enfermagem que permite a partilha de informação verbal, que garante a continuidade dos cuidados, devendo ser encarada como um momento de aprendizagem e formação com a análise das práticas, que tende a promover a melhoria contínua da qualidade dos cuidados. Os mesmos autores acrescentam que a transmissão da informação é feita de forma oral, podendo ser complementada pela forma escrita. No mesmo sentido, Silva e Campos (2007) acrescentam que a informação transmitida deve ser objectiva, clara e concisa e deve ser relativa à prestação de cuidados directos ou indirectos à pessoa, podendo-se também transmitir outros assuntos institucionais de interesse. Apesar deste conjunto de conceitos que fazem imergir uma definição do tema, a grande maioria dos enfermeiros de hoje transmitem uma preconcepção que desvaloriza a sua importância. Raros são aqueles que assumem a passagem de turno como um momento excepcional de formação contínua, continuando a remete-la apenas para a troca de informação. Por este motivo torna-se emergente compreender o que envolve a passagem de turno. Guimarães (1999) de-

fende que a passagem de turno corresponde a um tempo de simbolismo significativo, através da avaliação do trabalho realizado num turno, organização do turno seguinte e discussão de problemáticas decorrentes no quotidiano dos cuidados prestados. Já Kerr (2002) citado por Staggers e Jennings (2009) considera este momento como um processo complexo pelo conhecimento e experiência intrínsecos ao seu conteúdo. Considerando estes autores compreende-se que a passagem de turno envolve mais saber do que à partida se pensava com a simples troca de informação. De facto, a enfermagem é uma disciplina que envolve uma complexidade de saberes que se difunde em todas as actividades inerentes à profissão. Deste modo surgem diversas questões “Estaremos nós a eclipsar o verdadeiro sentido da passagem de turno? Que significado atribuímos a este momento da prestação de cuidados?”. É certo que em cada enfermeiro, cada contexto, cada instituição haverão diferenças na concepção deste momento, que podem inclusive aproximar-se intimamente da verdadeira noção de passagem de turno. Contudo, a reflexão será sempre uma mais-valia para a melhoria contínua da qualidade dos cuidados, conforme defendido pela nossa Ordem Profissional. O local da passagem de turno Na literatura é comum encontrar-se a discussão entre a dicotomia da passagem de turno no quarto/unidade doa pessoa ou numa sala à parte, ao qual a Ordem dos Enfermeiro (OE) já se pronunciou (Baker, 2010; Ferreira et al., 2010; Nunes et al. 2005; Santos e Ferreira, 2004; Staggers e Jennings, 2009). Por questões relativas ao sigilo, Nunes et al. (2005) descreve o parecer da OE, cujos as-

O ESSENCIAL SOBRE...

pectos conclusivos consideram que o espaço onde se realiza a passagem de turno deverá ter em atenção as características de cada contexto de trabalho, de modo a ir ao encontro dos objectivos da passagem de turno, anteriormente descritos. Como forma de não extrapolar o Código Deontológico dos Enfermeiros, é ainda feita referência à necessidade de salvaguardar o direito de privacidade e confidencialidade da pessoa e garantia da utilização do “privilégio terapêutico”. O documento acrescenta ainda que não é o local da passagem de turno que é colocado em causa, mas sim as informações nela contidas, que possam ser involuntariamente transmitidas a terceiros. Assim, a decisão do local fica ao critério da própria equipa de enfermagem, que em conjunto, e sublinhando o termo “equipa”, deverá tecer as melhores considerações para o contexto onde exerce funções. Sistematizar a passagem de turno Por ser central à manutenção da continuidade, qualidade e planeamento dos cuidados prestados, Lamond (2002) procurou compreender o processo de decisão e julgamento do enfermeiro durante a sua passagem de turno, tendo concluído que geralmente a informação transmitida nesse momento apresenta uma ordem específica, que confere uma estrutura ou esquema facilitador da transmissão de informação. O autor concluiu também que o enfermeiro tende a transmitir informação sumária acerca da condição da pessoa, por pressupor que o enfermeiro que recebe a informação fará uma associação cognitiva que permita concluir acerca das necessidades específicas desse mesma pessoa, e assim, se tende a reduzir-se o tempo dispensado na passagem de turno. No

mesmo sentido, ao comparar a informação contida nos registos escritos e na passagem de turno, o autor verificou que a primeira é sempre mais completa e detalhada do que a segunda, que justifica pelo facto dos registos escritos representarem um documento legalmente reconhecido. Curiosamente, o mesmo estudo revela que os dados psicossociais da pessoa são mencionados mais frequentemente na passagem de turno, do que nos registos escritos. No que se refere à comunicação de um profissional para o outro, a World Health Organization (2007) referencia que as lacunas que ocorrem durante esse processo predispõem à existência de quebras na continuidade dos cuidados, tratamentos inadequados e colocam em causa a segurança da pessoa. Efectivamente, o trabalho de Hansten (2003) citado por Dean (2009) enuncia que as diferenças verificadas na qualidade da informação transmitida na passagem de turno, podem favorecer a eficiência do turno seguinte ou, por outro lado, podem atrasar os cuidados em cerca de 1 a 2 horas. É interessante verificar o quão influente este momento é para o sucesso das restante horas de prestação de cuidados, pelo que a World Health Organization (2007) e Baker (2010) recomendam que a comunicação efectiva deverá ser cara-a-cara, precisa e não ambígua, sugerindo alguns passos descritos no Quadro 1. O que é que a passagem de turno despoleta nos enfermeiros? Para além do já descrito, a comunicação inerente à passagem de turno pode ser afectada por outras variáveis, que Roach (2002) citado por Dean (2009) referencia nestas questões: “If a depressed person enters a room, what happens to others? What

15

O ESSENCIAL SOBRE...

bn– Exemplo de organização da informação da passagem de turno junto da pessoa, adaptado de World Health Organization (2007) e Baker (2010). Aplicar técnica SBAR

AGOSTO 2014

O uso de uma abordagem estandardizada minimiza a confusão entre os profissionais

16

(S)Situation: o enfermeiro que termina o turno despede-se da pessoa e o enfermeiro que entra cumprimenta a pessoa; (B)Background: actualiza o colega acerca dos problemas actuais da pessoa, bem como do tratamento, medicação, exames complementares de diagnóstico e necessidades especiais (ex. isolamento de contacto, risco elevado de queda…); (A)Assessment: informa acerca dos acontecimentos durante o seu turno; (R)Recommendation: revê e certifica que tudo está operacional para o colega que entra (ex. permeabilidade de acessos venosos, terapêutica em curso ou pendente, confirma pedido de serviço social…); Ao longo desta abordagem a pessoa é convidada a intervir disponibilizando-se espaço para o esclarecimento de dúvidas e facilitando a sua inclusão no planeamento dos cuidados.

Dispensar o tempo necessário

Comunicar a informação importante dando a oportunidade ao colega de colocar questões, respondendo adequadamente, sem outras interrupções irrelevantes.

Incluir informações

Status da pessoa, medicação, plano de tratamento ou outras alterações significativas.

is the impact of the energy, motivation, and commitment of a nurse who is leaving a shift on those who take over?” (p.22). Efectivamente, estas questões nascem do facto do autor concluir que pouco se tem escrito sobre a problemática intra-profissional dos enfermeiros durante a passagem de turno e servem incondicionalmente de projecção à reflexão. É sabido que comportamento gera comportamento, pelo que um enfermeiro desmotivado influencia invariavelmente a energia dos restantes colegas e concomitantemente a disposição para a prestação de cuidados inócua. Face à situação actual do país e da profissão, não é tarefa fácil andar de cara alegre em todos os momentos da prestação de cuidados, mas assumindo a influencia que o nosso estado de espírito pode ter para com o outro, poderemos assumir o compromisso de deixarmos o nosso “fado” de lado e de causarmos impacto positivo na-

queles que entram ou deixam o turno. Silva e Campos (2007) referem que a maioria das dinâmicas de passagem de turno são demoradas, desgastantes e tendem à banalização e superficialidade, ao invés de fomentarem a reflexão. Provavelmente, este facto relaciona-se com a desorganização da transmissão de informação/formação, mas não só. Os mesmos autores enumeram alguns aspectos, relacionados com o comportamento da equipa, que interferem no sucesso da passagem de turno como: conversas paralelas, telefonemas, campainhas, entrada e saída de funcionários, solicitações médicas, presença de familiares, brincadeiras dos profissionais, não pontualidade dos profissionais e saídas apressadas. Efectivamente, e de modo empírico, todos os dias se assiste a um ou mais destes exemplos, que inevitavelmente prejudicam a transmissão da informação/ formação. Quantos de nós não nos identifi-

O ESSENCIAL SOBRE...

camos com algum destes comportamentos? De modo complementar, referencia-se ainda o trabalho de Roach (1997) citado por Dean (2009) que conclui que os enfermeiros na passagem de turno despendem demasiada energia a controlar os outros, ao invés de desenvolver a capacidade honestidade, integridade ou compaixão pelo outro colega. De facto somos demasiadamente críticos com os colegas, em especial com o colega do turno anterior, no que se refere às suas fraquezas, que sistematicamente vamos identificando. A tomada de consciência desta problemática poderá ser uma mais valia para que, em conjunto, se possam arranjar estratégias dentro da equipa que fomente um espírito crítico construtivo, evidenciado de forma igualitária os pontos positivos e negativos, tal como sugere Speas (2004) citado por Dean (2009). A melhoria dos cuidados não está em apontarmos as fraquezas dos outros mas em encontramos as nossas próprias fragilidades

e desenharmos estratégias para as contornarmos. Integrando as concepções expostas resumem-se as principais ideias no Esquema 1, que pretende ser um veículo catalisador para a tomada de consciência daquilo que fazemos e que poderemos melhorar. Nota Final Desde Nightingale que se assume a importância da comunicação oral como essencial à continuidade dos cuidados. A fim de centrar os cuidados na pessoa torna-se fundamental encontrar formas de comunicação e utilizar uma linguagem em que a pessoa esteja presente, sob pena de se uniformizar as situações que se pretendem descrever. Assim, a passagem de turno em enfermagem assume um carácter primordial na partilha de experiências, convidando à reflexão de cada profissional. A rotina pode transpor este momento à banalização, pelo que se preconiza a transmissão de informação clara,

Esquema 1 – Desafios para a passagem de turno no SUC.

Passagem de turno Assegura a continuidade de cuidados, pela transmissão verbal de informação, num momento de análise das práticas e de formação em serviço.

Informação a transmitir: Abordagem estandardizada, Incluir informações pertinentes, Excluir informações fúteis

Local – Unidade do doente Intervenientes Enfermeiro emissor

Enfermeiro Receptor

Tempo: O necessário para comunicar as informações e permitir espaço ao esclarecimento de dúvidas

Doente

Comportamentos a evitar: conversas paralelas, telefonemas, campainhas, entrada e saída de funcionários, solicitações médicas, presença de familiares, brincadeiras dos profissionais, não pontualidade dos profissionais, saídas apressadas.

Desafio: Que energia, motivação e empenho existe no enfermeiro que passa o turno e no enfermeiro que o está a receber? O que podemos melhorar no nosso contexto de trabalho?

17

AGOSTO 2014

O ESSENCIAL SOBRE...

18

sem ambiguidades e com uma ordem específica, de modo a evitar confusões nos enfermeiros que recebem essa mesma informação. O tempo dispendido deverá ser o suficiente para incluir o esclarecimento de dúvidas. O local deverá ser o que se adeque às características do contexto de trabalho, considerando a particularidade da confidencialidade e privacidade da pessoa. Mediante estas condições os enfermeiros deverão promover comportamentos que não interfiram no sucesso da transmissão da informação, através do controlo do ambiente circundante ao local da passagem de turno. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BAKER, Stephanie – Bedside shift report improves patient safety and nurse accountability. Journal of Emergency Nursing. ISBN 0099-1767. 36:4 (2010), 355-358. DEAN, Patrick – Nurse-to-Nurse Caring Begins with Shift-to-Shift Report. International Journal for Human Caring. ISBN 1091-5710. 13:2 (2009), 22-26. FERREIRA, Ricardo; LUZIO, Fátima; SANTOS, Mayra – Passagem de turno dos enfermeiros nos quartos (Visita de Enfermagem): opinião dos utentes. Revista Referência. ISBN 0874-0283. 2ª Série:12 (2010), 29-37. GUIMARÃES, Paula – Aprendizagens e quotidianos profissionais. Estudo de caso de uma enfermaria. Braga: Instituto de Educação e Psicologia da Universidade do Minho. Dissertação de Mestrado, 1999. LAMOND, Dawn – The information content of the nurse change of shift report: a comparative study. Journal of Advanced Nursing. ISBN 0309-2402. 31:4 (2000), 794-804 NUNES, Lucília; AMARAL, Manuela; GONÇALVES, Rogério – Código Deontológico do Enfermeiro: dos Comentários à Análise dos Casos. Lisboa: Ordem dos Enfermeiros. 2005. ISBN 972-99646-0-2.

SANTOS, Mayra; FERREIRA, Ricardo – Passagem de turno junto dos utentes: melhoria efectiva na prestação de cuidados? Revista Referência. ISBN 0874-0283. 12 (2004), 49-53. SILVA, Évena; CAMPOS, Luciana – Passagem de plantão na enfermagem: Revisão da Literatura. Cogitare Enfermagem. ISBN 1414-8536. 12:4 (2007), 502-507. STAGGERS, Nancy; JENNINGS, Bonnie – The Content and Context of Change of Shift Report on Medical and Surgical Units. The Journal of Nursing Administration. ISBN 0002-0443. 39:9 (2009), 393-398. WORLD HEALTH ORGANIZATION – Communication during patient hand-overs: Patient safety solutions. 2007. [Em linha]. [Consult. 20 Dez. 2012] Disponível em .

CIÊNCIA & TÉCNICA ENTRADA DO ARTIGO MARÇO 2013

A REDE SOCIAL DA REDE:

CUIDADOS CONTINUADOS INTEGRADOS LÚCIA ALEXANDRA PINTO CARDOSO Enfermeira no Serviço de Urgência do Centro Hospitalar do Porto. Curso de Pós-Licenciatura em Enfermagem Comunitária, Curso de Especialização em Saúde Publica e Curso de Pós-Graduação em Enfermagem Avançada.

ANA FILOMENA SILVA DE FREITAS Licenciada em Enfermagem. Mestranda em Enfermagem Comunitária, Curso de Pós Graduação em Enfermagem Avançada e Curso de Pós Graduação em Cuidados Continuados Integrados.

19

RESUMO A importância da formação e ampliação de redes de solidariedade está na mobilização e distribuição de recursos, e na mudança do perfil epidemiológico no processo saúde/doença. Esta revisão bibliográfica objetiva determinar a importância da articulação e configuração das redes sociais e de cuidados continuados integrados, na satisfação das necessidades sociais e de saúde. Os resultados corroboram que a configuração e a articulação das redes sociais com o sistema de saúde facilitam a gestão da rede e do seu alcance.

ABSTRACT The importance of the formation and expansion of networks of solidarity is the mobilization and distribution of resources, and the changing epidemiological profile in the health / disease. This literature review aims to determine the importance of coordination and configuration of social networks and integrated continuous care in meeting social needs and health. The results confirm that the configuration and coordination of social networking with the health system to facilitate management of the network and its reach.

Palavras-Chave: Rede social, Rede de Cuidados Continuados Integrados, Enfermagem Comunitária

Keywords: Social Networking, Network Continuous Care, Community Nursing

AGOSTO 2014

CIÊNCIA & TÉCNICA

20

INTRODUÇÃO Na atualidade, Portugal está numa fase inicial da sociedade em rede. A governação da saúde na sociedade em rede justifica a redefinição do equilíbrio entre os mecanismos de influência (controlo social) em prol de redes de interação e cooperação (Sakellarides et al., 2007-2013). De acordo com o preâmbulo do Decreto-Lei nº 101/2006, de 6 de Junho, a constituição da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI), visa dar resposta às carências de cuidados, resultantes do aumento da prevalência de doentes crónicos com múltiplas cormorbilidades, do aumento de idosos com dependência funcional, de doentes incuráveis em estado avançado e em fase final de vida. Neste domínio, a intervenção articulada entre a saúde e a segurança social assenta num modelo de natureza preventiva, recuperadora e paliativa, num nível intermédio entre os cuidados de base comunitária e os de internamento hospitalar. Por cuidados continuados integrados define-se como o conjunto de intervenções sequenciais de saúde e ou de apoio social, resultante da avaliação conjunta focada na recuperação global, compreendida como o processo terapêutico e de apoio social, ativo e contínuo, que pretende promover o aumento da autonomia através da melhoria da qualidade de vida (artigo 3º, do Decreto lei nº101/2006). A RNCCI, criada no âmbito dos Ministérios da Saúde e do Trabalho e da Solidariedade Social é constituída por unidades e equipas de cuidados continuados de saúde, e ou apoio social, e de cuidados e intervenções paliativas, provenientes dos serviços comunitários de proximidade, envolvendo os hospitais, os centros de saúde, os serviços

distritais e locais, a segurança social, a rede solidária e as autarquias locais, e organiza-se a nível local e regional (artigo 2º, nº1 e nº2 do Decreto lei nº101/2006). Por rede social entende-se as relações e vínculos sociais entre os indivíduos que podem promover o acesso ou a mobilização do apoio social em virtude da saúde (Ordem dos Enfermeiros, 2011). Degenne e Forsé (2004) conceptualizam rede social como o conjunto de atores sociais aliados entre si através de relações interpessoais, que facilitam a transmissão de recursos que transpõem os limites formais. A aproximação entre a rede social e a rede de saúde, consiste em fazer a junção da rede social com a rede saúde e desta com redes de indivíduos, pois são estes que permitem funcionar as organizações (Gomide e Grossetti, 2009). Neste sentido tendo por base alguns princípios da rede como: a continuidade dos cuidados entre os diferentes serviços, sectores e níveis de diferenciação, mediante a articulação em rede; a proximidade da prestação dos cuidados, através do desenvolvimento do potencial dos serviços comunitários de proximidade e na multidisciplinariedade, interdisciplinaridade e intersetorialidade na prestação dos cuidados; esta revisão bibliográfica tem como objetivo determinar a importância da articulação e configuração das redes sociais e de cuidados continuados integrados, na satisfação das necessidades sociais e de saúde da comunidade, realçando o contributo do enfermeiro especialista em enfermagem comunitária e de saúde pública. A relevância desta revisão bibliográfica, parte do pressuposto que a saúde é produto de diferentes áreas, interligadas e interdependentes, o que significa que o enfermeiro

CIÊNCIA & TÉCNICA

especialista em enfermagem comunitária e de saúde pública pelas suas competências específicas, estabelece, com base na metodologia do planeamento em saúde, a avaliação do estado de saúde de uma comunidade e integra a coordenação dos Programas de Saúde de âmbito comunitário e na consecução dos objetivos do Plano Nacional de Saúde, sendo por isso, chamado a intervir em estreita colaboração com outros profissionais e sectores da sociedade, na equidade no acesso á saúde (Ordem dos Enfermeiros, 2010). Para Laverack (2008), a saúde é o produto de áreas diferentes, todavia estritamente relacionadas, designadamente a habitação, os transportes, o emprego, os serviços de saúde comunitários e o acompanhamento social. Para o mesmo autor, os promotores de saúde tem de laborar em cooperação com os profissionais de muitos outros setores, para desenvolver estratégias para combater a pobreza e as desigualdades sociais.

METODOLOGIA No sentido de sistematizar o estado da arte sobre a temática em estudo e partindo dos pressupostos anteriormente mencionados, realizamos uma revisão bibliográfica da literatura, no período entre Março a Maio de 2012, tendo sido delineadas as seguintes questões norteadoras da pesquisa: Qual a importância da articulação e configuração das redes social e de cuidados continuados integrados, na satisfação das necessidades sociais e de saúde da comunidade? Qual o contributo do enfermeiro especialista em enfermagem comunitária e de saúde pública na articulação e desenvolvimento do

potencial das redes, através dos diferentes recursos existentes na comunidade? Para a identificação e seleção dos artigos científicos a incluir nesta revisão, estabelecemos critérios de inclusão e exclusão e palavras-chave apropriadas, de acordo com as questões objeto desta revisão bibliográfica. Como Critérios de inclusão e de exclusão estabelecemos: 1. Estudos primários centrados na temática em estudo; 2. Estudos com evidência científica, quantitativos ou qualitativos; 3. Estudos com resultados acerca da análise da rede social no sistema de saúde; 4. Estudos em língua portuguesa e inglesa; 5. Estudos publicados a partir de 2002 até a data de pesquisa (30 de Abril de 2012, de acesso aberto e com texto integral (Full Text), na base de dados Scielo; 6. Estudos publicados a partir de 2007 até a data de pesquisa (30 de Abril de 2012, de acesso aberto e com texto integral (Full Text), na base de dados EBSCO Host. A determinação das palavras – chave levou através da sua intersecção, à obtenção da expressão de pesquisa estabilizada: ((“Rede” OR “Network”) AND (“Saúde” OR “Health”) AND (“Social”)). Esta expressão de pesquisa estabilizada, como estratégia final foi inserida na caixa de busca (search box) existente nas bases de dados eletrónicas selecionadas, para a pesquisa bibliográfica. As bases de dados electrónicas selecionadas foram: a MEDLINE, a Cochrane Database of Systematic Reviews, a CINAHL Plus, Education Research Complete, Medic Latina

21

AGOSTO 2014

CIÊNCIA & TÉCNICA

22

with Full Text e a Nursing Reference Center através da EBSCO Host; Scielo; e o Repositório Cientifico de Acesso Aberto de Portugal. Foram ainda consultadas as referências bibliográficas dos resultados de pesquisa obtidos, Google Books e o catálogo da Escola Superior de Enfermagem do Porto. Assim sendo, na totalidade foram filtrados 371 artigos, 99 obtidos em bases de dados a partir da EBSCOhost Web e 273 artigos na base de dados eletrónica Scielo, pelo método integral de pesquisa em Portugal e no Brasil. No que respeita à base de dados Scielo, após leitura dos títulos, foram selecionados 15 artigos para leitura dos respetivos resumos e destes foram selecionados cinco artigos para leitura do texto na íntegra, tendo sido selecionados quatro artigos. Dos artigos obtidos a partir da EBSCOhost Web: 75 estavam indexados na CINAHL Plus e 24 na Academic Search Complete. Após leitura dos títulos foram selecionados 13 artigos para leitura dos respetivos resumos, tendo sido selecionados cinco artigos para leitura do texto na íntegra, e destes, selecionamos um artigo, de acordo com os critérios de inclusão/exclusão. Assim sendo, desta pesquisa resultaram na totalidade cinco artigos.

ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Para avaliar a qualidade das evidências o profissional de saúde deve compreender a abordagem metodológica na qual a pesquisa esta inserida (Galvão et al., 2003). Em argumento das questões norteadoras e do objetivo desta pesquisa, bem como dos referencias bibliográficas, na análise do rigor metodológico dos estudos, seguidamente,

apresentamos um quadro (quadro 1) resumo com as características dos estudos obtidos, quanto: aos objetivos, aos métodos, aos participantes e aos resultados. No mesmo quadro, a numeração atribuída aos estudos diz respeito a uma ordenação crescente da data de publicação dos mesmos. Em complementaridade á análise do rigor metodológico dos estudos, sucede-se a sua discussão. Este argumento desafiou á reflexão acerca do contributo do enfermeiro especialista em enfermagem comunitária e de saúde pública na articulação e desenvolvimento do potencial das redes, através dos diferentes recursos existentes na comunidade. O estudo 1 de Andrade e Vaitsman (2002), tendo como referência os conceitos de rede social, apoio social e empowerment, evidenciou que a ALpviver formada a partir da iniciativa de duas enfermeiras, através de ações de apoio social possibilitou a formação e o estreitamente de uma rede de solidariedade social. Essas ações constituíram mecanismos de aproximação dos pacientes em direção a objetivos comuns, contribuindo para o seu empowerment no sentido do desenvolvimento e descoberta de capacidades individuais, do aumento da autoestima e de um papel de sujeito ativo, num processo de construção da saúde e na edificação de uma sociedade mais participativa neste contexto, reconstituindo novas redes de relações sociais. Os autores, salientam que a participação dos pacientes nos serviços de saúde através de uma maior democratização da informação e reconhecimento dos usuários no processo de cuidado com a saúde, contribuiu para minimizar as condições sociais e de saúde adversas, perante um modelo assistencial extremamente centralizado no médico (pa-

CIÊNCIA & TÉCNICA

QUADRO 1 – Resumo dos artigos filtrado Estudo

1

2

3

Título

Apoio Social e Redes conetando Solidariedade e Saúde

Autores, Ano e País

Andrade, G.; Vaitsman, J. 2002, Brasil

Confiabilidade Teste-reteste de aspetos da Griep, R. et al, Rede Social no 2003, Brasil Estudo Pró-Saúde

Rede Social no Sistema de Saúde: um estudo das rela- Bittencourt, ções interoga- O. ; Neto, F. , 2009, Brasil -nizacionais em unidades de serviços de HIV/AIDS

Objetivo(s)

Participantes

Metodologia

Resultados

A ALpViver proporciona uma maior integração entre os pacientes, os proAnalisar o papel fissionais de saúde, Profissionais da Associação familiares e amigos, de saúde hosLutando para formam laços de pitalares (N=5) Viver (ALpViamizade e fortalece a Estudo Qualie pacientes ver), na visão rede social dentro do tativo Followde profissionais com maior hospital. Em direção -up: Janeiro de saúde e pa- assiduidade a objetivos comuns, a Outubro de cientes, a partir no quotidiano contribuindo para o 2000 da ALpViver dos conceitos seu empowerment no de rede social, (N=6) desenvolvimento e (N=11) apoio social e descoberta de capaciempowerment dades individuais, do aumento da autoestima e de um papel mais ativo

Avaliar os níveis de confiabilidade de teste-reteste de informações relativas a rede social no Estudo Pró-Saúde

Demonstrar as contribuições da análise de rede social para os sistemas de saúde, identificando padrões e estruturas na rede de serviços dirigidos a portadores de HIV/ AIDS

Funcionários técnico-administrativos de uma universidade pública do Rio de Janeiro (N=192)

Responsáveis técnicos de unidades de saúde especializadas em HIV de Porto Alegre (N=11)

As informações fornecidas pelos participantes sobre a maioria das componentes de rede social apreEstudo de sentam altos níveis Coorte de confiabilidade e Follow-up: reforçam o uso das Agosto a perguntas utilizadas Novembro de sobre a rede social 1999 em investigações de diversos desfechos relacionados com a saúde Há inúmeras características a serem observadas nas transações interinstitucionais, como a governança, a estrutura e a Estudo de caso. Follow- dinâmica da rede. As -up: Outubro unidades estudadas 2004 a Janei- funcionam como redes de serviços muito ro de 2005 frágeis, sem evidentes ações de parcerias e sem marcantes ações de governança (Cont)

23

CIÊNCIA & TÉCNICA

AGOSTO 2014

4

24

5

Atenção Domiciliar como Mudança do Modelo tecno-assisten-cial

Rede e Apoio Social Familiar no seguimento do Récem-Nascido Pré-Termo e Baixo Peso ao Nascer

Silva, K. et al, 2010, Brasil

Viera, C. et al, 2010, Brasil

Cinco instituições de saúde: Analisar práticas quatro serviços de atenção domi- de atenção ciliar de serviços domiciliar e um ambulatórios e serviço de um hospitalares e sua hospital filantróconstituição como pico, desenvolrede de substitui- vidos pela rede ção dos cuidados de serviços de de saúde saúde no âmbito do sistema único de saúde (SUS)

Identificar a rede social e apoio social de famílias com filhos pré-termo (PT) e baixo peso ao nascer ao nascer (BPN) com alta clínica da unidade de terapia intensiva neonatal (UTIN)

radigma biomédico). Portugal (2005) reforça que os indivíduos obtêm pelos laços sociais aquilo que não conseguem pelo vínculo de cidadania: serviços públicos eficientes e de qualidade. No estudo 2 de Griep et al.. (2003), os autores concluíram que o processo de avaliação sobre a maioria dos componentes de rede social, investigados através de um questionário, apresentaram altos níveis de confiabilidade, e por isso elevada estabilidade das informações colhidas no Estudo Pró - Saúde. Os resultados alcançados reforçam a importância de incluir questões sobre rede social em investigações de diversos desfechos re-

Seis famílias de crianças de PT e BPN com alta clínica do UTIN, totalizando 22 participantes entre famílias e crianças (N=22)

A atenção domiciliar possui potencial para constituir uma rede de cuidados, com potencia para contribuir para a Estudo Qualita- continuidade e a intetivo com base gralidade da assistência na metodolono domicilio, ao progia traçador. duzir novos modos de Realizado de cuidar que atravessam 2005 a 2007 os projetos dos usuários, dos familiares, da rede social e dos trabalhadores da atenção domiciliar

Estudo Descritivo

As famílias estão apoiadas pelos seus familiares. No entanto com as instituições governamentais e com os profissionais de saúde apresentam um vínculo frágil e superficial. A intersetorialidade e a integração entre os serviços são vulneráveis, uma vez que não há referenciação e contra referenciação das famílias para os demais setores da sociedade, de forma a minimizar os problemas que enfrentam no acompanhamento dos bebés

lacionados à saúde. Os autores evocam para a carência de informações sobre a confiabilidade dos instrumentos utilizados para avaliar os componentes de rede social, em investigações epidemiológicas e para a necessidade de análises posteriores sobre a validade do questionário, de forma, a completar a sua validação psicométrica, o que poderá contribuir para a decisão de utilizar um índice de rede social. Neste domínio, dada a influência dos determinantes sociais na saúde das comunidades, o enfermeiro especialista em enfermagem comunitária e de saúde pública, estabelece com base na metodologia do planeamento em saúde a avaliação do esta-

CIÊNCIA & TÉCNICA

do de saúde de uma comunidade e coopera na vigilância epidemiológica de âmbito geo - demográfico, desempenhando um papel preponderante no desenvolvimento de estudos adicionais sobre a validade deste tipo de questionários, que abrangem variáveis relacionadas não só à rede social como à RNCCI, variáveis estas preditoras de desfechos de saúde na comunidade. Desde que se começou a questionar importância relativa dos sistemas de prestação de cuidados de saúde, a tendência tem sido a de desenvolver investigação que mostre a importância dos diversos determinantes de saúde. (Sakellarides et al., 2007-2013). A saúde não se reduz nas pessoas somente pelos serviços de saúde, mas resulta das capacidades e iniciativas individuais em interação com a sua rede social de apoio e o seu meio ambiente físico e social (Observatório Português dos Sistemas de Saúde, 2003). No estudo 3 de Bittencourt e Neto (2009), para evidenciar as contribuições da análise de rede social para o sistema de saúde, os autores pesquisaram cinco tipos de relacionamentos que demonstram a dinâmica e a estrutura de uma rede de serviços: referência de transferência, referência de admissão, coordenação de caso, programas conjuntos e consultorias. Os resultados indicaram uma fraca dinâmica na rede, sobretudo nos relacionamentos que não envolveram a permuta de pacientes, alvitrando que se há instrumentos estabelecidos, como a marcação de consultas, há uma maior dinâmica na rede; pelo contrário, apenas se observaram iniciativas locais ou pessoais, que resultaram em pouca ou nenhuma ação dos serviços. Os autores

concluíram que a integração e a coordenação entre unidades da rede de saúde são altamente desejáveis. Para Gomide e Grossetti (2010), a análise de redes sociais é um instrumento adequado e estruturado, capaz de auxiliar as investidas avaliativas relacionadas aos serviços e programas de saúde, realçando os diferentes resultados alcançados pelos mesmos. É fundamental que o enfermeiro especialista em enfermagem comunitária e saúde pública adeque o uso deste instrumento na sua prática clínica, na medida em que uma das suas competências consiste em integrar a coordenação dos programas de saúde de âmbito comunitário e consecução dos objetivos do Plano Nacional de Saúde (Ordem do Enfermeiros, 2010). Os autores Silva et al. (2010) (estudo 4) afirmam que, a atenção domiciliar tem potencial para a transformação das práticas em saúde. É possível criar um novo ambiente de cuidado, fundado por valores e crenças quotidianas no domicílio. O que configura formas inovadoras de produção de projetos terapêuticos entre usuários, familiares, rede social e profissionais de saúde (médicos e enfermeiros), que continuam a ser estratégicos e nucleares, pois são eles que prescrevem os cuidados a ser administrados na complexidade do cuidar. A transição para uma sociedade em rede, é sustentada pela transformação das relações entre as hierarquias, as interfaces transacionais, os espaços concorrências dos mercados e as redes e dos diversos mecanismos de cooperação nos sistemas de saúde, e no modo como os intervenientes da saúde se relacionam com estes mecanismos de influência (Sakellarides et al., 2007-2013).

25

AGOSTO 2014

CIÊNCIA & TÉCNICA

26

No Estudo 5, de Viera et al. (2010), os resultados indicam que a rede social das famílias em estudo se constituiu, sobretudo, pelas instituições de saúde, da igreja, e de algumas instituições para atividades de lazer, sendo o serviço de saúde o mais distante da maioria das famílias. Quanto ao apoio social das famílias, realçaram os parceiros, os membros da família extensa, os amigos, e outras pessoas com as mesmas experiências. A família extensa representou para as famílias o seu mais constante apoio, assim como o vínculo com o profissional médico. A manutenção de vínculos com a equipa de enfermagem da UTIN após alta hospitalar, também se constituiu como uma importante fonte de apoio social, demonstrado pela confiança adquirida durante o período de hospitalização. Neste estudo, a família que se encontrava em situação de vulnerabilidade social, surgiu num contexto de rede e apoio sociais fragilizados. Os profissionais de saúde, em especial o enfermeiro, deve conhecer quem e o que faz parte da rede de relações da família, no contexto em que está inserida, de modo a promover em parceria com a mesma, fontes de apoio e rede sociais. Para Vieira et al. (2009), a condição social, económica, cultural, educacional, o apoio social e as características individuais e familiares atribuem diferentes formas de encarar e responder perante o processo saúde/doença. Estes pressupostos vão de encontro às competências do enfermeiro especialista em enfermagem comunitária e de saúde pública, no que respeita à participação, em parcerias com outras instituições da comunidade e com a rede social e de saúde, em projetos de intervenção comunitária dirigidos a grupos com maior vulnerabilidade.

CONCLUSÃO Com argumento nos resultados obtidos pelos vários autores, corroboramos a importância da configuração e da articulação das redes sociais com o sistema de saúde na gestão das redes e do seu alcance, em benefício da saúde das comunidades na singularidade dos seus indivíduos. A rede social em saúde tem potencial para contribuir para a continuidade e para a integralidade dos cuidados de saúde, e para a satisfação das necessidades sociais e de saúde da comunidade, na mitigação das desigualdades sociais. O enfermeiro especialista em enfermagem comunitária e de saúde pública pode contribuir na articulação e no desenvolvimento do potencial da rede social para o sistema de saúde, nomeadamente para a RNCCI, com base nos recursos existentes na comunidade. No entanto, as dimensões relacionadas à rede social e aos cuidados de saúde viabilizadas através da operacionalização na RNCCI, ainda estão pouco explorados razão pela qual é colocado como um desafio para futuras investigações. As carências do sistema de saúde são colmatadas pela articulação das redes e fundam-se nas responsabilidades individuais e coletivas da sociedade e do Estado, que são simultaneamente inclusivas e excludentes; protetoras para quem faz parte, mas indiferentes para quem esta fora. A configuração e articulação das redes sociais com a RNCCI, impõem-se como um dos principais motores e simultaneamente, pilar de sustentação do sistema de saúde.

CIÊNCIA & TÉCNICA

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA ANDRADE, Gabriela ; VAITSMAN, Jeni – Apoio Social e Redes: Conectando Solidariedade e Saúde [Em Linha] Rio de Janeiro: 2002. [Consult. 30 Abril 2012]. Disponível em WWW:. BITTENCOURT, Otávio ; NETO, Francisco – Rede Social no Sistema de Saúde: Um Estudo das Relações Interorganizacionais em Unidades de Serviços de HIV/ AIDS. RAC, CURITIBA [Em Linha]. Vol.13, nº6 (Jun. 2009), p.87-104. [Consult. 30 Abril 2012]. Disponível em WWW:. DECRETO-LEI nº101/06. D.R. I Série. Nº 109 (06-0606), p.3856-3865. DEGENNE, Alain ; FORSÉ, Michel – Les Réseaux Sociaux: Une Analyse en Structurale en Sociologie Paris: A. Colin, 1994. GALVÃO, C.; SAWADA, N.; MENDES, I. – Na busca das melhores evidências – Revista da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto USP. [Em linha]. 2003, p.43-50. [Consult. 9 Mai. 2012]. Disponível em WWW:. GOMIDE, Marcia ; GROSSETTI, Michel – Rede Social e Desempenho de Programas de Saúde: Uma Proposta Investigativa. Physis Revista de Saúde Coletiva [Em Linha]. Vol. 20, nº 3 (Jan. 2010), p.873-893. [Consult. 30 Abril. 2012]. Disponível em WWW: . GRIEP, Rosane Harter [et al..] – Confiabilidade Teste-Reteste de Aspectos da Rede Social no Estudo Pró-Saúde. Revista Saúde Pública [Em Linha]. Vol. 37, nº3 (2003), p. 379-85. [Consult. 30 Abril 2012]. Disponível em WWW:. LAVERACK, Glenn – Promoção da Saúde: Poder e Empoderamento. Loures: Lusodidacta, 2008. OBSERVATÓRIO PORTUGUÊS DE SISTEMAS DE SAÚDE – Saúde: Que Rupturas? Relatório de Primavera de 2003. [Em Linha] . Lisboa: Escola Nacional de Saúde Pública, 2003. [Consult. 7 de Maio 2012]. Disponível em WWW:.

ORDEM DOS ENFERMEIROS – Proposta dos Padrões de qualidade dos Cuidados Especializados em Enfermagem de Saúde Familiar. Assembleia do Colégio da Especialidade de Enfermagem Comunitária: Lisboa, 2011. ORDEM DOS ENFERMEIROS – Regulamento das Competências Específicas do Enfermeiro Especialista em Enfermagem Comunitária e de Saúde Pública [Em linha]. 2010 [Consult. 20 Abril. 2012]. Disponível em WWW:. PORTUGAL, Sílvia – Quem tem Amigos tem Saúde: O Papel das Redes Sociais no Acesso aos Cuidados de Saúde. Simpósio Família, Redes Sociais e Saúde [Em Linha]. (2005). [Consult. 7 Maio 2012] Disponível em WWW:URL: . SAKELLARIDES, Constantino [et al.] – O Futuro do Sistema de Saúde Português: Saúde 2015. Escola Nacional de Saúde Pública: Universidade Nova de Lisboa, 2007. SILVA, Kênia Lara [et al] – Atenção Domiciliar como Mudança do Modelo Tecnoassistencial. Revista Saúde Pública [Em Linha] Vol. 44, nº1 (2010), p.166-76. [Consult. 30 Abril 2012]. Disponível em WWW:. VIEIRA, S. S. ; DUPAS, G. ; FERREIRA, N. M. L. A. – Doença Renal Crônica: Conhecendo a Experiência da Criança. Esc Anna Nery Ver Enferm [Em Linha] Vol. 13, nº1 (2009) p.74-83. [Consult 30 Abril 2012]. Disponível em WWW:. VIERA, Cláudia Silveira [et al] – Rede Social Familiar no Seguimento do Recém-Nascido Pré-Termo e Baixo Peso ao Nascer. Revista Electrônica de Enfermagem [Em Linha] Vol.12, nº1 (Mar. 2010), p.11-9. [Consult. 30 Abril 2012]. Disponível em WWW:.

27

CIÊNCIA & TÉCNICA

ENTRADA DO ARTIGO MARÇO 2013

OS ENFERMEIROS E A VACINAÇÃO DO HPV

AGOSTO 2014

PAULA SARREIRA DE OLIVEIRA Enfermeira

28

RESUMO Para o êxito dos programas de vacinação, de nada adianta a segurança e eficácia das vacinas se os profissionais de saúde não os utilizarem ou a população não aderir. Nenhuma ação em saúde é tão efetiva e eficiente quanto vacinar. Uma serie de comportamentos de um indivíduo, com caraterísticas semelhantes, denominamos de atitudes desse indivíduo. Assim a atitude pretende ser, um mediador entre a forma de agir e a forma de pensar dos indivíduos. Este artigo pretende analisar o conhecimento, atitudes e necessidades de informação dos enfermeiros relativamente à prevenção e vacinação da Vírus do Papiloma Humano (HPV) em raparigas adolescentes nascidas em 1992, 1995 e 1996. Optou-se pela pesquisa quantitativa, com carácter exploratório e descritivo procurando trabalhar com o universo de conhecimentos e atitudes. Através da realização da recolha de dados por questionário auto preenchido, voluntário e anónimo com questões fechadas. Os enfermeiros demonstraram conhecimentos sobre a temática, destacando-se a necessidade de desenvolverem processos educativos que favoreçam a participação da comunidade. As áreas mais sensíveis de intervenção estão relacionadas com a aquisição de conhecimentos e habilidades para lidar com a problemática de saúde da população, com base no perfil epidemiológico. Palavras-Chave: Vacinação, HPV, Enfermeiros, Atitudes; Valores.

ABSTRACT For the success of vaccination programs is useless safety and efficacy of vaccines if health professionals do not use them or the people don’t adhere to the vaccination. No action on health is as effective and efficient as vaccinate to prevent major diseases. In the presence of a series of behaviours of an individual with similar characteristics, we call that individual attitude. Thus the attitude you want to be a mediator between the way of acting and thinking of individual. Account the problem was defined to analyse the knowledge, attitudes and information needs of nurses on prevention and vaccination Papilloma Virus (HPV) in adolescent girls born in 1992, 1995 and 1996. The study is based on an exploratory and descriptive, for quantitative research, seeking to work with the universe of knowledge and attitudes. The technique chosen to perform the data collection was a questionnaire filled out self, voluntary, and anonymous with closed questions. Nurses demonstrated knowledge of the subject, emphasizing also the need to develop educational processes that foster community participation. The most sensitive areas of intervention are relative to the acquisition of knowledge and skills to deal with the problem of population health, based on the epidemiological profile. Keywords: Vaccination; HPV; Nurses; Attitudes; Values

CIÊNCIA & TÉCNICA

29

INTRODUÇÃO A Epidemiologia tem demonstrado a vacinação como uma das medidas de maior impacto na prevenção primária, sendo de grande eficácia na prevenção e erradicação de infeções. Além de ser um instrumento importante para a saúde na missão de proteger a pessoa, o seu objetivo é o de conferir que a imunidade seja conseguida numa maior percentagem possível de indivíduos, com o menor risco possível de efeitos adversos, e menor custo. Além disso, também para aqueles que não foram vacinados, quanto maior o número de pessoas vacinadas, menor é a possibilidade de contágio da doença. No entanto para que esse sucesso seja efetivo terá que existir por parte dos profissionais quer por parte da população uma forte adesão, de modo a que os valores de imunidade re-

comendados sejam conseguidos. De modo a atingir este sucesso, a literatura apresenta e discute estratégias para ampliação das coberturas vacinais, incentivando o desenvolvimento das pesquisas sobre imunogenicidade, reatogenicidade e eficácia dos imunobiológicos.1 Com base na evidência proporcionada pela investigação, procura-se que a enfermagem encontre caminhos nesta área, proporcionando contributos para uma melhoria nas condições de prevenção, detecção, atendimento e encaminhamento das crianças e jovens. Este estudo tem como objetivos analisar os conhecimentos, as atitudes e as necessidades de informação dos enfermeiros do ACES Arco Ribeirinho em matéria de prevenção da HPV em raparigas nascidas em 1992, 1995 e 1996 e determinar os fatores

AGOSTO 2014

CIÊNCIA & TÉCNICA

30

associados à promoção da vacinação contra infecções por HPV dos enfermeiros que vacinam do ACES Arco Ribeirinho.

permitindo-nos, em determinados momentos, tomar as nossas posições face às dos outros2.

REFERENCIAL TEÓRICO Com a finalidade de identificar as atitudes, os conhecimentos e os valores dos enfermeiros que vacinam, optou-se por um referencial que facilitasse uma leitura do conceito construído a partir daqueles que exercem o seu trabalho nesta área do cuidar. Utilizou-se a Teoria de Allport (1935) que refere as atitudes como bons predictores de comportamento. Este autor refere que as atitudes sociais desempenham funções específicas para cada um de nós, são a base de uma série de situações sociais importantes, tais como as relações de amizade e de conflito. Referiu também que, a atitude é um estado de preparação mental ou neural, organizado através da experiência e exercendo uma influência dinâmica sobre as respostas individuais a todos os objetos ou situações que se relaciona, para este domínio do conhecimento, a atitude pretende ser "um mediador entre a forma de agir e a forma de pensar dos indivíduos"2 (p. 168). Assim, as atitudes têm uma forte ligação com os comportamentos e são inferidas, ou seja, são do campo da acção e não são directamente observáveis. Divergindo em muitos aspetos, as diferentes definições propostas para o conceito de atitude têm, no entanto, alguns pontos comuns. Primeiro as atitudes têm origem nas experiências subjetivas, segunda as atitudes são tomadas face a um objeto e por último as atitudes incluem sempre uma dimensão avaliativa2. Assim, as atitudes são fruto de interações sociais, obtidas por processos de comparação, identificação e diferenciação

TRAJETÓRIA METODOLOGICA Na realização deste trabalho utilizamos um tipo de estudo exploratório, descritivo, de abordagem quantitativa, com amostragem não probabilística por conveniência. Na pesquisa efetuada tivemos dificuldade em encontrar um questionário adaptado para a população do nosso estudo, confrontando-nos então com a necessidade de construir um instrumento próprio. Antes da aplicação do instrumento de colheita de dados, foi aplicado um pré-teste numa amostra aleatória. Da sua aplicação não se verificou a necessidade de reformulação do questionário. Assim, o questionário foi aplicado a uma amostra (n=30) constituída por dois enfermeiros de cada Unidade de Saúde do ACES Arco Ribeirinho que vacinavam, tendo em conta que existe sempre um enfermeiro que vacina e outro que o pode substituir. Os dados foram recolhidos através de questionário anónimo, com o tempo médio de preenchimento de 15 a 20 minutos. Foram enviados via correio eletrónico para os Enfermeiros Interlocutores de cada Unidade de Saúde e preenchidos pelos enfermeiros que vacinavam, nas suas Unidades de Saúde. Para a análise e tratamento dos resultados utilizou-se o programa SPSS (Statistical Package for Social Sciences), versão 16.

ANÁLISE E DISCUSSÃO Como primeira análise dos dados deste trabalho podemos referir que a maioria da amostra era do sexo feminino. Os sujeitos

CIÊNCIA & TÉCNICA

estudados possuíam idades compreendidas entre os 32 e os 50 anos, sendo que a média de 38,93 anos com o desvio-padrão=9,845. Quanto à distribuição dos elementos por categoria profissional verifica-se que 20 (71,4%) são enfermeiros graduados. Esta distribuição profissional da amostra não traduz por si só significado. Pois, se por um lado poderá significar o assegurar das necessidades básicas, como o desenvolvimento afectivo, físico e intelectual, ao mesmo tempo que, pode ser garantido o avanço na construção do conhecimento, ao ser mobilizado as competências relativas a cada área. A maior percentagem das enfermeiras da nossa amostra 9 (32,1%) trabalha há mais de 10 anos e 9 (32,1%) há mais de 5 anos no Programa de Vacinação, o que pressupõe maior experiência profissional. Associa-se a isso a expressiva referência relativamente aos conhecimentos sobre a vacina, ou seja 15 (53,6%) enfermeiros, consideraram os seus conhecimentos como Muito suficientes. Relativamente á atitude de recomendação dos benefícios da vacinação contra o HPV verifica-se que 22 (78,6%) das enfermeiras refere/ recomendar Sempre quais os benefícios da vacina. Quanto à atitude de recomendação da vacinação do HPV, averigua-se que 25 (89,3%) das enfermeiras recomenda Sempre a sua inoculação. Esta constatação6,7 sugere que o sucesso deste programa de imunização vai depender em grande parte, dos prestadores de cuidados de saúde, ao reconhecer a importância da Imunização para os adolescentes e pré-adolescentes. Aquando da administração da vacina os enfermeiros esclarecem quanto à utilidade desta e qual o microrganismo causador observando-se também que 18 (64,3%) da

amostra respondeu que falava Sempre, sobre a utilidade da vacina e qual o microrganismo causador. Em relação à eficácia da vacina, apurou-se que 12 (42,9%) das enfermeiras falavam Sempre sobre a mesma. Na sensibilização para a importância do cumprimento do esquema vacinal, observa-se que 26 (92,9%) dos enfermeiros referiu alertar Sempre para o cumprimento do esquema vacinal, o que vai de encontro ao recomendado pela Características do Medicamento8, que salienta a necessidade da adolescente completar o ciclo vacinação de três doses, caso contrário poderá não ficar totalmente protegida. Verificou-se que relativamente à questão do HPV ser a infecção sexualmente transmissível mais comum, 12 (46,4%) dos elementos da nossa amostra referiu Concordar Fortemente, ou seja a literatura refere que “ (…) a infeção por HPV é a infecção sexualmente transmissível com maior prevalência no mundo inteiro”9 (p.128). Na questão referente á percentagem da população infetada com HPV, verificou-se que 11 (39,3%) das enfermeiras da nossa amostra respondeu Concordar Fortemente com a afirmação de que mais de 50% da população já foi infectada com o HPV. O que vai de encontro10 ao (p. 128), “ (…) acredita-se que 70-80% das mulheres sexualmente activas irão estabelecer contacto, nalgum momento, com o vírus e sabe-se hoje que 99,7% dos Cancro do Colo do Útero estão associados à infecção por HPV”. As mulheres11 com infeção recorrentes de HPV têm 300 vezes mais probabilidade de ter Cancro do Colo do Útero. Na questão referente ao teste de Papanicolau ter uma sensibilidade de deteção do HPV superior a 50%, 14 (50%) enfermei-

31

AGOSTO 2014

CIÊNCIA & TÉCNICA

32

ros da amostra Concorda Fortemente. Como se trata de uma doença silenciosa o rastreio é fundamental uma vez que, quando detetada precocemente e numa fase inicial, o tratamento tem uma taxa de sucesso de 100%. O rastreio12 sistemático através do exame Citológico reduz significativamente a incidência de Cancro do Colo do Útero, ou seja são identificadas 30% das situações malignas. Na questão referente ao conhecimento sobre a possibilidade do Cancro do Colo do Útero poder ser causado por genótipos do HPV específicos, observou-se que 20 (71,4%) da amostra refere ter este conhecimento. Na afirmação referente á existência de certos genótipos específicos responsáveis pela maioria das verrugas anogenitais, 19 (67,9%) das enfermeiras respondeu Concordar Fortemente. Não existe uma caraterização epidemiológica dos tipos de HPV que ocorrem na população feminina portuguesa, no entanto, a DGS12 assume-se que os genótipos de HPV em Portugal tenham de um modo geral, uma distribuição semelhante à de outros países da Europa comunitária. Assim, os genótipos 16 e 18 são os mais prevalentes e responsáveis por cerca de 70 a 75% dos casos do Cancro do Colo do Útero”14. Segundo a Sociedade Portuguesa de Ginecologia15, os condilomas acuminados anais nem sempre estão relacionados com o coito anal, já que podem propagar-se através das secreções vulvares. Sendo fundamental a exploração sistemática para a sua deteção. Relativamente aos conhecimentos sobre a vacina do HPV, 15 (53,6%) das enfermeiras considerou os seus conhecimentos como Muito suficientes. Os efeitos do desenvolvimento dos conhecimentos em enfermagem são moldados pela orientação prática, o que por sua vez, modela a perspetiva de enfer-

magem16. Essa perspetiva reflete o interesse dos enfermeiros em, conceder à disciplina de enfermagem os conhecimentos relacionados com os cuidados e de acordo com os utentes. Quanto à fonte de formação, 8 (28,6%) das enfermeiras referiram as Orientações Técnicas da Direcção Geral da Saúde como a fonte por excelência da sua formação, o que sugere a sua valorização e demonstra a sua credibilidade de informação. Ressalta-se a importância da educação contínua no local de administração uma vez que novas vacinas são adicionadas, novos conhecimentos adicionados, tornando imprescindível a capacitação na prática quotidiana das enfermeiras. A importância da educação continuada deve-se ao facto de se privilegiar as oportunidades educativas surgidas no quotidiano dos trabalhadores de saúde. A partir da análise do contexto podem ser estabelecidas opções através das quais se indicariam alternativas para desenvolver o processo de capacitação, tais como o desenvolvimento de conhecimentos e habilidades que17 poderão adquirir-se gradual e progressivamente de acordo com o problema e relacionando com o objetivo educacional. Os enfermeiros procuram o conhecimento dos seres humanos relativamente às respostas para a saúde e doença de forma a poder ajudar na vigilância e promoção da saúde, para ajudar no seu cuidado, a fim de contribuir para promover o auto-cuidado e para ajudar na capacitação e desenvolvimento na utilização dos recursos 18. A meta do desenvolvimento do conhecimento em enfermagem é a compreensão das necessidades das pessoas de cuidados de enfermagem, de forma a aprender a cuidar melhor. Portanto, as atividades do cuidar em que os enfermeiros estão envolvidos

CIÊNCIA & TÉCNICA

numa base diária pode ser o foco para o desenvolvimento do conhecimento e pode ser congruente com actividades desenvolvidas na estruturação do conhecimento, essencialmente porque o alvo dos cuidados é igual em ambas as áreas, ou seja o ser humano. A literatura refere dois tipos de metas do desenvolvimento de conhecimento que conduzem a atividades e progressos no conhecimento. Existe "o conhecimento em prol do conhecimento" e o conhecimento para fornecer melhores cuidados de enfermagem através da resolução dos problemas centrais de preocupação para a disciplina19,20. A enfermagem como uma disciplina e os enfermeiros como investigadores a sua missão é a de cuidar das pessoas e aumentar o seu bem-estar, e não só participar no desenvolvimento de conhecimentos em prol do desenvolvimento dos mesmos. Nas formas de transmissão de formação, 15 “(…) as práticas são definidas por múltiplos fatores (conhecimento, valores, relações de poder, organização do trabalho etc.); a aprendizagem dos adultos requer que se trabalhe com elementos que “façam sentido” para os sujeitos envolvidos (aprendizagem significativa)” (p.25). Os efeitos do desenvolvimento dos conhecimentos em enfermagem são influenciados pela orientação prática, o que por sua vez, modela a perspetiva de enfermagem15. Essa perspetiva reflete o interesse dos enfermeiros em, habilitar a disciplina de enfermagem com conhecimentos relacionados com os utentes com o objetivo de melhorar o seu bem-estar e capacitá-los de acordo com as suas necessidades. Essa capacitação para o auto cuidado é feita através da utilização de métodos de planeamento dos recursos disponíveis e criando novos recursos. Se estes são os principais

objetivos para o desenvolvimento de conhecimentos em enfermagem, então temos de considerar a abordagens de desenvolvimento de conhecimentos que tornam possíveis estes fins. A saúde é também uma perspetiva que define o que consideramos nas nossas avaliações, na aplicação do plano de cuidados, na consideração das mudanças ocorridas depois das nossas intervenções.20 Com o processo de enfermagem, as enfermeiras descobrem forças de saúde, mobilizam essas forças, e apoiam os recursos disponíveis para que os utentes possam tomar decisões no seu processo de doença/saúde. O sucesso21 da imunização deve ser garantido, pelo facto de que a saúde e os custos económicos das infeções provocadas pelos microrganismos são substanciais. Continua referindo a importância do sucesso dos Programas de Imunização das Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST), sugerindo de que o sucesso na diminuição das infeções serão substanciais e de fácil comprovação relativamente ao custo-benefício desse mesmo Programa. No entanto, o sucesso22 destes programas depende das taxas de aceitação entre a maioria das pessoas em risco. Estudos realizados relativamente a outras vacinas como hepatite B, influenza e varicela demonstram que a disponibilidade de vacinação não garante uma adesão generalizada. Sugerem portanto que, se deve progredir para a avaliação da determinação dos potenciais de aceitação. Quanto à administração da vacina, 28 (100%) das enfermeiras refere Concordar Fortemente na administração da vacina a todas a raparigas antes de serem sexualmente activas e 16 (57,1%) das enfermeiras referem Concordar Fortemente quanto a esta ser administrada a todos os rapazes antes de serem sexualmente ativos. Estes resulta-

33

AGOSTO 2014

CIÊNCIA & TÉCNICA

34

dos vão de encontro ao referenciado pelo Institute of Medicine dos Estados Unidos da América no seu documento, “Vacinas para o século 21”,23 onde é realçado que idealmente, um programa de imunização eficaz para as Infecções Sexual Transmissíveis deve incluir jovens adolescentes, de preferência antes de se tornarem sexualmente ativos. As estratégias de imunização das IST´s voltados para os pré-adolescentes e adolescentes vão colocar a maior parte da responsabilidade da decisão sobre os pais e os prestadores de cuidados de saúde. Um estudo sobre a vacinação da hepatite B em adolescentes evidenciou que o melhor preditor da aceitação parental foi a convicção com que o enfermeiro conseguiu transmitir a importância que dava à vacinação.13 No entanto, os resultados indicaram que, existia por parte dos profissionais o reconhecimento da importância da vacinação dos rapazes como uma importante estratégia de proteção das mulheres, visto serem os principais veículos de transmissão do vírus. No caso do HPV a vacinação nos homens tem uma eficácia quase de 100%. A OMS recomenda que se passe a vacinar os rapazes depois da cobertura completa das raparigas. Fica claro que, para existir proteção geral da população, a imunização para as DST deve ser efetuada aos adolescentes antes do início da atividade sexual, de preferência, ou o mais tardar entre 11 e os 12 anos de idade. O sucesso dos programas de imunização6,7 vai depender em grande parte, dos prestadores de cuidados de saúde, ao reconhecer a importância da Imunização para os adolescentes e pré-adolescentes. No entanto os mesmos autores mencionam que existe por parte dos profissionais dos cuidados de saúde primários, resistência

em discutir com os adolescentes e com os pais assuntos relacionado com a sexualidade. Para as vacinas das DST25,22 encontraram vários determinantes de aceitação. Nestes estão incluídos determinantes como as crenças individuais e atitudes, acerca das caraterísticas da vacina. Foram 26,22encontrados determinantes de aceitação relacionados com a saúde dos indivíduos. O facto de existe 27um número crescente de enfermeiros envolvidos nos Cuidados de Saúde Primários e consequentemente um aumento das intervenções de enfermagem reflete-se 28 na melhoria das taxas de vacinação. Pesquisas anteriores29 sugerem que as práticas dos prestadores de cuidados de saúde são influenciadas por normas sociais percebidas. Essa descoberta, segundo o mesmo autor, indica que as normas sociais percebidas, como as recomendações feitas pelos profissionais, organizações profissionais, influenciam significativamente a educação dos adolescentes sobre as DST. Na possibilidade da data do início do rastreio citológico ser protelado nas mulheres imunizadas para o HPV, 25 (89,3%) das enfermeiras respondeu Não concordar. Quanto à possibilidade de Reduzir o rastreio Citológico nas mulheres vacinadas, observou-se que 25 (89,3%) das enfermeiras respondeu que Não Concordava. Esta concordância vai de encontro ao referido por Wright et al30 ao afirmar que as mulheres com maior risco de Cancro do Colo do Útero são aquelas com idade igual ou superior a 40 anos, e que não foram vacinadas na sua adolescência, ou seja que não apresentam proteção nos próximos anos/décadas. Outra razão é a não proteção, ou proteção limitada, contra os tipos de HPV de alto risco não incluídos na vacina. Além disso, segundo o mesmo autor é provável

CIÊNCIA & TÉCNICA

que a proteção diminua com o tempo. No entanto as infeções31,32,33 pelo HPV são muito comuns, estimando-se que cerca de 50 a 70% das pessoas com uma vida sexual ativa possam contrair, pelo menos uma infeção deste tipo. Quanto à possibilidade da Reduzir o número de intervenções no pós- rastreio, verifica-se que 10 (35,7%) das enfermeiras responderam Não Concordar com essa diminuição, já quanto à possibilidade da descontinuidade de rastreio citológicos, nas jovens que foram vacinadas na sua adolescência, 23 (82,1%) das enfermeiras Não Concorda. Ou seja, são34 as mulheres mais jovens as que menos fazem citologias, ou seja 55,6% das mulheres entre os 25-29 anos nunca fizeram uma citologia, e as do grupo etário dos 45-49 anos, cerca de 46,5% as que mais cumprem o intervalo de tempo recomendado. Segundo a Sociedade Portuguesa de Ginecologia14, aconselha o início do rastreio 3 anos após a primeira relação sexual. Antes das vacinas serem administradas, será importante assegurar que os profissionais tenham competências teóricas e instrumentais, para debater com os pais e jovens adolescentes os benefícios da vacinação em geral e das DST em particular. Na questão colocada relativamente qual a melhor idade para a introdução Universal da Imunização para o HPV, a possibilidade que reuniu maior consenso com 23 (82,1%) Concorda Fortemente, foi a de ser administrada antes dos 14 anos. Na possibilidade do esquema vacinal ser iniciado a partir dos 18 anos, observou-se que 12 (42,9%) das enfermeiras respondeu Não concordar. Embora a idade35 recomendada para vacinação seja entre os 11e os 12 anos, pode ser no entanto administrada às raparigas desde os 9 até aos 26

anos de idade. Dados do Centro de Controlo de Doenças e Prevenção dos Estados Unidos da América38 sobre a Youth Risk Behavior Survey, revelaram que 34.4% dos alunos do 9º Ano já iniciaram a sua atividade sexual. Ainda para Vilelas36 no seu estudo 10,3% dos adolescentes do sexo masculino e 9,4% do sexo feminino já tinham tido relações sexuais no 9º ano de escolaridade. O início da primeira relação ocorre por volta dos 13 anos. Além disso 37um estudo de prevalência de clamídia entre adolescentes concluiu que os alunos de 14 anos apresentaram uma prevalência de 27,5%. Encontramos também que a idade do adolescente influenciou a vontade para a recomendação da vacinação. Ou seja a vontade de recomendação da vacinação aumenta com a idade do adolescente. 35

CONSIDERAÇÕES FINAIS A partir da análise, podemos concluir que existem áreas mais sensíveis de intervenção relativas à aquisição de conhecimentos e habilidades para lidar com a problemática de saúde da população, com base no perfil epidemiológico, ou seja, o reconhecimento e priorização dos problemas, para orientar a intervenção. Trata-se, portanto, de redireccionar o perfil dos enfermeiros para que atuem em conjunto com os outros parceiros de saúde, na perspetiva de concretizar objetivos mais amplos. Destaca-se dois aspectos fundamentais na formação desse “novo profissional”. Primeiro, para além de estar comprometido com a competência técnica deverá também estar envolvido com as éticas da responsabilidade e da solidariedade. Outra área refere-se à especificidade da intervenção da enfermagem, o que significa

AGOSTO 2014

CIÊNCIA & TÉCNICA

36

estar preparado para o “cuidar”, essência e base histórica da enfermagem que, na saúde comunitária, pode ser interpretado como conjunto de práticas e habilidades para o acompanhamento, controle e resolução dos problemas de saúde da população. Destaca-se, também, a necessidade dos profissionais de saúde desenvolverem processos educativos que favoreçam a participação da comunidade, estimulando-a a reconhecer os problemas e intervir sobre eles, bem como a participar nas discussões e decisões que lhe digam respeito. Esses processos são ações prioritárias do campo da promoção da saúde para lidar com as iniquidades, por outro lado, mais do que reproduzir procedimentos ou desenvolver ações de caráter fragmentado (pré-consulta, pós-consulta), ligadas aos programas de saúde e voltadas para a atuação de outros profissionais, cabe à enfermagem aproveitar as oportunidades de contato com a população para ampliar o conhecimento sobre a mesma, com vistas a uma assistência integral e participativa. Em suma, verificasse que a especificidade da prática de enfermagem não se deva restringir apenas à realização de procedimentos técnicos, mas incorpore a dimensão da comunicação e perceção das necessidades do outro. Este estudo tem diversas limitações, sugerindo que os resultados devem ser interpretados com alguma cautela. Em primeiro lugar, a amostra de enfermeiros não é significativa. Existindo uma amostragem por conveniência, deste modo os resultados não podem necessariamente ser generalizados a todos os enfermeiros. Este estudo incidiu sobre um conjunto de fatores específicos, ou seja, vacina, profissional e adolescentes caraterísticos.

No futuro, será importante explorar outros fatores, tais como, as suas atitudes sobre a sexualidade do adolescente e a sua capacidade de comunicar com os pais sobre temas sensíveis. O profissional deve reconhecer a importância que as crenças têm sobre a imunidade em geral. Conhecer quais os fatores pessoais, discordantes de nosso sistema de valores, que pode levar-nos a uma mudança de atitude de sequência negativa, como o contrário, pode também levar-nos a uma mudança de atitude, porém neste caso, de sequência positiva. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Castro D. T., Brunell P.A. - Safe Handling of Vaccines. 2. Vala, J. & Monteiro, M. B. (Eds.) – Psicologia Social ed., Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2000. 3. Walsh J.M.E. & McPhee A systems model of clinical preventive care: an analysis of factors influencing patient and physician. Health Education Quarterly 19 (2), 157-175, 1992. ( 4. Mott F et al. The determinants of first sex by age 14 in hight-risk adolescent population. Family Planning Perspectives 1996, 28(1): 13-18. 5. Gil – Métodos e Técnicas de Pesquisa Social. São Paulo: Editores Atlas S: A., 2005. 6. Maheux B, Haley N, Rivard M, et a STD risk assessment and risk-reduction counseling by recently trained family physicians. .Acad Med 1995; 70:726-728. 7. Torkko KC, Gershman K, Crane LA, et al. Testing for chlamydia andsexual history taking in adolescent females: Results from a statewide of Colorado primary care providers. Pediatrics 2000; 106:e32. 8. Resumo das Características do Medicamento – Gardasil®. Aprovado pelo INFARMED em 20 Setembro de 2009 9. Nabais H. HPV: vacinar é uma boa solução. Vida Saudável /mulher. IESS, Primavera 2008; 48-49. 10. Bory, J.P., et al.- Infecção humana do papillomavirus Recorrente detectado com o teste de captura híbrida II selecciona mulheres com esfregaço cervical normal em risco de desenvolver lesões cervicais de alto grau: um estudo longitudinal de 3.091 mulheres. International Journal of Cancer, 102 (5), 519-525, 2002. 11. Saslow, D., Castle, P. E., Cox, J. T., Davey, D. D., Einstein, M. H., Ferris, D. G., et al. (2007). American Cancer Society Guideline for Human Papillomavirus (HPV) Vaccine Use to Prevent Cervical Cancer and Its Precursors (Vol. 57, pp. 7-28).

CIÊNCIA & TÉCNICA

12. Direcção-Geral da Saúde - Divisão de Doenças Transmissíveis. Programa Nacional de Vacinação. Orientações Técnicas Nº25. Lisboa: Direcção Geral da Saúde; 2007. 13. Direcção-Geral da Saúde - Divisão de Doenças Transmissíveis. Programa Nacional de Vacinação. Orientações Técnicas Nº25. Lisboa: Direcção Geral da Saúde; 2008. 14. Sociedade Portuguesa de Ginecologia e Secção Portuguesa de Colposcopia e Patologia Cervico-Vulvovaginal. Consenso em Patologia Cervico-Vulvovaginal. 2004. 15. Jager, B.; Minnie, C.; Jager, J.; Welgemoed, M.; Bessant, J.; FrancisS, D. Enabling continuous improvement: a case study of implementation. Journal of Manufacturing technology Management. V.15, n. 4, p. 315-324, 2004. 16. Haddad J, Mojica MJ, Chang M; Organizacion Panamericana de la Salud. Processo de educación permanente en salud. Educación Médica y Salud 1987; 21:11-29. 17. Bottoford, J. L. (1991). Nursing: Practical Science of Nursing. Advances Nursing Sciences, 14 (II), 26-39. 18. LAUDAN, Larry. Progress and its problems: toward a theory of scientific growth. Berkeley/Los Angelis/ London:University of California press, 1977. 19. LAUDAN, Larry. Science and values: the aims of science and their role in scientific debate. Berkeley: University of California Press, 1984. 20. Meleis; A. (1991) - Theoretical nursing: Development and progress. 2nd Edition. Philadelphia: J.B. Lippincott Company. 21. Rosenthal SL, Lewis LM, Succop PA, et al. College students' attitudes Estudantes Collegeregarding vaccination to prevent genital herpes. Sex Transm Dis1999; 26:438-443. 22. Zimet G, Mays RM, Fortenberry JD. Vaccines against sexually transmitidasmitted infections: Promise and problems of the magic bullets f: prevention and control. Sex Transm Dis 2000; 27:49-52. 23. Institute of Medicine. Vaccines for the 21st Century. Washington, DC:National Academy Press; 2000Barie PS, Dellinger EP, Dougherty SH, et al. Assessment of hepatitis B virus immunization status among North Am surgeon ArcArch Surg 1994; 129:27-32. 24. Franco, R; Amarall, R G; Montemor, E B L; Montis, D M; Morais, S; Zeferino, L C. - Fatores associados a resultados falso-negativos de exames citopatológicos do colo uterino. Rev Bras Ginecol Obstet, 28 (8) 47985, 2006. 25. Gagnon MP, Godin G. Young adults and HIV vaccine: Determinants of the intention of getting immunized. Can J Public Health, 2000; 91:432-434.

26. Lewis, LM, Stanberry LR, Rosenthal SL, et al Attitudes regarding àvaccinations of STDs and other diseases. Internat J STD AIDS 2000; 11:170-172. 27. Cooper RA, Laud P, Dietrich CL. Current and projected workforce of nonphysician clinicians.JAMA 1998; 280:788-794. 28. Christy C, McConnochie KM, Zernik N, et alImpact of an algorithm guided nurse intervention on the use of immunization opportunities. Pediatr & Adolesc Med 1997; 151:384-391. 29. Millstein SG. Utility of the theories of reasoned action and planned behavior for predicting physician behavior: A prospective analysis.Health Psychol 1996; 15:398-402. 30. Wright TC, Bosch FX, Franco EL, Cuzick J, Schiller JT, Garnett GP, et al. Chapter 30: HPV vaccines and screening in the prevention of cervical cancer; conclusions from a 2006 workshop of international experts. Vaccine 2006; 24(S3): S251-61. 31. Campos, C. A. – Reformas da Saúde: o fio condutor. Edições Almedina; 2008. ISBN 978-972-40-3604-5. 32. Baseman J.G. & Koutsky L.A.- A epidemiologia das infecções pelo papilomavírus. Journal of Clinical Virology 32 (Suppl. 1), S16-S24, 2005. 33. Keam S.J. e Harper D.M - Papilomavírus Humano Tipos 16 e 18 de Vacinas (Recombinante, AS04 adjuvante, adsorvida). Cervarixtrade. Drogas 68 (3), 359-372., 2008. 34. Alto Comissariado para a Saúde PNS em Foco- Boletim Informativo Nº4/ Abril (2009). 35. Markowitz LE, Dunne EF, Saraiya M, Lawson HW, Chesson H, Unger ER. Quadrivalent Human Papillomavirus Vaccine: Recommendations of the Advisory Committee on Immunization Practices (ACIP). MMWR Recomm Rep 2007; 56(RR- 2): 1-24. 36. Vilelas, J. J. – Educar sexualmente os adolescentes: uma finalidade da família e da escola? Rev.Gaucha Enfermagem, Porto Alegre (RS) Set.29 (5):382-90, 2008. 37. Burstein GR, Gaydos CA, Diener-West M, et al Incident chlamydia trachomatis infections among inner-city adolescent ftrachomatis. JAMA 1998; 280:521-526. 38. Center for Disease Control and Prevention. Youth risk behavior survaillance-United States, 1997. MMWR CDC Surveill Summ 2002; 47:3. 39. EUROSTAT- The social situation in the European Union 2005-2006.The Balance between Generations in an Ageing Europe.

37

CIÊNCIA & TÉCNICA

ENTRADA DO ARTIGO MARÇO 2013

ADESÃO À TERAPÊUTICA ANTI-RETROVIRAL. QUAIS AS INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM? NELSON MANUEL CARDOSO MENDÃO

AGOSTO 2014

Licenciatura em Enfermagem pela Escola Superior de Enfermagem de Angra do Heroísmo. Enfermeiro na Equipa de Tratamento de Santarém do CRI Ribatejo. Mestrando do 3º Curso de Mestrado em Enfermagem Comunitária da Escola Superior de Saúde de Santarém

38

RESUMO A aceitação da doença VIH/SIDA, a cronicidade do tratamento e os efeitos secundários da terapêutica anti-retroviral são alguns dos fatores que condicionam a adesão ao regime terapêutico anti-retroviral. Pretende-se identificar as intervenções de enfermagem promotoras da adesão à terapêutica anti-retroviral na pessoa adulta com VIH/SIDA. A partir da questão PI[C]O, foram definidos alguns conceitos e realizada uma pesquisa de artigos científicos em base de dados eletrónica (no período entre 2007 a 2012), sendo selecionados 3 estudos, segundo critérios centralizados na problemática em estudo. Emergem três intervenções de enfermagem promotoras da adesão à terapêutica: o envolvimento da família nos processos de adesão, a entrevista motivacional e a visita domiciliar de enfermagem. Palavras-Chave: Intervenções de enfermagem, adesão, terapêutica anti-retroviral, VIH

ABSTRACT Acceptance of the disease HIV / AIDS, chronic treatment and the side effects of antiretroviral therapy are some of the factors that influence adherence to antiretroviral regimen. It is intended to identify nursing interventions that promote adherence to antiretroviral therapy in adult with HIV / AIDS. From the point PI [C] O, some concepts were defined and conducted a search of scientific articles in an electronic database (for the period 2007 to 2012), three studies were selected according to criteria centered on the problem under study. Rise to three nursing interventions that promote adherence to therapy: family involvement in adhesion processes, motivational interviewing and nursing home visits. Keywords: Nurse interventions; adherence, antiretroviral, HIV

CIÊNCIA & TÉCNICA

INTRODUÇÃO De acordo com a Organização Mundial de Saúde as doenças crónicas constituem uma área de grande preocupação no panorama da saúde mundial, sendo responsáveis por grande parte da mortalidade e morbilidade observada nos países desenvolvidos e em vias de desenvolvimento. Além disso, estas serão a primordial causa de incapacidade no mundo até 2020 e representarão a maior sobrecarga para os sistemas de saúde. É neste contexto que a adesão ao regime terapêutico, principalmente em situações de doença crónica, assume uma grande importância para os profissionais de saúde, pois a não adesão é responsável pelo aumento da probabilidade de insucesso das terapêuticas, por complicações evitáveis, por aumento dos gastos com a saúde e aumento da morbilidade e mortalidade (Organização Mundial de Saúde,2003). O tratamento do VIH/SIDA tem progredido significativamente com o desenvolvimento da terapia anti-retroviral e estão definidos três pilares fundamentais para o seu sucesso: a capacidade de entrada da pessoa no sistema, a retenção/fidelização da pessoa ao programa de assistência e a adesão à terapêutica (Programa Nacional para a infeção VIH/SIDA, 2012). A não adesão à terapêutica anti retroviral pode ter grandes consequências para a saúde pública, uma vez que a resistência a esta terapêutica (provocada por uma não adesão) pode passar de pessoa para pessoa em situação de contágio (Organização Mundial de Saúde, 2003). O termo adesão ao regime terapêutico de acordo com a CIPE/ICN Versão 2 (2011:38) é definido como uma “ Ação auto-iniciada para promoção de bem-estar, recuperação

e reabilitação, seguindo as orientações sem desvios, empenhado num conjunto de ações ou comportamentos. Cumpre o regime de tratamento, toma os medicamentos como prescrito, muda o comportamento para melhor, sinais de cura, procura os medicamentos na data indicada, interioriza o valor de um comportamento de saúde e obedece às instruções relativas ao tratamento. (Frequentemente associado ao apoio da família e de pessoas que são importantes para o cliente, conhecimento sobre os medicamentos e processo de doença, motivação do cliente, relação entre o profissional de saúde e o cliente). De acordo com Michael (2011) a “Association of Nurses in AIDS Care” definiu competências específicas de enfermagem para os cuidados, tratamento e prevenção do VIH/ SIDA onde o enfermeiro deve demonstrar capacidade para promover a manutenção da terapêutica anti-retroviral, através da utilização de estratégias/intervenções que promovam a sua adesão. Nas orientações da Organização Mundial de Saúde (2003) específicas para a adesão ao regime terapêutico no VIH/SIDA (“Adherence to long-term therapies evidence for action”) são emanadas algumas intervenções que promovem a adesão ao regime terapêutico anti-retroviral, nomeadamente: educar a pessoa e explicar os objetivos da terapia e a necessidade de adesão, recrutar a família para apoiar o plano de tratamento, criar grupos de apoio à adesão, trabalhar em equipa multidisciplinar (enfermeiros, farmacêuticos, assistentes socias, voluntários, gestores de caso e médicos), desenvolver relações com organizações locais de base comunitária para ajudar a explicar a necessidade de adesão e envolver ativamente a pessoa nas suas decisões de cuidados próprios de saúde.

39

CIÊNCIA & TÉCNICA

AGOSTO 2014

A presente revisão sistemática da literatura, serve para refletir sobre os contributos que estes profissionais podem proporcionar nos processos de adesão à terapia anti-retroviral.

METODOLOGIA DE PESQUISA O esquema de referência PICO (população, intervenção, comparação e “outcomes”/ resultados), elaborado por et all Sacket (1997) é um método útil para elaborar questões de investigação (Craig e Smyth, 2004). Como ponto de partida para a revisão sistemática da literatura foi formulada a pergunta de investigação: Quais as intervenções de enfermagem (I) que promovem a adesão à terapêutica anti – retroviral (O) na pessoa adulta com VIH/SIDA (P)? Quadro n.º1 – Critérios para a formulação da questão de investigação.

40

Conceitos

P a r t i c i - Quem foi pantes estudado?

Enfermeiros Pessoa adulta com VIH/SIDA

Pessoa VIH/SIDA

I

Inter ven- O que foi ções feito?

Intervenções de Enfermagem

Intervenções de Enfermagem

C

Podem Comparaexistir ou ções não

O

Outcomes

Adesão à terapeutica anti-retroviral

Adesão à terapêutica anti-retroviral

P

Resultados/ Efeitos e consequências

Palavras Chave

« Nurs* » « Adherence » « HIV » « Antiretroviral »

As palavras-chave foram validadas como descritores na plataforma Medical Subject Headings (http://www.nlm.nih.gov/mesh/ MBrowser.html) e procedeu-se à pesquisa através da plataforma EBSCO (CINAHL Plus; Medline; Nursing & Allied Health Collection; Medilactina) introduzindo as palavras-chave na sequência apresentada

“nurs*”,”adherence”, “HIV”, “antiretroviral” no modo “AB ABSTRAT” tendo sido utilizado sempre o operador lógico “and”. A pesquisa realizou-se no dia 15 de Novembro de 2012, estabeleceu-se como filtro cronológico o período de Janeiro de 2007 a Novembro de 2012. Após a execução do protocolo de revisão (Anexo I), aplicaram-se os critérios de inclusão e exclusão apresentados no Quadro nº2 Quadro nº2 - Critérios protocolados adotados Critérios de Inclusão

Critérios de Exclusão

Estudos em Humanos de ambos os sexos Pessoa com VIH/SIDA Estudos qualitativos e quantitativos Artigos de revisão sistemática de literatura Sujeitos Adultos (idade superior ou igual a 19 anos e inferior a 64 anos) Um dos autores é enfermeiro Artigos disponíveis em PDF.

Estudos nas áreas de: Saúde Infantil Saúde Materna Duplicação de artigos Nenhum dos autores é enfermeiro

Posteriormente à aplicação dos respetivos critérios, surgiram 9 artigos. Após a leitura integral do resumo, exclui-se: o artigo 2 e 8 uma vez que a análise dizia respeito as intervenções promotoras da adesão realizadas por vários profissionais de saúde, o artigo 3 por nenhum dos autores ser enfermeiro, o artigo 5 por se centrar na análise do tipo de terapia anti-retroviral prescrita e o artigo 7 por dizer respeito à área da saúde materna. Após esta fase, são apresentados 3 estudos que vão de encontro ao objetivo desta revisão sistemática (identificar as intervenções de enfermagem que promovem a adesão à terapêutica anti-retroviral à pessoa adulta com VIH/SIDA).

CIÊNCIA & TÉCNICA

Os artigos foram classificados segundo a escala de 6 níveis de evidência (Guyatt G.& e Rennie D. 2002) e foram elaboradas fichas de leitura onde os estudos são apresentados com base nos seguintes parâmetros: título, autores, participantes, intervenções, resultados e tipo de estudo

RESULTADOS ESTUDO 1 - A PRELIMINARY RANDOMIZED CONTROLLED TRIAL OF A NURSE-DELIVERED MEDICATION ADHERENCE INTERVENTION AMONG HIV-POSITIVE OUTPATIENTS INITIATING ANTIRETROVIRAL THERAPY IN BEIJING, CHINA Autores: Jane M. Simoni , Wei-Ti Chen , David Huh • Karen I.Fredriksen-Goldsen, Cynthia Pearson, Hongxin Zhao, Cheng-Shi Shiu, Xin Wang, Fujie Zhang Participantes: 70 pessoas que iniciaram terapêutica anti-retroviral no Hospital de Beijing’s Ditan. Intervenções: Durante o período de Dezembro de 2006 e Março de 2008 foram criados dois grupos aleatoriamente, um grupo de caso e um grupo de controlo. Ao primeiro grupo de pessoas (n=26) (grupo de controlo) quando era iniciada a terapêutica anti-retroviral o enfermeiro explicava em 30 minutos os planos de tratamento, efeitos secundários da terapêutica antiretroviral, e a importância da adesão. Posteriormente não havia mais qualquer tipo de acompanhamento a não ser a entrega da medicação. Esta intervenção breve foi denominada por intervenção mínima.

Ao segundo grupo de pessoas (n=36) (grupo de casos) quando era iniciada a terapia antiretroviral, o enfermeiro realizava 3 sessões, de uma hora cada. As sessões decorriam na primeira, quinta e nona semana após o início da terapia anti-retroviral. As respetivas sessões envolviam uma abordagem cognitiva-comportamental e a resolução de problemas. As sessões tinham como conteúdos, o reforço para continuação do tratamento, a aprendizagem da terapia anti-retroviral, o regime prescrito, a comunicação com os profissionais de saúde, a formulação de um calendário de medicação diária , o armazenamento dos medicamentos, estratégias de lembrança das tomas, os efeitos secundários da terapia anti-retroviral e a importância do apoio familiar e social, Para além desta sessões neste grupo era entregue a cada pessoa um dispositivo de aviso eletrônico que relembrava a toma da medicação anti-retroviral diariamente. Esta intervenção foi denominada de intervenção avançada. No grupo de controlo, havia a hipótese da pessoa em estudo escolher um familiar para ser envolvido no processo de adesão. Dos 36 participantes 8 optaram por escolher o conjugue, 1 escolheu o pai e 3 escolheram um parceiro do mesmo sexo.25 pessoas optaram por não envolver ninguém no processo de adesão. Resultados: A adesão era contabilizada através da tecnologia EDM que consiste num frasco de plástico e tampa que contém um microprocessador capaz de gravar a dose, data e hora precisa de cada abertura do frasco. Para além desta tecnologia foi utilizada simultaneamente o autorrelato em que a pessoa respondia à questão “Quantas doses

41

AGOSTO 2014

CIÊNCIA & TÉCNICA

42

de anti-retrovirais não tomou nos últimos 7 dias?”. Os autores também recorreram a bio marcadores para contabilizar a adesão nomeadamente a carga viral e a contagem de células CD4. Ao fim de 128 semanas, o grupo de caso (intervenção mínima) apresentava 85,7% de adesão através do autorrelato, 70,1% de adesão através dos dados registados no EDM relativo à dose administrada, 50,0% de adesão relativo à hora exata da toma. A carga viral média era de 1,9 log 10 copias/ml e a contagem de células CD4 era em média de 255.8 células/mm3. O grupo de controlo (intervenção avançada) no mesmo período de tempo apresentava 94,4% de adesão através do autorrelato, 71,8% de adesão através do dados registados no EDM relativo à dose administrada, 56,7 % de adesão relativo à hora exata da toma. A carga viral era em média de 2,0 log 10 cópias/ml e a contagem de células CD4 era em média de 268.0 células/mm3. Os autores consideram que apesar de não haver relevância estatística em ambos os grupos os grupo que sofreu uma intervenção avançada no geral apresenta maiores níveis de adesão. Os autores concluem que a epidemia do VIH na China continua a oferecer vários desafios no que diz respeito aos processos de adesão à terapêutica anti-retroviral e é urgente estudar-se mais aprofundadamente as intervenções promotoras da adesão à terapeutia anti-retroviral. É feita referência que os enfermeiros são os profissionais mais aptos para intervirem nos processos de adesão à terapêutica anti-retroviral uma vez que estes têm um conhecimento mais abrangente da pessoa e por esse motivo devem ser aproveitados

como recurso nos processos de adesão. Os autores fazem referência que incorporar os membros da família que podem oferecer apoio social, são medidas que devem ser pensadas como estratégias promotoras da adesão à terapêutica anti-retroviral. Tipo de Estudo/Nivel de Evidencia: Quantitativo (“Randomized Controlled Trial”) / Nivel II.

ESTUDO 2 - USING MOTIVATIONAL INTERVIEWING TO PROMOTE ADHERENCE TO ANTIRETROVIRAL MEDICATIONS: A RANDOMIZED CONTROLLED STUDY Autores: c. Diiorio, F. Mccarty, K. Resnicow, M. Mcdonnell holstad, J. Soet,K. Yeager, S. M. Sharma, D. E. Morisky e B. Lundberg Participantes: 247 Pessoas que iniciaram terapêutica anti-retroviral ou alteraram o esquema terapêutico anti-retroviral numa clínica de Atlanta, Georgia, nos Estados Unidos da América. Intervenções: Entre o período de Junho de 2001 e Novembro de 2003 procedeu-se à seleção dos participantes, em Janeiro de 2005 foi concluído o estudo. Foram criados 2 grupos. O grupo de caso (n=125),que individualmente recebia 5 sessões de aconselhamento motivacional para adesão à terapia anti-retroviral. As sessões decorriam durante um período de três meses. Em média as sessões duravam entre 20 e 90 minutos. Quando a pessoa não se podia deslocar à clínica a sessão era realizada pelo telefone. As sessões eram realizadas por enfermeiros

CIÊNCIA & TÉCNICA

com competências específicas comunicacionais para este tipo de sessão. As sessões tinham como objetivo ajudar as pessoas a perceberem quais as ações necessárias para manter com êxito um elevado nível de adesão à terapia anti-retroviral através de uma técnica comunicacional denominada entrevista motivacional. Nas respetivas sessões eram abordos temas como identificação de barreiras à adesão, os benefícios da adesão ao regime terapêutico, as questões da ambivalência sobre a toma dos medicamentos anti-retrovirais. Era também, delineado com a pessoa um plano de ação onde eram integradas estratégias para melhorar a adesão à terapêutica. O grupo de controlo (n= 122) não recebia sessões de aconselhamento estruturadas com base na entrevista motivacional. Utilizavam os métodos habituais em prática na clínica em que cada enfermeiro decidia quais os métodos de ensino mais adequado com base no nível de educação e cultura. Era feita uma pequena abordagem ao tipo de regime terapêutico e horário. A colheita de dados decorreu durante 12 meses. Aos participantes de ambos os grupos era fornecido um dispositivo denominado MEMS Caps. O respetivo dispositivo tem um microprocessador onde fica registado a data e hora em que cada frasco que contém terapêutica anti-retroviral é aberto. Quando os participantes se deslocavam à clínica os respetivo dispositivo era ligado a um computador, onde ficavam registados os dados de adesão. Em ambos os grupos aos 6 meses através de análise laboratorial era feita a contagem das células CD4 e avaliada a carga viral. Resultados: O grupo de caso (grupo com 5 sessões de aconselhamento) ao fim de 12

meses apresentava 64% de adesão no que diz respeito ao total da dose tomada, 41% de adesão no que diz respeito a dose tomada no horário prescrito. Aos 6 meses este grupo apresentava 58% de adesão no que diz respeito à carga viral. O grupo de controlo (grupo que não recebia sessões de aconselhamento), ao fim de 12 meses apresentava 55% de adesão no que diz respeito ao total da dose tomada, 24% de adesão no que diz respeito à dose tomada no horário prescrito. Aos 6 meses este grupo apresentava 47% de adesão no que diz respeito à carga viral Os autores fazem referência que este estudo foi um dos primeiros a abordar os efeitos da entrevista motivacional na adesão à terapêutica anti-retroviral e permitiu também treinar os enfermeiros nesta técnica comunicacional. Os participantes do grupo de caso tiveram uma maior percentagem de adesão do que os participantes do grupo de controlo. A entrevista motivacional é usada principalmente por psicólogos nas suas práticas clínicas. No entanto, no cenário da adesão terapêutica na pessoa com VIH/SIDA, os enfermeiros são os profissionais mais indicados para promover a adesão terapêutica a este grupo de pessoas. A entrevista motivacional pode ser utlizada como uma intervenção de enfermagem que aumenta a motivação para a mudança comportamental. Apesar dos resultados obtidos, são necessários mais estudos para avaliar o efeito da entrevista motivacional nos processos de adesão terapêutica. Tipo de Estudo/Nivel de Evidencia: Quantitativo ( “Randomized Controlled Trial”) /Nivel II.

43

CIÊNCIA & TÉCNICA

ESTUDO 3 - EFFECTS OF NURSE-DELIVERED HOME VISITS COMBINED WITH TELEPHONE CALLS ON MEDICATION ADHERENCE AND QUALITY OF LIFE IN HIV-INFECTED HEROIN USERS IN HUNAN OF CHINA AUTORES: HONGHONG WANG, JUN ZHOU, LING HUANG, XIANHONG LI, KRISTOPHER P FENNIE AND ANN B WILLIAMS

AGOSTO 2014

Participantes: Uma amostra de 116 participantes com terapeutica anti-retroviral instituída e com consumos de heroína na região de Hunan da China.

44

Intervenções: Durante o período entre Julho de 2007 e Abril de 2008 foram criados dois grupos, o grupo de controlo (n= 58) que recebeu apenas os cuidados de rotina. O grupo de caso (n=58) recebeu visitas domiciliares combinadas com intervenção telefónica ao longo de oito meses. As visitas domiciliares foram realizadas a cada dois meses. As visitas domiciliares tinham os seguintes objetivos específicos: fornecer informações básicas sobre o VIH medicação e adesão; avaliar com os participantes e compreensão dos membros da família e expectativa em relação à terapia anti-retroviral; fornecer panfletos sobre o tratamento anti-retroviral; educar os participantes e familiares sobre o esquema terapêutico anti-retroviral; informar sobre os efeitos colaterais esperados; controlar os efeitos colaterais dos medicamentos; avaliar possíveis obstáculos para a adesão; informar sobre estratégias promotoras da adesão; identificar as situações e razões que expliquem a falta de tomas e as tomas fora do horário prescrito; definir metas de adesão à medicação; estabelecer e definir hora e local para tomar a medicação; apoiar os membros

da família; avaliar a atitude dos membros da família; fazer sugestões e criar estratégias para relembrar as tomas da medicação; fornecer um dispositivo eletrônico com um alarme para os participantes relembrarem a toma da medicação; instruir os participantes a planear com antecedência mudanças na rotina (férias, feriados); antecipar necessidade de medicação (medicação em stock); sugerir soluções para eventos adversos; reforçar e fortalecer a capacidade de aderência; gerir o abuso de drogas; discutir com os participantes e familiares o estigma e a discriminação associados ao VIH/SIDA e uso de drogas; avaliar o programa de manutenção com metadona nos participantes com consumos de heroína ativos; instruir sobre refeições saudáveis, higiene pessoal e saneamento do ambiente domiciliar, informar sobre comportamentos de risco (relações sexuais desprotegidas e partilha de material cortante). As chamadas telefónicas foram realizadas a cada duas semanas pelos mesmos enfermeiros que realizaram as visitas domiciliares, após cada visita domiciliar, para fazer valer o efeito da visita domiciliar o tempo de cada chamanda telefónica vairiou entre 10-20 minutos a uma hora Resultados: Pretendia-se avaliar a adesão à terapêutica anti-retroviral e a qualidade de vida e depressão. Para tal como instrumento de colheita de dados utilizaram o questionário “for Clinical Research on AIDS (CPCRA) Antiretroviral Medication Self-Report” onde os participantes devem responder se nos últimos 7 dias tomaram: toda a medicação, a maioria, cerca de metadade ou muito pouca medicação anti retroviral. Também foi questionado se tomaram a terapia anti retroviral

CIÊNCIA & TÉCNICA

no horário correto. Para avaliar a qualidade de vida e depressão utilizaram o questionário “Chinese versions of World Health Organization Quality of Life Instrument – Abbreviated version (WHOQOL-BREF)” e a escala “Self-rating Depression Scale”. Foi aplicado um pré-teste e um pós-teste. O tamanho da amostra deste estudo é pequeno o que limita a capacidade de generalizar as conclusões. Ao fim de oito meses, os participantes do grupo experimental apresentaram maiores níveis de adesão à terapêutica anti retroviral e à toma da terapêutica no horário correto. Na escala de qualidade de vida o grupo caso demonstrou níveis mais significativos nas dimensões física, psicológica, social e ambiental do que o grupo de controlo. Na escala da depressão o participantes do grupo experimental apresentou níveis inferiores do que o grupo de controlo. Os autores concluem que as visitas domiciliares e telefonemas são eficazes na promoção da adesão ao tratamento anti-retroviral e melhoraram a qualidade de vida e sintomas depressivos em pessoas infetadas pelo VIH/SIDA e com consumos de heroína. No respetivo artigo surge como conclusão que a família é um pilar fundamental para a adesão ao regime terapêutico e o seu envolvimento no processo de cuidados faz com que os participantes se sintam menos discriminados pelos membros da família e com menores níveis de depressão É importante que os enfermeiros reflitam sobre adesão à terapia anti-retroviral em consumidores de heroína.

CONSIDERAÇÕES FINAIS As evidências obtidas nesta revisão sistemática da literatura, destacam essencialmente três intervenções de enfermagem promotoras da adesão à terapêutica anti-retroviral nomeadamente: o envolvimento da família nos processos de adesão, a comunicação/ entrevista motivacional como instrumento de capacitação e a visita domiciliar como recurso. Estes resultados vão de encontro ao objetivo inicial deste trabalho, uma vez que foi possível identificar as intervenções de enfermagem que promovem a adesão à terapêutica anti retroviral à pessoa adulta com VIH/SIDA. A prática baseada na evidência é proporcional à qualidade dos cuidados em enfermagem, pois através desta surgem conhecimentos que orientam a prestação de cuidados. O recurso a achados científicos permitem ao enfermeiro, agir de forma fundamentada e competente Toda a evidência analisada no presente trabalho considera-se de nível II segundo a classificação de Guyatt G.& e Rennie D. (2002) o que sustenta a aplicabilidade prática destas intervenções de enfermagem no quotidiano do enfermeiro. Importa referir que para além a prescrição da terapia anti-retroviral há um grande caminho a percorrer entre a pessoa a família e o enfermeiro. É essencial que o enfermeiro recorra à sua vertente educacional e estabeleça vínculos com a pessoa com VIH/SIDA e os seus familiares, com vista a planear e implementar intervenções favorecedoras da adesão tornando a pessoa um agente ativo no seu processo de cuidar.

45

CIÊNCIA & TÉCNICA

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Conselho Internacional de Enfermeiros (2011). Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem (CIPE versão 2). Lisboa: Ordem dos Enfermeiros Craig, J., Smyth, L. (2004) Prática Baseada na Evidencia Manual para enfermeiros. Loures: Lusociência. DiIorio, C., McCarty, F., Resnicow K., McDonell M., Soet J, Yeager, K., Sharma, M., Morisky, E., Lunderber, B. (2008) Using motivational interviewing to promote adherence to antiretroviral medications: a randomized controlled study. AIDS Care 20 (3), pp. 273-283. Acedido a 15 de Novembro de 2012 em http://search.ebscohost.com/ login.aspx?direct=true&db=mnh&AN=18351473&lan g=pt-br&site=ehost-live

AGOSTO 2014

Michael, V. (2011). Essential Nursing Competencies Related to HIV and AIDS. Journal of the Association of Nurses in AIDS Care. Nº22, p-5-40

46

Organização Mundial de Saúde. (2003). Adherence to long-term therapies evidence for action. Acedido a 13 de Novembro de 2012, em http://www.who.int/chp/ knowledge/publications/adherence_report Programa Nacional para a infeção VIH/SIDA (2012). Recomendações portuguesas para o tratamento da infeção por VIH-1 e VIH- 2. Acedido a 13 de Novembro de 2012, em: http://www.aidsportugal.com/Modules/ WebC_Docs/GetDocument.aspx?DocumentId=2828 Simoni, J., Chen W., Huh, D., Goldsen, K., Zhao, C., Shiu, C., Zhang, X. (2011). A Preliminary Randomized Controlled Trial of a Nurse-Delivered Medication Adherence Intervention Among HIV-Positive Outpatients Initiating Antiretroviral Therapy in Beijing, China. AIDS Behavior, 15(5), pp – 919-929. Acedido a 15 de Novembro de 2012 em http://search.ebscohost.com/login.as px?direct=true&db=mnh&AN=20957423&lang=pt-br&site=ehost-live Wang. H., Zhou, J., Huang, L., Li, X.,Fennie, P., Williams B., (2010). Effects of nurse-delivered home visits combined with telephone calls on medication adherence and quality of life in HIV-infected heroin users in Hunan of China. Journal Of Clinical Nursing, 19 (3-4), pp. 380-388. Acedido a 15 de Novembro de 2012 em http://search.ebscohost.com/login.aspx?direct=true& db=mnh&AN=20500277&lang=pt-br&site=ehost-live

CIÊNCIA & TÉCNICA

ENTRADA DO ARTIGO MARÇO 2013

A importância da Enfermagem Forense em contexto de investigação criminal ANA FILIPA SANTOS DIAS

Enfermeira no Serviço de Urgência de Pediatria do Hospital de Santa Maria, Lisboa. Pós-graduada em Enfermagem Forense pela Escola Superior de Enfermagem São Francisco das Misericórdias

RESUMO O presente texto pretende enfatizar uma nova vertente da Enfermagem, bastante desenvolvida nos Estados Unidos da América e, que em Portugal começa a dar os primeiros passos. Esta reflexão resulta de revisões bibliográficas sobre a Enfermagem Forense, percorrendo o início da Enfermagem como profissão e a sua essência, aliada ao emergir crescente das ciências Forenses. Usufruí da minha experiência profissional, decorrente das minhas práticas quotidianas e, pretendi salientar a importância da existência de Enfermeiros com conhecimentos na área Forense de modo a auxiliar o sistema de Justiça. Esta reflexão tem como objectivo, realçar a todos os profissionais de saúde, a importância dos enfermeiros Forenses num processo de Investigação criminal, contribuindo para uma sociedade mais justa e para o bem comum. Palavras-Chave: Enfermagem Forense, Ciências Forenses, Sistema de Justiça

ABSTRACT This text intends to emphasize a new aspect of nursing, fairly developed in the United States of America and, that in Portugal it starts to give the first steps. This reflection results from bibliographical reviews about Forensic Nursing, stepping through the beginning of Nursing as a profession and its essence, together with the growing often emerging forensic sciences. Take advantage of my professional experience as a result of my daily practices and, intended to point out the importance of the Nurses with expertise in forensic area of way to help the system of justice. This reflection aims, enhance all healthcare professionals, the importance of Forensic Nurses in the criminal investigation process, contributing to a fairer society and for the common good. Keywords: Forensic Nursing, Forensic sciences, Justice Administration System

47

AGOSTO 2014

CIÊNCIA & TÉCNICA

48

INTRODUÇÃO A profissão de Enfermagem é exigente e requer conhecimento médico, habilidade técnica e aptidões como a paciência, empatia e compaixão. Tudo isto que define a profissão, aliado a uma precisão científica e à implementação de procedimentos adequados de investigação, definem de uma forma sumária a Enfermagem Forense (Forensic Nursing: 2012) Desenvolvi este tema, porque acredito que a Enfermagem Forense ocupa uma elevada importância no processo de investigação criminal e consequentemente na sociedade, contribuindo para o bem comum, competência imperatória do enfermeiro determinada no art. 80º do Código Deontológico do Enfermeiro. Como tal, é primordial realizar uma breve abordagem sobre a origem da Enfermagem, enfatizando a sua génese e percurso histórico, e assim compreender a essência da profissão, aliada nos dias de hoje, às ciências forenses. Em seguida irei desenvolver sobre a prática da Enfermagem Moderna e o emergir crescente das ciências forenses. Vou ainda abordar o emergir da Enfermagem Forense e o seu percurso, enfatizando por fim a sua importância baseada em referências bibliográficas e na minha subjectiva opinião, conjugada com a minha experiência profissional.

A HISTÓRIA DA ENFERMAGEM Desde o emergir da vida, existe no Homem a necessidade de cuidar, de "tomar conta" o que permite à vida continuar, desenvolver-se e, assim fazer recuar a morte. Este conceito existe desde sempre e muito antes de os cuidados pertencerem a um ofício e/ou a uma profissão (COLLIÈRE:1999).

A necessidade do cuidar correlaciona-se com os primórdios da Enfermagem, inicialmente com as acções desenvolvidas pelas mulheres, de modo a garantir a sobrevivência das espécies. Posteriormente a prestação de cuidados enraizou-se nas práticas sacerdotais baseadas no empirismo até ao período hipocrático, onde foi gerada uma nova concepção de saúde dissociando assim, a arte de cuidar a preceitos místicos e sacerdotais, baseando-se na utilização do método indutivo, da inspecção e da observação. A prestação de cuidados, ligada à prática da Enfermagem foi desenvolvida no período medieval por religiosos, não tendo assim uma conotação de prática profissional. Com a Revolução Industrial ressalta a Enfermagem como actividade profissional institucionalizada até ao séc. XIX, em que surge a Enfermagem Moderna muito influenciada pelas correntes de pensamento de Florence Nightingale (Conselho Regional de Enfermagem do RJ)

A ENFERMAGEM MODERNA E AS CIÊNCIAS FORENSES Com Florence Nightingale emergiram as bases da Enfermagem moderna. A criação do modelo assistencial cujos alicerces são os factos observáveis, iniciou uma nova abordagem de conhecimento através do método científico. Implementou também, os registos clínicos do doente, que hoje em dia ainda são utilizados (Wikipédia: 2012). Actualmente, podemos entender a Enfermagem como " A arte de cuidar e a ciência cuja essência e especificidade é o cuidado ao ser humano, individualmente, na família ou em comunidade de modo integral e holístico, desenvolvendo de forma autónoma ou em equipa actividades de promoção, protec-

CIÊNCIA & TÉCNICA

ção, prevenção, reabilitação e recuperação da Saúde." (ROCHA, S; ALMEIDA, M.: 2000 pág.97). Assim depreende-se que a Enfermagem actualmente, “abarca” um conceito amplamente complexo que se centra na prestação de cuidados ao indivíduo, não meramente enfermo mas, tendo em conta as várias vertentes do Ser Humano (físico, espiritual, emocional, social e económico). Tendo em conta esta perspectiva, podemos salientar a necessidade dos diagnósticos e intervenções de Enfermagem autónomas, já estabelecidas por exemplo, pela NANDA e pela CIPE e ainda, desenvolvidas num conceito de multidisciplinaridade implícito. Este conceito vai revelar-se fundamental, em termos de complementaridade com as ciências forenses. O termo forense advém do latim forensis que diz respeito ao tempo dos Romanos em que os praticantes de delitos eram presentes no forum, onde existia um debate público, para discutir vertentes de defesa e acusação de modo a obter a Justiça social. Assim se representa um processo forense na nossa sociedade, nos dias de hoje (Lynch, V.; Duval, J.: 2006). Qualquer assunto em circunstâncias suspeitas requer de uma investigação para apuramento dos factos, podendo ser resolvido em tribunal e por isso é considerado um caso forense. Por este motivo, as ciências forenses referem-se à aplicação de várias disciplinas utilizadas para elucidar questões de interesse para os tribunais em relação a um crime ou a uma acção cível. Esta multiplicidade de disciplinas envolvidas em questões forenses pretende de forma científica clarificar questões, que se encontram à margem de livre apreciação do Juiz, de modo a dis-

sipar dúvidas e apurar a verdade atestando a prova pericial, como está regulamentado nos art.s 151º a 163º do Código de Processo Penal (CPP). As áreas científicas envolvidas em questões do meio forense são vastas, entre as quais a área da saúde; especificamente os médicos, na sua implicação nas perícias médico-legais. A violência e os traumas associados, na nossa sociedade actual estão amplamente reconhecidos, como sendo um problema de Saúde em todo o Mundo. Actualmente a violência é encarada como uma responsabilidade mútua entre o sistema Legal e de Saúde. A Medicina Legal é reconhecida como uma componente respectiva das ciências forenses e consequentemente a Enfermagem Forense também deve ser encarada como tal, tendo em conta que é uma ciência que aplica conhecimentos científicos e habilidades para identificar, promover a segurança, intervir e prevenir em fenómenos de mortalidade e morbilidade (Lynch, V.; Duval, J.: 2006).

A ENFERMAGEM FORENSE Com as transformações sociais existente na actualidade, aliadas à descrença dos indivíduos pelos sistemas sociais, denotou-se consequentemente um aumento da taxa de criminalidade. Segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE: 2010), o número de crimes registados em 2009 aumentou 2,5% comparativamente a 2003. Em relação a 2011, a taxa de criminalidade total situa-se nos 39,0 ‰, sendo que os crimes contra a integridade física ocupam 5,7‰ dessa totalidade (INE: 2012). Posta esta realidade, facilmente conseguimos

49

AGOSTO 2014

CIÊNCIA & TÉCNICA

50

perceber a recorrência crescente aos sistemas de saúde e, da necessidade da existência de um “apoio” em contexto hospitalar para colmatar as lacunas, existente até então, no que diz respeito à cadeia de custódia da prova, fundamental num Processo de Investigação Criminal, para se concluir a verdade dos factos. Assim, podemos falar em Enfermagem Forense que segundo a Internacional Association of Forensic Nurses (IAFN: 2006) é definida como “ (…) the practice of nursing globally when health and legal systems intersect”. Os enfermeiros são elementos privilegiados neste contexto e, se se encontrarem despertos para estas questões podem desenvolver um trabalho complementar fundamental para combater o crime e a violência. Em termos evolutivos no que diz respeito à Enfermagem Forense, documentos históricos revelam que antes da Revolução Francesa as parteiras testemunhavam a respeito de abusos sexuais e gravidez. Em 1983, foi publicado o primeiro artigo que englobava a medicina nas ciências forenses, no Journal of Forensic Science. No entanto, em 1986 foi reconhecida cientificamente a Enfermagem Forense pela American Academy of Forensinc Sciences. (Lynch, V.; Duval, J.: 2006). Em 1992 numa reunião organizada pela Sexual Assault Resource Service e a Universidade de Enfermagem do Minnesota, um conjunto de Enfermeiros ligados a questões de abusos sexuais juntou-se e formou a IAFN, organização internacional. Em 1995 esta associação foi reconhecida oficialmente como uma especialização pela American Nurses Association (ANA). A missão do IAFN está direccionada de forma a assegurar o desenvolvimento, promoção e divulgação de informações a nível internacional sobre

Enfermagem Forense, definindo metas e um plano estratégico até 2014. Em 2002 a IAFN iniciou o desenvolvimento de áreas particulares de especialização relativamente à Enfermagem Forense como o Sexual Assault Nurse Examiner-Adult/Adolescent (SANE-A) e em 2006 o Sexual Assault Nurse Examiner Pediatric/Adolescent (SANE-P). Actualmente, a organização apresenta ainda como prática da Enfermagem Forense áreas particulares como a violência doméstica e violência interpessoal, maus-tratos a idosos, investigação de mortes e desastres em massa (IAFN: 2006). Nos Estados Unidos da América, onde a Enfermagem Forense já detém um papel primordial no processo de investigação criminal, o enfermeiro Forense pode desempenhar funções em contexto hospitalar, em situações de agressões de índole diversa. No entanto o enfermeiro forense também poderá desempenhar um papel fulcral na comunidade, tendo em conta os vários níveis de prevenção. Ao nível da prevenção primária o enfermeiro poderá desenvolver junto da comunidade acções de formação para a saúde, de combate à violência e criminalidade (IAFN: 2006)

A IMPORTÂNCIA DA ENFERMAGEM FORENSE Mediante o que foi exposto anteriormente, salientando a essência da Enfermagem e o seu desenvolvimento, tendo ciente o crescente emergir do conhecimento forense e assim, compreendendo a intersecção entre as duas ciências, podemos definir a Enfermagem Forense de uma forma mais complexa. Segundo (Lynch, V.; Duval, J.: 2006: p. 5) “Forensic nursing scien-

CIÊNCIA & TÉCNICA

ce is defined as the application of the forensic aspects of healthcare combined with the bio/psyco/social/spiritual education of the registered nurse in the scientific investigation and treatment of the trauma or death of victims and perpetrators of violence, criminal activity, and traumatic accidents”. Já no desenvolvimento da prestação de cuidados, no período hipocrático sobrepôs-se o método indutivo ao processo meramente empírico e aspectos como a inspecção e observação foram valorizados em questões de saúde. Na Enfermagem Forense revelam-se essenciais tendo em conta que a observação da vítima e ou agressor bem como a inspecção aliada à correcta recolha de vestígios são aspectos fundamentais. Ainda relativamente ao percurso histórico da Enfermagem, com Florence Nightingale e a sua influência na implementação de registos clínicos, estes revelam-se aspecto fundamental da prática da Enfermagem Generalista. Em Enfermagem Forense os registos manifestam-se de extremo interesse, tendo em conta que o enfermeiro observa, avalia e regista informações que podem ser imprescindíveis aquando de um processo de investigação criminal e em tribunal, de modo a apurar a verdade dos factos ocorridos, podendo ainda ser solicitado para prestar prova testemunhal (art.s 128º a 139º do CPP), mediante aquilo que observou e descreveu, uma vez que possui os conhecimentos necessários, baseados na cientificidade e na sua experiência, conferindo-lhe competências para que cumule uma prova pericial. No hospital o enfermeiro encontra uma posição única tendo em conta que, muitas vezes é o primeiro a estabelecer contac-

to com os utentes, ouvindo-o, avaliando as suas lesões e estabelecendo prioridades. O primeiro contacto, é um contacto privilegiado porque existe uma maior preservação dos vestígios, mantendo a sua idoneidade e não comprometendo as decisões a nível judicial (Pereira, L.; Machado, L.: 2012). Relativamente à minha experiência profissional, no Serviço de Urgência de Pediatria/ Unidade de Cuidados Intensivos Pediátricos, no decorrer da minha actividade fui percepcionando a frequente ocorrência de situações de maus tratos, violações e agressões a menores e, da minha sensação de impotência nestas situações, em questões direccionadas face à minha implicação em todo o processo decorrente e não somente na prestação de cuidados directos. Sendo uma área do meu interesse, fui percebendo ao longo do tempo que a minha actuação poderia ser mais útil de modo a poder auxiliar no processo de investigação nestes casos. Fui, também tomando consciência que as acções desenvolvidas pelos enfermeiros, a maior parte das vezes ficavam aquém daquilo que poderia ser realizado de modo a auxiliar num processo de investigação criminal, ao nível da preservação de vestígios, da avaliação do utente e dos registos efectuados e, assim auxiliar o sistema judicial. Talvez por esse motivo, não seja frequente a solicitação dos enfermeiros para auxílio num processo de investigação. Posto isto, considerei a pertinência de ingressar na pós-graduação de Enfermagem Forense, para sedimentar e adquirir conhecimentos nesta área e, assim melhorar a minha prática no âmbito dos cuidados de Enfermagem Gerais com a componente forense associada.

51

AGOSTO 2014

CIÊNCIA & TÉCNICA

52

Assim, é preponderante a existência de elementos nos serviços de saúde com conhecimentos nesta vertente, de modo a implementar normas de actuação que se coadunem com o processo de investigação contribuindo assim para a resolução de crimes e diminuição da violência na nossa sociedade. Percebemos que a Enfermagem Forense tem de ser encarada numa perspectiva multidisciplinar em conjugação com as vastas ciências, atestando a prova pericial (CPP artº’s nº’s 151º ao 163º) de modo a alcançar a verdade material e assim cumprir o dever legal e moral que está inerente à responsabilidade de todos os indivíduos. Esta colaboração, encontra-se também prevista no art. 80º do CDE na alínea c), que refere que o enfermeiro tem o dever de “(…) Colaborar com outros profissionais em programas que respondam às necessidades da comunidade.” Só tendo um olhar numa perspectiva multidisciplinar, é que podemos acreditar na eficácia da resolução de crimes tendo em conta o envolvimento de várias ciências, no qual se enquadra a Enfermagem, que atestam a prova pericial e assim alcançam a verdade dos factos ocorridos e, por sua vez a Justiça.

CONCLUSÃO Cada vez mais, é considerada a pertinência da existência da Enfermagem na vertente forense, tendo em conta tudo o que foi exposto ao longo do trabalho, salientado a posição privilegiada que o enfermeiro ocupa no primeiro contacto com as vítimas e ou agressores. Em Portugal, embora ainda haja alguma falta de informação sobre o trabalho imprescindível que a Enfermagem

Forense pode oferecer, já começam a ser dados os “primeiros passos” com a implementação de pós-graduações neste âmbito e por isso, torna-se imprescindível o seu reconhecimento junta das autoridades competentes. Tendo em conta a minha prática profissional, existem com alguma frequência situações de violência, nomeadamente violações e agressões a menores, e por esse motivo ao longo do tempo fui percebendo a necessidade imperiosa da existência de “elos” de ligação entre os sistemas de saúde e judicial. Cada vez mais, me consciencializo da importância de uma observação “treinada”, da identificação de lesões, recolha de vestígios e de registos completos para que se auxilie num processo de investigação criminal, de modo a combater a criminalidade contribuindo assim para uma sociedade mais justa e segura. Há ainda um trabalho de relevo que pode ser feito na comunidade, em termos de prevenção primária, na medida em que o enfermeiro “oferece” educação para a saúde à população, advertindo para os malefícios de uma sociedade embutida na violência, assim como está instituído no art. 80º alínea b) do CDE “ O enfermeiro, sendo responsável para com a comunidade na promoção da saúde e na resposta adequada às necessidades em cuidados de enfermagem, assume o dever de: (…) Participar na orientação da comunidade na busca de soluções para os problemas de saúde detectados (…)”. Em suma, podemos assim compreender a necessidade imperiosa da existência de enfermeiros habilitados para participar nestas questões de nível forense. É necessária a tomada de consciência social,

CIÊNCIA & TÉCNICA

nomeadamente das autoridades competentes e dos profissionais de enfermagem, para o benefício de uma “parceria” entre o sistema de saúde e o sistema judicial na resolução de crimes.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Internet BARROS, Alba Lúcia Bottura Leite – “ Classificações de Diagnóstico e Intervenções de Enfermagem: NANDA – NIC” [Em Linha] 2009 [Consult. a 27.05.2012] disponível em http://www.scielo.br/pdf/ape/v22nspe/03.pdf Conselho Regional de Enfermagem do RJ – “ História da Enfermagem” [Em linha] (Data desconhecida) [Consult. a 19.05.2012] disponível em http://medicinaintensiva.com.br/enfermagem-historia.htm CARVALHO, António e ABREU, Marily - "Cuidar em Enfermagem" [Em Linha] 10 de Fevereiro de 2009 [Consult. a 8.05.2012] disponível em http://www.webartigos.com/artigos/cuidar-em-enfermagem/14277/ GOWIN, Maciej – “Hand shape imprinted” [Em linha] 2010 [Consult. a 19.05.2012] disponível em http://www. gettyimages.pt/detail/foto/hand-shape-imprinted-imagem-royalty-free/124930162 (Capa do Trabalho FORENSIC NURSING – “ History of Forensic Nursing” [Em linha] 2012 [Consult. a 9.06.2012] disponível em http://www.forensicnursing.org/resources/history-of-forensic-nursing/ Infopédia – “Hipócrates” [Em Linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2012. [Consult. a 27.05.2012] disponivel em http://www.infopedia.pt/$hipocrates Internacional Association of Forensic Nurses – “What is Forensinc Nursing?”[Em linha] 2006 [Consult. a 27.05.2012] disponivel em http://www.iafn.org/displaycommon.cfm?an=1&subarticlenbr=137 Instituto Nacional de Estatística – “ Indicadores Socais 2009” [Em Linha] 29 de Dezembro de 2010 [Consult. a 27.05.2012] disponivel em http:// www.ine.pt/xportal/xmain?xpid=INE&xpgid=ine_ d e s t a q u e s & D E S T A Q U E S d e s t _ boui=83386953&DESTAQUESmodo=2 Instituto Nacional de Estatística – “ Taxa de Criminalidade (‰) por localização Geográfica (NUTS – 2001) e Categoria de Crime” [Em linha] 5 de Abril 2012 [Consult. a 27.05.2012) disponível em http://www.ine.pt/ xportal/xmain?xpid=INE&xpgid=ine_indicadores&ind OcorrCod=0001979&contexto=bd&selTab=tab2

PEREIRA, Liliana; MACHADO, Luísa – “ Enfermagem Forense – Preservação de Provas” [Em linha] Fevereiro de 2012 [Consult. a 8.06.2012) disponivel em https://docs. google.com/viewer?a=v&q=cache:HIjw5T1jM9YJ:med ia.wix.com/ugd/b2b612_05f0989e75de7e511361576c 1dc5b289.doc?dn%3D19%252B-%252BTrabalho%252 BEnfermagem%252BForense-%252BLu%25C3%2583% 25C2%25ADsa%252BMachado%252Be%252BLiliana% 252BPereira.doc+Enfermagem+forense+preserva%C 3%A7ao+de+provas&hl=pt-PT&gl=pt&pid=bl&srcid =ADGEESgFWqx6c0U68BiUSm2S0WUvDNp5_i1qX2lgfwdpokWoLty25dbDW01bi3x097teox6k4Le9vqS4oKLBS_nbzctZ7qDlI7dIb_HdMt0D3uQee85L7X-2MH bmTghxpuTSX3oxvJWB&sig=AHIEtbQmZCGWwv8Cjjz yYmfXdGrWeDOUeA Ordem dos Enfermeiros – “ Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem – CIPE®” [Em linha] 11 de Outubro de 2010 [Consult. a 27.05.2012] disponível em http://www.ordemenfermeiros.pt/projectos/Paginas/ ClassificacaoInternacionalPraticaEnfermagem.aspx ROCHA, Semiramis; ALMEIDA, Maria – “ O Processo de Trabalho da Enfermagem em Saúde Colectiva e a Interdisciplinaridade” [Em linha] Dezembro de 2000 [Consult. a 9.05.2012] disponível em http://www.scielo.br/ pdf/rlae/v8n6/12354.pdf Wikipédia – “ História da Enfermagem” [Em Linha] 23 de Abril de 2012 [Consult. a 19.5.2012) disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Enfermagem Wikipédia – “ Florence Nightingale” [ Em linha]. 13 de Maio de 2012 [Consult. a 27.05.2012] disponivel em http://pt.wikipedia.org/wiki/Florence_Nightingale Livros NUNES, Lucília; AMARAL, Manuela; GONÇALVES, Rogério - “ Código Deontológico do Enfermeiro: dos Comentários à Análise de Casos”. Lisboa: Ordem dos Enfermeiros, 2005 pág. 83 ISBN 972-99646-0-2 COLLIÈRE, Marie-Françoise – “ Promover a vida – Da prática das mulheres de virtude aos cuidados de enfermagem” 5ª tiragem. Lisboa: Lidel – edições técnicas Lda e Sindicato dos Enfermeiros Portugueses: 1999. págs. 27 ao 38 ISBN 972-757-109-3 Biblioteca Nacional de Portugal – Catalogação na Publicação PORTUGAL. Leis, decretos, etc. – “ Código de Processo Penal”, 13ª ed. – (códigos de Bolso) ISBN 978972-40-4693-8 LYNCH, Virginia; DUVAL, Janet – “Forensic Nursing Science” Second edition. St Louis Missouuri – Mosby Inc., na affiliate of Elsevier Inc: 2006, págs. 1 a 8 e 10 a 18. ISBN 978-0-323-006637-2

53

CIÊNCIA & TÉCNICA

ENTRADA DO ARTIGO DEZEMBRO 2012

Quando a família do doente crítico entra no mundo da emergência: um estudo de revisão ANDREIA JESUS PIRES ALVES

AGOSTO 2014

Licenciatura em Enfermagem

54

RESUMO Avaliar e intervir no doente crítico cria desafios complexos, devendo os cuidados a estes doentes serem prestados mediante uma abordagem fundamentada e organizada. Face a uma situação de emergência, o enfermeiro depara-se com o desafio de incluir a família no plano de cuidados, a fim de garantir a qualidade e humanização dos cuidados prestados. Tal justifica a elaboração deste artigo de revisão bibliográfica, tendo como objetivo identificar a evidência empírica produzida sobre a influência da presença da família junto do doente crítico, numa situação de emergência. A pesquisa foi realizada, entre os meses de maio e junho de 2011, nas bases de dados eletrónicas: SciELO e, através da B-ON, Academic Search Complete, Annual Reviews, Current Contents, Elsevier – Science Direct, PubMed, SpringerLink, Taylor&Francis, Web of Science e Wiley Online Library, conduzindo a uma amostra de 8 artigos primários. Os principais resultados apurados mostram que apesar de cada família reagir de forma diferente numa situação de emergência, a sua presença pode melhorar a condição física e emocional do familiar crítico. Verificou-se também que a maior parte dos profissionais de saúde não se sente à vontade ou considera não estar habilitada para a prestação de cuidados ao doente crítico com a família presente. Palavras-Chave: Família, Enfermagem, Emergências, Cuidados Críticos

ABSTRACT Assess and intervene in critically ill patients creates complex challenges, and care for these patients are provided through a reasoned and organized approach. Faced with an emergency situation, the nurse is faced with the challenge of including the family in the care plan, to ensure the quality and humanization of care. This justifies the writing of this literature review article, aiming to identify the empirical evidence produced on the influence of family presence from the critically ill patient in an emergency situation. The survey was conducted between the months of May and June 2011 in electronic databases SciELO, and through the B-ON, Academic Search Complete, Annual Reviews, Current Contents, Elsevier - Science Direct, PubMed, SpringerLink, Taylor & Francis, Web of Science and Wiley Online Library, leading to a sample of 8 primary articles. The main results obtained show that although each family react differently in an emergency situation, their presence may improve the physical and emotional condition of the familiar critical. It was also found that most health professionals do not feel comfortable or not considered to have the skills to provide critical patient care with family present. Keywords: Family, Nursing, Emergencies, Critical Care

CIÊNCIA & TÉCNICA

55

INTRODUÇÃO De acordo com a Sociedade Portuguesa de Cuidados Intensivos (2008), o doente crítico é o indivíduo que, por disfunção ou falência profunda de um ou mais órgãos ou sistemas, encontra-se em risco de vida, estando a sua sobrevivência dependente de meios avançados de monitorização e terapêutica. Avaliar e intervir no doente crítico cria desafios complexos, devendo os cuidados a estes doentes serem prestados mediante uma abordagem fundamentada e organizada (Hall, 2009). Estes desafios incluem identificar patologias, interligar conhecimentos, ter em consideração a vertente social e familiar.

Segundo a Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem, a família é conceptualizada como “unidade social ou todo coletivo composto por pessoas ligadas através de consanguinidade, afinidade, relações emocionais ou legais, sendo a unidade ou o todo considerados um sistema que é maior do que a soma das partes” (CIPE, 2011:115). Definir família pode tornar-se uma tentativa limitada, dada a dificuldade de contemplar a sua unidade como um todo e de se tratar de um conceito polissémico. No entanto, a teoria sistémica procura dar um contributo no sentido desta complexidade e defende a família como “sistema de inter-relações no

AGOSTO 2014

CIÊNCIA & TÉCNICA

56

qual os laços (…) tornam a família um grupo com identidade própria, reconhecida como um sistema aberto no meio em que está integrada, da qual utiliza e para o qual fornece recursos decisivos para a compreensão de uma situação vivida numa das suas partes, em situação de processo saúde-doença” (Silva, Gonçalves e Costa, 2006:215). Pelo supracitado e pensando que o bem-estar familiar é determinado pela saúde individual de cada membro, face a períodos de instabilidade e mudança que podem levar a transformações na estrutura do sistema familiar, esta tem capacidade para manter a sua organização e desenvolver-se ao longo do seu ciclo vital (Relvas, 1996). A enfermagem de família surge alicerçada no pensamento sistémico, centrando-se tanto no sistema familiar quanto nos sistemas individuais, dando ênfase à interação e reciprocidade entre os membros da família (Friedman, Bowden e Jones, 2003). O conceito de enfermagem apresentado no Regulamento para o Exercício Profissional de Enfermagem corrobora esta ideia, uma vez que nos diz que se trata de uma profissão com o objectivo de “prestar cuidados de enfermagem ao ser humano, são ou doente, ao longo do ciclo vital, e aos grupos sociais em que ele está integrado, de forma que mantenham, melhorem e recuperem a saúde, ajudando-os a atingir a sua máxima capacidade funcional tão rapidamente quanto possível” (REPE, 2006:2959). A abordagem dos cuidados continua assim centrada no indivíduo, mas a família deve constituir um parceiro nos cuidados de enfermagem, até porque "as informações fornecidas pelos familiares podem-nos ajudar a entender o paciente”. (Cintra, Nishide e Nunes, 2000:9). No entanto, para que a fa-

mília cumpra o seu papel de “dar suporte à situação vivenciada pelo paciente, ela também precisa de suporte nas suas necessidades físicas e emocionais” (Cintra, Nishide e Nunes, 2000:9), porque tudo o que acontece a um dos seus membros, como o adoecer inesperado e grave, repercute-se na vida dos restantes elementos, gerando instabilidade e sofrimento. Uma situação de emergência pode ser definida como uma alteração súbita do estado de saúde ou agravamento de uma situação de doença, que exige cuidados médicos imediatos e cujo atraso na prestação dos mesmos se torna prejudicial para o indivíduo. Situação na qual ocorrem experiências complexas e individualizadas, quer para o doente, quer para a sua família (Mateus, 2007). Para minimizar estas consequências, e garantir a qualidade e humanização dos cuidados prestados numa situação de emergência, em que o limiar entre a vida e a morte é ténue, o enfermeiro depara-se com o desafio de incluir a família no plano de cuidados do doente crítico. Neste âmbito, foi criada recentemente em Portugal a Lei n.º 33/2009, que garante ao doente o direito a ser acompanhado no Serviço de Urgência, reforçando a atualidade desta problemática. Surge assim a necessidade de compreender e refletir sobre a inclusão da família na prestação de cuidados ao doente crítico. Tendo em conta o supracitado, torna-se fundamental identificar a evidência empírica produzida sobre a influência da presença da família junto do doente crítico numa situação de emergência, pelo que definimos os seguintes objetivos específicos: refletir sobre a influência da presença da família na prestação de cuidados ao doente crí-

CIÊNCIA & TÉCNICA

tico; analisar de que forma a presença da família influencia a evolução do estado de saúde do doente crítico numa situação de emergência e analisar o comportamento da família do doente crítico, numa situação de emergência. De modo a atingir os objetivos acima mencionados, delineamos as questões orientadoras que passamos a enunciar: De que forma a presença da família influencia a recuperação do doente crítico e o desempenho dos enfermeiros, numa situação de emergência? De que forma é influenciado o comportamento da família de um doente crítico, quando permitida a sua presença junto do mesmo? Formuladas as questões, partimos rumo à descoberta do que sucede quando a família do doente crítico entra no mundo da emergência.

METODOLOGIA Realizamos um estudo de revisão bibliográfica que, segundo Fortin (2009), consiste em fazer um inventário e o exame crítico de um conjunto de publicações sobre um determinado tema de investigação. Neste tipo de estudo, o investigador examina, em cada um dos trabalhos escolhidos, os conceitos que foram desenvolvidos, as relações com a teoria, os métodos utilizados, os resultados e conclusões obtidas. A presente revisão da literatura foi realizada mediante análise de artigos que se reportam ao período temporal entre 2007 e 2011. Quanto ao período de busca dos artigos compreendeu os meses de maio a junho de 2011. A pesquisa baseou-se nos descritores: Família (Family, Familia), Enfermagem (Nursing, Enfermería), Emergências (Emergen-

cies, Urgencias Médicas), Cuidados Críticos (Critical Care, Cuidados Criticos), tendo como idiomas preferenciais português, inglês e espanhol. Através da associação destes descritores, nos três idiomas definidos, foi efetuada pesquisa nas bases de dados eletrónicas SciELO e, através da B-ON, Academic Search Complete, Annual Reviews, Current Contents, Elsevier – Science Direct, PubMed, SpringerLink, Taylor&Francis, Web of Science e Wiley Online Library. Utilizando estas bases de dados, os descritores mencionados anteriormente e tendo em consideração o universo temporal já descrito tivemos acesso a 2417 publicações, das quais 52 foram excluídas por não serem texto integral e 486 por se encontrarem repetidas nas diferentes bases de dados, restando 1879 publicações. Dado o elevado número de publicações encontradas, para restringir o número de artigos, tornou-se necessário definir critérios de inclusão, para além de considerar como participantes os artigos elaborados entre 2007 e 2011. Estes foram: - Intervenção: Influência da presença da família na recuperação do doente crítico e no desempenho dos enfermeiros e influência sobre a família de um doente crítico, quando permitida a sua presença junto do mesmo. - Contexto do estudo: Estudos realizados com doentes em situação de emergência. - Desenho do estudo: Estudos primários de abordagem qualitativa ou quantitativa. Tendo em conta estes critérios, após analisar os 1879 artigos, rejeitamos 1712 pelo título, 107 pela leitura do resumo, 2 pelo desenho do estudo e 50 pela leitura integral. Através desta estratégia incluímos apenas 8 artigos para crítica.

57

CIÊNCIA & TÉCNICA

AGOSTO 2014

APRESENTAÇÃO / ANÁLISE CRÍTICA DOS DADOS Os 8 estudos primários que satisfizeram os critérios de inclusão pré-definidos são apresentados na tabela seguinte, constando na mesma o objetivo geral, método, amostra e principais conclusões de cada artigo.

58

Síntese das evidências encontradas • AGARD, Anne Sophie; MAINDAL, Helle Terkildsen - Interacting with relatives in intensive care unit. Nurses’ perceptions of a challenging task. Dinamarca. 2009. Objetivo geral - Descrever como enfermeiros de cuidados intensivos usam conhecimentos pessoais, habilidades e expectativas para interagir com a família; Explorar a relação entre habilidades e expectativas e a atitude dos enfermeiros ao envolver a família e permitir a sua presença durante situações críticas. Método - Estudo quantitativo, transversal, exploratório. Questionário Amostra - 68 enfermeiros de uma unidade de cuidados intensivos de adultos. Principais conclusões - A opinião dos enfermeiros em incluir a família nos cuidados não é uniforme, nomeadamente em situações de paragem cardíaca e entubação; normalmente os enfermeiros não suportam a presença da família em situações críticas; os enfermeiros consideram que o seu conhecimento e habilidades em interagir com a família são bons e para além disso têm expectativas positivas sobre o resultado da sua interação. •

GAMELL FULLÀ, A. [et al.] - ¿Están presentes los padres durante los procedimientos invasivos? Espanha. 2010. Objetivo geral - Conhecer a situação atual em relação à presença dos pais e/ou respon-

sáveis durante os procedimentos invasivos em diferentes serviços de Urgências Pediátricas; conhecer os motivos pelos quais se restringe a presença dos pais e/ou responsáveis; conhecer o grau de concordância dos profissionais de saúde quanto a esta presença. Método - Estudo descritivo, segundo uma abordagem quantitativa. Questionário. Amostra - 32 responsáveis dos serviços de Urgências Pediátricas, de diferentes hospitais de Espanha, pertencentes à Sociedade Espanhola de Urgências Pediátricas. Principais conclusões - A presença dos pais e/ou responsáveis durante a realização de procedimentos invasivos é escassa, especialmente nos mais invasivos; a ansiedade dos pais e o pior rendimento dos profissionais de saúde são os motivos argumentados para restringir a presença dos pais e/ou responsáveis; os profissionais de saúde estão pouco ou nada de acordo com a presença familiar, especialmente durante as técnicas mais invasivas. •

HUNG, Maria S.Y.; PANG, Samantha M. C. - Family presence preference when patients are receiving resuscitation in an accident and emergency department. China. 2010. Objetivo geral - Analisar a experiência de familiares de pacientes que sobreviveram a ressuscitação pós acidente, num departamento de emergência, e saber as suas preferências relativamente a estarem ou não presentes. Método - Estudo interpretativo, fenomenológico. Entrevista. Amostra - 18 familiares adultos de pacientes que sobreviveram a intervenções de manutenção de vida. Principais conclusões - Nenhum dos familiares esteve presente na sala de emer-

CIÊNCIA & TÉCNICA

gência, mas a maioria refere que gostaria de ter estado presente; os profissionais de saúde deviam ser mais sensíveis e atentos às necessidades individuais e preocupações das famílias, tendo o cuidado de oferecer a hipótese de estarem presentes; deveriam existir guidelines para permitir atender às necessidades individuais em situações de risco de vida. KÖBERICH, Stefan [et al.] - Family witnessed resuscitation – experience and attitudes of German intensive care nurses. Alemanha. 2010. Objetivo geral - Explorar experiências de enfermeiros alemães de cuidados intensivos e suas atitudes em relação à presença da família durante a ressuscitação. Método - Estudo descritivo. Questionário e uma Questão Aberta. Amostra - 166 enfermeiros alemães de cuidados intensivos. Principais conclusões - A presença de familiares durante a reanimação trouxe experiências negativas para os profissionais de saúde; há profissionais de saúde que não concordam que os familiares deveriam ter a opção de presenciarem a reanimação; a presença da família pode influenciar negativamente o desempenho dos profissionais durante a reanimação; a presença da família poderia melhorar a compreensão entre profissionais e familiares, abordando temas como tomada de decisão, apoio às famílias, ameaças de violência e envolvimento da família. •



MITCHELL, Marion L.; CHABOYER, Wendy - Family Centred Care – A way to connect patients, families and nurses in critical care. Austrália. 2010.

Objetivo geral - Descrever experiências das famílias na prestação de cuidados individualizados ao seu ente querido em estado crítico, com o apoio da equipa de enfermagem. Método - Estudo qualitativo. Entrevistas telefónicas. Amostra -10 familiares que prestaram cuidados ao seu ente querido em estado crítico. Principais conclusões - Os familiares dos pacientes em estado crítico desfrutam da prestação de cuidados ao seu ente querido; a família sente-se útil; melhoria na comunicação e maior proximidade física e emocional com o paciente crítico; os enfermeiros de cuidados críticos apoiam os familiares a individualizar os cuidados; a inclusão da família promove o sucesso dos cuidados prestados e a relação entre família, paciente crítico e enfermeiros. PASQUALE, Mae Ann. [et al.] - Family presence during trauma resuscitation: Ready for primetime? Estados Unidos da América. 2010. Objetivo geral - Medir os efeitos da presença da família durante ressuscitação em trauma relativamente a ansiedade, satisfação e bem-estar. Método - Estudo quantitativo, prospetivo, comparativo, multivariado. Questionário e registos hospitalares dos doentes. Amostra - 50 adultos membros de famílias, dos quais vinte e cinco estiveram presentes durante a ressuscitação de um familiar gravemente ferido e vinte e cinco não estiveram presentes, num centro de trauma nível 1. Principais conclusões - Familiares presentes durante a ressuscitação referiram que beneficiaram o paciente e ganharam uma melhor compreensão da situação; familiares que não estiveram presentes durante a ressuscitação comentam que teriam preferido •

59

AGOSTO 2014

CIÊNCIA & TÉCNICA

60

estar presentes; familiares presentes durante ressuscitação em trauma não sofreram efeitos psicológicos negativos e tiveram os mesmos níveis de ansiedade, satisfação e bem-estar que os familiares que não estiveram presentes; a qualidade dos cuidados durante a ressuscitação foi mantida, mesmo quando presentes familiares; o facto de os familiares referirem que voltariam a passar pela mesma experiência suporta a ideia de que a presença de um familiar na ressuscitação em trauma não é demasiado traumática; a existência de um protocolo bem estruturado relativamente à presença da família durante ressuscitação em trauma permite que estes estejam presentes sem correr riscos e sem interferências para o paciente. TOMLINSON, Karen R. [et al.] - Family presence during adult resuscitation: a survey of emergency department registered nurses and staff attitudes. E.U.A. 2010. Objetivo geral - Avaliar as atitudes dos enfermeiros e outros profissionais de saúde a respeito da presença da família durante a reanimação de adultos, num departamento de emergência. Método - Estudo quantitativo. Questionário Amostra - 79 enfermeiros e outros profissionais de saúde que trabalham num departamento de emergência. Principais conclusões - A presença da família é permitida perante atos menos agressivos como a punção venosa, mas não é comum em atos mais agressivos; a presença da família pode facilitar a sua perceção sobre o esforço da equipa em reanimar o seu familiar, sendo uma experiência facilitadora para superar uma eventual morte do mesmo; a presença da família pode interferir com o •

processo de reanimação e aumentar o nível de stress da equipa; seriam importantes orientações escritas sobre este tema. VAVAROUTA, Antigone [et al.] - Family presence during resuscitacion and invasive procedures: physicians’ and nurses’ attitudes working in pediatric departments in Greece. Grécia. 2011. Objetivo geral - Determinar o conhecimento, experiências e opiniões dos médicos e enfermeiros gregos, sobre a presença da família durante a reanimação e procedimentos invasivos; investigar a existência de políticas oficiais e práticas sobre a presença da família; examinar possíveis correlações ou fatores que promovem ou limitam a aplicação desta questão. Método - Estudo descritivo, segundo uma abordagem quantitativa. Questionário. Amostra - 44 médicos e 77 enfermeiros que trabalham num departamento de pediatria e unidade de cuidados intensivos neonatais e pediátricos. Principais conclusões - A maioria dos médicos e enfermeiros não estão familiarizados com a presença da família durante a reanimação e procedimentos invasivos; revelou-se ausência de políticas escritas sobre a presença da família; os benefícios da presença da família na ressuscitação ou procedimentos invasivos superam possíveis argumentos negativos, sendo benéfico para a própria família. •

Após esta síntese das evidências encontradas, verifica-se que a origem dos autores é muito variada: 2 artigos têm origem nos E.U.A. e os restantes pertencem a países como Espanha, Dinamarca, China, Alemanha, Austrália e Grécia. Os artigos apurados fo-

CIÊNCIA & TÉCNICA

ram maioritariamente publicados em 2010 e estão enquadrados no paradigma quantitativo, utilizando como instrumento de recolha de dados o questionário. Tivemos oportunidade de perceber que as amostras estudadas reportaram-se a profissionais de saúde do Serviço de Urgência ou de Unidades de Cuidados Intensivos, de adultos e pediátricos, e a familiares do doente crítico. Os objetivos principais dos artigos selecionados foram saber se os profissionais de saúde estão habilitados para lidar com a presença da família em situações criticas e quais as suas experiencias; avaliar as atitudes dos profissionais de saúde perante a presença da família durante a realização de procedimentos ao doente crítico e conhecer as experiencias dos familiares que assistiram à prestação de cuidados ao familiar em estado crítico. Para a análise das evidências contidas nos artigos científicos encontrados, foi utilizada a técnica de análise de conteúdo, proposta por Bardin (2004). A análise de conteúdo pode ser definida como um conjunto de técnicas de análise de comunicação, visando obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores que permitam a inferência de conhecimento. Desta análise surgiram categorias que vão de encontro aos nossos objetivos: influência da presença da família na prestação de cuidados ao doente crítico; presença da família influencia a evolução do estado de saúde do doente crítico e comportamento da família do doente crítico. Emergiram também alguns aspetos relacionados com a temática em estudo que, apesar de darem resposta aos objetivos, não se enquadram nestas categorias, nomeadamente a opinião dos profissionais de saúde face à presença

da família e a inexistência de protocolos quanto a este aspeto. Influência da presença da família na prestação de cuidados ao doente crítico. Da evidência produzida por alguns autores salienta-se um pior rendimento por parte dos profissionais de saúde aquando da presença da família durante a prestação dos cuidados ao doente crítico pediátrico (Gamell Fullà [et al.], 2010). Alguns autores na comunicação de resultados fizeram referência à presença da família durante o processo de reanimação. Tomlinson [et al.] (2010) defendem que esta pode interferir com a reanimação e aumentar o stress da equipa. O mesmo tema foi assunto de interesse de Köberich [et al.] (2010) acrescentando as experiências negativas vivenciadas pelos profissionais de saúde face à presença de familiares, nomeadamente a dificuldade na prestação de cuidados a estes, as ameaças físicas e situações de prolongamento do processo de ressuscitação. Muito recentemente, o artigo de Mitchell e Chaboyer (2010) refutou as ideias anteriores, defendendo que a inclusão da família promove o sucesso dos cuidados prestados e o relacionamento entre esta e os profissionais de saúde. Também Tomlinson [et al.] (2010) defenderam que a presença da família é uma mais-valia durante a prestação de cuidados ao doente crítico, na medida em que, o esforço da equipa em reanimar vai ser mais facilmente percecionado e valorizado pela família. Sobressai, ainda, na evidência produzida a compreensão entre profissionais e familiares como aspeto positivo da presença da família durante o processo de reanimação e facilitador da tomada de decisão (Köberich [et al.], 2010).

61

AGOSTO 2014

CIÊNCIA & TÉCNICA

62

Pelo supracitado, verifica-se que não há unanimidade acerca da presença da família trazer benefícios ou prejuízos à prestação de cuidados ao doente crítico. Mesmo na realidade Portuguesa, não é de comum acordo o procedimento a tomar face à família, pois apesar de, com a criação da Lei n.º 33/2009, “Todo o cidadão admitido num serviço de urgência tem direito a ser acompanhado (…)”, no Artigo 3.º são enunciadas limitações ao direito de acompanhamento, justificadas pela possibilidade de prejudicar a eficácia dos exames e tratamentos a efetuar. Pasquale [et al.] (2010) defendem que a qualidade dos cuidados prestados ao doente crítico é mantida, estando a família presente ou não. Na realidade nacional, tal pode ser conseguido através da mudança de mentalidades, pois segundo a Lei anteriormente referida “(…) compete ao profissional de saúde responsável pela execução do acto clínico em questão (…)” a decisão de autorizar a presença da família ou não. Caso esta autorização seja concedida, importa conhecer a influência da família na evolução do estado de saúde do seu familiar. Presença da família influencia a evolução do estado de saúde do doente crítico. Dos artigos analisados, apenas os autores Mitchell e Chaboyer (2010) e Pasquale [et al.] (2010) fizeram referência à influência da família no estado de saúde do doente crítico. O artigo de Mitchell e Chaboyer (2010) considera que a presença da família melhora a comunicação e permite uma maior proximidade física e emocional com o doente crítico, contribuindo para um melhor relacionamento família - doente crítico. Por sua vez, Pasquale [et al.] (2010) concluíram que a presença da família traz benefícios para o doente,

referindo como exemplo que a família pode providenciar informações valiosas sobre os antecedentes clínicos do doente. Estes achados vêm dar relevo à importância de constituir a família como parceiro da prestação de cuidados, uma vez que podem ter informação que ajude na tomada de decisão, tendo em conta que muitas vezes o doente está inconsciente ou incapacitado de comunicar. Assim, o papel de suporte da família assume-se como relevante, devendo os profissionais de saúde despender tempo a escutá-los. Salientamos que esta foi uma categoria pouco desenvolvida nos estudos analisados, sendo que estes dão mais relevância ao comportamento da família do doente crítico. Comportamento da família do doente crítico. Sendo a família um grupo em que ocorrem interações entre os seus membros, e sendo o bem-estar familiar determinado pela saúde de cada um destes, importa saber como age a família de um doente em estado crítico e os sentimentos que manifesta. Os sentimentos de ter sido útil, ter desfrutado da companhia do familiar e mostrar carinho, foram referidos no estudo efetuado por Mitchell e Chaboyer (2010) por familiares que tiveram oportunidade de prestar cuidados a um familiar em situação crítica. Os autores foram mais longe ao referirem que quando as famílias prestam cuidados físicos estão a fazer muito mais, mostrando que se envolvem com as pessoas que amam. Estes mesmos autores referiram que a envolvência dos familiares na prestação de cuidados melhora o relacionamento com os profissionais. Por outro lado, Tomlinson [et al.] (2010) consideraram que quando uma situação de

CIÊNCIA & TÉCNICA

emergência culmina com a morte do doente, a presença da família é facilitadora para melhor ultrapassar o processo de luto. Isto porque a família pode observar os esforços efetuados para salvar a vida do seu ente querido, ganhando maior compreensão do empenho realizado com vista à recuperação do seu familiar. Com inquietações semelhantes surge o estudo de Pasquale [et al.] (2010), em que referiram que a maior necessidade dos familiares de doentes críticos é ter informação sobre a evolução clínica do doente. No entanto, estes contrapõem algumas das ideias anteriormente referidas, declarando que a presença da família em procedimentos tão invasivos como a ressuscitação pode gerar danos psicológicos aos familiares. Na mesma linha de pensamento, a reconhecer os resultados de Pasquale [et al.] (2010) surgem as conclusões de Gamell Fullà [et al.] (2010), que consideraram o comportamento da família como inoportuno, reportando-se à ansiedade como o motivo primordial para a exclusão dos familiares de uma sala de urgência; surge também com algum peso o facto de não considerarem os familiares preparados para se comportarem perante uma situação mais invasiva. De realçar que este é um estudo de âmbito pediátrico, em que a família dos doentes foram só pais. Pesando os prós e os contras, para as famílias de doentes em estado crítico, pode verificar-se que tudo vai depender da estrutura e processos familiares em causa. Na pesquisa efetuada, surgiram aspetos negativos para a família apenas quando abordados doentes pediátricos e doentes adultos sujeitos a procedimentos muito invasivos; por outro lado, quando o doente crítico é adulto, os familiares referiram que voltariam a passar pela mesma

experiência, tal como no estudo de Pasquale [et al.] (2010), o que suporta a defesa da presença de familiares durante a ressuscitação. Outros aspetos relacionados com a temática em estudo. Prestar cuidados à família é, de acordo com o Regulamento para o Exercício Profissional de Enfermagem (2006), uma incumbência dos enfermeiros, pelo que também o seu sentir face à permissão da presença da família, numa situação de emergência, deve ser considerado. Na opinião de Gamell Fullà [et al.] (2010) a presença dos pais e/ou responsáveis durante a realização de procedimentos invasivos é escassa, especialmente durante os mais invasivos, referindo-se à prestação de cuidados a doentes críticos pediátricos. Ainda segundo estes autores, uma razão para esta evidência é o facto dos profissionais de saúde estarem pouco ou nada de acordo com a presença dos familiares, especialmente durante as técnicas mais invasivas. O estudo conduzido por Agard e Maindal (2009) revela que normalmente os enfermeiros não suportam a presença da família em situações críticas. Esta presença pode gerar ansiedade e stress nos profissionais de saúde; pode distraí-los do seu foco de atenção (o doente), pois a família também necessita de apoio (Tomlinson [et al.], 2010). Já na opinião de Vavarouta [et al.] (2011) não são apenas os enfermeiros, mas também os médicos a não estarem familiarizados com a questão da família testemunhar a reanimação e procedimentos invasivos. Vários autores com as suas comunicações identificaram a ausência de orientações escritas/protocolos sobre a presença da família na prestação de cuidados ao doente crítico

63

AGOSTO 2014

CIÊNCIA & TÉCNICA

64

durante a ressuscitação, sem a família correr risco e sem interferências na reanimação (Pasquale [et al.] (2010), Tomlinson [et al.] (2010), Vavarouta [et al.] (2011)). Refletindo sobre a análise efetuada, considera-se que as categorias descritas foram de encontro aos objetivos desta revisão bibliográfica, respondendo assim às questões orientadoras enumeradas previamente. Quanto à questão orientadora: de que forma a presença da família influência a recuperação do doente crítico e o desempenho dos enfermeiros, numa situação de emergência, foi possível apurar que a presença da família no local da emergência, de alguma forma melhora a condição física e emocional do familiar, uma vez que melhora a comunicação e permite uma maior proximidade física e emocional com o doente crítico; e que a maioria dos profissionais de saúde não se sente à vontade ou considera que não possui habilidades para a prestação de cuidados ao doente crítico com a família do mesmo presente. Verificou-se também que cada membro da família de um doente crítico, seja adulto ou pediátrico, lida de forma diferente com a situação de emergência com que se depara, havendo famílias que repetiriam a experiencia de assistir a uma reanimação bem sucedida, ou porque o seu relacionamento com os profissionais melhorou ou porque obtiveram mais informação. Contrariamente surgem familiares que preferem não o fazer por terem medo de sofrerem danos psicológicos. Obtém-se assim resposta para a segunda questão orientadora: de que forma é influenciado o comportamento da família de um doente crítico, quando permitida a sua presença junto do mesmo.

CONCLUSÃO A qualidade dos cuidados de saúde é promovida através de uma abordagem centrada no doente e sua família, reconhecendo o papel integral da família e encorajando a colaboração mutuamente benéfica entre doente, sua família e profissionais de saúde. É reconhecido que a família do doente crítico deve integrar a unidade de cuidados numa situação de emergência, contudo surgem questões como: A presença da família é benéfica para o doente? É confortável para os profissionais de enfermagem? E a família, o que sente e como reage? Foram estas questões que conduziram à necessidade de identificar a evidência empírica produzida sobre a influência da presença da família junto do doente crítico, numa situação de emergência. Esta revisão de literatura é alvo de algumas limitações. Considera-se que a definição de um horizonte temporal de 5 anos limitou o número de artigos selecionados, no entanto este critério torna possível a obtenção de conhecimento que traduz uma evidência mais atual do tema em estudo. Também o facto de realizarmos pesquisas em apenas 3 idiomas pode ter limitado o número de publicações. Outra limitação consiste no fato de os objetivos dos estudos que incluímos na amostra, serem sobretudo centrados nos profissionais e não nas famílias. Considera-se que o percurso para a concretização desta revisão de literatura despertou a consciencialização da necessidade dos enfermeiros e as próprias instituições de saúde refletirem sobre a sua prática em situações de emergência, no que diz respeito à presença da família do doente crítico, promovendo a formação nesta área. Isto porque, emerge da análise dos oito artigos analisados que existem doentes críticos que retiram benefí-

CIÊNCIA & TÉCNICA

cios da presença dos seus familiares, daí que fosse positivo as pessoas terem esta opção. Seria gratificante constatar que os resultados da investigação constituíssem um pequeno passo em direção à mudança, pois torna-se fundamental os profissionais desenvolverem habilidades práticas necessárias à prestação de cuidados ao doente crítico mesmo com a presença da sua família, e as instituições de saúde elaborarem protocolos que definam as situações em que a família pode ou não estar presente, esclarecendo como atuar para satisfazer as necessidades dos familiares, para que esta não corra riscos e a atuação dos profissionais não ponha em risco o doente crítico. Espera-se assim, com estas breves páginas, deixar aberta uma porta para que possam decorrer outras investigações neste sentido, dado que sem dúvida esta é uma temática a explorar.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AGARD, Anne Sophie; MAINDAL, Helle Terkildsen (2009) - Interacting with relatives in intensive care unit. Nurses’ perceptions of a challenging task. “Nursing in critical care”. Vol. 14, nº.5, p.264-272. BARDIN,L. (2004) - Análise de Conteúdo. Lisboa: Edições70. CINTRA, Eliane de Araújo; NISHIDE, Vera Médice; NUNES, Wilma Aparecida (2000) – Assistência de Enfermagem ao Paciente Crítico. São Paulo: Atheneu. CONSELHO INTERNACIONAL DE ENFERMEIROS (2011) - Classificação internacional para a prática de enfermagem: versão 2. Lisboa: Ordem dos Enfermeiros. Dec.-Lei nº. 161/96 – D.R. I Série. 205 (96-09-04) 29592962. FORTIN, Marie-Fabienne (2009) – Fundamentos e etapas do processo de investigação. Loures: Lusodidacta. FRIEDMAN, Marilyn; BOWDEN, Vicky R.; JONES, Elaine (2003) - Family nursing: Research, theory and practice. 5ª ed. Stamford: Prentice Hall. GAMELL FULLÀ, A. [et al.] (2010) - ¿Están presentes los padres durante los procedimientos invasivos? . “Anales de Pediatría”. Vol. 72, nº.4, p.243-249.

HALL, Jess B. (2009) - Handbook of Critical Care. 3ª. ed. Chicago: Springer. HUNG, Maria S.Y.; PANG, Samantha M. C. (2010) - Family presence preference when patients are receiving resuscitation in an accident and emergency department. “Journal of Advanced Nursing”. Vol. 67, nº.1, p.56-67. KÖBERICH, Stefan [et al.] (2010) - Family witnessed resuscitation – experience and attitudes of German intensive care nurses. “Nursing in critical care”. Vol. 15, nº.5, p.241-250. Lei nº. 33/09 – D.R. I Série. 134 (09-07-14) 4467. MATEUS, Bárbara Aires (2007) – Emergência médica pré-hospitalar: que realidade. Loures: Lusociência. MITCHELL, Marion L.; CHABOYER, Wendy (2010) - Family Centred Care – A way to connect patients, families and nurses in critical care. “Intensive and Critical Care Nursing”. Vol. 26, nº.3, p.154-160. ORDEM DOS MÉDICOS; Sociedade Portuguesa de Cuidados Intensivos (2008) - Transportes de Doentes Críticos. Centro Editor Livreiro da Ordem dos Médicos. PASQUALE, Mae Ann [et al.] (2010) - Family presence during trauma resuscitation: Ready for primetime?. “The Journal of Trauma”. Vol. 69, nº.5, p.1092-1100. RELVAS, Ana Paula (1996) - O ciclo vital da família: perspetiva sistémica. Porto: Afrontamento. SILVA, Luzia; GONÇALVES, Lucia; COSTA, Maria (2006) - Abordagem sistémica de enfermagem à família: considerações reflexivas. “Servir”. Vol. 54, nº.5, p.214-223. TOMLINSON, Karen R. [et al.] (2010) - Family presence during adult resuscitation: a survey of emergency department registered nurses and staff attitudes. “Advanced Emergency Nursing Journal”. Vol. 32, nº.1, p.46-58. VAVAROUTA, Antigone [et al.] (2011) - Family presence during resuscitacion and invasive procedures: physicians’ and nurses’ attitudes working in pediatric departments in Greece. “Resuscitation”. Vol. 82, nº.6, p.713-716.

65

CIÊNCIA & TÉCNICA

ENTRADA DO ARTIGO JANEIRO 2013

Presença das famílias no serviço de urgência durante a reanimação e os procedimentos invasivos. Qual o estado da arte? P. COELHO Mestre em Enfermagem Médico-Cirúrgica. Docente da Universidade Católica Portuguesa

RESUMO A enfermagem deve ter uma abordagem holística nos cuidados e deve envolver o paciente e a família, fundamentalmente nos momentos de crise, como é o caso da vivência de acompanhar um familiar num serviço de urgência com todas as particularidades que lhe estão associadas. O objetivo deste trabalho é saber se a presença da família durante as medidas de reanimação ou procedimentos invasivos têm um impacto positivo ou negativo na família e nos profissionais de enfermagem e quais as atitudes dos enfermeiros nestas situações. Os enfermeiros com formação mais elevada, assim como com uma especialização específica na área

de emergência demonstram uma atitude de maior aceitação à presença de família durante as medidas de reanimação e procedimentos invasivos. Os aspetos positivos para a presença da família são: compreender que as medidas e esforços de reanimação foram as máximas e que tudo foi efetuado pelos profissionais, a oportunidade para a família apoiar o seu ente querido e de se despedir em situações de fim de vida, a participação em decisões de fim de vida, facilitando o processo de luto, providenciar explicações e demonstrar á família que a sua presença é um direito. Como motivos para não haver a presença das famílias são apontados: o baixo nível de conhecimento dos familiares, as memórias traumáticas,

AGOSTO 2014

MANUELA CELESTE SOUSA FERREIRA Enfermeira no Centro Hospitalar de S.João - Porto, Serviço de Unidade de Cuidados Intensivos Polivalente do Serviço de Urgência. Estudante do 5º Curso de PósLicenciatura em Enfermagem, na Universidade Católica Portuguesa.

66

CIÊNCIA & TÉCNICA

a interferência no trabalho dos profissionais, a diminuta escassez de recursos humanos, o aumento do risco de infeção, o desconforto dos profissionais em se sentirem observados na sua atuação e o seu medo de falhar e o obstáculo à comunicação na equipa. Num estudo, efetuado no Hospital da Universidade do Colorado pelas autoras Kathleen S. Oman em 2010, sugere-se a criação de protocolos que permitam aos profissionais dar a opção às famílias de estarem presentes, avaliando os familiares de acordo com as circunstâncias e as suas características para adequar o que será melhor para

Nurses with higher education, as well as with specific expertise in the area of emergency demonstrate an attitude of greater acceptance of family presence during CPR and invasive procedures. The positive aspects to the presence of the family are: understand the measures and resuscitation efforts were the maximum and that everything was done by professionals, the opportunity to support your family and loved ones to say goodbye at the end of life situations, participation in end of life decisions, facilitating the grieving process, provide explanations and demonstrate to the family that their presence is a right.

o paciente. Este protocolo inclui o acolhimento prévio à entrada dos familiares, com as devidas explicações do que estes irão encontrar junto aos pacientes, diminuindo a ansiedade destes e aumentando o nível de confiança nos profissionais. Este trabalho caracterizou-se por uma revisão da literatura tendo por base a pesquisa na ISI of Knowndlege, com os descritores booleanos urgência, enfermagem, família e cuidar, artigos publicados no período de 2010 a 2012. Conclui-se que a pesquisa originou 25 artigos, dos quais foram selecionados 6 após a leitura e dada a pertinência dos mesmos, tendo em conta a sua disponibilidade em texto integral e a sua relevância para o tema em discussão.

As reasons for not having the presence of the families are identified: the low level of knowledge of the family, traumatic memories, interference in the work of professionals, the tiny human resource shortages, increased risk of infection, the discomfort of professionals feel observed in his performance and his fear of failure and an obstacle to communication in the team. The study performed at the Hospital of the University of Colorado by the authors Kathleen S. Oman in 2010, suggests the creation of protocols that enable professionals to give families the option of being present, assessing the family according to the circumstances and characteristics to suit what is best for the patient. This protocol includes the reception prior to the entry of relatives, with appropriate explanations of what they will find with patients, reducing anxiety and increasing this level of confidence in the professionals. This work was characterized by a literature review based on a search of the ISI Knowndlege, with descriptors Boolean urgency, nursing and family care, articles published in the period 2010 to 2012. We conclude that the search yielded 25 articles, of which six were selected after reading and given the continued relevance, taking into account their availability in full text and its relevance to the topic under discussion.

Palavras-Chave: Emergência, Enfermagem, Família; Cuidar. ABSTRACT Nursing must take a holistic approach in the care and should involve the patient and family, mainly in times of crisis, such as the experience of accompanying a family member in the emergency department with all the particularities associated with him. This paper is whether family presence during CPR and invasive procedures has a positive or negative impact on family and nursing professionals and what the attitudes of nurses in these situations.

Keywords: Emergency, Nursing, Family; Caring.

67

AGOSTO 2014

CIÊNCIA & TÉCNICA

68

INTRODUÇÃO As diretrizes da Organização Mundial de Saúde (2010) descritas na declaração de Munique de 2000 e da Ordem dos Enfermeiros expressas no Enquadramento Conceptual e Padrões de Qualidade dos Cuidados de Enfermagem (2001), enfatizam a família como alvo dos cuidados numa crescente centralidade nos sistemas e cuidados de saúde. Torna-se um desafio à investigação em enfermagem encontrar metodologias que permitam aos profissionais nas diferentes áreas de atuação adaptarem-se e consolidarem conhecimentos e estratégias que lhes permitam providenciar cuidados de excelência aos pacientes/famílias. O serviço de urgência é um local privilegiado no contato com familiares que se encontram fragilizados e ansiosos, tornando-se também um local onde os dilemas dos profissionais perante a Família são uma realidade. É essencial que os enfermeiros procurem dar respostas aos problemas do seu quotidiano e a consulta de bibliografia atualizada permite conhecer o estado da arte nesta temática e fornecer dados para melhorar os cuidados. O objetivo deste trabalho é saber se a presença da família durante as medidas de reanimação ou procedimentos invasivos têm um impacto positivo ou negativo na família e nos profissionais de enfermagem e quais as atitudes dos enfermeiros nestas situações.

METODOLOGIA Foi utilizado o método exploratório descritivo com pesquisa avançada na base de dados da ISI of Knowndlege, utilizando

como descritores booleanos “Emergency”, and “Nursing”, and “Family”; and “Caring”. Como critérios de inclusão foram selecionados artigos completos, publicados em inglês, português e espanhol com referências disponíveis, com texto completo e datas de publicação dos últimos 2 anos (2010-2012). Foram encontrados 25 resultados, estes foram analisados, discutindo-se a sua relação com o tema e o objetivo deste trabalho e selecionados 6, tendo como critérios de exclusão serem artigos no âmbito da pediatria.

RESULTADOS Foram encontrados 25 artigos e selecionados 6 que se relacionavam diretamente com o tema enfocando a presença da família durante a reanimação e os procedimentos invasivos e as atitudes dos enfermeiros, assim como os benefícios e as desvantagens enumeradas.

DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Neste capítulo vou resumir os artigos consultados nesta pesquisa e apontar os aspetos mais relevantes que vão de encontro ao objetivo previamente delineado. O artigo de Susan Ellison (2010), descreve um estudo efetuado a 208 enfermeiros de um hospital de New Jersey aplicando o questionário de suporte de presença à família, estudando as variáveis demográficas (idade, sexo, etnia) e atitudes dos enfermeiros perante a família durante as medidas de reanimação e procedimentos invasivos, acrescentando a perceção e crenças pessoais acerca da presença da família para os enfermeiros.

CIÊNCIA & TÉCNICA

Este estudo demonstra a relação significativa entre as atitudes perante a família e as variáveis inerentes aos enfermeiros, tais como a experiência profissional, a sua formação, o tipo de certificação académica e a área de especialização. Segundo esta autora estes fatores são preditores para atitudes positivas perante a presença da família. Como resultados deste estudo enumera-se que os enfermeiros com formação mais elevada, assim como com uma especialização específica na área de emergência demonstram uma atitude de maior aceitação à presença de família durante as medidas de reanimação e procedimentos invasivos. Este estudo também demonstra que a presença das famílias interfere no desempenho dos enfermeiros devido às limitações estruturais das instituições, à escassez de tempo e à falta de recursos humanos que tenham disponibilidade para estarem como o doente e com os seus familiares. A falta de educação e de capacidade da família em compreender a situação e não transmitir ansiedade ao doente também dificulta o trabalho destes profissionais. Um dos aspetos positivos relatados neste estudo é a oportunidade de promover a comunicação entre a família e os profissionais e providenciar apoio e suporte emocional. Deste modo a família compreende que tudo foi efetuado, facilitando o processo de luto, a participação em decisões de fim de vida, providenciar explicações e demonstrar á família que a sua presença é um direito e não uma opção dos profissionais. Aponta como motivos para não haver a presença das famílias o baixo conhecimento dos familiares, as memórias traumáticas, a interferência no trabalho dos profissionais, a diminuta escassez de recursos

humanos, o aumento do risco de infeção, o desconforto dos profissionais em se sentirem observados na sua atuação e o seu medo de falhar. O estudo apresentado por Lori M. Feagan e colegas (2011), realizado em Washington, pretende demonstrar o impacto da educação dos profissionais na promoção de atitudes perante a família durante a reanimação e outros procedimentos invasivos. Neste estudo foram avaliadas as respostas ao mesmo grupo de profissionais (médicos e enfermeiros) em duas fases, antes e após um programa de formação sobre a temática. Estes autores concluíram que a educação e a criação de protocolos com critérios de inclusão e de exclusão para permitir a presença das famílias antes, durante e após os procedimentos demonstrou ser útil e ter um impacto positivo nas atitudes perante a família nos serviços de urgência e emergência. Em 2010, num estudo efetuado no Hospital da Universidade do Colorado pelas autoras Kathleen S. Oman, e colegas, referem que existe uma preocupação crescente nos profissionais de saúde em saber o efeito da presença da família durante as manobras de reanimação e procedimentos invasivos nos familiares dos pacientes. Neste estudo são apontadas vantagens que passo a referir: família saber o estado do paciente, a oportunidade para a família apoiar o seu ente querido e de se despedir em situações de fim de vida, a família perceber que as medidas e esforços de reanimação foram as máximas, assim como a perceção da personalidade do paciente através do que a família pode transmitir, permitindo assim o cuidado holístico ao paciente e á sua família.

69

AGOSTO 2014

CIÊNCIA & TÉCNICA

70

Como desvantagens neste estudo são enumerados: o trauma para a família, o medo da família e como podem transmiti-lo ao paciente, a ansiedade para os profissionais que se sentem observados, o obstáculo à comunicação na equipa. Todos estes fatores contribuem para a contínua controvérsia existente sobre a presença da família nos momentos de crise. Neste estudo sugere-se a criação de protocolos que permitam aos profissionais dar a opção às famílias de estarem presentes, avaliando os familiares de acordo com as circunstâncias e as suas características para adequar o que será melhor para o paciente. Este protocolo deverá incluir ainda que se deverá perguntar ao paciente, no caso dos procedimentos invasivos, se quer a família presente e qual o membro e caso não possa expressar a sua vontade assegurar que seja respeitada a vontade da família. A decisão da presença da família deverá ser consensual na equipa e sempre que a instabilidade do paciente justifique ou os procedimentos sejam mais invasivos, ou a família se torne emocionalmente perturbadora esta deva abandonar o local. É de realçar que estes protocolos de atuação estão recomendados desde 2004, contudo ainda poucos hospitais dispõem dos mesmos. No artigo de Elinar Lowry, (2012) é relatado como num hospital de Chicago a utilização de um protocolo desde 1992 é considerada uma vantagem para os profissionais. Neste estudo é referido como 14 enfermeiras de urgência descrevem as suas experiências perante a presença das famílias, através da análise de conteúdo das entrevistas efetuadas. Este protocolo é útil na medida em que define quando e como a família deve estar presente, assim como

quando deverá sair com critérios adequadamente estabelecidos. Neste estudo são enunciadas as vantagens e desvantagens da presença dos familiares junto aos pacientes em situações de urgência, e acrescenta que estes profissionais deveriam ter um suporte emocional adequado para lidar com estas famílias. Este protocolo inclui o acolhimento prévio à entrada dos familiares, com as devidas explicações do que estes irão encontrar junto aos pacientes, diminuindo a ansiedade estes e aumentando o nível de confiança nos profissionais. Num estudo publicado em 2011, realizado por Darcy Egging e colegas, é efetuada uma revisão sistemática da literatura com os descritores “ presença da família” e “emergência” e “procedimentos invasivos ou reanimação”, nas bases de dados da Pubmed e Crochane publicados entre 2005 e 2009. Deste estudo emergem algumas recomendações de nível A e B e também o que não é recomendado. Existe uma evidência fraca do ponto de vista dos pacientes dada a escassez de estudos nesta temática. Os poucos estudos referem que estes ficam contentes com a presença dos familiares, embora também refiram que é traumatizante para os seus familiares assistirem a procedimentos mais invasivos. Para as famílias a evidência demostra que estes se sentem mais satisfeitos em estarem presentes pois têm a perceção que tudo o que era possível ser feito pelos seus familiares foi efetuado. Como conclusões deste estudo aponta-se como evidencia nível A que as famílias desejam que lhes seja dada a opção de estarem presentes junto dos seus familiares. É de evidência forte que os profissionais de-

CIÊNCIA & TÉCNICA

fendem que devem ser providenciadas explicações e suporte emocional aos familiares. Salienta-se a evidência de nível B dada à necessidade de serem instituídas políticas ou protocolos de atuação que providenciem estruturas e medidas de suporte emocional também garantido aos profissionais. Alisha Gozdzialski e colegas, em 2012, referem a partir de estudos realizados e referidos no artigo das mesmas que a admissão a uma sala de emergência pode ser considerado um evento repleto de stress para o paciente e para a sua família. Uma comunicação eficaz entre os profissionais e os pacientes e/ou as suas famílias é muito importante e é um desafio para todos os profissionais. Contribui para aumentar o grau de satisfação dos familiares providenciar a informação adequada durante a permanência do paciente no serviço de urgência, dar tempo à família para colocar questões e dúvidas e adequar as informações às circunstâncias singulares de cada família.

CONCLUSÕES Os cuidados centrados no doente e na sua família são um aspeto essencial na enfermagem e sem dúvida na enfermagem de urgência. A enfermagem deve ter uma abordagem holística nos cuidados e deve envolver o paciente e a família, fundamentalmente nos momentos de crise, como é o caso da vivência de acompanhar um familiar num serviço de urgência com todas as particularidades que lhe estão associadas. A revisão da bibliografia efetuada foi pertinente e contribuiu para obter algumas conclusões que são extremamente úteis para a melhoria da qualidade dos cuidados providenciados à nossa população e tam-

bém otimizar medidas de suporte emocional e institucional aos profissionais que lidam de perto com estes dilemas nos seus locais de trabalho. O objetivo deste trabalho foi saber se a presença da família durante as medidas de reanimação ou procedimentos invasivos têm um impacto positivo ou negativo na família e nos profissionais de enfermagem e quais as atitudes dos enfermeiros nestas situações. Após a leitura destes estudos conclui-se que cada vez mais os profissionais de saúde demonstram uma atitude de maior aceitação à presença de família durante as medidas de reanimação e procedimentos invasivos, isto porque cuidar alguém implica cuidar também a sua família e amigos e se os profissionais de saúde conseguirem incutir nas famílias o sentimento de confiança de que todos os esforços foram empreendidos quer no tratamento como nos cuidados de reanimação, teremos certamente um processo de aceitação da doença ou luto facilitado aos familiares. A decisão da presença da família deverá ser consensual na equipa e sempre que a instabilidade do paciente justifique ou os procedimentos sejam mais invasivos, ou a família se torne emocionalmente perturbadora esta deve abandonar o local. É de realçar a sugestão de protocolos de atuação que segundo os estudos estão recomendados desde 2004, contudo ainda poucos hospitais dispõem dos mesmos. Estes protocolos incluem o acolhimento prévio à entrada dos familiares, com as devidas explicações do que estes irão encontrar junto aos pacientes, diminuindo a ansiedade destes e aumentando o nível de confiança nos profissionais.

71

AGOSTO 2014

CIÊNCIA & TÉCNICA

72

Contudo, para os profissionais existem algumas barreiras perante a presença das famílias, estes referem sentirem-se observados na sua atuação e têm medo de falhar, assim como acrescentam que é um obstáculo à comunicação dentro da equipa. Os protocolos de atuação neste âmbito devem comtemplar estruturas e medidas de suporte emocional também garantido aos profissionais. A elaboração deste artigo surgiu com o objetivo de permitir aos profissionais de saúde a reflexão sobre uma temática muito discutida na atualidade, contudo os estudos efetuados são na maioria a nível internacional e daí considerei pertinente promover a discussão à luz da nossa realidade. Deste modo, vou expor como observador participante o que de relevante me trouxe a permanência num dos maiores serviços de urgência de Portugal, durante o estágio inserido na especialização em Enfermagem médico-cirúrgica. Para isso, considerei que a revisão integrativa é um dos métodos que melhor se adequa a este trabalho, pois consiste num método de pesquisa que permite a incorporação das evidencias na prática clinica. Este método tem como finalidade reunir e sintetizar resultados de pesquisas sobre um determinado tema, contribuindo para o aprofundamento do conhecimento do tema investigado, conduzindo os enfermeiros à pratica baseada na evidencia, ampliando a qualidade dos cuidados de enfermagem. Uma revisão integrativa é um método de pesquisa que procura contribuir para a melhoria do cuidado prestado ao paciente e família, e facilita a incorporação de evidências, agilizando a transferência de conhecimento novo para a prática, conforme

nos diz Mendes et al (2008). Após a síntese dos resultados desta pesquisa, importa incorpora-los na nossa prática diária, permitindo dessa forma assumirmos o compromisso da prática baseada na evidência, transportando os conhecimentos obtidos para a realidade. Ao realizar o meu estágio num serviço de urgência polivalente deparei-me com a necessidade de efetuar esta pesquisa, dado que me deparei com inúmeras situações em que não foi possibilitado às famílias estar junto dos pacientes e noutros casos em a família esteve presente, esse fato causar algumas divergências entre os profissionais ou entre outros pacientes ou familiares. De acordo com a Lei nº 33/2009 da Assembleia da República de 14 de julho, o serviço de urgência deve permitir a entrada de um acompanhante por utente, contudo no nosso país o cumprimento desta lei nem sempre tem sido possível, dadas as limitações de espaço das nossas urgências, aliado ao crescente número de pessoas que acorrem todos os dias a um serviço de urgência. Se ainda não reunimos condições de aplicabilidade de uma lei que confere o direito a alguém para estar acompanhado num momento tão delicado, como poderemos evoluir para o debate que outros países impõem- a presença da família durante as manobras de reanimação- sim ou não? Penso que ao refletirmos sobre esta matéria haja a consciencialização da necessidade de mudar. Não sendo possível obter dados concretos da nossa realidade, dadas as limitações inerentes ao tempo disponível, importa referir algumas opiniões recolhidas junto dos profissionais da urgência acerca das vantagens e desvantagens da presença dos fa-

CIÊNCIA & TÉCNICA

miliares durante a realização dos procedimentos invasivos ou mesmo nas manobras de reanimação. É quase consensual que a presença dos familiares diminui o número de conflitos entre familiares e profissionais, dado que estes estão a par de todos os procedimentos efetuados e as duvidas acerca do estado clinico vão sendo dissipadas ao longo da estadia na urgência, aumentando o nível de confiança nos cuidados e nos profissionais. Contudo, apontam a falta de recursos humanos e de estruturas físicas para possibilitarem a permanência da família no serviço de urgência, tendo em conta o respeito pela privacidade e dignidade da Pessoa Humana. Em relação à presença durante as manobras de reanimação, aqui a realidade que vivenciei ainda se encontra longe do que nos apontam os estudos efetuados. Para estes profissionais a população portuguesa ainda não está preparada a nível cultural e de conhecimentos para poder assistir à reanimação do seu familiar, permitindo aos profissionais o desempenho adequado das suas funções, sem interferências. Em relação aos familiares pude constatar que cada vez mais se integram nos cuidados, havendo uma maior aproximação entre familiares e profissionais, fato esse devido a uma maior abertura das instituições às famílias e ao espirito dos profissionais que cada vez mais se disponibilizam a estar com as famílias, perdendo o medo da exposição, aumentando a sua autoconfiança, o que de certa forma permitirá a valorização de uma imagem de um profissional com sentido ético e humano ao mais alto nível, e é sem duvida aqui que devemos estar nós… os enfermeiros.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Egging D., Crowley M., Arruda T., Proehl J., Walker-Cillo G., Papa A., Li S., Walsh J., (2011)- Emergency nursing resource: family presence during invasive procedures and resuscitation in the emergency department, ENA Emergency Nursing Resource Development Committee, September volume 37 .p.469-473 acedido em 20 de outubro de 2012 em: www.jenonline.org Ellison’s A., (2010)- Family Presence During Resuscitative Efforts and Invasive Procedures, Nurses’ Attitudes Toward, Journal of emergency nursing, Old Bridge December 29:6 pag 521-529 Feagan S., Fisher S., (2011) - The impact of education on provider attitudes toward family-witnessed resuscitation, Journal of emergency nursing volume 37 • Spokane Valley, May 2011,p. 231-239 Gordon J., (2010) - The patient experience in the emergency department: A systematic synthesis of qualitative research International, Emergency Nursing 18,p. 80– 88 acedido em 20 de outubro de 2012 em: www.sciencedirect.com journal elsevierhealth.com/journals/aaen

homepage:www.

Gozdzialski S., Schlutow M., Pittiglio L., (2012)- Patient and family education in the emergency department: how nurses can help, Faye P. Everson, May volume 38, p.293-295 acedido em 20 de outubro de 2012 em: www.jenonline.org Lowry, E., (2012) - “It’s just what we do”: a qualitative study of emergency nurses working with wellestablished family presence protocol, Chicago, July, volume 38 p. 329-334,acedido em 20 de outubro de 2012 em: www.jenonline.org Mendes K., Silveira C., Galvão C., (2008) - Revisão integrativa: método de pesquisa para a incorporação de evidências na saúde e na enfermagem, Texto Contexto Enferm., Florianópolis, out-dez; p.758-64 Oman,K., Duranl C.,(2010)- Health care providers’ evaluations of family presence during resuscitation, Journal of emergency nursing volume 36, Denver November, p.524-533

73

CIÊNCIA & TÉCNICA

ENTRADA DO ARTIGO ABRIL 2013

TRAUMATISMO TORÁCICO. Lesões não específicas VANESSA ALEXANDRA G. DOMINGUES Licenciada em Enfermagem

SARA CORREIA Licenciada em Enfermagem

WILSON NOGUEIRA Licenciado em Enfermagem

RESUMO O presente artigo está direcionado para o Traumatismo Torácico, mais incisivamente para as lesões não específicas, nomeadamente as Lesões Pulmonares, que se dividem em Lesão da Laringe, Lesão da Traqueia, Lesão Brônquica, Pneumotórax (aberto e de tensão), Hemotórax, Contusão Pulmonar, e Lesão do Diafragma; Lesões Cardíacas e dos grandes vasos que englobem as Contusões Cardíacas, Lesões Cardíacas Penetrantes, Tamponamento Cardíaco, e Rotura da Aorta; e, por último, as Lesões Esofágicas.

ABSTRACT This article is directed towards Thoracic Trauma, more incisively to unspecific lesions, namely Pulmonary Injuries which are divided in Laryngeal Lesion, Traqueal Lesion, Bronchial Lesion, Pneumothorax (open and tension), Hemothorax, Pulmonary Contusion and Lesion of the Diaphragm; Cardiac and Major Blood Vessel Injuries which include Cardiac Contusions, Penetrating Cardiac Injuries, Cardiac Tamponade and Aortic Rupture; and finally, Esophageal Injuries.

Palavras-Chave: Traumatismo Torácico; Lesões não específicas (Lesões Pulmonares, Lesões Cardíacas e dos grandes vasos; e Lesões esofágicas).

Keywords: Thoracic Trauma, Unspecific Lesions (Pulmonary Injuries, Cardiac and Major Blood Vessel Injuries, Esophageal Injuries).

AGOSTO 2014

ANTÓNIO BRANCO Licenciado em Enfermagem

74

CIÊNCIA & TÉCNICA

Uma vez que as Lesões não específicas decorrentes de um Traumatismo Torácico não são tão visadas pela comunidade científica, achámos pertinente o seu desenvolvimento e consequente aprofundamento. Como objetivos delineámos: • Compreender o conceito de trauma e quais os mecanismos que lhe estão associados; • Obter conhecimentos teórico-práticos acerca do Traumatismo Torácico, nomeadamente, as lesões não específicas; • Adquirir competências para a prestação de cuidados de enfermagem ao doente com Traumatismo Torácico. O TRAUMA Urden, Stacy e Lough (2008) entendem por trauma como sendo uma doença ocasionada por um agente físico como a energia de radiação, elétrica, química ou mecânica, através do deslocamento de energia sobre um corpo. Segundo Castro e Aricó (2007), o trauma é resultado da falta de cuidados, de perceção ou distração de outrém, podendo ser intencional ou não intencional. Deste modo, esta lesão é a principal causa de morte nos adultos jovens e é a terceira causa de morte em todas as idades, mas nunca é demais referir que é uma morte evitável. A prevenção do trauma é de longe a mais barata e o modo mais seguro para o gerir. Os traumatismos dividem-se em não-penetrante/por impacto e em penetrante. O primeiro é uma lesão em que a pele não apresenta solução de descontinuidade nem há contacto com o ambiente exterior. Apesar da extensão destas lesões não ser tão visí-

vel, elas podem constituir um maior risco de vida, uma vez que é difícil fazer um diagnóstico definitivo. A energia deste tipo de traumatismo transmite-se em todos os sentidos, pelo que determinados órgãos ou tecidos irrompem ou fazem rotura. As forças não-penetrantes mais frequentes são os acidentes de viação, quedas, desportos de contacto e agressões. Quanto ao segundo tipo de traumatismo, o penetrante, Sheehy (2001) refere que este tipo de lesões é “(…) provocada por penetração de objetos estranhos em movimento, no corpo.” A energia obtida pelo objeto estranho dissipa-se para os tecidos ou zonas circundantes. A mesma autora indica-nos que a avaliação deste tipo de traumatismo depende “(…) do agente responsável pelo ferimento, do modo como a energia se dissipa, da distância entre a vítima e a arma e das características dos tecidos atingidos.” A gravidade das lesões depende da duração da exposição, sentido e magnitude da energia aplicada, e da região corporal para a qual a mesma energia é direcionada (Urden et al., 2008: 990). Cerca de 70% das lesões torácicas são causadas por este tipo de traumatismo. Anatomia do tórax O esqueleto da cavidade torácica é constituído pelo esterno, costelas, as cartilagens costais e vértebras torácicas (figura 1) apresentando alguma mobilidade para facilitar os movimentos respiratórios. As costelas ligam-se às vértebras torácicas na parte posterior; já na parte anterior, os sete primeiros pares ligam-se diretamente ao esterno; da oitava à décima vértebra, estas ligam-se ao mesmo mas pela fusão da cartilagem; os dois últimos pares – as flutuan-

75

CIÊNCIA & TÉCNICA

AGOSTO 2014

tes - não possuem ligação anterior (Seeley, Stephens e Tate, 2011). O diafragma constitui o bordo inferior do tórax, sendo o bordo superior contínuo às estruturas do pescoço (Sheehy, 2001). As estruturas internas da caixa torácica são constituídas por órgãos e estruturas dos sistemas respiratório, cardiovascular e gastrointestinal. As estruturas pulmonares estão situadas no espaço pleural, enquanto que as estruturas cardiovasculares e gastrointestinais situam-se no mediastino (cavidade que se encontra entre os dois espaços pleurais).

76

Lesões não específicas Decorrente do Traumatismo Torácico, podem surgir as seguintes lesões não específicas: Lesões Pulmonares; Lesões Cardíacas e dos grandes vasos; e, as Lesões Esofágicas. Resultante de Lesões Pulmonares, pode surgir Lesão da Laringe. A fratura da laringe não e um problema comum, mas colocam em risco a vida do doente, Khsetry (1994), Lewis (1986) e Pate (1989); cit. por Sheehy (2001). Os mecanismos que originam esta lesão, baseiam-se na aplicação de força na face anterior do pescoço, como em casos de embate contra volante, agressões nesta zona, estrangulamento. A lesão não-penetrante da laringe é sugerida pelo enquadramento histórico do sucedido, no entanto, o doente pode apresentar amolecimento ou crepitação localizados. Por vezes torna-se necessária a realização de exames complementares de diagnóstico como a radiografia lateral aos tecidos moles do pescoço ou mesmo Tomografia Axial Computadorizada (TAC). Em doentes com dificuldade respiratória grave ou obstrução, está indicada a entubação, caso a mesma seja dificultada, pode realizar-se traqueotomia, de acordo com American

College of Surgeons (1993) e Wilson (1986); cit. por Sheehy (2001), mas, “regra geral, na Urgência realiza-se cricotirotomia, reservando-se a traqueotomia para tratamento cirúrgico” (Sheehy 2001:322). Quanto ao tratamento, no caso de traumatismo penetrante, a intervenção cirúrgica deve ser realizada de imediato. Este traumatismo pode vir acompanhado por lesão da carótida ou da veia jugular. Nas lesões por projétil, está associada destruição extensa do pescoço e também deverá ser considerada lesão cervical. Na Lesão da Traqueia, os mecanismos de lesão assemelham-se aos da laringe, referidos anteriormente, podendo ser um traumatismo penetrante ou não-penetrante. No caso não-penetrante podem ser “subtis ou agudas” (Sheehy 2001:323). O único sinal, por vezes, de uma obstrução parcial é a respiração ruidosa, enquanto que a ausência de respiração reflete uma obstrução total. O diagnóstico torna-se ainda mais complicado caso o doente apresente alterações de consciência. A avaliação é feita a partir de broncoscopia, TAC e laringoscopia. O tratamento passa por entubação ou traqueotomia, em casos mais graves recorre-se a tratamento cirúrgico. Na Lesão Brônquica, o traumatismo não-penetrante do tórax, segundo Sheehy (2001), tem uma elevada mortalidade devido ao diagnóstico tardio e por vezes inexistente. No traumatismo penetrante, em algumas ocasiões, é apenas verificada durante a intervenção cirúrgica realizada por outras razões. A hemoptose, enfisema subcutâneo, fervores ou crepitações mediastínicos (sinal de Hamman), e pneumotórax de tensão com deslocamento do mediastino, são sinais e sintomas desta lesão. Na sequência do pneu-

CIÊNCIA & TÉCNICA

motórax de tensão o doente pode apresentar dispneia, taquicardia e poucos ou mesmo nenhuns sons respiratórios, Sheehy (2001). Baseado em Sheehy (2001), o tratamento passa por suporte das vias aéreas ate à remissão da inflamação e do edema. Nos doentes em que se verifique um rasgamento significativo é necessário o tratamento cirúrgico. Relativamente ao Pneumotórax, esta lesão consiste na acumulação de ar no espaço pleural devido ao colapso parcial ou total do pulmão com diminuição da pressão intrapleural. A lesão pode ter como etiologia, também, o traumatismo penetrante e/ou não-penetrante. A fratura de costelas com laceração dos tecidos do pulmão – traumatismo não-penetrante –, é a causa mais comum desta lesão. Como sinais, o doente refere dor no peito e dispneia. A auscultação do pulmão revela poucos ou nenhuns sons respiratórios e à precursão, verifica-se híper-ressonância. A taquicardia e taquipneia podem estar presentes. Caso o ar se acumule no mediastino podemos verificar o sinal de Hamman. Os exames radiológicos são importantes para a confirmação desta lesão. O tratamento passa pela utilização de um dreno torácico com um sistema subaquático de drenagem uma vez que, assim, há uma aspiração do ar e facilita-se a reexpansão do pulmão. Depois de verificada a colocação correta do dreno, o doente deve estar ereto para diminuir a pressão dos órgãos abdominais sobre o diafragma, sendo também realizada hiperventilação com oxigénio. De acordo com Sheehy (2001), o Pneumotórax pode-se dividir em Pneumotórax Aberto e Pneumotórax de Tensão. No primeiro, verifica-se esta lesão quando existe uma abertura no tórax de dimensão superior

a dois terços do diâmetro da traqueia. Assim o ar em vez de entrar pela traqueia, fá-lo pela parede torácica. Esta lesão resulta na sua maioria por traumatismos penetrantes. Quando o doente inspira o ar entra para o tórax, devido à perda de pressão intratorácica, não sendo expelido, consequentemente a pressão aumenta podendo formar-se um pneumotórax de tensão. O doente apresenta dor no peito, dispneia, hipotensão, sons respiratórios reduzidos ou ausentes, também é frequente surgirem bolhas de ar em volta da ferida. O tratamento imediato passa pela utilização de um penso oclusivo fixado em três pontos, permitindo que o ar saia e impedindo que este entre durante a inspiração. O doente deve estar monitorizado para despiste de sinais de pneumotórax de tensão, caso se verifique, o penso deve ser retirado e aplicado dreno. O tratamento definitivo é realizado através de um encerramento cirúrgico. A mesma autora refere que, no segundo – Pneumotórax de Tensão –, a acumulação de ar num espaço pleural provoca deslocação das estruturas para o lado não afetado, implicando risco de vida. O ar entra para a cavidade pleural através da inspiração mas o movimento inverso não se verifica com a expiração. Consequentemente as estruturas intratorácicas são comprimidas com a deslocação do mediastino. Na auscultação à redução ou mesmo ausência dos sons respiratórios, e caso o doente esteja vígil, poderá manifestar dor no peito, dispneia. A compressão do coração provoca disritmia, diminui o enchimento diastólico e o débito cardíaco. O ingurgitamento das veias do pescoço decorre do deficiente retorno venoso devido à compressão do coração, mas no caso de hipovolémia concomitante o ingurgitamento não se verifica.

77

AGOSTO 2014

CIÊNCIA & TÉCNICA

78

No tratamento imediato deve ser feita a descompressão do lado afetado utilizando-se um cateter de calibre catorze ou dezasseis. Introduz-se no segundo espaço intercostal, na linha média da clavícula, ou no 5º espaço intercostal, na linha axilar anterior, no lado afetado. A terapia definitiva consiste na entubação torácica (Sheehy, 2001). O Hemotórax consiste na acumulação de sangue na cavidade pleural resultante de uma hemorragia do parênquima pulmonar, lesão do coração, grandes vasos, e das artérias mamárias internas, no entanto, a causa mais frequente é a lesão das artérias intercostais. Como sinais e sintomas o doente refere dor torácica, apresenta alteração dos sons respiratórios, que podem estar diminuídos ou ausentes, e, no lado afetado, o doente apresenta percussão dura do tórax. No tratamento deve ser realizada hiperventilação com oxigénio, por máscara de não reinspiração, ou em casos graves entubação endotraqueal, linhas intravenosas de grande calibre para reposição de fluídos. A drenagem torácica deve ser cuidadosamente observada, a fim de se avaliar a necessidade de autotranfusão. A Contusão Pulmonar verifica-se quando o parênquima pulmonar subjacente é lesado provocando edema e hemorragia. As forças de concussão e de compressão são a causa mais comum da contusão pulmonar. “A lesão do parênquima pulmonar provoca rotura e hemorragia para o tecido pulmonar, para os alvéolos e vias aéreas inferior” (Sheehy 2001:326). Esta situação provoca colapso das vias aéreas e perda de ventilação, originando um shunting pulmonar seguido de hipoxemia. A reação inflamatória resultante dificulta a hematose pulmonar agravando o quadro clínico. Nestas lesões podem estar presentes sinais e sintomas como dispneia,

hemoptise, hipoxia e, por vezes, escoriação ou equimoses da parede torácica. Durante a auscultação o doente pode apresentar sons normais, mas a gasimetria arterial pode revelar anomalias. No tratamento, o doente deve ser posicionado em semifowler, de modo a facilitar a reexpansão pulmonar, aspiração e fisioterapia torácica. Nas situações em que o doente estiver em hipoxia, a contusão pulmonar pode afetar mais de 28% dos pulmões, segundo Shehhy (2001:326). Em casos de sinais de choque, fratura de oito ou mais costelas, idade avançada ou doença pulmonar subjacente, pode ser necessária a entubação e ventilação mecânica. A administração de fluidos deve ser restrita, a não ser que haja presença de sinais de hipovolémia. O traumatismo torácico pode provocar, também, Lesões do Diafragma. O não-penetrante origina “grandes rasgamentos radiais, acompanhados de herniação das estruturas abdominais para o tórax” (Sheehy, 2001:326). A maioria destas lesões ocorre do lado esquerdo, pois o oposto encontra-se protegido pelo fígado. Sinais e sintomas como dispneia, abdominalgias, epigastralgias, com irradiação para o ombro esquerdo (sinal de Kehr), ruídos hidroaéreos na extremidade inferior do tórax e diminuição dos sons respiratórios no lado afetado. A cirurgia de reparação constitui-se como tratamento nestas situações. As Lesões Cardíacas e dos Grandes Vasos englobam, de entre outros, as Contusões Cardíacas. “A contusão cardíaca e a sufusão do coração, geralmente resultante de traumatismo não-penetrante da face anterior do tórax” (Sheehy, 2001:327). Assim, o miocárdio pode apresentar contusão que se assemelha ao enfarte do mesmo. Na avaliação por ecocardiograma, em lesões moderadas,

CIÊNCIA & TÉCNICA

podem não ser reveladas alterações apesar de estarem presentes disritmias. Em lesões extensas, o mesmo exame poderá revelar sinais de disfunção do miocárdio, (Daleiden, 1994; cit. por Sheehy, 2001). Os sinais e sintomas de contusão não são específicos, no entanto, podem estar presentes equimoses da face anterior do tórax, dor no peito semelhante à da angina de peito, mas a dor resultante da contusão não responde aos vasos dilatadores, ao contrário da angina de peito. Através da realização do Eletrocardiograma (ECG), na sua leitura é observável taquicardia sinusal, fibrilhação auricular, flutter auricular e contrações ventriculares prematuras. Na observação dos ECGs verificam-se, também, alterações do segmento ST e da onda T, prolongamento do intervalo QT, e bloqueio do ramo fascicular direito. Este exame de diagnóstico é importante pois possibilita a distinção do tipo de patologias reforçando a veracidade do diagnóstico clínico. Disritmias; lesão valvular e rotura; tromboembolismo; e insuficiência cardíaca congestiva, são consequências da contusão cardíaca. “O tratamento consiste em motorização do doente durante vinte e quatro horas no mínimo” (Sheehy, 2001:327). Os doentes com anomalias no ECG devem realizar ecocardiograma e, se apresentarem alterações neste último, devem realizar tratamento sintomático. Por sua vez, aqueles que não apresentam quaisquer alterações no ECG ou que se mantenham assintomáticos durante vinte e quatro horas, não requerem tratamento. Nas Lesões Cardíacas Penetrantes, “A maioria das vítimas com lesão cardíaca penetrante chega à Urgência em paragem cardíaca, hipotensão significativa na sequência do tamponamento cardíaco ou hemorragia”

(Sheehy, 2001:327). Devido à posição anterior do ventrículo direito, este é o maioritariamente afetado. A taxa de sobrevivência, segundo esta autora, depende muito do diagnóstico precoce e do tratamento. Nos doentes que apresentem paragem cardíaca, está indicada a realização imediata de toracotomia na Urgência. No ECG sem alterações não é necessária avaliação posterior, mas nos casos com alteração, que indiquem tamponamento, aludem para a necessidade de fenestração subxifoideia. “Na exploração subxifoideia positiva está indicada cirurgia cardíaca, para reparação da anomalia” (Sheehy, 2001:327). O Tamponamento Cardíaco ocorre com o preenchimento rápido do pericárdio com sangue, havendo, deste modo, uma redução do “enchimento dos ventrículos” (Sheehy, 2001:328), aumentando a pressão exercida no coração. Assim, verifica-se uma redução da eficácia da contração do coração diminuindo, consequentemente, o débito cardíaco. Esta lesão possui um conjunto de sintomas clássicos – Tríade de Beck. A hipotensão deriva da redução do débito cardíaco; os sons cardíacos abafados derivam da capacidade de isolamento do sangue; e o ingurgitamento deve-se há deficiente capacidade do coração em dilatar-se, impedindo o normal retorno venoso. A hipovolémia associada pode dificultar a manifestação destes sintomas. A principal etiologia desta lesão são os traumatismos penetrantes. A pericardiocentese pode funcionar como meio de diagnóstico mas, nesta situação, existe o risco de lesões secundárias. Esta intervenção pode também ser um meio contemporizador, isto é, através dela melhora-se a função cardíaca ate à realização da cirurgia. Segundo Sheehy (2001) o ECG e a radiografia

79

AGOSTO 2014

CIÊNCIA & TÉCNICA

80

torácica não são meios de diagnósticos fiáveis devido às alterações contraditórias nos parâmetros de avaliação. “Certos doentes apresentam frequência anormal, conhecida por alternância elétrica. A deteção precoce e a intervenção rápida são cruciais para a sobrevivência do doente” (Sheehy, 2001:329). Na Rotura da Aorta, segundo Sheehy (2001:329), a maioria das vítimas morre no local do acidente, sendo poucas as que sobrevivem no percurso até ao hospital. Assim, o diagnóstico precoce e a intervenção cirúrgica rápida, são extremamente importantes para a sobrevivência pois, segundo a autora, mais de metade vítimas sem tratamento nas primeiras quarenta e oito horas morrem. O doente refere dor intensa e persistente no peito ou nas omoplatas. Verifica-se dispneia e hemoptise. “Se houver perda da integridade da válvula aórtica, ouve-se um sopro sistólico alto, precordial” (Sheehy, 2001:330). Outros sinais são o choque hipovolémico; a diferença abrupta nos valores da tensão arterial dos membros superiores; a síndroma de coartação aguda; e nos membros inferiores a perfusão sanguínea está diminuída ou mesmo ausente. O exame de diagnóstico mais utilizado é a radiografia torácica aórtica que demonstra uma dilatação mediatínica. O meio mais fidedigno é o aortograma, mas este revela riscos pois a administração de corante radiopaco pode agravar a lesão, ou até mesmo provocar uma secção total da aorta. O tratamento desta lesão consiste na reparação cirúrgica imediata. Na Urgência, o tratamento passa pela cateterização de veias com cateteres de grande calibre, de forma a repor fluidos, e pela colheita de sangue para triagem e compatibilidade. Por último, a Lesão esofágica é rara, mas geralmente é letal. Provoca mediastinite, de-

rivado à contaminação proveniente da saliva e do conteúdo gástrico. “O doente poderá sentir dor e/ou choque, desmesurados para a lesão torácica visível” (Sheehy, 2001:330). O diagnóstico é confirmado por exames de contraste ou esofagoscopia. O tratamento nestas situações é a reparação cirúrgica.

CONSIDERAÇÕES FINAIS As lesões não específicas, consequência do Traumatismo Torácico, são inúmeras e com grandes diferenças entre si. Estas podem constituir um risco de vida imediato para a vítima, uma vez que são lesões que acarretam complicações para os órgãos vitais tendo em conta o seu mecanismo de lesão e, nalguns casos, o seu difícil e tardio diagnóstico. Como tal, o enfermeiro deverá ter um papel ativo na deteção dos sinais e sintomas decorrentes de cada lesão de modo a poder implementar um tratamento o mais precocemente possível. Tendo em conta a escassez de informação sobre esta temática, com a leitura deste artigo, é possível ampliar o leque de conhecimentos teórico-práticos, tal como fora delineado inicialmente nos objetivos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Castro, M. A.F.; Aricó, T. P. (2007). Cinemática do Trauma – Avaliação da energia envolvida. Revista emergência Clínica. Ano 2. Nº7. pp. 28-34 Urden, L.; Stacy, K.; Lough, M. (2008). Thelan´s – Enfermagem de Cuidados Intensivos: Diagnóstico e Intervenção. (5ª edição). Loures: Lusodidacta. Phipps, W. J., Marek, J. F., Sands, K. J. (2010). Enfermagem Médico-Cirúrgica: conceitos e prática clínica. (7ª ed.). Vol.III. Loures: Lusociência. Seeley, R.; Stephens, T.; Tate P. (2011). Anatomia & Fisiologia (8ª ed.). Loures: Lusociência. Sheehy, S. (2001). Enfermagem de Urgência: da teoria à prática. (5ª edição). Loures: Lusociência.

PUB

PUB

NORMAS DE PUBLICAÇÃO

A Revista Sinais Vitais publica artigos sobre a área disciplinar de enfermagem, de gestão, educação, e outras disciplinas afins. Publica também cartas ao director, artigos de opinião, sínteses de investigação, desde que originais, estejam de acordo com as normas de publicação e cuja pertinência e rigor técnico e científico sejam reconhecidas pelo Conselho Científico. A Revista Sinais Vitais publica ainda entrevistas, reportagem, notícias sobre a saúde e a educação em geral. A Publicação de artigos na Revista SINAIS VITAIS dependerá das seguintes condições: 1. Serem originais e versarem temas de saúde no seu mais variado âmbito; 2. Ter título e identificação do (s) autor (es) com referência à categoria profissional, instituição onde trabalha, formação académica e profissional, eventualmente pequeno esboço curricular e forma de contacto; 2.1. Os autores deverão apresentar uma declaração assumindo a cedência de direitos à Revista Sinais Vitais; 3. Ocupar no máximo 6 a 8 páginas A4, em coluna única, tipo de letra Arial 11, versão Microsoft Word 2003, ou OpenDocument Format (ODF). 4. Serem acompanhadas de fotografia do (s) autor (es), podendo ser do tipo passe ou mesmo outra; 5. Terão prioridade os trabalhos gravados em CD ou submetidos por e-mail acompanhados de fotografias, ilustrações e expressões a destacar do texto adequadas à temática. As fotografias de pessoas e instituições são da responsabilidade do autor do artigo. Os quadros, tabelas, figuras, fotografias e esquemas devem ser numerados e a sua legenda deve ser escrita numa folha e de fácil identificação; 6. Os trabalhos podem ou não ser estruturados em capítulos, sessões, introdução, etc.; preferindo formas adequadas mas originais. 6.1. Devem obrigatoriamente ter lista bibliográfica utilizando normas aceites pela comunidade científica nomeadamente a Norma Portuguesa, NP4051(1994); 6.2. Todos os trabalhos deverão ter resumo com o máximo de 80 palavras e palavra-chave, que permitam a caracterização do texto; 6.3. Os artigos devem ter título, resumo e palavras-chaves em língua inglesa. 7. São ainda aceites cartas enviadas à direcção, artigos de opinião, sugestões para entrevistas e para artigos de vivências, notícias, assuntos de agenda e propostas para a folha técnica, que serão atendidas conforme decisão da Direcção da Revista. 8. A Direcção da revista poderá propor modificações, nomeadamente ao nível do tamanho de artigos; 9. As opiniões veiculadas nos artigos são da inteira responsabilidade dos autores e não do Conselho Editorial e da Formasau, Formação e Saúde Lda, editora da Revista Sinais Vitais, entidades que declinam qualquer responsabilidade sobre o referido material. 9.1. Os artigos publicados ficarão propriedade da revista e só poderão ser reproduzidos com autorização desta; 10. A selecção dos artigos a publicar por número depende de critérios da exclusiva responsabilidade da Revista Sinais Vitais e bem assim, a decisão de inclusão do artigo em diferentes locais da revista; 11. Somente se um autor pedir a não publicação do seu artigo antes de este estar já no processo de maquetização, é que fica suspensa a sua publicação, não sendo este devolvido; 12. Terão prioridade na publicação os artigos provenientes de autores assinantes da Revista Sinais Vitais.

13. Os trabalhos não publicados não serão devolvidos, podendo ser levantados na sede da Revista. 14. Os trabalhos devem ser enviados para [email protected]

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.