Perspetiva de uma potencial 8.ª dimensão das gratificações emocionais obtidas através do visionamento de filmes e de séries televisivas.

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Perspetiva de uma potencial 8.ª dimensão das gratificações emocionais obtidas através do visionamento de filmes e de séries televisivas. Jorge A. Ramos, Sandra Ramos, Sónia de Almeida e Soraia Monte ISCTE-IUL

Notas dos Autores Jorge A. Ramos (n.º 60113, PC1), Sandra Ramos (n.º 60164, PC1), Sónia de Almeida (n.º 54819, PC4) e Soraia Monte (n.º 60121, PC3) são discentes do 3.º ano da Licenciatura em Psicologia no ISCTE-IUL em Lisboa, ano letivo de 2014-2015. Este trabalho faz parte da Unidade Curricular com o nome Competências Académicas II ministrada pela Professora Doutora Patrícia Arriaga e pela Professora Doutora Joana Alexandre. A correspondência para os autores deste trabalho pode ser remetida para [email protected] ou para a Escola de Ciências Sociais e Humanas do ISCTE-IUL situada na Avenida das Forças Armadas, Edifício I, Sala 1W6, 1649-026 Lisboa, Portugal.

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Resumo Bartsch (2012) aferiu 7 dimensões nas gratificações emocionais (GE) que se obtêm através do visionamento de filmes (3 hedónicas e 4 eudaimónicas). Para Peterson e Seligman (2004) a perspetiva implica possuir capacidade de aconselhar sobre questões difíceis acerca das condutas e dos significados da vida. O presente estudo analisa (N = 331; idades entre 18-77) se a perspetiva poderá ser uma 8.ª dimensão das GE, esperando-se uma associação positiva entre a perspetiva e as 7 dimensões das GE (H1a), uma associação positiva entre a perspetiva e a quantidade de filmes que são visionados (H2a) e que a idade interaja como moderadora (H1b e H2b). Foram usados dois instrumentos: a escala de Bartsch (que mede as GE em 28 itens) e uma subescala da VIA-IS (que mede a perspetiva em 10 itens) ambas do tipo Likert com 5 pontos. Os resultados confirmaram H1a (r(331) = 0,178; p = 0,001) e H2a (r(331) = 0,104; p = 0,031; unicaudal), logo, consideramos a possibilidade de a perspetiva, como fator reflexivo externalizante, representar uma 8.ª dimensão das GE: a obtenção de conhecimento (pela via do visionamento filmes) para reforçar a capacidade de aconselhar e de analisar os desafios da vida segundo vários ângulos. Palavras-chave: gratificações emocionais, perspetiva, entretenimento, filmes

Abstract Bartsch (2012) assessed 7 dimensions of emotional gratifications (EG) that are obtained by watching movies (3 hedonic and 4 eudaimonic dimensions). To Peterson and Seligman (2004) perspective implies having the ability to give advice on difficult questions about conducts and the meanings of life. This study examines (N = 331; ages 18-77) if perspective may perhaps be an 8th dimension of EG, being expected a positive association between perspective and the 7 dimensions of EG (H1a), a positive association between perspective and the amount of movies that are watched (H2a) and that age interact as a moderator (H1b and H2b). Two instruments were used: the Bartsch scale (which measures EG with 28 items) and a subscale of VIA-IS (which measures perspective with 10 items) both Likert type with 5 points. The results confirmed H1a (r(331) = 0.178, p = 0.001) and H2a (r (331) = 0.104, p = 0.031; one-tailed), therefore we consider the possibility that perspective, as a reflexive externalizing factor, represents an 8th dimension of EG: obtaining knowledge (by way of watching movies) to strengthen the ability to give advice and to analyze the challenges of life according to several angles. Keywords: emotional gratifications, perspective, entertainment, movies

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Enquadramento Teórico Este trabalho tem por base um tema pré-definido pelas docentes – as gratificações emocionais obtidas no visionamento de filmes e de séries televisivas (GE) –, assim como a nossa motivação para explorarmos temas menos comuns na academia portuguesa, mormente o foco da Psicologia Positiva nas virtudes e nas forças de caráter humanas. Interessou-nos sobretudo explorar potenciais respostas a duas questões: existirão relações entre as GE e uma força de caráter específica: a perspetiva? E quanto à quantidade de filmes que são visionados e a perspetiva: haverá uma associação? Perguntar-se-á: porquê a perspetiva? Ao longo deste trabalho tentaremos responder a estas três questões (entre outras). As Gratificações Obtidas com o Visionamento de Filmes Por que há tantas pessoas que gostam de filmes? As estatísticas da indústria cinematográfica são normalmente impressionantes e nem a crise económica mundial abrandou o ritmo de crescimento do lucro da 7.ª arte. De acordo com a Motion Picture Association of America (2015) o lucro total (em todos os países) obtido em 2010 foi de 31,6 biliões de dólares, em 2012 foi de 34,7 biliões e em 2014 cifrou-se em 36,4 biliões de dólares. É sem dúvida um negócio através do qual se obtêm recompensas incríveis, mas não é sobre esta dimensão retribuitória que incide o nosso trabalho. Interessa-nos explorar quais as gratificações que os consumidores obtêm desta indústria. No que diz respeito às GE, Bartsch (2012) refere que existem duas grandes linhas teóricas: as GE hedónicas e as eudaimónicas. Gratificações diretas (ou hedónicas). As GE hedónicas dizem respeito à experiência de emoções por si só e associam-se mais à gestão do estado de espírito (como meio de distração dos pensamentos negativos), à disposição afetiva (obtendo-se afeto positivo com base nos julgamentos de justiça, de quando as personagens boas prevalecem sobre as más), à transferência de excitação (ficando-se com sentimentos positivos e de euforia, quando a angústia do enredo tem um bom desfecho), à busca de sensações (mormente as fortes, que se obtêm nos filmes violentos e de terror), às metaemoções (que não radicam num final justo ou feliz, mas sim em filmes trágicos e tristes que deixam sentimentos positivos sobre o self, na sequência da capacidade da pessoa pensar sobre, e sentir, emoções que são moralmente valorizadas) e ao afeto significativo misto (que se obtém quando se experienciam sentimentos mesclados, e.g., alegria e tristeza em simultâneo, ou outros mais complexos). Gratificações indiretas (ou eudaimónicas). As GE eudaimónicas dizem respeito à satisfação de necessidades cognitivas e sociais e são mais associadas à facilitação dos

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relacionamentos (e.g., nos rituais de cortejamento dos casais de namorados e na promoção da comunicação nos casais casados), aos relacionamentos parassociais (com as personagens, não para colmatar dificuldades nas relações sociais mas como uma fonte complementar de gratificação), às experiências vicariantes (obtendo-se gratificações emocionais através da identificação com as personagens), à comparação social (buscando-se conforto em histórias piores que as do próprio espectador), à autorreflexão (onde a elicitação de memórias emocionais cria experiências estéticas significativas e prazerosas) e à motivação eudaimónica (para se obterem inspirações, significados e propósitos mais profundos sobre a vida). Em suma, na revisão da literatura efetuada por Barstch (2012), foram identificados seis fatores teóricos (que constituíram um modelo preliminar sobre as GE): três hedónicos (afeto positivo, ativação e tristeza empática) e três eudaimónicos (partilha social de emoções, envolvimento emocional com as personagens e autorreflexão). E se os hedónicos possuem já um significativo corpo de investigação, a pesquisa sobre os eudaimónicos só a partir de 2009 é que começou a ganhar um maior enfoque. Por conseguinte Bartsch efetuou um estudo que incidiu sobre estas duas linhas de investigação em simultâneo, preconizando aferir uma avaliação sistemática das GE em geral (embora com mais interesse nas GE eudaimónicas). As 7 Dimensões das Gratificações Emocionais Bartsch (2012) efetuou quatro estudos que envolveram: (1) uma análise qualitativa (através de entrevistas semiestruturadas) onde aferiu 66 categorias de GE através das quais criou um questionário com 84 itens; (2) administrou depois o questionário a uma amostra de estudantes universitários que lhe respondeu de acordo com um filme de que se lembrassem; (3) depois, numa loja de aluguer de filmes, pediu aos clientes que preenchessem o questionário após o visionamento do filme que tinham alugado; (4) por fim, após ter efetuado uma análise fatorial exploratória (com o segundo e com o terceiro estudos), colocou o questionário online para que os respondentes avaliassem a sua série favorita, o que serviu para efetuar uma análise fatorial confirmatória. Os resultados destes estudos evidenciaram sete dimensões nas GE: três hedónicas e quatro eudaimónicas. As primeiras refletem sentimentos recompensadores: o divertimento, o entusiasmo e a tristeza empática (as duas primeiras aparentam refletir as já muito estudadas dimensões da gestão do estado de espírito e a da busca de sensações; a terceira dimensão hedónica aparenta refletir as também já conhecidas GE associadas às metaemoções). Quanto aos quatro fatores eudaimónicos envolvem a satisfação de necessidades sociais e cognitivas:

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o envolvimento emocional com as personagens (que sugere uma integração das já estudadas dimensões dos relacionamentos parassociais e a das experiências vicariantes), a partilha social de emoções (que salienta o papel das GE na socialização com a família, com os amigos e com os parceiros românticos) e a libertação vicariante de emoções (que surgiu como um fator inesperado e que radica no conceito aristoteliano de catarse, não no sentido de se ventilar agressão, mas de se expressar vulnerabilidades que se evitam mostrar durante o dia) e as experiências emocionais contemplativas (outro tema emergente para a investigação, que releva o papel dos filmes na estimulação de experiências cognitivas gratificantes) que para Bartsch (2015) é o fator mais típico das GE eudaimónicas. Psicologia Positiva, Virtudes, Forças de Caráter e Perspetiva A psicologia positiva (PP) foca-se no estudo do melhor do ser humano, o que não é uma novidade. Carl Rogers e Abraham Maslow (as maiores referências da psicologia humanista) já possuíam um grande enfoque nos aspetos positivos da individualidade humana bem como na coadjuvação da realização do potencial de cada indivíduo (Hergenhahn & Henley, 2013). Por exemplo, a terapia centrada no cliente preconiza desenvolver as melhores capacidades específicas de cada pessoa (Rogers, 1951) ao passo que a pirâmide de necessidades formula uma teoria positiva da motivação humana (Maslow, 1954). Ainda assim Martin Seligman quis-se demarcar da corrente humanista advogando que esta carece de suporte científico e enfatiza formas narcisistas de autorrealização, o que são falhas que a PP preconiza corrigir (Aanstoos, Serlin, & Greening, 2000). A determinação de Seligman ficou bem registada na 107.ª Convenção Anual da APA (realizada em Boston, no dia 21 de agosto de 1999, que ficou associada à criação da PP) pois foi aqui que (com o peso institucional inerente ao facto de ter sido Presidente da APA em 1998) enfatizou a sua intenção de corrigir a trajetória da psicologia focada na patologia, para uma psicologia que também se dedique ao estudo científico do que está subjacente ao sucesso e à felicidade humana (Hefferon & Boniwell, 2013). Nesta sequência foi publicado um livro (que os autores consideram ser um manual de sanidades, que contrasta com o Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders) onde ficaram registados os resultados da investigação sobre uma nova teoria da personalidade que se apoia na fatorização de 24 forças de caráter de seis virtudes, as quais são definidas como traços estáveis e transculturais (Peterson & Seligman, 2004). De facto foi efetuado um estudo onde foi usada uma amostra de 1.063.921 adultos, que responderam na Internet (entre 2002 e 2012) à Values In Action - Inventory of Strengths (VIA-IS), e onde os

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resultados de 75 países (representados por um mínimo de 150 respondentes por país) sugerem uma grande similaridade transcultural das forças de caráter (McGrath, 2015). Virtudes e Forças de Caráter. Peterson e Seligman (2004) especificam que as virtudes são caraterísticas nucleares humanas e universais que se salientam de uma forma consistente a partir de pesquisas históricas e talvez possuam uma raiz biológica onde (na sequência de um processo evolutivo) foram selecionadas por serem excelentes para a resolução de problemas inerentes à sobrevivência da humanidade. Por sua vez as FC são traços de personalidade estáveis e universais que se manifestam através das cognições, dos afetos, das disposições e dos comportamentos, são moralmente valorizadas, benéficas (para quem as tem salientes e para quem interage com essas pessoas) e são os traços positivos que definem as virtudes. Assim sendo, as FC associadas às seis virtudes (por ordem alfabética e não por ordem de importância) são: (1) Coragem (bravura, persistência, integridade e vitalidade); (2) Humanidade (amor, bondade e inteligência social); (3) Justiça (cidadania ou trabalho em Equipa, equidade e liderança); (4) Temperança (perdão, humildade, prudência e autocontrolo); (5) Transcendência (apreciação da beleza e da excelência, gratidão, confiança, humor e espiritualidade; por fim, as FC associadas à virtude da (6) Sabedoria são a criatividade, a curiosidade, a mente-aberta, o amor pela aprendizagem e a perspetiva. A Perspetiva. Segundo Peterson e Seligman (2004) a perspetiva é definida como sendo representativa de “um nível superior de conhecimento, julgamento e capacidade de aconselhar; permite ao indivíduo endereçar questões importantes e difíceis acerca da conduta e do significado da vida; é usada para o bem ou para o bem-estar do próprio e de outros” (p. 182). Por conseguinte parece existir uma associação concetual entre a perspetiva e as GE eudaimónicas, mormente com as experiências emocionais contemplativas. Logo, poderá a perspetiva ser uma oitava dimensão das GE? Bartsch (2015) refere que, apesar de as FC serem traços relativamente estáveis de personalidade e as GE serem estados efémeros, a ideia soa-lhe como sendo interessante; o que muito nos motivou a empenharmo-nos neste trabalho.

Objetivos e Hipóteses O nosso estudo iniciou-se com dois objetivos: (1) analisar se existem relações entre a perspetiva e as GE; (2) testar se existe uma associação entre a perspetiva e a quantidade de filmes (e de séries televisivas) que são visionados. Por conseguinte para a nossa primeira hipótese espera-se que a perspetiva se associe positivamente às 7 dimensões das GE (H1a), prevendo-se que quanto maior for a perspetiva

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(autorreportada) maior o relato de GE eudaimónicas (i.e., o envolvimento com as personagens, a partilha social de emoções, a libertação vicariante e as experiências contemplativas), comparativamente ao das GE hedónicas (i.e., o divertimento, o entusiasmo e a tristeza empática) (H1b). Espera-se no entanto que a relação entre a perspetiva e as experiências contemplativas seja superior às das restantes dimensões das GE eudaimónicas (H1c). Por outro lado espera-se que a idade funcione como moderadora entre a perspetiva e as GE (H1d) sendo expectável que as classes etárias mais altas relatem níveis mais altos de perspetiva e de GE do que as classes etárias mais baixas, o que estará de acordo com a teoria dos estádios do desenvolvimento psicossocial de Erik Erikson (1956) onde ao último estágio (designado por Integridade do Ego, onde os indivíduos se confrontam com a forma como foram resolvendo os seus problemas ao longo da vida) Peterson e Seligman (2004) associaram duas FC: a integridade e a perspetiva. Sendo esta primeira hipótese confirmada significaria que (comparativamente aos indivíduos que reportam valores mais baixos de perspetiva) os indivíduos que reportam valores mais altos de perspetiva tendem a obter dos filmes (em termos de GE) mais coragem para se focarem em coisas que são importantes para eles, inspiração para introspeções e para pensarem em questões importantes, assim como para refletirem sobre si próprios (que são as 4 subdimensões do fator experiências contemplativas, das GE). A força desta associação deverá aumentar em função da idade dos inquiridos. Para a nossa segunda hipótese espera-se que a perspetiva se associe positivamente à quantidade de filmes visionados (H2a). Sendo esta associação confirmada, poderia significar que que os indivíduos com mais perspetiva tendem a ver mais filmes (e/ou que quanto mais filmes os indivíduos visionam, maior é a sua perspetiva). Espera-se ainda que a idade interaja como moderadora (entre a perspetiva e a quantidade de filmes visionados) (H2b) sendo expectável que os valores mais elevados de perspetiva e de filmes visionados (em média) por mês se associem de forma positiva e mais forte às classes etárias mais altas (em comparação com as classes etárias mais baixas).

Método Participantes Conforme o Anexo A a amostra (que foi recolhida na região de Lisboa entre os dias 16 e 27 de Março de 2015) é constituída por 331 indivíduos, adultos, sendo cerca de 96% de portugueses e cerca de 4% de estrangeiros (um caso omisso). Quanto ao sexo (conforme Figura 1) 210 indivíduos eram mulheres (63,4%) e 121 eram homens (36,6%), variando as suas idades

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entre os 18 e os 77 anos (M = 28,10; DP = 11,79; 8 casos omissos). Salienta-se ainda que 71,3% dos respondentes possuiam um nível de escolaridade igual ou inferior ao ensino obrigatório (56,5% com o 12.º ano de escolaridade completo) e apenas 28,7% eram licenciados (ou possuiam um nível superior). Em relação ao estado civil apurou-se que 73,7% dos inquiridos eram solteiros, 20,2% eram casados ou viviam em união de facto, 4,5% eram divorciados ou separados e apenas 1,5% da amostra corresponde a inquiridos que eram viúvos. Figura 1 - Distribuição das Idades dos Participantes: em Geral e segundo o Sexo.

Dado que estes participantes foram escolhidos pelos membros dos vários grupos de alunos sem qualquer critério a não ser o da maioridade, esta amostra é não-probabilística e por conveniência. Por outro lado, dado ser uma amostra jovem (com uma mediana de 23 anos de idade), as estatísticas descritivas salientaram a existências de três outliars (os casos 1, 31 e 171 que correspondem aos participantes #9, #44 e #211) com idades iguais ou superiores a 65 anos (Anexo A). Ainda assim, porque a idade é a variável moderadora em estudo (em H1d e H2b) e porque escalonámos esta variável em três subdimensões (conforme observaremos adiante) onde se incluem no terceiro escalão etário indivíduos com idade igual ou superior a 50 anos, decidimos manter estes casos. Medidas Para testar as nossas hipóteses usámos doze variáveis (que foram tratadas como escalares no SPSS): (1) a da perspetiva, que é uma variável preditora (dado que conforme

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Bartsch, 2015, sendo a perspetiva um traço estável de personalidade, ela prediz a probabilidade de obter GE eudaimónicas), compósita (constituída pela média dos 10 itens da escala da perspetiva), unidimensional e define-se em termos estatísticos como sendo uma variável quantitativa; (2) a das GE, que é uma variável critério compósita, constituída pela média dos 28 itens da escala de Bartsch (2012), unidimensional e quantitativa; (3) a das GE hedónicas, que é uma variável critério compósita (constituída pela média de 12 itens da escala de Bartsch, 2012), unidimensional, quantitativa; (4) a das GE eudaimónicas, que também é uma variável critério compósita (constituída pela média de 16 itens da escala de Bartsch, 2012), unidimensional, quantitativa; e (5) a da idade, que é a variável testada como moderadora (em H1d e H2b), quantitativa e tridimensional (1 = “< 25 anos”, 2 = “Entre 25 e 49 anos” e 3 = “>= 50 anos”), escalonada conforme Peterson e Seligman (2004) segundo as idades aproximadas e correspondentes aos três estádios do desenvolvimento psicossocial do adulto (concetualizados por Erikson, 1956). (6 a 12) Foram ainda criadas mais 7 variáveis compósitas, uma para cada fator da escala de Bartsch, com as médias de quatro itens cada, que correspondem às 7 dimensões das GE: a do divertimento, a do entusiasmo e a da tristeza empática (para os fatores hedónicos) e a do envolvimento com as personagens, a da partilha social de emoções, a da libertação vicariante e a das experiências contemplativas (para os fatores eudaimónicos). Por sua vez, as 28 variáveis que servem de base às variáveis GE, GE hedónicas, GE eudaimónicas e às das 7 dimensões das GE, bem como as 10 variáveis que servem de base à variável perspetiva, são todas quantitativas (escalares). Escala de Bartsch. Para efetuar uma avaliação sistemática das GE em geral e aferir os diferentes fatores das gratificações emocionais que se obtêm através do visionamento de filmes e de séries televisivas, Bartsch (2012) criou uma escala que é constituída por 28 itens (que neste estudo foram respondidos tendo em conta a experiência emocional com o filme que o inquirido tinha acabado de referir antes, e.g., do item #17: “Foi bom experienciar esse sentimento… porque inspirou novas ideias”), 4 para cada um das 7 dimensões encontradas das GE (Anexo B, ponto 17), dispostos numa escala do tipo Likert de concordância com 5 pontos que variam entre 1 (“Discordo totalmente”) e 5 (“Concordo totalmente”). Conforme suprarreferido, 12 destes itens relacionam-se com as três dimensões hedónicas das GE (que refletem sentimentos recompensadores) e 16 itens relacionam-se com as quatro dimensões eudaimónicas das GE (que envolvem a satisfação de necessidades sociais e cognitivas). Esta escala não possui itens com pontuações invertidas e as pontuações finais são feitas com o

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recurso a médias, mas também podem ser usadas somas, desde que de uma forma consistente (Bartsch, 2015). As pontuações mais elevadas representam maiores níveis de GE. Na análise da nossa amostra observámos a existência de 27 casos omissos (num total global de 9268 entradas possíveis para esta escala, de acordo com N = 331), mas sendo omissões dispersas (à exceção do participante #158 que não respondeu a 3 dos 28 itens desta escala) optámos por não eliminar qualquer registo e por manter os casos omissos inalterados. No que diz respeito à fidelidade desta escala, na análise da consistência interna (de cada uma das 7 subdimensões das GE) aferiu-se (conforme Bartsch, 2012): no Estudo 2, a mais baixa (α = 0,71) foi a do fator partilha social de emoções (das GE eudaimónicas); no Estudo 3, a mais baixa (α = 0,73) foi a do fator libertação vicariante de emoções (das GE eudaimónicas); e no Estudo 4, as consistências internas mais baixas (α = 0,76) foi a do fator experiências contemplativas (das GE eudaimónicas) e a do fator divertimento (das GE hedónicas). Quando aos valores mais elevados do Alfa de Cronbach aferiu-se que foi de 0,89 (no fator tristeza empática, aferido no Estudo 4). Portanto todos os valores de consistência interna variam entre o aceitável e o bom. A validade desta escala foi analisada com o recurso à Positive and Negative Affect Schedule (PANAS) e à Modified Differential Affect Scale (MDAS) porém não foi efetuada qualquer conclusão sobre a qualidade da validade de construto (convergente e descriminante) deste instrumento. Esta medida não tinha sido ainda sujeita a qualquer validação para a população portuguesa. Foi traduzida por docentes do ISCTE-IUL e foi sujeita a uma retroversão também por uma docente bilingue tendo-se aferido que a proposta final foi muito semelhante à versão original (Arriaga, 2015). Na análise que efetuámos da consistência interna (dos 28 itens, na nossa amostra) aferimos um valor excelente (α = 0,90), uma consistência interna aceitável (α = 0,79) quando são analisados os 12 itens da dimensão hedónica das GE e uma boa consistência interna (α = 0,88) quando são analisados os 16 itens da dimensão eudaimónica das GE. Conforme Figura 2, quando foi analisada a consistência interna de cada uma das 7 subdimensões das GE, aferiu-se que a mais baixa (α = 0,77) é a do fator divertimento (da dimensão hedónica) o que é aceitável.

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Figura 2 - Propriedades Psicométricas das Dimensões da Escala de Bartsch e da Perspetiva.

Escala da Perspetiva. Para aferir o nível da perspetiva de cada indivíduo foram usados (dos 240 itens da VIA-IS) os 10 itens da perspetiva, que constituem uma das 24 subescalas desta medida (Peterson & Park, 2009; Peterson & Seligman, 2004). A subescala perspetiva (Anexo C) preconiza medir o grau de perceção dos respondentes relativamente ao seu autoconhecimento, ao facto de introduzirem sentimento e racionalidade nas decisões, de perceberem maiores padrões de significado ou de relação, de possuírem uma perspetiva alargada, de possuírem uma forte necessidade de contribuírem para o bem-estar dos outros e da sociedade, de considerarem as necessidades alheias, de compreenderem os limites do que conseguem saber e fazer, de conseguirem ver o núcleo dos problemas importantes, de possuírem uma visão precisa dos seus pontos fortes e fracos, de serem vocacionados para dar conselhos e de se comportarem de forma consistente com os seus próprios padrões pessoais (Peterson & Seligman, 2004). Estes itens estão dispostos numa escala do tipo Likert de concordância com 5 pontos: (1) “Não tem nada a ver comigo”; (2) “Não tem a ver comigo”; (3) “Neutro”; (4) “Tem a ver comigo”; (5) “Tem tudo a ver comigo” (e.g., item #8: “As outras pessoas pedem-me conselhos”). Esta escala não possui itens com pontuações invertidas (Shely, 2015) e as pontuações finais fazem-se com as médias, sendo as mais altas as que representam uma maior perspetiva (Peterson & Seligman, 2004). Na análise da nossa amostra observámos a existência de apenas 3 casos omissos (num total global de 3310 entradas possíveis para esta escala, de acordo com N =331), mas sendo omissões dispersas optámos por não eliminar qualquer registo e por manter os casos omissos inalterados.

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No que diz respeito à fidelidade, na VIA-IS, a subescala da perspetiva possui uma boa consistência interna (α = 0,82) e uma forte correlação teste-reteste (r > 0,71). Quanto à validade foi aferido que esta subescala possui validade de construto convergente com a escala Activities Questions (r > 0.57) e validade de construto descriminante com as escalas Satisfaction With Life Scale (SWLS) (r > 0.30) e a Center for Epidemiological Studies Depression Scale (CES-D) (r > -0.31). Sublinhamos porém que esta subescala (dado não ter sido ainda testada isoladamente) não pode ser considerada validada (Shely, 2015). Quanto à VIA-IS em termos globais é uma medida que surgiu em 2000 e foi testada em mais de 250 adultos para depois ser sujeita a várias adaptações até que a sua consistência interna fosse aceitável (α > 0,70) nas suas 24 subescalas. As correlações teste-reteste (após 4 meses) foram fortes (r > 0,70), as pontuações em geral da escala de desejabilidade social (de Crowne & Marlowe, 1960) não se correlacionaram significativamente com as da VIA-IS e não foram encontradas diferenças significativas entre a versão online e a de papel-e-lápis (Peterson & Seligman, 2004). Esta subescala não tinha sido ainda sujeita a qualquer validação para a população portuguesa. Foi traduzida por nós (com a supervisão das discentes), mas não foi sujeita a uma retroversão. Ainda assim (conforme Figura 2) na análise que efetuámos da consistência interna (dos 10 itens, na nossa amostra) aferimos um valor aceitável (α = 0,76). Procedimentos Conforme se subentende a nossa investigação é correlacional pois preconiza analisar a existência de associações. Foi efetuada em várias etapas entre o início de Fevereiro e o final de Maio de 2015. Em primeiro lugar, foi apresentado pelas docentes (no dia 4 de Fevereiro de 2015), o tema de base para este trabalho (as GE), sendo depois necessário que cada grupo de trabalho escolhesse outro tema de seu interesse (e que possa estar associado às GE). Conforme já suprarreferimos escolhemos trabalhar sobre as FC (e as GE), enquanto os outros grupos escolheram diversos outros temas (relacionados com o tema principal). No dia 11 de Fevereiro iniciámos a pesquisa de literatura (inerente aos temas escolhidos), a tradução dos 10 itens da subescala perspetiva, a redação dos objetivos e das hipóteses do nosso estudo, bem como a leitura de referências (enquadradas com a nossa investigação). Estando finalizada a preparação das escalas de todos os grupos, as docentes compilaram o questionário final (Anexo B) que ficou com um total de 223 variáveis (alguns grupos optaram por trabalhar não só sobre as gratificações obtidas por meio do visionamento de filmes, bem como pela via dos jogos, o que resultou num número diferente de variáveis, por conseguinte

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houve dois tipos de questionários; Anexo D), para então se iniciar a recolha de dados no dia 16 de Março. Cada aluno teve que distribuir 10 questionários, num total de 40 a 50 questionários por grupo (sendo 14 o número total de grupos: 6 que trabalharam sobre filmes e videojogos ou só sobre videojogos e 8 grupos cujos estudos incidiram apenas sobre filmes). Os participantes foram escolhidos por cada aluno e as instruções dadas foram muito simples: os respondentes foram convidados a ler o consentimento informado (Anexo E) e caso concordassem (após reiterarmos a garantia de confidencialidade, privacidade e anonimato) era-lhes pedido que respondessem individualmente a todos os itens (o que demorou cerca de 30 minutos em média); não tendo o estudo implicado assuntos ocultos (para os inquiridos) não foi efetuado qualquer esclarecimento final. A recolha dos questionários (pelos vários grupos) foi feita em vários contextos, tais como locais de trabalho, residências, salas de aula e de estudo do ISCTE-IUL, por conseguinte houve algum descuido com o controlo de variáveis parasitas (e.g., o barulho). À medida que os questionários foram sendo recolhidos, cada grupo foi introduzindo a informação numa base de dados, cuja data limite de entrega (às docentes) foi no dia 27 de Março. Após as bases de dados de todos os grupos terem sido integradas (pelas docentes) foram distribuídas aos alunos no dia 11 de Abril para então se iniciar a análise dos dados e a escrita da secção dos resultados, bem como a da discussão (deste artigo) e a elaboração do póster (através do qual se apresentou o estudo no dia 20 de Maio de 2015). Porque a VIA-IS possui direitos de autor e é necessária uma autorização para o uso deste instrumento, no dia 26 de Fevereiro fizemos esse pedido à VIA Institute on Character, o qual incluiu uma breve descrição do projeto (Shely, 2015). No dia 15 de Abril recebemos a aprovação do nosso projeto e foi-nos solicitado o preenchimento de um formulário (assinado por um dos membros do grupo de alunos e por uma das docentes, Anexo F) onde concordámos que a subescala da perspetiva não será publicada, que as informações sobre esta medida servirão apenas para propósitos de investigação, que esta subescala não pode ser considerada validada (porque nunca foi testada isoladamente), que a aplicação e a interpretação dos resultados serão efetuadas com bases científicas (fornecidas pela VIA ou outras fontes cientificamente alicerçadas), com a partilha dos resultados com a VIA Institute, bem como com a citação da VIA conforme instruções indicadas. Após termos enviado o formulário assinado para a VIA (no dia 17 de Abril) dez dias depois recebemos os 10 itens originais da subescala perspetiva (que afortunadamente coincidiram com aqueles que tínhamos encontrado num artigo de um investigador asiático, onde se baseou a parte do questionário relacionada com a aferição dos níveis de perspetiva dos respondentes).

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Resultados Para a análise da H1a verificámos que agregando os 28 itens das GE num único fator e correlacionando-o com o fator perspetiva, onde agregámos os 10 itens desta subescala (ficando ambos os novos fatores com as pontuações médias de cada inquirido), observou-se que existe uma correlação significativa (bicaudal, ao nível de 0,01) entre as GE e a perspetiva: r(331) = 0,178; p = 0,001. Observou-se ainda que a média do autorreporte dos inquiridos sobre os seus níveis de perspetiva se situaram acima do ponto médio (que é 3 = “neutro”) da escala (M = 3,57; DP = 0,49) ao passo que a média das GE se situou abaixo do ponto médio (que também é 3, entre 1 = “Discordo completamente” e 5 = “Concordo completamente”) da escala (M = 2,96; DP = 0,68) (Anexo G). Para a verificação da H1b correlacionámos o fator único da perspetiva com as duas grandes dimensões das GE (que são dois novos fatores criados também através das médias das respostas dos inquiridos aos 12 itens hedónicos e aos 16 itens eudaimónicos da escala de Bartsch) e encontrámos correlações estatisticamente significativas (bicaudais) com ambos: r(331) = 0,173; p = 0,002 para as GE eudaimónicas (com um nível de significância de 0,01) e r(331) = 0,134; p = 0,015 para as GE hedónicas (com um nível de significância de 0,05). Porém, embora a associação entre a perspetiva e as GE eudaimónicas tenha um valor mais elevado, comparativamente à associação verificada entre a perspetiva e as GE hedónicas, quando ambas as correlações são comparadas, elas não são estatisticamente significativas (Z de Fisher = 0,51; p = 0,61 bicaudal; p = 0,31 unicaudal). Quanto às médias destas duas dimensões da escala de Bartsch aferiu-se que as respostas dos respondentes situaram-se, em média, muito próximo do ponto médio (M = 2,97; DP = 0,79 para as GE eudaimónicas e M = 2,95; DP = 0,74 para as GE hedónicas) (Anexo H). Para a H1c (onde se espera que a relação entre a perspetiva e as experiências contemplativas seja superior às das restantes dimensões das GE eudaimónicas), encontrámos também correlações significativas (bicaudais) entre a perspetiva e 5 das 7 dimensões das GE: r(331) = 0,201 (p < 0,001) para o fator experiências contemplativas e r(331) = 0,154 (p = 0,005) para o fator envolvimento com as personagens (sendo ambas estas dimensões eudaimónicas e as suas correlações significativas com um nível de significância de 0,01); já para os fatores entusiasmo (r(331) = 0,138; p = 0,012; hedónico), partilha social de emoções (r(331) = 0,136; p = 0,014; eudaimónico) e tristeza empática (r(331) = 0,116; p = 0,034; hedónico) as correlações são significativas com um nível de significância de 0,05. Assim, apenas o fator divertimento (r(331) = 0,030; p = 0,585; hedónico) e o fator libertação

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vicariante de emoções (r(331) = 0,022; p = 0,690; eudaimónico) não se correlacionaram com o fator perspetiva. No entanto, embora a correlação mais elevada (com a perspetiva) seja a das experiências contemplativas (Figura 3), o Z de Fisher para a transformação de pontuações mostra que as diferenças significativas entre o fator experiências contemplativas e as 7 dimensões das GE se verifica em apenas duas comparações: com o fator divertimento (Z de Fisher = 2,23; p = 0,013 bicaudal) e com o fator libertação vicariante de emoções (Z de Fisher = 2,33; p = 0,019 bicaudal) que não se relacionam com a perspetiva. Todas as diferenças nas correlações (entre as restantes 5 dimensões das GE e a perspetiva) não são significativas (e.g., na comparação entre o fator experiências contemplativas e o fator tristeza empática: Z de Fisher = 1,12; p = 0,263 bicaudal). Relativamente às pontuações médias para cada uma das 7 dimensões da escala de Bartsch elas variaram entre 2,38 (DP = 1,06) para o fator libertação vicariante de emoções e 3,28 (DP = 0,98) para o fator entusiasmo (Anexo I). Figura 3 - Correlações Entre o Fator Perspetiva e as Dimensões e Subdimensões das GE

No que concerne ao potencial efeito de moderação da primeira hipótese (H1d: espera-se que a idade funcione como moderadora entre a perspetiva e as GE) aferimos (via regressão linear múltipla) que não existe uma interação significativa entre a idade e a perspetiva (t = -1,269; p = 0,205) logo, concluímos que a associação entre a perspetiva e as GE não é moderada pela idade (Anexo J).

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Para a análise da H2a verificámos que a correlação entre a quantidade de filmes visionados em média por mês e a perspetiva não é significativa: r(331) = 0,104; p = 0,061. Porém quando é efetuada uma análise unicaudal a associação é estatisticamente significativa: r(331) = 0,104; p = 0,031 (Anexo K). Já relativamente a H2b (espera-se que a idade funcione como moderadora entre a perspetiva e a a quantidade de filmes visionados) aferimos (via regressão linear múltipla) que existe uma interação significativa entre a idade e a perspetiva (t = 2,296; p = 0,022) logo, concluímos que a quantidade de filmes visionados, em média, por mês (pelos inquiridos) é moderada pela idade (Anexo L). Através de testes de comparação múltipla à posteriori (com o teste de Scheffe), dentro de uma análise de variância a um fator (one-way anova) observou-se que existe uma diferença significativa entre o escalão etário dos inquiridos com idades compreendidas entre os 18 e os 24 anos e o escalão entre os 25 e os 49 anos de idade (p = 0,019; num nível de significância de 0,05) cujas médias de filmes visionados por mês são (respetivamente e conforme a Figura 4): 5,63 (DP = 4,74) e 7,91 (DP = 8,43). Já entre o escalão etário dos respondentes com idade igual ou superior a 50 anos, e os restantes dois escalões não se aferiram diferenças estatisticamente significativas (Anexo M). Figura 4 - Médias de Filmes Visualizados por Mês Segundo os Escalões Etários.

Por conseguinte existe um efeito de moderação da idade (onde se afere também que r(319) = 0,114; p = 0,021 na associação com a média de filmes vistos por mês; e r(323) = 0,115; p = 0,019 na associação com a perspetiva; ambas as correlações significativas num nível de 0,05 unicaudal, ibidem).

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Discussão Tendo-se confirmado H1a (a perspetiva associa-se positivamente às 7 dimensões das GE) e H1d (parcialmente), bem como infirmado H1b e H1c (quanto maior for a perspetiva maior o relato de GE eudaimónicas e a correlação mais elevada entre a perspetiva e as 7 dimensões das GE será a que se verifica com o fator experiências contemplativas), as várias associações positivas aferidas na análise desta primeira hipótese talvez contribuam para tentar clarificar uma das lacunas salientadas por Bartsch (2012) no estudo das GE: “as experiências de entretenimento contemplativas podem em parte explicar a necessidade de dominar os desafios cognitivos” (p. 295) e por consequência contribuir também para a resolução de um dos enigmas da investigação sobre o entretenimento: o porquê de as audiências se exporem de forma voluntária a sentimentos desagradáveis, como se estes fossem “um mal necessário para obter outras formas não-hedónicas de gratificação” (p. 297). Portanto representando a perspetiva (que é distinta do conceito de inteligência) um alto nível de conhecimento (onde se inclui a capacidade de aconselhar e a de ponderar várias possibilidades antes de tomar uma decisão, permitindo ao indivíduo – que possui um alto grau de perspetiva – lidar com questões importantes sobre as condutas e os significados da vida; Peterson & Seligman, 2004) e representando as experiências contemplativas (que é, das 7 dimensões das GE, o conceito mais próximo da perspetiva) o facto de se possuir coragem para ter um maior foco em coisas que são importantes para o indivíduo, inspiração para introspeções e para pensar em questões relevantes, assim como para refletir sobre si próprio (portanto uma dimensão mais reflexiva, mas internalizante) a perspetiva poderá representar uma dimensão também reflexiva, mas externalizante pois inclui uma orientação para o outro no sentido de lhe prover conselhos. Assim sendo, embora as suprarreferidas associações sejam fracas (talvez porque a perspetiva é um traço de personalidade e as GE serem momentâneas), questionamo-nos se a FC perspetiva poderá ser uma 8.ª dimensão das GE: a obtenção de conhecimento (pela via do visionamento de filmes e de séries televisivas) que reforce a capacidade de aconselhar e de perceber múltiplos aspetos sobre os significados da vida. Na perspetiva de Bartsch (2015, p. 60) “faz sentido considerar o desenvolvimento de competências relacionadas com a Perspectiva como um fator de gratificação, dado que o conceito de bem-estar eudaimónico está intimamente relacionado com o auto-desenvolvimento e o crescimento pessoal.” Quando à segunda hipótese (espera-se que a perspetiva se associe positivamente à quantidade de filmes visionados e que a idade interaja como moderadora) existe de facto uma correlação (embora unicaudal) o que sugere, embora de forma fraca, que os indivíduos com

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mais perspetiva tendem a ver mais filmes em média por mês (e/ou que quanto mais filmes os indivíduos visionam, maior é a sua perspetiva). Quanto ao efeito de moderação da idade observou-se que não foi de encontro ao esperado (i.e., que os valores mais elevados de perspetiva e da média de filmes visionados por mês se associem mais às classes etárias mais altas do que às classes etárias mais baixas), pois de facto os inquiridos que veem mais filmes em média por mês são os do escalão intermédio (entre os 25 e os 49 anos de idade). Limitações Com a infirmação da moderação esperada para H2b e não tendo sido aferido também um expectável efeito de moderação da idade em H1d, questionamo-nos se as diferenças na dimensão das amostras de cada grupo etário (n = 192 para o 1.º grupo: 18-25 anos; n = 100 para o 2.º grupo: 25-49 anos; e n = 31 para o 3.º grupo: mais de 49 anos; Anexo A) poderão ter contribuído para as referidas infirmações. De facto a distribuição da idade é assimétrica à direita (M = 28,10; ME = 23; DP = 11,79; ∆ = 59), com um enviesamento (skewness = 1,542) que demonstra não estarmos perante uma distribuição normal. Por outro lado a distribuição é leptocúrtica (kurtosis = 1,518) com uma grande concentração de dados em torno da mediana. Para esta distribuição etária não deverá ter sido alheio o facto de a amostra ter sido recolhida por estudantes universitários o que implicou que seja nãoprobabilística e por conveniência, e que por consequência impede que se façam inferências para a população em geral. Outras limitações do nosso estudo incidiram no facto de não termos controlado (para além da idade) mais potenciais covariáveis que poderão interagir significativamente na relação entre as GE e a perspetiva. Por outro lado os dados foram recolhidos nas mais diversas condições tendo sido sujeitos a variáveis parasitas (e.g., o ambiente distrator de um local de trabalho ou de uma sala de aula), o que poderá não ter contribuído para a acuidade das respostas. Devido a limitações temporais não foi aferida a validade de construto (convergente e descriminante) da escala de Bartsch, tão-pouco foi feita uma análise fatorial confirmatória desta medida (no software indicado pelas docentes como sendo o mais adequado para o efeito: o SPSS Amos da IBM). Este estudo também não incluiu uma escala para controlar a desejabilidade social, o que poderá ser especialmente relevante no caso do fator perspetiva cujas pontuações (conforme Peterson & Seligman, 2004) poderão ser influenciadas por perceções narcisistas. Dado ter sido um questionário extenso (que incluiu 223 variáveis; Anexo B) e tendo sido a escala da perspetiva a penúltima a ser respondida, esta poderá ter sofrido um efeito de fadiga. O efeito de ordem (das questões) também não foi

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controlado, tal como não foi controlado um dos problemas associados às medidas de autorrelato: a memória (i.e., o facto de os inquiridos estarem a relatar perceções e sensações de filmes que já viram há algum tempo atrás, que pode ser de dias, meses ou anos e que poderá contribuir para que alguns dados sejam artificiais). Por fim, dado que este estudo é do tipo correlacional, não podem ser retiradas conclusões causais (i.e., de causa e efeito) por conseguinte a conclusão de que a perspetiva poderá ser uma 8.ª dimensão das GE (i.e., de que a causa para as pessoas procurarem ampliar a sua perspetiva com o visionamentos de filmes e de séries televisivas, é o facto de elas próprias possuírem já um maior nível de perspetiva) deve ser interpretada com muitas reservas, dado que o inverso também poderá ser verdade (i.e., o facto de se verem filmes e séries televisivas poderá contribuir para ampliar a perspetiva das audiências televisivas). Conclusões e Perspetivas Futuras Sugerimos que os estudos futuros considerem uma amostra aleatória estratificada, em termos de idades (garantindo a representatitividade de todas as classes etárias), para se aferirem com maior clareza os potenciais efeitos de moderação desta variável. Por outro lado poderá ser importante controlar outros potenciais fatores moderadores e/ou covariáveis (e.g., o sexo, o nível de escolaridade, a nacionalidade e o estado civil) bem como potenciais variáveis parasitas (e.g., estar numa sala onde outras pessoas estão a conversar) e a desejabilidade social. Para aferir com maior rigor a validação da escala de Bartsch (para a população portuguesa) é necessário efetuar uma análise fatorial confirmatória, bem como que, para a análise da fidelidade (para além da análise da consistência interna da medida) seja efetuada uma análise de correlações teste-resteste; e para a análise da validade sejam efetuados testes com construtos relacionados (para ser aferida a validade de construto convergente) e com construtos não-relacionados (para se aferir a validade de construto descriminante). Também nos parece ser importante controlar o efeito de fadiga (efetuando um questionário com o mínimo de variáveis possível) bem como o efeito de ordem (distribuindo várias versões do questionário com os itens em diferentes sequênciações) e incluir uma nova variável que capte há quanto tempo a pessoa viu o filme sobre o qual relata as suas perceções e sensações. Apesar de todas as limitações encontradas o nosso estudo propõe que a perspetiva talvez seja uma 8.ª dimensão das gratificações emocionais eudaimónicas que se obtêm através do visionamento de filmes e de séries televisivas, por isso parece-nos importante

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considerar uma análise mais rigorosa relativamente a esta possibilidade. Bartsch (2015) salienta que para esse efeito será necessário reformular os itens da escala da perspetiva no sentido de eles não refletirem a capacidade de as pessoas efetuarem julgamentos e tomarem decisões sábias (e.g., “em geral sou uma pessoa sábia”), mas sim no sentido de captarem, por exemplo, se os inquiridos consideram que ter visionado um determinado filme lhes poderá ter ampliado a sabedoria (e.g., “este filme tornou-me mais sábio”). Esta eventualidade poderá talvez também contribuir para ampliar o leque de possibilidade (sugerido por Peterson & Seligman, 2004) para intervir na ampliação e na estimulação da perspetiva: ler os clássicos da literatura e da filosofia e/ou refletir sobre as verdades e os valores humanos. Por fim, consideramos ainda que este estudo terá contribuído significativamente para ampliar a nossa perspetiva sobre a estatística aplicada às ciências socias e humanas.

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