Poder Legislativo e Partidos Políticos da República Velha

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Alfredo de J. Flores Organizador

Temas de História do Direito: o Brasil e o Rio Grande do Sul na Construção dos Conceitos Jurídicos Republicanos (1889-1945)

Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul 2013

T278

Temas de história do direito: o Brasil e o Rio Grande do Sul na construção dos Conceitos Jurídicos Republicanos (1889-1945) / Organizado por: Alfredo de J. Flores. – Porto Alegre: Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul, 2013. 288 p. ; 15,5 x 21,5cm. ISBN 978-85-62943-04-1 1.História : Direito 2. Direito : Brasil. 3.Direito : Rio Grande do Sul I. Alfredo de J. Flores (Org.). II. Andrei Koener. III. Christian Edward Cyril Lynch. IV. Gustavo César Machado Cabral. V. Gustavo Castagna Machado. VI. Wagner Silveira Feloniuk. VII. Título. CDU 34(09) Bibliotecária: Márcia Piva Radtke. CRB 10/1557 Capa: Priscila Pereira Pinto. Ilustração: Revista Illustrada (1896-97) Anno 21 - Nº 719 - Pag. 5

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INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DO RIO GRANDE DO SUL Rua Riachuelo, 1317 - 1º Andar - 90010-271 - Centro - Porto Alegre - RS - Brasil Horário de Funcionamento: Seg -Sex, das 9h às 12h e das 13h às 18h Atendimento ao Público: Ter-Sex, das 13h30min às 17h30min Telefone/Fax (51) 3224-3760 E-mail: [email protected] / [email protected] Site: www.ihgrgs.org.br Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Programa de Pós-Graduação em Direito. Avenida João Pessoa, 80 - 2º Andar - 90040-000 - Centro - Porto Alegre, RS - Brasil Horário de Atendimento: Seg-Sex, das 08h30min às 12h e das 14h às 18h30min. Telefone: (51) 33083306 / Fax: (51) 33083987 E-mail: [email protected] / Site: www6.ufrgs.br/ppgd

blica brasileira (1870-1891). Historia Constitucional, v. 12, p. 297-325, 2011b.

Poder Legislativo e Partidos Políticos da República Velha

______. O Império é que era a República: a monarquia republicana de Joaquim Nabuco. Lua Nova, v. 85, p. 277-311, 2012. MELLO, Evaldo Cabral de. A Outra Independência: O Federalismo Pernambucano de 1817 a 1824. São Paulo: Editora 34, 2004. MOURA, Euclides. O vandalismo no Rio Grande do Sul. Pelotas: Liv. Universal, 1892. OSÓRIO, Joaquim Luiz. Constituição Política do Estado do Rio Grande do Sul. Comentários. 2. ed. ampl. Porto Alegre: Livraria do Globo, 1923 [1911]. PADOIN, Maria Medianeira. O federalismo na propaganda republicana no Rio Grande do Sul: uma retrospectiva histórica. In: AXT, Gunter et al. Júlio de Castilhos e o paradoxo republicano. Porto Alegre: Nova Prova, 2005, pp. 97-105. RODRIGUES, Ricardo Vélez. O castilhismo e as outras ideologias. In: RECKZIEGEL, Ana Luiza Setti; AXT, Gunter. História geral do Rio Grande do Sul. República Velha (1889-1930). t. 1. Passo Fundo: Méritos, 2007, pp. 57-88. RUSSOMANO, Victor. História Constitucional do Rio Grande do Sul. 2. ed. Porto Alegre: Assembléia Legislativa do Estado do RS, 1976 [1932]. ROURE,  Agenor  de. A Constituinte Republicana. v. 2. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1918. VARELA, Alfredo. Riogrande do Sul: descripção physica, histórica e econômica. v. 1. Pelotas e Porto Alegre: Livraria Universal, 1897.

Wagner Silveira Feloniuk1 Índice: Introdução. 1. Partido Republicano no Império. 1.1. Surgimento do Partido Republicano. 1.2 Economia e Afirmação Política do Patriarcalismo Rural. 1.3 Cultura e a Força do Positivismo no Brasil. 1.4 Militares e o Crescimento do seu Poder Político. 1.5 Política e Surgimento do Partido Republicano. 2. A Política da República Velha. 2.1 Partidos Nacionais Fracos. 2.2 Política dos Governadores. 2.3 Partido Republicano Rio-Grandense. 3 O Poder Legislativo. 3.1 Influências sobre a Constituição de 1891. 3.2 Estrutura do Poder Legislativo. 3.3 Câmara dos Deputados. 3.4 Senado. 3.5 Imunidades Parlamentares. 3.5 Incompatibilidades 3.6 Juramento e Subsídio. 3.7 Poder Legislativo e Política. 3.8 Fim da República Velha. Conclusão. Referências Bibliográficas. Palavras-Chave: República Velha; Partido Republicano; Poder Legislativo; Positivismo; Economia; Política dos Governadores. Introdução A República Velha representa a experiência inicial do Brasil com um sistema republicano e presidencial de governo. O sistema monárquico foi substituído através de uma ruptura, e o grupo de maior poder econômico ascendeu à posição de primazia também na política. Os cafeicultores, inicialmente com amplo apoio dos militares, 1 Doutorando em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) com bolsa CNPQ. Mestre em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) com bolsa CNPQ. Especialista em Direito do Estado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Graduado com Láurea Acadêmica em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Editor da revista Cadernos do Programa de Pós-Graduação PPGDir./UFRGS.

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desejavam introduzir uma nova ordem, menos centralizada, e fortemente inspirada no sucesso dos Estados Unidos da América. Durante todo esse período houve uma série de doutrinadores do Direito e de outras áreas afins analisaram criticamente a situação política e as normas constitucionais que a institucionalizavam. Pretende-se aqui retomar os principais autores do período para apresentar a visão desses eruditos sobre o momento em que viviam, com suas dificuldades e avanços. O método não será de analisar os institutos sob uma perspectiva contemporânea de democracia, ou referenciar como as dificuldades existentes seriam superadas nos momentos posteriores. Procura-se sistematizar esse período e observar os problemas da época dentro de seu contexto, comentando o que os autores apontavam como as principais questões e as suas propostas para solucioná -las. Há uma divisão tríplice de matéria. Inicialmente se trata do surgimento do Partido Republicano, dos fatores de ordem econômica, militar, doutrinária e política que permitiram a substituição de toda a ordem anterior. O período mais abordado é o imediatamente anterior à república, quando todos os traços do novo período começam a se delinear, e as suas características podem ser bem compreendidas. A finalidade dessa apresentação é a compreensão profunda do quadro político que se formaria. Busca-se atribuir a situação da República Velha a uma cadeia nítida de fatores que eram bastante estudados e compreendidos inclusive enquanto o modelo se desenvolvia. Após, um capítulo é feito para estudar a política do período republicano. Um quadro geral é montado com ênfase na observação dos partidos republicanos que surgiram e se desenvolveram nos estados. Os doutrinadores da época apontavam com argumentos semelhantes aos atuais sobre as dificuldades dessa descentralização de poder. E, por vivenciarem os problemas, eles trazem depoimentos importantes para apontar os problemas da Política do Café com Leite em seus detalhes, especialmente no que tange à efetiva representação da socieda226

de e à aplicação do Direito Eleitoral. Por fim, um último capítulo sistematiza o Poder Legislativo da Constituição de 1891. A apresentação mostra ligações entre o sistema positivado e a realidade política existente – ou falta de relações em muitos casos, no que LOEWENSTEIN classificaria de Constituição nominal. O funcionamento do legislativo é apresentado para ver até que ponto ele se relaciona com a política que ocorria efetivamente no Brasil. 1. Partido Republicano no Império 1.1. Surgimento do Partido Republicano O partido republicano surge em 1870 – a ideia consciente, organizada, sistematizada de um partido político e seu programa podem ser identificados definitivamente a partir do Manifesto Republicano daquele ano. O aparecimento, no entanto, não foi uma ruptura violenta com outro partido ou movimento. Ele também não foi uma completa novidade no cenário nacional. Inexistia o partido, mas existia, em gestação, há muito, a noção de república e mesmo a política do império concentrada na capital conviveu com os ideais republicanos e com as revoltas que invocavam seus princípios. Compreender o Poder Legislativo e os ideais do partido republicano brasileiro passa por entender as circunstâncias de seu nascimento. O surgimento desse ente político dependeu de fatores concretos, e seus próprios conteúdos e objetivos foram profundamente associados a eles. A história dessa fundação mostra-se, como é comum, tão importante quanto largos períodos históricos posteriores. A defesa da república – a ideia teórica – tem grande peso, mas ao seu lado, os movimentos políticos e econômicos concretos e conflitos da política moldaram os acontecimentos e seriam muito influentes no próprio período que se seguiria até 1930. 227

Desde antes da independência dos Estados Unidos da América, a sociedade brasileira produziu movimentos defendendo a república. Houvera a Confederação do Equador, a Sabinada, a Revolução Praieira, e antes de todos esses, Tiradentes, em 1789, defendia a forma de governo republicana na Inconfidência Mineira. A noção de república no Brasil é quase tão antiga quanto a sua implantação nos Estados Unidos. O surgimento do partido e sua ascensão vieram quase cem anos depois das primeiras manifestações em favor da ideia – ela se tornou realidade quando deixou de ser ideal de protesto e passou a ser o programa da nova elite econômica e política que subiu ao poder. MELLO FRANCO, em 1948, defende uma divisão em quatro causas determinantes para o surgimento do partido, de ordem econômica, cultural, militar e política2. É uma generalização abrangente, capaz de apresentar um quadro adequado da nova política que surgia, mostrando os fatores mais poderosos culminariam em 1889 e a Proclamação da República no Brasil3. A classificação será utilizada novamente, utilizando outras fontes, especialmente as dos autores jurídicos que escreviam no período, para apresentar o nascimento dessa força que dominaria a política brasileira apenas poucas décadas após seu surgimento. O Manifesto Republicano, a síntese inicial do programa republicano, é o exemplo maior da importância dos acontecimentos econômicos e sociais na reorganização política que se aproximava. É um documento elaborado em Itú, cidade do leste de São Paulo onde residiram vários dos maiores cafeicultores do período. Situada no interior e sem grande população, a cidade foi politicamente relevante durante todo o processo que culminou na proclamação de 1889 por estar no que então se tornava o novo centro de poder econômico. O manifesto pode ser visto como o marco mais relevante para demarcar o momento em que a ideia política se transforma no programa definido do gru2  MELLO FRANCO, Afonso Arinos de. História e Teoria do Partido Político no Direito Constitucional Brasileiro. Rio de Janeiro, 1948, p. 50. 3  Pode-se citar também a obra de CARVALHO, que reduz as questões relevantes para três mas confirma a validade da divisão: “Abolição, militarismo e republicanismo foram três dos principais fatores da queda da monarquia”. CARVALHO, José Murilo. D. Pedro II. São Paulo: Companhia das Letras, 2007, p. 127.

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po de cafeicultores paulistas. Traz em seu primeiro parágrafo: “É a voz de um partido a que se alça hoje para faliar ao paiz. E esse partido não carece demonstrar a sua legitimidade. Desde que a reforma, alteração, ou revogação da carta outhorgada em 1824, está por elia mesma prevista e auctorisada, é legitima a aspiração que hoje se manifesta para buscar em melhor origem o fundamento dos inauferiveis direitos da nação”4. Os motivos mais prementes trazidos pelo grupo não remontam à doutrina da República. É criticado o imperador5 e sua irresponsabilidade6, e falta de representatividade7 e de crença popular na política8. As dificuldades políticas concretas e o desejo de descentralização político nas províncias9 culminaram no movimento. A própria carta diz: “De todos os angulos do paiz surgem as queixas, de todos os lados políticos surgem os protestos e as revelações estranhas que denunciam a existência de um vicio grave, o qual põe em risco a sorte da liberdade pela completa annuilação do elemento democratico”10. São sobre problemas concretos que se formou partido e mais tarde, se organizaria o Poder Legislativo. Ruy Barbosa afirmaria em discurso que não apenas lutara contra a monarquia pelos seus atos concretos, mas que também estava lutando contra a república pela semelhança com o sistema anterior11 - não foram as doutrinas, mas a 4  O Manifesto Republicano. Itú: 1870. In: Cadernos ASLEGIS. Número 37. Brasília: Associação dos Consultores Legislativos e de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados, 2009. P. 42. 5  O Manifesto Republicano. Itú: 1870. In: Cadernos ASLEGIS. Número 37. Brasília: Associação dos Consultores Legislativos e de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados, 2009. P. 53. 6  O Manifesto Republicano. Itú: 1870. In: Cadernos ASLEGIS. Número 37. Brasília: Associação dos Consultores Legislativos e de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados, 2009. Pp. 49-50. 7  O Manifesto Republicano. Itú: 1870. In: Cadernos ASLEGIS. Número 37. Brasília: Associação dos Consultores Legislativos e de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados, 2009. Pp. 48 e 56. 8  O Manifesto Republicano. Itú: 1870. In: Cadernos ASLEGIS. Número 37. Brasília: Associação dos Consultores Legislativos e de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados, 2009. P. 52. 9  O Manifesto Republicano. Itú: 1870. In: Cadernos ASLEGIS. Número 37. Brasília: Associação dos Consultores Legislativos e de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados, 2009. P. 53. 10  O Manifesto Republicano. Itú: 1870. In: Cadernos ASLEGIS. Número 37. Brasília: Associação dos Consultores Legislativos e de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados, 2009. P. 43. 11  “Velho liberal, defendi a liberdade contra o imperio, que, por isso, me qualificava republicano. Hoje

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conjuntura nacional que determinou as posições do célebre político12. 1.2 Economia e Afirmação Política do Patriarcalismo Rural O domínio da burocracia e do clero começava encontrar sua derrocada em meados do século XIX – até ali, sua força fora muito superior à dos latifundiários13. Foi um processo lento e gradual que avançou pelo início do século XX e fez chegar ao domínio da política a classe dos latifundiários. O crescente poder econômico dos fazendeiros, que não tinha se transformado em poder político durante o império em, no ano de 1824, agora se afirmava. Em 1850, o poder econômico no campo estava se tornando poder político no cenário nacional. A lavoura de café iniciara a pesar na economia na bacia do Paraíba, mas o rápido esgotamento das terras levou ao deslocamento da cultura para toda a região de São Paulo e Minas Gerais. Na medida em que ela avançava para se tornar o maior peso econômico do Brasil, foi sendo fortalecido o papel político dos grandes latifundiários da região. São Paulo e Minas Gerais se tornam os maiores centros econômicos do país, e a importância da política dessa região se tornaria, em consequência, a maior do país14. Um primeiro dado relevante para entender o funcionamento do Partido Republicano e suas ideias posteriores é, então, a ligação com o café. Grande parte dos movimentos, organizações e instituições posteriores estariam muito ligadas a essa origem15. O império não iga republica, pela mesma razão, me encoima de monarquista. É que ambos os regimes se divorciaram da liberdade, e o segundo não quiz reconhecer na catastrophe do outro a necessidade vital daquella companheira”. BARBOSA, Ruy. O Partido Republicano Conservador: documentos de uma tentativa baldada. Rio de Janeiro: Casa Mon’Alverne, 1897, pp. 41-42. 12  Assim se posiciona MELLO FRANCO: “Êste partido surgiu no Império, sob a influência de acontecimentos históricos de várias naturezas e de imensa complexidade”. MELLO FRANCO, Afonso Arinos de. História e Teoria do Partido Político no Direito Constitucional Brasileiro. Rio de Janeiro, 1948, p. 59. 13  FAORO, Raymundo. Os Donos do Poder. Formação do Patronato Político Brasileiro. 3ª ed. São Paulo: Editora Globo, 2001, p. 420. 14  O papel político dos cafeicultores vai ser apresentado adiante, na seção da política. Nessa seção, cabe demonstrar o tamanho de seu avanço. 15  “Economicamente, o partido Republicano tem a sua origem estreitamente vinculada às novas condições da lavoura do café. Nova lavoura, novo sistema de trabalho, por seu lado, estavam a exigir novas classes dirigentes, nova organização política, visto que a máquina conservadora do Império, detendo ainda o

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norava a fundamental importância da cultura para o Brasil, foram feitas modificações no sistema financeiro e empréstimos de grande vulto foram tomados para auxiliar no seu desenvolvimento. Apenas entre 1886 e 1889, os empréstimos vindos da Inglaterra somaram cem mil contos de réis, ou 12 milhões de libras esterlinas16. FREIRE escreveria, apenas quatro anos mais tarde, em 1894, que o excesso de operações de empréstimo era o fator que mais enfraquecia o sistema bancário brasileiro no período17. Apesar de os esforços do império terem sido notáveis, os cafeicultores desejavam mais. Agora começava a se vislumbrar a possibilidade de substituição da antiga ordem política por uma nova, que iria aumentar o poder das províncias e servir ainda melhor aos interesses econômicos da nova elite que começava a conquistar poder18. Apesar dos esforços da ordem que vigia o desejo de mais apoio à cultura do café deve ser visto como fundamento determinante para a formação do partido. E após a proclamação, seria relevante para enpoder em nome de interesses já superados, não poderia acompanhar a evolução com necessária rapidez. É manifesta a influência direta do café sobre a República. Itú e Campinas, em São Paulo, Juiz de Fora em Minas, foram centros cafeeiros e foram igualmente centros capitais da agitação republicana, pelo menos até 1930, período em que o café dominou a economia nacional, foi o predomínio exclusivo da Zona da Meta e do Sul. Regiões do café”. MELLO FRANCO, Afonso Arinos de. História e Teoria do Partido Político no Direito Constitucional Brasileiro. Rio de Janeiro, 1948, p. 51. 16  “Sómente de 1886 a 1889 fizemos tres emprestimos na praça de Londres, na importancia de 12 milhões de libras ou cem mil contos, não fallando de cento e cincoenta mil contos de emprestimos internos. Em face desta situação em que, além de outros inconvenientes, o regimen da emissão não podia satisfazer as necessidades monetarias do paiz, o ministro da fazenda da Republica obedeceu á influencia de outros principios nas reformas em que entrou. Tendeu francamente para o regimen da inconversibilidade, do qual não podia abrir mão o Imperio e elle ahi ficou latente no contracto celebrado com o Banco NacionaI. Creou a organisação bancaria com a garantia de titulos de credito do Estado. Dous fins visava o ministro da reforma financeira com que procurou substituir a situação existente: - activar a producção, por meio da emissão, creando um estabelecimento de credito, como regulador da circulação fiduciaria e - iniciar o processo de amortisação da divida publica, por meio do resgate de apolices, retiradas da immubiliJade e estugnaçilo em que e tavam”. FREIRE, Felisbelo. História Constitucional da República dos Estados Unidos do Brasil. Volume I. Rio de Janeiro: Typographia Moreira Maximino, Chagas & C., rua da Quitanda, 90, 1894, pp. 128-129. 17  FREIRE, Felisbelo. História Constitucional da República dos Estados Unidos do Brasil. Volume I. Rio de Janeiro: Typographia Moreira Maximino, Chagas & C., rua da Quitanda, 90, 1894, p. 40 18  “A rejeição do regime monárquico pelos senhores rurais, na verdade, radicava menos no caráter pessoal do governo, do que do fato de ele não vir sendo empregado em seu benefício, mas em seu detrimento, desde o início do processo da abolição. Daí que, como explicava Campos Sales, chefe dos conservadores agrários, a vantagem de substituir a Monarquia parlamentar pela república presidencial estava na conjugação que esta permitia, de um governo forte e pessoal, de um lado, com sua temporariedade e responsabilidade frente aos representantes da lavoura, reunidos no Congresso, de outro”. LYNCH, Christian Edward Cyril. Entre o Liberalismo Monárquico e o Conservadorismo Republicano: A Democracia Impossível de Rui Barbosa. Revista da EMARF, Cadernos Temáticos, Rio de Janeiro, dez. 2010. P. 50.

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tender toda a ordem jurídica e política estabelecida.

Antonio Joaquim RIBAS24.

Nesse período, também, ocorre a abolição da escravatura, precedida pela Lei Eusébio de Queiros, do Ventre Livre e dos Sexagenários, todas envolvendo progressivos desgastes entre o imperador e os cafeicultores. A vigência da Lei Áurea, de 13 de maio 1888, traz uma alteração econômica e social profunda, que era pouco cogitada até trinta anos antes19. A insatisfação inicial viera com a questão trazida pelo desejo de indenização pelas alforrias. MILTON, escrevendo em 1895, identificava essa como sendo uma das principais causas de conflito com o império20.

No mesmo período em que o café avançava como força maior a abolição afinal foi conquistada. O sistema de trabalho anterior precisou ser reconstruído, a mão de obra escrava não existia mais, e o trabalho precisava ser substituído pelos negros livres ou pelos imigrantes europeus que começariam a chegar ao Brasil. MAXIMILIANO traz essa realidade à seara de preocupações do Direito Constitucional com as seguintes palavras: “Desorganizou-se o trabalho agricola. Entrou em crise a lavoura. A balança commercial, commummente favoravel ao Brasil (até em períodos criticos), inclinou-se contra o paiz uberrimo”25.

O conflito, no entanto, era de natureza diferente - tão profundo que José Bonifácio, um abolicionista convicto, muitas vezes pretendeu ver a libertação afastada de discussão pelo medo de sacrificar a unidade nacional durante o processo21. Vários doutrinadores do direito de período anterior à abolição adotavam essa postura de temor pelas consequências, posicionando-se contra a escravidão, mas temendo as repercussões sociais da abolição e adiando a discussão para o futuro – esses foram os casos de Teixeira de FREITAS22, Trigo de LOUREIRO23 e

No momento em que a abolição ocorre, não estava claro o cenário futuro. O efeito imediato, no entanto, foi sentido com a perda de apoio político dos cafeicultores, que já não eram aliados do imperador. Escrevendo muito tempo após os eventos, em 1927, VIANA afirmaria que a república tinha vindo encontrar uma classe aristocrática que ainda buscava um reequilíbrio em função dos acontecimentos decorrentes da abolição, e que todas as classes haviam sofrido uma alteração estrutural com o acontecimento26.

19  “De fato, até 1850 não houve no Brasil qualquer corrente de opinião de alguma importância que fosse abertamente contra o tráfico. Quase todos os políticos reconheciam a obrigação moral e legal de terminá-lo, mas temiam as conseqüencias econômicas da medida. Além disso, a pressão inglesa fazia com que o sentimento nacionalista favorecesse os traficantes, tendo havido vários casos de intervenção popular em defesa contra oficiais e marinheiros ingleses, tanto em 1842 como em 1850”. CARVALHO, José Murilo de. Teatro de Sombras. A política imperial. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2011, p. 300. 20  “Assim foi que, no proprio paço imperial, prepararam-se e distribuiram-se pamphletos proclamando entusiasticamente a sancta abolição dos escravos, e aos netos de d. Pedro II se attribuiu - sem rebuços a responsabilidade de similhante alvitre. Ficaram, porém, muito irritadas as classes conservadoras que, appellando para o que chamavam «direito de propriedade» exigiam pertinazes uma indemnização qualquer pelos escravos de que tinham sido desapossados, em virtude da immorredôra lei de 11 de maio, que aboliu a escravidão no Brazil”. MILTON, Aristides Augusto. A Constituição do Brazil: noticia historica, texto e commentario. Rio de Janeiro: Imprensa nacional, 1895, p. XI. 21  CARVALHO, José Murilo de. A Construção da Ordem. A elite política imperial. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2011, p. 19. 22  ““Cumpre advertir que não há um só lugar do nosso texto, onde se trate de – escravos -. Temos, é verdade, a escravidão entre nós; mas, se esse mal é uma exceção que lamentamos, e que já está condemnado a extinguir-se em uma época mais ou menos remota, façamos tambem uma exceção, um capitulo avulso, na forma das nossas Leis Civis, não as maculemos com disposições vergonhosas, que não podem servir para a posteridade”. TEIXEIRA DE FREITAS, Augusto. Consolidação das Leis Civis. 1ª ed. Rio de Janeiro: Typographia Universal de Laemmert, 1857, p. XI. 23  “Felizmente para a humanidade, esse infame trafico cessou de ser tolerado entre nós no ano de 1829, por virtude da Convenção celebrada entre o Brasil, e a Grã-Bretanha aos 23 de Nov. de 1826. Por força porém das circumstancias, que nos cercão, a escravidão ainda ficou subsistindo a respeito dos escravos que então havia no Brasil, e de sua futura descendencia; donde se segue que hoje entre nós os escravos nascem, porém não se fazem”. TRIGO DE LOUREIRO, Lourenço. Instituições de Direito civil brasileiro. Tomo

Esse cenário, de uma classe rural rica, abalada e ressentida com a monarquia pela grande alteração que envolvia a abolição da escravatura, foi um gerador do partido. As ideias e os interesses que envolviam a proteção da terra são os que predominavam inicialmente no movimento – a abolição viria depois para selar com ainda mais força o desejo pela reconstrução da ordem política. O Primeiro Congresso Republicano Provincial, ocorrido em 1873, teve como representantes

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I. Pernambuco: Typographia da Viuva Roma & Filhos, 1851, pp. 2-3. 24  “Á proporção, porém, que o direito estricto se foi approximando do raiconal, foi-se restringindo a dominica potestas, e parallelamente alargando a capacidade dos escravos, esta instituição reconhecida como opposta á natureza, e á liberdade como faculdade natural”. RIBAS, Antonio Joaquim. Curso de Direito Civil Brasileiro. 2 tomos. Rio de Janeiro: Typographia Universal de Laemmert, 1865, pp. 29-30. 25  Justifica o autor dizendo que esse foi o efeito da saída dos negros das fazendas. MAXIMILIANO, Carlos. Commentarios a Constituição Brasileira. Rio de Janeiro: Jacintho Ribeiro dos Santos Editor, 1916, p. 68. 26  “Foi nesse meio agitado e instabilissimo que a Republica surgiu e a nova Constituição foi promulgada. No fundo, a abolição do trabalho escravo desorganisára o systema de meios de vida da aristocracia nacional – e a Republica a encontrou na situação de quem procura urgentemente uma base econômica”. VIANNA, Oliveira. O Idealismo na Constituição. Rio de Janeiro: Terra de Sol, 1927, pp. 32-33.

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quatorze advogados e nove fazendeiros. Dos advogados, muitos atuavam em causas na lavoura27. Antes da abolição, os cafeicultores já se movimentavam pela república, mas a sua implantação foi um importante incentivo na definição do quadro. Além do fator econômico ligado à força do café, havia a crise econômica gerada pela Guerra do Paraguai. Os gastos com a guerra foram altos, totalizando seiscentos e quatorze mil contos de réis. A maior parte dos recursos veio do próprio Estado, através do aumento de impostos, mas cerca de centro e quatro mil foi financiado pela emissão de moeda – importante fator inflacionário -, quarenta e nove de empréstimos externos e vinte e sete de empréstimos internos. O custo do conflito pode ser melhor compreendido quando comparado ao orçamento do ano 1864. Conforme apresentado por BRAZ, ele era de cinquenta e sete mil contos de réis: a guerra custou cerca de dez anos do orçamento de todo o Brasil no período28. O resultado da guerra, portanto, foi o baixo nível de investimento do governo e a inflação alta, pela emissão constante de moeda. A economia brasileira só não entrou em crise e foi menos afetada pelo forte crescimento da cultura do café e pelo redirecionamento dos valores que antes se destinavam ao tráfico negreiro para a guerra, pois a travessia do Atlântico ficava cada vez mais restrita pelas imposições inglesas29. A República Velha seria conhecida como uma ordem em que a economia teve um peso desproporcionalmente amplo sobre a política. Não há separação plena em nenhum governo, mas a economia teve peso excessivo sobre a política nesse momento. Ao se tratar de um governo concreto e instalado, relacionando política e economia, HAMILTON escreveria que o dinheiro é o princípio vital do corpo jurídico, através do que ele mantém sua vida e movimento e consegue realizar 27  MELLO FRANCO, Afonso Arinos de. História e Teoria do Partido Político no Direito Constitucional Brasileiro. Rio de Janeiro, 1948, p. 52. 28  VAS, Braz Batista. O final de uma guerra e questões de logística: o conde d’Eu na Guerra do Paraguai (1869-1870) São Paulo: Cultura Acadêmica, 2011, p. 126. 29  VAS, Braz Batista. O final de uma guerra e questões de logística: o conde d’Eu na Guerra do Paraguai (1869-1870) São Paulo: Cultura Acadêmica, 2011, pp. 121-125.

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suas funções básicas30. No Brasil desse período, a economia se tornaria bem mais do que um meio para realização de funções. O grupo de proprietários rurais, poderosos economicamente agora acordara para suas possibilidades na política. 1.3 Cultura e a Força do Positivismo no Brasil Em 1850, é possível identificar a entrada do positivismo de Augusto Comte no pensamento de elites intelectuais brasileiras. Teses acadêmicas em ciências exatas foram seguidas das adesões de cunho político. Pensadores como Teixeira Mendes e Miguel Lemos, além de outras personalidades importantes do período como Silva Jardim, Júlio de Castilhos, João Pinheiro e Demétrio Ribeiro entraram no movimento e o difundiram. O professor, eventualmente chamado de fundador da República, o Tenente-Coronel Benjamin Constant, converteu-se ao positivismo em 1857, e se tornaria com o tempo, o seu principal defensor31. Constant fez as escolas militares e seus oficiais terem um papel relevante na política nacional. Apesar de Ruy BARBOSA negar a ligação entre a república e o positivismo32, outros autores como FREIRE e MAXIMILIANO traçam a ligação durante o desenvolver dos acontecimentos. Em 1860, Constant conclui seu curso na Escola Militar, recebendo o título de bacharel em matemática e ciências físicas, participou da Guerra indo ao Paraguai entre agosto de 1866 e setembro de 1867. Nove anos depois, ele fundaria a Sociedade Positivista Brasileira, que, em 1881 anos, passaria a ser o Apostolado e Igreja Positiva do Brasil33. 30  A respeito, ler artigo 30. HAMILTON, Alexander; JAY, John; MADISON, James. The Federalist Papers. Oxford: Oxford University Press, 2008. 31  MELLO FRANCO, Afonso Arinos de. História e Teoria do Partido Político no Direito Constitucional Brasileiro. Rio de Janeiro, 1948, pp. 52-53. 32  LYNCH, Christian Edward Cyril. Entre o Liberalismo Monárquico e o Conservadorismo Republicano: A Democracia Impossível de Rui Barbosa. Revista da EMARF, Cadernos Temáticos, Rio de Janeiro, dez. 2010. P. 56. 33  CASTRO, Celso. Os Militares e a República. Um Estudo Sobre Cultura e Ação Política. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1995, pp. 109-113.

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FREIRE narra que a influência de Constant sobre os alunos foi profunda. Vários atos da república estavam imbuídos dos elementos positivistas em função da cultura que adentrou as forças armadas. As circunstâncias que acompanhavam a revolução também contribuíram para criar um ambiente em que as doutrinas floresciam com força34. Carlos MAXIMILIANO narra que os jovens alunos das escolas militares redigiam manifestos contundentes em defesa das doutrinas positivistas e sua aplicação na política brasileira35. Apesar do ingresso da doutrina no Brasil, não foi a sociedade que aderiu com força ao movimento positivista. As ideias eram aceitas difusamente e essa aceitação outorgava legitimidade aos líderes que as defendiam. No entanto, esses líderes é que tornaram extremamente expressivo o papel da doutrina na política brasileira36. A disseminação entre os militares determinou o surgimento de uma geração de oficiais novos, de classe média, influentes na sua camada social. Havia mistura dos seus interesses de classe e opiniões políticas à doutrina, que culminava na defesa de um presidencialismo forte, voltado a garantir o progresso de uma sociedade incapaz de se determinar politicamente. COMTE doutrinara que o caos na sociedade e política era uma decorrência da mistura entre as filosofias teológica, metafísica e positiva, mas que apenas a última poderia triunfar37. O resultado dessa racionalização seria a ordem e o progresso38 – realizados principalmen34  “Toda resistencia era inutil. A influencia positivista havia de dominar pelo valor pessoal daquelle que no meio do governo era della o orgão”. FREIRE, Felisbelo. História Constitucional da República dos Estados Unidos do Brasil. Volume I. Rio de Janeiro: Typographia Moreira Maximino, Chagas & C., rua da Quitanda, 90, 1894, p. 65. 35  “Nos institutos militares, viveiros da officialidade futura, os lentes ensinavam á mocidade a doutrina presidencialista de Augusto Comte. Os proprios alumnos redigiam folhas violentamente revolucionárias, de distribuição gratuita, usando alguns, á guisa de pseudonymo, a proprio assignatura invertida”. MAXIMILIANO, Carlos. Commentarios a Constituição Brasileira. Rio de Janeiro: Jacintho Ribeiro dos Santos Editor, 1916, p. 71. 36  MELLO FRANCO, Afonso Arinos de. História e Teoria do Partido Político no Direito Constitucional Brasileiro. Rio de Janeiro, 1948, pp. 53-54. 37  COMTE, Augusto. Curso de Filosofia Positiva. Tradução de José Arthur Giannotti. IN: Augusto Comte; seleção de textos. Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultura, 1987, pp. 11-18. 38  COMTE, Augusto. Discurso sobre o Espírito Positivo. Tradução de José Arthur Giannotti. IN: Augusto Comte; seleção de textos. Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultura, 1987, pp. 66-72.

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te através de um programa de educação positiva e do trabalho39. Um sistema racional de governo deveria surgir para substituir os modelos anteriores, evolução que já estava em curso em alguns locais, como a França40. As adaptações do pensamento do autor às conjunturas da política brasileira são várias, mas a tentativa de racionalização da política viria desse sistema comtiano. Alguns dos mais influentes representantes dela utilizaram-na constantemente e se basearam nela para tomar decisões fundamentais no desenvolvimento político brasileiro. O desejo de ver o progresso do país fez com que personalidades políticas relevantes aderissem às teses, isso ocorreu especialmente entre aqueles que se envolveram com a Guerra do Paraguai (1864 a 1870). Ainda que estratégias de como implantar um governo capaz de desenvolver o país divergissem, os diferentes grupos viam na monarquia uma instituição incapaz de corresponder às necessidades brasileiras. Positivistas ocupavam vários dos principais postos militares do Brasil. Havia a intenção de utilizar a doutrina para implantar as reformas que o país precisaria passar para se adequar aos ideais de crescimento e força pretendidos41. O momento imediatamente posterior à república traria poucas alterações a esse quadro na visão de MAXIMILIANO42. A revolução tivera inspiração do positivismo e sua doutrina política passou a ter grande 39  “Trata-se, com efeito, de assegurar convenientemente a todos, primeiro, uma educação normal, depois o trabalho regular. Tal é, no fundo, o verdadeiro programa social dos proletários. Não pode mais existir verdadeira popularidade a não ser para uma política que tenda necessariamente para esse duplo destino. Ora, tal é evidentemente o caráter espontâneo da doutrina social peculiar à nova escola filosófica”. COMTE, Augusto. Discurso sobre o Espírito Positivo. Tradução de José Arthur Giannotti. IN: Augusto Comte; seleção de textos. Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultura, 1987, p. 85. 40  COMTE, Augusto. Discurso sobre o Espírito Positivo. Tradução de José Arthur Giannotti. IN: Augusto Comte; seleção de textos. Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultura, 1987, p. 67. 41  “A recepção que o ministro da guerra fizera aos representantes do positivismo e as sympathias que votava a este systema philosophico, trouxeram-lhes a esperança da influencia mental que almejavam exercer no trabalho da organisação republicano. São elles mesmos que dizem: A cordial recepção que nos fizera Benjamin Constant encheu-nos de esperanças sobre o novo governo de nossa patria: tanto mais quanto entre os ministros figurava Demetrio Ribeiro, um filho de nossa propaganda. Contavamos com a acção combinada delle e de Benjamin Constant para obter as reformos Iiberaes, sem as quaes a Republica não passaria de um distico vão”. FREIRE, Felisbelo. História Constitucional da República dos Estados Unidos do Brasil. Volume I. Rio de Janeiro: Typographia Moreira Maximino, Chagas & C., rua da Quitanda, 90, 1894, p. 200. 42  MAXIMILIANO, Carlos. Commentarios a Constituição Brasileira. Rio de Janeiro: Jacintho Ribeiro dos Santos Editor, 1916, p. 85-86.

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influência e prestígio na formação do novo governo – a bandeira, a ampla liberdade de culto e a separação entre Estado e Igreja foram algumas alterações influenciadas pelo positivismo, de acordo com o autor.

guai, a partir de 1870, foi sendo construída internamente a imagem de afastamento das práticas da política vigente e a importância da não corrupção e do nacionalismo na classe.

A ligação entre positivismo e o poder econômico dos cafeicultores não é imediata. Apesar disso, o desenvolvimento da situação nos pródomos da república permitirá aferir a importante ligação entre os acontecimentos a seguir.

Pela disciplina e lealdade à pátria, os militares cada vez mais se consideraram os personagens capazes de adentrar o cenário político e exercer influência benéfica sobre ele para promover o desenvolvimento do Brasil. Uma intervenção progressista e modernizadora, em grande parte influenciada pelo positivismo, passou a ser pretendida. Eles cultivaram após a Guerra do Paraguai crescente preocupação com as fraquezas internas do país, e buscaram em suas doutrinas e costumes, os meios de modificar o cenário nacional.

1.4 Militares e o Crescimento do seu Poder Político A Guerra do Paraguai, ocorrida entre os anos de 1864 e 1870, culminou no surgimento de uma classe militar ciente de sua condição e disposta a se envolver com a política. A adesão ao pensamento positivista era um fator importante, mas a disposição para participar ativamente da vida nacional deve ser compreendida como uma novidade relevante por si mesma na história nacional. Os militares deixavam de ser uma classe volátil, que mudava de lado em questões políticas ao sabor das conjunturas como ocorrera durante períodos do império43. Nesse momento, eles se tornavam uma classe com pensamento solidificado a respeito da política nacional e os rumos que o país deveria tomar. Diversos fatores ligados às forças armadas contribuíram para o surgimento do grupo político que viabilizaria o golpe final ao Império do Brasil. Os problemas de logística e organização enfrentados ao longo da guerra, só resolvidos quando ela se encontrava na metade44, somados à sensação de falta de prestígio frente aos políticos da capital deram, inicialmente, a sensação de que aos militares sozinhos coubera o papel mais importante na defesa do Brasil. Após a Guerra do Para43  BONAVIDES, Paulo. Constitucionalismo Luso-Brasileiro: Influxos Recíprocos. IN: MIRANDA, Jorge (Org.) Perspectivas Constitucionais: Nos 20 anos da Constituição de 1976. Volume 1. MIRANDA, Jorge. Coimbra: Coimbra, 1996-1998, p. 25. 44  VAS, Braz Batista. O final de uma guerra e questões de logística: o conde d’Eu na Guerra do Paraguai (1869-1870) São Paulo: Cultura Acadêmica, 2011, p. 131.

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A Guerra do Paraguai foi o fator de desenvolvimento da mentalidade política dos militares. No entanto, outros diversos conflitos ocorridos após seu término também contribuíram para afetar ainda mais a relação entre o império e os militares, no todo, essa série de ocorrências seriam conhecidas como a Questão Militar. Entre agosto de 1884 e maio de 1887, ocorreria uma série de choques entre o governo e o exército, afastando-o de Dom Pedro II e criando insatisfação. Dos conflitos, o mais significativo ocorreu quando o Tenente-coronel Antônio de Sena Madureira convidou o abolicionista Francisco José Nascimento para visitar a Escola de Tiro do Rio de Janeiro, em 1884. O resultado foi a punição do militar e transferência para a o Rio Grande do Sul. A polêmica gerada pela decisão foi grande e houve manifestações de militares na imprensa. Como resultado, o Ministro da Guerra do Império a proibiu todas as manifestações do exército, desgastando ainda mais o relacionamento. Além desse conflito, no ano anterior, em 1883, o exército havia se desgastado com a coroa pela obrigação à contribuição ao montepio dos militares45. Questões envolvendo corrupção de militares pertencentes aos partidos liberais e conservadores também auxiliaram a degradar ainda 45  CASTRO, Celso. Os Militares e a República. São Paulo: Editora Zahar, 2007, pp. 85-97.

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mais a relação com o governo ao longo daquela década. A série de acontecimentos resultou no surgimento do Clube Militar em 188746, quando então o governo se viu forçado a recuar na posição de punir alguns militares que resistiam às suas decisões por notar que a maior parte do exército apoiava suas posições. Dentre as forças ascendentes desse movimento está o Marechal Deodoro. As preocupações do imperador com a crescente politização dos militares e a força que eles representariam eram grandes, como comenta Ruy BARBOSA, ao narrar as táticas extremas do governo para conter a difusão de ideias políticas na Escola Militar47. A insatisfação após a guerra vinha também de fatores não políticos. Os militares estavam insatisfeitos com as dificuldades de ascender na carreira e o caráter personalista com que promoções eram feitas. Os soldos não eram altos, e os avanços nos postos vinham apenas com o passar de muito tempo, entrecortados pelos que recebiam algum privilégio pessoal. Por outro lado, os cargos civis do governo, ocupados por bacharéis, tinham remunerações mais altas e com maior prestígio. Apenas após o golpe, na república, essa realidade seria transformada, o exército foi mais profissionalizado, teve seus armamentos fortalecidos e treinamento de oficiais inclusive fora do Brasil. A insatisfação dos militares com a ordem imperial somada a sua crença de ser um elemento em condições de melhorar o Brasil foram determinantes para fortalecer sua unidade e seu desejo de ingressar na política como força capaz de derrubar a ordem que vigia. MELLO FRANCO cita que antes do dia 15 de novembro Floriano já havia confessado sua tomada de posição, uma consequência do conjunto de novas ideias e situações: interesses de classe, a Guerra do Paraguai, abolicionismo, positivismo e desprestígio do imperador48. 46  CASTRO, Celso. Os Militares e a República. São Paulo: Editora Zahar, 2007, p. 103. 47  “O estado superagudo nessa nevrose tem o seu symptoma especifico na preoccupação de matar idéas, esmagando-lhes os orgãos. Entre o principe, que tranvaca aos jornaes as portas da Escola Militar, com medo á republica, e os democratas, que espedaçavam typographias para evitar a restauração, não ha outra differença que a do mal ao peior. São dois graus de loucura na escada ascendente”. BARBOSA, Ruy. O Partido Republicano Conservador: documentos de uma tentativa baldada. Rio de Janeiro: Casa Mon’Alverne, 1897, pp. 25-26. 48  MELLO FRANCO, Afonso Arinos de. História e Teoria do Partido Político no Direito Constitucional

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Os militares desejavam a república, e foram elementos essenciais ao movimento que nela culminou49. O golpe de 15 de novembro de 1889 foi protagonizado pelo Marechal Deodoro da Fonseca50 – foi uma vitória militar antes de ser dos cafeicultores51. O partido republicano, portanto, funde-se com o papel dos militares e sua ascensão na política nacional. A vitória, no entanto, não traria frutos duradouros para os militares: a Constituição e a eleição de civis logo faria os cafeicultores terem o predomínio do poder. Em pouco tempo, as oligarquias locais determinariam a passagem dos militares a um plano de menor protagonismo – a política dos governadores determinaria os caminhos do Brasil pelas próximas décadas. 1.5 Política e Surgimento do Partido Republicano Os fatores políticos que culminaram no surgimento do Partido Republicano contam a própria história da queda do império. A descrença no sistema monárquico era grande e crescia conforme avançaram as questões econômicas, militares e o desenvolvimento do positivismo52. A queda do Gabinete de Zacarias, em 1868, por decisão pesBrasileiro. Rio de Janeiro, 1948, p. 55. 49  Interessa ressaltar também a preocupação em não dar ao movimento um caráter excessivamente militar. Do plano de ingresso na política dos militares precisavam participar também alguns civis. Carlos MAXIMILIANO lista os principais alistados para auxiliar a legitimar e fortalecer o movimento militar. “Para retirar á revolução o caracter puramente militar, convidaram quatro paisanos, que muito se distinguiram nas batalhas da palavra, para alistarem entre os conjurados (Quintino Bocayuva, Ruy Barbosa, Francisco Glicerio e Aristides Lobo). Reuniram-se estes na casa do General Deodoro, então seriamente enfermo, no dia 11, de noite”. MAXIMILIANO, Carlos. Commentarios a Constituição Brasileira. Rio de Janeiro: Jacintho Ribeiro dos Santos Editor, 1916, p. 82-83. 50  A ideia de realizar o golpe, segundo MAXIMILIANO, veio de Constant, ainda que posta efetivamente em prática pelo General Deodoro: “Benjamin Constant, em reunião secreta do Club Militar, propoz a revolta contra as autoridades constituidas. No dia immediato (9 de Novembro), justamente na hora em que o ministro offerecia, na Ilha Fiscal, sumptuoso baile é officialidade do Almirante Cockrane, realizava-se ostensivamente uma sessão solemne no referido Club, sob a presidencia de Benjamin. Este, perante 152 officiaes, profligou a ordem de embarque ao 22º batalhão da infantaria para o Amazona, no dia seguinte; desenvolveu o plano do levante geral, promettendo quebrar a sua espada, se elle fracassasse”. MAXIMILIANO, Carlos. Commentarios a Constituição Brasileira. Rio de Janeiro: Jacintho Ribeiro dos Santos Editor, 1916, p. 82-83. 51  “O modo por que foi feita, a revolução, o caracter e a natureza das forças lhe deram o triumpho. Foi uma revolução militar. Uma conquista do exercito, alliado para isto ao elemento civil do partido republicano. Responsaveis pela nova situação em que colIocaram o paiz, os militares não podiam deixar de constituir-se factores de sua organisação. Isto trouxe-lhes a consciencia do seu grande valor. Tomaram-se politicos”. FREIRE, Felisbelo. História Constitucional da República dos Estados Unidos do Brasil. Volume I. Rio de Janeiro: Typographia Moreira Maximino, Chagas & C., rua da Quitanda, 90, 1894, p. 80. 52  Nabuco de Araújo proferira as seguintes palavras, citadas no Manifesto Republicano: “O poder moderador não tem o direito de despachar ministros como despacha delegados e subdelegados de polícia”. O

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soal do imperador gerara grande desgaste político. A falta de consenso sobre o governo foi definitivamente selada pelo apoio à abolição. Os liberais consideravam que ela ocorrera tarde demais, os conservadores criticavam o fato de ela ter ocorrido53. Muitos dos políticos mais novos acreditavam que apenas a alteração do sistema de governo poderia resolver os problemas surgidos54. Os membros dos partidos imperiais também apontavam a falta de poder do parlamento. Mais tarde, quando foi instaurada a assembleia constituinte, vários políticos do império apoiariam o fortalecimento do Poder Executivo para evitar um cenário de dificuldade política semelhante55. O Manifesto Republicano, de 3 de dezembro 1870, demonstra não apenas a perda de apoio do governante, mas também a organização do movimento que agora surgia, com propostas apoiadas em uma doutrina e objetivos bem definidos. A elaboração do manifesto foi liderada principalmente por dois membros do Partido Liberal, Quintino Bocaiúva e Joaquim Saldanha Marinho, e já deixava entrever o patamar de avanço que naquele momento a ideia republicana já tinha. As críticas ao imperador eram muito severas56, e inclusive no que tangia à Manifesto Republicano. Itú: 1870. In: Cadernos ASLEGIS. Número 37. Brasília: Associação dos Consultores Legislativos e de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados, 2009. Pp. 49-50. 53  “Se alguns liberais, como Nabuco de Araújo, acreditavam ainda na possibilidade da reforma política sem revolução, outros, os mais jovens, componentes da ala chamada radical, foram aos poucos se convencendo de que somente a substituição do Império pela República poderia remediar os vícios inerentes à nossa prática do sistema representativo. Esta ala liberal, mais avançada, foi o núcleo central do partido Republicano”. MELLO FRANCO, Afonso Arinos de. História e Teoria do Partido Político no Direito Constitucional Brasileiro. Rio de Janeiro, 1948, pp. 56-57. 54  MELLO FRANCO, Afonso Arinos de. História e Teoria do Partido Político no Direito Constitucional Brasileiro. Rio de Janeiro, 1948, p. 56. 55  “Contribuiu poderosamente para isso a tradição parlamentarista neste paiz, pela qual a omnipotencia da camara foi uma realidade, derrubando ministerios, traçando planos de governo, em summa tornando excessivamente instavel o poder executivo. Contra o regimen parlamentar sempre bateu-se o partido republicano historico, e no recinto da constituinte não podia deixar de fazer desse programma uma realidade. Não só vasou a organisação institucional no typo presidencial de governo, como procurou dar a maior força, possivel ao poder executivo”. FREIRE, Felisbelo. História Constitucional da República dos Estados Unidos do Brasil. Volume II. Rio de Janeiro: Typographia Moreira Maximino, Chagas & C., rua da Quitanda, 90, 1894, p. 186. 56  “O governo, a nefasta política do governo do imperador foi quem creou este estado desesperado em que nos achamos... política de proscripção, de corrupção, de venalidade e de cynismo... um tal governo não é o da nação pela nação, é o governo do imperador pelo imperador... A proporção que o poder se une nas mãos de um só, a nação se desune e divide”. O Manifesto Republicano. Itú: 1870. In: Cadernos ASLEGIS. Número 37. Brasília: Associação dos Consultores Legislativos e de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados, 2009. Pp. 49-50. P. 37.

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descentralização. A federação era defendida, naquele momento, como oposição ao império. “O regimen da federação baseado, portanto, na independência reciproca das províncias, elevando-as a cathegoria de Estados próprios, unicamente ligados pelo vinculo da mesma nacionalidade e da solidariedade dos grandes interesses da representação e da defeza exterior, é aquelle que adaptamos no nosso progamma, como sendo o unico capaz de manter a communhão da familia brasileira”57. Além do evidente desejo de descentralização, a elite agrária tinha o exemplo da Terceira República, implantada na França naquele mesmo ano. Depois de 1789, a França havia conhecido três monarquias constitucionais, duas repúblicas e dois impérios. Após tanta instabilidade, finalmente a Assembleia Nacional implantara uma república - que afinal teria longa duração, e se encerraria apenas em 1940, durante a segunda grande guerra. A instalação da república no berço do liberalismo gerava efeitos no Brasil, legitimando os movimentos brasileiros. No dia 3 de novembro de 1870, é criado oficialmente o Partido Republicano. Os choques com o império são sérios, a diferença ideológica era inconciliável. A continuidade do império se chocava com a principal reivindicação da nova força política – a república -, e o apoio popular a ela não era desprezível. A alternância dos partidos imperiais e os problemas eleitorais sempre causaram sérias dificuldades às províncias, e a falta de legitimidade no processo político só aumentava o ressentimento dos prejudicados, criando antipatia até mesmo na população afastada dos centros de poder, normalmente alheia à política58.

57  O Manifesto Republicano. Itú: 1870. In: Cadernos ASLEGIS. Número 37. Brasília: Associação dos Consultores Legislativos e de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados, 2009. P. 5. 58  MELLO FRANCO, Afonso Arinos de. História e Teoria do Partido Político no Direito Constitucional Brasileiro. Rio de Janeiro, 1948, pp. 61-62.

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Completando o cenário, o exército cada vez mais toma as características de um grupo político perto de 1889. O “partido”59 militar se tornava uma força política preponderante na política nacional. A sua potência só era aumentada pelo desprestígio dos partidos imperiais. A população das cidades, não tão distante dos oficiais de baixa patente, também era cada vez mais poderosa, e via com descontentamento o seu afastamento da política nacional. A soma de todos os fatores de ordem economia, cultura, militar e política fez com que clubes republicanos surgissem ao longo de todo o país. A abolição da escravatura em 1888 foi o estopim final para os acontecimentos do ano seguinte60. O império não tinha sustentação política para continuar, a força da república só aumentava. Nesse cenário se chegaria ao dia 15 de novembro de 1889. O Marechal Deodoro, munido de uma tropa, inicia a revolta, possivelmente por rumores de sua prisão ou punição. Independentemente dos motivos imediatos, a proclamação é feita, e o imperador aceita se retirar da chefia de Estado quando nota a extensão do movimento. A família imperial voltaria para a Europa, o Brasil se tornaria uma república e a força política dominante era o Partido Republicano61. Haviam chegado ao poder os atores que protagonizaram os diversos quadros apresentados. Não era um grupo uniforme, esse que implantariam a nova ordem no Brasil. A principal diferenciação a ser feita era entre os cafeicultores e os militares, com tendências não completamente compatíveis. LYNCH apresenta o quadro mais bem desenvolvido:

59  MELLO FRANCO não usa aspas para chamar os militares de partido. MELLO FRANCO, Afonso Arinos de. História e Teoria do Partido Político no Direito Constitucional Brasileiro. Rio de Janeiro, 1948, pp. 61-62. 60  O partido conservador deixaria de existir em 1889, e grande parte de seus membros iriam juntar-se aos republicanos em oposição à ordem política imperial. “O Partido Conservador, scindido pelos projectos de abolição do captiveiro, dissolveu-se em 1889, indo a maioria engrossas as fileiras republicanas. Justo epilogo da conduta eternamente paradoxal dos partidos monarhicos: lutavam os liberaes por salvar o throno; entre os que almejavam demolil-o, alistaram-se os conservadores”. MAXIMILIANO, Carlos. Commentarios a Constituição Brasileira. Rio de Janeiro: Jacintho Ribeiro dos Santos Editor, 1916, p. 76. 61  A narração da revolução náo será feita aqui, por fugir ao interesse da análise política e jurídica.

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“Com efeito, espelhando o espectro político que derrubara a Monarquia com o golpe militar, era bastante díspar a coalizão que sustentava o governo provisório. Ela reunia generais como Deodoro e Floriano, inclinados à ditadura pura e simples; militares e civis positivistas, como Benjamin Constant Botelho e Demétrio Ribeiro, propensos a uma república autoritária, científica e progressista; aristocratas rurais conservadores, como Campos Sales e Francisco Glicério, que queriam uma república oligárquica como a Argentina de Júlio Roca; e jornalistas democratas, como Aristides Lobo e Quintino Bocaiuva”62. O quadro de deficiências políticas do império iria ser substituído por outro, com dificuldades de igual patamar. O poder político iria ser alinhado ao poder econômico na nova ordem, mas a população continuou a predominantemente alheia aos acontecimentos, e quase sem representação política. Os políticos que subiram ao poder aplicaram seus recursos especialmente na manutenção da ordem política que começava a se formar, e esta era voltada predominantemente aos interesses da elite agrária que se concentrava em São Paulo e Minas Gerais. Já em 1899, VARELA critica a nova ordem instituída por se voltar excessivamente aos interesses ligados ao café63. 2. A Política da República Velha 2.1 Partidos Nacionais Fracos O sufrágio não havia ocorrido regularmente no império, as dificuldades em compreender o desejo da população e de efetivá-lo 62  LYNCH, Christian Edward Cyril. Entre o Liberalismo Monárquico e o Conservadorismo Republicano: A Democracia Impossível de Rui Barbosa. Revista da EMARF, Cadernos Temáticos, Rio de Janeiro, dez. 2010. P. 47-48. 63  “Não é isso que fundaremos com esta desgraçada disposição que nos leva a repartir com extranhos quaesquer, nosso patrimonio moral. O que estamos creando é uma vasta feitoria para exploração universal do solo brazileiro: Patria, não! Essa vai morrendo ás mãos dos chatins politicos, para dar passo a um triste aggregoado de todas as nações: especie de navio corsario, onde a sêde do ganho juncta gente de toda procedencia”. VARELA, Alfredo. Direito constitucional brazileiro: reforma das instituições nacionaes. Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, Typographia, 1899, p. 269.

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eram profundas64. Imediatamente após chegar ao poder, os membros do partido republicano utilizaram a máquina pública para manteremse no governo durante o período provisório e implantarem seu projeto de governo. A vontade do povo novamente não teve meios de se fazer ouvida. A situação da república não era melhor que a do império nesse aspecto. Em 15 de novembro de 1889 o Decreto nº 1 transforma o Brasil em República Federativa. Cerca de sete meses mais tarde, o Decreto nº 511, de 23 de julho de 1890, vinha regular a eleição dos constituintes que tornaria definitiva a nova ordem política. O Decreto nº 511, conhecido como Regulamento Alvim, parecia trazer principalmente regras sobre a elegibilidade65, mas tinha em seu conteúdo uma alteração de procedimentos eleitorais que davam grande poder de influência dos republicanos sobre os eleitores. A república foi introduzida no ordenamento jurídico através de uma legislação que enfraquecera ainda mais o sistema eleitoral brasileiro, que alcançara uma evolução maior apenas no final do império66. A constituinte brasileira nascia sob as críticas de não ter sido eleita de acordo com a vontade da nação, e sim daqueles que dominavam o governo durante o período de transição. Oliveira VIANNA faz as críticas mais severas a essa constituinte e suas origens, ressaltando a influência deslegitimadora e antidemocrática do Regulamento Alvim:

64  FAORO, Raymundo. Os Donos do Poder. Formação do Patronato Político Brasileiro. 3ª ed. São Paulo: Editora Globo, 2001, p. 391. 65  Requisitos para elegibilidade: ser cidadão no pleno gozo de seus direitos; ser cidadão brasileiro a mais de sete anos para a Câmara, e nove para o senado. São inelegíveis os clérigos e religiosos, os governadores, chefes de polícia, comandantes de armas, comandantes de corpos policias, magistrados e funcionários demissíveis a qualquer tempo. FERREIRA, Manoel Rodrigues. A Evolução do Sistema Eleitoral Brasileiro. Brasília: Senado Federal, 2001, p. 302. 66  “Não foi sob grande prestigio da opinião publica que o Congresso encetou os seus trabalhos constituintes, em Novembro de 1890. O modo porque foram eleitos os seus membros, por uma lei que não garantia a verdade do voto e que se prestava a todas as tentativas de corrupção, fez recahir sobre elles as mais solidas presumpções da opinião de que o Congresso era uma feitura do governo provisorio, um seu prolongamento, por isso que o criterio da escolha dos seus membros dependeu mais dos respresentantes do governo de que do prestigio real que gozassem no seio do eleitorado”. FREIRE, Felisbelo. História Constitucional da República dos Estados Unidos do Brasil. Volume II. Rio de Janeiro: Typographia Moreira Maximino, Chagas & C., rua da Quitanda, 90, 1894, p. 193.

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“Na Constituinte Republicana, nada disto. Já as próprias fontes de sua autoridade não eram de pureza absoluta: o mandato que receberam não lhes vinha de uma delegação nacional, comparável á de que resultára a Constituinte Imperial; mas, sim, de um embuste formidável, conscientemente preparado, através do famoso , com o fito declarado de abafar qualquer manifestação do povo contraria á idéa republicana. Emanando de fontes tão suspeitas, a Constituinte Republicana não podia ter, de certo, grande autoridade moral sobre o paiz – e, realmente, não a teve”67. O sistema republicano nascia sem a representação da população – em parte pelo temor de que o apoio à nova ordem não fosse ser suficiente para garantir uma maioria na constituinte, inviabilizando a plena implantação do projeto. Os autores da época criticavam com vigor essa condição. Esse foi o primeiro fatores de relevo para compreender o momento político imediatamente posterior à proclamação, mas não seria o único. Ao lado da implantação planejada da nova ordem, ainda havia um forte desprestígio em relação aos partidos de âmbito nacional, como aponta MELLO FRANCO68. O desgaste que a política imperial enfrentara na sua derrocada veio acompanhado do desejo de descentralização política, que se mostrava forte desde o Manifesto Republicano de quase vinte anos antes. O exemplo exitoso dos norte-americanos envolvia um patamar de grande descentralização, e esse era um interesse dos agricultores, que teriam mais liberdade para reger seus interesses sem um governo centralizador. A ligação com a Constituição Norte-Americana era grande: a proposta do manifesto era de que o único vínculo a ser mantido entre 67  VIANNA, Oliveira. O Idealismo na Constituição. Rio de Janeiro: Terra de Sol, 1927, pp. 21-22. 68  “E a tudo se vinham juntar as necessidades federais, que não pareciam encontrar, nos partidos nacionais, instrumentos apropriados para expressão ou solução dos seus problemas. Esta hostilidade aos partidos nacionais é visível nos homens mais representativos da primeira geração republicana”. MELLO FRANCO, Afonso Arinos de. História e Teoria do Partido Político no Direito Constitucional Brasileiro. Rio de Janeiro, 1948, p. 62.

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os diferentes estados da federação era o da nacionalidade e da solidariedade na representação e defesa exterior69. O projeto de descentralização política começava a ser concretizado com a nova Constituição, com a outorga de amplas competências aos estados70. O transplante da Constituição descentralizada ia ao encontro dos desejos dos cafeicultores, que progressivamente tomaram o papel de protagonistas na política, logo que ultrapassado o momento inicial de prevalência militar positivista71. A política nacional tem atores novos, muito concentrados em seus núcleos, com a liderança nacional feita pela aliança entre os estados de Minas Gerais e São Paulo. A tetrapartição do Poder Moderador72 fora suprimida para implantação da tripartição de poderes prevista por Montesquieu73 e utilizada nos Estados Unidos da América. Duas características apontadas por Oliveira VIANNA são importantes para compreender o quadro político que levaria à fragmentação do poder nesse momento inicial e os motivos para adoção do modelo político norte-americano. O historiador e sociólogo inicialmente critica 69  “A autonomia das províncias é, pois, para nós mais do que um interesse imposto pela solidariedade dos direitos e das relações provinciaes, é um principio cardeal e solemne que inscrevemos na nossa bandeira”. O Manifesto Republicano. Itú: 1870. In: Cadernos ASLEGIS. Número 37. Brasília: Associação dos Consultores Legislativos e de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados, 2009. P. 55. 70  “E a prova está no pendor ali manifestado para se privar a União de certos elementos indispensaveis á sua vida, e os distribuir fartamente depois pelos Estados”. MILTON, Aristides Augusto. A Constituição do Brazil: noticia historica, texto e commentario. Rio de Janeiro: Imprensa nacional, 1895, p. XXII. 71  “Benjamin Constant fôra quem deffundira as doutrinas de Augusto Comte no Exercito, servindo-se da sua cathedra de lente da Escola Militar; e, como elle inspirara a revolução de 15 de Novembro, prestigio enorme adveio para a Politica Positiva. Demais, por haver sido o levante obra directa e quasi exclusiva da tropa, ella predominou, com os seus erros e as suas virtudes, na divisão dos despojos: a parte intellectual das forças regulares adoptava a escola philosophica do genial pensador contrario á existencia de exercitos permanentes. Emfim, exceptuados os positivistas e raros espiritualistas de valor, apresentaram-se, em geral, os republicanos para a ingente obra demolidora, apenas: sómente após o triumpho emprehenderam o estudo de doutrinas organicas, tornaram-se constructores orientados. Predominou, pois, o Comtismo nos dias posteriores á victoria”. MAXIMILIANO, Carlos. Commentarios a Constituição Brasileira. Rio de Janeiro: Jacintho Ribeiro dos Santos Editor, 1916, p. 85-86. Inspirou o desenho da bandeira nacional e os decretos que instituiram a plena liberdade de cultos, a separação entre Igreja e Estado, e a secularização dos ceminterios. 72  Na doutrina original, concebida pelo Benjamin CONSTANT francês, o monarca iria ocupar um local neutro e mediador dos poderes políticos, chamado de Poder Real. CONSTANT, Benjamin. Principes de Politique, Aplicables a tous les Gouvernemens Représentatifs et Particulièrment a la Constitution Actuelle de la France. Paris: Chez Alexis Eymery, 1815, p. 35. 73  “Existem em cada Estado três tipos de poder: o poder legislativo, o poder executivo das coisas que dependem do direito das gentes e o poder executivo daquelas que dependem do direito civil”. MONTESQUIEU, Charles de Secondat, Barão de. O Espírito das Leis. 3ª ed., São Paulo: Martins Fontes, 2005, Livro XI, cap. VI.

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a falta de qualidade da política feita após a implantação do império. “Na Constituinte da Republica, o pensamento político, que a animou, não tinha, no espirito da maioria, a clareza e a intensidade do ideal, que inspira os constituintes imperiais”74. Foi alçado ao topo do poder político um grupo com objetivos claros em alguns aspectos – implantar a república –, mas com dificuldades para viabilizar essa implantação doutrinariamente. A solução encontrada foi a cópia do núcleo norteamericano, medida que não trouxe o progresso econômico e social esperado pelas enormes diferenças sociais e de capacidade de mobilização política em relação à população norte-americana. A segunda característica é a falta de um núcleo político unido. É criticada a inexistência de uma classe coesa e capaz implantar a república no Brasil. O grupo republicano era pequeno, com elementos esparsos e pertencentes a vários setores de interesses diferentes na sociedade75. A crítica foi feita mesmo quando considerado o grupo dos proprietários rurais isoladamente: “Porque para estas classes só ha um modo de influirem no governo: - é apresentarem-se diante delle como uma massa de interesses conscientes de si mesmos, solidarios e unidos como moleculas de um bloco – e isto todos nós sabemos que não se dá”76. Na visão do historiador, faltava unidade à nova elite política nacional. Os interesses relacionados à descentralização, desejo dos proprietários que logo seriam chamados coronéis, foi realizada. A guarda constante do novo sistema para que ele realmente se traduzisse em um governo atento às necessidades e vontades da população, não. Neste enquadramento se pode compreender a postura de Ruy Barbosa. Ainda que o político tivesse suas aspirações próprias dentro da política e elas possam ajudar a justificar sua trajetória de colisão com o governo, a sua atitude em romper com os republicanos e a justi74  “De modo que, quando se deu a queda do velho regimen, o pensamento republicano não havia atingido a sua plena maturidade: não havia ainda saturado a consciência do país. Por isso, os expoentes do ideal republicano, na Constituinte ou fora dela, não pareciam senhores da sua idéa matriz: a impressão que nos dão é que não sabiam bem o que queriam, nem bem o que era preciso fazer”. VIANNA, Oliveira. O Idealismo na Constituição. Rio de Janeiro: Terra de Sol, 1927, p. 23. 75  VIANNA, Oliveira. O Idealismo na Constituição. Rio de Janeiro: Terra de Sol, 1927, p. 31. 76  VIANNA, Oliveira. O Idealismo na Constituição. Rio de Janeiro: Terra de Sol, 1927, pp. 112-113.

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ficação dada são condizentes com a situação experimentada pelo país. “A fórmulas não correspondem ao espirito, á acção viva, á existencia interior, são mascaras de impostura. A republica é a democracia e a liberdade na lei. Logo que a fórmula viola a justiça, opprime o individuo, ou falseia o voto da nação, a república está em contradicção comsigo mesma”77. LYNCH também atribui à realidade autoritária do governo a ruptura do insigne jurista com a república que ele contribuíra para criar78. Nunca foi uma ruptura com a ideia republicana, foi com a realidade republicana brasileira79. “Quero a republica justa, a republica livre, a republica popular. Não sacrifico a substancia á forma: faço questão de harmonizar uma com a outra”. Devido às dificuldades, VIANNA iria escrever até mesmo que a Constituição nunca fora posta em prática80, uma frase que demonstra a gravidade da sua insatisfação. Em verdade, a Constituição fora posta em prática – mas criada com a influência maior dos cafeicultores, a norma permitiu a apenas a implantação de um sistema que não fosse hostil aos seus interesses, com poucas das virtudes existentes na república dos Estados Unidos da América. Aurelino LEAL, enquanto busca a neutralidade doutrinária na explicação do conceito de autonomia, acaba por mostrar a política nacional com simplicidade. “No Brasil, os Estados são províncias largamente descentralisadas. A descentralisação política comporta, perfeitamente, esse poder próprio dos chamados Estados, e uma descentralisação ampla é, afinal, o mesmo que autonomia” 81. Havia a ampla autonomia, mas faltavam os motivos sociais 77  BARBOSA, Ruy. O Partido Republicano Conservador: documentos de uma tentativa baldada. Rio de Janeiro: Casa Mon’Alverne, 1897, p. 43. 78  “Insatisfeito com as limitações do ideário liberal sob a monarquia parlamentar, Rui procedeu a uma escalada doutrinária e idealista que atingiu seu ápice durante o Governo Provisório da República, quando, como ministro de Estado, colaborou num projeto de república democrática e liberal. Decepcionou-se, todavia, com a realidade autoritária da primeira década republicana, dominada sucessivamente pelo democratismo jacobino e pelo conservadorismo oligárquico”. LYNCH, Christian Edward Cyril. Entre o Liberalismo Monárquico e o Conservadorismo Republicano: A Democracia Impossível de Rui Barbosa. Revista da EMARF, Cadernos Temáticos, Rio de Janeiro, dez. 2010. P. 39. 79  BARBOSA, Ruy. O Partido Republicano Conservador: documentos de uma tentativa baldada. Rio de Janeiro: Casa Mon’Alverne, 1897, p. 43. 80  “Em verdade, esta Constituição nunca foi posta em pratica, como veremos: pode-se dizer que ella, como as crianças mal nascidas, morreu do mal de sete dias. Ella trazia, aliás, no sangue, a alravez a propria Constituinte, eleita pelo regulamento Alvim...”. VIANNA, Oliveira. O Idealismo na Constituição. Rio de Janeiro: Terra de Sol, 1927, p. 27. 81  LEAL, Aurelino. Theoria e Prática da Constituição Federal Brasileira. Primeira Parte. Da Organisação

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e políticos para fundamentá-la e torná-la um sistema de governo benéfico ao bem comum, capaz de aumentar a liberdade dos cidadãos. As decisões políticas dos novos governantes determinaram uma ampla descentralização. A supressão do Poder Moderador – sem a instituição de nenhum outro órgão com a mesma função -, é apontado por LYNCH como mais um passo relevante no caminho que fora tomado quando se descentralizou as competências ao estilo norte-americano82. A forma hierárquica de organização política foi substituída por um sistema menos dotado de ferramentas para enfrentar crises, com exceção dos regimes de emergência83. O desprestígio dos partidos nacionais era profundo, contra eles se levantavam os partidos políticos, os militares, os positivistas. Os políticos estaduais mais influentes do Brasil republicano também não escondem sua hostilidade à ideia de partidos amplos84. Nesse cenário é compreensível haverem surgido os Partido Republicano Federal apenas em 1910 e 1913, mais de duas décadas após o fim da monarquia. Até 1910, na opinião de MEDEIROS, os estados tiveram condições de se desenvolver internamente com a mais ampla liberdade, com pouca interferência até mesmo da política relativamente centralizada que começaria a ser realizada por São Paulo e Minas Gerais algum tempo depois. A descentralização prevista se tornou realidade, os poderes locais aumentaram e os estados tiveram grande liberdade85. DuFederal do Poder Legislativo (Arts. 1 a 40). Rio de Janeiro; F. Briguiet e C, Editores, 1925, p. 33. 82  Atribuição de competências em sistema onde o Presidente da República tem uma lista de competência e os entes federados tem competência residual para todos os demais assuntos. O sistema ainda existe no Brasil atualmente. A principal diferença é a pequena lista de competências atribuídas ao presidente no sistema norte-americano, permitindo aos estados atuar em muitas áreas. Para detalhes: RODRIGUES, Itiberê de Oliveira. Fundamentos Dogmático-Jurídicos do Sistema de Repartição das Competências Legislativa e Administrativa na Constituição Federal de 1988. Revista Diálogo Jurídico. Salvador, Nº 14, jan. fev. e mar. de 2007. 83  LYNCH, Christian Edward Cyril. O Caminho para Washington passa por Buenos Aires: A recepção do conceito argentino do estado de sítio e seu papel na construção da República brasileira (1890-1898). Revista Brasileira de Ciências Sociais, volume 27, número 48, 149-196, fevereiro de 2012. P. 151. 84  MELLO FRANCO, Afonso Arinos de. História e Teoria do Partido Político no Direito Constitucional Brasileiro. Rio de Janeiro, 1948, pp. 62-63. 85  As presidências civis que se sucederam até 1910, mantendo o país na ordem material e jurídica, cumprindo e fazendo cumprir na ordem material e jurídica, cumprindo e fazendo cumprir a Constituição, com louvável inteireza, favoreceram a expansão do princípio federativo, e os Estados puderam então governarse pacificamente, adestrando-se no manejo diuturno dos seus interesses privativos. MEDEIROS, Borges

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rante todo esse período, a sociedade pouco se manifestou – a opinião pública não tinha canais para se fazer ouvir, e nem organização para criá-los. A Constituição criada à imagem da norte-americana, criada para uma sociedade ativa politicamente, agora estava sendo aplicada sem participação popular86. 2.2 Política dos Governadores O enfraquecimento da política nacional criava o vácuo necessário para a política ser feita através de outros caminhos, os das organizações partidárias estaduais. A alta política do país desloca-se para os estados, e as duas potências agrárias emergentes – São Paulo e Minas Gerais – surgem como as maiores detentoras de poder político. Era o período da política dos governadores, que seu maior símbolo e criador, Campos Sales, sempre preferiu chamar de “Política dos Estados”87. A situação de domínio dos cafeicultores e outros proprietários rurais não se instalou imediatamente após a proclamação. Inicialmente, ainda sob o comando militar, os estados foram caracterizados por FREIRE como simples circunscrições administrativas, sobre as quais o governo central ainda exercia grande intervenção. Em um primeiro momento, “governadores não passaram de simples delegados da ditadura, que os destituia ou restringia suas attribuições”88. Uma força armada do governo central se manteve em todas as províncias durante um período, e os governadores poderiam apenas organizar o policiamento, dependendo quase totalmente do governo central89. A partir de 1894, quando começaram a serem eleitos preside. O Poder Moderador na República Presidencial. Recife: Diário de Pernambuco, 1933, p. 45. 86  “Como se vê, os republicanos da Constituinte construiram um regimen político baseado no pressupposto da opinião publica organisada, arregimentada e militante. Ora, esta opinião não existia, e ainda não existe, entre nós: logo, ao mechanismo idealisado pelos legisladores de 91 faltava o sopro inspirador do seu dynamismo, Dahi a sua fallência”. VIANNA, Oliveira. O Idealismo na Constituição. Rio de Janeiro: Terra de Sol, 1927, p. 42. 87  MELLO FRANCO, Afonso Arinos de. História e Teoria do Partido Político no Direito Constitucional Brasileiro. Rio de Janeiro, 1948, p. 65. 88  FREIRE, Felisbelo. História Constitucional da República dos Estados Unidos do Brasil. Volume I. Rio de Janeiro: Typographia Moreira Maximino, Chagas & C., rua da Quitanda, 90, 1894, p. 354. 89  LEAL, Aurelino. História Constitucional do Brasil. Brasília: Senado Federal, 2002, p. 202.

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dentes civis, a ascensão política dos produtores rurais foi rapidamente alterando o cenário e acentuando a descentralização política. A organização política estadual pôde tornar-se rapidamente uma força autônoma, dotada de liberdade para dirigir a política para os caminhos que lhe pareceram mais desejáveis. São Paulo começa lentamente a tomar o lugar de protagonista da política nacional, os demais estados tornam-se mais e mais autônomos – um fenômeno chamado na doutrina de VIANNA de “o estado atomístico”90. A partir desse momento, a política do Café com Leite pode ser identificada ao longo da República Velha, logo que os militares Deodoro e Peixoto deram lugar aos presidentes eleitos. Minas Gerais e São Paulo dominaram a política nacional sem chegar a criar consenso na sua liderança ou centralizar complemente o poder. Apenas 10% da população do período era urbana, seguindo estimativas da época. A maior parte da população estava nas fazendas, não tinha propriedades, e nem meios materiais de acessar a justiça ou gozar dos direitos reconhecidos pela Constituição recém-criada91. Aliado à falta de consciência política, a situação de submissão econômica aos proprietários criava grande suscetibilidade para influências no campo político. Havia grande dependência dos proprietários de terra que agora protagonizavam o cenário político. Nesse quadro, de um eleitorado pouco politizado e dependente, a máquina estatal passou a ser ligada aos interesses dos proprietários e suas culturas, pois eles possuíam os meios de dominar os principais cargos e reforçar ainda mais seu poder sobre os cidadãos locais:

“Rara a provincia em que a eleição do juiz de paz, que a representava, não recabia em um membro da classe proprietaria territorial, assim como a nomenção do seus vice-presi90  VIANNA, Oliveira. O Idealismo na Constituição. Rio de Janeiro: Terra de Sol, 1927, pp. 114. 91  VIANNA, Oliveira. O Idealismo na Constituição. Rio de Janeiro: Terra de Sol, 1927, pp. 64-65.

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dentes . E’ facil agora compreendermos como, a despeito do regime representativo, continuou a preponderancia politica da classe que economicamente dominava, mesmo no recinto do Parlamento e em suas resoluções. Ou ela representava-se directamente, ou por meio de seus delegados...”92. A realidade política brasileira retratava fielmente a estrutura econômica ligada à agricultura. A maior parte dos representantes eleitos, portanto, estava ligada diretamente ao campo. O amparo da máquina estatal às necessidades dos seus novos protagonistas foi amplo93. O sistema eleitoral desse período foi instrumento de submissão dos cidadãos. Dentre os institutos da Constituição dos Estados Unidos da América94, estava a competência estadual e municipal para legislar sobre Direito Eleitoral95. Foi a primeira - e única - vez na história do Brasil em que essa competência não coube à união96. Houve experiências positivas: no município e no estado de São Paulo foram adotadas normas semelhantes à avançada Lei Saraiva97, a mais avançada do império. No entanto, no estado do Amazonas o deputado Efigênio de Sales foi nomeado após uma emenda trocar o nome dos candidatos; e no Rio de Janeiro, foi eleito o candidato Mendes Tavares, apesar de não ter recebido a metade dos votos do primeiro colocado98. As dificuldades foram tão grandes que em 15 de novembro de 1904 a Lei 92  FREIRE, Felisbelo. História Constitucional da República dos Estados Unidos do Brasil. Volume I. Rio de Janeiro: Typographia Moreira Maximino, Chagas & C., rua da Quitanda, 90, 1894, p. 338. 93  FREIRE, Felisbelo. História Constitucional da República dos Estados Unidos do Brasil. Volume I. Rio de Janeiro: Typographia Moreira Maximino, Chagas & C., rua da Quitanda, 90, 1894, p. 336. 94  Artigo 1º, Seção 4, 1 “A época, os locais e os processos de realizar eleições para Senadores e Representantes serão estabelecidos, em cada Estado, pela respectiva Assembleia; mas o Congresso poderá, a qualquer tempo, fixar ou alterar, por meio da lei, tais normas, salvo quanto ao local de eleição dos Senadores”. ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA. The United States Constitution. Disponível em: . Acesso em: 3 jul. 2013. 95  O artigo 34, §22º, trata da competência da união para “regular as condições e o processo da eleição para os cargos federais, em todo o Pais”. Em consequência, todos os demais cargos – não federais – passariam a ser supridos pelos outros entes federados, na forma que desejassem. 96  STARLING, Leão Vieira. A Nova Lei Eleitoral (Decreto-lei n. 7.586), 1945, p. 59. 97  A Lei Saraiva, somada ao seu decreto, ocupou mais de sessenta páginas quando publicada, é a lei eleitoral mais avançada do império e uma síntese das experiências em busca de isenção eleitoral. BRASIL. Decreto nº 8213, de 13 de agosto de 1881. Regula a execução da Lei nº 3029 de 9 de janeiro do corrente ano que reformou a legislação eleitoral. Coleção das Leis do Império do Brazil. Rio de Janeiro: 1881. 98  STARLING, Leão Vieira. A Nova Lei Eleitoral (Decreto-lei n. 7.586), 1945, pp. 59-60.

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nº 1.269, conhecida como Lei Rosa e Silva, revogou toda a legislação esparsa anterior e fez retornar a competência privativa à União. Amaro CAVALCANTI, escrevendo quatro anos antes da Lei Rosa e Silva, ressalta a impotência da união frente a influência dos estados, pois mesmo os deputados federais e senadores eram predominantemente designados pelos poderes locais99. VIANNA chama os políticos locais de clãs partidários e afirma haver a substituição da organização monárquica pela de representantes sem grande autoridade, escolhidos pelos novos protagonistas econômicos100. Os presidentes civis, portanto, tem um parlamento eleito pelas forças regionais, sem contar com a manifestação da população ou de uma sociedade politicamente organizada e crítica101. A Constituição da República, fortemente influente pela norte-americana, tinha normas preparadas para uma organização pública ativa, expressiva, preparada para pressionar o governo. Essa não era a realidade brasileira, agrária e com uma população pouco capaz de resistir aos que possuíam o poder econômico e político102. Ruy BARBOSA rompe com o governo implantado, e pela sua importância no império, narra-se o seu depoimento da evolução de sua oposição a partir de 1891. Suas críticas haviam se voltado à desorganização dos estados e sua política local; a partir de 1892, à ditadura viabilizada a partir do estado de sítio; e, a partir de 1893, em aberta oposição a Floriano Peixoto. Nesse ano ele foi exilado103, indo para Argentina e após para Portugal, podendo retornar ao Brasil apenas no ano de 1895. 99  CAVALCANTI, Amaro. Regimen Federativo. A Republica Brazileira. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1900, p. 339. 100  “De modo que, em sua maioria, os clas partidários, que se organizaram por todo o paiz, em substituição das velhas organizações monarchicas, não tinham propriamente á sua frente as figuras de mais autoridade no seio das elites politicantes. Havia ali, com notáveis e brilhantes excepções – muita entidade entrelopa, muito arrivista, muito nouveau-riche politico, sem grande solidez de estrutura no caráter e sem grande lastro de escrúpulos na consciência...”. VIANNA, Oliveira. O Idealismo na Constituição. Rio de Janeiro: Terra de Sol, 1927, p. 22. 101  VIANNA, Oliveira. O Idealismo na Constituição. Rio de Janeiro: Terra de Sol, 1927, p. 59. 102  VIANNA, Oliveira. O Idealismo na Constituição. Rio de Janeiro: Terra de Sol, 1927, pp. 51-52. 103  BARBOSA, Ruy. O Partido Republicano Conservador: documentos de uma tentativa baldada. Rio de Janeiro: Casa Mon’Alverne, 1897, p. 89-94.

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Assim, durante largo período de tempo, os Partidos Republicanos Mineiro (PRM) e Paulista (PRP) dominam a política nacional104, enquanto os partidos republicanos dos outros estados protegem seus interesses locais e participam marginalmente das decisões de maior monta. Em sentido amplo, os republicanos eram todos, mas lhes faltava unidade. Não havia um grupo nacional ou uma liderança pensante, haviam grupos locais nos estados. O pluralismo político, durante esse período de mais de trinta anos, foi substituído por uma aliança de vinte oligarquias estaduais, que dominaram um Congresso Nacional enfraquecido e pouco resistente às suas demandas105. 2.3 Partido Republicano Rio-Grandense São Paulo e Minas Gerais, graças ao seu poder econômico, assumiam o protagonismo político. No resto do país, começam a se desenvolver os partidos republicanos estaduais e mais afastados da política nacional. Dentre eles, o Rio Grande do Sul se destaca pelo seu maior desenvolvimento doutrinário na doutrina republicana e por ter gerado o político que, ao final do período, modificaria a ordem, Getúlio Dorneles Vargas. A busca pelo republicanismo havia começado precocemente no estado, a Revolução Farroupilha terminada em 1845, após dez anos de conflito, tinha a república como um de seus objetivos. O primeiro partido republicano estadual , por outro lado, só iria se organizar em 23 de fevereiro de 1882, tardiamente se comparado aos outros estados106. Ele só nasceu quando o Clube Republicano de Porto Alegre 104  MELLO FRANCO aponta três motivos predominantes para a união dos dois estados. O primeiro foi a necessidade premente de ter alguma coesão no governo federal para garantir a unidade nacional. O segundo foi econômico: a produção cafeeira dominava a economia brasileira, e os dois estados eram os maiores produtores, facilitando uma correspondente unificação dos aparelhos políticos. Por fim, havia um semelhanças culturais e proximidade territorial para auxiliar. O resultado foi a duradoura sucessão de presidentes de cada estado. MELLO FRANCO, Afonso Arinos de. História e Teoria do Partido Político no Direito Constitucional Brasileiro. Rio de Janeiro, 1948, p. 68. 105  LYNCH, Christian Edward Cyril. O Caminho para Washington passa por Buenos Aires: A recepção do conceito argentino do estado de sítio e seu papel na construção da República brasileira (1890-1898). Revista Brasileira de Ciências Sociais, volume 27, número 48, 149-196, fevereiro de 2012. P. 151. 106  A Convenção de ITU, de 1870, abrira o período em que a propaganda republicana apenas se fortaleceu no Brasil. Apesar disso, as tentativas de se criar um partido republicano foram atrasadas, no início da

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conseguiu organizar seus membros sob os ideais republicanos107. Além das dissidências internas, as primeiras tentativas eleitorais ocorridas a partir de 1880 não haviam sido bem sucedidas. Em 1885, novas eleições ainda trariam resultados desestimulantes mesmo nos locais em que o partido tinha mais força, o principal passo positivo foi a eleição de Assis Brasil para a Assembleia Provincial108. Dissidências internas haviam atrasado o surgimento do partido, mas sua atividade política se fortaleceu a partir daquele momento. Clubes republicanos, que haviam surgido inicialmente em 1878, passam a aumentar em número. Em 1º de janeiro de 1884, é publicado o jornal a Federação, que alcançaria repercussão nacional, e não foi o único periódico republicano do estado. Ao final de 1888, havia trinta e cinco clubes no Rio Grande do Sul109. A posição a respeito do governo imperial era a de que ele deveria ser atacado com uso do exército e sob a influência do Partido Republicano. Escrevendo em 1930, OSÓRIO descreve como elemento essencial do partido “a eliminação da monarquia como regime incapaz de conduzir o povo brasileiro à felicidade e à grandeza e a fundação da República é a aspiração dominante do Partido Republicano”110. No ano de 1889, o número de deputados estaduais já chegava a seis. No momento em que ocorre a queda do império, o poder político dos republicanos ainda era proporcionalmente menor do que em São Paulo ou Minas gerais, mas era a segunda maior força da província. década de 1880, os membros indicavam a necessidade de organização do movimento e se faziam convenções com essa finalidade. RUSSOMANO, Victor. História Constitucional do Rio Grande do Sul: 1835/1930. 2ª ed. Rio Grande do Sul: Corag, 1976, p. 184. 107  OSÓRIO, Luís Joaquim. Partidos Políticos no Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul: 1992, 13. 108  BOEHRER narra que, Assis Brasil, por exemplo, alcançou 158 dos 1.473 votos na eleição para a Câmara de Deputados. BOEHRER, George C. A. Da Monarquia à República. História do Partido Republicano do Brasil – (1870-1889). Tradução de Berenice Xavier. Rio de Janeiro: Ministério da Educação e Cultura, 1954, pp. 181-184. 109  BOEHRER, George C. A. Da Monarquia à República. História do Partido Republicano do Brasil – (1870-1889). Tradução de Berenice Xavier. Rio de Janeiro: Ministério da Educação e Cultura, 1954, pp. 184-187. 110  OSÓRIO, Luís Joaquim. Partidos Políticos no Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul: 1992, p. 16.

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Líderes gaúchos111 se tornariam grandes líderes do movimento no Brasil, especialmente nas pessoas de Assis Brasil e Júlio de Castilhos112. Os exemplos do Partido Republicano Paulista eram vistos como modelos a seguir nesse momento inicial de organização113. Após o golpe, o Congresso Constituinte delineia o início do domínio de Júlio de Castilhos no Rio Grande do Sul. A chapa republicana local angariou todas as cadeiras de representação, graças a Lei Alvim e seu sistema de escrutínio majoritário por lista completa. A disputa, no entanto, foi acirrada, pois duas chapas republicanas concorreram, uma do partido local, vencedora, e outra apoiada pelo Partido Republicano Federal114 e composta por liberais e os dissidentes do partido republicano local115. O conflito logo evoluiria para a Revolução Federalista, entre 1893 e 1895, que após o emprego de violência, culminou no domínio dos castilhistas. A estabilidade política interna não havia sido alcançada. Seguindo a vitória inicial, Borges de Medeiros e Júlio de Castilhos dominam a política local. Castilhos era o redator do jornal a Federação, e foi a principal influência doutrinária para o governo levado a cabo por Borges. Tão importante era o pensamento de Castilhos que CHACON afirma ser o estado do Rio Grande do Sul, sob sua liderança, foi o único estado a encarar seriamente a doutrina do republicanismo 111  RUSSOMANO cita como principais líderes em Porto Alegre: Apolinário Porto Alegre, José Pedro Alves, Sebastião Pereira de Barros, M. Sérvulo de Almeida, Venâncio Aires, Pinheiro Machado, Ramiro Barcelos, Demétrio Nunes Ribeiro e Julio de Castilhos. RUSSOMANO, Victor. História Constitucional do Rio Grande do Sul: 1835/1930. 2ª ed. Rio Grande do Sul: Corag, 1976, p. 154. 112  BOEHRER, George C. A. Da Monarquia à República. História do Partido Republicano do Brasil – (1870-1889). Tradução de Berenice Xavier. Rio de Janeiro: Ministério da Educação e Cultura, 1954, p. 189. 113  RUSSOMANO, Victor.   História Constitucional do Rio Grande do Sul: 1835/1930.  2ª ed. Rio Grande do Sul: Corag, 1976, pp. 154-155. 114 , OSÓRIO descreve da seguinte forma o partido: “O Partido Republicano Federal foi formado em 23 de abril de 1891. Resultou da junção do grupo dissidente histórico, que se congregara sob o título de ‘União Republicana’ com a chamada ‘União Nacional’, coligação política que se organizara neste Estado em 8 de julho de 18901. O Partido Republicano nada teve de comum com o Partido Federalista, fundado pelo Conselheiro Gaspar da Silva Martins, no Congresso de Bagé, de 31 de março de 1892. O primeiro tinha como ideal o regime presidencial federativo; o segundo, o sistema unitário parlamentar. Foram duas organizações partidárias completamente distintas, com programas antagônicos ”. OSÓRIO, Luís Joaquim. Partidos Políticos no Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul: 1992, p. 51. 115  TRINDADE, Hélgio. Poder legislativo e autoritarismo no Rio Grande do Sul: 1891-1937. Porto Alegre, Sulina, 1980, 24.

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no Brasil do período116. A postura conservadora, a ideia de melhorar conservando foi desenvolvida em doutrinas novas e originais, como o direito ao voto do analfabeto, a elegibilidade dos sacerdotes, a unicameralidade do Congresso, propriedade estadual de todas as terras devolutas em seus estados e aumento da descentralização estadual117. Júlio de Castilhos morreria precocemente em 24 de outubro de 1903, mas a execução política de sua doutrina continuaria durante todo o período borgista. Ao assumir a liderança do partido após o falecimento, Borges escreveria que “Nada temos a instituir ou inovar, senão unicamente aperfeiçoar, em nossa existência política”118. Houve contestação ao longo das três décadas, como a ocorrida em 1922, quando houve a união de diversos grupos em volta da candidatura oposicionista de Assis Brasil durante o processo eleitoral em que Borges seria eleito governador pelo quinto mandato119. O grupo de Borges, no entanto, lideraria a política no Rio Grande do Sul por esse longo período, foi o líder de um dos grupos mais duradouros dentre os estados brasileiros. Salvo o intervalo de cinco anos entre 1908 e 1913, Borges governaria o Rio Grande do Sul entre 1898 e 1929. Ao longo do tempo, o panorama político do país foi sendo modificado lentamente. São Paulo e Minas Gerais começavam a ocupar o vácuo aberto pela queda dos partidos imperiais e ter cada vez mais influência. A descentralização dos partidos estaduais foi diminuindo conforme os dois mais importantes passaram a projetar seu programa sobre todos os demais estados. O Rio Grande do Sul não foi exceção nesse movimento, mas foi um dos locais onde a doutrina conseguiu identificar esse acontecimento enquanto ele ainda se ocorria. 116  “Só num único lugar se veio a levar a sério o republicanismo doutrinário e não apenas a República de fato: o Rio Grande do Sul, sob a liderança de Júlio de Castilhos”. CHACON, Vamireh. História dos partidos brasileiro: discurso e práxis dos seus programas. 2ª ed. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1985, pp. 58-59. 117  OSÓRIO, Luís Joaquim. Partidos Políticos no Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul: 1992, p. 21. 118  OSÓRIO, Luís Joaquim. Partidos Políticos no Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul: 1992, p. 27. 119  SEGA, Rafael Augustus. Getúlio Vargas e o Partido Republicano Rio-Grandense. Fronteiras, Dourados, MS, v. 10, n. 18, pp. 195-210, jul./dez. 2008, pp. 203-205.

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Escrevendo logo após o final do período, no ano de 1933, Borges de MEDEIROS criticava o novo quadro de centralização que afinal se instalara depois da atomização inicial, originado pelos anos de domínio do cenário nacional por paulistas e mineiros, que as poucos expandiram novamente a importância da política nacional. A Política dos Governadores, que inicialmente garantia a descentralização, também havia aberto o espaço para que os estados mais fortes voltassem a criar influências centralizadas conforme dominavam mais e mais o governo central. “Outra fonte do mal é facil descobrir na criticada formula – política dos governadores – que o presidente Campos Sales inaugurara. Ele queria dizer, praticamente, que o presidente e os governadores de comum acordo, fariam a política, apoiando-se reciprocamente e trocando favores. Mas, como o presidente era o mais forte e dispunha de uma poderosa maquina eleitoral – o funcionalismo federal, cujos quadros se alargavam constantemente, a consequencia inevitavel foi que ele passou a exercer uma influencia decisiva sobre os governos locais e sobre os seus prepostos no Congresso Nacional, ditandolhe as normas de ação. Não havendo partido nacionais, agia o presidente livremente, sem freios que contivessem os excessos do seu poder. E dess’arte intervinha ele não só na escolha dos legisladores federais, como até na sucessão dos governadores locais”120.

Ainda que em meio às críticas sobre aspectos políticos, ainda no ano de 1895, MILTON já aponta a expansão e desenvolvimento dos estados, que tiveram tempo para se desenvolverem dentro do sistema federal122. O Rio Grande do Sul, além da grande força doutrinária e política, contribuiria com desenvolvimento do cenário político brasileiro do período gerando um importante defensor do castilhismo. Getúlio Vargas, em 1907, chegara a fundar com seus colegas o Bloco Acadêmico Castilhista e redigir textos chamando Júlio de Castilhos de Mestre Imortal123. Ele, afinal, interromperia a política vigente no período para iniciar uma nova era no Brasil. 3 O Poder Legislativo 3.1 Influências sobre a Constituição de 1891 Apresentado o quadro político brasileiro, é possível acessar com mais acuidade as normas do Poder Legislativo sistematizado na Constituição de 1891 e relacioná-las à realidade política. A finalidade é apresentar as origens das instituições e os principais debates da época.

Há saldos positivos da República Velha, o progresso material e cultural brasileiro foi significativo durante o período de domínio dos proprietários rurais. Apesar de ser um período de sendo política feito pelos estados, a crescente dominância dos dois maiores foi recriando a centralização que se esfacelara com a queda de Dom Pedro II121 e abrindo espaço para a política ser feita nacionalmente novamente.

A maior influência é a Constituição dos Estados Unidos da América – que será referida com grande frequência. Três são as situações observadas. Houve normas que já faziam parte da tradição constitucional brasileira por estarem na Constituição de 1824, e foram mantidas com pouca alteração substancial. Algumas normas norte-americanas foram discutidas, mas não foram adotadas na formulação do legislativo em função das peculiaridades políticas da época e influência de países como suíça ou os latino-americanos, sendo a Argentina o destaque maior. A maioria das normas novas, por fim, foram implantadas no

120  MEDEIROS, Borges de. O Poder Moderador na República Presidencial. Recife: Diário de Pernambuco, 1933, pp. 48-49. 121  MELLO FRANCO, Afonso Arinos de. História e Teoria do Partido Político no Direito Constitucional Brasileiro. Rio de Janeiro, 1948, p. 67.

122  MILTON, Aristides Augusto. A Constituição do Brazil: noticia historica, texto e commentario. Rio de Janeiro: Imprensa nacional, 1895, p. 382. 123  SEGA, Rafael Augustus. Getúlio Vargas e o Partido Republicano Rio-Grandense. Fronteiras, Dourados, MS, v. 10, n. 18, pp. 195-210, jul./dez. 2008, p. 200

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Brasil pela primeira vez por influxo da Constituição americana, eventualmente causando efeitos e gerando debates diferentes daqueles que existiam nos Estados Unidos em função das mesmas normas124. O governo provisório, implantado após a proclamação, legislou abundantemente. Foi decretado o sufrágio universal, a ampla naturalização de estrangeiros, a separação entre Estado e Igreja, o casamento civil, abolição de algumas penas cruéis, a criação do código penal, a lei de falências, a criação da justiça federal e várias leis comerciais e societárias. Além das normas, em 3 de dezembro de 1889, foi nomeada uma comissão para elaborar um projeto de Constituição que iria implantar o sistema republicano. A comissão tinha cinco membros: Joaquim Saldanha Marinha, presidente; Americo Braziliense de Almeida Mello; vice-presidente; Antonio Luiz dos Santos Weneck, Francisco Rangel Pestana e José Antonio Pereira de Magalhães Castro125. Os personagens são importantes porque todos eram republicanos históricos, e dois haviam assinado o Manifesto Republicano no ano de 1870126. O projeto criado pelos cinco juristas foi enviado ao Governo Provisório em 24 de maio de 1890. Uma nova revisão foi feita, coordenada principalmente por Ruy BARBOSA, até 22 de junho – modificações importantes foram realizadas, ainda que sem descaracterizar o projeto inicial. “De fato, Rui fez umas poucas alterações no modelo constitucional estadunidense, tendo em vista, basicamente, a evolução política daquele país desde 1787. Com receio da deficiente educação do povo, ele também adotou a eleição indireta para presidente e senadores; mas, com receio de que as eleições presidenciais fossem tumultuárias, fixou uma duração mais longa, de seis anos, para o mandato presidencial. Receoso de que o presidente manipulasse o Supremo Tribunal, fixou seu 124  LEAL, Aurelino. História Constitucional do Brasil. Brasília: Senado Federal, 2002, p. 224. 125  LEAL, Aurelino. História Constitucional do Brasil. Brasília: Senado Federal, 2002, p. 204. 126  MELLO FRANCO, Afonso Arinos de. Direito Constitucional. Teoria da Constituição. As Constituições do Brasil. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1981, p. 123.

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número de integrantes na Constituição; temendo o excesso de federalismo – ciente de que, no Brasil, ele se fazia do centro para a periferia, e não o contrário –, Rui ajudou a fortalecer a União, concedendo-lhe o poder de emitir moeda, a propriedade das terras devolutas e a competência para legislar sobre Direito Civil, Penal e Processual”127. Nesse mesmo dia o Decreto nº 510 convocou a Assembleia Constituinte. Do projeto apresentado à constituinte, apenas quatorze artigos foram alterados. Foi aprimorado na Constituição a intervenção e os regimes de emergência128, retirado especialmente da Argentina, e já presente nas constituições de muitos países latino-americanos129. Propostas parlamentaristas e exclusivamente positivistas foram afastadas do projeto, vigendo um sistema bastante semelhante ao norte-americano. O principal embate ocorreu entre os federalistas liderados por Ruy BARBOSA e os políticos liderados por Campos Sales e Júlio de Castilhos. Ruy BARBOSA era mais fiel ao sistema norte-americano. O outro grupo, objetivando uma descentralização ainda mais acentuada, conseguiu implantar algumas alterações importantes do projeto inicial, como a eleição direta para presidente130 e senadores, a redução 127  LYNCH, Christian Edward Cyril. Entre o Liberalismo Monárquico e o Conservadorismo Republicano: A Democracia Impossível de Rui Barbosa. Revista da EMARF, Cadernos Temáticos, Rio de Janeiro, dez. 2010. P. 49. 128  LYNCH, Christian Edward Cyril. Entre o Liberalismo Monárquico e o Conservadorismo Republicano: A Democracia Impossível de Rui Barbosa. Revista da EMARF, Cadernos Temáticos, Rio de Janeiro, dez. 2010. P. 49. 129  MELLO FRANCO, Afonso Arinos de. Direito Constitucional. Teoria da Constituição. As Constituições do Brasil. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1981, p. 123. 130  Sistema de eleição presidencial é indireto, utilizando representantes indicados pelos estados-membro. Constituição dos Estados Unidos da América, Artigo 2º, Seção 1, 2: “Cada Estado nomeará, de acordo com as regras estabelecidas por sua Legislatura, um número de eleitores igual ao número total de Senadores e Deputados a que tem direito no Congresso; todavia, nenhum Senador, Deputado, ou pessoa que ocupe um cargo federal remunerado ou honorífico poderá ser nomeado eleitor. (Os eleitores se reunirão em seus respectivos Estados e votarão por escrutínio em duas pessoas, uma das quais, pelo menos, não será habitante do mesmo Estado. Farão a lista doas pessoas votadas e do número dos votos obtidos por cada um, e a enviarão firmada, autenticada e selada à sede do Governo dos Estados Unidos, dirigida ao Presidente do Senado. Este, na presença do Senado e da Câmara dos Representantes, procederá à abertura das listas e à contagem dos votos. Será eleito Presidente aquele que tiver obtido o maior número de votos, se esse número representar a maioria do total dos eleitores nomeados. No caso de mais de um candidato haver obtido essa maioria assim como número igual de votos, a Câmara dos Representantes elegerá imediatamente um deles, por escrutínio, para Presidente, mas se ninguém houver obtido maioria, a mesma Câmara elegerá, de igual modo, o Presidente dentre os cinco que houverem reunido maior

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do mandato presidencial para quatro anos, ampliação da competência tributária dos estados e a transferência das terras devolutas131. Esses ajustes auxiliariam mais tarde à plena realização do projeto político batizado por Campos Sales de Política dos Estados. A Constituição, em suma, foi mais influenciada pelos Estados Unidos, mas as circunstâncias concretas que viabilizaram a ascensão dos republicanos ao poder também tiveram papel relevante sobre normas fundamentais. Disposições que inicialmente seriam retiradas da constituição norte-americana foram modificadas na criação de um sistema ainda mais voltado ao desejo de descentralização. Apresentadas as influências na Constituição, o foco é a apresentação do legislativo, sua estrutura, funcionamento e atribuições. A apresentação pretende tanto expor suas normas quanto adentrar os principais debates doutrinários relacionados aos problemas concretos do país. 3.2 Estrutura do Poder Legislativo A primeira seção da Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil trata do Poder Legislativo, indo do artigo 16 ao artigo 40. A função legislativa é atribuída ao Congresso132 Nacional com a sanção número de votos. Nessa eleição do Presidente, porém, os votos serão tomados por Estados, cabendo um voto à representação de cada Estado. Para se estabelecer quórum necessário, deverão estar presentes um ou mais membros de dois terços dos Estados. Em qualquer caso, eleito o Presidente, o candidato que seguir com o maior número de votos será o vice-presidente. Mas se dois ou mais houverem obtido o mesmo número de votos, o Senado escolherá dentre eles, por escrutínio, o Vice-Presidente.)* 3. O Congresso pode fixar a época de escolha dos eleitores e o dia em que deverão votar; esse dia deverá ser o mesmo para todos os Estados Unidos. 4. Não poderá ser candidato a Presidente quem não for cidadão nato, ou não for, ao tempo da adoção desta Constituição, cidadão dos Estados Unidos. Não poderá, igualmente, ser eleito para esse cargo quem não tiver trinta e cinco anos de idade e quatorze anos de residência nos Estados Unidos”. ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA. The United States Constitution. Disponível em: . Acesso em: 3 jul. 2013. 131  LYNCH, Christian Edward Cyril. Entre o Liberalismo Monárquico e o Conservadorismo Republicano: A Democracia Impossível de Rui Barbosa. Revista da EMARF, Cadernos Temáticos, Rio de Janeiro, dez. 2010. P. 51. 132  A palavra “congresso” adentra a tradição constitucional brasileira nesse momento para não mais deixá-la. O termo inexiste na Constituição do Império. O uso do termo vem da história constitucional dos Estados Unidos, “O termo Congresso foi introduzido no Direito Constitucional pelos norte-americanos. Assim se denominou a primeira reunião de comissários das colonias, em 1765, para protestar contra o Stamp Act, lei ingleza que eleva o imposto do sello”. MAXIMILIANO, Carlos. Commentarios a Constituição Brasileira. Rio de Janeiro: Jacintho Ribeiro dos Santos Editor, 1916, p. 269.

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do Presidente – a tradição anterior vigora na menção ao Presidente nesse artigo introdutório, apenas a Constituição de 1824 faz essa referência, e não a dos Estados Unidos. Utilizando a tradição norte-americana para a escolha dos termos133, a Constituição compõe o legislativo de dois “ramos”, a Câmara dos Deputados e o Senado Federal. Havia debate sobre a necessidade da divisão. VARELA argumentava tenazmente pela desnecessidade e o prejuízo da divisão – o autor defendia a conveniência de limitar o poder legislativo, mas não contemplava vantagens na divisão de câmaras como forma de limitação. Argumentava que em harmonia ou discordando, duas câmaras não trariam benefícios à sociedade134, podendo anularem-se mutuamente na criação de boas leis ou concordarem para gerar leis deficientes. Aduzia que a origem do instituto era a Inglaterra, mas lá a Câmara dos Lordes tinha autoridade puramente nominal, restando o poder apenas a dos comuns: “emquanto nos paizes em que se introduziu este enxerto anglo-saxonico, vemos que se apegam a elle com um irracional empenho!” A ideia de unicameralidade fora defendida inclusive durante a constituinte, por Júlio de Castilho135. MAXIMILIANO136, defendendo a posição majoritária na doutrina e adotada pelos constituintes, seguia a tradição de bicameralidade como forma de garantir maior limitação e representatividade ao legislativo. COELHO, também defensor da divisão, relaciona a importância das duas câmaras com a ideia de evitar que maiorias acidentais em 133  A expressão utilizada na Constituição dos Estados Unidos é “legislative branch”, traduzida no Brasil como ramos legislativos. A tradição constitucional anterior vinha da França, o artigo 14 da Constituição de 1824 referira-se à divisão em duas câmaras. 134  “A solução consiste em limitar e nunca em dividir a acção do Congresso, o que será fonte e origem de conflictos, em caso de desavença, inutil estorvo, em caso de harmonia de pensar, como observa Sieyès: ”. VARELA, Alfredo. Direito constitucional brazileiro: reforma das instituições nacionaes. Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, Typographia, 1899, p. 145. 135  “Na Constituinte, entretante, houve quem pensasse no systema unicameral. Na Comissão dos 21, o sr. Julio de Castilho foi patrono dessa idéa”. LEAL, Aurelino. Theoria e Prática da Constituição Federal Brasileira. Primeira Parte. Da Organisação Federal do Poder Legislativo (Arts. 1 a 40). Rio de Janeiro; F. Briguiet e C, Editores, 1925, p. 225. 136  “No caso contrário, ainda intervém, como um contrapeso, o direito de sancção e de veto conferido ao Executivo”. MAXIMILIANO, Carlos. Commentarios a Constituição Brasileira. Rio de Janeiro: Jacintho Ribeiro dos Santos Editor, 1916, p. 262.

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uma das casas permita a produção de normas que não representam os desejos da sociedade137. A origem da bicameralidade é anterior ao influxo norte-americano – ela é eleita como forma de organização do legislativo ainda em 1824138. A organização brasileira retira sua inspiração originalmente da Carta Constitucional da França, do ano de 1814139. Além da forte inspiração liberal francesa, a primeira Constituição brasileira ainda passara por forte influxo do doutrinador francês Benjamin CONSTANT, que também defendia haver cinco poderes em um Estado, sendo dois deles, as câmaras legislativas140 - o Poder Representativo da Duração e o Poder Representativo da Opinião. Mesmo sem adentrar a falta de representatividade dos partidos estaduais, há críticas à capacidade do legislativo de cumprir seu papel. Aurelino LEAL desaprova a atividade legislativa141, e atribui as dificuldades ao modo de constituição do legislativo, à falta de competência dos membros e aos perigos das paixões políticas142. O funcionamento do congresso seria de quatro meses, podendo ser prorrogado com liberdade e convocado extraordinariamente. A reunião seria na capital, no dia 3 de maio de cada ano. O tempo de 137  “Tudo isso obriga os membros de uma camara, contando com a apreciação da outra, a ponderar seriamente as responsabilidades de sua funcção, a agir, com o maximo criterio, e, na hypothese de uma maiora accidental na casa, a que pertençam, a não seguir o caminho das facilidades e das tolerâncias.” COELHO, Henrique. O Poder Legislativo e o Poder Executivo. São Paulo: Typographia do Diario Official, 1905. 138  Artigo 14 da Constituição Política do Império do Brasil. BRASIL. Constituição Política do Império do Brazil. Disponível em: . Acesso em 07 de julho de 2013. 139  Artigos 13 e 24 da Carta Constitucional de 1814. FRANÇA. Charte de 1814 - 1ère Restauration. Disponível em: . Acesso em 07 de julho de 2013. 140  CONSTANT, Benjamin. Principes de Politique, Aplicables a tous les Gouvernemens Représentatifs et Particulièrment a la Constitution Actuelle de la France. Paris: Chez Alexis Eymery, 1815, p. 35. 141  «É indiscutivel que o Poder Legislativo é uma instituição defeituosissima. A sua funcção principal legislar - é lamentavelmente cumprida... Quando se quer, modernamente, uma lei bem redigida, a primeira cousa que se faz é mandal-a elaborar por um especialista. Em seguida, em seguida, emprega-se esforço junto ás Camaras para que não a emendem ou a emendem pouco”. LEAL, Aurelino. Theoria e Prática da Constituição Federal Brasileira. Primeira Parte. Da Organisação Federal do Poder Legislativo (Arts. 1 a 40). Rio de Janeiro; F. Briguiet e C, Editores, 1925, p. 220. 142  LEAL, Aurelino. Theoria e Prática da Constituição Federal Brasileira. Primeira Parte. Da Organisação Federal do Poder Legislativo (Arts. 1 a 40). Rio de Janeiro; F. Briguiet e C, Editores, 1925, p. 220.

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duração das reuniões fixado na norma escapa à influência do texto norte-americano, pertence à tradição francesa do texto anterior. Nos Estados Unidos, a reunião não tinha um tempo de duração, devendo apenas iniciar na primeira segunda-feira de dezembro, salvo disposição legal em contrário143. Há apoio na doutrina para a reunião por prazo certo e de curta duração como ocorre no Brasil. A curta duração permitiria aos representantes se aproximarem dos eleitorados, conhecerem o país, e se dedicarem ao estudo da política – além de servir como espécie de coerção a um trabalho mais rápido dos parlamentares144. A legislatura duraria três anos e seria o prazo de mandato dos deputados. Na Constituição dos Estados Unidos o tempo de mandato dos membros da Casa dos Representantes é de dois anos145. A antiga Constituição do Império fixaram em quatro. Houve uma diminuição do mandato se comparado ao regime anterior, mas sem a adoção dos dois anos, decisão defendida por parte da doutrina, que a viu como adequada e democrática146. A seguir, determina-se o funcionamento das sessões e o processo legislativo: decisões seriam tomadas em quóruns de instalação de maioria absoluta, e de decisão pela da maioria dos presentes. É a estrutura típica de funcionamento dos legislativos. A única ressalva importante é a exigência de maioria dos votos dos presentes para a retirada da publicidade das decisões, uma possibilidade prevista sem quórum algum nos Estados Unidos. Carlos MAXIMILIANO apresenta sua construção de publicidade, demonstrando o avanço da doutrina 143  “Artigo 1º, Seção 4, 2. O Congresso se reunirá pelo menos uma vez por ano, e essa reunião se dará na primeira segunda-feira de dezembro, salvo se, por lei, for designado outro dia”. ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA. The United States Constitution. Disponível em: . Acesso em: 3 jul. 2013. 144  MAXIMILIANO, Carlos. Commentarios a Constituição Brasileira. Rio de Janeiro: Jacintho Ribeiro dos Santos Editor, 1916, p. 269. 145  Eleição: Artigo 1º, Seção 2, 1: “A Câmara dos Representantes será composta de membros eleitos bianualmente pelo povo dos diversos Estados, devendo os eleitores em cada Estado possuir as mesmas qualificações exigidas dos eleitores da Assembleia Legislativa mais numerosa do respectivo Estado”. ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA. The United States Constitution. Disponível em: . Acesso em: 3 jul. 2013. 146  “Neste particular, offerece-nos significativo exemplo a historia parlamentar da França, onde, sob a fórma republicana, a época de tal duração tem oscilado entre um e quatro annos, ao passo que, no regimen monarchico, foise elevando a cinco a seis anos, para em 1824, chegar ao maximo de sete”. COELHO, Henrique. O Poder Legislativo e o Poder Executivo. São Paulo: Typographia do Diario Official, 1905, p. 43.

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brasileira no assunto: “Por tres meios, empregados simultaneamente, imprime-se o carater de publicidade aos trabalhos das camaras: permittindo a pessoas estranhas o ingresso nas galerias ou tribunas; fazendo inserir no Diario do Congresso, annexo ao Diario Official, os discursos e os resultados das votações nominaes, e reservando um lugar para os representantes da imprensa, bem como outorgando-lhes o direito de estampar em suas folhas noticia completa do que ocorreu no recinto do parlamento”147. Pode-se observar claramente a influência norte-americana, mas a Constituição não abriu mão da tradição constitucional existente. 3.3 Câmara dos Deputados A Câmara dos Deputados compõe-se de representantes eleitos pelos Estados e pelo Distrito Federal148. A decisão de incluir representantes do Distrito Federal, de acordo com MAXIMILIANO, foi outra das influências argentinas sobre a norma, e inexiste na Constituição dos Estados Unidos149. O sufrágio é direto, exigindo-se para habilitação apenas a cidadania brasileira por mais de quatro anos, além da posse dos direitos políticos e o alistamento. Dos requisitos, a cidadania é o que merece mais atenção, pois houve alterações importantes e várias normas de origem nacional, sem influxo norte-americano. 147  MAXIMILIANO, Carlos. Commentarios a Constituição Brasileira. Rio de Janeiro: Jacintho Ribeiro dos Santos Editor, 1916, p. 281. 148  A Constituição prevê a garantia à representação da minoria. Essa menção é criticada por VARELA, que “Em justiça, uma minoria não tem direito sináo a duas coisas: o respeito dos direitos individuaes dos seus adherentes e o meio de agir, pela propaganda e pela persuação...” VARELA, Alfredo. Direito constitucional brazileiro: reforma das instituições nacionaes. Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, Typographia, 1899, p. 112. 149  “A Constituição Brasileira afastou-se do modelo norte-americano quando concedeu representantes, no Congresso, ao Districto Federal. Preferiu o modelo argentino, inspirado por Alberdini. Julgava este accetuar a idéia da unidade nacional fazendo legislarem homens da Capital ao lado dos preferidos pelas províncias”. MAXIMILIANO, Carlos. Commentarios a Constituição Brasileira. Rio de Janeiro: Jacintho Ribeiro dos Santos Editor, 1916, p. 495.

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As possibilidades de outorga de cidadania são bastante amplas, um resultado da necessidade de ocupar o território do Brasil que já era observado na doutrina constitucional há mais de cinquenta anos. PIMENTA BUENO escreveu ser a colonização a primeira das necessidades brasileiras, e apontava a extensa legislação imperial, criada desde 1832, voltada a facilitar a ocorrência de imigração para ocupar a vasta área brasileira ainda sem população150. O artigo 69 da Constituição lista a série de hipóteses em que se outorga a nacionalidade, onde são utilizados os critérios do ius solis e ius sanguinis em conjunto. Demonstrando o grande interesse na outorga da cidadania aos estrangeiros, também foi outorgada a cidadania aos que, salvo sua expressa manifestação em contrário, estivessem no Brasil no dia 15 de novembro de 1889, os que possuíssem imóveis no Brasil, fossem casados com brasileiros ou tivessem filhos brasileiros, contanto que residissem no Brasil. O alistamento, ao contrário da outorga de nacionalidade, era bastante restritivo e garantia que a votação estivesse apenas ao alcance influência da elite econômica que havia ascendido ao poder. O artigo 70, §1º, impede a votação de mendigos, analfabetos, praças de pré (excetuados os das escolas militares de ensino superior), e os religiosos de ordens em que houvesse alguma renúncia à liberdade individual. A principal característica política do alistamento era a necessidade de alfabetização, pois grande parcela da população não sabia ler. Antes da vigência da Lei Saraiva, de 1881, 10% da população votava no Brasil – esse é o quadro do final do império. A exigência da alfabetização, provada mediante assinatura do eleitor, reduziu a população votante para menos de 1% - cerca de cento e quarenta mil eleitores, numa população de quatorze milhões151. O patamar de 10% de aptos a votar só voltaria a se recompor por 1920, ainda em uma 150  BUENO, José Antônio Pimenta. Direito Publico Brazileiro e Analyse da Constituição do Imperio. Rio de Janeiro: Typographia Imp. E Const. de J. Villeneuve E C., 1857, pp. 455-457. 151  CARVALHO, José Murilo de. A formação das almas: o imaginário da República no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2006, p. 24.

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população ainda predominantemente rural, em que mais de 70% da atividade estava ligada à agricultura, pecuária e extração152. Dentre os habilitados, durante todo o período republicano, a maior participação efetiva de eleitores se deu na terceira eleição presidencial – de Rodrigues Alves, 1902 -, quando 3,4% da população votou – todas as outras eleições ocorreram com participações variando entre 1,4% e 3% da população153. A exigência da alfabetização gerou uma participação inferior na República Velha se comparada à maior parte do império, enquanto não houve a necessidade. O número de deputados seria fixado por lei, e não excederia o de um por setenta mil habitantes, sempre garantida a existência de ao menos quatro representantes por estado. Com a finalidade de garantir o cumprimento da norma a Constituição prevê um recenseamento imediato e a realização de um novo decenalmente. São previsões semelhantes às da Constituição dos Estados Unidos, onde fora previsto o recenseamento em até três anos e sua nova realização também a cada dez anos. A principal diferença em relação ao regime norte-americana é em relação ao número de representantes. Nos Estados Unidos não haveria mais de um representante para trinta mil pessoas, com um mínimo de apenas um deputado por estado154. Esse foi um tema tratado durante a constituinte, Amaro CAVALCANTI desejava deixar ao Congresso a fixação do número de deputados em função da população, enquanto Epitafio PESSOA desejava a igualdade total entre estados155. COELHO se preocupava com a norma por não prever um limite ao número de representantes, “sucederá, como prova Assis Brazil, que ‘quando o paiz viesse a ter setecentos milhões de almas, isto é ainda 152  CARVALHO, José Murilo de. Os Três Povos da República. Revista Usp. São Paulo, Nº 59, p. 96-115, setembro/novembro 2003. Pp. 100-102. 153  CARVALHO, José Murilo de. Os Três Povos da República. Revista Usp. São Paulo, Nº 59, p. 96-115, setembro/novembro 2003. P. 103. 154  Eleição: Artigo 1º, Seção 2, 2. ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA. The United States Constitution. Disponível em: . Acesso em: 3 jul. 2013. 155  LEAL, Aurelino. Theoria e Prática da Constituição Federal Brasileira. Primeira Parte. Da Organisação Federal do Poder Legislativo (Arts. 1 a 40). Rio de Janeiro; F. Briguiet e C, Editores, 1925, p. 398.

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menos que lhe marcaram... a camara deveria reunir dez mil deputados’”156. Apesar das considerações, uma versão do sistema norte-americano adaptada à população mais reduzida do Brasil foi adotada. Ultrapassada a organização e a composição dos ramos, as competências legislativas da Câmara dos Deputados podem ser divididas em três. Há, inicialmente, as competências listadas no artigo 18, parágrafo único, que se referem ao funcionamento interno de cada câmara, e seriam feitas com independência por elas. São competências: verificar e reconhecer os poderes de seus membros; eleger a sua mesa; organizar o seu regimento interno; regular o serviço de sua polícia interna; e nomear os empregados de sua Secretaria. São encontradas também as competências listadas no artigo 34, privativas do Congresso Nacional, e de iniciativa de qualquer das câmaras. São listados trinta e cinco itens, com as atribuições tipicamente encontradas dentre as competências legislativas nas constituições escritas157. Além dele, há o artigo 35, que responsabiliza o Congresso por guardar a Constituição e criar instituições para promoção da educação. A respeito dessas atribuições, interessa notar que a classificação utilizada por Aurelino LEAL, respeitado doutrinador e historiador, é argentina, demonstrando novamente a ligação entre as doutrinas e a influência latino-americana no texto brasileiro. Ele cita Matienzo, e divide o artigo 34 em atribuições jurídicas, internacionais, de adminis156  COELHO, Henrique. O Poder Legislativo e o Poder Executivo. São Paulo: Typographia do Diario Official, 1905, p. 110. 157  Dentre essas atribuições, destaca-se principalmente duas. A do parágrafo vigésimo segundo é a que determina que cabe à união regular as condições e o processo de eleição apenas para os cargos federais, permitindo que os outros entes federados tivessem suas próprias legislações – situação que se tornaria insustentável e seria modificada. A segunda é a do primeiro parágrafo, a respeito da receita, pela discussão doutrinária a respeito da natureza da lei orçamentária. Aurelino LEAL cita que ““Jèze, que estudou de maneira com muita clareza, resume o juizo dos escriptores da seguinte forma: 1.º Para uns, o orçamento é uma lei propriamente dita. 2.º Para outros, é ora uma lei, ora um acto particular, um acto de administração. 3.º Para outros, finalmente, o orçamento nunca é uma lei”. O autor se posiciona com a primeira hipótese, mas salienta que o orçamento seria uma lei sui generis, já que apesar de suas outras características, era um ato capaz de suspender a vigência de leis tributárias, efeito que só uma lei poderia ter. LEAL, Aurelino. Theoria e Prática da Constituição Federal Brasileira. Primeira Parte. Da Organisação Federal do Poder Legislativo (Arts. 1 a 40). Rio de Janeiro; F. Briguiet e C, Editores, 1925, pp. 496-497.

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tração e de finanças158. A terceira seção de leis são as previstas no artigo 29, dando exclusividade à Câmara para a iniciativa do adiamento de sessão legislativo, leis de tributos, de fixação das forças de terra e mar e projetos do Poder Executivo. Essa disposição também existe na Constituição dos Estados Unidos a respeito dos tributos159, mas não se origina ali, sendo uma disposição tradicional no constitucionalismo brasileiro, bastante semelhante à Constituição de 1824. A principal160 diferença da Constituição anterior era atribuir também a exclusiva iniciativa da Câmara dos Deputados no caso de escolha da nova dinastia em caso de extinção da que governava161, inexistindo agora uma dinastia governante, também inexistia a competência. A origem dessas disposições é inglesa, e se fundamenta historicamente162 pela necessidade de manter os assuntos mais sensíveis próximos da população, com a câmara que representava mais fielmente sua vontade163. Por fim, ainda no artigo 29, a possibilidade de proposição do impeachment é atribuída exclusivamente à Câmara dos Deputados. A existência da responsabilidade política fora uma das maiores demandas dos republicanos que lutavam contra o império, e se positivara 158  “Tratando de igual ponto da Constituição argentina, faz Matienzo: . Acesso em 01 de julho de 2013.

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disposição causava dissenções na doutrina, que utilizavam argumentos sistemáticos para aprovar ou rejeitar a adoção. MAXIMILIANO, por exemplo, afirmava que a solução evitava dificuldades aos estados da federação, pois não haveria situações em que o Estado do presidente teria vantagens e desvantagens – vantagens quando o voto do presidente desempatasse algum pleito; e desvantagens nos demais casos, pois não lhe caberia voto algum169. Colocando-se contra a presidência do Senado pelo Vice-Presidente havia o argumento de que se criara uma confusão na divisão de poderes. O segundo maior representante do Poder Executivo seria o líder de uma das casas do legislativo, configurando-se uma contradição inadequada ao sistema na opinião de Alfredo VARELA170. Por fim, caberia ao Senado o julgamento do impeachment do Presidente da República. Nesses casos, ele seria presidido pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal e deveria proferir sentenças por dois terços de seus membros. O limite da pena era a perda do cargo e a incapacidade de exercer qualquer outro, sem prejudicar a futura ação na justiça ordinária. Esse sistema de julgamento é retirado inteiramente da Constituição dos Estados Unidos171, e lá se afirma também que essa é a única ocasião em que crimes não são julgador através do juri172. Ao contrário da Câmara dos Deputados, o Senado não tem competências legislativas com iniciativa privativa, possuindo apenas suas competências de auto-organização e auto-administração no artigo 18, e as competências exercendo o Poder Legislativo listadas no 169  MAXIMILIANO, Carlos. Commentarios a Constituição Brasileira. Rio de Janeiro: Jacintho Ribeiro dos Santos Editor, 1916, pp. 331-332. 170  VARELA, Alfredo. Direito constitucional brazileiro: reforma das instituições nacionaes. Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, Typographia, 1899, pp. 142-143. 171  Artigo 1º, Seção 3, 6: “Só o Senado poderá julgar os crimes de responsabilidade (impeachment). Reunidos para esse fim, os Senadores prestarão juramento ou compromisso. O julgamento do Presidente dos Estados Unidos será presidido pelo Presidente da Suprema Corte: E nenhuma pessoa será condenada a não ser pelo voto de dois terços dos membros presentes”. ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA. The United States Constitution. Disponível em: . Acesso em: 3 jul. 2013. 172  Artigo 3º, Seção 2, 3: ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA. The United States Constitution. Disponível em: . Acesso em: 3 jul. 2013.

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artigo 34 e 35 da Constituição. A formação do Senado dá demonstrações mais consistentes da preocupação de adaptar a Constituição dos Estados Unidos da América ao novo regime político e à realidade brasileira que começava a ser desenhada. Apesar disso, novamente se observa a ligação diminuta entre o sistema elaborado e as dificuldades que a prática traria. A forma de funcionamento dos partidos foi realizada na política diária respeitando a Constituição, essa é que não tinha meios de superar e se adaptar a realidade social nos termos que a doutrina demandava. 3.5 Imunidades Parlamentares O estudo de alguns tópicos principais da organização judiciário é feito a partir de agora para garantir a sistematicidade e completude da pesquisa. A busca por ligações entre a política brasileira e as normas constitucionais continua sendo o enfoque. Dois artigos da Constituição de 1891 travam das imunidades parlamentares. O artigo 19 estabelecia serem os deputados e senadores invioláveis por suas opiniões, palavras e votos no exercício do mandato. Havia dúvidas na doutrina sobre a necessidade dessa medida. Aurelino LEAL considerava a irresponsabilidade desnecessária. “De mim, penso que esses privilegios já fizeram seu tempo. Porque os membros das Camaras são irresponsáveis por suas opiniões, palavras e votos? Não concebo que um cidadão elevado é categoria de representante do povo precise expender opiniões calumniosas, pronunciar palavras que conteham injúrias para desempenhar o seu mandato”173. A irresponsabilidade para proferir opiniões não se confunde com a impunidade para injuriar pessoas, ela é uma garantia essencial 173  LEAL, Aurelino. Theoria e Prática da Constituição Federal Brasileira. Primeira Parte. Da Organisação Federal do Poder Legislativo (Arts. 1 a 40). Rio de Janeiro; F. Briguiet e C, Editores, 1925, p. 286.

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para permitir a efetiva liberdade do representante. A mudança nos acontecimentos políticos e jurídicos não pode fazer com que uma voz defensável no passado possa ser perseguida no futuro, sob o risco de nunca haver plena liberdade de ação e opinião parlamentar. Ainda que em situação menos extrema, vale a lição de MAQUIAVEL a respeito dos generais romanos. A preocupação com seus atos na volta das campanhas militares não poderia ser um peso sobre suas escolhas174, então todos iam para as campanhas cientes de que a derrota nunca iria ser punida e ele não precisava temer seus efeitos. COELHO apoia a imunidade, mas, como o restante da doutrina, reforça a inexistência dela quando atos abusivos forem cometidos fora do Congresso e do exercício das atribuições do parlamentar175. Além da imunidade material, o artigo 20 estabelece a imunidade à prisão e ao processo criminal, salvo em caso de flagrante em crime inafiançável. No caso do flagrante, e havendo a pronúncia, a autoridade processante remeteria os autos à Câmara respetiva, salvo a decisão do acusado de pedir o imediato julgamento. Ainda que a doutrina apresentasse explicações ao instituto, ele é pouco controvertido, reforçando a aceitação ao sistema. Essa norma existia na Constituição norte-americana, mas era bastante restrita, pois os representantes podiam ser presos por traição, crime comum e perturbação da ordem pública176. A fonte histórica do artigo 20, apesar de haver semelhança com a norma norte-americana, é a Constituição de 1824, que previa 174  “Se enviavam, por exemplo, uma expedição militar à Grécia, contra Felipe da Macedônia, ou à Itália, contra Aníbal, ou contra alguns dos povos dominados inicialmente, o general que a comandava estaria normalmente preocupado com os cuidados relativos às graves providências exigidas pelas circunstâncias. Se se acrescentasse a esta preocupação a idéia de que um general romano podia ser crucificado, ou condenado a qualquer outro suplício, por ter perdido uma batalha, isso tornaria impossível ao chefe militar tomar decisões com toda firmeza. Achavam os romanos que a vergonha da derrota era um suplício bastante grande, e que não se devia atemorizar os generais com a perspectiva de penas ainda mais rigorosas”. MAQUIAVEL, Nicolau. Comentários sobre a primeira década de Tito Lívio. Trad. de Sérgio Bath. 3ª ed. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1994, p. 103. 175  “A prerrogativa não isenta de processo o representante pelo que elle diz na qualidade de homem particular e fóra do Congresso, na imprensa, em palestras, disputas, conferencias ou meetings.” MAXIMILIANO, Carlos. Commentarios a Constituição Brasileira. Rio de Janeiro: Jacintho Ribeiro dos Santos Editor, 1916, p. 293. O mesmo afirma COELHO, ligando a imunidade ao desempenho das funções. COELHO, Henrique. O Poder Legislativo e o Poder Executivo. São Paulo: Typographia do Diario Official, 1905, p. 64. 176  Artigo 1º, Seção 6, 1. ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA. The United States Constitution. Disponível em: . Acesso em: 3 jul. 2013.

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norma extremamente semelhante nos artigos 27 e 28. 3.5 Incompatibilidades Além dos casos de incompatibilidades eleitorais, delegados expressamente à legislação infraconstitucional no artigo 27, a Constituição de 1891 traz normas que permaneceriam na tradição constitucional brasileira posterior e que geraram rico debate doutrinário no período de sua criação. A doutrina não tem discussões substanciais sobre duas normas importantes sobre incompatibilidade. A primeira é sobre incompatibilidade do artigo 16, §3º, que proíbe a eleição concomitante para os cargos de deputado e senador. A segunda é a incompatibilidade de exercício de qualquer outra função durante as sessões legislativas. Essas duas normas eram aceitas e não sofriam questionamentos importantes. As normas do artigo 23 e 24, no entanto, trazem um conteúdo mais substancial para o debate, ainda que desligado do quadro político vigente. O primeiro artigo proíbe os membros do Congresso de celebrar contratos com o Poder Executivo e dele receber comissões ou empregos remunerados, salvo os cargos de acesso e promoções legais. Com autorização da respectiva câmara, ou nos casos de guerra e naqueles em que a honra e integridade da União pudessem estar em risco, estariam excetuados dessa proibição a ocupação de missões diplomáticas, comissões e comandos militares. Carlos MAXIMILIANO elogia a norma, tratando ela como uma forma de retirar a possibilidade de domínio do executivo sobre o legislativo através da cooptação feita por vias de vantagens econômicas177. 177  “É um daquelles freios e contrapesos que caracterizam o systema vigente. Corollario da doutrina de Montesquieu, não permitte que se accumulem funcções de dous dentre os tres poderes constitucionaes. Tira ao Executivo um instrumento de predomínio...”. MAXIMILIANO, Carlos. Commentarios a Constituição

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Em sequência ao artigo anterior, o artigo 25 normatiza que deputado e senador não podem ser presidentes ou diretores de bancos, companhias e empresas que gozem favores do governo federal. LEAL acata o artigo dizendo que é uma maneira de evitar dependências entre os membros do Congresso e essas companhias, diminuindo a possibilidade de influências negativas sobre a política e evitando que algum representante acabasse privilegiando interesses de empresas de que fosse membro. A preocupação do autor, por outro lado, é com o afastamento do parlamento de homens capazes e habituados a questões financeiras178. As incompatibilidades, em suma, não afetam a Política dos Governadores. Há normas discutidas na doutrina, mas a principal questão política do país não é influenciada por elas. As normas puderam ser respeitadas, pois não traziam nenhum grande inconveniente ao desenvolvimento do cenário político. 3.6 Juramento e Subsídio A respeito das normas sobre o legislativo, cabe ressaltar ainda dois institutos: juramento e os subsídios. O primeiro assunto é o dever de juramento, compromisso dos membros das duas casas, a ser feito em sessão pública. A narração de Carlos MAXIMILIANO mostra que o Deputado Monteiro Manso se recusou a prestar o juramento no que ele fosse incompatível com suas ideias, pois ele defendia a monarquia e a religião oficial. No ano de 1923 ocorreu novo fato no mesmo sentido, e o imperialista Martim se comprometeu apenas em cumprir o seu dever. Os dois representantes tomaram posse dos seus cargos sem impedimento179. O segundo importante é a percepção de subsídio. Eles eram Brasileira. Rio de Janeiro: Jacintho Ribeiro dos Santos Editor, 1916, p. 309. 178  LEAL, Aurelino. Theoria e Prática da Constituição Federal Brasileira. Primeira Parte. Da Organisação Federal do Poder Legislativo (Arts. 1 a 40). Rio de Janeiro; F. Briguiet e C, Editores, 1925, p. 329. 179  MAXIMILIANO, Carlos. Commentarios a Constituição Brasileira. Rio de Janeiro: Jacintho Ribeiro dos Santos Editor, 1916, pp. 302-303.

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devidos aos Senadores e Deputados, e seriam fixados ao final de cada legislatura para a seguinte, assim como ocorria nos Estados Unidos. COELHO posiciona-se contra a existência do direito, por acreditar que os parlamentares poderiam cometer abusos para continuar no cargo pelo desejo de não perdê-lo180. A norma adotada pela Constituição seguiu o caminho contrário, e foi aplaudida por MAXIMILIANO e LEAL. LEAL ressalta que o não pagamento constituiria um impedimento à representação por classes operárias do país181. MAXIMILIANO faz o mesmo apontamento, e ressalta ainda que o não pagamento de subsídios dependeria de partidos fortemente organizados e preparados para financiar os parlamentares menos capazes economicamente, tal como ocorria na Inglaterra182. 3.7 Poder Legislativo e Política A exposição sistemática do Poder Legislativo e os apontamentos das questões mais conflituosas na doutrina demonstram que a Constituição não era desrespeitada. Os debates das normas constitucionais não se ligam às principais problemáticas do quadro político. A política da República Velha não se desenhou contra a norma, e sim, apesar da norma. O sistema norte-americano foi modificado, ajustado à realidade nacional e depois foi aplicado. O quadro político trazido pela política do Café com Leite não trouxe um desrespeito constante à norma, mas sim uma situação que não era prevista nela e que se desenvolveu com independência dela. A própria dinâmica da economia e as características da população determinavam grande parte do desenho eleitoral. Apesar dos desrespeitos às leis eleitorais, o quadro político, econômico e social per180  “… a posição especial dos representantes e até o receio de abusos, no prolongamento dos trabalhos, para continuar a receber o direito ao subsídio”. COELHO, Henrique. O Poder Legislativo e o Poder Executivo. São Paulo: Typographia do Diario Official, 1905, p. 87 181  LEAL, Aurelino. Theoria e Prática da Constituição Federal Brasileira. Primeira Parte. Da Organisação Federal do Poder Legislativo (Arts. 1 a 40). Rio de Janeiro; F. Briguiet e C, Editores, 1925, p. 313. 182  MAXIMILIANO, Carlos. Commentarios a Constituição Brasileira. Rio de Janeiro: Jacintho Ribeiro dos Santos Editor, 1916, p. 303.

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mite a compreensão da situação, e não a Constituição. Durante todo o período, apenas dois presidentes não receberam a ampla maioria dos votos computados – Hermes da Fonseca (1910) obteve 57,9% dos votos válidos; e Artur Bernardes (1922) obteve 56%. Todos os demais receberam tiveram mais de dois terços dos votos, e a maioria tiveram ao menos 90% dos votos computados183. A organização do Poder Legislativo teve uma influência pequena dentro de um universo de votantes bastante propenso a aceitar o principal candidato Na classificação ontológica criada por Karl LOEWENSTEIN, a organização do Poder Legislativo é um caso clássico de Constituição nominal. Ela é respeitada, mas as condições políticas e sociais existentes não permitem que suas normas interfiram no reais processos de decisão política. “Una constitución podrá ser jurídicamente válida, pero si la dinámica del proceso político no se adapta a sus normas, la constitución carece de realidad existencial. En este caso, cabe calificar a dicha constitución de nominal. Esta situación no deberá, sin embargo, ser confundida con la conocida manifestación de una práctica constitucional diferente del texto constitucional”184. A Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil não fora preparada para enfrentar as dificuldades políticas. Ela fora inspirada numa sociedade completamente diferente da brasileira. 3.8 Fim da República Velha O fim da política dos governadores só viria com a Revolução de 1930. O café sofreu crescente concorrência internacional e o estado de São Paulo iniciou a compra de sacas para evitar que toda a produção 183  CARVALHO, José Murilo de. Os Três Povos da República. Revista Usp. São Paulo, Nº 59, p. 96-115, setembro/novembro 2003. P. 104. 184  LOEWENSTEIN, Karl. Teoria de la Constitución. 2ª ed. Barcelona: Ariel, 1979, pp. 217-218.

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fosse despejada no mercado, fazendo seu preço diminuir. Essa prática levou ao profundo endividamento do estado, que entrou em seu colapso final com a crise de 1929, quando os preços do café caíram a despeito de qualquer política aplicada. Foi o fim de um período de política dominado pela economia, superado pela severidade da crise do período e seus efeitos sobre os preços do café185. Washington Luís seria o último presidente deste período. O sistema eleitoral estadual ruiria junto com a economia. Ao lado da crise econômica, o governador criou uma séria contenda política. O presidente eleito no último pleito era paulista, e deveria apoiar um candidato mineiro para as eleições presidenciais – era a alternância que sustentava a política do Café com Leite. Quebrando a alternância, o apoio de São Paulo vai para Júlio Prestes. O resultado é a união dos mineiros com outras forças políticas do país para fazer oposição. O Rio Grande do Sul toma a dianteira da política nacional com a Revolução de Getúlio Vargas. O exército voltaria a se envolver na política através do tenentismo. O movimento se opunha à política dos governadores, e foi fortalecido com o enfraquecimento dos políticos estaduais186. CONCLUSÃO A política do império foi substituída por republicanos ligados à terra e com o objetivo consciente de defender seus interesses. Avanços econômicos e sociais ocorreram, mas a democracia – em seu sentido substancial – foi afetada seriamente. A Política do Café com Leite e seus coronéis trouxe a realidade da descentralização para uma sociedade pouco ativa politicamente. A maior parte da população que efetivamente votava – que nunca chegou a 4% da população no período – era rural e dependia dos que dominavam a ordem econômica. 185  MELLO FRANCO, Afonso Arinos de. História e Teoria do Partido Político no Direito Constitucional Brasileiro. Rio de Janeiro, 1948, p. 70. 186  MELLO FRANCO, Afonso Arinos de. História e Teoria do Partido Político no Direito Constitucional Brasileiro. Rio de Janeiro, 1948, p. 69.

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Essa realidade não escapava à crítica dos doutrinadores da época. Eles apontavam com precisão as dificuldades que existiam e apresentavam hipóteses para suas causas e modos de resolução. O sistema eleitoral do período não correspondeu às expectativas daqueles que desejavam um grande avanço em relação ao império – como Ruy BARBOSA –, a política como um todo foi utilizada para finalidades que não correspondiam às expectativas dos estudiosos dos sistemas políticas. A respeito da Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, a principal conclusão é que ela é a base desse sistema, mas não chega a afetar o quadro que se desenvolveu. As normas positivadas eram cumpridas em sua forma, a substância precisaria de uma sociedade completamente diferente para funcionar e garantir um regime democrático. O sistema passara por forte influxo da Constituição dos Estados Unidos da América, mas as semelhanças formais não supririam as diferenças sociais existentes. Uma sociedade em que predominava o analfabetismo e a atividade política na sociedade era quase inexistente não permitiu que normas funcionais na América do Norte fossem aplicadas com sucesso.

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